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Castelo Rá-Tim-Bum:
Bastidores – O Livro
Catherine Mello & Diogo Salvador
Orientação: Marcos Zibordi
Revisão: Diego Henrique de Carvalho
Diagramação: Marina Knöbl Evangelista
Imagens cedidas por: Carlos Alberto Gardin,
Lu Grecco, Catherine Mello e Willian Alves
Capa: Cristiane Picelli
ÍNDICE
Agradecimentos Pessoais	 5
Agradecimentos Especiais 	 8
Prefácio	10
1. “20 anos depois, novo boom do Castelo Rá-Tim-Bum”	 12
2. “Rá-Tim-Bum e Mundo da Lua”	 34
3. Depoimento - Flávio de Souza	 48
4. Depoimento - Bia Rosenberg	 60
5. Depoimento - Leila Russo	 68
6. Depoimento - Carlos Albeto Gardin	 78
7. Depoimento - Lu Grecco	 94
8. Depoimento - Eliana Fonseca	 110
9. Depoimento - Claúdia Dalla Verde 	 118
10. Depoimento - Sérgio Mamberti	 130
11. Depoimento - Angela Dip 	 144
12. Depoimento - Alvaro Petersen	 154
13. Depoimento - Patricia Gasppar	 162
14. Depoimento - Fernando Gomes	 172
15. Depoimento - Pascoal da Conceição	 182
16. Depoimento - Eduardo Silva	 190
17. Depoimento - Theo Werneck	 200
18. Tchau, não! Até amanhã	 205
5
Agradecimentos Pessoais
Dentre tantas dúvidas que tive nos últimos quatro anos, uma delas era como concluir a
faculdade. Poder realizar um trabalho com tamanho prazer e dedicação me faz uma for-
manda completamente agradecida. Eu gostaria de agradecer a todas as fontes que nos ajudaram
a produzir este trabalho, mas infelizmente são muitas e não conseguirei citá-las aqui nominal-
mente. Entretanto, agradeço todas as entrevistas concedidas e por nos mostrarem o quão no
caminho certo estávamos. Agradeço às inesquecíveis entrevistas, a confiança em nosso trabalho
e agradeço principalmente àqueles que nos desejaram sorte. A maior parcela de confiança que
tivemos foi graças a vocês. Agradeço à minha mãe, Silvia, por me apresentar, quando eu era
criança, ao programa que hoje, em 2014, me proporcionou um trabalho que me fez realizada.
Agradeço, ainda, por aquelas fitas cassetes compradas em uma coleção de um jornal. Agradeço
às amigas e irmãs de vida, Priscila Siqueira, Tássia Lopes, Viviane Sousa e Gabriela Maza-
rin pela amizade incondicional e pelo apoio desde sempre. Foram essenciais e serão sempre.
Agradeço ao Diego pela paciência, apoio e revisão. Agradeço ao orientador Marcos Zibordi
por nos aguentar todos os dias em que estávamos na faculdade. Agradeço à disponibilidade e
à paciência. Não menos importante, agradeço com a maior gratidão à minha dupla neste traba-
lho, Diogo, por comprar a ideia de mudar em cima da hora o tema que usaríamos para concluir
a faculdade. Poder terminar quatro anos de curso falando sobre o Castelo Rá-Tim-Bum é de
tamanho orgulho. Por último, agradeço a todos que se dispuseram a ler este livro. Nem oito se-
mestres seriam o bastante pra compor meus agradecimentos da maneira bonita que eu gostaria.
Acabei escrevendo, em forma de trabalho, o poema que eu sempre quis ler. Muito obrigada.
Catherine Mello
Agradecimentos Pessoais
6
Agradecimentos Pessoais
Quando me vem à cabeça agradecer alguém, a minha família está em primeiro
lugar. Em especial, meus pais, Regina e Carlos, que me ensinaram tudo o que
eu sei na vida, com muito amor e carinho, além de serem de certa forma os responsá-
veis por me levarem à peça do Castelo Rá-Tim-Bum, logo quando viemos para São
Paulo. Agradeço à família Salvador, composta por minha avó Irene, meus tios, tias e
primos, que sempre estão nos melhores e piores momentos da minha vida. É motivo
de orgulho ser um Salvador. Agradeço à família Cavalcanti, que também é motivo de
orgulho, e aos meus avós Margarida e Eugênio, os responsáveis por me apresentarem
à paixão pelos livros. Agradeço ao Roberto Cochrane, tio que sempre esteve presente.
À Yvone, que não é da família de sangue, mas me conhece desde quando eu nasci e
também me ensinou muito do que sei. Agradeço também aos atores, roteiristas, pro-
dutores e profissionais envolvidos com o Castelo Rá-Tim-Bum. Sem eles, não seria
possível a realização deste livro. Agradeço ao professor Marcos Zibordi, que aceitou
entrar nessa viagem. Sem a orientação dele, não conseguiríamos chegar aonde che-
gamos. Por último e não menos importante, agradeço à Catherine, por ter sido uma
grande companheira nessa maravilhosa viagem ao passado para descobrirmos mais
sobre o programa que tanto gostávamos quando éramos crianças
Diogo Salvador
Agradecimentos Pessoais
7
8
Agradecimentos Especiais
Cláudia Dalla Verde Thiago Salvador
Gabriele Araújo Anna Carolina Chaves
Flávio de Souza Diego Henrique de Carvalho
Eduardo Silva Rodrigo Ferraz Do Amaral Schahin
Carlos Alberto Gardin Gabriela Souza
Ângela Dip Bruna Bertolucci
Eliana Fonseca Fabio Campos
Pascoal da Conceição Leonardo Pires
Lu Grecco Bruno Peruchi
Patrícia Gasppar Gabriela Mazarin
Leila Russo Amanda e Rosaura Faleiros
Bia Rosenberg Regina Aranha
Siomara Schröder Patrícia Passareli
Sérgio Mamberti Irene Salvador
Fernando Gomes Alice Ferreira
Álvaro Petersen Pedro Novaes
Theo Werneck Cristina Lopez
Silvio Galvão Daiane Bonfim
José Armando Vanucci Márcia, Sérgio e Henrique Salvador
Zélia Cavalcanti Marcelo, Heloísa, Lúcia, João Marcelo e Iza Salvador
Regina Salvador Roberto, Fátima e Bruno Salvador
Silvia da Silva Leite Fabiano Cameran
Agradecimentos Especiais
9
10
Prefácio
Era uma vez um menino de 300 anos que, junto com o tio e a tia-avó, morava num
castelo escondido em meio à cidade. Infelizmente, o fato de não poder frequentar uma
escola comum impedia que ele tivesse amigos. Graças a um feitiço, porém, Nino, certo
dia, conseguiu conquistar novas companhias...
Ah, o resto da história vocês já conhecem, certo?
O que vocês não sabem, muito provavelmente, é como o castelo, os personagens e
os bonecos passaram a existir. E são exatamente esses processos que serão revelados, por
meio de depoimentos, em Castelo Rá-Tim-Bum: Bastidores – O Livro.
Aqui, tudo começa pela exposição comemorativa dos 20 anos do programa, que
estreou em 9 de maio de 1994. Em seguida, viajamos no tempo, lá para os idos de 1990,
para falar brevemente dos antecessores “Rá-Tim-Bum” e “Mundo da Lua”. Boa parte
daqueles que trabalharam no Castelo conta que foi a passagem por esses infantis da TV
Cultura que fez com eles conseguissem experiência suficiente para produzir o mais mar-
cante deles.
Nas páginas deste livro apresentamos os depoimentos de 15 profissionais direta-
mente envolvidos com o programa.
Preparem-se para essa viagem!
Catherine Mello e Diogo Salvador
Prefácio
11
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 12
“Ingressos esgotam e fila para mostra Castelo Rá-Tim-Bum é interrompida”. Essas
informações frustrantes circulavam nos principais sites e jornais de São Paulo em
17 de julho de 2014, data seguinte da inauguração da exposição sobre um dos mais im-
portantes programas infantis televisivos já produzidos no Brasil, cuja homenagem aos 20
anos, em forma de exposição, começava a ser mostrada ao público no Museu de Imagem
e Som (MIS), na zona oeste da capital paulista.
É preciso dizer, antes de mais nada, que a badalada exposição incomodou a uma mi-
noria. Não só pelas enormes filas, problema que, na verdade, era totalmente compensado
quando as pessoas passavam pela porta de entrada. O fato é que um grupo de moradores
do entorno do MIS chegou a fazer, em meados de setembro, um abaixo assinado com,
segundo eles, 150 assinaturas - mas, na verdade, havia apenas 10!
O grupo restrito se incomodou com adultos interessados pela exposição e com os
ônibus de excursão que fechavam o tráfego. Ninguém deu ouvidos aos “manifestantes”
e a situação acabou sendo ironizada por pessoas como o jornalista Ricardo Chapola. Em
seu blog “Crônicas do Cotidiano”, o colunista de O Estado de São Paulo comparou os
“ativistas” ao Dr. Abobrinha, personagem que sempre tentava destruir o Castelo. Em um
dado momento do texto, afirma: “Nós não repudiamos os assinantes do manifesto, que
talvez nem saibam do que se trata a exposição, ou saibam e queiram derrubar o MIS para
levantar um prédio de 100 andares (muaaaahhhh muaahhhhh muaahhhhhh!!!)”.
20 anos depois, novo boom
do Castelo Rá-Tim-Bum
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum13
Centenas de pessoas foram todos os dias ao
Jardim Europa enfrentar horas de fila. Em menos
de um mês de exposição, o museu bateu o recorde
de público, atingindo 80 mil espectadores – até en-
tão, este número só havia sido alcançado em três
meses, na mostra do cantor inglês David Bowie.
Em meados de agosto, a exposição do Castelo já
havia recebido 83 mil pessoas. "Considerando esse
fluxo de 80 mil pessoas em um mês, a gente espe-
ra um pouco mais de 240 mil pessoas no final da
exposição", estima Gabriele Araújo, curadora assis-
tente da exposição. Vale ressaltar que essa previsão
de público foi feita antes da primeira prorrogação
da data de término da exposição. De início ela iria
até 12 de outubro, mas já no começo de setembro
foi prorrogada até novembro e, inclusive, chegou a
funcionar no dia 5 de outubro, primeiro turno das
eleições. Duas semanas depois, aconteceu uma ma-
ratona de visitações à mostra, ocorrendo vendas de
ingressos desde a 00h às 20 horas do domingo. Mas
dias antes, Castelo Rá-Tim-Bum – A exposição foi
prorrogada novamente e desta vez até 25 de janeiro
de 2015, dia do aniversário da cidade de São Paulo.
Se não prorrogada pela terceira vez, a exposição,
ficará cinco meses em cartaz, com previsão de filas
até a última hora.
Mas como assim uma exposição sobre o
Castelo Rá-Tim-Bum, por que está acontecendo?
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 14
Trata-se de uma comemoração lembrando os vinte anos de estreia do programa. Vinte
anos? Raios e Trovões – diria Doutor Victor –, como pode ter passado tanto tempo?
É chocante, prezado leitor, mas duas décadas transcorreram (ou melhor, correram)
desde que Pedro, Biba e Zequinha foram visitar pela primeira vez aquele estranho castelo,
localizado no meio de uma cidade tão grande como São Paulo. Ali, um menino de trezen-
tos anos, que não tinha amigos, vivia junto com seu tio, um bruxo e inventor, e sua tia-a-
vó, uma sábia contadora de histórias e bruxa, assim como todos da família. Muitas cenas
vêm às nossas cabeças fazendo recordar as tardes que passávamos assistindo às aventuras
da turma do Castelo, que prendia a atenção de todos, fossem adultos ou crianças.
O programa estreou em uma segunda-feira, dia 09 de maio de 1994. A novela Éra-
mos Seis, produzida pelo SBT, também estreava naquele dia. Os dois televisivos tinham
algo em comum, explicaremos melhor mais tarde, a participação do ator Eduardo Silva.
Nove dias antes o Brasil havia perdido o tricampeão de Fórmula 1,Ayrton Senna. O piloto
se envolveu em acidente durante corrida em San Marino, e morreu. Os jornais, no dia da
estreia do Castelo, ainda davam destaque ao falecimento com cadernos especiais dedica-
dos a Senna. Mesmo assim, um caderno especial de entretenimento anunciava em página
inteira a estreia do infantil.
Quatro dias depois, o jornal Folha de São Paulo noticiava: “Castelo dobra a audiência
da Cultura”. Segundo a matéria, o horário anteriormente era ocupado pelo, também infantil,
Glub Glub e chegava a registrar médias de 4 e 5 pontos de audiência, aproximadamente 198
mil residências. Já na estreia, o Castelo Rá-Tim-Bum conseguiu registrar 8 pontos, 318.320
domicílios. O índice se repetiu por dois dias e no terceiro, o programa chegou a 10 pontos.
A repercussão do infantil foi tão grande que a vice-liderança, ocupada pelo SBT, estava
ameaçada segundo a reportagem, já que no mesmo horário, chegava a 11 pontos.
Muitos anos se passaram então voltemos no tempo, como se fosse um feitiço da
Morgana, para visitar a exposição, como milhares de pessoas fizeram.
Não foi apenas no dia 17 de julho que filas quilométricas tomavam conta dos quar-
teirões de acesso ao museu. Nas semanas seguintes, cenário praticamente igual. A organi-
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum15
zação tentou facilitar a vida dos visitantes com a oportunidade de vender os ingressos durante alguns dias
pela internet. Mas adivinha o que aconteceu, inclusive com nós? O número altíssimo de acessos sobre-
carregou o site do evento e impediu o comércio de entradas por várias horas. No entanto, esse enxame de
interessados só comprova algo mais certo do que a Celeste morar numa árvore: o sucesso da exposição do
Castelo Rá-Tim-Bum no MIS demonstra como o programa, mesmo após duas décadas da primeira exibi-
ção, permanece vivo na memória de adultos que assistiam às histórias de Nino durante a infância. Continua
sendo muito bom ser criança.
DOMINGO, 24 DE AGOSTO DE 2014
Era um belo dia, não havia sequer uma nuvem no céu. O calor e o tempo seco não estavam para brincadei-
ra. Quando chegamos à Avenida Europa, número 158, no bairro de Pinheiros, por volta de oito horas da
manhã, uma enorme fila para ver a exposição do Castelo Rá-Tim-Bum já contornava a Rua Alemanha e che-
gava até a Rua Bucareste. O número de pessoas só aumentou. Pouco antes das nove e meia da manhã, faltando
doze horas para encerrar a visitação, surgiu monitor do evento que carregava uma placa com a seguinte men-
sagem: “OS INGRESSOS PARA HOJE ESTÃO ESGOTADOS E NÃO SÃO VENDIDOS INGRESSOS
ANTECIPADOS NA BILHETERIA DO MIS. Por favor, retorne em outra data. Recomendamos chegar cedo,
pois a procura está sendo grande e
há número limitado de visitantes por
dia.”
Também pelos monitores,
foram distribuídos adesivos ver-
melhos que simbolizavam os in-
gressos. Cada pessoa poderia pegar
até quatro adesivos e, sem a apre-
sentação dos mesmos garantindo a
compra de ingressos, não valeria a
espera na fila.
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 16
Pessoas dos mais variados
estilos esperavam a vez para com-
prar as entradas. Desde senhoras
que faziam tricô enquanto a fila
não andava, até gente tatuada, com
cabelo colorido, muitos adultos e
adolescentes, que não deixavam
de lado as crianças com menos de
10 anos, todas eufóricas para ver
os cenários coloridos do Castelo
Ra-Tim-Bum, programa que só
voltou a ser reprisado recentemen-
te pela TV Cultura.
Depois do meio-dia conse-
guimos adquirir nossos ingressos para
o horário das cinco da tarde, o que
significava a chance de almoçar em
casa e, depois de algumas horas,
voltar.
Foi o que fizemos. Quando
o relógio marcava quatro da tarde,
estávamos de volta. Na frente do
museu, porém, não estava nem me-
tade das pessoas. Em uma das filas,
encontramos Suzzy Silva Inácio, de
26 anos, e sua filha, Victória, de 3
anos. Formada em enfermagem, a
jovem acompanhou ao programa
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum17
quando era jovem e estava preparada para mos-
trar para a filha o universo com o qual ela tanto se
encantava.
– Eu chego a colocar para ela na internet, e
ela adora. Acho que os cenários, os figurinos, são
as coisas que vão mais nos encantar.
Ela deu sorte, não chegou a ficar nem uma
hora na fila. Alguém comprou e desistiu, acabou
vendendo os ingressos. Depois de conversar com
ela e ver o entusiasmo da pequena Victória, che-
gamos à entrada, onde havia uma maquete do
Castelo. Tudo nos distraia das instruções da mo-
nitora, como as fotografias, até que, finalmente,
chegou a hora tão esperada: uma porta semelhante
àquela do castelo original, com um boneco de lata
como porteiro, recepcionava os visitantes. Dessa
vez, não era Pedro, Biba ou Zequinha os persona-
gens principais. Éramos nós...
“KLIFT, KLOFT, STILL, A PORTA SE ABRIU.”
Oprimeiro ambiente da exposição provoca uma volta ao passado de todos os programas
infantis produzidos pela TV Cultura desde a década 1970, como a versão brasileira do
“Sesame Street”, rebatizada aqui de Vila Sésamo, até o Ilha Rá-Tim-Bum em 2002, atingindo
no mínimo cinco gerações.
Falando sobre esses programas infantis, Cláudia Dalla Verde, uma das roteiristas do pro-
grama, explicou que o Castelo Rá-Tim-Bum, a princípio, tinha outro nome:
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 18
– O Rá-Tim-Bum II era simplesmente tirar o que não tinha dado certo no Rá-Tim
-Bum I e criar novas coisas, mas eles começaram a inventar tanta moda, mas tanta moda,
que virou outro programa. Então resolveu-se não aproveitar nada e iam fazer uma outra
coisa que foi o Castelo, e daí tinha mais dinheiro também, né?
Cláudia participou de outros programas infantis da TV Cultura, como o primeiro
Rá-Tim-Bum, Mundo da Lua e Glub Glub. Ela irá aparecer novamente neste livro, dando
depoimento completo sobre o processo de criação do Castelo Rá-Tim-Bum e a relação
dos profissionais envolvidos com a TV Cultura.
Continuando pela exposição, ainda na primeira parte ficamos impressionados com
todos os detalhes das criações, as fotografias de montagem dos cenários, as técnicas de
abertura do programa, e o que mais nos chamou atenção: roteiros originais e reproduzidos,
que pudemos até tocar, percebendo quantas pessoas estavam envolvidas, além de Cláudia.
Um pouco mais à frente encontramos com o personagem Nino, ou Cássio Scapin
em holograma, dizendo que finalmente seu Tio Victor havia aberto o castelo para visita-
ção. À sua esquerda, o quadro mágico em que um pintor maluco fazia as mais inusitadas
obras de arte; à direita, relógio que, dentre muitas falas, anunciava a chegada do dono do
castelo, a horas das crianças irem embora ou o momento da feitiçaria.
“UMA HORA, HORA E MEIA; MEIA HORA,
HORA INTEIRA; O DR. VICTOR VAI CHEGAR,
O DR. VICTOR VAI CHEGAR.”
Mais adiante, fomos para o cenário da biblioteca. Entre livros, réplica e boneco ori-
ginal do Gato Pintado e da cadeira usada no cenário na década de 90. Ali conhe-
cemos e conversamos com Tatiane Bueno. Formada em jornalismo, a jovem de 22 anos
estava eufórica para rever cada cenário e com certeza cada lembrança. Ao falar sobre o
que estava sentindo, seus olhos, várias vezes, ficaram marejados. A jovem, inclusive, cita
a influência de uma das personagens na escolha da sua profissão.
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum19
- O meu personagem preferido era a Pené-
lope e a Penélope era uma patricinha e jornalis-
ta; eu, querendo ou não, acabo sendo um pouco
patricinha e virei jornalista, então será que de
repente teve alguma influência do Castelo Rá-
Tim-Bum na minha escolha profissional?
Alguém duvida? Ela acrescenta ainda que
o gosto por arte e poesia aconteceu graças ao
programa e, coincidência ou não, naquele ce-
nário acontecia um dos quadros favoritos dela,
onde as pessoas liam poemas de Cecília Meire-
les, Vinicius de Moraes, entre outros, e os mos-
travam animados. Depois de cinco horas na fila
para conhecer a mostra, ela percebe a importân-
cia do programa, principalmente quando com-
parado com os realizados atualmente.
- Eu acho que é um conjunto de coisas. É
um projeto muito inovador, ele é esteticamente
maravilhoso. Criaram uma atmosfera de realida-
de com tudo muito simples, o gato era de E.V.A.
(espuma sintética de baixo custo muito usada
para produtos infantis) meu deus! O sucesso se
deve a isso, a qualidade do elenco, do roteiro, da
estética tudo é excepcional!
No mesmo cenário da biblioteca, repara-
mos que nas estantes havia títulos de enciclo-
pédias e de grandes clássicos, como “As Mil e
Uma Noites”, e até livros de Direito, como o
“Código Penal.
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 20
“LÁ VEM O TÍBIO E O PERÔNIO...”
Opróximo ambiente da exposição é o laboratório dos irmãos gêmeos Tíbio e Perônio, onde os dois cien-
tistas realizavam experiências e ensinavam as crianças sobre, por exemplo, lei da gravidade. Curiosa-
mente, os dois atores que interpretavam os personagens não eram gêmeos e nem sequer parecidos. Inclusive,
Tíbio era vivido por Flávio de Souza, um dos criadores do programa e de boa parte dos personagens. A ideia
de produzir e atuar nem sequer foi dele, mas do diretor Cao Hamburger.
- Foi o Cao que teve a ideia. Ele cismou que eu e o Henrique éramos parecidos e falou pra ele que
queria que ele fizesse a dupla de cientistas gêmeos comigo. De uma certa maneira ele viu um jeito, sei lá,
meio infantil de ser, de interpretar, que realmente combinou.
Já o outro ator, Henrique Stroeter, acabou sendo escolhido para contracenar com Flávio por acaso, ao
fazer um teste para o personagem principal do Castelo, Nino. Apesar de o diretor ter elogiado seu desempe-
nho, ele foi informado que gostariam que ele interpretasse Perônio, o outro cientista. E digo mais. Ou me-
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum21
lhor, neste caso, nós dizemos mais: mesmo os dois não se achando parecidos, depois da carac-
terização ficaram muito parecidos, fazendo todos pensarem que eram mesmo irmãos gêmeos.
Flávio aparecerá novamente nos próximos episódios, quer dizer, no decorrer do livro para
contar sobre sua participação na criação do programa e interpretação do seu personagem;
Continuando nosso percurso, chegamos ao laboratório do Doutor Victor, tio de Nino e
dono do castelo. Distribuído em dois andares, o local onde o bruxo de 3000 anos realizava in-
venções, assim como os outros ambientes da exposição, estava repleto de fotografias, desenhos
e, principalmente, de figurinos usados nas gravações. De minuto em minuto as luzes piscavam
e uma voz estridente gritava “RAIOS E TROVÕES!”, assustando adultos e mais ainda as crian-
ças. Sérgio Mamberti, que também aparecerá pessoalmente nas páginas futuras deste livro, deu
vida ao mago que pronuncia aqueles apelos. Ainda hoje, o ator fala com carinho sobre o perso-
nagem que mais o fazer ser reconhecido na rua:
- Fiz coisas marcantes na televisão, mas o personagem que marcou minha vida foi o Dr.
Victor no Castelo. Ele se tornou meu alter ego.
No programa, em meio a luzes piscando e gritos do dono do castelo, havia duas botas ra-
ppers que viviam fazendo rimas, malandras, ou “malacas”, conforme gíria da época. Dubladas
por Theo Werneck, que fala a seguir, e Gérson de Abreu, já falecido, os bonecos, controlados
por controle remoto, obrigavam os atores improvisarem as falas, inserindo os famosos “cacos”:
- Os bonecos tinham uma certa imprecisão e a gente tinha que colocar muito caco e pra isso
tem que ter uma habilidade, então não basta você só ser um dublador. Você tem que saber colocar
um caco e esse caco tem que ser pertinente pra não ficar com uma dublagem artificial.
Em seguida, entramos em um corredor escuro e mais estreito que os anteriores da expo-
sição. O espaço representava os encanamentos do castelo, onde ficava a toca do Mau. Sempre
acompanhado de Godofredo, o personagem fazia desafios: crianças e adultos precisavam resol-
ver enigmas citando, por exemplo, frutas com uma determinada cor e repetindo trava-línguas.
Caso não superassem o desafio, Mau dava a sua terrível gargalhada fatal, algo que pouco acon-
tecia, graças a Godofredo, que, quase sempre, ajudava as pessoas.
Em seguida, chegamos ao, até então, maior cenário da exposição: a sala de música, di-
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 22
vidida em dois ambientes. No primeiro, tivemos a oportunidade de sentar na pianola. A cada pedalada,
bonecos dançavam em uma pequena tela, na altura dos olhos, vários ritmos diferentes. Mais adiante, uma
caixinha de música, a pequena maquete do circo e a máquina onde desenhos se criavam e se transforma-
vam. Em frente a dois sofás, uma grande e antiga televisão exibia, ininterruptamente, reportagem sobre
os bastidores do programa. Na segunda parte do ambiente, fantoches de vários países ensinavam palavras
básicas de outras culturas em uma lareira. No canto, encontramos o globo que, no programa, qualquer um
girava e escolhia um país para escutar melodias locais. Outro item que vimos foi a caixa mágica: ao abri-la,
objetos geométricos surgiam e estimulavam as crianças a identificá-los.
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum23
Passando para o próxi-
mo espaço da exposição, não
encontramos propriamente um
cenário, mas, sim, outro corre-
dor escuro, com luzes que si-
mulavam estrelas. Logo perce-
bemos: estávamos no espaço e,
mais à frente, iríamos encontrar
o figurino daquele que, infeliz-
mente, não pôde presenciar o
sucesso do programa. Wagner
Bello, intérprete do personagem
que visitava sempre Nino e seus
colegas, morreu ainda no perío-
do de gravações, quando faltava
mais um episódio para ser gra-
vado. Entrou em cena, então,
a atriz e amiga pessoal do ator,
Siomara Schröder, que já havia
interpretado a mãe do perso-
nagem e, depois da perda, deu
vida à Etecetera, irmã do, tam-
bém extraterrestre, Etevaldo.
- Eles me chamaram e
de primeira eu não aceitei, nós
éramos muito amigos, eu ain-
da estava muito abalada com a
perda. Depois eles me ligaram
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 24
de novo e insistiram dizendo que aquilo
seria uma homenagem a ele e eu acabei
aceitando sem saber como iria reagir.
Seguimos e chegamos ao hall do
castelo, que ligava os cenários da co-
zinha, jardim e quarto do Nino. Agora,
sim, o maior espaço da exposição, onde
encontramos vários figurinos e imagens
de jornais, croquis dos figurinos e cartas
de fãs. Foi onde ficamos a maior parte
do tempo. O local era grande demais, a
maioria das pessoas também permane-
ceu boa parte do tempo por ali, tirando
fotos, observando os figurinos ou mes-
mo descansando, já que havia um sofá
idêntico ao do Castelo no centro do hall.
O primeiro objeto que encon-
tramos foi o figurino do Telekid, per-
sonagem que sempre dizia “PORQUE
SIM NÃO É RESPOSTA” quando Ze-
quinha cismava em sempre perguntar o
porquê de algo e no final, recebia um
sonoro “PORQUE SIM, ZEQUINHA”.
Marcelo Tas interpretou o personagem
que vivia sempre acompanhado de um
aparelho que, hoje, se assemelha a um
smartphone. Quem sabe não fosse um
presságio dos celulares modernos da
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum25
atualidade, da internet e de uma gran-
de empresa de busca? O personagem
sempre explicava por qual motivo,
por exemplo, as pessoas espirravam.
De uma forma simples e de fácil en-
tendimento, o quadro ensinava coi-
sas muitas vezes complexas.
Chegamos, então, à cozinha
e assim como todos os espaços da
exposição, este retratou quase fiel-
mente o cenário de 20 anos atrás. Os
armários nos davam a possibilidade
de abrir algumas gavetas onde havia
fotos de gravações. No centro da co-
zinha encontramos o mais extrover-
tido dos visitantes daquele castelo,
Bongô. O entregador de pizza cheio
de ginga e molejo foi interpretado
por Eduardo Silva que, mesmo ten-
do feito inúmeros outros trabalhos
televisivos, é reconhecido constan-
temente pela atuação no Castelo.
- Os trabalhos que mais as pes-
soas acabam lembrando são os que
ficam mais tempo no ar, o Castelo e
o Telecurso 2000 são esses exemplos.
Os dois estão há muito tempo no ar,
mesmo o Castelo tendo parado por um
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 26
tempo, as pessoas ainda ficam
com a sua imagem guardada. É
muito legal virarem pra você e
falarem que a pessoa aprendeu
e se divertiu com aquilo.
Algo que chamou nossa
atenção naquela cozinha foi a
máquina de lavar louça na ja-
nela - no cenário original, o
equipamento não limpava re-
almente os pratos. Da mesma
janela avistamos o jardim, para
onde seguimos. Cheio de plan-
tas, foi o local propício para
colocar o bicho do mato da per-
sonagem Caipora. O figurino, cheio de mega hairs e sementes incorporados nos fez supor
o quanto aquilo deveria demorar a ficar pronto, causando enorme calor na atriz Patrícia
Gasppar. A dificuldade continuava, mesmo depois do término das gravações.
- Na época não tinham produtos pra tirar maquiagem tão fácil como os que têm hoje.
Enquanto todo mundo ia embora, eu ficava lá tentando tirar a maquiagem, várias vezes eu
desistia e saía com vestígio de maquiagem no rosto e ia pra qualquer lugar daquele jeito.
Saindo do jardim, passando pela cozinha novamente, chegamos a dois locais, di-
gamos: à nossa frente havia os três figurinos das crianças que diariamente visitavam o
castelo: Pedro, Biba e Zequinha; dando meia volta, estávamos em frente ao figurino da
mais delicada das personagens do programa, Penélope, admirada por todos pela tamanha
beleza. Jornalista, influenciou muitas meninas a seguirem a mesma profissão e, principal-
mente, a gostarem mais ainda da cor rosa.
- Eu já ouvi isso de várias meninas. E isso é realmente muito importante. Programas
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum27
infantis têm essa importância. Você molda pessoas, eu vejo como isso é importante por amigos
que eu tenho de 28 anos, pela receptividade dos fãs na rua e pela quantidade de entrevistas que
a gente dá. Eu vejo por mim, as referências que você tem na infância ficam pra sempre.
Ângela estava certa ao dizer que influenciou inúmeras meninas. Eu, Catherine, sou um
desses exemplos. Não era fácil assistir àquele programa e não ficar admirada em como ela
conseguia ter apenas o rosa em sua vida! A delicadeza, os trejeitos e a feminidade encanta-
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 28
vam até os meninos, como disse o próprio Nino,
com cara de bobo, ao vê-la pela primeira vez:
“Meu Deus, como ela é linda”. Sem nenhuma
imparcialidade, ela era realmente linda, a repre-
sentação de uma boneca. O rosa ainda é até hoje
a minha cor preferida, mas não sou charmosa
como a personagem e por isso, o rosa, na minha
vida, é bem mais moderado.
Após tanto andar, ver e sentir, sentamos no
sofá redondo para descansar e notamos os olha-
res de admiração das pessoas à nossa volta. Era
nítido o quanto elas estavam gostando de estar
ali e, ao mesmo tempo, o quanto elas gostaram
do que foi a presença do Castelo Rá-Tim-Bum
na infância de cada uma.
Levantamos e à nossa frente estava a ár-
vore do castelo, aquela mesmo em que dentro
vivia a cobra rosa, Celeste, que sonhava em ter
braços e pernas. Seu desejo, certa vez, acabou
virando, em vez de braços e pernas, asas, e assim
ela pôde passear pelo castelo sozinha. Ao lado, a
porta do quarto do Nino frequentemente girava.
Lá dentro a decoração era o que mais chamava a
atenção: paredes, o chão e o teto revestidas por
gibis colados. Uma cadeira e diversas fotos tam-
bém compunham o cenário.
Na mesma árvore, a casa do João de Barro
onde moravam os passarinhos musicistas. Mais
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum29
acima estava o lustre do castelo onde as
duas doces fadinhas, Lana e Lara, viviam.
Vimos ainda, ao lado dos figurinos
das crianças, o ratinho que vivia circu-
lando pelo castelo dentro do carrinho em
forma de rato, dando voltas entre a par-
te de dentro e de fora. No programa, ele
cantava músicas incentivando a higiene
pessoal de forma descontraída. Quem es-
tava ao seu lado era Fura-Bolos, acom-
panhado dos amigos da Dedolândia, que
sempre aparecia cantando músicas sobre
matemática ou lembrando a importân-
cia de se lavar as mãos, dando início ao
conhecidíssimo clipe “Lavar as mãos”,
com letra de Arnaldo Antunes.
Quase ao pé da escada que nos le-
vava ao quarto da bruxa Morgana e mais
alguns cenários, estava uma parede com
quadros do Dr. Victor. Eram vários e de
diversas épocas. Na parede da escada
também havia vários quadros, desta vez
da família. No topo da escadaria, podí-
amos observar a movimentação do hall.
Uma estante estava cheia de projetos
paralelos ao programa: livros, fitas-cas-
sete, gibis dos personagens, cadernos de
colorir e muitos outros.
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 30
“MORCEGO, RATAZANA, BARATINHA E COMPA-
NHIA, ESTÁ NA HORA DA... FEITIÇARIA.”
Assim como Catherine confessou suas reações ao ver a Penélope, eu, Diogo, tam-
bém tive um momento particular, mas com outro personagem. Ao chegar ao ce-
nário do quarto da Morgana, meus pensamentos voaram para um passado de referências
e lembranças. Tudo ao mesmo tempo. Eu ainda morava no Rio de Janeiro e nem imagi-
nava residir em São Paulo quando vi pela primeira vez aquela bruxa com um cabelo em
pé e cheia de histórias para contar, sempre na companhia da gralha Adelaide, no quarto
da torre daquele castelo.
Era muito divertido imaginar como uma bruxa de seis mil anos sabia de tantas
coisas, desde a pré-história até o descobrimento do Brasil, passando por clássicos ca-
sos como a Guerra de Tróia. Parando para pensar, esse mundo de fantasias é algo que
sempre me chamou atenção: não à toa, alguns anos mais tarde eu comecei a entrar num
mundo de bruxaria, mas não da Morgana, e sim, de um garoto que só descobria o mun-
do da magia aos 11 anos, vocês devem saber quem é!
Impressões e recordações revividas, voltando ao cenário da exposição, a luz era
quase pouca. Havia a cama da bruxa Morgana, o sofá, as réplicas da gralha Adelaide, o
caldeirão dos feitiços, um retroprojetor antigo onde, com imagens feitas por ele, a bru-
xa contava suas histórias. Havia também alguns, poucos, objetos originais que foram
usados 20 anos atrás. Junto a fotografias estava lá, também, o figurino da personagem
que foi interpretada por Rosi Campos.
“PASSARINHO, QUE SOM É ESSE?”
Opróximo cenário, representação do ninho que vimos na árvore do hall, está mon-
tado com os quadros preferidos dos telespectadores fãs de música. Toda vez que
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum31
o passarinho aparecia tocando um instrumento, as passarinhas, suas companheiras de cena,
cantarolavam a música e faziam as crianças adivinharem qual instrumento o personagem
estava tocando. João de Barro e as Patativas eram a essência musical do Castelo. No ce-
nário repleto de instrumentos musicais, com palha ao redor, três ovos e os três figurinos,
escutamos a famosa música que elas cantavam em todos os episódios: “QUE SOM, QUE
SOM É ESSE? QUEM SABE O NOME DELE?”
Ainda visitamos o cenário do lustre do castelo. Ali as fadas Lana e Lara, irmãs, fa-
ziam brincadeiras e frequentemente uma provocava a outra para adivinhar através do som
ou da forma do objeto. Doces e delicadas as fadinhas, às vezes, acabavam discutindo. A
dupla chegou a sair do lustre algumas vezes para ajudar Nino e as crianças.
Quase duas horas depois de termos passado pela portaria, estávamos chegando ao
final da exposição. Chegamos ao que pareceu, aos nossos olhos, a parte de fora do caste-
lo e também o cenário do personagem Pompeu Pompílio Pomposo. Conhecido como Dr.
Abobrinha, o personagem, interpretado por Pascoal da Conceição, sempre tentava comprar
o castelo para derrubá-lo e construir, no mesmo local, um prédio de 100 andares. Como
nos espaços anteriores, havia fotos e o figurino do personagem. Em volta, sacos de lixo
encostados em um latão, local onde Dr. Abobrinha foi parar algumas vezes depois de ten-
tar enganar a turma do castelo. O ator era o único que a cada episódio tinha um figurino
diferente, pois ele sempre se fantasiava de algum outro personagem para tentar comprar a
propriedade.
- Como eu estava careca na época foi muito fácil para fazer altos disfarces. Eu acho
que sou uma pessoa boa para disfarce. É engraçado, eu mudo muito quando visto uma rou-
pa, era muito divertido.
E, enfim, terminávamos a visita. A sensação de nostalgia tomava conta. Assim que
saímos, resolvemos iniciar uma volta ao passado ainda mais ousada do que a da exposição
- resolvemos contar as histórias dos atores, produtores, diretores, roteiristas (alguns apre-
sentados neste capítulo, outros vocês irão conhecer nos próximos), todos envolvidos com o
programa que marcou a década de 90 educando e divertindo crianças e que, hoje, 20 anos
20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 32
depois, já adultas, ainda gostam tanto do Castelo Rá-Tim-Bum que enfrentam horas
de fila para reviver aquele castelo.
Neste livro, porém, é bem mais fácil reviver o passado: não há filas, ingressos,
nem data para começar e terminar a nostálgica diversão. Simplesmente vire a página
e tudo recomeçará como num passe de mágica. ■
rá-tim-bum e Mundo da Lua33
rá-tim-bum e Mundo da Lua 34
Estamos na década de 1980, marcada pelo sucesso de bandas de pop rock nacional como Barão
Vermelho, Legião Urbana, Titãs. Naquela época, passamos por anos de transição política. Desde
1985, não vivíamos mais em uma ditadura militar e, ao mesmo tempo, perdíamos Tancredo Neves,
vítima de um tumor na região abdominal.
Aos sábados, as pessoas assistiam aos calouros no programa do Chacrinha e aos primeiros anos
do canal de televisão de Silvio Santos, aquele que seria um dos maiores apresentadores de programas
de auditório do país. Mas se você era criança, programas como o da Xuxa, Mara Maravilha e Angélica
certamente chamavam mais sua atenção.
Foi mais ou menos neste período em que pessoas como Flávio de Souza e Cláudia Dalla Verde
trabalhavam como roteiristas em programas infantis na TV Cultura. A emissora paulista já tinha um
histórico de projetos voltados para esse público. Vila Sésamo talvez tenha sido o primeiro, com ato-
res de reconhecimento nacional, como Sônia Braga e Aracy Balabalian. O seriado foi referência para
crianças da década de 1970, hoje adultos que, com certeza, ainda lembram das aventuras de Garibaldo
e sua turma.
Mas foi no final da década de 1980 que muitos profissionais conseguiram produzir um progra-
ma infantil diferente de tudo o que se fazia até então - inclusive, naquela década, ocorreu um grande
movimento de teatro infantil em São Paulo e também foi formada a Associação Paulista de Teatro de
Infância e Juventude. Não à toa, a maioria desses dramaturgos do teatro acabou entrando em projetos
de televisão. E numa parceria com tantos profissionais, deu-se o Rá-Tim-Bum!
2. Rá-Tim-Bum e Mundo da Lua
rá-tim-bum e Mundo da Lua35
“SENTA QUE LÁ VEM HISTÓRIA...”
Em 1990, o Rá-Tim-Bum, primeiro programa infantil patrocinado pela FIESP (Federação das Indústrias
do Estado de São Paulo), com direção-geral de Fernando Meirelles (aquele que anos mais tarde iria
conduzir o premiado filme Cidade de Deus), tinha uma proposta muito diferente. O programa apresentava
inúmeros quadros que incentivam as crianças em determinadas áreas, como o quadro Doutor Barbatana e
as sereias da água doce, por meio do qual elas aprendiam a diferença entre “em cima” e “embaixo”. No
programa havia quadros como o Senta que lá vem história, do Professor Tibúrcio, interpretado por Marcelo
Tas, e O Pinguim Pianista, interpretado por Theo Werneck.
- Como eu já tinha participado do Revistinha (programa infantil também produzido pela Tv Cultura)
eu já conhecia várias pessoas do elenco. Então eu já frequentava a casa como ator, foi aí que me chamaram.
rá-tim-bum e Mundo da Lua 36
Eu também já conhecia o Fernando Meirelles e Marcelo Tas do Olhar Eletrônico.
O ator que anos depois participaria do Castelo Rá-Tim-Bum conta que nem sempre
era reconhecido nas ruas, tal a caracterização do personagem. A ocasião mais inusitada
que viveu foi quando sua atual namorada fez uma pesquisa na internet e descobriu sua
participação no infantil.
A principal ideia do Rá-Tim-Bum surgiu de Fernando Meirelles, diretor geral: ele
queria fazer um programa que representasse um pequeno canal de televisão para crianças,
com histórias, telejornais... Flávio de Souza, que estava envolvido na criação, começou
a escrever os primeiros roteiros em reuniões de criação, que contavam com Marcelo Tas
e Paulo Moreli, todos então envolvidos com o Olhar Eletrônico, produtora de Fernando
Meirelles, também presente nos encontros.
Como era destinado ao público infantil, todos os roteiros produzidos por Flávio e
seus colegas precisavam ser orientados por uma coordenação pedagógica. Essa relação
entre roteiristas e pedagogos não foi uma tarefa muito tranquila. Pelo contrário. Flávio
narra como era a relação entre eles: “O conceito era mostrar o conteúdo pedagógico, mas
de forma divertida. A ideia era o divertimento em forma de entretenimento, mas a coor-
denação pedagógica não concordava, achava que só tinha que ter a informação. Muitos
roteiros eram riscados por que eles achavam desnecessários.”
Eliana Fonseca, diretora de um dos quadros e intérprete da personagem Cacilda,
confirma cenas dirigidas sob acompanhamento de algum profissional da coordenação pe-
dagógica. Eles, inclusive, chegaram a proibir algumas ideias, como o quadro da persona-
gem Nina, vivida pela a atriz Iara Jamra:
- Nós não sabíamos como a personagem ia começar, e eu sugeri que ela cantasse
o ‘atirei o pau no gato’, de repente tinha uma pessoa da coordenação pedagógica man-
dando refazer tudo por que essa música não poderia”, explica a diretora, que relembra a
passagem como uma situação mais engraçada do que problemática. Atirar o pau no gato
poderia incitar à violência contra os animais.
No final das contas, o sucesso do programa acabou deixando todos surpresos. A equi-
pe inteira estava no meio do processo e, com isso, as relações nos bastidores foi amenizada.
Fernando Meirelles, diretor-geral, havia acabado de chegar à TV Cultura e, portanto, tinha
rá-tim-bum e Mundo da Lua37
uma linguagem muito diferente, bem próxima à utilizada na publicidade. O sucesso do programa fez com que,
aos poucos, os ânimos se acalmassem entre roteiristas e o departamento pedagógico.
Uma das grandes diferenças do Rá-Tim-Bum em relação a outros programas da época era a forma
como foi escrito. Cláudia Dalla Verde, que entrou com o processo já iniciado, explica que, mesmo assim,
ajudou a “dar forma” a alguns personagens, como o Máscara.
- O Rá-Tim-Bum funcionava como uma fábrica de salsichas, ninguém era dono do personagem. Você pe-
gava 30 quadros de ginastica, depois mais 20 de telejornal e, depois, mudava tudo. O que era uma delícia!
rá-tim-bum e Mundo da Lua 38
Com quadros distintos, cada episódio encontrava sua maneira de ser ligado ao “Senta
que La Vem História”. Contado em três ou quatro atos, o quadro apresentava, muitas vezes,
adaptações de grandes clássicos literários.
Muitos atores que hoje tem certo reconhecimento estavam envolvidos. Eram os casos
de Marcelo Tas, Iara Jamra, Carlos Moreno, Norival Rizzo, Eliana Fonseca e Angela Dip.
Como existiam muitos quadros independentes das histórias, a maioria dos atores gravava
em poucos dias blocos e mais blocos. É o que conta Angela Dipp, que participou do “Famí-
lia Teodoro”, uma das pequenas esquetes do programa, todas gravadas em menos de uma
semana.
Como a TV Cultura é um canal de televisão pública, todos os índices de audiência até
então não tinham tanta relevância. O próprio Flávio lembra que era muito comum os pro-
gramas não registrarem nenhum ponto de audiência. Mas foi no Rá-Tim-Bum que o cenário
começou a mudar, registrando pela primeira vez índices altos de audiência.
Os figurinos do programa foram apresentados por Carlos Alberto Gardin, o mesmo que,
anos mais tarde, criaria as vestimentas dos personagens do Castelo Rá-Tim-Bum. Porém, va-
mos falar sobre esse programa daqui a pouco. O figurinista afirma que a relação com Fernando
Meirelles era bem tranquila, além de recordar que havia uma parceria com outros departa-
mentos, como o de cenografia, para a realização do quadro da família que assistia tudo o que
era realizado no Rá-Tim-Bum.
- Quando o Fernando me explicou sobre essa família, seriam famílias comuns: uma
dona de casa, o pai era mecânico e, inclusive, eu comecei a trabalhar em cima dessa ideia,
mas quando vi que a cenografia estava fazendo coisas totalmente diferentes, como colo-
car um vaso de ponta a cabeça, resolvi refazer todo o figurino desses personagens. Nós
estávamos indo por caminhos diferentes, e nós tínhamos que juntar os canais.
Para construir o personagem Euclides, interpretado pelo ator Carlos Moreno, Gar-
din explica que sempre teve grande liberdade nos figurinos.
- Eu pensava ele bem careta, como se fosse um escriturário, com terno xadrez, mas
não era isso que eu queria, e o Fernando disse: ‘Faz o que você quiser’. E eu explorei
muito dessa idéia, com coisas que poderiam ser contatas, chegando até a colocar ele com
um sapato de coturno para a surpresa até do Fernando, quando viu no estúdio”.
rá-tim-bum e Mundo da Lua39
Outro caso interessante é que a personagem que Eliana Fonseca deu vida não era
para ser humana, mas, sim, um boneco. No entanto, como a ideia não vingou, ela acabou
atuando e, mais uma vez, Carlos Gardin usou de sua imaginação para criar.
- Ela era uma produtora de tevê, então ela tinha até comida na sua roupa”, relembra
o figurinista.
Como o programa entrou no ar no meio do processo de realização, todos perceberam
a receptividade perante o público, e acabavam remodelando o que não estava dando certo.
Mas muita coisa deu certo. Flávio acredita que um dos triunfos que merecem maior destaque
rá-tim-bum e Mundo da Lua 40
foi o investimento no público infantil, além da quantidade de pessoas talentosas que estavam
envolvidas.
- É, eu acho que o principal acerto foi a quantidade de gente que participou, foi
praticamente uma multidão. Muita gente escreveu e muita gente dirigiu. Ele meio que
distribuiu, chamou muita gente que nunca tinha feito nada pra televisão, e eu acho que é
uma coisa experimental mesmo, tanto que algumas coisas não deram muito certo e acaba-
ram tendo que ir pro ar. Mas muita coisa eu acho que deu muito certo porque ele deixou
as pessoas experimentarem, fazer coisas...
rá-tim-bum e Mundo da Lua41
Eliana Fonseca também tem sua opinião sobre o programa e, principalmente, sobre o sucesso. Na
visão dela, todos envolvidos estavam no auge de suas carreiras.
- Tudo dava certo no Rá-Tim-Bum, os roteiristas escreviam muito bem, os atores atuavam muito bem,
e nós diretores estávamos dirigindo bem, também, mas acho que, além disso, era algo meio energético, sabe?
Ali, tudo o que estávamos realizando dava certo.
E boa parte daquela equipe não parou no Rá-Tim-Bum. Alguns roteiristas do programa já estavam
envolvidos com o próximo sucesso infantil, o Mundo da Lua.
rá-tim-bum e Mundo da Lua 42
“ALÔ, ALÔ! PLANETA TERRA CHAMAN-
DO! PLANETA TERRA CHAMANDO! ESTA
É MAIS UMA EDIÇÃO DO ‘DIÁRIO DE
BORDO’ DE LUCAS SILVA E SILVA, FALAN-
DO DIRETAMENTE DO MUNDO DA LUA,
ONDE TUDO PODE ACONTECER!”
Agora estamos em 1991. Flávio de Souza, que acabara de ter uma experiência
muito boa com o Rá-Tim-Bum, idealizou praticamente sozinho o seriado para
o mesmo público do programa que ele havia produzido recentemente e estava dando
tão certo. Inspirado num seriado que assistia quando criança, o “Papai sabe tudo”,
que foi exibido no começo da década de 1960, o roteirista queria fazer algo em que
o cotidiano de uma família estivesse envolvido. Ao apresentar a ideia para Beth
Carmona, diretora de programação da TV Cultura, recebeu dela o aval. Mas não foi
nada fácil fazer esse seriado, se for comparado com o grande sucesso da época, o
Rá-Tim-Bum.
Flávio e Cláudia, ambos recém-saídos do programa, estavam envolvidos na criação
do Mundo do Lua. Inclusive, eles escreveram mais de 20 episódios, mas nem todos foram
aproveitados, por vários motivos. Um deles era a coordenadora pedagógica.
- A professora Célia Marques, que era da equipe pedagógica, achou que tinha sido
relegada e que ninguém tinha perguntado nada pra ela, ninguém tinha pedido a aprovação
dela. Eu não sabia direito porque não tinha esse contato direto com ela, mas o que falaram
era que ela jogou tudo que já tinha sido feito no lixo e mandou refazer.
Houve também uma mudança na direção do programa. Com a entrada de Marcos
Vaisntock, muita coisa mudou na atração, uma das principais foi o cenário. O criador
da série explica:
- Antes eles moravam num apartamento que era meio pequeno, era tudo meio
pobre, era tudo menor do que foi feito depois. Ele tornou as pessoas, a família, prova-
rá-tim-bum e Mundo da Lua43
velmente mais rica, vamos dizer. Acho que eles eram de classe média baixa e eles passaram
pra classe média alta na verdade.
O seriado se resumia à rotina da família Silva e Silva, liderada pelo professor de geogra-
fia Orlando Silva, interpretado por Antônio Fagundes. Ele era casado com Carolina, vivida por
Mira Haar, dona de uma boutique. Eles eram pais de Juliana, interpretada pela novata Mayana
Blum, e o jovem e protagonista da história, Lucas, interpretado por LucianoAmaral.Ainda resi-
diam na casa o avô paterno, Orlando Silva, vivido por Gianfrancesco Guarnieri, e a empregada
doméstica Rosa, interpretada por Ana D’Lira.
Cada episódio girava em torno do cotidiano dessa típica família de classe média paulista-
na. Lucas, por sua vez, enxergava todas as situações vivenciadas na casa e usava sua imagina-
ção para narrar seu diário de bordo num velho gravador, que pertencia ao seu avô.
Além dos personagens fixos, sempre havia participações especiais. Geralmente, eram fa-
miliares. Flavio de Souza, por exemplo, chegou a atuar como o irmão caçula do personagem de
Antônio Fagundes, o Tio Dudu. Mas a percepção de atuar além de escrever não foi do roteirista
e, sim, do diretor Marcos Vaisntock.
- Ele teve uma ideia muito engraçada, mas que acabou não conseguindo chegar até onde
queria. Ele ia chamar atores que fossem parentes, porque achava que as pessoas já seriam pare-
cidas e, aí, teriam uma coisa de familiaridade, de intimidade entre eles. Então, é por isso que na
verdade a minha família, na época, estava toda lá. A minha ex-mulher fazia o papel da mãe, o
meu filho mais velho fazia o papel de um primo que chama Diego de los Angeles e, aí, depois,
o bebê que nasceu era meu filho, porque minha ex-mulher estava grávida na época.
Assim como o Rá-Tim-Bum, o programa também era patrocinado pelo SESI. Uma das
referências ao patrocinador era o fato de Lucas estudar na escola homônima e em várias opor-
tunidades o personagem aparecia vestido com o uniforme da instituição.
Leila Russo, que já produzia o Revistinha, acabou entrando no Mundo da Lua auxiliando
no que fosse necessário nas gravações.
- Neste trabalho, foi a primeira vez que eu trabalhei com uma continuísta porque a
gente não gravava as cenas em ordem cronológica e sim por cenários. Aquilo era de vital
importância já que parte do episódio era sonho e parte era realidade, o que exigia um trabalho
gigantesco da direção de arte.
rá-tim-bum e Mundo da Lua 44
rá-tim-bum e Mundo da Lua45
Leila conta ainda que considera o Mundo da Lua como um grande aprendizado, seu
primeiro trabalho envolvendo dramaturgia.
Lu Grecco, que acabara de entrar na equipe de cenografia da TV Cultura, participou
da reconstrução do cenário do programa e explica que a realização foi uma tarefa bastante
complicada.
- Como as externas eram realizadas numa casa real, nós tivemos que refazer toda a
casa em estúdio.
Assim como a cenógrafa tinha dificuldade na reprodução interna da casa real, a pro-
dução do programa tinha outro tipo de dificuldade. Leila explica melhor o que acontecia.
- As externas que a gente gravava de noite eram bem complicadas, a gente mobili-
zava muitas pessoas, inclusive uma equipe de limpeza pra não causar incômodo nenhum
aos moradores. Toda vez que o diretor iniciava a gravação de uma cena, uma vizinha
rá-tim-bum e Mundo da Lua 46
disparava o alarme da casa e não conseguíamos dar continuidade.
Nós acabamos conversando com todos os moradores da rua, pas-
samos um comunicado. Todos acabaram aceitando, inclusive essa
vizinha!
No decorrer dos 52 episódios, o programa teve participações
especiais de atores bastante conceituados, como Edson Celulari,
Laura Cardoso, Ana Lúcia Torre, Lucinha Lins, Denise Fraga e até
do então jovem ator Caio Blat, de 11 anos, que fazia parte do “Big
Bad Boys’, a banda juvenil da qual a irmã de Lucas era fã. O grupo
possuía apenas um único refrão: “Somos os Big Bad Boys/Todas as
minas gostam de nós”, nítida referência às boy bands, que começa-
vam a fazer sucesso na década de 1990.
Logo depois, o Mundo da Lua ganhou uma spin-off (peque-
na continuação) com o nome “Lucas e Juquinha: perigo, perigo,
perigo!” interpretado por Luciano Amaral e Guilherme Fonseca.
Os programas institucionais tinham duração de aproximadamente
cinco minutos e eram veiculados durante a programação, mostran-
do os perigos existentes em uma casa que há crianças. As grava-
ções ocorreram no mesmo cenário do Mundo da Lua. O enredo de
cada episódio era a solução que Lucas, irmão mais velho, arruma-
va para os problemas que Juquinha, irmão mais novo, causava na
casa. O projeto foi a primeira parceria de Flávio de Souza e Cao
Hamburger.
- Esse programa deu muito certo, a gente se deu super bem.
Nossa parceria funcionava muito bem, eu escrevia e ele gostava.
Era muito bom! Nós éramos amigos além de trabalharmos juntos.
Uma parceria que iria render grandes frutos como o que ve-
remos agora: Castelo Rá-Tim-Bum! Uma série de depoimentos a
seguir irão recontar vivências próprias dos bastidores do programa.
Preparados para mais uma viagem no tempo? ■
Depoimento - Flávio de Souza47
Depoimento - Flávio de Souza 48
“Revistinha, Curumim, Rá-Tim-Bum, Mundo da Lua e Castelo Rá-Tim-Bum. To-
dos esses programas infantis têm algo em comum: a participação do roteirista e
ator Flávio de Souza. Além de escrever e criar, foi ele que (mesmo não parecendo em
nada com seu irmão em cena) deu vida a Tíbio. No Castelo, porém, sua atuação como ator
foi menor, pois Flávio estava envolvido mesmo com os roteiros e a direção.
Vimos na exposição do Castelo que, na verdade, ele iria ser o Rá Tim Bum II. Como
surgiu a ideia de fazer um novo programa?
Então, essa ideia foi da direção da TV Cultura, eu não sei exatamente quem, mas
como disse, foi um programa muito experimental, muitas coisas não funcionaram. Todo
mundo concordava com quase todas as coisas que não deram certo. Foi meio fácil, assim,
decidir quais seriam as coisas que iam ser tiradas porque a ideia era tirar as coisas que
não tinham dado muito certo e colocar outras no lugar. Então por isso que ia ser o Rá-Tim
-Bum II. O Marcelo Tas e o Paulo Moreli não puderam participar das reuniões de criação
e quem ia participar era o Fernando Meireles, que ia continuar sendo o diretor geral, eu, o
Flávio Del Carlo, que ia continuar coordenando a parte de criação e o Fernando chamou
o Cao Hamburger porque, os caras precisam participar desde o roteiro até a edição. Então
ele passou muito tempo sem fazer coisas da produtora dele, porque ele já tinha uma pro-
dutora, eu não sei se na época já chamava O2, mas eu acho que sim, ele não podia fazer
a direção geral, ia ficar só coordenando. E aí eu não sei por que o Flavio Del Carlo não
“A gente começou a inventar o
Castelo Rá-Tim-Bum a partir de uma
frase: Castelo do Doutor Victor”
Depoimento - Flávio de Souza49
continuou e as outras pessoas também não puderam.
Então, eu e o Cao Hamburger inventamos as coisas
que iam entrar no lugar. Na primeira a gente ficou
só inventando coisas que eram pra entrar no lugar e
acabaram chegando ao Castelo como, por exemplo,
o Nino. Porque no Rá-Tim-Bum tinha, na verdade
tem ainda, um personagem que se chama Nina, uma
menina feita por uma atriz adulta. E aí como ela fala-
va coisas de menina, eu pensei que seria legal ter um
Nino, pra falar coisas de menino. Inclusive, a atriz
que fazia o papel é a Iara Jamra, minha amiga... pe-
ças juntos. Esse quadro eu tinha feito especialmen-
te para ela, porque tinha feito uma peça chamada
‘Parentes entre parênteses’, onde ela desempenhava
o papel de uma menina de nove ou dez anos e fez
muito bem, foi uma coisa que deu muito certo. Era
muito convincente, parecia que ela era uma menina
mesmo. E eu acho que é um dos quadros que deram
super certo no programa, inclusive por causa dela.
Mas aí ficou muita coisa especulando, como que ia
ser o Ra-Tim-Bum II, porque as pessoas que fizeram
de atores tinham vontade de participar dessa nova
fase também, e aí não sei como a Iara soube que não
ia mais ter a Nina porque ia ter o Nino, e aí ela ficou
com muita raiva de mim. Daí teve uma segunda fase
que a gente inventou tanta coisa nova pra entrar que
a direção decidiu que era melhor criar um progra-
ma novo, então eles meio que encomendaram um
programa novo. E a gente acabou inventando nessa
segunda fase as crianças que são o Pedro, a Biba e o
Depoimento - Flávio de Souza 50
Zeca e mais outras coisas que acabaram entrando no Castelo. Era um programa muito
maluco e tinha milhares de cenas, milhares de cenários, mas era um programa que não
ia ser feito por custar, sei lá, um trilhão de dólares, uma coisa muito doida. E aí a gente
apresentou esse projeto e eles falaram ‘gente, vocês trabalharam muito, parabéns, não
sei o quê, mas veja bem, não dá pra fazer esse programa que vocês querem fazer. Vamos
fazer uma coisa mais simples’. Então, como no Rá-Tim-Bum tinha aquelas histórias do
“Senta que lá vem história”, a gente inventou vários lugares pra acontecer essas histó-
rias no Rá-Tim-Bum II e um dos itens que tinham lá era o Castelo do Doutor Victor, que
tem a ver com o Doutor Victor Frankstein do filme, uma das obsessões do Cao, tanto
que ele tinha feito pouco tempo antes um desenho animado de animação com massinha.
Daí, a partir disso que a gente começou a inventar o Castelo Rá-Tim-Bum. A partir de
uma frase que tinha lá: “Castelo do Doutor Victor”.
Quando foi decidido que seria um novo programa os patrocinadores colocaram mais
dinheiro?
O dinheiro foi o mesmo.
Quanto tempo durou a criação?
Eu não sei dizer exatamente. Foram vários meses, nove meses ou dez meses, não sei, sei
que eu passei me encontrando com o Cao semanalmente, três, quatro vezes por semana,
porque teve duas fases, na verdade três. Então por isso demorou tanto. E também porque é
um programa gigantesco. Se você for pensar a quantidade de coisa que tem dentro, é uma
loucura, porque tem o castelo, mas tem todos aqueles quadros. E na verdade, as histórias
do Castelo servem pra ir praqueles quadros.
Você criou os personagens Tíbio e Perônio?
Sim! Na verdade eu e o Cao, mas principalmente eu. Eu tinha essa ideia que foi uma das
ideias que não foram aceitas no Rá-Tim-Bum, fazer dois personagens que descobriam
coisas aparentemente obvias, mas que na verdade não são. Eram personagens meio esqui-
sitas que moravam em um lugar meio esquisito e eles acidentalmente descobriam pra quê
Depoimento - Flávio de Souza51
que serve, por exemplo, o pires, pra que serve o pente, pra que servem as coisas. Então
quando teve o Castelo eu vim, de novo, com a minha ideia e aí eles acabaram virando
cientistas, talvez porque o pai do Cao é cientista, não sei, provavelmente foi ideia dele.
Ou então não, tinha as coisas do currículo, das coisas que a gente tinha que trabalhar e aí
falaram ‘bom, esses são dois personagens bons pra falarem de ciência’. E o nome eu tinha
inventado antes, e na verdade era Tíbia e o Perônio, que são os nomes do osso mesmo,
que se chama Tíbia, e não Tíbio. Mas eu gostava desse som e como o osso tinha a ver com
coisas de ciência eu propus de chamar Tíbia e Perônio.
No Mundo da Lua a ideia de interpretar foi do diretor. Desta vez, a ideia de inter-
pretar foi sua?
Também não! Foi o Cao que teve a ideia. Ele cismou, teve coisas que eu fiquei sabendo
só agora por causa da exposição, acabei conversando bastante o assunto com o Henrique
Stroeter, que é o Perônio. A gente é amigo, trabalhamos muito tempo juntos, sei lá, muitas
vezes, mas é umas das coisas que ele me contou e eu não sabia exatamente como tinha
sido. Ele foi fazer o teste pro Nino e aí o Cao falou que ele tinha ido muito bem e tal, mas
que tava querendo que ele fizesse uma dupla de cientistas gêmeos comigo, porque vendo
o teste ele o achou muito parecido comigo. E agente, se você for ver, não é muito pareci-
do, mas de uma certa maneira ele viu um jeito, sei lá, meio infantil de ser, talvez, não sei,
de interpretar, que realmente combinou muito eu e ele. Mas a ideia foi do Cao!
Depois da decisão de interpretar, como foi a criação dos trejeitos dos personagens?
A gente não criou muito... Aconteceu o seguinte: foi o segundo quadro a ser gravado,
porque eu também achava que era o primeiro, mas depois o Henrique me falou que não,
o primeiro a ser gravado foi o Mau. Depois foi o Tíbio e o Perônio e tem uma razão!
Eu ia fazer uma peça, esse ano foi o ano mais louco da minha vida porque eu escrevi
um seriado no SBT que depois acabou virando uma novela e acabou sendo suspenso e
eu estava participando do Castelo e eu ia trabalhar de ator em uma peça dirigida pela
Marília Pêra, inclusive eu fazia um dos papéis principais. Então ficou combinado que
a gente ia fazer rápido, gravamos tudo em 15 dias, duas semanas, né? E é por isso que
Depoimento - Flávio de Souza 52
eles tem barba também, porque eu tava deixando
a barba, aí coitado do Henrique,foi obrigado a pôr
aquela barba postiça e a minha também era, porque
eu tava só com um pedaço da barba, tava deixan-
do só bigode e cavanhaque e minha barba é rala
e tava no começo ainda, não tava grande. A gente
teve que fazer tudo muito rápido: teve uma reunião
com o Cao e a gente experimentou a roupa, foi só
isso que foi combinado. Aí a gente chegou um dia
lá, numa segunda-feira, não sei, mas deve ter sido
em uma segunda-feira, super cedo, naquela época
eu trabalhava de noite, escrevia de noite e então eu
tava sempre dormindo, pra mim o normal era dor-
mir de manhã. E eu tive que acordar umas seis, seis
e meia da manhã, então eu cheguei lá praticamente
dormido e aquela maquiagem demorava quase uma
hora pra ser feita, acho que era mais de uma hora
até, no começo foi mais de uma hora, depois acaba-
ram pegando prática. Aí a gente teve que começar a
gravar, não teve assim tempo pra conversar e nem
dava porque o Henrique, acho que ainda tava um
pouco mais acordado, até poderia conversar algu-
ma coisa, mas eu tava sem condições. A gente tinha
que decorar um texto, muito texto, foram feitos vá-
rios roteiros por dia, a gente não teve tempo de ficar
combinando, ensaiando e vendo como eles iam ser.
A única coisa que a gente combinou foi ‘olá, olá’.
Mas tem um segredo: o Henrique foi bailarino, en-
tão ele tinha uma coisa de mexer com o corpo, na
verdade ele ainda tem, muito forte, muito mais for-
Depoimento - Flávio de Souza53
te que eu, claro. Eu até fiz peça musical, fiz vários tipos
de dança, sapateado, mas eu não cheguei a ser bailarino.
Como foi sua reação depois que vocês se viram tão
parecidos?
A primeira veza gente se viu e falou ‘nossa, a gente tá re-
almente parecido’, mas não ficamos muito impressiona-
dos porque inclusive a gente tava com muito sono ainda,
mas o cabelo era diferente e tinha sei lá o corpo também,
ele era mais magro que eu. Aí a gente pôs a roupa e nem
se viu no espelho, já foi indo empurrado pro estúdio por-
que eles estavam com um cronograma gigantesco pra ser
feito tudo em duas semanas. Então a gente não chegou
a ficar se olhando no espelho. Mas aí teve um momento
nesse primeiro dia que a gente estava esperando a hora
de entrar, tinha um monitor no chão pra gente ver lá uma
ordem do câmera e ele fazia um gesto pra saber que ia
entrar e aí a gente ficou se olhando assim no monitor, e
um dos dois, não lembro qual, falou: ‘Pera aí, qual que
eu sou ali?’Então um dos dois mexeu o braço pra saber.
Realmente o Cao tinha razão e a caracterização que o
Carlos Gardin fez também ajudou muito, com certeza.
Alguém chegou a te reconhecer na rua?
Então, isso é que é engraçado, porque muitos adultos
reconhecem a gente, mas as crianças, não, principal-
mente criança pequena. Muitas vezes a gente encontra
o pai que assistiu e eles falam ‘olha, é o Tíbio do Tíbio
e o Perônio’, e a criança fica olhando pra gente com
cara assim de ‘acho que meu pai enlouqueceu, não sei,
Depoimento - Flávio de Souza 54
como assim?’Aconteceu bastante da gente ser reconhecido por causa da voz e também
do jeito, não ficou completamente diferente, mas teve uma coisa que aconteceu comigo
e com ele separados, aconteceu igual, assim: eu fui tomar um suco em um lugar e o
carinha que tava no caixa, eu fiquei um tempo lá escolhendo o suco, ele ficou me olhan-
do meio assim e deu tempo dele me reconhecer. Aí, na hora que eu dei o dinheiro, ele
pegou e começou a chorar, aí eu falei: ‘você tá com algum problema?’; depois dele se
acalmar um pouco, falou que a hora que ele acordou naquele dia ele não podia imaginar
que ia encontrar com o Tíbio ao vivo na frente dele. Com o Henrique foi até mais engra-
çado: o motorista do taxi falou que a filha dele tinha aprendido uma série de coisas por
causa do Tíbio e Perônio e por causa disso ela tinha ido embora; ele começou a chorar
e o Henrique chorou também.
Existia uma equipe pedagógica nos infantis, certo? Como era a relação com eles?
A relação com a equipe pedagógica era a pior possível no Rá-Tim-Bum. Quando che-
gou o Castelo Rá-Tim-Bum, na verdade essa equipe foi substituída. Mas no Catavento
foi muito difícil, inclusive foi o primeiro programa que eu escrevi e era o programa
feito a partir de um currículo oficial da escola da rede pública e a chefa, vamos dizer, da
equipe pedagógica, Fazia questão de que cada item daquele currículo fosse desenvol-
vido. Eles não chegavam a mexer nos roteiros, mas ela cortava muito, principalmente
no Rá-Tim-Bum, no Catavento não tinha o que fazer, então a gente fez um monte de
reuniões com elas e era ela e mais duas pessoas, e enfim, eu fiz bastante coisa assim
que eu não tinha vontade de fazer e que eu achava, inclusive, que era muito difícil. Por
exemplo: você mostrar direita e esquerda na televisão é louco porque é como se fosse
um espelho, é tudo ao contrário, né? Tinham algumas coisas que não funcionavam na
televisão porque eram pra ser feitas em uma classe de aula com professora, professor.
Precisava que a pessoa lesse ao vivo e com outras crianças, mas de qualquer maneira
elas insistiram e insistiram e na verdade, de uma certa maneira, elas fizeram desafios.
Pra mim foi bom porque eu desenvolvi a imaginação com essa coisa de inventar por-
que, deixa eu falar uma outra coisa: a ideia, desde o Catavento, que acabou chegando no
Castelo, era fazer e mostrar coisas com conteúdo pedagógico de uma maneira divertida,
Depoimento - Flávio de Souza55
de uma maneira que as crianças não percebessem que elas estavam aprendendo. A ideia
era conhecimento através do entretenimento, mas a Dona Célia Marques (só falei agora
porque só agora eu lembrei o nome), achava que não precisava de entretenimento, só
a informação era importante e não precisava de mais nada. No Catavento tinha muito
pouco dinheiro, então não tinha como inventar muita coisa. No Rá-Tim-Bum, como
tinha o patrocínio da FIESP, então as ideias puderam ser mais loucas, mais completas,
mais complexas vamosdizer. E isso cria um problema porque ela achava que era desne-
cessário e era exatamente isso que ela falava. Os roteiros iam pra ela e quando voltavam
ela tinha riscado tudo que não fosse exatamente só informação. Então o esforço que a
gente fazia pra desenvolver coisas como se fosse um invólucro do conteúdo deles, ela
queria que jogasse no lixo, riscava. E o mais louco é que depois que o programa es-
treou, que fez o sucesso absurdo assim como nunca tinha feito na TV Cultura, aí depois
me falaram que ela passou a ir a muitas palestras no Brasil, ela viajou o Brasil inteiro e
aí alguém foi em um desses lugares e viu a palestra dela e a palestra começava assim:
“Nós, quando fizemos o programa Rá-Tim-Bum, pensamos que o conteúdo não podia
vir sozinho, tinha que ter coisas em volta”, exatamente o que ela era contra.
Foi uma surpresa o sucesso e o alto índice de audiência?
Olha, foi e não foi, ao mesmo tempo. Por causa do sucesso do Rá-Tim-Bum e do Mun-
do da Lua, não foi uma surpresa tão grande porque sei lá, não que a gente estivesse
acostumado a fazer sucesso, porque a gente já tinha feito outras coisas que não tinham
feito sucesso, mas não foi tão espantoso; agora, foi espantoso por causa do número,
né? Realmente a audiência foi muito grande de manhã, de tarde e de noite. Inclusive
de noite, horário nobre, passava no mesmo horário de uma das novelas da Globo, não
sei exatamente qual delas.
Naquela época você imaginou que dali vinte anos o programa teria feito tantos fãs?
Não, mas isso é uma coisa que se alguém falar que imaginou é mentira, porque re-
almente a gente não imaginou, inclusive, pra mim, ia ser mais um programa de tele-
visão. É claro que era um programa especial porque era enorme e tinha patrocínio,
Depoimento - Flávio de Souza 56
mas não imaginei que fosse ser visto vinte anos depois e
tivesse tanta gente gostando tanto. A gente escuta muito
‘você fez parte da minha infância, muito obrigado, você
tornou a minha infância melhor’. A gente não imaginava.
Por que o Castelo teve mais visibilidade que os outros
infantis?
Os personagens principais que aparecem todo dia apare-
cem bastante, metade de cada episódio acontece no Cas-
telo. E aí tem o Mickey no castelo que é o Nino, tem as
crianças e tem vários personagens que se repetem, né? Eles
aparecem mais por semana, vamos dizer assim. E tem um
acabamento que é maior que o dos outros programas. En-
tão eu acho assim, teve gente talentosa e com muita experi-
ência. E é uma coisa também que não tem explicação, que
nem teatro. Você não sabe porque uma peça faz um monte
de sucesso e outra não, entendeu? Às vezes tem peça que
você acha boa, mas que não faz sucesso, e uma que faz
sucesso e você não acha tão boa.
Por que, apesar do sucesso, o programa não teve conti-
nuidade?
Isso aí é uma coisa que vocês têm que perguntar pra alguém
da presidência da TV Cultura. O que aconteceu, eu acho que
aconteceu várias vezes na TV Cultura, mudou o presidente e
aí, eu acho, não posso afirmar porque eu não sei exatamente,
ninguém me falou, mas eu desconfio que era porque o novo
presidente queria ter um novo programa e não continuar
com o programa do mandato anterior. Porque tem uma coisa
assim de política. É isso.
Depoimento - Flávio de Souza57
Você sabe se foi muito cara a produção do Castelo?
Foi caríssima! Porque além de ter o patrocínio, teve as coisas da TV Cultura, os estúdios,
até pessoas já contratadas da cenografia, eu já tava lá antes de ser contratado, a ilumi-
nação, as câmeras. Eu sei que muitas coisas foram compradas, principalmente pro Rá-
Tim-Bum, mas no Castelo acho que eles ainda compraram mais, não sei nem se dá pra
calcular tudo isso exatamente, quanto que custou o Castelo contando com tudo, com ilhas
de edição, mas foi muito caro. Eu acho até que é um dos motivos de não ser feito de novo.
Quando foi que você se deu conta da proporção do sucesso?
Ah, eu não sei exatamente quando foi. Na verdade eu sei quando foi, não sei exata-
Depoimento - Flávio de Souza 58
mente que dia e que mês e nem de que ano, mas quando teve o lançamento dos livros
do Castelo editado pela Companhia das Letrinhas... Era uma coleção, na verdade
quando lançou só tinham três, e aí eles fizeram um lançamento no Museu da Casa
Brasileira, acharam que iriam quinhentas pessoas, mil pessoas, e aí não sabe quan-
tas pessoas foram porque ninguém conseguiu contar, mas com certeza umas dez mil
pessoas, talvez até mais, porque teve gente que falou que viu carros passando na rua,
vendo a fila e indo embora, entendeu? Desistindo. Foi meio parecido com que o que
está acontecendo agora na exposição, filas que davam a volta no quarteirão. Eu fiquei
com a mão doendo de tanto que eu dei autógrafo, porque eu fiz questão de ficar até o
fim, mas foi uma loucura porque Cassio Scapinestava lá vestido de Nino. Foi a pri-
meira vez que o Nino apareceu ao vivo em algum lugar e realmente foi meio absurdo.
Uma hora acharam que ia acontecer uma tragédia porque tinha uma porta pra entrar e
outra pra sair e tinha a fila que dava volta no quarteirão. Teve gente que não entendeu
como que entrava, como era a história da fila e começaram a tentar entrar pela saída.
Então as pessoas que queriam sair não conseguiam sair, virou um bolo, uma confu-
são. Eu acho que tinha bombeiro própria Casa Brasileira e eles tiveram que interferir,
fazer alguma coisa, organizar a confusão porque tava virando uma coisa complicada
e com crianças. Realmente foi nesse dia.
Você participou da adaptação cinematográfica? E da peça?
A adaptação é uma história meio complicada. Eu fiz as três primeiras versões do rotei-
ro, depois eu saí. E eu escrevi todas as peças do Castelo, inclusive, principalmente a
primeira, eu fui um dos produtores. ■
Depoimento - Bia Rosenberg59
Depoimento - Bia Rosenberg 60
Bia Rosenberg foi chefe de departamento infantil da TV Cultura na época em que pro-
gramas infantis eram o grande investimento da emissora. X-Tudo, Mundo da Lua,
Perigo, Perigo, Perigo, e claro, Castelo Rá-Tim-Bum são apenas alguns dos programas
nos quais estava envolvida. Nosso papo aconteceu no mesmo local onde há vinte anos, em
meio a luzes, paredes falsas, e muito trabalho, o Castelo foi construído.
Como você entrou no projeto do Castelo?
Eu estava na chefia do departamento infantil e na TV Cultura desde o último ano do curso
de Rádio e TV. Fiz programas de música, ensino, entrevistas, muitas coisas. Eu comecei a
fazer programas infantis no meio da década de 1980, em 88 fiz o especial “Banho deAven-
tura”, que era a história do Júlio, do Cocoricó. Voltando ao Castelo, quando ele começou,
ainda não tinha um nome, apenas era um programa bem legal para crianças. Como eu
estava no departamento infantil não tinha como eu não participar, né?
Você participou então da criação do programa, dando palpites?
Eu participei de algumas das primeiras reuniões, porque foi um grupo que se reuniu, Flávio
de Souza, Cao Hambúrguer, Fernando Meirelles, Flávio Del Carlo e eu. Nós nos reunimos
e conversamos, acabei saindo, tinha outros projetos. Eles fizeram a criação do programa.
Na verdade o projeto original era gigante, ele tinha muito mais histórias e só uma delas
vingou, que foi o Castelo.
“Quando vimos o primeiro, percebemos
que tinha ficado bacana.”
Depoimento - Bia Rosenberg61
O Castelo era para ser um quadro, apenas?
Não era exatamente um quadro. As três crianças andavam por diferentes lugares e por di-
ferentes programas, iam para a escola, pro cinema e pro Castelo. Como o projeto era muito
grande e inviável, eles tinham que escolher apenas um local e foi escolhido o Castelo.
Por ser um programa infantil, ele passava por uma orientação pedagógica, cer-
to? Como era essa relação?
Aqui na Cultura sempre houve um grupo de professores, com psicólogos, que faziam
a orientação pedagógica de todos os projetos. Eles liam tudo que fosse para crian-
ça e programas de educação, eles participavam, comentavam, iam desde corrigir o
português até dizer que tal cena estava inadequada para essa faixa etária. Isso já era
comum na TV Cultura, mas alguns projetos precisavam de orientação especializada.
O Castelo também trouxe uma orientação especializada, com a Zélia Cavalcanti, que
trouxe para nós a questão do construtivismo, e a ideia de que você poderia explicar
qualquer coisa para as crianças, desde que essas coisas estivessem contextualizadas, e
não só ‘vai escovar os dentes’, mas que você pudesse trazer a informação atrelada ao
conjunto de informações emocionais, práticas e que fizessem sentido. Aí houve uma
opção do Castelo não seguir a linha curricular, como o Rá-Tim-Bum seguia. O Caste-
lo optou por trazer conteúdos que fossem complementares à escola, como história da
arte, ciências, tinha formas geométricas também, música, diversidade. Essas coisas
foram trazidas para compor o cardápio do Castelo.
A orientação pedagógica no Rá-Tim-Bum e no Mundo da Lua foi bem complicada,
no Castelo como foi?
Foi bem tranquilo. No Mundo da Lua e no Ra-Tim-Bum, a consultoria foi realizada
com profissionais aqui dentro da Cultura. Deixa eu dar um exemplo: no especial Banho
de Aventura, que eu estava envolvida, e foi transmitido no Senta que lá vem História, o
Júlio tem uma cena em que ele é amarrado por uma bruxa em uma árvore, e a consulto-
ria vetou que personagens fossem amarrados, mas vetaram mesmo sendo bonecos. No
Castelo foi harmonioso, e no decorrer dos anos, eu aprendi a lidar com a consultoria
Depoimento - Bia Rosenberg 62
pedagógica, acho inclusive que é bastante importante esse trabalho, antigamente eles
davam a palavra final, o que hoje não acontece mais.
Eles tinham poder de veto?
Sim, se eles achavam que tinham algo inadequado. Mas no Castelo não tinha nada inade-
quado. Todos já estavam acostumados com a orientação pedagógica, eles se formaram das
outras produções, como se todos fossem um família.
Você acompanhava a escolha de elenco? Dava sua opinião?
Dava palpite sim. Era uma coisa consensual. Nós chegamos num consenso de grupo. As
crianças, principalmente, nós precisávamos formar um trio de crianças. Na exposição do
Depoimento - Bia Rosenberg63
Castelo, inclusive, tem umas imagens dos testes
das crianças.
Quanto tempo durou o processo todo?
Eu fiquei do começou ao fim. Eu estava na chefia
em 1990, fizemos o Mundo da Lua, X-Tudo, Pe-
rigo, Perigo, Perigo. Eu não me lembro de quanto
tempo durou. Única coisa que me lembro: o pro-
grama estreou em 1994, mas nós ainda estávamos
gravando quando ele foi ao ar. Talvez começamos
em 1992, não lembro ao certo.
Teve alguma ocasião na qual você percebeu o
sucesso?
Quando o programa marcou 10 pontos de audi-
ência. A média de audiência da TV Cultura é três.
Mas para ser sincera, nós estávamos tão ocupados
que não dava para parar. Foi um trabalho que não
teve pré-teste, até a primeira edição do primeiro
programa que ficou pronto, o episódio 16, já que
nós gravamos todos os quadros separados, e estes
foram gravados bem antes estúdio principal ficar
pronto. Todos foram gravando, e ninguém tinha
visto a edição final, isso quer dizer, a história mis-
turada com os quadros. Eu estava muito insegura
se ia dar certo. O primeiro Rá-Tim-Bum era mais
ou menos assim, quadro, quadro, quadro, quadro e
uma história no meio, já o Castelo era o contrario,
é uma história com quadros no meio. Ele tinha uma
estrutura diferente e não tínhamos experimentado
Depoimento - Bia Rosenberg 64
para ver como ia ser. Quando vimos o primeiro, percebemos que tinha ficado bacana. O
castelo vinha de uma escola de infantis da TV Cultura, de uma escola que vinha do Ca-
tavento, do Curumim, tinha o Bambalalão, esses programas foram fazendo uma escola, e
esta foi se desenvolvendo. Não dependia apenas de uma boa ideia, ao contrário, uma boa
ideia é fácil, precisava fazer e a TV Cultura estava disposta a fazer, toda a estrutura de
cenário, de figurino, de efeitos especiais, de boneco, de atores, de música, de produção...
Toda a equipe estava afinada. Então foi trazer um projeto bonito e legal para uma estrutura
que estava pronta. Às vezes eu achava que se um diretor ruim viesse o programa ia ficar
bom, mas isso não é verdade, é apenas um exemplo para dizer como a estrutura era boa,
se um diretor ruim viesse o programa ia ficar ruim, mesmo com a estrutura. Mas eu acho
que tínhamos muitos talentos, e a estrutura funcionava muito bem, muito criativa.
Foi muito cara a produção do Castelo?
Eu sei dizer que hoje não faríamos. Quando digo que não faríamos, é que ninguém faria.
Porque foi uma produção muito cara, não sei grana, não sei nada. Era um ritmo TV Cultu-
ra, todo mundo ganhava pouco, ninguém ficou rico com o Castelo. A maioria das despesas
eram absorvidas, por que não eram custos direitos, os funcionários eram todos da Cultura,
era um projeto muito caro.
É verdade que houve uma inspiração vindo de você para ser a cobra Celeste?
Vocês que me dizem, é verdade? Noooossa! Mas é verdade sim. O Álvaro é um querido,
e eu falo desse jeito, eu sempre falei assim.
Qual o diferencial do Castelo? Por que ele se sobressaiu entre os outros programas
infantis?
O Castelo tem uma estrutura dramática muito forte. O Rá-Tim-Bum tinha os quadros, era
muito divertido, mas não tinha uma história, apesar de ter o senta que lá vem história, mas
não tinha uma história forte. Já com o Castelo, tinha uma história aonde os personagens
se repetem, tinha aventura, digamos que é o principio das sitcons americanas, só que com
um cenário muito mais amplo do que eram as sitcons. O Castelo contava muito bem uma
Depoimento - Bia Rosenberg65
história, o conjunto dos personagens foi muito legal, deu tudo super certo, os convidados eram muito
interessantes, os bonecos eram divertidos, os roteiros eram muito bons. O motivo do sucesso: era uma
produção gigantesca, o Mundo da Lua também fez muito sucesso, mas a produção era fichinha. O Cas-
telo também teve seus altos e baixos, nem todos os quadros eram muito bons, tem alguns que não gosto
muito. Mas ele tinha essa magia, um encantamento, o Tio Victor e Morgana que nem sempre apareciam
muito, mas sempre estavam presentes nas histórias, e acabam compondo um universo mágico em que
crianças saem de seus cotidianos que é a cidade de São Paulo e entram no Castelo, afinal quem não quer?
É um sonho. São esses aspectos todos que contribuíram para o sucesso dele.
Era bombeiro, tinha que apagar incêndio...
Mais ou menos isso. Tivemos que cancelar gravações no zoológico, e passou para outro dia, teve cenas que
foram regravadas, que ninguém soube, era uma coisa interna. Mas teve muita coisa, um projeto desse tamanho
é muito difícil não ter problemas. Num modo geral todo mundo ganhava pouco e gravavam para caramba.
Depoimento - Bia Rosenberg 66
Teve o caso também que o Sergio Mamber-
ti ficava embaixo do bolo e tinham velas em
cima e pegou fogo, mas temos equipe contra-
fogo. As crianças vinham da escola, não tinha
ar condicionado.Acho que foi a maior tragédia
não ter ar condicionado. Tinha que gravar cena
de inverno, e era muito quente, e os figurinos
eram quentes, né? As luzes também esquenta-
vam bastante o estúdio.
Você lembra mais ou menos o número de
cartas de fãs que mandavam para a Cul-
tura?
Não tenho a mínima ideia. Provavelmente por
causa do dia das crianças, o que eu me lembro
é que pedimos mandarem desenhos. Não lem-
bro se foi o Mundo da Lua, mas enfim. Veio
tanto desenho que meses depois ainda colocá-
vamos como vinheta, e os desenhos não aca-
bavam nunca. Não sei quantas cartas vieram.
É verdade essa história de que algumas
crianças mandaram moedas porque des-
cobriram que o programa não teria con-
tinuidade?
É verdade sim. Não sei para quem foram
as cartas, mas isso é verdade. Nunca vi es-
sas moedas. Também tinha uma história do
acréscimo da conta de luz, não me lembro
de detalhes, são nevoas. ■
Tchau, não! Até amanhã205
Tchau, não! Até amanhã
Hoje, de volta a 2014 e vinte anos depois da exibição do primeiro episódio do Castelo Rá-Tim-Bum,
a TV Cultura ainda colhe os frutos.
Já no final de 1994, o Castelo foi premiado pela APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes)
como melhor programa infantil daquele ano. No ano seguinte, participou do Festival de Nova York e re-
cebeu a medalha de prata na categoria programação infantil. Com isso, também ganhou reconhecimento
internacional ao ser exibido em vários países – não existem informações precisas sobre todas as nações
que puderam assistir as aventuras de Nino. De acordo com reportagem do jornal Folha de São Paulo de
22 de fevereiro de 1995, o programa foi exportado para Cuba e a República Dominicana.
Anos depois, o Castelo acabou migrando para os palcos, com a peça “Onde está o Nino?”, que
ficou oito meses em cartaz no TUCA (Teatro da Universidade Católica de São Paulo), chegando a 190
mil espectadores, com direito a turnê por todo o país. O texto ficou por conta do co-criador Flávio de
Souza, direção de Mira Haar. Cássio Scapin, Freddy Allan, Cinthia Rachel e Luciano Amaral viveram,
respectivamente, Nino, Zequinha, Biba e Pedro, os mesmos intérpretes que fizeram o programa de tevê.
Anos mais tarde, Cao Hamburger, diretor e um dos criadores do programa, foi responsável por
trazer a mágica história do castelo de Dr. Victor para os cinemas, em primeiro de janeiro de 2000. Com
algumas alterações na história original, Marieta Severo foi escolhida para ser a principal antagonista,
enquanto Rosi Campos e Sergio Mamberti ficaram com os papeis originais.
Vários produtos foram licenciados com a marca do Castelo Rá-Tim-Bum, como coleções de livros
que venderam cerca de 55 mil exemplares, além VHS, CDs, jogos, calçados, brinquedos e materiais es-
colares. O programa rendeu à TV Cultura muito mais do que recordes de audiência.
Há quem diga que a emissora faturou 5 milhões de reais com licenciamentos de produtos desde 1995,
superando o valor inicial pago pela TV Cultura e pelo FIESP. Sucesso incontestável duas décadas depois,
Tchau, não! Até amanhã 206
a exposição sobre o programa realizada no Museu da Imagem e do Som (MIS) desde
julho de 2014, com sucessivos adiamentos para antes de encerrar, provou a vitalidade da
produção infanto-juvenil.
Para tentar recuperar os bastidores desse sucesso, realizamos 20 entrevistas com
profissionais envolvidos com o programa, durante três meses. Apenas 15 foram re-
produzidas na íntegra, as demais ajudam a subsidiar as duas reportagens iniciais deste
livro. Para nós foi um prazer poder descobrir detalhes da produção, notar o quanto o
programa que vimos quando crianças tinha preocupações minuciosas, tipo a contrata-
ção de profissionais para evitar erros gramaticais.
A intenção foi sempre realizar um bate-papo com os entrevistados. No entanto,
nunca deixamos de lado nossa condição de fãs, tanto que pedimos para tirar fotos com
todos eles.
A viagem que vocês puderam acompanhar, junto conosco, percorreu os anos mais
produtivos da TV Cultura. Uma das conclusões que tivemos deste trabalho foi que a
magia e a diversão do Castelo Rá-Tim-Bum sempre estarão disponíveis para quem for
visitar o Nino, mesmo ele tendo hoje 320 anos.
Esperamos que você, leitor, possa ter tido as mesmas emoções que nós, autores,
tivemos. Mesmo aqui, nesta reta final, é importante dizer que o embarque estará livre
pra quem quiser se aventurar novamente, inclusive, quem sabe, na continuação deste
projeto.
A viagem ainda não acabou. Por enquanto, vai o inevitável “Bum Bum Bum,
Castelo Rá-Tim-Bum” bem forte pra você.
Miolo do livro "20 Anos Depois, Novo Boom do Catelo Rá-Tim-Bum!"
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Miolo do livro "20 Anos Depois, Novo Boom do Catelo Rá-Tim-Bum!"

  • 1.
  • 2. Castelo Rá-Tim-Bum: Bastidores – O Livro Catherine Mello & Diogo Salvador Orientação: Marcos Zibordi Revisão: Diego Henrique de Carvalho Diagramação: Marina Knöbl Evangelista Imagens cedidas por: Carlos Alberto Gardin, Lu Grecco, Catherine Mello e Willian Alves Capa: Cristiane Picelli
  • 3.
  • 4. ÍNDICE Agradecimentos Pessoais 5 Agradecimentos Especiais 8 Prefácio 10 1. “20 anos depois, novo boom do Castelo Rá-Tim-Bum” 12 2. “Rá-Tim-Bum e Mundo da Lua” 34 3. Depoimento - Flávio de Souza 48 4. Depoimento - Bia Rosenberg 60 5. Depoimento - Leila Russo 68 6. Depoimento - Carlos Albeto Gardin 78 7. Depoimento - Lu Grecco 94 8. Depoimento - Eliana Fonseca 110 9. Depoimento - Claúdia Dalla Verde 118 10. Depoimento - Sérgio Mamberti 130 11. Depoimento - Angela Dip 144 12. Depoimento - Alvaro Petersen 154 13. Depoimento - Patricia Gasppar 162 14. Depoimento - Fernando Gomes 172 15. Depoimento - Pascoal da Conceição 182 16. Depoimento - Eduardo Silva 190 17. Depoimento - Theo Werneck 200 18. Tchau, não! Até amanhã 205
  • 5. 5 Agradecimentos Pessoais Dentre tantas dúvidas que tive nos últimos quatro anos, uma delas era como concluir a faculdade. Poder realizar um trabalho com tamanho prazer e dedicação me faz uma for- manda completamente agradecida. Eu gostaria de agradecer a todas as fontes que nos ajudaram a produzir este trabalho, mas infelizmente são muitas e não conseguirei citá-las aqui nominal- mente. Entretanto, agradeço todas as entrevistas concedidas e por nos mostrarem o quão no caminho certo estávamos. Agradeço às inesquecíveis entrevistas, a confiança em nosso trabalho e agradeço principalmente àqueles que nos desejaram sorte. A maior parcela de confiança que tivemos foi graças a vocês. Agradeço à minha mãe, Silvia, por me apresentar, quando eu era criança, ao programa que hoje, em 2014, me proporcionou um trabalho que me fez realizada. Agradeço, ainda, por aquelas fitas cassetes compradas em uma coleção de um jornal. Agradeço às amigas e irmãs de vida, Priscila Siqueira, Tássia Lopes, Viviane Sousa e Gabriela Maza- rin pela amizade incondicional e pelo apoio desde sempre. Foram essenciais e serão sempre. Agradeço ao Diego pela paciência, apoio e revisão. Agradeço ao orientador Marcos Zibordi por nos aguentar todos os dias em que estávamos na faculdade. Agradeço à disponibilidade e à paciência. Não menos importante, agradeço com a maior gratidão à minha dupla neste traba- lho, Diogo, por comprar a ideia de mudar em cima da hora o tema que usaríamos para concluir a faculdade. Poder terminar quatro anos de curso falando sobre o Castelo Rá-Tim-Bum é de tamanho orgulho. Por último, agradeço a todos que se dispuseram a ler este livro. Nem oito se- mestres seriam o bastante pra compor meus agradecimentos da maneira bonita que eu gostaria. Acabei escrevendo, em forma de trabalho, o poema que eu sempre quis ler. Muito obrigada. Catherine Mello Agradecimentos Pessoais
  • 6. 6 Agradecimentos Pessoais Quando me vem à cabeça agradecer alguém, a minha família está em primeiro lugar. Em especial, meus pais, Regina e Carlos, que me ensinaram tudo o que eu sei na vida, com muito amor e carinho, além de serem de certa forma os responsá- veis por me levarem à peça do Castelo Rá-Tim-Bum, logo quando viemos para São Paulo. Agradeço à família Salvador, composta por minha avó Irene, meus tios, tias e primos, que sempre estão nos melhores e piores momentos da minha vida. É motivo de orgulho ser um Salvador. Agradeço à família Cavalcanti, que também é motivo de orgulho, e aos meus avós Margarida e Eugênio, os responsáveis por me apresentarem à paixão pelos livros. Agradeço ao Roberto Cochrane, tio que sempre esteve presente. À Yvone, que não é da família de sangue, mas me conhece desde quando eu nasci e também me ensinou muito do que sei. Agradeço também aos atores, roteiristas, pro- dutores e profissionais envolvidos com o Castelo Rá-Tim-Bum. Sem eles, não seria possível a realização deste livro. Agradeço ao professor Marcos Zibordi, que aceitou entrar nessa viagem. Sem a orientação dele, não conseguiríamos chegar aonde che- gamos. Por último e não menos importante, agradeço à Catherine, por ter sido uma grande companheira nessa maravilhosa viagem ao passado para descobrirmos mais sobre o programa que tanto gostávamos quando éramos crianças Diogo Salvador Agradecimentos Pessoais
  • 7. 7
  • 8. 8 Agradecimentos Especiais Cláudia Dalla Verde Thiago Salvador Gabriele Araújo Anna Carolina Chaves Flávio de Souza Diego Henrique de Carvalho Eduardo Silva Rodrigo Ferraz Do Amaral Schahin Carlos Alberto Gardin Gabriela Souza Ângela Dip Bruna Bertolucci Eliana Fonseca Fabio Campos Pascoal da Conceição Leonardo Pires Lu Grecco Bruno Peruchi Patrícia Gasppar Gabriela Mazarin Leila Russo Amanda e Rosaura Faleiros Bia Rosenberg Regina Aranha Siomara Schröder Patrícia Passareli Sérgio Mamberti Irene Salvador Fernando Gomes Alice Ferreira Álvaro Petersen Pedro Novaes Theo Werneck Cristina Lopez Silvio Galvão Daiane Bonfim José Armando Vanucci Márcia, Sérgio e Henrique Salvador Zélia Cavalcanti Marcelo, Heloísa, Lúcia, João Marcelo e Iza Salvador Regina Salvador Roberto, Fátima e Bruno Salvador Silvia da Silva Leite Fabiano Cameran Agradecimentos Especiais
  • 9. 9
  • 10. 10 Prefácio Era uma vez um menino de 300 anos que, junto com o tio e a tia-avó, morava num castelo escondido em meio à cidade. Infelizmente, o fato de não poder frequentar uma escola comum impedia que ele tivesse amigos. Graças a um feitiço, porém, Nino, certo dia, conseguiu conquistar novas companhias... Ah, o resto da história vocês já conhecem, certo? O que vocês não sabem, muito provavelmente, é como o castelo, os personagens e os bonecos passaram a existir. E são exatamente esses processos que serão revelados, por meio de depoimentos, em Castelo Rá-Tim-Bum: Bastidores – O Livro. Aqui, tudo começa pela exposição comemorativa dos 20 anos do programa, que estreou em 9 de maio de 1994. Em seguida, viajamos no tempo, lá para os idos de 1990, para falar brevemente dos antecessores “Rá-Tim-Bum” e “Mundo da Lua”. Boa parte daqueles que trabalharam no Castelo conta que foi a passagem por esses infantis da TV Cultura que fez com eles conseguissem experiência suficiente para produzir o mais mar- cante deles. Nas páginas deste livro apresentamos os depoimentos de 15 profissionais direta- mente envolvidos com o programa. Preparem-se para essa viagem! Catherine Mello e Diogo Salvador Prefácio
  • 11. 11
  • 12. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 12 “Ingressos esgotam e fila para mostra Castelo Rá-Tim-Bum é interrompida”. Essas informações frustrantes circulavam nos principais sites e jornais de São Paulo em 17 de julho de 2014, data seguinte da inauguração da exposição sobre um dos mais im- portantes programas infantis televisivos já produzidos no Brasil, cuja homenagem aos 20 anos, em forma de exposição, começava a ser mostrada ao público no Museu de Imagem e Som (MIS), na zona oeste da capital paulista. É preciso dizer, antes de mais nada, que a badalada exposição incomodou a uma mi- noria. Não só pelas enormes filas, problema que, na verdade, era totalmente compensado quando as pessoas passavam pela porta de entrada. O fato é que um grupo de moradores do entorno do MIS chegou a fazer, em meados de setembro, um abaixo assinado com, segundo eles, 150 assinaturas - mas, na verdade, havia apenas 10! O grupo restrito se incomodou com adultos interessados pela exposição e com os ônibus de excursão que fechavam o tráfego. Ninguém deu ouvidos aos “manifestantes” e a situação acabou sendo ironizada por pessoas como o jornalista Ricardo Chapola. Em seu blog “Crônicas do Cotidiano”, o colunista de O Estado de São Paulo comparou os “ativistas” ao Dr. Abobrinha, personagem que sempre tentava destruir o Castelo. Em um dado momento do texto, afirma: “Nós não repudiamos os assinantes do manifesto, que talvez nem saibam do que se trata a exposição, ou saibam e queiram derrubar o MIS para levantar um prédio de 100 andares (muaaaahhhh muaahhhhh muaahhhhhh!!!)”. 20 anos depois, novo boom do Castelo Rá-Tim-Bum
  • 13. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum13 Centenas de pessoas foram todos os dias ao Jardim Europa enfrentar horas de fila. Em menos de um mês de exposição, o museu bateu o recorde de público, atingindo 80 mil espectadores – até en- tão, este número só havia sido alcançado em três meses, na mostra do cantor inglês David Bowie. Em meados de agosto, a exposição do Castelo já havia recebido 83 mil pessoas. "Considerando esse fluxo de 80 mil pessoas em um mês, a gente espe- ra um pouco mais de 240 mil pessoas no final da exposição", estima Gabriele Araújo, curadora assis- tente da exposição. Vale ressaltar que essa previsão de público foi feita antes da primeira prorrogação da data de término da exposição. De início ela iria até 12 de outubro, mas já no começo de setembro foi prorrogada até novembro e, inclusive, chegou a funcionar no dia 5 de outubro, primeiro turno das eleições. Duas semanas depois, aconteceu uma ma- ratona de visitações à mostra, ocorrendo vendas de ingressos desde a 00h às 20 horas do domingo. Mas dias antes, Castelo Rá-Tim-Bum – A exposição foi prorrogada novamente e desta vez até 25 de janeiro de 2015, dia do aniversário da cidade de São Paulo. Se não prorrogada pela terceira vez, a exposição, ficará cinco meses em cartaz, com previsão de filas até a última hora. Mas como assim uma exposição sobre o Castelo Rá-Tim-Bum, por que está acontecendo?
  • 14. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 14 Trata-se de uma comemoração lembrando os vinte anos de estreia do programa. Vinte anos? Raios e Trovões – diria Doutor Victor –, como pode ter passado tanto tempo? É chocante, prezado leitor, mas duas décadas transcorreram (ou melhor, correram) desde que Pedro, Biba e Zequinha foram visitar pela primeira vez aquele estranho castelo, localizado no meio de uma cidade tão grande como São Paulo. Ali, um menino de trezen- tos anos, que não tinha amigos, vivia junto com seu tio, um bruxo e inventor, e sua tia-a- vó, uma sábia contadora de histórias e bruxa, assim como todos da família. Muitas cenas vêm às nossas cabeças fazendo recordar as tardes que passávamos assistindo às aventuras da turma do Castelo, que prendia a atenção de todos, fossem adultos ou crianças. O programa estreou em uma segunda-feira, dia 09 de maio de 1994. A novela Éra- mos Seis, produzida pelo SBT, também estreava naquele dia. Os dois televisivos tinham algo em comum, explicaremos melhor mais tarde, a participação do ator Eduardo Silva. Nove dias antes o Brasil havia perdido o tricampeão de Fórmula 1,Ayrton Senna. O piloto se envolveu em acidente durante corrida em San Marino, e morreu. Os jornais, no dia da estreia do Castelo, ainda davam destaque ao falecimento com cadernos especiais dedica- dos a Senna. Mesmo assim, um caderno especial de entretenimento anunciava em página inteira a estreia do infantil. Quatro dias depois, o jornal Folha de São Paulo noticiava: “Castelo dobra a audiência da Cultura”. Segundo a matéria, o horário anteriormente era ocupado pelo, também infantil, Glub Glub e chegava a registrar médias de 4 e 5 pontos de audiência, aproximadamente 198 mil residências. Já na estreia, o Castelo Rá-Tim-Bum conseguiu registrar 8 pontos, 318.320 domicílios. O índice se repetiu por dois dias e no terceiro, o programa chegou a 10 pontos. A repercussão do infantil foi tão grande que a vice-liderança, ocupada pelo SBT, estava ameaçada segundo a reportagem, já que no mesmo horário, chegava a 11 pontos. Muitos anos se passaram então voltemos no tempo, como se fosse um feitiço da Morgana, para visitar a exposição, como milhares de pessoas fizeram. Não foi apenas no dia 17 de julho que filas quilométricas tomavam conta dos quar- teirões de acesso ao museu. Nas semanas seguintes, cenário praticamente igual. A organi-
  • 15. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum15 zação tentou facilitar a vida dos visitantes com a oportunidade de vender os ingressos durante alguns dias pela internet. Mas adivinha o que aconteceu, inclusive com nós? O número altíssimo de acessos sobre- carregou o site do evento e impediu o comércio de entradas por várias horas. No entanto, esse enxame de interessados só comprova algo mais certo do que a Celeste morar numa árvore: o sucesso da exposição do Castelo Rá-Tim-Bum no MIS demonstra como o programa, mesmo após duas décadas da primeira exibi- ção, permanece vivo na memória de adultos que assistiam às histórias de Nino durante a infância. Continua sendo muito bom ser criança. DOMINGO, 24 DE AGOSTO DE 2014 Era um belo dia, não havia sequer uma nuvem no céu. O calor e o tempo seco não estavam para brincadei- ra. Quando chegamos à Avenida Europa, número 158, no bairro de Pinheiros, por volta de oito horas da manhã, uma enorme fila para ver a exposição do Castelo Rá-Tim-Bum já contornava a Rua Alemanha e che- gava até a Rua Bucareste. O número de pessoas só aumentou. Pouco antes das nove e meia da manhã, faltando doze horas para encerrar a visitação, surgiu monitor do evento que carregava uma placa com a seguinte men- sagem: “OS INGRESSOS PARA HOJE ESTÃO ESGOTADOS E NÃO SÃO VENDIDOS INGRESSOS ANTECIPADOS NA BILHETERIA DO MIS. Por favor, retorne em outra data. Recomendamos chegar cedo, pois a procura está sendo grande e há número limitado de visitantes por dia.” Também pelos monitores, foram distribuídos adesivos ver- melhos que simbolizavam os in- gressos. Cada pessoa poderia pegar até quatro adesivos e, sem a apre- sentação dos mesmos garantindo a compra de ingressos, não valeria a espera na fila.
  • 16. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 16 Pessoas dos mais variados estilos esperavam a vez para com- prar as entradas. Desde senhoras que faziam tricô enquanto a fila não andava, até gente tatuada, com cabelo colorido, muitos adultos e adolescentes, que não deixavam de lado as crianças com menos de 10 anos, todas eufóricas para ver os cenários coloridos do Castelo Ra-Tim-Bum, programa que só voltou a ser reprisado recentemen- te pela TV Cultura. Depois do meio-dia conse- guimos adquirir nossos ingressos para o horário das cinco da tarde, o que significava a chance de almoçar em casa e, depois de algumas horas, voltar. Foi o que fizemos. Quando o relógio marcava quatro da tarde, estávamos de volta. Na frente do museu, porém, não estava nem me- tade das pessoas. Em uma das filas, encontramos Suzzy Silva Inácio, de 26 anos, e sua filha, Victória, de 3 anos. Formada em enfermagem, a jovem acompanhou ao programa
  • 17. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum17 quando era jovem e estava preparada para mos- trar para a filha o universo com o qual ela tanto se encantava. – Eu chego a colocar para ela na internet, e ela adora. Acho que os cenários, os figurinos, são as coisas que vão mais nos encantar. Ela deu sorte, não chegou a ficar nem uma hora na fila. Alguém comprou e desistiu, acabou vendendo os ingressos. Depois de conversar com ela e ver o entusiasmo da pequena Victória, che- gamos à entrada, onde havia uma maquete do Castelo. Tudo nos distraia das instruções da mo- nitora, como as fotografias, até que, finalmente, chegou a hora tão esperada: uma porta semelhante àquela do castelo original, com um boneco de lata como porteiro, recepcionava os visitantes. Dessa vez, não era Pedro, Biba ou Zequinha os persona- gens principais. Éramos nós... “KLIFT, KLOFT, STILL, A PORTA SE ABRIU.” Oprimeiro ambiente da exposição provoca uma volta ao passado de todos os programas infantis produzidos pela TV Cultura desde a década 1970, como a versão brasileira do “Sesame Street”, rebatizada aqui de Vila Sésamo, até o Ilha Rá-Tim-Bum em 2002, atingindo no mínimo cinco gerações. Falando sobre esses programas infantis, Cláudia Dalla Verde, uma das roteiristas do pro- grama, explicou que o Castelo Rá-Tim-Bum, a princípio, tinha outro nome:
  • 18. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 18 – O Rá-Tim-Bum II era simplesmente tirar o que não tinha dado certo no Rá-Tim -Bum I e criar novas coisas, mas eles começaram a inventar tanta moda, mas tanta moda, que virou outro programa. Então resolveu-se não aproveitar nada e iam fazer uma outra coisa que foi o Castelo, e daí tinha mais dinheiro também, né? Cláudia participou de outros programas infantis da TV Cultura, como o primeiro Rá-Tim-Bum, Mundo da Lua e Glub Glub. Ela irá aparecer novamente neste livro, dando depoimento completo sobre o processo de criação do Castelo Rá-Tim-Bum e a relação dos profissionais envolvidos com a TV Cultura. Continuando pela exposição, ainda na primeira parte ficamos impressionados com todos os detalhes das criações, as fotografias de montagem dos cenários, as técnicas de abertura do programa, e o que mais nos chamou atenção: roteiros originais e reproduzidos, que pudemos até tocar, percebendo quantas pessoas estavam envolvidas, além de Cláudia. Um pouco mais à frente encontramos com o personagem Nino, ou Cássio Scapin em holograma, dizendo que finalmente seu Tio Victor havia aberto o castelo para visita- ção. À sua esquerda, o quadro mágico em que um pintor maluco fazia as mais inusitadas obras de arte; à direita, relógio que, dentre muitas falas, anunciava a chegada do dono do castelo, a horas das crianças irem embora ou o momento da feitiçaria. “UMA HORA, HORA E MEIA; MEIA HORA, HORA INTEIRA; O DR. VICTOR VAI CHEGAR, O DR. VICTOR VAI CHEGAR.” Mais adiante, fomos para o cenário da biblioteca. Entre livros, réplica e boneco ori- ginal do Gato Pintado e da cadeira usada no cenário na década de 90. Ali conhe- cemos e conversamos com Tatiane Bueno. Formada em jornalismo, a jovem de 22 anos estava eufórica para rever cada cenário e com certeza cada lembrança. Ao falar sobre o que estava sentindo, seus olhos, várias vezes, ficaram marejados. A jovem, inclusive, cita a influência de uma das personagens na escolha da sua profissão.
  • 19. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum19 - O meu personagem preferido era a Pené- lope e a Penélope era uma patricinha e jornalis- ta; eu, querendo ou não, acabo sendo um pouco patricinha e virei jornalista, então será que de repente teve alguma influência do Castelo Rá- Tim-Bum na minha escolha profissional? Alguém duvida? Ela acrescenta ainda que o gosto por arte e poesia aconteceu graças ao programa e, coincidência ou não, naquele ce- nário acontecia um dos quadros favoritos dela, onde as pessoas liam poemas de Cecília Meire- les, Vinicius de Moraes, entre outros, e os mos- travam animados. Depois de cinco horas na fila para conhecer a mostra, ela percebe a importân- cia do programa, principalmente quando com- parado com os realizados atualmente. - Eu acho que é um conjunto de coisas. É um projeto muito inovador, ele é esteticamente maravilhoso. Criaram uma atmosfera de realida- de com tudo muito simples, o gato era de E.V.A. (espuma sintética de baixo custo muito usada para produtos infantis) meu deus! O sucesso se deve a isso, a qualidade do elenco, do roteiro, da estética tudo é excepcional! No mesmo cenário da biblioteca, repara- mos que nas estantes havia títulos de enciclo- pédias e de grandes clássicos, como “As Mil e Uma Noites”, e até livros de Direito, como o “Código Penal.
  • 20. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 20 “LÁ VEM O TÍBIO E O PERÔNIO...” Opróximo ambiente da exposição é o laboratório dos irmãos gêmeos Tíbio e Perônio, onde os dois cien- tistas realizavam experiências e ensinavam as crianças sobre, por exemplo, lei da gravidade. Curiosa- mente, os dois atores que interpretavam os personagens não eram gêmeos e nem sequer parecidos. Inclusive, Tíbio era vivido por Flávio de Souza, um dos criadores do programa e de boa parte dos personagens. A ideia de produzir e atuar nem sequer foi dele, mas do diretor Cao Hamburger. - Foi o Cao que teve a ideia. Ele cismou que eu e o Henrique éramos parecidos e falou pra ele que queria que ele fizesse a dupla de cientistas gêmeos comigo. De uma certa maneira ele viu um jeito, sei lá, meio infantil de ser, de interpretar, que realmente combinou. Já o outro ator, Henrique Stroeter, acabou sendo escolhido para contracenar com Flávio por acaso, ao fazer um teste para o personagem principal do Castelo, Nino. Apesar de o diretor ter elogiado seu desempe- nho, ele foi informado que gostariam que ele interpretasse Perônio, o outro cientista. E digo mais. Ou me-
  • 21. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum21 lhor, neste caso, nós dizemos mais: mesmo os dois não se achando parecidos, depois da carac- terização ficaram muito parecidos, fazendo todos pensarem que eram mesmo irmãos gêmeos. Flávio aparecerá novamente nos próximos episódios, quer dizer, no decorrer do livro para contar sobre sua participação na criação do programa e interpretação do seu personagem; Continuando nosso percurso, chegamos ao laboratório do Doutor Victor, tio de Nino e dono do castelo. Distribuído em dois andares, o local onde o bruxo de 3000 anos realizava in- venções, assim como os outros ambientes da exposição, estava repleto de fotografias, desenhos e, principalmente, de figurinos usados nas gravações. De minuto em minuto as luzes piscavam e uma voz estridente gritava “RAIOS E TROVÕES!”, assustando adultos e mais ainda as crian- ças. Sérgio Mamberti, que também aparecerá pessoalmente nas páginas futuras deste livro, deu vida ao mago que pronuncia aqueles apelos. Ainda hoje, o ator fala com carinho sobre o perso- nagem que mais o fazer ser reconhecido na rua: - Fiz coisas marcantes na televisão, mas o personagem que marcou minha vida foi o Dr. Victor no Castelo. Ele se tornou meu alter ego. No programa, em meio a luzes piscando e gritos do dono do castelo, havia duas botas ra- ppers que viviam fazendo rimas, malandras, ou “malacas”, conforme gíria da época. Dubladas por Theo Werneck, que fala a seguir, e Gérson de Abreu, já falecido, os bonecos, controlados por controle remoto, obrigavam os atores improvisarem as falas, inserindo os famosos “cacos”: - Os bonecos tinham uma certa imprecisão e a gente tinha que colocar muito caco e pra isso tem que ter uma habilidade, então não basta você só ser um dublador. Você tem que saber colocar um caco e esse caco tem que ser pertinente pra não ficar com uma dublagem artificial. Em seguida, entramos em um corredor escuro e mais estreito que os anteriores da expo- sição. O espaço representava os encanamentos do castelo, onde ficava a toca do Mau. Sempre acompanhado de Godofredo, o personagem fazia desafios: crianças e adultos precisavam resol- ver enigmas citando, por exemplo, frutas com uma determinada cor e repetindo trava-línguas. Caso não superassem o desafio, Mau dava a sua terrível gargalhada fatal, algo que pouco acon- tecia, graças a Godofredo, que, quase sempre, ajudava as pessoas. Em seguida, chegamos ao, até então, maior cenário da exposição: a sala de música, di-
  • 22. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 22 vidida em dois ambientes. No primeiro, tivemos a oportunidade de sentar na pianola. A cada pedalada, bonecos dançavam em uma pequena tela, na altura dos olhos, vários ritmos diferentes. Mais adiante, uma caixinha de música, a pequena maquete do circo e a máquina onde desenhos se criavam e se transforma- vam. Em frente a dois sofás, uma grande e antiga televisão exibia, ininterruptamente, reportagem sobre os bastidores do programa. Na segunda parte do ambiente, fantoches de vários países ensinavam palavras básicas de outras culturas em uma lareira. No canto, encontramos o globo que, no programa, qualquer um girava e escolhia um país para escutar melodias locais. Outro item que vimos foi a caixa mágica: ao abri-la, objetos geométricos surgiam e estimulavam as crianças a identificá-los.
  • 23. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum23 Passando para o próxi- mo espaço da exposição, não encontramos propriamente um cenário, mas, sim, outro corre- dor escuro, com luzes que si- mulavam estrelas. Logo perce- bemos: estávamos no espaço e, mais à frente, iríamos encontrar o figurino daquele que, infeliz- mente, não pôde presenciar o sucesso do programa. Wagner Bello, intérprete do personagem que visitava sempre Nino e seus colegas, morreu ainda no perío- do de gravações, quando faltava mais um episódio para ser gra- vado. Entrou em cena, então, a atriz e amiga pessoal do ator, Siomara Schröder, que já havia interpretado a mãe do perso- nagem e, depois da perda, deu vida à Etecetera, irmã do, tam- bém extraterrestre, Etevaldo. - Eles me chamaram e de primeira eu não aceitei, nós éramos muito amigos, eu ain- da estava muito abalada com a perda. Depois eles me ligaram
  • 24. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 24 de novo e insistiram dizendo que aquilo seria uma homenagem a ele e eu acabei aceitando sem saber como iria reagir. Seguimos e chegamos ao hall do castelo, que ligava os cenários da co- zinha, jardim e quarto do Nino. Agora, sim, o maior espaço da exposição, onde encontramos vários figurinos e imagens de jornais, croquis dos figurinos e cartas de fãs. Foi onde ficamos a maior parte do tempo. O local era grande demais, a maioria das pessoas também permane- ceu boa parte do tempo por ali, tirando fotos, observando os figurinos ou mes- mo descansando, já que havia um sofá idêntico ao do Castelo no centro do hall. O primeiro objeto que encon- tramos foi o figurino do Telekid, per- sonagem que sempre dizia “PORQUE SIM NÃO É RESPOSTA” quando Ze- quinha cismava em sempre perguntar o porquê de algo e no final, recebia um sonoro “PORQUE SIM, ZEQUINHA”. Marcelo Tas interpretou o personagem que vivia sempre acompanhado de um aparelho que, hoje, se assemelha a um smartphone. Quem sabe não fosse um presságio dos celulares modernos da
  • 25. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum25 atualidade, da internet e de uma gran- de empresa de busca? O personagem sempre explicava por qual motivo, por exemplo, as pessoas espirravam. De uma forma simples e de fácil en- tendimento, o quadro ensinava coi- sas muitas vezes complexas. Chegamos, então, à cozinha e assim como todos os espaços da exposição, este retratou quase fiel- mente o cenário de 20 anos atrás. Os armários nos davam a possibilidade de abrir algumas gavetas onde havia fotos de gravações. No centro da co- zinha encontramos o mais extrover- tido dos visitantes daquele castelo, Bongô. O entregador de pizza cheio de ginga e molejo foi interpretado por Eduardo Silva que, mesmo ten- do feito inúmeros outros trabalhos televisivos, é reconhecido constan- temente pela atuação no Castelo. - Os trabalhos que mais as pes- soas acabam lembrando são os que ficam mais tempo no ar, o Castelo e o Telecurso 2000 são esses exemplos. Os dois estão há muito tempo no ar, mesmo o Castelo tendo parado por um
  • 26. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 26 tempo, as pessoas ainda ficam com a sua imagem guardada. É muito legal virarem pra você e falarem que a pessoa aprendeu e se divertiu com aquilo. Algo que chamou nossa atenção naquela cozinha foi a máquina de lavar louça na ja- nela - no cenário original, o equipamento não limpava re- almente os pratos. Da mesma janela avistamos o jardim, para onde seguimos. Cheio de plan- tas, foi o local propício para colocar o bicho do mato da per- sonagem Caipora. O figurino, cheio de mega hairs e sementes incorporados nos fez supor o quanto aquilo deveria demorar a ficar pronto, causando enorme calor na atriz Patrícia Gasppar. A dificuldade continuava, mesmo depois do término das gravações. - Na época não tinham produtos pra tirar maquiagem tão fácil como os que têm hoje. Enquanto todo mundo ia embora, eu ficava lá tentando tirar a maquiagem, várias vezes eu desistia e saía com vestígio de maquiagem no rosto e ia pra qualquer lugar daquele jeito. Saindo do jardim, passando pela cozinha novamente, chegamos a dois locais, di- gamos: à nossa frente havia os três figurinos das crianças que diariamente visitavam o castelo: Pedro, Biba e Zequinha; dando meia volta, estávamos em frente ao figurino da mais delicada das personagens do programa, Penélope, admirada por todos pela tamanha beleza. Jornalista, influenciou muitas meninas a seguirem a mesma profissão e, principal- mente, a gostarem mais ainda da cor rosa. - Eu já ouvi isso de várias meninas. E isso é realmente muito importante. Programas
  • 27. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum27 infantis têm essa importância. Você molda pessoas, eu vejo como isso é importante por amigos que eu tenho de 28 anos, pela receptividade dos fãs na rua e pela quantidade de entrevistas que a gente dá. Eu vejo por mim, as referências que você tem na infância ficam pra sempre. Ângela estava certa ao dizer que influenciou inúmeras meninas. Eu, Catherine, sou um desses exemplos. Não era fácil assistir àquele programa e não ficar admirada em como ela conseguia ter apenas o rosa em sua vida! A delicadeza, os trejeitos e a feminidade encanta-
  • 28. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 28 vam até os meninos, como disse o próprio Nino, com cara de bobo, ao vê-la pela primeira vez: “Meu Deus, como ela é linda”. Sem nenhuma imparcialidade, ela era realmente linda, a repre- sentação de uma boneca. O rosa ainda é até hoje a minha cor preferida, mas não sou charmosa como a personagem e por isso, o rosa, na minha vida, é bem mais moderado. Após tanto andar, ver e sentir, sentamos no sofá redondo para descansar e notamos os olha- res de admiração das pessoas à nossa volta. Era nítido o quanto elas estavam gostando de estar ali e, ao mesmo tempo, o quanto elas gostaram do que foi a presença do Castelo Rá-Tim-Bum na infância de cada uma. Levantamos e à nossa frente estava a ár- vore do castelo, aquela mesmo em que dentro vivia a cobra rosa, Celeste, que sonhava em ter braços e pernas. Seu desejo, certa vez, acabou virando, em vez de braços e pernas, asas, e assim ela pôde passear pelo castelo sozinha. Ao lado, a porta do quarto do Nino frequentemente girava. Lá dentro a decoração era o que mais chamava a atenção: paredes, o chão e o teto revestidas por gibis colados. Uma cadeira e diversas fotos tam- bém compunham o cenário. Na mesma árvore, a casa do João de Barro onde moravam os passarinhos musicistas. Mais
  • 29. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum29 acima estava o lustre do castelo onde as duas doces fadinhas, Lana e Lara, viviam. Vimos ainda, ao lado dos figurinos das crianças, o ratinho que vivia circu- lando pelo castelo dentro do carrinho em forma de rato, dando voltas entre a par- te de dentro e de fora. No programa, ele cantava músicas incentivando a higiene pessoal de forma descontraída. Quem es- tava ao seu lado era Fura-Bolos, acom- panhado dos amigos da Dedolândia, que sempre aparecia cantando músicas sobre matemática ou lembrando a importân- cia de se lavar as mãos, dando início ao conhecidíssimo clipe “Lavar as mãos”, com letra de Arnaldo Antunes. Quase ao pé da escada que nos le- vava ao quarto da bruxa Morgana e mais alguns cenários, estava uma parede com quadros do Dr. Victor. Eram vários e de diversas épocas. Na parede da escada também havia vários quadros, desta vez da família. No topo da escadaria, podí- amos observar a movimentação do hall. Uma estante estava cheia de projetos paralelos ao programa: livros, fitas-cas- sete, gibis dos personagens, cadernos de colorir e muitos outros.
  • 30. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 30 “MORCEGO, RATAZANA, BARATINHA E COMPA- NHIA, ESTÁ NA HORA DA... FEITIÇARIA.” Assim como Catherine confessou suas reações ao ver a Penélope, eu, Diogo, tam- bém tive um momento particular, mas com outro personagem. Ao chegar ao ce- nário do quarto da Morgana, meus pensamentos voaram para um passado de referências e lembranças. Tudo ao mesmo tempo. Eu ainda morava no Rio de Janeiro e nem imagi- nava residir em São Paulo quando vi pela primeira vez aquela bruxa com um cabelo em pé e cheia de histórias para contar, sempre na companhia da gralha Adelaide, no quarto da torre daquele castelo. Era muito divertido imaginar como uma bruxa de seis mil anos sabia de tantas coisas, desde a pré-história até o descobrimento do Brasil, passando por clássicos ca- sos como a Guerra de Tróia. Parando para pensar, esse mundo de fantasias é algo que sempre me chamou atenção: não à toa, alguns anos mais tarde eu comecei a entrar num mundo de bruxaria, mas não da Morgana, e sim, de um garoto que só descobria o mun- do da magia aos 11 anos, vocês devem saber quem é! Impressões e recordações revividas, voltando ao cenário da exposição, a luz era quase pouca. Havia a cama da bruxa Morgana, o sofá, as réplicas da gralha Adelaide, o caldeirão dos feitiços, um retroprojetor antigo onde, com imagens feitas por ele, a bru- xa contava suas histórias. Havia também alguns, poucos, objetos originais que foram usados 20 anos atrás. Junto a fotografias estava lá, também, o figurino da personagem que foi interpretada por Rosi Campos. “PASSARINHO, QUE SOM É ESSE?” Opróximo cenário, representação do ninho que vimos na árvore do hall, está mon- tado com os quadros preferidos dos telespectadores fãs de música. Toda vez que
  • 31. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum31 o passarinho aparecia tocando um instrumento, as passarinhas, suas companheiras de cena, cantarolavam a música e faziam as crianças adivinharem qual instrumento o personagem estava tocando. João de Barro e as Patativas eram a essência musical do Castelo. No ce- nário repleto de instrumentos musicais, com palha ao redor, três ovos e os três figurinos, escutamos a famosa música que elas cantavam em todos os episódios: “QUE SOM, QUE SOM É ESSE? QUEM SABE O NOME DELE?” Ainda visitamos o cenário do lustre do castelo. Ali as fadas Lana e Lara, irmãs, fa- ziam brincadeiras e frequentemente uma provocava a outra para adivinhar através do som ou da forma do objeto. Doces e delicadas as fadinhas, às vezes, acabavam discutindo. A dupla chegou a sair do lustre algumas vezes para ajudar Nino e as crianças. Quase duas horas depois de termos passado pela portaria, estávamos chegando ao final da exposição. Chegamos ao que pareceu, aos nossos olhos, a parte de fora do caste- lo e também o cenário do personagem Pompeu Pompílio Pomposo. Conhecido como Dr. Abobrinha, o personagem, interpretado por Pascoal da Conceição, sempre tentava comprar o castelo para derrubá-lo e construir, no mesmo local, um prédio de 100 andares. Como nos espaços anteriores, havia fotos e o figurino do personagem. Em volta, sacos de lixo encostados em um latão, local onde Dr. Abobrinha foi parar algumas vezes depois de ten- tar enganar a turma do castelo. O ator era o único que a cada episódio tinha um figurino diferente, pois ele sempre se fantasiava de algum outro personagem para tentar comprar a propriedade. - Como eu estava careca na época foi muito fácil para fazer altos disfarces. Eu acho que sou uma pessoa boa para disfarce. É engraçado, eu mudo muito quando visto uma rou- pa, era muito divertido. E, enfim, terminávamos a visita. A sensação de nostalgia tomava conta. Assim que saímos, resolvemos iniciar uma volta ao passado ainda mais ousada do que a da exposição - resolvemos contar as histórias dos atores, produtores, diretores, roteiristas (alguns apre- sentados neste capítulo, outros vocês irão conhecer nos próximos), todos envolvidos com o programa que marcou a década de 90 educando e divertindo crianças e que, hoje, 20 anos
  • 32. 20 anos depois, novo boom do castelo rá-tim-bum 32 depois, já adultas, ainda gostam tanto do Castelo Rá-Tim-Bum que enfrentam horas de fila para reviver aquele castelo. Neste livro, porém, é bem mais fácil reviver o passado: não há filas, ingressos, nem data para começar e terminar a nostálgica diversão. Simplesmente vire a página e tudo recomeçará como num passe de mágica. ■
  • 34. rá-tim-bum e Mundo da Lua 34 Estamos na década de 1980, marcada pelo sucesso de bandas de pop rock nacional como Barão Vermelho, Legião Urbana, Titãs. Naquela época, passamos por anos de transição política. Desde 1985, não vivíamos mais em uma ditadura militar e, ao mesmo tempo, perdíamos Tancredo Neves, vítima de um tumor na região abdominal. Aos sábados, as pessoas assistiam aos calouros no programa do Chacrinha e aos primeiros anos do canal de televisão de Silvio Santos, aquele que seria um dos maiores apresentadores de programas de auditório do país. Mas se você era criança, programas como o da Xuxa, Mara Maravilha e Angélica certamente chamavam mais sua atenção. Foi mais ou menos neste período em que pessoas como Flávio de Souza e Cláudia Dalla Verde trabalhavam como roteiristas em programas infantis na TV Cultura. A emissora paulista já tinha um histórico de projetos voltados para esse público. Vila Sésamo talvez tenha sido o primeiro, com ato- res de reconhecimento nacional, como Sônia Braga e Aracy Balabalian. O seriado foi referência para crianças da década de 1970, hoje adultos que, com certeza, ainda lembram das aventuras de Garibaldo e sua turma. Mas foi no final da década de 1980 que muitos profissionais conseguiram produzir um progra- ma infantil diferente de tudo o que se fazia até então - inclusive, naquela década, ocorreu um grande movimento de teatro infantil em São Paulo e também foi formada a Associação Paulista de Teatro de Infância e Juventude. Não à toa, a maioria desses dramaturgos do teatro acabou entrando em projetos de televisão. E numa parceria com tantos profissionais, deu-se o Rá-Tim-Bum! 2. Rá-Tim-Bum e Mundo da Lua
  • 35. rá-tim-bum e Mundo da Lua35 “SENTA QUE LÁ VEM HISTÓRIA...” Em 1990, o Rá-Tim-Bum, primeiro programa infantil patrocinado pela FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), com direção-geral de Fernando Meirelles (aquele que anos mais tarde iria conduzir o premiado filme Cidade de Deus), tinha uma proposta muito diferente. O programa apresentava inúmeros quadros que incentivam as crianças em determinadas áreas, como o quadro Doutor Barbatana e as sereias da água doce, por meio do qual elas aprendiam a diferença entre “em cima” e “embaixo”. No programa havia quadros como o Senta que lá vem história, do Professor Tibúrcio, interpretado por Marcelo Tas, e O Pinguim Pianista, interpretado por Theo Werneck. - Como eu já tinha participado do Revistinha (programa infantil também produzido pela Tv Cultura) eu já conhecia várias pessoas do elenco. Então eu já frequentava a casa como ator, foi aí que me chamaram.
  • 36. rá-tim-bum e Mundo da Lua 36 Eu também já conhecia o Fernando Meirelles e Marcelo Tas do Olhar Eletrônico. O ator que anos depois participaria do Castelo Rá-Tim-Bum conta que nem sempre era reconhecido nas ruas, tal a caracterização do personagem. A ocasião mais inusitada que viveu foi quando sua atual namorada fez uma pesquisa na internet e descobriu sua participação no infantil. A principal ideia do Rá-Tim-Bum surgiu de Fernando Meirelles, diretor geral: ele queria fazer um programa que representasse um pequeno canal de televisão para crianças, com histórias, telejornais... Flávio de Souza, que estava envolvido na criação, começou a escrever os primeiros roteiros em reuniões de criação, que contavam com Marcelo Tas e Paulo Moreli, todos então envolvidos com o Olhar Eletrônico, produtora de Fernando Meirelles, também presente nos encontros. Como era destinado ao público infantil, todos os roteiros produzidos por Flávio e seus colegas precisavam ser orientados por uma coordenação pedagógica. Essa relação entre roteiristas e pedagogos não foi uma tarefa muito tranquila. Pelo contrário. Flávio narra como era a relação entre eles: “O conceito era mostrar o conteúdo pedagógico, mas de forma divertida. A ideia era o divertimento em forma de entretenimento, mas a coor- denação pedagógica não concordava, achava que só tinha que ter a informação. Muitos roteiros eram riscados por que eles achavam desnecessários.” Eliana Fonseca, diretora de um dos quadros e intérprete da personagem Cacilda, confirma cenas dirigidas sob acompanhamento de algum profissional da coordenação pe- dagógica. Eles, inclusive, chegaram a proibir algumas ideias, como o quadro da persona- gem Nina, vivida pela a atriz Iara Jamra: - Nós não sabíamos como a personagem ia começar, e eu sugeri que ela cantasse o ‘atirei o pau no gato’, de repente tinha uma pessoa da coordenação pedagógica man- dando refazer tudo por que essa música não poderia”, explica a diretora, que relembra a passagem como uma situação mais engraçada do que problemática. Atirar o pau no gato poderia incitar à violência contra os animais. No final das contas, o sucesso do programa acabou deixando todos surpresos. A equi- pe inteira estava no meio do processo e, com isso, as relações nos bastidores foi amenizada. Fernando Meirelles, diretor-geral, havia acabado de chegar à TV Cultura e, portanto, tinha
  • 37. rá-tim-bum e Mundo da Lua37 uma linguagem muito diferente, bem próxima à utilizada na publicidade. O sucesso do programa fez com que, aos poucos, os ânimos se acalmassem entre roteiristas e o departamento pedagógico. Uma das grandes diferenças do Rá-Tim-Bum em relação a outros programas da época era a forma como foi escrito. Cláudia Dalla Verde, que entrou com o processo já iniciado, explica que, mesmo assim, ajudou a “dar forma” a alguns personagens, como o Máscara. - O Rá-Tim-Bum funcionava como uma fábrica de salsichas, ninguém era dono do personagem. Você pe- gava 30 quadros de ginastica, depois mais 20 de telejornal e, depois, mudava tudo. O que era uma delícia!
  • 38. rá-tim-bum e Mundo da Lua 38 Com quadros distintos, cada episódio encontrava sua maneira de ser ligado ao “Senta que La Vem História”. Contado em três ou quatro atos, o quadro apresentava, muitas vezes, adaptações de grandes clássicos literários. Muitos atores que hoje tem certo reconhecimento estavam envolvidos. Eram os casos de Marcelo Tas, Iara Jamra, Carlos Moreno, Norival Rizzo, Eliana Fonseca e Angela Dip. Como existiam muitos quadros independentes das histórias, a maioria dos atores gravava em poucos dias blocos e mais blocos. É o que conta Angela Dipp, que participou do “Famí- lia Teodoro”, uma das pequenas esquetes do programa, todas gravadas em menos de uma semana. Como a TV Cultura é um canal de televisão pública, todos os índices de audiência até então não tinham tanta relevância. O próprio Flávio lembra que era muito comum os pro- gramas não registrarem nenhum ponto de audiência. Mas foi no Rá-Tim-Bum que o cenário começou a mudar, registrando pela primeira vez índices altos de audiência. Os figurinos do programa foram apresentados por Carlos Alberto Gardin, o mesmo que, anos mais tarde, criaria as vestimentas dos personagens do Castelo Rá-Tim-Bum. Porém, va- mos falar sobre esse programa daqui a pouco. O figurinista afirma que a relação com Fernando Meirelles era bem tranquila, além de recordar que havia uma parceria com outros departa- mentos, como o de cenografia, para a realização do quadro da família que assistia tudo o que era realizado no Rá-Tim-Bum. - Quando o Fernando me explicou sobre essa família, seriam famílias comuns: uma dona de casa, o pai era mecânico e, inclusive, eu comecei a trabalhar em cima dessa ideia, mas quando vi que a cenografia estava fazendo coisas totalmente diferentes, como colo- car um vaso de ponta a cabeça, resolvi refazer todo o figurino desses personagens. Nós estávamos indo por caminhos diferentes, e nós tínhamos que juntar os canais. Para construir o personagem Euclides, interpretado pelo ator Carlos Moreno, Gar- din explica que sempre teve grande liberdade nos figurinos. - Eu pensava ele bem careta, como se fosse um escriturário, com terno xadrez, mas não era isso que eu queria, e o Fernando disse: ‘Faz o que você quiser’. E eu explorei muito dessa idéia, com coisas que poderiam ser contatas, chegando até a colocar ele com um sapato de coturno para a surpresa até do Fernando, quando viu no estúdio”.
  • 39. rá-tim-bum e Mundo da Lua39 Outro caso interessante é que a personagem que Eliana Fonseca deu vida não era para ser humana, mas, sim, um boneco. No entanto, como a ideia não vingou, ela acabou atuando e, mais uma vez, Carlos Gardin usou de sua imaginação para criar. - Ela era uma produtora de tevê, então ela tinha até comida na sua roupa”, relembra o figurinista. Como o programa entrou no ar no meio do processo de realização, todos perceberam a receptividade perante o público, e acabavam remodelando o que não estava dando certo. Mas muita coisa deu certo. Flávio acredita que um dos triunfos que merecem maior destaque
  • 40. rá-tim-bum e Mundo da Lua 40 foi o investimento no público infantil, além da quantidade de pessoas talentosas que estavam envolvidas. - É, eu acho que o principal acerto foi a quantidade de gente que participou, foi praticamente uma multidão. Muita gente escreveu e muita gente dirigiu. Ele meio que distribuiu, chamou muita gente que nunca tinha feito nada pra televisão, e eu acho que é uma coisa experimental mesmo, tanto que algumas coisas não deram muito certo e acaba- ram tendo que ir pro ar. Mas muita coisa eu acho que deu muito certo porque ele deixou as pessoas experimentarem, fazer coisas...
  • 41. rá-tim-bum e Mundo da Lua41 Eliana Fonseca também tem sua opinião sobre o programa e, principalmente, sobre o sucesso. Na visão dela, todos envolvidos estavam no auge de suas carreiras. - Tudo dava certo no Rá-Tim-Bum, os roteiristas escreviam muito bem, os atores atuavam muito bem, e nós diretores estávamos dirigindo bem, também, mas acho que, além disso, era algo meio energético, sabe? Ali, tudo o que estávamos realizando dava certo. E boa parte daquela equipe não parou no Rá-Tim-Bum. Alguns roteiristas do programa já estavam envolvidos com o próximo sucesso infantil, o Mundo da Lua.
  • 42. rá-tim-bum e Mundo da Lua 42 “ALÔ, ALÔ! PLANETA TERRA CHAMAN- DO! PLANETA TERRA CHAMANDO! ESTA É MAIS UMA EDIÇÃO DO ‘DIÁRIO DE BORDO’ DE LUCAS SILVA E SILVA, FALAN- DO DIRETAMENTE DO MUNDO DA LUA, ONDE TUDO PODE ACONTECER!” Agora estamos em 1991. Flávio de Souza, que acabara de ter uma experiência muito boa com o Rá-Tim-Bum, idealizou praticamente sozinho o seriado para o mesmo público do programa que ele havia produzido recentemente e estava dando tão certo. Inspirado num seriado que assistia quando criança, o “Papai sabe tudo”, que foi exibido no começo da década de 1960, o roteirista queria fazer algo em que o cotidiano de uma família estivesse envolvido. Ao apresentar a ideia para Beth Carmona, diretora de programação da TV Cultura, recebeu dela o aval. Mas não foi nada fácil fazer esse seriado, se for comparado com o grande sucesso da época, o Rá-Tim-Bum. Flávio e Cláudia, ambos recém-saídos do programa, estavam envolvidos na criação do Mundo do Lua. Inclusive, eles escreveram mais de 20 episódios, mas nem todos foram aproveitados, por vários motivos. Um deles era a coordenadora pedagógica. - A professora Célia Marques, que era da equipe pedagógica, achou que tinha sido relegada e que ninguém tinha perguntado nada pra ela, ninguém tinha pedido a aprovação dela. Eu não sabia direito porque não tinha esse contato direto com ela, mas o que falaram era que ela jogou tudo que já tinha sido feito no lixo e mandou refazer. Houve também uma mudança na direção do programa. Com a entrada de Marcos Vaisntock, muita coisa mudou na atração, uma das principais foi o cenário. O criador da série explica: - Antes eles moravam num apartamento que era meio pequeno, era tudo meio pobre, era tudo menor do que foi feito depois. Ele tornou as pessoas, a família, prova-
  • 43. rá-tim-bum e Mundo da Lua43 velmente mais rica, vamos dizer. Acho que eles eram de classe média baixa e eles passaram pra classe média alta na verdade. O seriado se resumia à rotina da família Silva e Silva, liderada pelo professor de geogra- fia Orlando Silva, interpretado por Antônio Fagundes. Ele era casado com Carolina, vivida por Mira Haar, dona de uma boutique. Eles eram pais de Juliana, interpretada pela novata Mayana Blum, e o jovem e protagonista da história, Lucas, interpretado por LucianoAmaral.Ainda resi- diam na casa o avô paterno, Orlando Silva, vivido por Gianfrancesco Guarnieri, e a empregada doméstica Rosa, interpretada por Ana D’Lira. Cada episódio girava em torno do cotidiano dessa típica família de classe média paulista- na. Lucas, por sua vez, enxergava todas as situações vivenciadas na casa e usava sua imagina- ção para narrar seu diário de bordo num velho gravador, que pertencia ao seu avô. Além dos personagens fixos, sempre havia participações especiais. Geralmente, eram fa- miliares. Flavio de Souza, por exemplo, chegou a atuar como o irmão caçula do personagem de Antônio Fagundes, o Tio Dudu. Mas a percepção de atuar além de escrever não foi do roteirista e, sim, do diretor Marcos Vaisntock. - Ele teve uma ideia muito engraçada, mas que acabou não conseguindo chegar até onde queria. Ele ia chamar atores que fossem parentes, porque achava que as pessoas já seriam pare- cidas e, aí, teriam uma coisa de familiaridade, de intimidade entre eles. Então, é por isso que na verdade a minha família, na época, estava toda lá. A minha ex-mulher fazia o papel da mãe, o meu filho mais velho fazia o papel de um primo que chama Diego de los Angeles e, aí, depois, o bebê que nasceu era meu filho, porque minha ex-mulher estava grávida na época. Assim como o Rá-Tim-Bum, o programa também era patrocinado pelo SESI. Uma das referências ao patrocinador era o fato de Lucas estudar na escola homônima e em várias opor- tunidades o personagem aparecia vestido com o uniforme da instituição. Leila Russo, que já produzia o Revistinha, acabou entrando no Mundo da Lua auxiliando no que fosse necessário nas gravações. - Neste trabalho, foi a primeira vez que eu trabalhei com uma continuísta porque a gente não gravava as cenas em ordem cronológica e sim por cenários. Aquilo era de vital importância já que parte do episódio era sonho e parte era realidade, o que exigia um trabalho gigantesco da direção de arte.
  • 44. rá-tim-bum e Mundo da Lua 44
  • 45. rá-tim-bum e Mundo da Lua45 Leila conta ainda que considera o Mundo da Lua como um grande aprendizado, seu primeiro trabalho envolvendo dramaturgia. Lu Grecco, que acabara de entrar na equipe de cenografia da TV Cultura, participou da reconstrução do cenário do programa e explica que a realização foi uma tarefa bastante complicada. - Como as externas eram realizadas numa casa real, nós tivemos que refazer toda a casa em estúdio. Assim como a cenógrafa tinha dificuldade na reprodução interna da casa real, a pro- dução do programa tinha outro tipo de dificuldade. Leila explica melhor o que acontecia. - As externas que a gente gravava de noite eram bem complicadas, a gente mobili- zava muitas pessoas, inclusive uma equipe de limpeza pra não causar incômodo nenhum aos moradores. Toda vez que o diretor iniciava a gravação de uma cena, uma vizinha
  • 46. rá-tim-bum e Mundo da Lua 46 disparava o alarme da casa e não conseguíamos dar continuidade. Nós acabamos conversando com todos os moradores da rua, pas- samos um comunicado. Todos acabaram aceitando, inclusive essa vizinha! No decorrer dos 52 episódios, o programa teve participações especiais de atores bastante conceituados, como Edson Celulari, Laura Cardoso, Ana Lúcia Torre, Lucinha Lins, Denise Fraga e até do então jovem ator Caio Blat, de 11 anos, que fazia parte do “Big Bad Boys’, a banda juvenil da qual a irmã de Lucas era fã. O grupo possuía apenas um único refrão: “Somos os Big Bad Boys/Todas as minas gostam de nós”, nítida referência às boy bands, que começa- vam a fazer sucesso na década de 1990. Logo depois, o Mundo da Lua ganhou uma spin-off (peque- na continuação) com o nome “Lucas e Juquinha: perigo, perigo, perigo!” interpretado por Luciano Amaral e Guilherme Fonseca. Os programas institucionais tinham duração de aproximadamente cinco minutos e eram veiculados durante a programação, mostran- do os perigos existentes em uma casa que há crianças. As grava- ções ocorreram no mesmo cenário do Mundo da Lua. O enredo de cada episódio era a solução que Lucas, irmão mais velho, arruma- va para os problemas que Juquinha, irmão mais novo, causava na casa. O projeto foi a primeira parceria de Flávio de Souza e Cao Hamburger. - Esse programa deu muito certo, a gente se deu super bem. Nossa parceria funcionava muito bem, eu escrevia e ele gostava. Era muito bom! Nós éramos amigos além de trabalharmos juntos. Uma parceria que iria render grandes frutos como o que ve- remos agora: Castelo Rá-Tim-Bum! Uma série de depoimentos a seguir irão recontar vivências próprias dos bastidores do programa. Preparados para mais uma viagem no tempo? ■
  • 47. Depoimento - Flávio de Souza47
  • 48. Depoimento - Flávio de Souza 48 “Revistinha, Curumim, Rá-Tim-Bum, Mundo da Lua e Castelo Rá-Tim-Bum. To- dos esses programas infantis têm algo em comum: a participação do roteirista e ator Flávio de Souza. Além de escrever e criar, foi ele que (mesmo não parecendo em nada com seu irmão em cena) deu vida a Tíbio. No Castelo, porém, sua atuação como ator foi menor, pois Flávio estava envolvido mesmo com os roteiros e a direção. Vimos na exposição do Castelo que, na verdade, ele iria ser o Rá Tim Bum II. Como surgiu a ideia de fazer um novo programa? Então, essa ideia foi da direção da TV Cultura, eu não sei exatamente quem, mas como disse, foi um programa muito experimental, muitas coisas não funcionaram. Todo mundo concordava com quase todas as coisas que não deram certo. Foi meio fácil, assim, decidir quais seriam as coisas que iam ser tiradas porque a ideia era tirar as coisas que não tinham dado muito certo e colocar outras no lugar. Então por isso que ia ser o Rá-Tim -Bum II. O Marcelo Tas e o Paulo Moreli não puderam participar das reuniões de criação e quem ia participar era o Fernando Meireles, que ia continuar sendo o diretor geral, eu, o Flávio Del Carlo, que ia continuar coordenando a parte de criação e o Fernando chamou o Cao Hamburger porque, os caras precisam participar desde o roteiro até a edição. Então ele passou muito tempo sem fazer coisas da produtora dele, porque ele já tinha uma pro- dutora, eu não sei se na época já chamava O2, mas eu acho que sim, ele não podia fazer a direção geral, ia ficar só coordenando. E aí eu não sei por que o Flavio Del Carlo não “A gente começou a inventar o Castelo Rá-Tim-Bum a partir de uma frase: Castelo do Doutor Victor”
  • 49. Depoimento - Flávio de Souza49 continuou e as outras pessoas também não puderam. Então, eu e o Cao Hamburger inventamos as coisas que iam entrar no lugar. Na primeira a gente ficou só inventando coisas que eram pra entrar no lugar e acabaram chegando ao Castelo como, por exemplo, o Nino. Porque no Rá-Tim-Bum tinha, na verdade tem ainda, um personagem que se chama Nina, uma menina feita por uma atriz adulta. E aí como ela fala- va coisas de menina, eu pensei que seria legal ter um Nino, pra falar coisas de menino. Inclusive, a atriz que fazia o papel é a Iara Jamra, minha amiga... pe- ças juntos. Esse quadro eu tinha feito especialmen- te para ela, porque tinha feito uma peça chamada ‘Parentes entre parênteses’, onde ela desempenhava o papel de uma menina de nove ou dez anos e fez muito bem, foi uma coisa que deu muito certo. Era muito convincente, parecia que ela era uma menina mesmo. E eu acho que é um dos quadros que deram super certo no programa, inclusive por causa dela. Mas aí ficou muita coisa especulando, como que ia ser o Ra-Tim-Bum II, porque as pessoas que fizeram de atores tinham vontade de participar dessa nova fase também, e aí não sei como a Iara soube que não ia mais ter a Nina porque ia ter o Nino, e aí ela ficou com muita raiva de mim. Daí teve uma segunda fase que a gente inventou tanta coisa nova pra entrar que a direção decidiu que era melhor criar um progra- ma novo, então eles meio que encomendaram um programa novo. E a gente acabou inventando nessa segunda fase as crianças que são o Pedro, a Biba e o
  • 50. Depoimento - Flávio de Souza 50 Zeca e mais outras coisas que acabaram entrando no Castelo. Era um programa muito maluco e tinha milhares de cenas, milhares de cenários, mas era um programa que não ia ser feito por custar, sei lá, um trilhão de dólares, uma coisa muito doida. E aí a gente apresentou esse projeto e eles falaram ‘gente, vocês trabalharam muito, parabéns, não sei o quê, mas veja bem, não dá pra fazer esse programa que vocês querem fazer. Vamos fazer uma coisa mais simples’. Então, como no Rá-Tim-Bum tinha aquelas histórias do “Senta que lá vem história”, a gente inventou vários lugares pra acontecer essas histó- rias no Rá-Tim-Bum II e um dos itens que tinham lá era o Castelo do Doutor Victor, que tem a ver com o Doutor Victor Frankstein do filme, uma das obsessões do Cao, tanto que ele tinha feito pouco tempo antes um desenho animado de animação com massinha. Daí, a partir disso que a gente começou a inventar o Castelo Rá-Tim-Bum. A partir de uma frase que tinha lá: “Castelo do Doutor Victor”. Quando foi decidido que seria um novo programa os patrocinadores colocaram mais dinheiro? O dinheiro foi o mesmo. Quanto tempo durou a criação? Eu não sei dizer exatamente. Foram vários meses, nove meses ou dez meses, não sei, sei que eu passei me encontrando com o Cao semanalmente, três, quatro vezes por semana, porque teve duas fases, na verdade três. Então por isso demorou tanto. E também porque é um programa gigantesco. Se você for pensar a quantidade de coisa que tem dentro, é uma loucura, porque tem o castelo, mas tem todos aqueles quadros. E na verdade, as histórias do Castelo servem pra ir praqueles quadros. Você criou os personagens Tíbio e Perônio? Sim! Na verdade eu e o Cao, mas principalmente eu. Eu tinha essa ideia que foi uma das ideias que não foram aceitas no Rá-Tim-Bum, fazer dois personagens que descobriam coisas aparentemente obvias, mas que na verdade não são. Eram personagens meio esqui- sitas que moravam em um lugar meio esquisito e eles acidentalmente descobriam pra quê
  • 51. Depoimento - Flávio de Souza51 que serve, por exemplo, o pires, pra que serve o pente, pra que servem as coisas. Então quando teve o Castelo eu vim, de novo, com a minha ideia e aí eles acabaram virando cientistas, talvez porque o pai do Cao é cientista, não sei, provavelmente foi ideia dele. Ou então não, tinha as coisas do currículo, das coisas que a gente tinha que trabalhar e aí falaram ‘bom, esses são dois personagens bons pra falarem de ciência’. E o nome eu tinha inventado antes, e na verdade era Tíbia e o Perônio, que são os nomes do osso mesmo, que se chama Tíbia, e não Tíbio. Mas eu gostava desse som e como o osso tinha a ver com coisas de ciência eu propus de chamar Tíbia e Perônio. No Mundo da Lua a ideia de interpretar foi do diretor. Desta vez, a ideia de inter- pretar foi sua? Também não! Foi o Cao que teve a ideia. Ele cismou, teve coisas que eu fiquei sabendo só agora por causa da exposição, acabei conversando bastante o assunto com o Henrique Stroeter, que é o Perônio. A gente é amigo, trabalhamos muito tempo juntos, sei lá, muitas vezes, mas é umas das coisas que ele me contou e eu não sabia exatamente como tinha sido. Ele foi fazer o teste pro Nino e aí o Cao falou que ele tinha ido muito bem e tal, mas que tava querendo que ele fizesse uma dupla de cientistas gêmeos comigo, porque vendo o teste ele o achou muito parecido comigo. E agente, se você for ver, não é muito pareci- do, mas de uma certa maneira ele viu um jeito, sei lá, meio infantil de ser, talvez, não sei, de interpretar, que realmente combinou muito eu e ele. Mas a ideia foi do Cao! Depois da decisão de interpretar, como foi a criação dos trejeitos dos personagens? A gente não criou muito... Aconteceu o seguinte: foi o segundo quadro a ser gravado, porque eu também achava que era o primeiro, mas depois o Henrique me falou que não, o primeiro a ser gravado foi o Mau. Depois foi o Tíbio e o Perônio e tem uma razão! Eu ia fazer uma peça, esse ano foi o ano mais louco da minha vida porque eu escrevi um seriado no SBT que depois acabou virando uma novela e acabou sendo suspenso e eu estava participando do Castelo e eu ia trabalhar de ator em uma peça dirigida pela Marília Pêra, inclusive eu fazia um dos papéis principais. Então ficou combinado que a gente ia fazer rápido, gravamos tudo em 15 dias, duas semanas, né? E é por isso que
  • 52. Depoimento - Flávio de Souza 52 eles tem barba também, porque eu tava deixando a barba, aí coitado do Henrique,foi obrigado a pôr aquela barba postiça e a minha também era, porque eu tava só com um pedaço da barba, tava deixan- do só bigode e cavanhaque e minha barba é rala e tava no começo ainda, não tava grande. A gente teve que fazer tudo muito rápido: teve uma reunião com o Cao e a gente experimentou a roupa, foi só isso que foi combinado. Aí a gente chegou um dia lá, numa segunda-feira, não sei, mas deve ter sido em uma segunda-feira, super cedo, naquela época eu trabalhava de noite, escrevia de noite e então eu tava sempre dormindo, pra mim o normal era dor- mir de manhã. E eu tive que acordar umas seis, seis e meia da manhã, então eu cheguei lá praticamente dormido e aquela maquiagem demorava quase uma hora pra ser feita, acho que era mais de uma hora até, no começo foi mais de uma hora, depois acaba- ram pegando prática. Aí a gente teve que começar a gravar, não teve assim tempo pra conversar e nem dava porque o Henrique, acho que ainda tava um pouco mais acordado, até poderia conversar algu- ma coisa, mas eu tava sem condições. A gente tinha que decorar um texto, muito texto, foram feitos vá- rios roteiros por dia, a gente não teve tempo de ficar combinando, ensaiando e vendo como eles iam ser. A única coisa que a gente combinou foi ‘olá, olá’. Mas tem um segredo: o Henrique foi bailarino, en- tão ele tinha uma coisa de mexer com o corpo, na verdade ele ainda tem, muito forte, muito mais for-
  • 53. Depoimento - Flávio de Souza53 te que eu, claro. Eu até fiz peça musical, fiz vários tipos de dança, sapateado, mas eu não cheguei a ser bailarino. Como foi sua reação depois que vocês se viram tão parecidos? A primeira veza gente se viu e falou ‘nossa, a gente tá re- almente parecido’, mas não ficamos muito impressiona- dos porque inclusive a gente tava com muito sono ainda, mas o cabelo era diferente e tinha sei lá o corpo também, ele era mais magro que eu. Aí a gente pôs a roupa e nem se viu no espelho, já foi indo empurrado pro estúdio por- que eles estavam com um cronograma gigantesco pra ser feito tudo em duas semanas. Então a gente não chegou a ficar se olhando no espelho. Mas aí teve um momento nesse primeiro dia que a gente estava esperando a hora de entrar, tinha um monitor no chão pra gente ver lá uma ordem do câmera e ele fazia um gesto pra saber que ia entrar e aí a gente ficou se olhando assim no monitor, e um dos dois, não lembro qual, falou: ‘Pera aí, qual que eu sou ali?’Então um dos dois mexeu o braço pra saber. Realmente o Cao tinha razão e a caracterização que o Carlos Gardin fez também ajudou muito, com certeza. Alguém chegou a te reconhecer na rua? Então, isso é que é engraçado, porque muitos adultos reconhecem a gente, mas as crianças, não, principal- mente criança pequena. Muitas vezes a gente encontra o pai que assistiu e eles falam ‘olha, é o Tíbio do Tíbio e o Perônio’, e a criança fica olhando pra gente com cara assim de ‘acho que meu pai enlouqueceu, não sei,
  • 54. Depoimento - Flávio de Souza 54 como assim?’Aconteceu bastante da gente ser reconhecido por causa da voz e também do jeito, não ficou completamente diferente, mas teve uma coisa que aconteceu comigo e com ele separados, aconteceu igual, assim: eu fui tomar um suco em um lugar e o carinha que tava no caixa, eu fiquei um tempo lá escolhendo o suco, ele ficou me olhan- do meio assim e deu tempo dele me reconhecer. Aí, na hora que eu dei o dinheiro, ele pegou e começou a chorar, aí eu falei: ‘você tá com algum problema?’; depois dele se acalmar um pouco, falou que a hora que ele acordou naquele dia ele não podia imaginar que ia encontrar com o Tíbio ao vivo na frente dele. Com o Henrique foi até mais engra- çado: o motorista do taxi falou que a filha dele tinha aprendido uma série de coisas por causa do Tíbio e Perônio e por causa disso ela tinha ido embora; ele começou a chorar e o Henrique chorou também. Existia uma equipe pedagógica nos infantis, certo? Como era a relação com eles? A relação com a equipe pedagógica era a pior possível no Rá-Tim-Bum. Quando che- gou o Castelo Rá-Tim-Bum, na verdade essa equipe foi substituída. Mas no Catavento foi muito difícil, inclusive foi o primeiro programa que eu escrevi e era o programa feito a partir de um currículo oficial da escola da rede pública e a chefa, vamos dizer, da equipe pedagógica, Fazia questão de que cada item daquele currículo fosse desenvol- vido. Eles não chegavam a mexer nos roteiros, mas ela cortava muito, principalmente no Rá-Tim-Bum, no Catavento não tinha o que fazer, então a gente fez um monte de reuniões com elas e era ela e mais duas pessoas, e enfim, eu fiz bastante coisa assim que eu não tinha vontade de fazer e que eu achava, inclusive, que era muito difícil. Por exemplo: você mostrar direita e esquerda na televisão é louco porque é como se fosse um espelho, é tudo ao contrário, né? Tinham algumas coisas que não funcionavam na televisão porque eram pra ser feitas em uma classe de aula com professora, professor. Precisava que a pessoa lesse ao vivo e com outras crianças, mas de qualquer maneira elas insistiram e insistiram e na verdade, de uma certa maneira, elas fizeram desafios. Pra mim foi bom porque eu desenvolvi a imaginação com essa coisa de inventar por- que, deixa eu falar uma outra coisa: a ideia, desde o Catavento, que acabou chegando no Castelo, era fazer e mostrar coisas com conteúdo pedagógico de uma maneira divertida,
  • 55. Depoimento - Flávio de Souza55 de uma maneira que as crianças não percebessem que elas estavam aprendendo. A ideia era conhecimento através do entretenimento, mas a Dona Célia Marques (só falei agora porque só agora eu lembrei o nome), achava que não precisava de entretenimento, só a informação era importante e não precisava de mais nada. No Catavento tinha muito pouco dinheiro, então não tinha como inventar muita coisa. No Rá-Tim-Bum, como tinha o patrocínio da FIESP, então as ideias puderam ser mais loucas, mais completas, mais complexas vamosdizer. E isso cria um problema porque ela achava que era desne- cessário e era exatamente isso que ela falava. Os roteiros iam pra ela e quando voltavam ela tinha riscado tudo que não fosse exatamente só informação. Então o esforço que a gente fazia pra desenvolver coisas como se fosse um invólucro do conteúdo deles, ela queria que jogasse no lixo, riscava. E o mais louco é que depois que o programa es- treou, que fez o sucesso absurdo assim como nunca tinha feito na TV Cultura, aí depois me falaram que ela passou a ir a muitas palestras no Brasil, ela viajou o Brasil inteiro e aí alguém foi em um desses lugares e viu a palestra dela e a palestra começava assim: “Nós, quando fizemos o programa Rá-Tim-Bum, pensamos que o conteúdo não podia vir sozinho, tinha que ter coisas em volta”, exatamente o que ela era contra. Foi uma surpresa o sucesso e o alto índice de audiência? Olha, foi e não foi, ao mesmo tempo. Por causa do sucesso do Rá-Tim-Bum e do Mun- do da Lua, não foi uma surpresa tão grande porque sei lá, não que a gente estivesse acostumado a fazer sucesso, porque a gente já tinha feito outras coisas que não tinham feito sucesso, mas não foi tão espantoso; agora, foi espantoso por causa do número, né? Realmente a audiência foi muito grande de manhã, de tarde e de noite. Inclusive de noite, horário nobre, passava no mesmo horário de uma das novelas da Globo, não sei exatamente qual delas. Naquela época você imaginou que dali vinte anos o programa teria feito tantos fãs? Não, mas isso é uma coisa que se alguém falar que imaginou é mentira, porque re- almente a gente não imaginou, inclusive, pra mim, ia ser mais um programa de tele- visão. É claro que era um programa especial porque era enorme e tinha patrocínio,
  • 56. Depoimento - Flávio de Souza 56 mas não imaginei que fosse ser visto vinte anos depois e tivesse tanta gente gostando tanto. A gente escuta muito ‘você fez parte da minha infância, muito obrigado, você tornou a minha infância melhor’. A gente não imaginava. Por que o Castelo teve mais visibilidade que os outros infantis? Os personagens principais que aparecem todo dia apare- cem bastante, metade de cada episódio acontece no Cas- telo. E aí tem o Mickey no castelo que é o Nino, tem as crianças e tem vários personagens que se repetem, né? Eles aparecem mais por semana, vamos dizer assim. E tem um acabamento que é maior que o dos outros programas. En- tão eu acho assim, teve gente talentosa e com muita experi- ência. E é uma coisa também que não tem explicação, que nem teatro. Você não sabe porque uma peça faz um monte de sucesso e outra não, entendeu? Às vezes tem peça que você acha boa, mas que não faz sucesso, e uma que faz sucesso e você não acha tão boa. Por que, apesar do sucesso, o programa não teve conti- nuidade? Isso aí é uma coisa que vocês têm que perguntar pra alguém da presidência da TV Cultura. O que aconteceu, eu acho que aconteceu várias vezes na TV Cultura, mudou o presidente e aí, eu acho, não posso afirmar porque eu não sei exatamente, ninguém me falou, mas eu desconfio que era porque o novo presidente queria ter um novo programa e não continuar com o programa do mandato anterior. Porque tem uma coisa assim de política. É isso.
  • 57. Depoimento - Flávio de Souza57 Você sabe se foi muito cara a produção do Castelo? Foi caríssima! Porque além de ter o patrocínio, teve as coisas da TV Cultura, os estúdios, até pessoas já contratadas da cenografia, eu já tava lá antes de ser contratado, a ilumi- nação, as câmeras. Eu sei que muitas coisas foram compradas, principalmente pro Rá- Tim-Bum, mas no Castelo acho que eles ainda compraram mais, não sei nem se dá pra calcular tudo isso exatamente, quanto que custou o Castelo contando com tudo, com ilhas de edição, mas foi muito caro. Eu acho até que é um dos motivos de não ser feito de novo. Quando foi que você se deu conta da proporção do sucesso? Ah, eu não sei exatamente quando foi. Na verdade eu sei quando foi, não sei exata-
  • 58. Depoimento - Flávio de Souza 58 mente que dia e que mês e nem de que ano, mas quando teve o lançamento dos livros do Castelo editado pela Companhia das Letrinhas... Era uma coleção, na verdade quando lançou só tinham três, e aí eles fizeram um lançamento no Museu da Casa Brasileira, acharam que iriam quinhentas pessoas, mil pessoas, e aí não sabe quan- tas pessoas foram porque ninguém conseguiu contar, mas com certeza umas dez mil pessoas, talvez até mais, porque teve gente que falou que viu carros passando na rua, vendo a fila e indo embora, entendeu? Desistindo. Foi meio parecido com que o que está acontecendo agora na exposição, filas que davam a volta no quarteirão. Eu fiquei com a mão doendo de tanto que eu dei autógrafo, porque eu fiz questão de ficar até o fim, mas foi uma loucura porque Cassio Scapinestava lá vestido de Nino. Foi a pri- meira vez que o Nino apareceu ao vivo em algum lugar e realmente foi meio absurdo. Uma hora acharam que ia acontecer uma tragédia porque tinha uma porta pra entrar e outra pra sair e tinha a fila que dava volta no quarteirão. Teve gente que não entendeu como que entrava, como era a história da fila e começaram a tentar entrar pela saída. Então as pessoas que queriam sair não conseguiam sair, virou um bolo, uma confu- são. Eu acho que tinha bombeiro própria Casa Brasileira e eles tiveram que interferir, fazer alguma coisa, organizar a confusão porque tava virando uma coisa complicada e com crianças. Realmente foi nesse dia. Você participou da adaptação cinematográfica? E da peça? A adaptação é uma história meio complicada. Eu fiz as três primeiras versões do rotei- ro, depois eu saí. E eu escrevi todas as peças do Castelo, inclusive, principalmente a primeira, eu fui um dos produtores. ■
  • 59. Depoimento - Bia Rosenberg59
  • 60. Depoimento - Bia Rosenberg 60 Bia Rosenberg foi chefe de departamento infantil da TV Cultura na época em que pro- gramas infantis eram o grande investimento da emissora. X-Tudo, Mundo da Lua, Perigo, Perigo, Perigo, e claro, Castelo Rá-Tim-Bum são apenas alguns dos programas nos quais estava envolvida. Nosso papo aconteceu no mesmo local onde há vinte anos, em meio a luzes, paredes falsas, e muito trabalho, o Castelo foi construído. Como você entrou no projeto do Castelo? Eu estava na chefia do departamento infantil e na TV Cultura desde o último ano do curso de Rádio e TV. Fiz programas de música, ensino, entrevistas, muitas coisas. Eu comecei a fazer programas infantis no meio da década de 1980, em 88 fiz o especial “Banho deAven- tura”, que era a história do Júlio, do Cocoricó. Voltando ao Castelo, quando ele começou, ainda não tinha um nome, apenas era um programa bem legal para crianças. Como eu estava no departamento infantil não tinha como eu não participar, né? Você participou então da criação do programa, dando palpites? Eu participei de algumas das primeiras reuniões, porque foi um grupo que se reuniu, Flávio de Souza, Cao Hambúrguer, Fernando Meirelles, Flávio Del Carlo e eu. Nós nos reunimos e conversamos, acabei saindo, tinha outros projetos. Eles fizeram a criação do programa. Na verdade o projeto original era gigante, ele tinha muito mais histórias e só uma delas vingou, que foi o Castelo. “Quando vimos o primeiro, percebemos que tinha ficado bacana.”
  • 61. Depoimento - Bia Rosenberg61 O Castelo era para ser um quadro, apenas? Não era exatamente um quadro. As três crianças andavam por diferentes lugares e por di- ferentes programas, iam para a escola, pro cinema e pro Castelo. Como o projeto era muito grande e inviável, eles tinham que escolher apenas um local e foi escolhido o Castelo. Por ser um programa infantil, ele passava por uma orientação pedagógica, cer- to? Como era essa relação? Aqui na Cultura sempre houve um grupo de professores, com psicólogos, que faziam a orientação pedagógica de todos os projetos. Eles liam tudo que fosse para crian- ça e programas de educação, eles participavam, comentavam, iam desde corrigir o português até dizer que tal cena estava inadequada para essa faixa etária. Isso já era comum na TV Cultura, mas alguns projetos precisavam de orientação especializada. O Castelo também trouxe uma orientação especializada, com a Zélia Cavalcanti, que trouxe para nós a questão do construtivismo, e a ideia de que você poderia explicar qualquer coisa para as crianças, desde que essas coisas estivessem contextualizadas, e não só ‘vai escovar os dentes’, mas que você pudesse trazer a informação atrelada ao conjunto de informações emocionais, práticas e que fizessem sentido. Aí houve uma opção do Castelo não seguir a linha curricular, como o Rá-Tim-Bum seguia. O Caste- lo optou por trazer conteúdos que fossem complementares à escola, como história da arte, ciências, tinha formas geométricas também, música, diversidade. Essas coisas foram trazidas para compor o cardápio do Castelo. A orientação pedagógica no Rá-Tim-Bum e no Mundo da Lua foi bem complicada, no Castelo como foi? Foi bem tranquilo. No Mundo da Lua e no Ra-Tim-Bum, a consultoria foi realizada com profissionais aqui dentro da Cultura. Deixa eu dar um exemplo: no especial Banho de Aventura, que eu estava envolvida, e foi transmitido no Senta que lá vem História, o Júlio tem uma cena em que ele é amarrado por uma bruxa em uma árvore, e a consulto- ria vetou que personagens fossem amarrados, mas vetaram mesmo sendo bonecos. No Castelo foi harmonioso, e no decorrer dos anos, eu aprendi a lidar com a consultoria
  • 62. Depoimento - Bia Rosenberg 62 pedagógica, acho inclusive que é bastante importante esse trabalho, antigamente eles davam a palavra final, o que hoje não acontece mais. Eles tinham poder de veto? Sim, se eles achavam que tinham algo inadequado. Mas no Castelo não tinha nada inade- quado. Todos já estavam acostumados com a orientação pedagógica, eles se formaram das outras produções, como se todos fossem um família. Você acompanhava a escolha de elenco? Dava sua opinião? Dava palpite sim. Era uma coisa consensual. Nós chegamos num consenso de grupo. As crianças, principalmente, nós precisávamos formar um trio de crianças. Na exposição do
  • 63. Depoimento - Bia Rosenberg63 Castelo, inclusive, tem umas imagens dos testes das crianças. Quanto tempo durou o processo todo? Eu fiquei do começou ao fim. Eu estava na chefia em 1990, fizemos o Mundo da Lua, X-Tudo, Pe- rigo, Perigo, Perigo. Eu não me lembro de quanto tempo durou. Única coisa que me lembro: o pro- grama estreou em 1994, mas nós ainda estávamos gravando quando ele foi ao ar. Talvez começamos em 1992, não lembro ao certo. Teve alguma ocasião na qual você percebeu o sucesso? Quando o programa marcou 10 pontos de audi- ência. A média de audiência da TV Cultura é três. Mas para ser sincera, nós estávamos tão ocupados que não dava para parar. Foi um trabalho que não teve pré-teste, até a primeira edição do primeiro programa que ficou pronto, o episódio 16, já que nós gravamos todos os quadros separados, e estes foram gravados bem antes estúdio principal ficar pronto. Todos foram gravando, e ninguém tinha visto a edição final, isso quer dizer, a história mis- turada com os quadros. Eu estava muito insegura se ia dar certo. O primeiro Rá-Tim-Bum era mais ou menos assim, quadro, quadro, quadro, quadro e uma história no meio, já o Castelo era o contrario, é uma história com quadros no meio. Ele tinha uma estrutura diferente e não tínhamos experimentado
  • 64. Depoimento - Bia Rosenberg 64 para ver como ia ser. Quando vimos o primeiro, percebemos que tinha ficado bacana. O castelo vinha de uma escola de infantis da TV Cultura, de uma escola que vinha do Ca- tavento, do Curumim, tinha o Bambalalão, esses programas foram fazendo uma escola, e esta foi se desenvolvendo. Não dependia apenas de uma boa ideia, ao contrário, uma boa ideia é fácil, precisava fazer e a TV Cultura estava disposta a fazer, toda a estrutura de cenário, de figurino, de efeitos especiais, de boneco, de atores, de música, de produção... Toda a equipe estava afinada. Então foi trazer um projeto bonito e legal para uma estrutura que estava pronta. Às vezes eu achava que se um diretor ruim viesse o programa ia ficar bom, mas isso não é verdade, é apenas um exemplo para dizer como a estrutura era boa, se um diretor ruim viesse o programa ia ficar ruim, mesmo com a estrutura. Mas eu acho que tínhamos muitos talentos, e a estrutura funcionava muito bem, muito criativa. Foi muito cara a produção do Castelo? Eu sei dizer que hoje não faríamos. Quando digo que não faríamos, é que ninguém faria. Porque foi uma produção muito cara, não sei grana, não sei nada. Era um ritmo TV Cultu- ra, todo mundo ganhava pouco, ninguém ficou rico com o Castelo. A maioria das despesas eram absorvidas, por que não eram custos direitos, os funcionários eram todos da Cultura, era um projeto muito caro. É verdade que houve uma inspiração vindo de você para ser a cobra Celeste? Vocês que me dizem, é verdade? Noooossa! Mas é verdade sim. O Álvaro é um querido, e eu falo desse jeito, eu sempre falei assim. Qual o diferencial do Castelo? Por que ele se sobressaiu entre os outros programas infantis? O Castelo tem uma estrutura dramática muito forte. O Rá-Tim-Bum tinha os quadros, era muito divertido, mas não tinha uma história, apesar de ter o senta que lá vem história, mas não tinha uma história forte. Já com o Castelo, tinha uma história aonde os personagens se repetem, tinha aventura, digamos que é o principio das sitcons americanas, só que com um cenário muito mais amplo do que eram as sitcons. O Castelo contava muito bem uma
  • 65. Depoimento - Bia Rosenberg65 história, o conjunto dos personagens foi muito legal, deu tudo super certo, os convidados eram muito interessantes, os bonecos eram divertidos, os roteiros eram muito bons. O motivo do sucesso: era uma produção gigantesca, o Mundo da Lua também fez muito sucesso, mas a produção era fichinha. O Cas- telo também teve seus altos e baixos, nem todos os quadros eram muito bons, tem alguns que não gosto muito. Mas ele tinha essa magia, um encantamento, o Tio Victor e Morgana que nem sempre apareciam muito, mas sempre estavam presentes nas histórias, e acabam compondo um universo mágico em que crianças saem de seus cotidianos que é a cidade de São Paulo e entram no Castelo, afinal quem não quer? É um sonho. São esses aspectos todos que contribuíram para o sucesso dele. Era bombeiro, tinha que apagar incêndio... Mais ou menos isso. Tivemos que cancelar gravações no zoológico, e passou para outro dia, teve cenas que foram regravadas, que ninguém soube, era uma coisa interna. Mas teve muita coisa, um projeto desse tamanho é muito difícil não ter problemas. Num modo geral todo mundo ganhava pouco e gravavam para caramba.
  • 66. Depoimento - Bia Rosenberg 66 Teve o caso também que o Sergio Mamber- ti ficava embaixo do bolo e tinham velas em cima e pegou fogo, mas temos equipe contra- fogo. As crianças vinham da escola, não tinha ar condicionado.Acho que foi a maior tragédia não ter ar condicionado. Tinha que gravar cena de inverno, e era muito quente, e os figurinos eram quentes, né? As luzes também esquenta- vam bastante o estúdio. Você lembra mais ou menos o número de cartas de fãs que mandavam para a Cul- tura? Não tenho a mínima ideia. Provavelmente por causa do dia das crianças, o que eu me lembro é que pedimos mandarem desenhos. Não lem- bro se foi o Mundo da Lua, mas enfim. Veio tanto desenho que meses depois ainda colocá- vamos como vinheta, e os desenhos não aca- bavam nunca. Não sei quantas cartas vieram. É verdade essa história de que algumas crianças mandaram moedas porque des- cobriram que o programa não teria con- tinuidade? É verdade sim. Não sei para quem foram as cartas, mas isso é verdade. Nunca vi es- sas moedas. Também tinha uma história do acréscimo da conta de luz, não me lembro de detalhes, são nevoas. ■
  • 67. Tchau, não! Até amanhã205 Tchau, não! Até amanhã Hoje, de volta a 2014 e vinte anos depois da exibição do primeiro episódio do Castelo Rá-Tim-Bum, a TV Cultura ainda colhe os frutos. Já no final de 1994, o Castelo foi premiado pela APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes) como melhor programa infantil daquele ano. No ano seguinte, participou do Festival de Nova York e re- cebeu a medalha de prata na categoria programação infantil. Com isso, também ganhou reconhecimento internacional ao ser exibido em vários países – não existem informações precisas sobre todas as nações que puderam assistir as aventuras de Nino. De acordo com reportagem do jornal Folha de São Paulo de 22 de fevereiro de 1995, o programa foi exportado para Cuba e a República Dominicana. Anos depois, o Castelo acabou migrando para os palcos, com a peça “Onde está o Nino?”, que ficou oito meses em cartaz no TUCA (Teatro da Universidade Católica de São Paulo), chegando a 190 mil espectadores, com direito a turnê por todo o país. O texto ficou por conta do co-criador Flávio de Souza, direção de Mira Haar. Cássio Scapin, Freddy Allan, Cinthia Rachel e Luciano Amaral viveram, respectivamente, Nino, Zequinha, Biba e Pedro, os mesmos intérpretes que fizeram o programa de tevê. Anos mais tarde, Cao Hamburger, diretor e um dos criadores do programa, foi responsável por trazer a mágica história do castelo de Dr. Victor para os cinemas, em primeiro de janeiro de 2000. Com algumas alterações na história original, Marieta Severo foi escolhida para ser a principal antagonista, enquanto Rosi Campos e Sergio Mamberti ficaram com os papeis originais. Vários produtos foram licenciados com a marca do Castelo Rá-Tim-Bum, como coleções de livros que venderam cerca de 55 mil exemplares, além VHS, CDs, jogos, calçados, brinquedos e materiais es- colares. O programa rendeu à TV Cultura muito mais do que recordes de audiência. Há quem diga que a emissora faturou 5 milhões de reais com licenciamentos de produtos desde 1995, superando o valor inicial pago pela TV Cultura e pelo FIESP. Sucesso incontestável duas décadas depois,
  • 68. Tchau, não! Até amanhã 206 a exposição sobre o programa realizada no Museu da Imagem e do Som (MIS) desde julho de 2014, com sucessivos adiamentos para antes de encerrar, provou a vitalidade da produção infanto-juvenil. Para tentar recuperar os bastidores desse sucesso, realizamos 20 entrevistas com profissionais envolvidos com o programa, durante três meses. Apenas 15 foram re- produzidas na íntegra, as demais ajudam a subsidiar as duas reportagens iniciais deste livro. Para nós foi um prazer poder descobrir detalhes da produção, notar o quanto o programa que vimos quando crianças tinha preocupações minuciosas, tipo a contrata- ção de profissionais para evitar erros gramaticais. A intenção foi sempre realizar um bate-papo com os entrevistados. No entanto, nunca deixamos de lado nossa condição de fãs, tanto que pedimos para tirar fotos com todos eles. A viagem que vocês puderam acompanhar, junto conosco, percorreu os anos mais produtivos da TV Cultura. Uma das conclusões que tivemos deste trabalho foi que a magia e a diversão do Castelo Rá-Tim-Bum sempre estarão disponíveis para quem for visitar o Nino, mesmo ele tendo hoje 320 anos. Esperamos que você, leitor, possa ter tido as mesmas emoções que nós, autores, tivemos. Mesmo aqui, nesta reta final, é importante dizer que o embarque estará livre pra quem quiser se aventurar novamente, inclusive, quem sabe, na continuação deste projeto. A viagem ainda não acabou. Por enquanto, vai o inevitável “Bum Bum Bum, Castelo Rá-Tim-Bum” bem forte pra você.