1. O documento descreve um caso de violência obstétrica contra uma menina de 16 anos durante o parto em uma maternidade. A médica responsável submeteu a menina a diversos atos de tortura física e psicológica, ignorando suas súplicas de parar.
2. A médica rompeu artificialmente a bolsa d'água da menina, realizou procedimentos dolorosos sem consentimento e a ameaçou verbalmente. Seu objetivo era punir a menina por ter engravidado cedo.
3. O
3. Parte lV - C
5. O corporativismo obstétrico e a hegemonia médica no parto com sessões de tortura numa
menina-mulher de dezesseis anos
12. Análise de caso de violência obstétrica publicado pelo Jornal
O ESTADO de São Paulo, 26022016
28. Para uma política psicossocial transformadora:
sequelas das mães rasgadas e crianças desorientadas
32. A violação dos direitos da mulher-mãe no parto obstétrico: a síndrome da tortura obstétrica no
Brasil -Algumas reflexões da política psicossocial transformadora, da pessoa paisagem,
sobre os seguintes tópicos
33. Vocabulário português
36. Prefixos e sufixos em terminologia médica ocidental
37. Bibliografia
4.
5. O CORPORATIVISMO OBSTÉTRICO E A HEGEMONIA MÉDICA NO PARTO
COM SESSÕES DE TORTURA NUMA MENINA-MÃE DE DEZESSEIS ANOS
A violência obstétrica, tortura obstétrica institucionalizada, maus tratos em
menina-mulher gestante precoce, primípara e de termo.
Se a torturadora, a “doutora”, vê a vítima, a menina-mãe, e
não a ouve e continua a “castigá-la” por estar precocemente
grávida, isso caracteriza-se como um ato mortificante.
Relatos de sessões de tortura obstétrica,
física e psíquica numa menina-mãe de 16 anos.
O ESTADO de São Paulo, 26022016
6. A obstetra disse:
“a obstetra aqui sou eu”.
“Ah, você está fazendo fiasco”,
e rompeu a bolsa d’água da
5. parturiente, ... escorrendo liquido claro.
•
“Quem é a obstetra aqui? É tu?
Vamos acabar com isso já”.
A obstetra, impaciente, gritou para minha
colega realizar a manobra de Kristeller.
10. Ela se negou, respondendo
“que nós não realizamos aquilo”.
A médica brigou conosco, xingou todo mundo e
mandou a enfermeira subir na escadinha e fazer.
A enfermeira ‘quase montou’.
15. A paciente berrava para que parassem.
A menina dizia que doía muito
e que não conseguia respirar.
“Cala boca!”, gritou a obstetra
e subiu na paciente também.
20. Não conseguindo satisfazer seu desejo,
7. ela se enfureceu
e fez episiotomia, rasgando
o períneo da menina-mãe.
Não julgando suficiente, ela
25. mandou a enfermeira fazer o
fórceps em carne viva.
A paciente berrou de dor.
A episiotomia e o fórceps foram feitos
contra a vontade da paciente.
30. Era só ter paciência, não
havia sofrimento fetal.
Novamente, ouviu-se a voz da doutora:
“é assim mesmo, filha”.
Eu disse que não, não era, que
35. não precisava ser assim horrível,
enquanto suturava aquele corte profundo,
enorme que ia até quase a nádega da moça.
Solicitei gelo perineal à enfermagem,
para reduzir o edema. Elas disseram:
40. “só se a doutora prescrever”.
8. Daí, me humilhei na frente da
obstetra e consegui o gelo.
A “doutora” disse que tinha sido bom
“PARA ELA VER QUE POR FILHO NO MUNDO
45. NÃO É BRINCADEIRA”.
Ainda levei uma bronca por
“ter deixado a família entrar”.
Quando retruquei dizendo que é lei
federal, ouvi da doutora:
50. “MAS ELES NÃO SABEM”...
O ESTADO de São Paulo, 26022016
O que é mais vergonhoso, torturante e mortificante?
A ignorância da menina-mãe e da mãe dela ou os atos praticados
conscientemente, racionalmente e irracionalmente pela
OBSTETRA CRIMINOSA E SUA EQUIPE?
9. Este caso revela-nos todas as verdades criminosas que os(as) ‘doutores(as) obstetras’
sempre andaram negando, mentindo por anos e anos a fio. Foram desmascarados em seu próprio
covil , conforme diz o ditado: o podre sempre fede.
2. Este estudo, desenvolvido ao longo de muitos anos, nos levou a obtenção de informações que
nos permitiram adentrar no universo trágico da TORTURA OBSTÉTRICA sofrida pelas mulheres-
mães por meio de intervenções nos nascimentos de suas crianças sob supervisão médica nas
ESCOLAS-MATERNIDADES, nas instituições do SUS ou nas maternidades privadas.
3. Para melhor compreender este comportamento e com isto conseguir apontar eficazmente sua
existência, vamos fortalecer a denúncia contra ela, e vamos concretamente cooperar para o fim de
todas as práticas repressivas contra as mulheres-mães e suas crianças sem distinção de classe,
cor ou idade.
4. Ao contrário do que pensam os residentes, os supervisores e os professores universitários
formadores da classe médica feminina e masculina, não se pode manter impune as instituições e
os nomes das criminosas e dos criminosos que trituram ‘meninas-mães’, mulheres-mães e suas
crianças a seu mero prazer, deixando-as com danos irreversíveis e irreparáveis para toda sua vida.
Não se pode aceitar passivamente que continuem a colar tampões de vinagre na boca e a
descarregar torrentes de ódio sobre suas vítimas.
5. Não se pode aceitar com indiferença este modelo retrógrado, bárbaro e feroz da delinquência
acadêmica. NÃO SÃO NORMAIS AS MUTILAÇÕES DO VENTRE MATERNO POR HOMENS E
MUITO MENOS POR MULHERES MASCULINIZADAS CIVILIZADAS! A tortura obstétrica se
encontra institucionalizada no Brasil como uma forma de violência contra a ‘menina-mãe e a
mulher-mãe e a sua criança.
10. 6. A perda da autoestima, a frustração e a insegurança são fatores centrais na vida de numerosas
famílias contemporâneas que passaram por essas experiências. Isso tem sido traduzido nas
relações sociais entre mães e suas crianças e entre o casal, onde as distorções e mágoas
profundas deixaram cicatrizes em seu conteúdo psicossocial.
7. A constatação da derrota do projeto de ser mulher-mãe se associa rapidamente a comoções
pessoais importantes e aos danos significativos, que repercutem nela e em seu grupo psicossocial
e familiar, em seu trabalho e em seu futuro. O passado que foi vivido de uma forma inspiradora e
legítima com uma percepção e um sentir pessoal de seu ventre, acabou por se transformar em um
elemento de estigmatização, de ameaça vital e de perdas.
8. Dentro dessa situação de barbárie, a pergunta fundamental é: como pode uma médica obstetra
e professora-supervisora querer despedaçar a personalidade e a identidade de uma menor de
idade e gerar desalento e sofrimento numa menina-mulher prestes a ser mãe?
Outra pergunta é: quais são as circunstâncias sociais, políticas e psicológicas que dão
espaço à tortura institucionalizada? Para responder a estas perguntas, nos encorajamos a fazer
uma breve análise do caso.
11. Diagrama 51
A repressão obstétrica como causante de transtornos que afetam as relações
familiares. As famílias se utilizam de explicações e de fantasias distorcidas na tentativa de
esquecer o sofrimento e continuar sobrevivendo. A partir dessa situação traumática, se tecem
experiências de tensão acumulativa para a mãe e sua criança.
12. ANÁLISE DE CASO DE VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA
PUBLICADO PELO JORNAL “O ESTADO DE SÃO PAULO”, EM
26022016
Estudante de medicina desabafa
depois de assistir a parto violento realizada pela professora
Histórico do caso e sua análise descritiva e evolutiva
“Uma menina de 16 anos, grávida pela primeira vez, chega a maternidade, com
contrações ritmadas e sete centímetros de dilatação pélvica. Não se queixava de dores fortes,
apenas de desconforto e certo cansaço”.
O primeiro fato a ser observado é que estamos diante de uma menina mulher gestante
precoce primípara e de termo (concluída a gestação normal).
2. A condição social da menor de idade chama a atenção da burguesia acadêmica. Ela devia
pertencer aos grupos mais brutalmente afetados pela marginalização, discriminação (os sem voz)
da política psicossocial autoritária. Ela e sua mãe (acompanhante) não demonstram lucidez
mínima sobre quão perniciosa e maléfica pode ser a imagem que alguns médicos e algumas
médicas tem de uma gravidez precoce.
13. 3. Despertou o sadismo e a discriminação na insegura equipe obstétrica, a qual reagiu com
represálias sistematizadas. Seguramente, essa equipe estava formada por pessoas não sádicas e
‘honestas’ que simplesmente faziam seu trabalho de parto mecânico repulsivo, em que a tortura,
se não era, foi legitimamente institucionalizada.
4. A menor caminhava acompanhada pela estudante-residente estagiária tranquilamente.
“Andamos pelos corredores, do lado de fora da sala do pré-parto, das 23 horas até
meia–noite. Tudo corria bem, eu fazia massagens na sua região lombar”.
Percebe-se que nesta relação social parturiente-residente insinuava-se um compromisso
que transcendia o espaço do exclusivamente profissional. A residente se sentia particularmente
comprometida a assistir e a compartilhar as emoções vinculadas a essas experiências com a
parturiente menor de idade.
5. Surge inesperadamente a médica, testa de ferro
“De repente, surge no local a ‘médica-professora’ plantonista para atender outra
paciente que estava na mesma sala, já que não há pré-parto individual. Ignorando meu relato de
que a paciente estava evoluindo super bem ela prescreve ocitocina”.
Ideologicamente e eticamente engajada a seus motivos profissionais, ela sentiu que não
foi valorizada como residente e que uma nova experiência e um desafio escalofriante estava por vir
através da testa de ferro.
14. 6. A primeira resposta da médica-professora foi o silêncio, ignorando a educanda e rompendo o
vínculo professora-aluna. Aqui começou a quebra de todas as normas naturais e o surgimento de
um ambiente geral de ANOMIA, em que estariam literalmente suspensas as normas éticas
socialmente válidas. Tudo isso resultou numa experiência massiva de vivências inéditas de
violência, danos, destruição, brutalidade e perdas de limites em todos os planos.
Primeira interferência
7. A prescrição da ocitocina ignorando os apelos da menina e de sua mãe
A médica prescreveu ocitocina (hormônio usado para estimular as contrações)
diretamente no soro, sem o uso de bomba de infusão, a correr, sem controle preciso do número de
gotas, apesar da paciente e da mãe dela terem dito que não queriam.
8. O binômio, testa de ferro e a ocitocina vieram para interferir violentamente na evolução natural
do parto, provocando apreensão na mãe quanto ao estado físico e psíquico da filha parturiente,
pois ainda que não se evidenciasse os sintomas de contrações bruscas, ela estava sendo
testemunha de uma repressão e intervenção no parto natural. Aqui, cabe a nós outros
questionarmos como é possível uma mulher-médica obstetra lesar uma outra pessoa, menor de
idade e parturiente de forma deliberada e consciente?
9. A seguir, algumas hipóteses que responderiam a estas perguntas. As torturadoras são possíveis
num sistema que as condiciona à obediência dentro de uma instituição autoritária de hierarquia
rígida. Outro elemento que permite compreender a prática da tortura obstétrica é o hábito da
crueldade e da violência como parte da cultura educacional dentro das universidades de
medicina.
15. Segunda interferência
10. “A obstetra aqui sou eu!” ‘Ah, você está fazendo é fiasco’. E rompeu a bolsa d’água
“Sabe com quem está lidando?” é a frase que traduz a carteirada obstétrica, o famoso
jargão da impunidade e do autoritarismo. Os maus tratos e as sessões físicas de tortura estavam a
eclodir junto às ironias autoritárias da delinquente acadêmica.
11. “A paciente começou a sentir contrações dolorosas, ficando impossibilitada de caminhar. A
obstetra mandou-a deitar na cama, para novo exame de toque, dizendo. ‘Ah, você está fazendo é
fiasco’. E rompeu a bolsa d’água da parturiente, escorrendo líquido claro”.
12. O rompimento da bolsa d’água fez com que a menina-mulher ficasse possuída pelo pânico,
desgarrada, totalmente indefesa e cheia de confusões, sem poder reagir. Deve ter se sentido
infinitamente só. Ela só tinha ido à maternidade para parir, no entanto logo lhe infundiram o terror
esmagador e demolidor. Na dimensão psicossocial autoritária, o mais significativo deste
processo se observa na estigmatização de uma identidade maligna da menina-mulher, prejudicial
para a sociedade, transgressora, hostil, precocemente grávida. Essa identidade maligna permitiu a
conduta de dano por parte da ‘testa de ferro’, a delinquente acadêmica que vestiu a carapuça
institucional autoritária.
13. A agressão a menor, a menina-mulher, continuou a ser praticada com obscenidades. Ela foi
ameaçada, violentada. Podia lhe suceder qualquer coisa mais e ela se encontrava completamente
indefesa, começava a perder seu tempo e seu espaço, sentindo-se sem chão, sem explicação
alguma. O medo massivo inundava o corpo tomado pela droga indigesta e pelas agressões
covardes da delinquente acadêmica.
16. 14. “Os batimentos cardíacos do bebê estavam ótimos, eu captava com o sonar a cada dez
minutos, preocupada com tanta citocina...”.
Para a menor, o mundo de sonhos e de convicções, antes reluzente, primaveril, colorido
e vigoroso, se transformava numa silhueta flácida, vaga, quase inexistente.
15. Vamos acabar com isso já!
Eu tentava argumentar com a obstetra: “Dra, ela estava com contrações efetivas,
ritmadas”. Mas ouvi: “Agora são meia-noite e meia. Vamos acabar com isso já! E repetiu a pérola”.
16. Aqui se mantém com a parturiente uma atitude contraditória subjetiva que geralmente
implica numa dupla mensagem. Observa-se uma comunicação distorcida entre a equipe, pois por
uma parte a residente buscava tranquilizar a “doutora” e por outra, queria tranquilizar a menina-
mulher, dizendo-lhe que tudo já havia se passado, que ela e a criança ficariam bem, que tudo
estava tranquilo. No entanto, para a mulher-mãe que na realidade seguia vigiada, acuada,
ameaçada, com seu futuro incerto, o perigo ainda estava presente. As atitudes da obstetra
carrasca e as intervenções intermitentes da residente deixavam a jovem mãe confusa e em
constante tensão. Meias palavras não bastavam para tranquilizá-la.
17. “Quem é a obstetra aqui? É tu?
“... lá pelas duas da manhã, a paciente já estava com dilatação total, mas o bebê ainda estava
alto. E a “doutora” tascou outro soro com ocitocina na moça, sobre protestos da paciente, da
mãe, que era sua acompanhante, e meus”.
17. 18. A presença da situação traumática, as ameaças concretizadas e repetidas à mulher-mãe
certamente a sobressaltava, porém a sua pulsação em nenhum momento foi medida ou
acompanhada.
A garantia de direitos individuais de escolha continuava a ser restringida e ameaçada
com arbitrariedades e imposições. A concepção do mundo da mulher-mãe começou a se
desarticular no momento em que lhe gritaram através dessas atitudes sua condição de
delinquente juvenil, de ser desprezível. Não importavam as suas “súplicas e nem as de sua
mãe”, elas tinham o poder de lhe dar a morte em vida e de lhe tirar a dor por suas ‘transgressões
juvenis precoces’. Mais valia evitar novas e dolorosas torturas, evitando reclamar.
19. Interrupção do parto com gestos rudes
“Na sequência, levei super bronca porque deixei a paciente beber água. Bom, quando o
bebê desceu e estava quase nascendo, a doutora, com gestos rudes, fez a paciente levantar-se do
leito e me pediu para levá-la para a sala de parto a cerca de dez metros dali”.
Por que o parto deve ser feito obrigatoriamente sobre a mesa ginecológica, na sala de
parto? Por um lado, é válido lembrar que essa conduta está sancionada por uma série de valores
de intervenção cultural que contribuem e regulamentam o que é proibido ou permitido para a
autoafirmação do poder.
20. Na cultura latino-americana, é possível observar valores relevantes e recorrentes em torno do
machismo como sobrevalorização do masculino. Por outro lado, se todo mundo fica morrendo de
medo que o neném nasça na cama (mas quando a criança nasce num corredor ou na calçada do
hospital, ninguém diz nada) por que, então, acham que o parto deve ser feito obrigatoriamente
sobre a mesa ginecológica, na sala de parto ou na sala de inibição do parto, quando o nenê
está para nascer? Como afirmam as parteiras-obstetras, “a equipe geralmente se apavora e
deixam a mulher que vai ser mãe mais assustada”.
18. A instância tirânica
“A enfermeira e a obstetra realizam a manobra distorcida de Kristeller e sobem na menina ...”
“A obstetra, impaciente, gritou para minha colega realizar a manobra de Kristeller, subir na cliente”
“Cala boca!”, gritou a obstetra e subiu na paciente.
Queremos elucidar que quando nos relatam o parto com os verbos: ‘sobem’, ‘subir’, ‘subiu’ na
menina”, presumimos que concretizaram o ato com a manobra perversa do cavalo,
cujo poder é incomensurável. Essa instância tirânica aterroriza, aniquila, paralisa e a
angústia da morte vem pela falta de ar.
19. 21. A enfermeira e a obstetra realizam a manobra de *Kristeller e sobem na paciente
“... posicionamos a paciente deitada, em litotomia. A cabeça do bebê vinha descendo lentamente,
mas descia. Os batimentos do bebê eram excelentes. Mas a obstetra, impaciente, gritou para
minha colega realizar a manobra de Kristeller (manobra proibida, por ser perigosa para a mãe do
bebê que consiste na aplicação de pressão na parte superior do útero com o objetivo de facilitar a
saída do bebê). Ela se negou e disse para ela ‘que nós não realizávamos aquilo’. A médica brigou
conosco, xingou todo mundo e mandou a enfermeira subir na escadinha e fazer.”
22. Esse tipo de tortura provoca um impacto perverso e deixa graves consequências por vários
motivos. Quando se experimenta o nascimento da criança pela força da “trombada perversa”, as
fantasias do prazer da mãe são afetadas. Essa má experiência a bloqueia como mulher, a
arrebenta e a angustia, pois, com certeza, ela jamais fantasiara um fim tão inesperado e cruel.
23. “Cala boca!”, gritou a obstetra
”A enfermeira quase montou na paciente, que berrava para que parassem. A menina
dizia que doía muito e que não conseguia respirar. “Cala boca!”, gritou a obstetra. E subiu na
paciente também”.
Quando se força e se impõe à mulher-mãe práticas distorcidas, aberrantes, perversas e
proibidas dos trancos pesados de Kristeller, é frequente ver a equipe técnica tomada por fortes
sentimentos de culpa derivados da transgressão das pautas culturais previamente internalizadas.
*. Ver. Dilaceração da mulher-mãe com as manobras ou trancos pesados de Kristeller (Parte IV - A)
20. 24. Tortura nas zonas erógenas: Episiotomia
‘Eu dizia que não tinha necessidade daquilo, que o bebê estava nascendo. Foi um
pandemônio. A obstetra se enfureceu, tirou-me do campo e fez episiotomia (abolido por muitos
médicos humanizados, é um corte que se faz entre a vagina e o períneo da mulher para “facilitar a
saída” do bebê)’.
Pressupõe-se que a episiotomia seja uma técnica ideologicamente preventiva para
evitar todas as possíveis manifestações da vítima. A delinquente-torturadora faz a ruptura do
períneo, quando a ‘presa’ se encontra deitada, sem poder se defender, desprotegida, dominada,
acuada pela equipe obstétrica e sem a capacidade mínima para reagir. Numa circunstância assim,
altamente ameaçante, perigosa e enlouquecedora, a mulher-mãe tem a sua intimidade rasgada.
25. A tortura nas zonas erógenas perturba a capacidade de reconhecer as próprias sensações,
as quais acabam encobertas pela lembrança penosa da tortura e pelo transtorno antecipado.
Tudo isto se expressa na mulher-mãe, em geral, pelos sintomas de inibição da
genitalidade, incapacidade orgástica, frigidez, os quais levam muitas vezes a condutas de
isolamento que perturbam finalmente suas relações de reinserção psicossocial.
26. Fórceps em carne viva
“Não contente, a médica pediu para a enfermeira trazer o fórceps- Quando ela colocou,
a paciente berrou de dor. E o corte, no períneo, já enorme e feito contra a vontade da paciente,
aumentou ainda mais, como um rasgo”.
21. 27. Imagine passando um ferro quente para marcar e escaldar sua pele, viva e aberta, na pélvis e
no períneo, já angustiados ou agoniados. Há algo particularmente sinistro na tortura obstétrica,
muito mais se é realizada por mulheres sádicas, porque elas percebem e conhecem, mais que
qualquer um, as áreas de sensibilidade e sensitividade feminina.
28. O dano produzido no períneo e no canal de nascimento com fórceps, com o “ferro
escaldado”, na interferência do nascimento tem um efeito destrutivo muito forte, não só pelas
vexações que a mulher-mãe recebe no seu corpo, mas também por estas produzirem fantasias de
devastação, substituindo a utopia antecipada do prazer.
29. Era só ter paciência e serenidade, não havia sofrimento fetal
“A médica puxou o bebê com o fórceps, desnecessariamente ao meu ver, porque, o
bebê descia, ainda que lentamente, era só ter paciência já que os batimentos cardíacos
mostravam que tudo evoluía bem, não havia sofrimento fetal. Até o dorso do bebê estava à
esquerda, como manda o figurino”.
30. A reciprocidade entre a mãe e a(o) filha(o) é uma verdadeira relação social e é valorizada
pelas mulheres-mães amazônicas. Os humanos civilizados, com seu tabu patriarcal do
sofrimento fetal, predadores e técnicos por excelência, desejam eliminar o binômio serenidade-
paciência, a repudiam, não a reconhecem, não a consideram e nem a respeitam, atemorizam a
mulher-mãe, impondo uma reação violenta de sofrimento através do medo.
22. 31. Sutura do períneo rasgado: -“É assim mesmo, filha”-
“A médica olhou para mim e ao final disse: ‘Você que ficou aí parada, sutura aqui a
episiotomia’. Levei mais de uma hora para suturar aquele corte. A minha paciente chorou e a mãe
dela disse: ‘É assim mesmo, filha’. Eu disse que não, não era, que não precisava ser assim
horrível, enquanto suturava aquele corte profundo, enorme, que ia até quase a nádega da moça”.
32. Como sensibilizar os obstetras do Brasil, para a proteção das meninas-mulheres, das
mulheres, e das mulheres-mães contra a tortura obstétrica
É possível afirmar que a fragmentação do contato social contribui para fortalecer a
vontade de depositar a maldade na parturiente. Cada pessoa envolvida neste drama que entra
em contato com a menina-mãe o faz com o objetivo de realizar uma ação determinada: a obstetra
intimida a mulher-mãe e intervém no processo como supervisora das residentes, a enfermeira e a
obstetra realizam a manobra de Kristeller e sobem na paciente, a obstetra faz episiotomia, a
ruptura do períneo, a enfermeira faz o fórceps em carne viva, a residente fala e sutura a
episiotomia.
33. Ninguém da equipe técnica, em protesto ou em negação aos atos de crueldade praticados,
chamou para si uma reponsabilidade ao pelo menos tentar sair da sala. A omissão e a
obediência acadêmica se mostraram completas. Faltou coragem, atitude.
Por detrás disto está a intenção de impedir uma relação pessoal. Essa fragmentação
do contato social possibilita a obediência e a diluição da responsabilidade quanto ao destino da
parturiente.
23. 34 Humilhação e negação do gelo perineal “para ela ver que pôr filho no mundo não é brincadeira”
“Quando solicitei à enfermagem gelo perineal, para reduzir o edema, elas disseram: ‘Só
se a Dra. prescrever!’. Daí me humilhei na frente da obstetra para conseguir que fosse colocada a
compressa de gelo. Consegui, mas ouvi que tinha sido bom ‘para ela ver que pôr filho no mundo
não é brincadeira!”.
35. A tortura em mulheres-mães não são fatos esporádicos ou isolados, são regras acadêmicas.
A menina-mãe é considerada “marginal precoce”. “Para ela ver que pôr filho no mundo
não é brincadeira”: tal comentário parece frisar a legitimidade da repressão, do trato aplicado, a
tortura obstétrica. A relação torturadora e torturada se faz anonimamente e impessoalmente
36. Sessões de tortura numa menina de 16 anos por uma equipe de doutoras
“Daí eu entendi que ela fez tudo isso porque a moça (menina-mulher) tinha apenas
16 anos. Também doeu ver que as pessoas não tem consciência de que isso é violência, mesmo
depois de alertarmos, eu e minha colega”.
37 Os excessos dos serviços de saúde pública
A principal preocupação é que não se saiba onde e por quem a parturiente foi torturada
brutalmente. Num segundo plano, o que fica literalmente claro é que a atrocidade massiva é
praticada com objetivo sinistro único de assustar as mulheres-mães, as parturientes, o povo
24. feminino através da instauração de um clima de terror aniquilando qualquer ilusão de ter criança e
de se tornar mãe através de um processo simples, o fluxo pela via baixa. A tortura obstétrica
traduz a mensagem dos delinquentes acadêmicos : “Elas estão avisadas. É melhor marcar dia e
hora para realizar as abomináveis cesáreas para não sofrer”.
38. A mãe da menina-mulher disse: eu não vou denunciar a médica
A mãe dela comentou no final: “Olha, doutoras, eu não vou denunciar a médica porque a
gente precisa de médicos. A gente nunca deve fazer uma coisa dessas com quem cuida da gente”.
39.Tudo estava ocorrendo diante de seus olhos e ela se sentia impotente, não podia fazer nada.
Conseguiram quebrar e fragmentar a sua filha... Mesmo assim, ela diz: “A gente nunca deve fazer
uma coisa dessas com quem cuida da gente...”. Apesar de terem sofrido torturas, absolveu as
suas carrascas... Se ‘sentem protegidas’ ainda que agredidas, denegridas, castigadas,
massacradas; querem que cuidem delas mesmo que irrompam e dissociem seus pensamentos.
40. Aqui, fala mais alto o medo, a ignorância, o abandono, as manchas que cobrem os seus
olhos e os seus sentimentos. ‘Seremos suas escravas, mas cuidem de nós depois do
sofrimento...’ Até onde chega a escravidão do povo brasileiro submetido à falta de educação
básica? O oprimido silencia , aceita calado a sua opressão.
41. Nega-se literalmente o exercício da suposta cidadania, do supremo direito à crítica. Devia-se,
na verdade, questionar a autoridade, os privilégios, o comportamento aterrador da “Doutora” em
relação a adolescente, a pretexto de todo tipo de correção, no entanto, impera a corrupção, o
corporativismo, a hegemonia médica em detrimento das mulheres-mães.
25. 42. Tapinha nas costas e choro de partir o coração não reparam os danos sofridos pela
menina-mulher
“Foi de partir coração ouvir isso. A minha colega e eu choramos de raiva, de frustração,
de tudo, no quarto dos internos. Esse foi o caso mais criminoso e horrível que eu assisti, o parto
mais violento”.
43. As estudantes não chegam a imaginar sua irresponsabilidade psicossocial
Já que os traumas da mulher-mãe não podem ser remediados, podem ser
potencialmente revividos pelo resto de sua vida. A dificuldade de levar uma vida normal, de sentir
satisfações e de ter vínculos familiares acaba por acarretar más consequências inclusive no
convívio com a criança e na relação com o seu parceiro.
44. A recordação que a menina de 16 anos guardará será a da experiência real do horror sem
limite, do inimaginável sentimento de desproteção, da ameaça vital e do seu esmagamento
mortificante, quando deveria ter sentido prazer em se tornar uma mulher-mãe!
45. Ignoram as leis brasileiras: não aos acompanhantes
. “Para completar, ainda recebi bronca por ‘ter deixado a família entrar’. Quando retruquei dizendo
que é lei federal, ouvi: ‘mas eles não sabem!’
46. Anulam prontuários e falsificam laudos médicos
“Eu e minha colega anotamos tudo no prontuário. A ‘doutora’ não gostou do nosso
registro e ‘passou a limpo o prontuário’, fazendo nova folha de registro! E foi dormir”.
26. 47. A delinquente acadêmica, certa de sua impunidade, rasga o prontuário, o registro original, o
que lhe permite o ingresso a escalões superiores da sociedade, onde ela sempre será a vítima
enquanto não se prove o contrário, e será sempre recompensada com o silêncio do parto, a não
divulgação da equipe, do seu cargo, e do hospital em que foi realizada a tortura porque ela serve
a política do poder autoritário dominante.
48. Sua vítima será sempre culpada, esquecida, tratada como louca, esfolada, escamoteada e
jogada no lixo pela ciência médica civilizada
A violência e a agressão, a ausência de normas e o preconceito, a obediência absoluta
da equipe médica, a repressão e a tortura obstétrica somente provocaram danos físicos e
psicossociais à menina-mulher de 16 anos.
49. A análise da ‘crise de consciência’ das (os) delinquentes obstétrico (as) que praticam torturas
nas instituições acadêmicas, leva-nos a pensar que esse genocídio está vinculada à formação
acadêmica, à capacidade de discutir meios sem nunca questionar os fins, à possibilidade de
transformar problemas político psicossociais em problemas técnicos, desprezando a opinião
pública. A traição dos intelectuais acadêmicos dá razão ao seu crime e a indignidade do
delinquente acadêmico acaba por substituir a dignidade da menor-mãe e da mulher-mãe.
ONDE ESTÁ O CONSELHO UNIVERSITÁRIO PARA DAR SUAS EXPLICAÇÕES?
27. Diagrama 52
“Esse foi o caso mais criminoso e horrível que eu assisti, o parto mais violento”.
A mãe não tem percepção da extensão da repressão obstétrica institucionalizada, nem
de quanto e de como essa situação dramática e complexa poderá afetar a criança.
Apesar dos transtornos obstétricos reais descritos pelas crianças conferirem a manutenção de
temores reais, nunca se elaborou uma ação psicossocial para lidar com a situação criminosa e
traumática resultante da violência obstétrica vivenciada pela mãe e a pela criança.
28. PARA UMA POLÍTICA DE CONSCIÊNCIA
PSICOSSOCIAL TRANSFORMADORA
Sequelas das mães rasgadas e crianças desorientadas
Uma professora solteira passou pela seguinte experiência, no final do ano de 2018 em
SP. Do nada, um menino de 7 anos fez uma pergunta; outras crianças entraram na conversa,
enquanto algumas outras ouviam atentamente:
“Você tem filhos? Respondi que não. Por que você não tem filhos? É porque você tem
medo de que te rasguem a barriga?“ “Eu não quero ter filhos. Eu tenho medo de que me cortem a
barriga, disse uma menina. Se for ter filhos, eu prefiro que nasçam naturalmente.“ O menino se
lamentou dizendo: mamãe me mostrou a marca que ela tem na barriga. Disse que foi por ali que
eu nasci. Mas se rasgarem a barriga não dói? Não morre? Coitada das meninas! Eu é que não
queria ser uma menina numa hora dessas”. Outra disse: minha mãe também tem marcas na
barriga. Uma da cirurgia que ela fez do câncer (vertical) e outra (horizontal) de quando eu nasci”.
As estratégias de sobrevivência das crianças e das mães rasgadas, suturadas, hoje,
coladas, são múltiplas e variadas, no entanto, elas se mostram fortemente dificultadas pela
introjeção do temor e da ameaça vital, e pela vivência de perdas progressivas no que diz respeito
a possibilidade de não expressar a violência obstétrica dentro de seus hábitos e costumes.
29. 2. As famílias afetadas pela situação da repressão obstétrica tem em comum o fato de suas
crianças apresentarem problemas de adaptação sócio-afetiva no que diz respeito a forma de lidar
com o sofrimento pelo qual a mãe passou.
3. Este assunto é dificilmente abordado pelo casal. A partir desta situação traumática, os
argumentos que orientam o casal a justificar a exclusão desse assunto da conversa em família
giram ao redor da incapacidade da mulher-mãe de entender, de discernir e de discriminar o que
deve ou não ser transmitido fora da instituição repressiva hospitalar.
4. A constatação da mãe cortada se associa rapidamente a comoções pessoais importantes pela
ameaça vital, pela possibilidade de outras mulheres também serem rasgadas no ventre. A
tolerância emocional desta situação gera diversas reações: temor generalizado, reações
angustiosas e a possibilidade de projetar-se para um futuro incerto.
5. A atitude das crianças desta geração representa um compromisso vital e absoluto com o fazer
social, pois serão transmitidas às gerações posteriores. Um grupo significativo dos que hoje são
crianças, no futuro assumirão um rol psicossocial profundamente manchado, por terem trauma
resultante dos partos violentos em que elas(es) foram as(os) protagonistas.
6. O sentimento de marginalidade vivido intensamente pela mulher-mãe na maternidade adquire
um caráter crônico. Vivenciar as barreiras levantadas pelo grupo familiar como uma resposta
defensiva, constituem para a criança passar por uma experiência idêntica a da mama’e. As portas
abertas para a vida são sentidas como uma ameaça para o futuro.
30. 7. Nós, profissionais da Medicina originária (Medicina Itinerante Kallawaya Andino), realizadores de
uma política de consciência comunitária, queremos testemunhar sobre os efeitos da repressão
no mundo interno das crianças e no das Mãe d’Água. Porém, como fazê-lo sem usurpar os
discursos das ‘mortas-vivas’ que vivem discriminadas pela miséria, das refugiadas internas e
externas, das grávidas segregadas das periferias e do interior, das gestantes metropolitanas, das
Olhos d’Água, prenhas nuas, e das Mães d’Água, prenhas vestidas amazônicas, das mulheres-
mães condenadas ao SILÊNCIO pelos maus tratos e pela TORTURA OBSTÉTRICA nos
hospitais-maternidades brasileiros.
8. É muito provável que o poder político partidário dos Conselhos enlameados que se destacam
pelo uso das palavras, teorias, não demonstre interesse pela adormecida política-psicossocial
autoritária dos hospitais-maternidades.
9. Assim, mesmo sem terem tido uma formação política social, os(as) psicólogos(as), as (os)
medicas(os) são convocados para atuar desde que se submetam, em sua prática pontual, às
intenções recíprocas complementares estabelecidas dentro da política psicossocial comunitária.
10. Destarte, o discurso que o acadêmico escuta permanece 518 anos contaminado e manchado
pelo sangue-energia, o qual alimenta a carne ferida e aberta pela repressão e pela
INTERVENÇÃO. Estes acadêmicos, se forem orgânicos, acríticos, devem se calar. Deve fazer de
conta que as relações entre o poder e o desejo só se encontrem sem vínculos de nenhuma
espécie com o poder político civil autoritário corrupto.
31.
11. Esse poder totalitário deveria ser mudado através de uma estrutura de poder flexível (por
meio da êthos e da ‘ética’ dos povos originários amazônicos, andinos e afins), para apresentar
uma política psicossocial transformadora, em única instância, fora do controle ‘do poder
estatal’, distante das psicologias e das medicinas intervencionistas e longe das estatais-
maternais.
12. Sua prática deveria proteger e promover a dignidade, o respeito, a responsabilidade e germinar
o testemunho de vida pela transformação energética. A ‘psicologia médica e a obstetrícia órfãs’,
desamparadas, mesmo sendo adotadas não teriam poder para se indignar, elas não nos
oferecem nenhuma esperança, são como se fossem uma paisagem fotográfica desolada descrita
por Graciliano Ramos em “Vidas Secas” ou como diz Lima Barreto é como se elas fossem um
“cemitério de vivos’, sem sangue nem energia para alimentar a sua própria carne fria.
13. A política psicossocial transformadora, a pessoa paisagem, não deve mostrar omissão
perante as torturas obstétricas brasileiras que fazem o que querem com as mulheres-mães e com
seu organismo sensorial demolido. Se a pessoa paisagem não der testemunho contra essa
situação, quem o fará? Alguma atitude já deveria ter sido tomada no passado a fim de que a
‘saúde’, a salvação, não viesse a arfar agonizante como nos nossos dias.
14. Num momento crítico como este, o silêncio é omissão, é barbárie acadêmica. A mudança
seria a concretização de um grande testemunho a favor de uma identidade e da continuidade de
um mundo transformado pela Mãe d’Água e pela Mãe d’Umbigo.
36. Prefixos e sufixos em terminologia médica ocidental
Prefixos Significado
adeno- glândula
colpo- vagina
histero- útero
láparo- flanco ou ventre
masto- mama
pielo- pélvis
salpingo- trompa
Sufixos
-ectomia corte ou ressecção para tirar tecidos
-episio vulva, epíson, pubis
-stomía formação de uma fístula ou abertura
-tomía corte ou incisão
-pexia fixação
-plastia reconstrução ou amoldamento
-rrafia sutura