1. Uma das maiores emoções da minha vida
de homem público foi, sem dúvida, o dia em que
acordei por volta das 6h, como faço sempre, e
olhei, estampada na capa do Jornal MINUANO a
foto de um rapaz negro, com a esposa e o filho,
na frente de sua humilde casa, que tinha uma
faixa na parede com os seguintes dizeres:
“Valeu, André Luís”. Aquela foto sintetizava o
resultado concreto do programa “Porta de
Entrada”, que criamos na Prefeitura de Bagé.
Emoção maior, talvez, só quando nasceu minha
filha Fernanda.
André Luís, beneficiário do
Bolsa Família, filho do Chitão,
entregador do jornal Correio do
Sul, comemorava, com orgulho,
seu ingresso na Faculdade de
Ciências Contábeis da Urcamp. O
Porta de Entrada nasceu durante
uma viagem que fiz ao Chile,
convidado pelo Ministério do
Desenvolvimento Social, como
reconhecimento pela excelente
gestão que a Márcia, como
coordenadora voluntária do
Programa Cidadão Bageense
(Prociba), e sua equipe faziam no
Bolsa Família. Recebemos,
inclusive, prêmio pela gestão
inovadora que aplicamos.
F o m o s c o n h e c e r o
programa Chile Solidariedade, similar ao Bolsa
Família, e participar de debates sobre os
mecanismos que precisavam ser adotados para
fazer da transferência de renda um trampolim
para a emancipação dos beneficiados, visando
romper a dependência financeira que tinham do
Estado. O nosso ministro do Desenvolvimento
Social de então, Patrus Ananias, dizia que
tínhamos que encontrar uma “porta de saída”.
Não concordei muito com o termo, pois me
lembra um ditado antigo que diz que “a porta de
saída é a serventia da casa”. Acreditava que
deveríamos procurar uma “porta de entrada”
para uma vida melhor.
E, para mim, nada melhor do que a
educação, o estudo, o conhecimento, para que
uma pessoa possa se emancipar. A educação tem
o poder da transformação e da conquista da
autonomia. É, sem dúvida, a mais radical das
oportunidades para a libertação dos pobres e
oprimidos. Começava a elaborar um projeto para
oportunizar aos pobres da minha cidade a
possibilidade de acesso ao ensino superior.
Queria ver mais moradores da periferia sentados
nos bancos da nossa Urcamp.
Faltavam os recursos financeiros
Conhecedor
da sensibilidade
social do então
reitor Arno Cunha,
propus transformar
as dívidas que a
Urcamp tinha para
com o município em
bolsas de estudo.
Recebíamos uma
b o n i fi c a ç ã o
fi n a n c e i r a d o
governo Federal
p e l o
acompanhamento
que fazíamos do
B o l s a F a m í l i a ,
e s t i m u l a n d o a s
mães manterem as
c a d e r n e t a s d e
vacina dos filhos
atualizados, as crianças estudando, enfim
cumprindo os requisitos do programa. Buscamos
apoio do Sindicato das Empresas de Transporte
(Semtro), liderado pela nossa parceria Maria da
Graça Anversa, e obtivemos passe livre para os
beneficiados frequentar a universidade. Estava
montado o Programa Porta de Entrada (Propen)
que, depois, serviria de referência para outros
municípios.
Não fosse este programa, muitos dos
beneficiados jamais frequentariam uma
universidade. Jamais poderiam colocar na
parede de suas casas, nos bairros de Bagé, uma
faixa como aquela do André Luís. Sonhamos
juntos e transformamos este sonho em
realidade.
Uma Porta de Entrada
para o Futuro
*Esse texto faz parte de Memórias de Um Tempo, uma série publicada no Jornal Minuano de Bagé,
em que procurei resgatar fatos de nossa gestão de oito anos na Prefeitura Municipal.