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Estudo devocional e explicativo
de um dos mais importantes
temas do Novo Testamento
—o Reino de Deus
REIS BOOK’S DIGITAL
Abraão de Almeida
ISBN 85-85589-14-0
Categoria: Vida Cristã
© 1997 Editora Betei
1■
' impressão 1997
Impresso na Gráfica Editora Serrana Ltda
Todos os direitos reservados e/n língua
portuguesa por Editora Betei,
R. João Vicente, 7, Madureira
21340-020 Rio de Janeiro, RJ
Salvo quando mencionada outra fonte,
as citações bíblicas foram extraídas da
Edição Contemporânea de Almeida.
Capa: Anderson Rocha
Dedicatória
v
A Lucinha,
minha esposa.
Aos alunos emestres
do Seminário Betei.
5
índice
Prefácio.................................................. 9
1. A abrangência do reino.............11
2. A invasão do reino..................... 19
3. O governo do reino....................27
4. O acesso ao reino....................... 39
5. Os súditos do reino................... 61
6. A prioridade do reino................77
7. O bem do reino............................85
8. A harmonia do reino..................93
9. A perenidade do reino.............. 99
10. A plenitude do reino................111
11. O aconchego do reino..............117
Prefácio
/ / enho a imensa satisfação de apresentar ao
/ público Teu é o Reino, da erudita pena do pastor
Abraão de Almeida.
O autor, em suas quase três dezenas de obras em
português e espanhol, têm enriquecido o povo de Deus
com cultura, teologia, filosofia, história e literatura,
transmitindo experiência e prática numa linguagem
simples, didática e acessível a todos. Teu é o Reino é
mais uma dessas valorosas obras do escritor Abraão de
Almeida que vem suprir, por certo, uma verificada
carência nos púlpitos, nas cátedras teológicas, nas igrejas
e no meio do povo em geral.
O autor se dirige, nesta obra, tanto a crentes como a
descrentes, ao expor, com clareza, como o absoluto reino
de Deus invade a nossa ordem relativa, trazendo às vezes
perturbação emocional e espiritual, mas produzindo, por
outro lado, entrega, renúncia, e uma profunda harmo­
nia com a natureza, com o próximo, com Deus e com o
universo.
Em seu primeiro capítulo, Teu é o Reino faz uma
exposição clara do significado de expressões que ainda
têm sido alvo de polêmicas entre os estudiosos da Palavra
de Deus, como reino de Deus e reino dos céus, além de
outras frases em que aparece a palavra reino. Mas a obra
é muito mais devocional do que explicativa, e nos dez
capítulo restantes o autor desafia seus leitores a viverem
avida cristã em toda aplenitude do reino, que étotalitário,
harmônico, prioritário e aconchegante. Creio que ao
finalizar a leitura deste livro o leitor sentirá o impulso de
agradecer a Deus o inefável dom de seu reino, pois
9
descobrirá que tal reino é, de fato, o nosso verdadeiro lar.
A Editora Betei lança Teu é o Reino com a certeza de
que a sua leitura, meditação e prática enriquecerão a
vida cristã de todos os seus leitores.
PastorDoutor Manoel Ferreira
Presidente da Convenção Nacional das Assembléias
de Deus no Brasil - Ministério de Madureira
Presidente do Conselho Nacional de Pastores do Brasil
10
1
A abrangência do reino
Ç * OBRESSAI NOS EVANGELHOS a ênfase que
1 Jesus Cristo deu ao reino de Deus, pois a ele se
^— referiu nada menos que 70 vezes, enquanto
apenas duas vezes à Igreja. Por isso o evangelho é
também conhecido como o evangelho do reino, expressão
presente em quase todas as parábolas contadas pelo Sal­
vador.
Para um perfeito entendimento do reino no Novo Tes­
tamento é primordial que se considere a expressão que
contenha “reino” à luz do seu respectivo contexto. Em
outras palavras, é preciso que se maneje bem a palavra
da verdade, pois às vezes o contexto pode ser mais
abrangente do que o próprio capítulo ou o livro em que
uma passagem está inserida; pode tratar-se de uma
dispensação. A propósito, o verbo “manejar”, que aparece
em 2 Timóteo 2:15, tem sido traduzido por “distribuir”
(Monges de Meredsous), “ensinar” (Versão Inglesa de
Hoje), “dispensar” (Bíblia de Jerusalém), “dividir”
(Versão Autorizada de 1611, em inglês), etc..
Especialmente quando a Escritura Sagrada se refere
a “reino” temos de examinar em que contexto esse
“reino” se insere. Por exemplo, os discípulos de Jesus,
ao perguntarem a este se a vinda do Espírito Santo
11
TEU É O REINO
significaria a restauração do reino a Israel, tiveram como
resposta que não lhes pertencia “saber os tempos ou as
épocas que o Pai estabeleceu pelo seu próprio poder”
(Atos 1:7).
Não é difícil perceber em que contexto os discípulos
estavam usando a palavra “reino” . Como afirma Will­
iams, eles ainda estavam “acorrentados à noção popu­
lar de um reino de Deus eminentemente político, que
sua vinda traria a reunião de todas as tribos, a
restauração da independência de Israel e o seu triunfo
sobre todos os inimigos. Neste campo eles não haviam
feito muito progresso, e ainda se prendiam à esperança
primitiva de vir a ocupar lugares de proeminência num
reino material” .0)
E claro, nas Escrituras, que o reino será restaurado a
Israel, mas num sentido escatológico e em condições
espirituais, políticas e sociais profundamente alteradas.
Na linguagem de Jesus, o “reino de Deus” de Atos 1:3, a
ser pregado pelos discípulos em todo o mundo, seria um
reino do âmbito do Espírito Santo, não deste mundo (João
18:36), no qual se entra mediante o arrependimento dos
pecados e a fé na pessoa do Salvador e na obra por ele
realizada na cruz.
Há, pelo menos, sete expressões para “reino” no Novo
Testamento:
1. Reino dos Céus. Esta expressão, sempre com a
palavra “céus” no plural, ocorre 32 vezes no Novo Tes­
tamento, e todas elas no Evangelho de Mateus, tendo
em vista o propósito daquele evangelho. E evidente que
algumas vezes o “reino dos céus” de Mateus aparece em
passagens paralelas de outros evangelhos como “reino
de Deus” (por exemplo: Mateus 11:11 com Lucas 7:28),
o que, entretanto, não altera o propósito que teve Mateus
12
A abrangência do reino
ao escrever o seu evangelho.
“Reino dos Céus”, como um termo dispensacional, é
às vezes usado para o reino do Messias, e às vezes para
indicar a soberania celestial sobre a terra. A soberania
vem dos céus porque o Rei vem de lá (João 18:36). Foi
para esse fim que o Messias nasceu, e este foi o primeiro
objetivo de seu ministério. De acordo com a parábola
profética de Jesus em Mateus 22:2-7, aquele reino foi
rejeitado pelos judeus, tanto durante o ministério de
Jesus como na proclamação apostólica (Atos 3:19-23).
Por causa dessa rejeição do reino, a sua realização
terrena foi adiada até que o Rei seja enviado dos céus,
conforme disse Pedro: “E envie ele a Jesus Cristo, que
já dantes vos foi pregado. Convém que o céu o contenha
até os tempos da restauração de tudo, dos quais Deus
falou pela boca de todos os seus santos profetas, desde o
princípio” (Atos 3:20-21). Os segredos desse reino já fo­
ram revelados aos discípulos, mas, no que diz respeito
aosjudeus, só serão revelados no futuro (Mateus 13:11).
Em resumo, o reino dos céus:
1. Tem o Messias como o seu Rei
2. E dos céus, sob os céus e sobre a terra
3. E limitado em seu escopo
4. E político em sua esfera
5. E judaico e exclusivo em seu caráter
6. É nacional em seu aspecto
7. E o propósito especial das profecias do
Antigo Testamento
8. E dispensacional em sua duração
Scofield também não considera a expressão reino dos
céus como sinônima de reino de Deus. Ele afirma que o
“reino dos céus é messiânico, mediador e davídico, e tem
por objetivo o estabelecimento do reino de Deus sobre a
13
TEU É O REINO
terra” .Em defesa de seu posicionamento, ele cita Mateus
3:2 e 1 Coríntios 15:24-25. Este último texto afirma:
“Então virá o fim, quanto tiver entregado o reino a Deus,
ao Pai, e quando houver destruído todo o domínio, e toda
a autoridade e todo o poder. Pois convém que ele reine
até que haja posto a todos os inimigos debaixo dos seus
pés” .(2)
Isaías referia-se a esse reino dos céus na terra quando
profetizou que ele haveria de crescer sempre (Isaías 9:7).
Quando Jesus disse a Pilatos: “Mas agora o meu reino
não é daqui” (João 18:36), ele fazia referência ao seu
reinado milenial, que terá início com o seu retorno para
Israel, e que finalmente atingirá a sua plenitude quando
todos os seus inimigos lhe estiverem sujeitos, ao final do
milênio. Essa vitória final de Cristo porá fim definitivo
ao indigno “poder” e à indigna “glória” que o próprio
Jesus rejeitou no deserto da Judéia, quando ali derrotou
o diabo.
A fim de evitar qualquer mal-entendido, usaremos de
preferência, neste livro, a expressão “reino de Deus”,
por não deixar dúvida quanto à sua plena abrangência.
2. O Reino do Pai. “Então os justos resplandecerão
como o Sol, no reino de seu Pai. Quem tem ouvidos para
ouvir, ouça” (Mateus 13:43). Esta expressão, aqui, não
tem sentido universal, e se refere à esfera do reino de
Deus no seu aspecto celestial em relação à terra. E
equivalente à expressão “participantes da vocação ce­
lestial”, de Hebreus 3:1. Alude, portanto, ao íntimo
relacionamento entre Deus e o seu povo, e a única
maneira de se entrar nesse reino é através do novo
nascimento (João 3:3).
3. O Reino do Filho do Homem. Esta expressão está
em Mateus 16:28: “Em verdade vos digo, alguns dos que
14
A abrangência do reino
aqui estão não provarão a morte até que vejam vir o
Filho do homem no seu reino” . Trata-se do reino dos
céus no que diz respeito unicamente a Israel sobre a terra
(Daniel 7:13,14,18, 21, 22), sem incluir os “participantes
da vocação celestial” .Embora partes de um mesmo reino,
as esferas terrena e celestial são distintas, como aliás o
Senhor prometeu aAbraão: “Grandemente multiplicarei
a tua descendência, como as estrelas do céu e como a
areia que está na praia do mar... e em tua descendência
serão benditas todas as nações da terra” (Gênesis 22:17-
18). Israel corresponde, nesse reino do Filho do Homem,
à areia que está na praia do mar, como povo terreno, ao
passo que a igreja corresponde às estrelas do céu, como
povo celestial.
4. O Reino do Filho do seu amor. O contexto desta
expressão em Colossenses diz: “Dando graças ao Pai que
nos fez idôneos para participar da herança dos santos
na luz, e que nos tirou do poder das trevas, e nos
transportou para o reino do Filho do seu amor, em quem
temos a redenção pelo seu sangue, a saber, a remissão
dos pecados” (1:12-14). Refere-se, esta passagem, à
soberania do amado Filho de Deus naquela esfera que
está acima de todos os céus, em que o Pai “sujeitou todas
as coisas debaixo dos seus pés, e sobre todas as coisas o
constituiu como cabeça da igreja, que é o seu corpo, a
plenitude daquele que enche tudo em todos” (Efésios
1:22-23).
Esta supremacia do Filho, como um “mistério que
desde tempos eternos esteve oculto” (Romanos. 16:25)
“em Deus” (Efésios 3:9), “durante séculos e gerações”
(Colossenses 1:26), foi revelada na proclamação do reino
de Deus, feita por Jesus, e “depois confirmada pelos que
a ouviram” (Hebreus 2:3). Os propósitos dessa suprema
15
TEU É O REINO
autoridade do Filho estão selados para ulterior
cumprimento na vida dos que, pela sua fé em Cristo, se
tornaram herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo
(Efésios 2:13-14).
5. O reino eterno de nosso Senhor e Salvador Jesus
Cristo. Registrada em 2 Pedro 1:11, esta expressão
refere-se ao reino milenial, quando “a terra se encherá
do conhecimento do Senhor, como as águas cobrem o
mar” (Isaías 11:9).
6. O reino de nosso Senhor e do seu Cristo. O texto
completo está em Apocalipse 11:15: “Os reinos do
mundo vieram a ser de nosso Senhor e do seu Cristo
[ou Messias]” . Trata-se de mais uma referência ao
período milenial. Essa expressão é mais abrangente do
que “Reino do Pai” e “Reino do Filho do Homem”, pois
inclui tanto o poder como a glória do reino, como
ensinou Jesus em Mateus 6:13: “Porque teu é o reino e
o poder, e a glória, para sempre” . O poder é o poder do
reino, e a glória é a glória do reino.
Ao final do milênio, todas as esferas particulares ou
secundárias do reino serão absorvidas no reino de Deus.
7. O reino de Deus. Esta expressão indica a suprema
autoridade de Deus, que é moral e universal. Ela existe
desde o começo, ejamais terá fim. Essa autoridade está
sobre todas as coisas e abrange a tudo.
Em resumo, esse reino:
1. Tem Deus o Pai como seu Governo
2. Ele está no céu, sobre a terra
3. E ilimitado em seu escopo
4. E moral e espiritual em sua esfera
5. E inclusivo em seu caráter, abrangendo as
sementes natural e espiritual de Abraão, a
“vocação celestial” e a igreja
16
A abrangência do reino
6. É universal em seu aspecto
7. E, em seu aspecto mais amplo, o objetivo da
revelação do Novo Testamento
O Reino de Deus e a Igreja
De tudo o que já vimos depreende-se que o termo
“reino”, mesmo aparecendo em distintos contextos, com
distintas conotações, não pode ser aplicado à igreja. Eis
algumas das razões dessa impossibilidade:
1. A Bíblia fala de herdeiros do reino, mas em nenhum
lugar da Escritura lemos acerca de herdeiros da igreja.
2. Lemos acerca da possibilidade de se receber o reino,
mas nada lemos na Bíblia acerca da possibilidade de se
receber a igreja.
3. Lemos acerca de anciãos de igrejas, de mensageiros
ou servos da igreja, mas nada há na Bíblia acerca de
anciãos do reino.
4. A palavra “basileia”, traduzida por “reino”, ocorre
162 vezes no Novo Testamento, sendo 158 vezes no sin­
gular, e apenas quatro vezes no plural, ao se referir a
reinos deste mundo (Mateus 4:8, Lucas 4:5, Hebreus
11:33, Apocalipse 11:15). Por outro lado, a palavra
“ekklesia” ocorre 115 vezes, e destas, 36 estão no plural
e 79 no singular, todas elas significando “igreja” ou
“igrejas” . Somente em Atos 19:32, 39, 41 ela aparece
como “assembléia” ou “ajuntamento”.
5. Lemos acerca de “filhos do reino” , mas nada
encontramos como “filhos da igreja”.
6. Termos como “corpo”, que aparece em Efésios 1:23;
4:4, 16; 5:30, e Colossenses 1:24; “edifício”, Efésios 2:21;
e “coluna e esteio da verdade”, em 1 Timóteo 3:15, nunca
são aplicáveis a “reino” .
17
TEU É O REINO
7. O grande privilégio dos membros da igreja, como
participantes “da vocação celestial” (Hebreus 3:1;
Apocalipse 20:4-6), é o de reinar com Cristosoòre a terra
- ou acima da terra - enquanto que aquele reino será
sobre todos os “reinos debaixo de todo o céu” (Daniel
7:27).
8. A igreja das cartas da prisão de Paulo (Efésios,
Filipenses e Colossenses), está aqui e agora no mundo,
esperando pelo “prêmio da soberana vocação de Deus
em Cristo Jesus” (Filipenses 3:14), ao passo que o reino,
no sentido de reino de Cristo, não está aqui, porque o
Rei não está aqui, e “ainda não vemos todas as coisas
sujeitas a ele” (Hebreus 2:8).
9. O reino é o grande objetivo das profecias, enquanto
que a igreja, especialmente das chamadas cartas que
Paulo escreveu na prisão, não é o objetivo da profecia.
Pelo contrário, foi ela mantida em segredo até que
chegasse o tempo da sua revelação.
18
2
A invasão do reino
S OMO VIMOS NO capítulo anterior, os judeus
í  dos dias de Jesus, pelo fato de estarem vivendo
sob o opressivo e repressivo império romano,
acabaram por ver as profecias messiânicas de um ponto
de vista muito particular. Eles acreditavam que o
Messias, como um poderoso guerreiro, conquistaria esses
indesejáveis invasores e estabeleceria definitivamente o
reino de Davi, inaugurando assim uma nova era de paz,
prosperidade e grandeza. Como outros israelitas que
viveram em épocas anteriores sob outros dominadores,
os judeus dos dias de Jesus também tinham o seu
entendimento do reino de Deus muito limitado pelas
circunstâncias adversas em que viviam.
O profeta Isaías falou da vinda do Messias em diversas
ocasiões, numa das quais afirmou que este viria como
um menino: “Porque um menino nos nasceu, um filho
se nos deu; o principado está sobre os seus ombros”
(Isaías 9:6). Mencionou que essa vinda seria como uma
pedra assentada em Sião “uma pedra já provada, pedra
preciosa de esquina, que está bem firme e fundada”
(28:16).
Mais adiante, no capítulo 53, o mesmo profeta falaria
de Cristo como o servo sofredor, que daria a sua vida na
19
TEU É O REINO
cruz como resgate de nossa alma. Setecentos anos depois,
quando as esperanças do povo já se desvaneciam em
virtude de tantas guerras opressoras, João Batista, como
uma “Voz do que clama no deserto” (Mateus 3:3), se
apresentou com as notícias de que as promessas de Deus
estavam prestes a cumprir-se. Exortava ele: “Arrependei-
vos, pois está próximo o reino dos céus” (Mateus 3:2).
Os evangelhos nos mostram como Jesus foi, aos
poucos, mudando a idéia do reino, transferindo-a do seu
aspecto material para o espiritual. O Novo Testamento
nos mostra, também, como Jesus, pela sua vida, ensinos,
morte e ressurreição, estabeleceu a base sobre a qual
esse reino de Deus, tanto no seu sentido espiritual como
escatológico, poderia tornar-se realidade aqui na terra.
Na concepção de Jesus, o reino de Deus é, em
substância, “uma grande sociedade espiritual que
transcende todas as distinções terrenas, e que está
por sobre todas as organizações políticas — uma
sociedade cujos membros têm a sua cidadania nos
céus, porém cuja esfera presente de atividade é o
mundo atual, e cujos membros estão unidos no
elevado propósito de realizar a vontade do
Altíssimo ”.(3)
Pelo fato de Jesus encarar o reino de Deus de um modo
muito diferente do povo de seus dias, às vezes ele se servia
de paradoxos para ilustrar como o reino nos invade. Ele
dizia que o reino de Deus está dentro dos discípulos
(Lucas 17:21), que esse reino poderia ser possuído pelos
pobres de espírito (Mateus 5:3), e que deveria ser buscado
antes de qualquer outra coisa (Mateus 6:33).
Jesus também falou do reino como algo em que se
20
A invasão do reino
pode entrar, como se estivesse cruzando a fronteira de
um país, sendo o passaporte o espírito semelhante ao de
uma criancinha (Marcos 10:15); e afirmou ainda que,
mediante o novo nascimento, se pode ver o reino de Deus
(João 3:3). E como se a conversão nos abrisse os olhos
para as belezas espirituais da nova vida em Cristo.
A proclamação desse reino foi a prioridade tanto de
João Batista como de Jesus. O ministério de João durou
pouco em virtude de sua prisão e martírio, mas assim
que Herodes o tetrarca silenciou a “Voz do que clama no
deserto” (Isaías 40:3), Jesus começou, imediatamente,
a proclamar, na Galiléia, a mesma eloqüente mensagem
da chegada do reino.
Sem exercer domínio político sobre nenhuma
província, e sem a menor intenção de vir a exercê-la em
seu ministério terreno, a pregação de Jesus estava
voltada primeiramente para o arrependimento e a
conversão, como condição única para que o governo de
Deus seja exercido na vida das pessoas.
O reino no passado
Embora o reino de Deus seja ainda futuro em sua
realização plena, em certo sentido elé esteve presente
em Israel, que experimentou em inúmeras ocasiões o
seu poder sobrenatural, como nos sinais realizados por
Moisés no Egito, na travessia do mar Vermelho, na
provisão do maná, nas guerras de conquista sob o
comando de Josué, nos livramentos do povo de Deus das
ameaças de potências inimigas, e nos milagres realizados
pelos profetas, especialmente Elias e Eliseu.
Nos muitos períodos de apostasia de Israel
desapareciam da nação os sinais visíveis da presença do
21
TEU É O REINO
reino de Deus entre eles, até que profetas, sacerdotes e
reis fiéis ao Senhor se levantavam e promoviam
reformas, levando o povo de volta às leis de Deus . Mais
tarde, no chamado período interbíblico, de Malaquias a
João Batista, durante cerca de quatrocentos anos a nação
viveu sob o silêncio da Deus, em que nenhum profeta
surgiu entre eles.
Mas, com a vinda e o ministério do Messias, na época
denominada nas Escrituras de “a plenitude dos tempos”
(Gálatas 4:4), o reino de Deus foi proclamado como
presente aqui na terra de um modo muito mais abrangente
do que nos tempos do Antigo Testamento. O precursor
João Batista, com arrebatadora eloqüência, introduziu o
Messias, e este, ungido por Deus com o Espírito Santo e
com poder, “andou fazendo o bem e curando a todos os
oprimidos do diabo, porque Deus era com ele” (Atos
10:38).
O reino no presente
Já no final de seu ministério, ainda restrito às ovelhas
perdidas da casa de Israel, Jesus afirmou aos líderes
israelitas que o reino de Deus lhes seria tirado, e seria
dado a uma nação que daria os frutos desse reino (Mateus
21:43). Embora alguns teólogos, equivocadamente,
tenham interpretado essa nação como sendo a Inglaterra
ou os Estados Unidos da América, a Bíblia afirma com
clareza que tal nação é a igreja. Pedro afirmou: “Mas
vós sois a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa,
o povo adquirido, para que anuncieis as grandezas
daquele que vos chamou das trevas para a sua
maravilhosa luz” (1 Pedro 2:9).
A igreja, portanto, denominada de “a igreja dos
22
A invasão do reino
primogênitos arrolada nos céus” (Hebreus 12:23),
constituída de “homens de toda tribo; e língua, e povo e
nação”, comprados com o precioso sangue do Cordeiro
de Deus (Apocalipse 5:9), constitui hoje o reino de Deus
na terra. Nela, na igreja, o poder do reino de Deus está
presente e operante no milagre maior de transformação
de vidas, na expulsão de demônios e na libertação dos
oprimidos do diabo.
Portanto, a cada dia devemos nós, como cristãos,
demonstrar pelo nosso modo de vida que o reino de Deus
está em vigor agora mesmo. O modo de fazer isso é deixar
que o Senhor Jesus governe soberanamente em nossa
vida, guiando o nosso comportamento em tudo o que
fazemos.
Billy Graham afirmou muito bem que “o reino de Deus
não é apenas uma esperança futura, mas uma realidade
presente”. De fato, onde quer que homens e mulheres
se voltem para Deus em arrependimento e fé, procurando
fazer a vontade dele aqui na terra como ela é feita no
céu, ali está o reino de Deus.
O reino no futuro
Daniel profetizou com muita clareza a vinda do reino
messiânico de Deus a este mundo. Suas visões proféticas
se estendem desde a sua época até o tempo final dos
acontecimentos do mundo. O Senhor mostrou ao rei de
Babilônia a imagem de um homem que representava os
quatro grandes impérios do mundo: o babilônico, o medo-
persa, o grego e o romano.
Segundo essa profecia, no final dos tempos uma pedra
atingirá a estátua e a reduzirá a pó. O vento se
encarregará de fazer que esse pó desapareça, mas a pedra
23
1
TEU É O REINO
se converterá em uma enorme montanha que encherá
toda a terra. De acordo com a interpretação divina que
Deus deu a Daniel, a vinda da pedra indica o retorno de
Cristo para pôr um fim aos reinos da terra e estabelecer
aqui o seu próprio reino de paz ejustiça.
Jesus, ao voltar à terra, cumprirá as promessas do
reino feitas a Davi (2 Samuel 7:16; Salmo 89:37-38). Tais
promessas foram confirmadas pelo anjo a Maria, por
ocasião do anúncio do nascimento de Jesus: “Disse-lhe
então o anjo: Maria, não temas, achaste graça diante de
Deus. Conceberás e darás à luz um filho, e pôr-lhe-ás o
nome de Jesus. Este será grande, e será chamado Filho
do Altíssimo. O Senhor Deus lhe dará o trono de Davi,
seu pai. Ele reinará eternamente sobre a casa de Jacó, e
o seu reinado não terá fim” (Lucas 1:30-33).
A Bíblia ensina que o dia virá em que as nações do
mundo, especialmente aquelas que têm oprimido a Is­
rael, se submeterão às leis e à justiça divinas. Nesse
tempo, o governo de Deus será como uma forte luz a
dissipar as trevas que têm sobrevindo a este mundo. Esse
tempo será o milênio, quando todo o povo de Israel estará
reunido na terra que Deus lhe prometeu, e Jerusalém
será a capital do mundo. O trono de Cristo estará ali na
Cidade Santa, pois a partir de Jerusalém Jesus
proclamará suas leis para toda a humanidade.
O advento de Cristo marcará o fim definitivo do
governo humano sobre a terra. Cristo reinará sobre todas
as nações do mundo. De acordo com o livro de Apocalipse,
os quatro seres viventes e os vinte e quatro anciãos que
João viu no céujá proclamaram, em cântico, essa gloriosa
verdade (Apocalipse 5:9-10), que se cumprirá quando
soar a sétima trombeta e as vozes celestiais proclamarem:
“Os reinos do mundo vieram a ser de nosso Senhor e do
24
A invasão do reino
seu Cristo, e ele reinará para todo o sempre” (Apocalipse
11:15). Os crentes que forem transformados no rapto,
ou ressuscitados na primeira ressurreição, “reinarão com
ele durante os mil anos” (Apocalipse 20:6).
A principal característica do reinado de Cristo será a
justiça e a paz, pois naquele reino jamais haverá lugar
para a opressão ou a guerra. O profeta registrou: “Vêm
dias, diz o Senhor, em que levantarei a Davi um Renovo
justo, um rei que reinará e prosperará, e praticará ojuízo
e a justiça na terra. Nos seus dias Judá será salvo, e
Israel habitará seguro. Este será o seu nome, com que o
nomearão: O Senhor, Nossa Justiça” (Jeremias 23:5-6).
Embora não nos tenha sido dada nenhuma data para
a vinda de Cristo, a partir da perspectiva de Deus
podemos perceber que esse evento ocorrerá muito breve.
O fato de a igreja primitiva ter enfatizado tanto essa
segunda vinda deve dar-nos um sentido de urgência, uma
vez que estamos vivendo vinte séculos mais próximos
desse glorioso acontecimento do que os nossos irmãos
do primeiro século. Por isso devemos levar a sério as
advertências bíblicas e permanecer vigilantes, pois o Rei
virá a qualquer momento.
Apesar de às vezes vermos o aparente triunfo do mal
ao nosso redor, devemos estar certos de que os propósitos
de Deus continuam a avançar com firmeza para o dia
em que toda a terra será cheia de sua glória, e em que
todas as nações o adorarão. Primeiramente no milênio,
quando Jesus Cristo estabelecerá seu reino terreno, e
depois, para todo o sempre, na eternidade.
E quanto mais nos aproximamos do final dos tempos,
mais firmemente devemos nos apegar às verdades acerca
do reino de Deus agora e no futuro. Devemos proclamar
as novas do poder de Cristo que transforma vidas, para
25
TEU É O REINO
que os que não lhe conheçam tenham a oportunidade de
preparar-se para a sua vinda. O evangelista Richard
Vinyard, numa mensagem baseada em Colossenses 1:13:
“Que nos tirou do poder das trevas, e nos transportou
para o reino do Filho do seu amor”, afirmou:
Fomos tirados do reino das trevas. Ospoderes
do reino do inferno foram quebrantados. Fom,os
trasladados para o reino do seu amado Filho.
Hoje somos filhos do reino dos céus. Temos o céu
dentro de nossos corações hoje à noite. Estamos
vivendo no poder daquele reino. Então ele deve
ter chegado ou não o sentiríamos. O reino deve
ser disponível ou não poderíamos ser
transportados para dentro dele. E desde que
somos transportados para dentro dele, sabemos
que o poder do reino dos céus tem chegado. (4)
26
3
Ogoverno do reino
y
EVIDENTE QUE UM reino só pode existir
g J se tiver como seu cabeça um rei. Não existe reino
^ ^ sem rei. E no caso do reino de Deus, o seu rei é
Deus Pai.
Não sendo nosso propósito fazer aqui uma
apresentação ampla desse rei, mostraremos apenas
alguns aspectos de seu caráter mediante seus atributos
e sua soberania.
A Bíblia Sagrada afirma que o Deus que reina sobre
todo o universo é Espírito (João 4:24), é vida (João 5:26),
existe por si mesmo (Ex 3:14), é infinito (Salmo 145:3),
é imutável, jamais muda (Salmo 102:27; Malaquias 3:6;
Tiago 1:17), é a verdade (Deuteronômio 32:4; João 17:3),
é amor (1 João 4:8), é eterno (Salmo 90:2; Jeremias
23:23-24), é onisciente (Salmo 147:4-5), e é onipotente
(Mateus 19:26).
Esses atributos divinos atestam a sua soberania sobre
toda a criação. Nada escapa ao seu infinito poder,
autoridade e glória. Sendo ele perfeito em grau infinito,
Deus Pai não podejamais ser surpreendido, ou enganado
ou derrotado. Sem comprometer a sua autoridade e seu
propósito de consumar ao final de tudo a sua boa,
agradável e perfeita vontade (Romanos 12:2), aprouve a
27
I
TEU É O REINO
Deus dar ao homem o livre arbítrio, pelo qual é este
responsável perante o seu Criador.
Ribeiro do Vale escreveu um lindo soneto em que tenta
expressar alguns dos atributos de Deus:(5)
Os Nomes de Deus
Querendo Deus gravar seus Nomes na opulência
Do universo, estampou no espaço — Imensidade;
E sobre a curva azul dos mares — Majestade;
Sobre asflores — Beleza; no ar—
- Resplandecência;
Na multidão dos astros — Glória e Onipotência;
No manto que recobre a terra — Variedade;
Na semente das árvores — Fecundidade;
Na fronte do homem estampou — Inteligência;
E nas leis sábias que governam todo o mundo
Deixou gravado claro seu — Saber Profundo.
Mas, na sua obra-prima, o coração humano,
Que a um tempo é o menor dos mundos e o maior,
Soube, com traço fino e misterioso arcano,
Esculpir de seus Nomes o mais belo — Amor!
O reinado do Pai
O reinado do Pai sobre a terra é eterno, como afirmou
Moisés: “O Senhor reinará eterna e perpetuamente”
(Êxodo 15:18). Os salmistas, quando falam desse reinado
de Deus usam o verbo no presente: “Pois o reino é do
Senhor, e ele domina entre as nações... Deus reina sobre
28
O governo do reino
as nações; Deus se assenta no seu santo trono” (Salmo
22:28; 47:8). O profeta Isaías, falando dos mensageiros
de boas novas, afirma que eles dizem a Sião: “O teu
Deus reina!” (Isaías 52:7). E Jeremias registrou: “Tu, ó
Senhor, reinas eternamente, e o teu trono subsiste de
geração em geração” (Lamentações 5:19).
Mas o reinado do Pai vai muito além deste planeta
em que vivemos. Quando Paulo afirma em Efésios 3:14-
15: “Por causa disto me ponho de joelhos perante o Pai
de nosso Senhor Jesus Cristo, do qual toda a família nos
céus e na terra toma o nome”,ele não está falando apenas
de seres humanos, mas também de seres angelicais, que
são criaturas de Deus. A mesma verdade aparece em
Hebreus 12:9, em que o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo
é chamado de “Pai dos espíritos”, expressão que parece
incluir todos os seres morais criados por Deus, quer
sejam homens, quer sejam anjos.
O rei Nabucodonosor, de Babilônia, depois de
humilhado por causa de seu orgulho, reconheceu a
grandeza do reino de Deus, quando disse: “Eu bendisse
o Altíssimo, e louvei, e glorifiquei ao que vive para
sempre, cujo domínio é um domínio sempiterno, e cujo
reino é de geração em geração. Todos os moradores da
terra são reputados como nada; segundo a sua vontade
ele opera no exército do céu e nos moradores da terra.
Não há quem lhe possa deter a mão, nem lhe dizer: Que
fazes?” (Daniel 4:34-35)
As passagens bíblicas que acabamos de citar indicam
que a Primeira Pessoa da Trindade, na qualidade de
Criador de todas as coisas, reina soberanamente sobre
toda a sua criação. Todavia, no que se refere a este
mundo, o seu reino ainda não está de todo manifestado.
Virá, porém, o dia em que esse reino se manifestará e se
29
f
TEU É O REINO
estenderá ao mundo inteiro na pessoa do Filho.
Salomão e a sulamita
Segundo alguns estudiosos da Bíblia, entre eles N. W.
Hutchings, o livro de Cantares, ou Cântico dos Cânticos,
descreve tipologicamente o reinado de Cristo com a sua
igreja.
Considerando que o cântico narra um dos primeiros
namoros de Salomão como rei de Israel, o pano de fundo
desse cântico seria uma vinha que o rei possuía em Baal-
Hamon, ao Norte do país, na qual, por falta de cuidado
dos trabalhadores, pássaros e animais selvagens comiam
as uvas. O rei, então, disfarçado de pastor, foi a Baal-
Hamon inspecionar a vinha, e ali encontrou a linda
camponesa sulamita. Ambos se apaixonaram um pelo
outro.
Como Salomão tivesse que retornar a Jerusalém a
negócios, antes de partir prometeu à sulamita que
voltaria e se casaria com ela. O rei cumpriu a sua
promessa, levando ajovem para o seu palácio e casando-
se com ela. Mas, apesar de todo o esplendor da corte, a
sulamita sentia saudades da sua terra natal, e por isso
Salomão voltou com ela a Baal-Hamon.
Esse lindo cântico — o único que chegou até nós dos
1005 que ele escreveu (1 Reis 4:32) — possui uma
preciosa lição tipológica acerca de Jesus como rei. No
Cântico, Salomão é um tipo do Senhor Jesus, e a
empregada sulamita um tipo da igreja. O amor que
nutrem um pelo outro ilustra bem o amor de Jesus pela
igreja: “Vós, maridos, amai as vossas mulheres, como
também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou
por ela” (Efésios 5:25).
30
O governo do reino
O esplendor de Salomão, descrito em 1 Reis 10:14-29,
aponta para o Senhor Jesus Cristo como o Criador do
Universo. E assim como o mais rico dos homens vai a
Baal-Hamon disfarçado de simples pastor, assim veio
Jesus à terra em pobreza, sem ter sequer onde repousar
a cabeça. Diz a Bíblia: “A vinha do Senhor dos Exércitos
é a casa de Israel” (Isaías 5:7), a quem Jesus foi enviado:
“Eu não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa
de Israel” (Mateus 15:24).
Do mesmo modo como Salomão, disfarçado de pastor,
não foi reconhecido pelos empregados da vinha, que o
expulsaram, assim também Israel não reconheceu a
Jesus Cristo como o Messias, o Rei da glória. Lemos em
João 1:11-12: “Veio para o que era seu, mas os seus não
o receberam. Mas a todos os que o receberam, àqueles
que crêem no seu nome, deu-lhes o poder de serem feitos
filhos de Deus”.
Embora fosse Salomão rejeitado por seus próprios
empregados em Baal-Hamon, a empregada sulamita não
o rejeitara. Salomão significa paz em hebraico, e,
portanto, como rei, era ele príncipe da paz. Sulamita é a
forma feminina de Salomão, e significa filha da paz.
Comparando os tipos de Cantares com os seus
correspondentes antítipos do Novo Testamento, temos
algumas lições importantes. Por exemplo, à pergunta da
Sulamita em 1:7: “Diz-me, ó tu, a quem ama a minha
alma: Onde apascentas o teu rebanho, onde o recolhes
pelo meio-dia. Por que razão seria eu como a que anda
errante pelos rebanhos dos teus companheiros?” ; Jesus
responde: “Eu sou o bom pastor; eu conheço as minhas
ovelhas, e as minhas ovelhas me conhecem” (João
10:14).
Por ser estrangeira, a sulamita representa todos os
31
TEU É O REINO
povos gentílicos pelos quais Jesus morreu, João 3:16;
Marcos 16:15. E assim como ajovem apresenta Salomão
à sua mãe, que tipifica as nações; os crentes de cada nação
apresentam Jesus ao seu povo, 3:4; Mateus 28:19-20.
Salomão deseja entrar no lar da sulamita (2:9), e Jesus
deseja entrar na igreja e em nosso coração (Apocalipse
3:20). Quando a sulamita abre a porta, Salomão a saúda
(2:10-12), dizendo que o tempo de cantar chegou, que as
flores estão florescendo, e que já se ouve a voz das rolas.
Jesus, ao entrar em nossa vida, dá-nos uma nova vida e
o gozo do Espírito Santo, simbolizado pela rola (Mateus
3:16. Veja também Lucas 12:27-31).
O noivo chama a sulamita de jardim fechado, irmã
minha, noiva minha, manancial fechado, fonte selada
(4:12), e a igreja é uma virgem pura, santificada, separada
do mundo (2 Coríntios 11:2).
O Cântico dos Cânticos menciona um banquete
associado com a mirra e a especiaria (5:1), o que aponta
para a última ceia, realizada na noite em que Jesus foi
traído por Judas. Mirra e especiarias estão associadas
também com a preparação de um corpo para a sepultura,
e por isso a sulamita tem um conturbado pesadelo (5:2-
5). Nesse pesadelo temos uma cena noturna (o orvalho)
no Getsêmani, e uma figura de Cristo suando sangue
(gotas da noite), despido da sua túnica (sobre a qual os
soldados lançaram sortes), e tendo os pés lavados
(ungidos para o sepultamento (Mateus 26:12). Uma cena
típica da crucificação.
Mais adiante, a descida de Salomão ao seujardim para
colher os lírios (6:2) pode significar a ida de Jesus ao
paraíso (Lucas 23:43), onde colheria os seus lírios, isto
é, levaria “cativo o cativeiro” (Efésios 4:8). E quando a
sulamita abre a porta, o noivo já não estava mais lá (5:6-
32
O governo do reino
7), o que indica a ascensão de Jesus ao céu (Lucas 24:51).
Ao ser perguntada acerca de seu noivo, a sulamita faz
dele uma descrição (5:10-16) que corresponde à de Jesus
glorificado (Lucas 9:28-36; Apocalipse 1:12-16). Depois,
ao despertar de seu sono, a sulamita vê que seu noivo
volta para ela, não há como um pobre pastor, mas em
poder e glória (3:6-8), o que indica a volta de Cristo
(Mateus 24:30). Jesus, ao retornar no final do período
da Tribulação a fim de salvar Israel, ele virá como Rei
dos reis e Senhor dos senhores (Apocalipse 19:12-13),
com aquela glória que a empregada sulamita viu em
Salomão.
Depois a sulamita sobe do deserto encostada ao seu
amado (8:5), o que corresponde ao rapto da igreja (1
Tessalonicenses 4:16:17).
Finalmente, a transformação da humilde camponesa
em rainha ilustra a transformação que experi­
mentaremos na volta do Senhor (1 Coríntios 15:51-52),
quando receberemos um corpo perfeito.(6)
O Cântico dos Cânticos, portanto, traz lições
tipológicas importantíssimas para todos nós hoje. E como
afirma Paulo em 1 Coríntios 10:11: “Tudo isto lhes
aconteceu como exemplos, e estas coisas estão escritas
para aviso nosso, para quem já são chegados os fins dos
séculos” .
A realeza de Jesus
Alguns fariseus, ao interrogarem a Jesus acerca da
época em que ele estabeleceria na terra o seu reino,
tiveram como resposta: “O reino de Deus está dentro
em vós” (Lucas 17:21). Aqueles religiosos devem ter
ficado decepcionados com a resposta de Cristo, pois não
33
TEU É O REINO
viam com seus próprios olhos tal reino, nem o podiam
compreender ou sentir.
De maneira geral, os judeus esperavam da parte do
Messias um domínio político e ditatorial, que rápida e
heroicamente libertasse Israel de seus poderosos
opressores. Suas mentes e atenções estavam de tal
maneira voltadas para as dificuldades econômicas,
religiosas e morais da nação, que só podiam esperar da
parte de Deus um Cristo revolucionário, talvez como um
dos Macabeus, que suplantasse pela força das armas o
Império Romano e reinasse em Jerusalém “com vara de
ferro”, conforme anunciava o Salmo 2, versículos 6, 8 e
9: “Eu ungi o meu Rei sobre o meu santo monte Sião...
Pede-me, e eu te darei as nações por herança, e os fins
da terra por tua possessão. Tu os regerás com vara de
ferro; tu os despedaçarás como a um vaso de oleiro” .
Um teólogo brasileiro descreve que esse anseio popu­
lar dos judeus pelo reino do Messias só concebiam esse
reino como um poder político com as...
acenadoras glórias da era dos Macabeus, cuja
linhagem e cuja influência ainda coloriam os
horizontes de Israel, a que se aliava a natural
inclinação das mentes empolgadas por visões de
grandeza terrena, esperava um Rei, na acepção
consuetudinária do termo, aassentar-se num trono
esplêndido, cercado de fâmulos e vassalos,
poderosos contingentes armados e portentosos
arraiais fortalecidos, soberbo e imperioso,
magnífico e pomposo como nenhum outro na
tradição de Israel.C)
Tal interpretação de escrituras isoladas não poderia
34
O govarno <
/<
>io/no
apoiar-se no conjunto das claras profecias, pois estas
falavam de um Messias desprezado, perseguido e
aparentemente fraco, que seria levado à cruz como se
leva um cordeiro ao matadouro (Isaías 53). Isso a maioria
dos judeus não percebeu, como também não percebeu
as profecias acerca da sua ressurreição e do
estabelecimento por ele de seu reino eterno, porém
inicialmente caracterizado por seus aspectos espiritual
e moral.
O mesmo teólogo atrás citado assinala, mais adiante
que o evangelista Mateus, começando pela genealogia
de Cristo, revela a sua intenção de destacar a realeza de
Cristo.
“Não rei nos moldes terrenos, segundo as
prerrogativas políticas e o serviço de interesse
materiais. Ao contrário, rei, rei grandioso e
soberano, cumprimento real dos arrojados e
constantes vaticínios dos profetas, vida
plenamente em harmonia com a vontade divina,
senhor augusto do presente e do além. Varão de
Dores, tão majestoso na humilhação a que se
condicionou, supremo na exaltação de que se
aureolara, cumprida a missão redentora a que
viera, restaurado ã glória celeste de onde
procedera”.(8)
Embora rejeitado pelo povo e incompreendido até
mesmo por muitos de seus próprios discípulos, Jesus
cumpriu fielmente a missão que lhe havia sido confiada
pelo Pai, de resgatar com seu precioso sangue os que
nele cressem. E depois de vencer o diabo e a morte, ele
entregou aos seus primeiros súditos as boas novas de
35
TEU É O REINO
salvação, e os mandou proclamá-las a todos os povos..
Os súditos do reino de Deus, sobre os quais Jesus reina
soberano, é chamado nas Escrituras de “raça eleita,
sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade
exclusiva de Deus” (1 Pedro 2:9). Estes são alguns dos
títulos da verdadeira Igreja. Esta fiel assembléia dos
santos, enquanto estiver na terra como igreja militante,
tem de lutar contra o reino das trevas, despoticamente
governado por Satanás e seus agentes, e onde estão
presos e escravizados todos os que ainda não nasceram
de novo.
O reinado de Jesus
As Escrituras tratam também do aspecto escatológico
do reino, a ser estabelecido aqui na terra com a vinda de
Jesus para o Milênio. As referências bíblicas são
abundantes:
Deus prometeu a Abraão que da sua descendência
sairiam reis (Gênesis 17:6). Jacó profetizou que o cetro
não se apartaria de Judá, e que viria Silo, o Messias
(Gênesis 49:8). Os profetas falaram de Cristo como rei
(Isaías 9:6; Zacarias 9:9; Jeremias 23:5). De fato, Jesus
nasceu como rei (Mateus 2:2,11,16-18), foi aclamado rei
pelos judeus (João 12:12-16; Mateus 21:8-11), testificou
da sua realeza diante de Pilatos (João 18:33-37), como
rei foi coroado e crucificado (Mateus 27:29, 37), e como
rei foi recebido em cima nos céus (Salmo 24:7-10).
Não foi por acaso que Pilatos ordenou que fosse
afixada no cimo da cruz um anúncio de que Jesus era
rei, escrito em grego, a língua da ciência; em hebraico, a
língua da religião, e em latim, a língua do governo.
Como Rei dos reis e Senhor dos senhores Jesus é hoje
36
O governo do reino
glorificado (1 Timóteo 1:17; 6:15; Apocalipse 1:5; 15:3;
19:6). Como rei ele voltará com poder e grande glória
(Mateus 16:27, 28; 25:34; Apocalipse 17:14;19:16), e
reinará na terra durante mil anos (Ezequiel 37:22,24,25;
Apocalipse 20:1-6; Daniel 2:44; 7:27; Mateus 19:28; Atos
2:30). Finalmente, como rei ele entregará o Reino ao Pai,
no final do Milênio, quando toda a rebelião estiver para
sempre aniquilada (1 Coríntios 15:24-28; Filipenses 2:9-
11).
Segundo a aliança estabelecida entre Deus e Davi,
através do profeta Natã (2 Samuel 7:1-17), a casa de Davi
(sua linhagem), o trono de Davi e o reino de Israel
durariam para sempre. Quando o anjo Gabriel anunciou
aMaria o nascimento de Jesus, disse que ele seria grande,
e o Senhor Deus lhe daria o trono de Davi seu pai, e que
ele reinaria sobre a casa de Jacó para sempre, e seu reino
não teria fim (Lucas 1:32, 33). Aqui estão as mesmas
três palavras-chave da aliança davídica: trono, casa e
reino.
As nações não querem que Cristo reine sobre elas.
Israel não quis e ainda não quer que Cristo reine sobre
ele, mas Deus é fiel e executará a sua vontade. Jesus
reinará!(9
)
37
4
O acesso ao reino
/ ^ ) VISLUMBRE QUE O livro do Apocalipse
í J nos mostra, com respeito a nossa eterna
y—
S recompensa, escapa à compreensão humana.
Mas essas indicações do cumprimento do Reino foram
dadas para animar-nos. Embora talvez não possamos
compreender mentalmente o completo significado de
nossa futura glória com Deus, podemos contar com essa
realidade tão certos como aceitamos a verdadeira
presença de Cristo em nós hoje. O Reino não nos foi
revelado em etapas, como se fosse um acidente no plano
de Deus. Cada parte deste eterno mosaico está sendo
colocada no seu devido lugar, de acordo com a perfeita
vontade divina.
Ao longo da história e em nossos dias não tem faltado
tentativas de construir o reino de Deus aqui na terra.
Até mesmo a Igreja Católica Romana se considerou,
durante os longos séculos do cesaropapismo, a recipiente
e mantenedora desse reino.
Podemos construir o reino ?
Não há, nas Escrituras, nenhuma indicação de que
seja possível aos homens construir aqui na terra o reino
39
TEU É O REINO
de Deus. É claro que se pode melhorar as condições
espirituais, morais e sociais do mundo mediante a
aplicação dos princípios do reino. Um bom exemplo dessa
possibilidade é a aldeia de Shimabuko, no Japão:
Durante a Segunda Guerra Mundial,
Clarence W
. Hall, correspondente de guerra dos
Estados Unidos, ao visitar a aldeia de
Shimabuko, em Okinawa, escreveu: Durante
anos a aldeia não tivera cadeia, nem bordel, nem
embriaguez, nem divórcio. Havia ali um alto
nível de saúde e felicidade... Criaram uma
democracia cristã na sua forma mais pura”.
E que os mil habitantes de Shimabuko haviam
recebido a
, visita de um missionário que foi para
o Japão, uns trinta anos antes, o qual deixara ali
um exemplar da, Bíblia em poder de dois
shimabukanos convertidos, Mejun Nakamura e
Shasei Kina, respectivamente chefe eprofessor da
aldeia. Ao partir, disse o missionário aos dois
crentes: “Estudem este Livro, pois ele dará a vocês
uma fé robusta. Quando a féé forte, tudo é forte”.
Sem noção de culto ou templo cristão, os mil
habitantes criaram o seu próprio sistema de
adoração. O professor Kina fazia a leitura da
Bíblia e todos repetiam em forma de cântico.
Entoavam hinos e faziam orações voluntárias.
Em seguida passavam a tratar dos problemas
da aldeia, e, para cada questão, Kina procurava
na Bíblia uma resposta.
Após tomar parte num desses cultos, o
motorista de Hall disse-lhe com ares de mofa:
“Veja, tudo isso é resultado de uma, só Bíblia, e
40
O acesso ao reino
de dois fanáticos que querem viver como Jesus”.
Impressionado com o que viu, o motorista
acrescentou: “Talvez estejamos usando as armas
erradas para tornar o mundo melhor”. Ele fazia
referência às armas de guerra.
Alguns anos depois de terminada a guerra,
Clarence Hall voltou a Okinawa para ver o efeito
da civilização que os norte-americanos tinham
introduzido. Okinawa estava irreconhecível. Em
lugar depequenas aldeias havia agora ruas, lojas,
armazéns, clubes, cinemas, teatros, campos degolfe,
piscinas, estação de rádio e televisão. Havia bares
e prostíbulos. Hall procurou Shimabuko e a
encontrou “cercada”pelo “progresso”. Entretanto,
toda aquela confusão e aflição do “progresso” não
a tinham atingido. Permanecia espiritualmente
separada de tudo aquilo, baseando sua vida nos
ensinos da Bíblia. E Clarence Hall não pôde
esquecer do que lhe dissera seu motorista anos
passados: “Talvez estejamos usando as armas
erradas para tornar o mundo melhor!”(m
)
Alguns “construtores ” do reino
O exemplo de Shimabuko difere de diversos outros,
como a pretensão do catolicismo romano de ter-se
constituído, na Idade Média, o reino de Deus na terra
mediante o exercício, pelo papa, dos poderes espiritual e
secular, a que se convenciou chamar de cesaropapismo.
Mas a história está aí para atestar o quanto tal pretensão
esteve longe de se cumprir.
Após a Segunda Grande Guerra surgiu um movimento
que também pretendia construir aqui o reino de Deus.
41
TEU É O REINO
Foi a Teologia do Evangelho Social. O conhecido livro
Em seus passos que faria Jesus ?,.por sinal em si mesmo
um bom livro, tem sido considerado um produto dessa
tentativa, que também ficou conhecida como evangelho
do caminho de Jericó, em virtude da sua ênfase nas
melhorias das condições sociais do mundo.
Mais recentemente, teólogos católicos e protestantes
intentaram construir o reino de Deus através do
movimento conhecido como Teologia da Libertação.
Gustavo Gutierrez, os irmãos Boff e Ruben Alves são
alguns dos mais conhecidos propagadores desse
movimento que analiso em meu livro O Deus dos Pobres,
traduzido e editado na língua espanhola com o título El
Senor de los Pobres.
Em virtude da poderosa influência do evangelho em
nações como Inglaterra e Estados Unidos da América,
alguns estudiosos da Bíblia chegaram a propor que esses
países se tornaram os sucessores de Israel como
representantes do reino de Deus na terra. Todavia, à
luz de passagens claríssimas das Escrituras, como a de 1
Pedro 2:7-10, o reino de Deus não foi entregue a
nenhuma nação em particular, mas à igreja. Por isso não
há como negar a responsabilidade da igreja, e de cada
cristão em particular, de ser o “sal da terra” e a “luz do
mundo” , contribuindo de modo decisivo para as
melhorias das condições de vida da sua comunidade. A
luz de Mateus 25:34-40, Jesus continua faminto em cada
pessoa faminta, continua com sede em cada sedento,
continua preso em cada prisioneiro.
Os perigos do conformismo
O fato de ser a salvação um dom de Deus, e não o
42
O acesso ao reino
produto do nosso bom desempenho pessoal, não significa
que temos o direito de cruzar os braços e nos tornarmos
indiferentes à miséria humana. Justamente quando a
Bíblia afirma que somos salvos pela graça de Deus,
mediante a fé, ela conclui que “somos criação de Deus
realizada em Cristo Jesus para as boas obras, as quais
Deus preparou de antemão para que nós as
praticássemos” (Efésios 2:10, NVI). As vezes enfatizamos
tanto a salvação pela graça que acabamos nos esquecendo
de que as obras são o fruto da salvação, e de que “a fé, se
não tiver obras, é morta em si mesma” (Tiago 2:17).
Não há a menor dúvida, portanto, de que devem os
cristãos contribuir para que haja, no mundo, os sinais
benditos da presença do reino. Muitas coisas boas hoje
presentes na sociedade são frutos diretos ou indiretos
do cristianismo, como hospitais, orfanatos, lar de idosos,
o fim da escravatura, e até mesmo o preço fixo no
comércio, que aboliu no ocidente o injusto e corrupto
sistema de regateio. Neste último caso, os cristãos se
inspiraram nas palavras de Jesus: “Seja o vosso ‘Sim’,
sim; e o vosso ‘Não’, não” (Mateus 5:37).
A respeito da verdadeira missão da igreja, escrevi, em
1989:
Seguindo o exemplo de Cristo, a evangelização
inclui o serviço. Disse Jesus: “Eu para isso nasci
e para isso vim ao mundo, a fim de dar
testemunho da verdade” (João 18:37), e: “Pois o
Filho do homem não veio para ser servido, mas
para servir e dar a sua vida em resgate por
muitos” (Marcos 10:45). Comentando o pedido
dos filhos de Zebedeu, de se assentarem um à
direita e o outro à esquerda de Jesus, John Stott
43
TEU É O REINO
afirmou que “o símbolo de uma liderança
autenticamente cristã não é a veste de púrpura
de um imperador, mas o avental batido de um
escravo; não um trono de marfim e ouro, mas
uma bacia de água para a lavagem dos pés”.
Meu amigo, pastor Ricardo Gondim
Rodrigues, que realiza em Fortaleza, no Nordeste
brasileiro, notável obra espiritual e social, disse,
num dos boletins semanais da sua grande e
atuante congregação, que a igreja evangélica,
omissa em muitas de suas áreas, deve voltar às
suas origens, aoprimeiro amor de uma fé simples
sem ser simplista. Eis suas palavras: “A Igreja
não é lugar de posições, títulos, e fama. Aqui se
aprende a servir. Aprendemos a arte de amar, a
Deus e ao semelhante. Organização, comissões,
atas e plenárias devem ficar sempre na
perspectiva de servir à visão maior que é levar
as pessoas a amarem e servirem o Deus vivo.
Evangelizar, cuidar e orar deveriam ser
conjugados em todos os tempos com todos os
pronomes ”.(u)
Stott insiste na necessidade de a igreja se dispor a
seguir o exemplo de Cristo:
Onde está o espírito de aventura, o senso de
desinteresseira solidariedade com os menos
privilegiados? Onde estão os cristãos dispostos
a colocar o serviço acima da segurança, a
compaixão acima do conforto, a dureza acima
da vida fácil? Milhares de tarefas cristãs
pioneiras, que desafiam a nossa complacência e
44
O acesso ao reino
demandam risco, aguardam para serem feitas.
A insistência na segurança é incompatível com
o caminho da cruz. Que aventuras ousadas fo­
ram a encarnação e a expiação! Que quebra de
convenções e decoro ter o Deus Todo-poderoso
renunciado a seus privilégios a fim de se vestir
de carne e levar o pecado do homem! Jesus não
tinha segurança nenhuma a não ser em seu Pai.
De modo que seguir a Jesus é sempre aceitarpelo
menos certa medida de incerteza, perigo e
rejeição por amor a ele. (1
2
)
O que diz a Bíblia
Através das páginas do Novo Testamento, e em espe­
cial nos evangelhos e no livro de Atos, nos deparamos
constantemente com apelos à salvação que indicam
“como” somos introduzidos no seio do reino de Deus.
“Arrependei-vos, pois está próximo o reino dos céus”
(3:2). “Arrependei-vos e crede no evangelho” (Marcos
1:15). “Então, saindo eles [os doze), pregavam ao povo
que se arrependesse” (Marcos 6:12). “Antes, se não vos
arrependerdes, todos de igual modo perecereis” (Lucas
13:3). Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado...”
(Atos 2:38). “Arrependei-vos, pois, e convertei-vos, para
que sejam apagados os vossos pecados...” (Atos 3:19).
“Crê no Senhor Jesus Cristo, e serás salvo, tu e a tua
casa” (Atos 16:31).
No evangelho de João são bem conhecidos os
versículos que indicam a necessidade da fé em Cristo e
da posse dele para a salvação. Vejamos: “Mas a todos os
que o receberam, àqueles que crêem no seu nome, deu-
lhes o poder de serem feitos filhos de Deus” (3:12). “Para
45
TEU E O REINO
que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a
vida eterna” (3:16). “Todo aquele que crê no Filho tem
a vida eterna” (3:36).
São fortes, na Bíblia, as palavras que indicam fé,
arrependimento, conversão e posse. Mas essas palavras
indicam apenas o lado humano, aquilo que temos de
fazer. Embora a salvação seja um dom gratuito de Deus,
cabe a nós aceitá-la ou não mediante escolha nossa. Deus,
pelo Espírito Santo, apela à nossa vontade. “Quem
quiser, tome de graça da água da vida” (Apocalipse
22:17).
Devemos receber o reino
Se construir o reino revela o ego insubmisso
pretendendo o impossível pelo esforço próprio, receber
o reino revela, por outro lado, o ego submisso e receptivo,
de mãos vazias, aceitando alegremente o dom da graça
de Deus.
Recebemos o reino pela fé, em humildade. A expressão
“pobres de espírito”, de Mateus 5:3, quer dizer também
suficientemente humilde e receptivo para receber das
mãos de Deus o seu dom inefável. Como Deus mesmo
estabeleceu o princípio de que o orgulho fecha a porta
da graça, somente os que possuem um espírito
renunciado, esvaziado de qualquer vaidade, estão aptos
a estender a mão e tomar posse da salvação.
O esforço humano em estabelecer o reino pode ser
comparado à tentativa da vespa que tenta escapar
através da vidraça. Em seu desespero ela se joga
repetidamente contra o obstáculo, em vão. Por fim,
exausta, ela cai no peitoril dajanela, e então escapa livre
através de pequena abertura, pois a janela não estava
46
O acesso ao reino
totalmente abaixada. Assim deve o crente cessar de lutar
e deixar-se cair nas mãos onipotentes de Deus, de onde,
livre, pode finalmente alçar vôo às maiores alturas. Frida
Vingrem expressou essa verdade ao escrever, num lindo
hino, que “às alturas santas ninguém voa, sem as asas
da humilhação”.
Como recebemos o reino
O ato em si de recebimento do reino possui alguns
passos, como no início de um relacionamento de amizade
entre duas pessoas. Conhecido evangelista internacional
sugere estes cinco passos:
(a) A etapa da aproximação. Esta é a etapa
experimental. Você não tem certeza se quer
entregar-se inteiramente a outrapessoa. E a fase
do sim e não. (b) A etapa na qual há a decisão
interior de se dar a alguém — a fase da decisão.
(c) Você leva a cabo a decisão — você realmente
faz a entrega interior a outra pessoa, (d) Tendo-
se dado à outrapessoa, você está agora livrepara
receber daquela pessoa. Há um intercâmbio de
si mesmos — você pertence àquela pessoa, e
aquela pessoa pertence a você. Vocês são um. (e)
Há um ajuste contínuo e mútuo de mente à mente,
vontade à vontade, e de ser a ser através dos anos.
A amizade se desdobra. (1
3
)
Desejo destacar três desses passos, a saber: a
aproximação, a decisão e a entrega. Esses passos
poderiam também ser chamados deconflito mental, crise
emocional e resolução do conflito.
47
TEU É O REINO
A aproximação, ou conflito mental. Esta etapa pode
durar muito tempo, anos até, ou pode ser vencida em
apenas alguns minutos. Como pastor, conheço pessoas
que ainda não venceram essa etapa em dez anos, e sei de
outras que o fizeram rapidamente, em um culto. A razão
por que em alguns casos tal aproximação é lenta se deve
à hesitação.
No caso de uma amizade humana, a hesitação pode
estar em ambos os lados, mas nunca em se tratando de
amizade com Deus, pois da parte dele não há nenhuma
hesitação. Tudo foi feito e tudo está perfeitamente
arranjado. E como disse Jesus: “Vinde, pois tudo já está
preparado” (Lucas 14:17). Jesus, ao exclamar na cruz:
“Está consumado”, colocava um ponto final na obra
redentora que viera realizar. Da parte dele, do Pai e do
Espírito Santo não há nada mais a fazer. Agora, tudo
depende de nós.
Infelizmente, como todas as religiões ensinam a busca
de Deus pelo homem, algumas pessoas acham que o
mesmo ocorre no cristianismo bíblico. Um amigo meu
mostrou-me um original sob o título: “A trajetória do
homem em busca de Deus”, e eu sugeri-lhe que mudasse
o título para: “A trajetória de Deus em busca do homem”,
pois é exatamente isso que ensinam as Escrituras. O
pecador não pode encontrar a Deus pelo fato de estar
sempre correndo para longe dele, mas pode colocar-se
no caminho de Deus para que seja achado por ele.
Há um exemplo clássico de como podemos nos colocar,
mesmo involuntariamente, na condição de sermos
achados por Deus.
Quando findou a Segunda Grande Guerra, a família
alemã Schuricht substituiu o “deus” Hitler pelo “deus”
Stalin. Rodolfo, filho dessa família, tornou-se comunista
48
O acesso ao reino
fanático e fundou o primeiro clube comunista parajovens
em 1947. Um ano depois a organização contava 4.500
membros, e, na qualidade de dirigente, Rodolfo odiava
tanto os não comunistas e era tão odiado por eles que
sequer podia andar livremente.
Cerca de dois anos e meio mais tarde, um jovem
procurou Rodolfo e pediu demissão do clube. Tinha
começado a ler a Bíblia e desejava seguir a Cristo. O
dirigente perguntou-lhe que estupidez o tinha levado a
ler um livro tão cheio de mentiras e contradições, e então
o jovem pediu-lhe que lhe mostrasse essas mentiras e
contradições da Bíblia.
Poucos dias depois o vice-presidente, com enorme
brilho na face, também procurou Rodolfo pela mesma
razão: tinha-se convertido. Replicando às mesmas
agressões verbais, o demissionário pediu a Rodolfo que
lhe mostrasse as mentiras da Bíblia.
Duplamente desafiado, o líder comunista decidiu
estudar a Bíblia e anotar suas contradições. Em seis
meses leu-a de capa a capa sem encontrar uma só das
muitas contradições que esperava achar. Então, numa
manhã, ao levantar-se da cama, ajoelhou-se e, pela
primeira vez em sua vida, orou: “O Deus, se tu és o
verdadeiro Deus, o Deus vivo, e se Jesus Cristo é o teu
Filho, então liberta-me, salva-me e dá a tua paz ao meu
coração” . Esta foi a sua primeira oração, e Deus
respondeu imediatamente, enchendo seu coração de
alegria e paz.
Rodolfo buscou então o seu camarada e confessou-
lhe sua fé em Cristo, dizendo: “Agora sigo contigo no
mesmo caminho, e vou abandonar imediatamente o
partido comunista. Andava nas trevas, ignorante da
Palavra de Deus. Comprei uma Bíblia com o propósito
49
TEU É O REINO
de descobrir mentiras para te libertar, mas nesse santo
livro encontrei a salvação. Agora, ambos iremos confessar
a nossa fé e procurar servir o nosso Mestre e Senhor”.(1
4
)
O colocar-se em contato com a Bíblia foi a maneira de
Rodolfo ser achado por Deus.
Para ilustrar quanto tempo podemos resistir ao apelo
de Deus e permanecer na fase de aproximação,
transcrevo aqui, de outro livro meu, um testemunho bem
antigo:
Há mais de um século, quando ainda não
existia o túnel de São Gotardo, os que se dirigiam
à Suíça procedentes da Itália, ou vice-versa,
tinham de transpor o desfiladeiro do mesmo
nome a pé, o que exigia muito tempo. Como era
comum naquele tempo viajar-se em grupos,
alguns pedreiros de Lugano se dirigiam à Suíça
em busca de melhores salários. Entre estes estava
Antônio, um jovem que depois de evangelizado
por uma senhora, ganhara desta uma Bíblia de
luxo, encadernada a couro. Embora a recebesse,
não se interessou em lê-la, pois não queria saber
nada do Cristianismo.
Já em seu posto de trabalho em Glarus,
Antônio, enquanto ajudava na construção de um
edifício, zombava e praguejava com os colegas
de tudo que fosse sagrado. De repente, ao rebocar
uma parede, deparou com um vão que devia ser
preenchido com um tijolo. Subitamente lembrou-
se da Bíblia em sua bagagem e disse aos colegas:
— Camaradas, ocorre-me uma boa
brincadeira. Vou colocar esta Bíblia neste vão.
Em virtude do tamanho, a Bíblia foi
50
O acesso ao reino
espremida, danificando a encadernação.
— Vejam! — disse Antônio. — Agora reboco à
frente e quero ver se o diabo consegue tirá-la
daqui!
Semanas mais tarde ele voltou à sua pátria.
No dia 10 de maio de 1851, irrompeu em
Glarus um grande incêndio que destruiu 490
edifícios. Embora a cidade toda estivesse em
ruínas, decidiu-se reconstruí-la.
Umpedreiro perito do norte da Itália, de nome
João, foi incumbido de examinar uma residência
ainda nova, porém parcialmente destruída.
Batendo com seu martelo em diversos pontos de
uma parede intacta, a certa altura deslocou-se
uma parte do reboco e surgiu um livro embutido
na parede. Bastante admirado ele o puxou. Era
uma Bíblia... Como teria ido parar ali? Era-lhe
inexplicável, especialmente porque já possuíra
uma, mas tinham-na tomado. “Esta eles não me
tomarão”, cogitou.
João tornou-se um leitor da Bíblia em todas
as suas horas livres. Embora entendesse apenas
algumas partes dos Evangelhos e dos Salmos,
aprendeu e compreendeu que era um pecador.
Descobriu também que Deus o amava e que
poderia obter o perdão dos seus pecados pela fé
no Senhor Jesus. Quando, no outono, regressou
ã sua pátria e à sua família, anunciou por toda
a parte a sua salvação em Cristo.
Munido de uma mala de Bíblias, João
aproveitava suas horas livres para divulgar o
evangelho. Assim, chegou ele à região onde
residia Antônio e armou sua estante de Bíblias
51
TEU É O REINO
numa feira. Quando Antônio, perambulando
pela feira, parou diante da estante de João, disse:
— Ora, Bíblias! Disso não preciso. Basta-me
ir a Glarus, pois lá tenho uma bem escondida na
parede. Gostaria de saber se o diabo consegue
tirá-la dali.
João fitou o homem seriamente e disse:
— Tome cuidado, jovem! Zombar é fácil. O
que você diria se eu lhe mostrasse a tal Bíblia ?
— Você não me enganaria — replicou
Antônio. -—Reconhecê-la-ia imediatamente, pois
ela está marcada. — E asseverou: — Nem o diabo
consegue tirá-la da parede!
João buscou a Bíblia e perguntou:
— Amigo, reconhece esta marca?
Ao ver a Bíblia danificada, Antônio calou-se,
perplexo.
— Você está vendo ?No entanto não foi o diabo
quem a retirou da parede, mas Deus, para que
você pudesse reconhecer que ele vive. Ele quer
salvá-lo também.
Nesse instante, embora com sua consciência o
acusando, Antônio extravasou todo o ódio
acumulado contra Deus. Chamou os amigos:
— Ei, colegas! O que este sujeito, com sua
estante religiosa, procura aqui ?
Em poucos segundos a estante de João estava
arrasada e ele mesmo violentamente agredido.
Os agressores rapidamente desapareceram en­
tre o povo.
Desde então Antônio revoltava-se cada vez
mais contra Deus. Certo dia, depois de beber em
demasia, caiu do andaime a dezessete metros de
52
O acesso no reino
altura e foi hospitalizado em estado grave. João,
ao saber do acidente, foi visitá-lo no hospital.
Embora impressionado com a atitude de João, o
coração de Antônio continuava empedernido.
João o visitou cada semana. Decorrido algum
tempo, o acidentado começou a ler a Bíblia,
inicialmente como passatempo, e mais tarde com
interesse. Certa ocasião leu em Hebreus 12:5:
“Filho meu, não menosprezes a correção que vem
do Senhor”.
Ora, isso se ajustava bem a seu caso. Antônio
prosseguiu a leitura, e a Palavra de Deus, capaz
de esmiuçar a penha, passou a operar em sua
vida. Reconheceu sua culpa e confessou-a a Deus.
Creu verdadeiramente na obra de Cristo
consumada na cruz. Sua alma convalescera,
porém seu quadril, paralisado, o incapacitava
para a sua antiga profissão. Encontrou um
serviço condizente com suas aptidões, e, mais
tarde, casou-se com a filha de João, agora seu
sogro, amigo e pai na fé.
Antôniojá está, há muito, na pátria celestial,
mas a Bíblia por ele emparedada permanece
como uma valiosa herança de seus
descendentes. (1
5
)
A decisão. O segundo passo é o da decisão, ou crise
emocional. Nessa etapa você sabe quejá não pode resistir
ao apelo do amor de Deus, que o conflito íntimo em que
você vive exige providências da sua parte.
Nesse estágio da decisão você pode experimentar
grande perturbação. Toda a sua vida poderá ser
confrontada com as exigências do evangelho. Assim
53
TEU É O REINO
como quando Jesus chegou o rei Herodes “alarmou-
se e com ele toda Jerusalém”, assim também ocorre
com você quando Jesus bate à porta de sua vida. O
evangelho nos desarranja antes de nos consertar. Seus
pais poderão opor-se à sua decisão; o futuro cônjuge
ou o cônjuge poderá ameaçá-lo com o término do
relacionamento; suas amizades poderão abandoná-lo.
Todas estas coisas, e muitas outras mais, poderão
pressionar você a dizer “não” a Cristo, mas o profundo
anseio de sua alma poderá clamar mais alto e
realmente levá-lo a decidir pelo “sim” .
Recordo-me de quando estive nessa fase. Eu havia sido
comunista e ateu. Havia passado anos lendo literatura
marxista que considerava enorme tolice a Bíblia e a vida
cristã. Agora prestava o serviço militar, e no quartel havia
conhecido o evangelho não apenas pregado, mas vivido
de fato por alguns soldados crentes. Era muito forte o
meu anseio por uma mudança radical em toda a minha
vida, mas o que diriam os meus antigos amigos de
ideologia? O que diriam os meus novos colegas de farda,
aos quais eu já havia impressionado com os meus
conhecimentos ideológicos?
Mas, graças a Deus, prevaleceu o irresistível apelo do
amor de Deus. Numa quarta-feira à noite, no templo da
Igreja Metodista de Resende, estado do Rio de Janeiro,
fui de tal modo envolvido por ondas do amor de Deus
que não contive as lágrimas. Semanas mais tarde, no
templo da Assembléia de Deus da mesma cidade, ergui
meu braço cansado em sinal de que estava decidido a
seguir a Cristo, custasse o que custasse. Era o dia 17 de
setembro de 1959, e passou-me pela mente que eu
deveria aguardar o domingo seguinte para tomar aquela
decisão, pois seria então no dia do meu vigésimo
54
aniversário. Resolutamente afastei aquele pensamento,
e assim, publicamente, entreguei a minha vida a Cristo
naquela noite memorável. No dia 8 do seguinte mês de
novembro, eu e mais alguns jovens descemos às águas
do batismo.
A entrega, ou a resolução do conflito. E esta a fase de
consumação de todo um processo de aproximação,
conflito e decisão. Finalmente você se entregou a ele, e
pertence a ele.
Em muitos casos a pessoa que entrega
verdadeiramente a sua vida a Cristo enfrenta tremendas
batalhas espirituais. Poderá ver o seu lar transformado
num inferno, ser deserdado pelos pais, perder o
namorado (ou a namorada) etc. Há países em que tal
decisão pode significar até a morte. Na China, por
exemplo, é comum os ministros perguntarem aos novos
crentes, antes do batismo, se eles estão dispostos a
morrer pela sua fé, e muitas vezes é este o preço que se
paga pela entrega da vida a Cristo.
Há uma linda figura nas palavras de Jesus: “Em
verdade, em verdade vos digo que se o grão de
trigo, caindo na terra, não morrer, fica só. Mas se
morrer, produz muito fruto” (João 12:24). A Vida
desceu a este mundo perdido na pessoa de Jesus,
a fim de elevar-nos do reino das trevas ao reino
da sua maravilhosa luz. Mas como é que a vida
sobe de um nível para o outro?
Somente através da entrega. Ilustremos com os
reinos da natureza. Começando com o mais inferior
deles, o mineral, temos depois o reino vegetal, depois o
reino animal, e acima deste o reino do homem. O reino
de Deus é o quinto e o último, o mais elevado. A única
chance que tem a vida de elevar-se é apegar-se ao reino
O acesso ao reino
55
TEU É O REINO
imediatamente superior. Como isso ocorre?
Olhemos para uma linda flor, alva e perfumada,
medrando em feio lodaçal. A flor lança a sua semente,
que é totalmente imersa no charco. A vida inferior do
charco, para elevar-se ao nível superior do reino da flor
tem de se apegar àquela semente e entregar-se por
completo a ela. A partir daí, todo o processo de
transformação se inicia, e assim a vida do inferior reino
mineral se eleva para o superior reino vegetal.
O reino do homem, por sua vez, tornou-se um charco
de lodo por causa do pecado. Davi, ao ser salvo, percebeu
em que triste condição havia estado: “Tirou-me de um
lago horrível, de um charco de lodo” (Salmo 40:2). O
pecado trouxe trevas e morte a esse reino humano, que
perdeu a sua beleza e a imagem e semelhança com a
divindade. O ser humano desceu tanto que foi além do
inferior reino animal, tornando-se pior do que as bestas
feras; pior do que a criação bruta.
Mas foi precisamente a esse degradado reino humano,
alienado de Deus, que Jesus veio. Como aquela árvore que
Moisés lançou nas águas de Mara a fim de sará-las (Êxodo
15:23-25), assimfoiJesus lançado àsprofundezas damorte.
“O Verbo se fez carne, e habitou entre nós” (João 1:14).
Henry Barraclough descreve esta verdade nos versos de
um lindo hino:
A sua vida gastou aqui perdidos pra salvar;
Na cruz sangrenta se deu a si, afim de os resgatar.
O povo com apatia viu a prova desse amor;
E sua graça jam ais mediu um mundo
pecador... (1
6
)
Eis aí a chance de nos elevarmos do reino humano ao
56
O acesso ao reino
reino divino! Da mesma maneira como a vida no reino
mineral, para elevar-se, tem de se entregar à vida do
reino vegetal que desceu até ela, assim também devemos
nós entregar sem reservas a nossa vida humana à
semente do reino de Deus, Jesus, e deixar que os
processos vitais do reino superior operem livremente em
nós. Somente assim a nossa vida inferior entra na nova
dimensão da Vida superior do reino de Deus.
Arrependimento e conversão
Mas precisamos ainda analisar dois importantes
termos bíblicos: o arrependimento e a conversão. Eles
aparecem separados, como fases seqüentes, no apelo de
Pedro: “Arrependei-vos, pois, e convertei-vos” (Atos
3:19). O arrependimento precede a entrega, e esta marca
o início da conversão.
Arrepender-se, portanto, significa entristecer-se por
causa do modo de vida errado que apessoa vive, e desejar
mudar completamente esse modo de vida. A palavra tem
também o significado de voltar-se, de reverter
completamente a direção da vida da pessoa.
O arrependimento bíblico é tão urgente quanto
apropriado, pois o reino há tanto tempo aguardado está
agora presente e bem junto de cada um de nós. “O reino
de Deus está dentro de vós” (Lucas 17:20).
Tanto na mensagem pregada por João Batista como
na que pregaram Jesus e os apóstolos, é forte a ênfase
nos resultados do arrependimento. “Produzi, pois, frutos
dignos de arrependimento”, bradava o Batista. “Quem
não negar-se a si mesmo não pode ser meu discípulo”,
ensinava Jesus. “Portanto, se alguém está em Cristo, é
nova criação. As coisas antigasjá passaram; eis que coisas
57
TEU É O REINO
novas surgiram!” (2 Coríntios 5:17, NVI), é a tônica de
Paulo. E mais: “Agora, porém, despojai-vos também de
tudo: da ira, da cólera, da malícia, da maledicência, das
palavras torpes da vossa boca. Não mintais uns aos
outros, pois já vos despistes do velho homem com os seus
feitos, e vos vestistes do novo, que se renova para o
conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou”
(Colossenses 3:8-10).
O passo que se segue ao arrependimento é o da
conversão, que por sua vez produz no arrependido um
sentimento de pobreza espiritual, de pequenez e de
humildade, que são os frutos do verdadeiro
arrependimento e da fé.
O apóstolo Paulo descreve a experiência cristã em três
estágios distintos, sendo o primeiro deles a vivificação,
relacionada com o arrependimento, e o segundo, a
ressurreição, nesse caso uma ressurreição moral, um
novo tipo de vida, não mais centralizado em si próprio,
mas em Cristo.
A conversão implica no abandono, por parte do
convertido, do senhorio e da justiça próprios. O
convertido passa a centralizar-se em seu Salvador, e a
valer-se daquelajustiça superior, adquirida por Jesus no
Calvário.
O terceiro resultado da conversão é o que Paulo chama
de “assentado nas regiões celestiais em Cristo Jesus”
(Efésios 2:5-6), o que corresponde ao novo nascimento.
O papel do Espírito Santo
E decisivo o papel do Espírito Santo em nossa salvação.
E ele quem convence o mundo do pecado, dajustiça e do
juízo (João 16:8-11). E ele quem nos leva à fé e ao
58
O acesso ao reino
arrependimento, e é ele quem nos regenera. Diz a Bíblia:
“Não por obras de justiça praticadas por nós, mas
segundo a sua misericórdia ele nos salvou mediante o
lavar regenerador e renovador do Espírito Santo” (Tito
3:5).
O Espírito Santo, portanto, faz que o convertido viva
um novo tipo de vida, ou “em novidade de vida”, usando
uma expressão paulina. Essa vida nova tem como
marcas: a justiça, que diz respeito ao relacionamento
fraterno com todas as pessoas; a santidade (Efésios 5:24),
que diz respeito ao nosso relacionamento com Deus; a
pureza, que diz respeito ao nosso afastamento de todas
as obras da carne, conforme relacionadas em Gálatas
5:16-21; e, a verdade, que significa o nosso apego a Jesus
e à sua Palavra (1 Coríntios 5:7).
O alvo final do Espírito Santo é a produção no crente
da colheita do Espírito (Gálatas 5:22-23), que quer dizer,
em outras palavras, trazer à vida do crente a imagem de
Deus em Cristo (Colossenses 3:10). Falando desse
maravilhoso processo, diz Paulo que “ somos
transformados de glória em glória na mesma imagem,
como pelo Espírito do Senhor” (2 Coríntios 3:18).
59
5
Os súditos do reino
SERMÃO DE JESUS registrado por Mateus,
especialmente no quinto capítulo de seu
Evangelho, tem sido considerado por muitos
estudiosos da Bíblia como a ética do reino. Esse sermão
não consiste de uma nova lista de mandamentos, como
o decálogo, mas sim de uma descrição clara e simples de
como devem viver as pessoas que entram no reino de
Não há dúvida de que as exigências éticas desse
sermão de Jesus são incomparavelmente maiores do que
qualquer outro mandamento contido nas Escrituras. A
superioridade do sermão do monte em relação aos dez
mandamentos, por exemplo, é equivalente à luz do sol
em relação à luz da lua.
Mas as exigências de Jesus não têm por objetivo levar
seus ouvintes ao desespero, mas conduzi-las, mediante
o arrependimento e o novo nascimento, a um novo
padrão de vida, vivido não no poder do nosso desempenho
pessoal, mas pela poderosa ação do Espírito Santo em
nosso coração.
Mesmo estando as exigências de Jesus definidas em
termos absolutos, como: “Sede vós, pois, perfeitos, como
perfeito é o vosso Pai que está nos céus” (Mateus 5:48),
Deus.
61
TEU É O REINO
ainda assim não devemos encará-las como inatingíveis,
mas como um constante desafio em nosso
aperfeiçoamento espiritual. Se não podemos alcançar
as estrelas, devemos, pelo menos, nos orientar por elas
enquanto navegamos no tempestuoso mar desta vida
presente.
Em nossa sucinta análise do sermão do monte nos
restringiremos às bem-aventuranças. Convém,
entretanto, que apresentemos aqui uma definição do
termo “bem-aventurado”, que aparece repetidas vezes
nas páginas da Bíblia, tanto do Antigo como do Novo
Testamento.
De acordo com Mounce, “bem-aventurado descreve
uma alegria cujo segredo está dentro da própria
pessoa” .(1
7) Diferentemente dos pagãos, que chamavam
seus deuses de “os bem-aventurados” , como seres
privilegiados que desfrutam uma felicidade digna de ser
atingida pelos seus adoradores, os israelitas jamais
atribuíram esse título ao seu Deus.
Na Bíblia, “bem-aventurados” são aqueles que se
aproximam de Deus, em humildade e reverência,
reconhecendo a soberania dele sobre todas as coisas,
como Criador e Redentor. Eis alguns exemplos, tirados
dos Salmos: “Bem-aventurados todos aqueles que nele
se refugiam” (Salmo 2:12); “Bem-aventurado aquele cuja
transgressão é perdoada” (Salmo 32:1); “ Bem-
aventurada é a nação cujo Deus é o Senhor” (Salmo
33:12); “Bem-aventurado aquele a quem tu escolhes, e
fazes chegar a ti” (Salmo 65:4); “Bem-aventurados os
que habitam em tua casa” (Salmo 84:4); “ Bem-
aventurados os que observam a justiça, que praticam o
que é correto em todos os tempos” (Salmo 106:3); “Bem-
aventurados os que trilham caminhos retos, e andam na
62
Os súditos do reino
lei do Senhor. Bem-aventurados os que guardam os seus
estatutos...” (Salmo 119:1-2), etc.
Os pobres
Jesus inicia seu discurso exclamando que não são os
ricos e poderosos que são bem-aventurados, mas os
pobres e humildes, os de espírito renunciado. “Pobre”,
aqui, não quer dizer apenas alguém destituído de bens,
mas qualquer pessoa que, em sua necessidade, busca a
ajuda de Deus, como Davi, que disse: “Eu sou pobre e
necessitado, mas tu, ó Senhor, cuidas de mim” (Salmo
40:17). E mais adiante: “Os pobres verão isto, e se
agradarão; vós, que buscais a Deus, reviva o vosso
coração” (Salmo 69:32).
A palavra grega parapobres tem o sentido de “extrema
pobreza” , por derivar-se de “um verbo que significa
‘rastejar’ ou ‘agachar-se’ (a forma substantiva é usada
para designar o mendigo, alguém em pobreza abjeta)”(1
8
).
Ser pobre de espírito significa, portanto, depender
totalmente de outrem para ajuda, especialmente de Deus.
E como lemos no Salmo 34:6: “Clamou este pobre, e o
Senhor o ouviu; salvou-o de todas as suas angústias” .
O fato de Mateus acrescentar à palavra “pobre” o
qualificativo de espírito fez que Calvino sugerisse aqui um
tipo de pobreza especial: apobrezaevangélica. “São Mateus
ajuntando este epíteto restringe a bem-aventurança a
somente aqueles que, disciplinados pela cruz, aprenderam a
ser humildes”.(1
9
)
Seja como for, a gloriosa verdade é que o reino pertence
aos que assumem a posição de absoluta dependência de
Deus, e nesse reino entram triunfantes mediante a obra
redentora de Cristo.
63
TEU É O REINO
Os que choram
A expressão “os que chorara” refere-se aos servos de
Deus que sofrem na terra por causa do curso deste
mundo tenebroso, que vive o seu dia a dia como se Deus
nunca existisse. Esse curso do mundo, por ser totalmente
oposto ao reino de Deus, faz que os filhos de Deus nadem
contra a correnteza, sofrendo todo o tipo de oposição
por parte dos pecadores.
Phillips traduz essa expressão por “os que sabem o
que significa a tristeza” . Os que choram, portanto,
choram de tristeza pela condição pecaminosa do
mundo. Mas os tristes serão consolados, conforme
proclamou Isaías: “O Espírito do Senhor está sobre
mim, porque o Senhor me ungiu para pregar as boas-
novas aos pobres... a consolar todos os tristes, e
ordenar acerca dos tristes de Sião que se lhes dê
ornamento por cinza, óleo de alegria por tristeza, veste
de louvor por espírito angustiado...” (Isaías 61:1-3).
Os mansos
A terceira bem-aventurança destina-se aos mansos.
Entre os Evangelhos sinópticos, apenas Mateus usa a
palavra grega para “mansos”, e isso em três ocasiões
distintas. A segunda vez que encontramos essa palavra,
em Mateus 11:28-30, Jesus convida a todos os cansados
e sobrecarregados deste mundo para que vão a ele,
tomem sobre si o seu jugo, e aprendam que o Senhor é
“manso e humilde de coração”.
A ultima referencia a “manso” ocorre no final do
ministério terreno de Jesus, quando ele entra em
Jerusalém montado num jumento, em cumprimento
64
Os súditos do reino
àprofecia de Zacarias: “O teu rei vira a ti,justo e salvador,
humilde, montado em jumento, num jumentinho, filho
de jumenta” (Mateus 21:5; Zacarias 9:9).
Jesus exemplificou aqui na terra o tipo de mansidão
que requer de todos os que ingressam no seu reino.
Longe de tentar estabelecer um reino político através
da força, como tantos outros o fizeram antes dele, Jesus
viveu entre nós uma vida de serviço sacrificial e
humilde, tanto para Deus como para todos os seres
humanos.
Um dos maiores mestres da Bíblia escreveu acerca da
humildade:
O ensino do Novo Testamento é que devemos
ser suplicantes e não auto-suficientes. Este fato
é um grande choque para a vaidade
contemporânea. Exatamentepor esta razão é que
eu me convenço de sua veracidade. Pode uma
profunda, consciência de Deus surgir ou ser
imposta a conceitos auto-suficientes ?A essência
do divino é a humildade. Oprimeiro passo para
encontrar a Deus é destruir nosso orgulho, dar-
lhe um tiro mortal para que, humilhados até o
pó, sejamos exaltados até às alturas; tão tocados
que rompamos num cântico; tão submissos que
sejamos cônscios de nós mesmos. A fonte de nossa
vida, espiritual será, daí por diante, gratidão,
exaltada gratidão porque, não tendo nada,
possuímos tudo”.{w)
A humildade, ou mansidão, é, portanto, a
característica dos que vão herdar a terra e ter, aqui,
abundância de paz (Salmo 37:11). Todas as coisas que
65
TEU É O REINO
realmente dão satisfação genuína e duradoura estão
destinadas aos mansos, os únicos que de fato podem
gozar a vida.
Os que têm fome e sede dejustiça
Milhões de pessoas que hoje vivem no mundo jamais
sofreram a amarga experiência da fome e da sede. Por
isso não lhes é fácil entender o verdadeiro significado
das palavras de Jesus. Mas no mundo antigo, em virtude
de guerras e secas prolongadas, uma parcela muito
grande da população vivia contentemente à beira dessas
tragédias, às vezes fugindo de perseguição ou
atravessando longos desertos sem a devida provisão do
precioso líquido.
Jesus sabia que, mediante tais figuras vividas, seus
ouvintes avaliariam corretamente o anseio pela justiça
que todo filho do reino deve ter, pois ele fala, não da
fome e sede físicas, mas da espiritual. Os filhos de Coré,
no Salmo 42:1-2, usam a sede como figura de seu
profundo anseio espiritual: “Como o cervo anseia pelas
correntes das águas, assim suspira a minha alma por ti,
ó Deus. A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo.”
Mas o que é ajustiça? Frei Heitor Pinto escreveu um
interessante poema àjustiça, que diz:
O Justiça, guia da nossa vida, que seria do
mundo sem ti?! Tu és inventora das leis; mestra
dos bons costumes; tu alevantas as virtudes e
abates os vícios. Tu és a inimiga da azeda
discórdia e conservadora da doce paz. Tu
espantas os maus e asseguras os bons. Sem ti, a
ordem é desordem, a vida é morte, o descanso é
66
Os súditos do reino
trabalho, a glória é infâmia, o bem é mal. Tu
destruíste a confusão egeraste a boa governança.
Tu livras os inocentes e condenas os culpados.
Tu alegras osjustos tristes e entristeces osjustos
alegres, para que deixadas as suas vãs e
temporais alegrias, alcancem os verdadeiros e
eternos contentamentos. Finalmente, tu és aquela
gloriosa escada de Jacó, que com uma ponta
estava na terra e com a outra tocava no céu, pela
qual subiam uns e outros desciam: porque tu
alevantas os justos e santos até os altos céus, e
derribas os ímpios e danados até os profundos
dos abismos. (2
1
)
Que bom seria se ajustiça cumprisse com rigor o seu
importante papel na sociedade! Entretanto, quantas
pessoas não têm sido vítimas da corrupção justamente
da parte daqueles que têm o dever de fazer justiça! Um
brasileiro no exterior, ao ser perguntado como ia o Brasil,
respondeu ironicamente que ia muito bem, pois “cinco
por cento da população não tinha de que se queixar, e
noventa e cinco por cento não tinha a quem se queixar” .
Ele falava da impunidade dos poucos que se enriquecem
à custa do desamparo de muitos.
No presente contexto do sermão do montej ustiçavem
a ser aquelas condições sociais e espirituais que
prevalecerão em nosso mundo por ocasião do reino
milenial de Cristo, quando a vontade de Deus será feita
na terra como agora é ela feita no céu. A promessa de
Cristo é que Deus satisfará plenamente a todos aqueles
que, como os filhos de Coré, todos os dias suspiram pela
oportunidade de viver em plena harmonia com a vontade
divina.
67
TEU É O REINO
Jesus se serve, aqui, da figura de um banquete
espiritual em que famintos e sedentos encontram farta
satisfação para as suas mais profundas necessidades.
“O Senhor dos Exércitos preparará neste monte a
todos os povos uma festa com animais gordos, uma
festa com vinhos puros, com coisas gordurosas, e
vinhos velhos, bem purificados” (Isaías 25:6). No
último livro da Bíblia, afirma Jesus: “ Quem tem
ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas. Ao que
vencer darei do maná escondido, e lhe darei uma pedra
branca, e na pedra um novo nome escrito, o qual
ninguém conhece senão aquele que o recebe”
(Apocalipse 2:17).
Um grande homem de Deus observou que “nunca
conseguimos obter o suficiente daquilo que na verdade
não queremos. Fomos criados para Deus e nada, exceto
sua presença, nos satisfaz” .(2
2
)
Portanto, a justiça pela qual os servos de Deus
suspiram é muito superior a todo o tipo dejustiça terrena,
e inclui a consumação final da obra redentora de Jesus
no Calvário, o que se dará por ocasião de sua volta em
triunfo para reinar aqui na terra.
Os súditos do reino de Deus, vivendo ainda na carne,
anseiam pelo momento ainda futuro da ressurreição
dos que dormiram em Cristo, ou da transformação dos
cristãos vivos, por ocasião do arrebatamento. Somente
então se cumprirá o que Paulo escreveu: “Pelo que
Deus o exaltou soberanamente, e lhe deu um nome
que é sobre todo o nome, para que ao nome de Jesus
se dobre todo joelho dos que estão nos céus, na terra e
debaixo da terra, e toda língua confesse que Cristo
Jesus é o Senhor, para glória de Deus Pai” (Filipenses
2 : 10- 11).
68
Os misericordiosos
A misericórdia é outra característica dos súditos do
reino de Deus (Mateus 5:7-8). A palavra significa
compaixão despertada pela miséria alheia, e perdão.
No Novo Testamento o termo significa “bondade”, e
a ele estão associadas expressões como “ amor
persistente” e “cheios de compaixão”, evidentemente
compaixão pelos que estão perdidos, e sofrem. Dentro
do contexto bíblico, a misericórdia praticada pelos súditos
do reino não é simplesmente o fruto de emoções
passageiras ou de uma filantropia interesseira, tão
comuns nas religiões de mercado, baseadas na salvação
pelas obras. Os bem-aventurados misericordiosos são
aquelas pessoas fiéis a um relacionamento de aliança,
que praticam a misericórdia com uma bondade
intencional.
A vida humana de milhões, nos dias de Jesus, não
passava de verdadeira tragédia, tanto na Palestina como
na maioria das outras nações. Eram espantosas a
crueldade e a brutalidade infligidas pelas pessoas livres
às multidões escravizadas. Em Roma, por exemplo, os
escravos viviam à mercê do capricho de seus senhores,
na maioria das vezes cruéis, que tinham pleno direito de
tirar-lhes a vida quando bem o quisessem. “De um tal
Pólio, cavaleiro do tempo de Augusto, consta que foi
censurado por atirar os escravos vivos ao seu lago para
sustentar lampreias, que depois se aprazia em saborear
na sua mesa!”(2
3
) Atribui-se a Aristóteles a expressão:
“O escravo é um utensílio com vida, e um utensílio é um
escravo sem vida”.
Foi nesse contexto que Jesus veio ao mundo, como
bem escreveu Rui na sua célebre Prece de Natal:
69
TEU É O REINO
“Enquanto César cuidava do império, e Roma do mundo,
assomavas Tu ao canto de uma província e na vileza de
um estábulo, sem que Roma, nem o império, nem César
Te percebessem, para ficar à posteridade a lição indelével
de que a política ignora sempre os seus mais formidáveis
interesses” .
Jesus exemplificou essa compaixão em seu ministério.
Mateus afirma, para citarmos apenas esse evangelista:
“Vendo ele as multidões, tinha grande compaixão delas,
porque andavam cansadas e abatidas, como ovelhas que
não têm pastor” (9:36). “Saindo Jesus, viu uma grande
multidão, e, possuído de grande compaixão para com ela,
curou os seus enfermos” (14:14). E mais adiante: “Jesus
chamou os discípulos e lhes disse: Tenho compaixão da
multidão... Movido de compaixão, Jesus tocou-lhes os
olhos. Imediatamente recuperaram a vista, e o seguiram”
(15:32; 20:34).
Os misericordiosos, portanto, são aqueles que, como
Jesus, mostram misericórdia aos fracos, aos
desamparados, aos pequeninos, possuindo assim “o
mesmo sentimento que houve em Cristo Jesus”
(Filipenses 2:5).
Mas misericórdia é palavra sinônima de perdão. Os
cavaleiros da antiguidade davam o nome de
“Misericórdia” ao punhal que traziam à sua direita, com
o qual matavam o adversário derribado, se este não
pedisse misericórdia.
A Bíblia afirma que aos misericordiosos Deus
mostrará misericórdia. Essa reciprocidade está presente
na oração do Pai Nosso, em que Jesus enfatiza a
necessidade de perdoar para ser perdoado: “Perdoa as
nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos
devedores” (Mateus 6:12). O verdadeiro súdito do reino
70
Os súditos do reino
de Deus, portanto, é aquela pessoa incapaz de guardar
mágoas ou ressentimentos contra quem quer que seja.
Ele mantém sempre uma atitude perdoadora. Um
experiente conselheiro sugere diversos passos para quem
deseja de fato perdoar, sendo este um deles:
Mesmo quando cheio do poder do Espírito
Santo, a pessoa deve tomar uma decisão
consciente de perdoar aquele que pecou contra
ela. Veja, mesmo depois de nos tornarmos crentes,
Deus nunca remove nosso livre arbítrio. Nós
sempre temos a oportunidade e responsabilidade
de escolher o que faremos. Deus não nos fará
perdoar, mas ele nos ajudará aperdoar, se nossa
escolha for obedecê-lo. Davi escreveu: “Venha a
tua mão socorrer-me, pois escolhi os teus
preceitos ” (Salmo 119:173). Quando tomamos a
decisão consciente de perdoar aos outros, Deus
nos ajuda. (2
4)
Apiano, no primeiro volume do seu livro Maravilhas
do Egito, narra surpreendente caso testemunhado por
ele próprio na cidade de Roma, nos dias de Caio César.
No grande circo exibia-se aopovo um combate
em grande escala com as feras. Foi introduzido
o escravo de um cruel ex-cônsul da África do
Norte. O nome do escravo era Androcles. Ao vê-
lo à distância, diz Apiano, o leão estacou como
que surpreendido, depois aproximou-se
vagarosamente do homem, e, tranqüilamente
começou a lamber-lhe os pés e as mãos.
Androcles, ao passo que se submetia às carícias
71
TEU É O REINO
de um animal tão feroz, readquiriu a perdida
coragem e, aos poucos, volveu os olhos para o
leão. Então, diz Apiano, ainda o homem e o leão
trocaram efusivas saudações, como quem se
reconhecia um ao outro. Sendo isso deveras
pasmoso, o povo rompeu em altos gritos de
aclamações. Caio César chamou Androcles a si,
e indagou a razão daquela cena.
Foi então que Androcles relatou a estranha e
surpreendente história. Disse ele que, havendo
fugido de seu cruel Senhor, escondera-se numa
caverna em deserto solitário. Nessa caverna
entrou, depois de algum tempo, um leão com uma
pata ferida, a sangrar, dando a conhecerpor seus
gemidos, a torturante dor que sentia. A princípio,
Androcles ficou atemorizado, mas o leão ergueu
a pata para ele, que viu uma enorme lasca de
madeira enterrada na sola de seu pé. Com
cuidado, removeu-a, então, tratando a ferida o
melhor que pôde. O leão deitou-separa repousar.
Anos depois é que os dois se encontraram
novamente nesse famoso dia no circo. Como
Androcles fora misericordioso para com o leão,
alcançou agora misericórdia também”.(2
5
)
Ninguém perdoou mais do que Deus e do que Jesus.
A Bíblia está cheia de expressões que falam do amor
perdoador de Deus, e o Salmo 136 é bom exemplo, ao
afirmar vinte e seis vezes que “o seu amor dura para
sempre”. Noutro Salmo, lemos que “Quanto está longe
o oriente do ocidente, assim [o Senhor] afasta de nós as
nossas transgressões” (Salmo 103:12). Note que não se
trata da distância entre o norte e o sul, que é finita, mas
72
Os súditos do reino
entre o oriente e o ocidente, que é infinita. Se pudéssemos
tomar um avião rumo ao norte, em dado momento
alcançaríamos o nosso alvo; mas se esse alvo é o oriente
ou o ocidente, então nunca o alcançaríamos.
E assim que devemos perdoar. Gamaliel de Jabné,
famoso rabino do primeiro século, dizia: “Enquanto você
for misericordioso, o Misericordioso lhe será
misericordioso” .(2
6
) O perdão de Deus está condicionado
ao perdão com que perdoamos aos outros. Jesus deixou
essa verdade bem clara quando disse: “Pois se perdoardes
aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial
vos perdoará a vós. Porém se não perdoardes aos homens
as suas ofensas, também vosso Pai celestial não perdoará
as vossas” (Mateus 6:14-15).
Kay Arthur afirma que “deixar de perdoar vai con­
tra todo o evangelho da salvação, que lhe traz o
perdão dos pecados, das suas dívidas, outorgado por
um Deus santo. Recusar-se a perdoar é negar ou
esquecer o conteúdo da salvação. E o mesmo que
dizer: ‘Deus o perdoará, mas eu não. O seu pecado,
companheiro, é grande demais!’ ” (27)
Portanto, todos os que verdadeiramente foram
perdoados por Deus, não fazem outra coisa senão
perdoar.
Os puros de coração
Embora a pureza sexual esteja presente aqui, a
expressão puros de coração é mais abrangente e inclui a
retidão e a inteireza ou sobriedade. Trata-se portanto,
de pessoas que não têm o eu dividido, mas unido e
harmônico.
Tiago considera sinônimas as expressõesduplo ânimo
73
TEU É O REINO
e coração impuro, quando afirma: “Vós, de duplo ânimo,
purificai os corações” (Tiago 4:8).
A bem-aventurança dos puros de coração é que verão
a Deus. A Bíblia diz que essa será a maior bênção que
um ser humano possa receber, uma vez que ninguém
jamais viu a Deus (João 1:18), pelo fato de Deus habitar
na luz inacessível (1 Timóteo 6:16).
A promessa de Apocalipse 22:4, de que os salvos verão
a Deus, terá o seu cumprimento pleno quando
recebermos o nosso novo corpo, pela ressurreição ou pela
transformação, por ocasião do regresso do Senhor Jesus.
Enquanto esse glorioso dia não chega, podemos ter uma
visão mais profunda de Deus mesmo neste tempo
presente, através de uma comunhão mais íntima com
ele.
Os pacificadores
A virtude da pacificação torna os que a possuem em
filhos de Deus. Sendo Deus um Deus de paz, que pelo
sangue de seu próprio Filho fez a paz entre nós e ele,
quando reconciliamos as pessoas umas com as outras,
fazendo isso de todo o coração, então herdamos de nosso
Pai celestial essa virtude dele. Um pastor evangélico de
gênio extremamente agressivo tentavajustificar as suas
atitudes belicosas junto a outro pastor, dizendo que
herdara de seu pai aquele temperamento. O colega
retrucou que, como cristãos, todos nós temos um novo
pai, o Pai Celestial, de quem nos tornamos herdeiros.
Davi nos diz que devemos procurar a paz e segui-la
(Salmo 34:14), e o autor de Hebreus nos manda seguir a
paz com todos (Hebreus 12:14). Lincoln, o presidente
dos Estados Unidos da América ao tempo em que aquela
74
Os súditos do reino
nação viveu a sua maior crise social — a guerra civil —
agiu como perfeito pacificador, jamais tomando partido
entre os estados do Norte e os do Sul, e essa atitude foi
decisiva para a pacificação do pós-guerra e o
fortalecimento de toda a nação.
Em seu propósito de sempre buscar a paz com todos,
Lincoln conseguiu tornar-se amigo de um forte
adversário político, provocando críticas de alguns amigos.
Sua resposta foi: “Não é nosso dever acabar com os
nossos inimigos? Eu acabei com um deles, fazendo dele
um amigo” . Não é sem motivo que os norte-americanos,
e tantos outros povos, não conseguem esquecer-se de
Lincoln, o Pacificador.
Os que sofrem perseguição
Esta bem-aventurança destina-se somente àqueles
que são perseguidos “por causa da justiça”, ou seja, que
sofrem pelo fato de perseverarem na prática da fé cristã,
afastando-se do pecado e de todo o tipo de corrupção.
Especialmente quando um fiel servo de Deus assume
um cargo de influência em uma empresa ou um mandato
público, onde a corrupção existe, e esse crente rejeita
participar de manobras ou negociatas desonestas, é certo
que a perseguição virá de muitas formas.
A sociedade em geral tem a tendência de perseguir e
afastar de seu meio tanto os que descem abaixo do nível
moral dela quanto aos que se elevam acima dela. Por
isso estão nos presídios os criminosos comuns, que
matam, estupram, assaltam e roubam. Mas também são
banidos do meio social os que se elevam acima da média,
como tem acontecido com tantos, dentre eles João
Bunyan, que passou 20 anos encarcerado sem nunca ter
75
TEU É O REINO
sidojulgado, somente porque desejava viver o evangelho
como Jesus viveu. É como o próprio Jesus afirmou:
“Quem pratica o mal odeia a luz e não se aproxima da
luz, temendo que as suas obras sejam manifestas” (João
3:20, NVI).
Um cristão verdadeiramente honesto incomoda muito
os que vivem na prática da desonestidade, que tudo fazem
para se livrar dele. “Todos os que desejam viver piamente
em Cristo padecerão perseguições” (2 Timóteo 3:12),
afirma o apóstolo Paulo. Sei de crentes que perderam
bom emprego público por se recusarem a participar de
negócios escusos que envolviam até mesmo os seus
coniventes superiores.
Jesus diz que o reino dos céus pertence a essas pessoas
perseguidas. Não somente estão elas dentro do reino;
este lhes pertence, é delas.
76
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  • 1. Estudo devocional e explicativo de um dos mais importantes temas do Novo Testamento —o Reino de Deus
  • 4. ISBN 85-85589-14-0 Categoria: Vida Cristã © 1997 Editora Betei 1■ ' impressão 1997 Impresso na Gráfica Editora Serrana Ltda Todos os direitos reservados e/n língua portuguesa por Editora Betei, R. João Vicente, 7, Madureira 21340-020 Rio de Janeiro, RJ Salvo quando mencionada outra fonte, as citações bíblicas foram extraídas da Edição Contemporânea de Almeida. Capa: Anderson Rocha
  • 5. Dedicatória v A Lucinha, minha esposa. Aos alunos emestres do Seminário Betei. 5
  • 6. índice Prefácio.................................................. 9 1. A abrangência do reino.............11 2. A invasão do reino..................... 19 3. O governo do reino....................27 4. O acesso ao reino....................... 39 5. Os súditos do reino................... 61 6. A prioridade do reino................77 7. O bem do reino............................85 8. A harmonia do reino..................93 9. A perenidade do reino.............. 99 10. A plenitude do reino................111 11. O aconchego do reino..............117
  • 7. Prefácio / / enho a imensa satisfação de apresentar ao / público Teu é o Reino, da erudita pena do pastor Abraão de Almeida. O autor, em suas quase três dezenas de obras em português e espanhol, têm enriquecido o povo de Deus com cultura, teologia, filosofia, história e literatura, transmitindo experiência e prática numa linguagem simples, didática e acessível a todos. Teu é o Reino é mais uma dessas valorosas obras do escritor Abraão de Almeida que vem suprir, por certo, uma verificada carência nos púlpitos, nas cátedras teológicas, nas igrejas e no meio do povo em geral. O autor se dirige, nesta obra, tanto a crentes como a descrentes, ao expor, com clareza, como o absoluto reino de Deus invade a nossa ordem relativa, trazendo às vezes perturbação emocional e espiritual, mas produzindo, por outro lado, entrega, renúncia, e uma profunda harmo­ nia com a natureza, com o próximo, com Deus e com o universo. Em seu primeiro capítulo, Teu é o Reino faz uma exposição clara do significado de expressões que ainda têm sido alvo de polêmicas entre os estudiosos da Palavra de Deus, como reino de Deus e reino dos céus, além de outras frases em que aparece a palavra reino. Mas a obra é muito mais devocional do que explicativa, e nos dez capítulo restantes o autor desafia seus leitores a viverem avida cristã em toda aplenitude do reino, que étotalitário, harmônico, prioritário e aconchegante. Creio que ao finalizar a leitura deste livro o leitor sentirá o impulso de agradecer a Deus o inefável dom de seu reino, pois 9
  • 8. descobrirá que tal reino é, de fato, o nosso verdadeiro lar. A Editora Betei lança Teu é o Reino com a certeza de que a sua leitura, meditação e prática enriquecerão a vida cristã de todos os seus leitores. PastorDoutor Manoel Ferreira Presidente da Convenção Nacional das Assembléias de Deus no Brasil - Ministério de Madureira Presidente do Conselho Nacional de Pastores do Brasil 10
  • 9. 1 A abrangência do reino Ç * OBRESSAI NOS EVANGELHOS a ênfase que 1 Jesus Cristo deu ao reino de Deus, pois a ele se ^— referiu nada menos que 70 vezes, enquanto apenas duas vezes à Igreja. Por isso o evangelho é também conhecido como o evangelho do reino, expressão presente em quase todas as parábolas contadas pelo Sal­ vador. Para um perfeito entendimento do reino no Novo Tes­ tamento é primordial que se considere a expressão que contenha “reino” à luz do seu respectivo contexto. Em outras palavras, é preciso que se maneje bem a palavra da verdade, pois às vezes o contexto pode ser mais abrangente do que o próprio capítulo ou o livro em que uma passagem está inserida; pode tratar-se de uma dispensação. A propósito, o verbo “manejar”, que aparece em 2 Timóteo 2:15, tem sido traduzido por “distribuir” (Monges de Meredsous), “ensinar” (Versão Inglesa de Hoje), “dispensar” (Bíblia de Jerusalém), “dividir” (Versão Autorizada de 1611, em inglês), etc.. Especialmente quando a Escritura Sagrada se refere a “reino” temos de examinar em que contexto esse “reino” se insere. Por exemplo, os discípulos de Jesus, ao perguntarem a este se a vinda do Espírito Santo 11
  • 10. TEU É O REINO significaria a restauração do reino a Israel, tiveram como resposta que não lhes pertencia “saber os tempos ou as épocas que o Pai estabeleceu pelo seu próprio poder” (Atos 1:7). Não é difícil perceber em que contexto os discípulos estavam usando a palavra “reino” . Como afirma Will­ iams, eles ainda estavam “acorrentados à noção popu­ lar de um reino de Deus eminentemente político, que sua vinda traria a reunião de todas as tribos, a restauração da independência de Israel e o seu triunfo sobre todos os inimigos. Neste campo eles não haviam feito muito progresso, e ainda se prendiam à esperança primitiva de vir a ocupar lugares de proeminência num reino material” .0) E claro, nas Escrituras, que o reino será restaurado a Israel, mas num sentido escatológico e em condições espirituais, políticas e sociais profundamente alteradas. Na linguagem de Jesus, o “reino de Deus” de Atos 1:3, a ser pregado pelos discípulos em todo o mundo, seria um reino do âmbito do Espírito Santo, não deste mundo (João 18:36), no qual se entra mediante o arrependimento dos pecados e a fé na pessoa do Salvador e na obra por ele realizada na cruz. Há, pelo menos, sete expressões para “reino” no Novo Testamento: 1. Reino dos Céus. Esta expressão, sempre com a palavra “céus” no plural, ocorre 32 vezes no Novo Tes­ tamento, e todas elas no Evangelho de Mateus, tendo em vista o propósito daquele evangelho. E evidente que algumas vezes o “reino dos céus” de Mateus aparece em passagens paralelas de outros evangelhos como “reino de Deus” (por exemplo: Mateus 11:11 com Lucas 7:28), o que, entretanto, não altera o propósito que teve Mateus 12
  • 11. A abrangência do reino ao escrever o seu evangelho. “Reino dos Céus”, como um termo dispensacional, é às vezes usado para o reino do Messias, e às vezes para indicar a soberania celestial sobre a terra. A soberania vem dos céus porque o Rei vem de lá (João 18:36). Foi para esse fim que o Messias nasceu, e este foi o primeiro objetivo de seu ministério. De acordo com a parábola profética de Jesus em Mateus 22:2-7, aquele reino foi rejeitado pelos judeus, tanto durante o ministério de Jesus como na proclamação apostólica (Atos 3:19-23). Por causa dessa rejeição do reino, a sua realização terrena foi adiada até que o Rei seja enviado dos céus, conforme disse Pedro: “E envie ele a Jesus Cristo, que já dantes vos foi pregado. Convém que o céu o contenha até os tempos da restauração de tudo, dos quais Deus falou pela boca de todos os seus santos profetas, desde o princípio” (Atos 3:20-21). Os segredos desse reino já fo­ ram revelados aos discípulos, mas, no que diz respeito aosjudeus, só serão revelados no futuro (Mateus 13:11). Em resumo, o reino dos céus: 1. Tem o Messias como o seu Rei 2. E dos céus, sob os céus e sobre a terra 3. E limitado em seu escopo 4. E político em sua esfera 5. E judaico e exclusivo em seu caráter 6. É nacional em seu aspecto 7. E o propósito especial das profecias do Antigo Testamento 8. E dispensacional em sua duração Scofield também não considera a expressão reino dos céus como sinônima de reino de Deus. Ele afirma que o “reino dos céus é messiânico, mediador e davídico, e tem por objetivo o estabelecimento do reino de Deus sobre a 13
  • 12. TEU É O REINO terra” .Em defesa de seu posicionamento, ele cita Mateus 3:2 e 1 Coríntios 15:24-25. Este último texto afirma: “Então virá o fim, quanto tiver entregado o reino a Deus, ao Pai, e quando houver destruído todo o domínio, e toda a autoridade e todo o poder. Pois convém que ele reine até que haja posto a todos os inimigos debaixo dos seus pés” .(2) Isaías referia-se a esse reino dos céus na terra quando profetizou que ele haveria de crescer sempre (Isaías 9:7). Quando Jesus disse a Pilatos: “Mas agora o meu reino não é daqui” (João 18:36), ele fazia referência ao seu reinado milenial, que terá início com o seu retorno para Israel, e que finalmente atingirá a sua plenitude quando todos os seus inimigos lhe estiverem sujeitos, ao final do milênio. Essa vitória final de Cristo porá fim definitivo ao indigno “poder” e à indigna “glória” que o próprio Jesus rejeitou no deserto da Judéia, quando ali derrotou o diabo. A fim de evitar qualquer mal-entendido, usaremos de preferência, neste livro, a expressão “reino de Deus”, por não deixar dúvida quanto à sua plena abrangência. 2. O Reino do Pai. “Então os justos resplandecerão como o Sol, no reino de seu Pai. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça” (Mateus 13:43). Esta expressão, aqui, não tem sentido universal, e se refere à esfera do reino de Deus no seu aspecto celestial em relação à terra. E equivalente à expressão “participantes da vocação ce­ lestial”, de Hebreus 3:1. Alude, portanto, ao íntimo relacionamento entre Deus e o seu povo, e a única maneira de se entrar nesse reino é através do novo nascimento (João 3:3). 3. O Reino do Filho do Homem. Esta expressão está em Mateus 16:28: “Em verdade vos digo, alguns dos que 14
  • 13. A abrangência do reino aqui estão não provarão a morte até que vejam vir o Filho do homem no seu reino” . Trata-se do reino dos céus no que diz respeito unicamente a Israel sobre a terra (Daniel 7:13,14,18, 21, 22), sem incluir os “participantes da vocação celestial” .Embora partes de um mesmo reino, as esferas terrena e celestial são distintas, como aliás o Senhor prometeu aAbraão: “Grandemente multiplicarei a tua descendência, como as estrelas do céu e como a areia que está na praia do mar... e em tua descendência serão benditas todas as nações da terra” (Gênesis 22:17- 18). Israel corresponde, nesse reino do Filho do Homem, à areia que está na praia do mar, como povo terreno, ao passo que a igreja corresponde às estrelas do céu, como povo celestial. 4. O Reino do Filho do seu amor. O contexto desta expressão em Colossenses diz: “Dando graças ao Pai que nos fez idôneos para participar da herança dos santos na luz, e que nos tirou do poder das trevas, e nos transportou para o reino do Filho do seu amor, em quem temos a redenção pelo seu sangue, a saber, a remissão dos pecados” (1:12-14). Refere-se, esta passagem, à soberania do amado Filho de Deus naquela esfera que está acima de todos os céus, em que o Pai “sujeitou todas as coisas debaixo dos seus pés, e sobre todas as coisas o constituiu como cabeça da igreja, que é o seu corpo, a plenitude daquele que enche tudo em todos” (Efésios 1:22-23). Esta supremacia do Filho, como um “mistério que desde tempos eternos esteve oculto” (Romanos. 16:25) “em Deus” (Efésios 3:9), “durante séculos e gerações” (Colossenses 1:26), foi revelada na proclamação do reino de Deus, feita por Jesus, e “depois confirmada pelos que a ouviram” (Hebreus 2:3). Os propósitos dessa suprema 15
  • 14. TEU É O REINO autoridade do Filho estão selados para ulterior cumprimento na vida dos que, pela sua fé em Cristo, se tornaram herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo (Efésios 2:13-14). 5. O reino eterno de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Registrada em 2 Pedro 1:11, esta expressão refere-se ao reino milenial, quando “a terra se encherá do conhecimento do Senhor, como as águas cobrem o mar” (Isaías 11:9). 6. O reino de nosso Senhor e do seu Cristo. O texto completo está em Apocalipse 11:15: “Os reinos do mundo vieram a ser de nosso Senhor e do seu Cristo [ou Messias]” . Trata-se de mais uma referência ao período milenial. Essa expressão é mais abrangente do que “Reino do Pai” e “Reino do Filho do Homem”, pois inclui tanto o poder como a glória do reino, como ensinou Jesus em Mateus 6:13: “Porque teu é o reino e o poder, e a glória, para sempre” . O poder é o poder do reino, e a glória é a glória do reino. Ao final do milênio, todas as esferas particulares ou secundárias do reino serão absorvidas no reino de Deus. 7. O reino de Deus. Esta expressão indica a suprema autoridade de Deus, que é moral e universal. Ela existe desde o começo, ejamais terá fim. Essa autoridade está sobre todas as coisas e abrange a tudo. Em resumo, esse reino: 1. Tem Deus o Pai como seu Governo 2. Ele está no céu, sobre a terra 3. E ilimitado em seu escopo 4. E moral e espiritual em sua esfera 5. E inclusivo em seu caráter, abrangendo as sementes natural e espiritual de Abraão, a “vocação celestial” e a igreja 16
  • 15. A abrangência do reino 6. É universal em seu aspecto 7. E, em seu aspecto mais amplo, o objetivo da revelação do Novo Testamento O Reino de Deus e a Igreja De tudo o que já vimos depreende-se que o termo “reino”, mesmo aparecendo em distintos contextos, com distintas conotações, não pode ser aplicado à igreja. Eis algumas das razões dessa impossibilidade: 1. A Bíblia fala de herdeiros do reino, mas em nenhum lugar da Escritura lemos acerca de herdeiros da igreja. 2. Lemos acerca da possibilidade de se receber o reino, mas nada lemos na Bíblia acerca da possibilidade de se receber a igreja. 3. Lemos acerca de anciãos de igrejas, de mensageiros ou servos da igreja, mas nada há na Bíblia acerca de anciãos do reino. 4. A palavra “basileia”, traduzida por “reino”, ocorre 162 vezes no Novo Testamento, sendo 158 vezes no sin­ gular, e apenas quatro vezes no plural, ao se referir a reinos deste mundo (Mateus 4:8, Lucas 4:5, Hebreus 11:33, Apocalipse 11:15). Por outro lado, a palavra “ekklesia” ocorre 115 vezes, e destas, 36 estão no plural e 79 no singular, todas elas significando “igreja” ou “igrejas” . Somente em Atos 19:32, 39, 41 ela aparece como “assembléia” ou “ajuntamento”. 5. Lemos acerca de “filhos do reino” , mas nada encontramos como “filhos da igreja”. 6. Termos como “corpo”, que aparece em Efésios 1:23; 4:4, 16; 5:30, e Colossenses 1:24; “edifício”, Efésios 2:21; e “coluna e esteio da verdade”, em 1 Timóteo 3:15, nunca são aplicáveis a “reino” . 17
  • 16. TEU É O REINO 7. O grande privilégio dos membros da igreja, como participantes “da vocação celestial” (Hebreus 3:1; Apocalipse 20:4-6), é o de reinar com Cristosoòre a terra - ou acima da terra - enquanto que aquele reino será sobre todos os “reinos debaixo de todo o céu” (Daniel 7:27). 8. A igreja das cartas da prisão de Paulo (Efésios, Filipenses e Colossenses), está aqui e agora no mundo, esperando pelo “prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus” (Filipenses 3:14), ao passo que o reino, no sentido de reino de Cristo, não está aqui, porque o Rei não está aqui, e “ainda não vemos todas as coisas sujeitas a ele” (Hebreus 2:8). 9. O reino é o grande objetivo das profecias, enquanto que a igreja, especialmente das chamadas cartas que Paulo escreveu na prisão, não é o objetivo da profecia. Pelo contrário, foi ela mantida em segredo até que chegasse o tempo da sua revelação. 18
  • 17. 2 A invasão do reino S OMO VIMOS NO capítulo anterior, os judeus í dos dias de Jesus, pelo fato de estarem vivendo sob o opressivo e repressivo império romano, acabaram por ver as profecias messiânicas de um ponto de vista muito particular. Eles acreditavam que o Messias, como um poderoso guerreiro, conquistaria esses indesejáveis invasores e estabeleceria definitivamente o reino de Davi, inaugurando assim uma nova era de paz, prosperidade e grandeza. Como outros israelitas que viveram em épocas anteriores sob outros dominadores, os judeus dos dias de Jesus também tinham o seu entendimento do reino de Deus muito limitado pelas circunstâncias adversas em que viviam. O profeta Isaías falou da vinda do Messias em diversas ocasiões, numa das quais afirmou que este viria como um menino: “Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu; o principado está sobre os seus ombros” (Isaías 9:6). Mencionou que essa vinda seria como uma pedra assentada em Sião “uma pedra já provada, pedra preciosa de esquina, que está bem firme e fundada” (28:16). Mais adiante, no capítulo 53, o mesmo profeta falaria de Cristo como o servo sofredor, que daria a sua vida na 19
  • 18. TEU É O REINO cruz como resgate de nossa alma. Setecentos anos depois, quando as esperanças do povo já se desvaneciam em virtude de tantas guerras opressoras, João Batista, como uma “Voz do que clama no deserto” (Mateus 3:3), se apresentou com as notícias de que as promessas de Deus estavam prestes a cumprir-se. Exortava ele: “Arrependei- vos, pois está próximo o reino dos céus” (Mateus 3:2). Os evangelhos nos mostram como Jesus foi, aos poucos, mudando a idéia do reino, transferindo-a do seu aspecto material para o espiritual. O Novo Testamento nos mostra, também, como Jesus, pela sua vida, ensinos, morte e ressurreição, estabeleceu a base sobre a qual esse reino de Deus, tanto no seu sentido espiritual como escatológico, poderia tornar-se realidade aqui na terra. Na concepção de Jesus, o reino de Deus é, em substância, “uma grande sociedade espiritual que transcende todas as distinções terrenas, e que está por sobre todas as organizações políticas — uma sociedade cujos membros têm a sua cidadania nos céus, porém cuja esfera presente de atividade é o mundo atual, e cujos membros estão unidos no elevado propósito de realizar a vontade do Altíssimo ”.(3) Pelo fato de Jesus encarar o reino de Deus de um modo muito diferente do povo de seus dias, às vezes ele se servia de paradoxos para ilustrar como o reino nos invade. Ele dizia que o reino de Deus está dentro dos discípulos (Lucas 17:21), que esse reino poderia ser possuído pelos pobres de espírito (Mateus 5:3), e que deveria ser buscado antes de qualquer outra coisa (Mateus 6:33). Jesus também falou do reino como algo em que se 20
  • 19. A invasão do reino pode entrar, como se estivesse cruzando a fronteira de um país, sendo o passaporte o espírito semelhante ao de uma criancinha (Marcos 10:15); e afirmou ainda que, mediante o novo nascimento, se pode ver o reino de Deus (João 3:3). E como se a conversão nos abrisse os olhos para as belezas espirituais da nova vida em Cristo. A proclamação desse reino foi a prioridade tanto de João Batista como de Jesus. O ministério de João durou pouco em virtude de sua prisão e martírio, mas assim que Herodes o tetrarca silenciou a “Voz do que clama no deserto” (Isaías 40:3), Jesus começou, imediatamente, a proclamar, na Galiléia, a mesma eloqüente mensagem da chegada do reino. Sem exercer domínio político sobre nenhuma província, e sem a menor intenção de vir a exercê-la em seu ministério terreno, a pregação de Jesus estava voltada primeiramente para o arrependimento e a conversão, como condição única para que o governo de Deus seja exercido na vida das pessoas. O reino no passado Embora o reino de Deus seja ainda futuro em sua realização plena, em certo sentido elé esteve presente em Israel, que experimentou em inúmeras ocasiões o seu poder sobrenatural, como nos sinais realizados por Moisés no Egito, na travessia do mar Vermelho, na provisão do maná, nas guerras de conquista sob o comando de Josué, nos livramentos do povo de Deus das ameaças de potências inimigas, e nos milagres realizados pelos profetas, especialmente Elias e Eliseu. Nos muitos períodos de apostasia de Israel desapareciam da nação os sinais visíveis da presença do 21
  • 20. TEU É O REINO reino de Deus entre eles, até que profetas, sacerdotes e reis fiéis ao Senhor se levantavam e promoviam reformas, levando o povo de volta às leis de Deus . Mais tarde, no chamado período interbíblico, de Malaquias a João Batista, durante cerca de quatrocentos anos a nação viveu sob o silêncio da Deus, em que nenhum profeta surgiu entre eles. Mas, com a vinda e o ministério do Messias, na época denominada nas Escrituras de “a plenitude dos tempos” (Gálatas 4:4), o reino de Deus foi proclamado como presente aqui na terra de um modo muito mais abrangente do que nos tempos do Antigo Testamento. O precursor João Batista, com arrebatadora eloqüência, introduziu o Messias, e este, ungido por Deus com o Espírito Santo e com poder, “andou fazendo o bem e curando a todos os oprimidos do diabo, porque Deus era com ele” (Atos 10:38). O reino no presente Já no final de seu ministério, ainda restrito às ovelhas perdidas da casa de Israel, Jesus afirmou aos líderes israelitas que o reino de Deus lhes seria tirado, e seria dado a uma nação que daria os frutos desse reino (Mateus 21:43). Embora alguns teólogos, equivocadamente, tenham interpretado essa nação como sendo a Inglaterra ou os Estados Unidos da América, a Bíblia afirma com clareza que tal nação é a igreja. Pedro afirmou: “Mas vós sois a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido, para que anuncieis as grandezas daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1 Pedro 2:9). A igreja, portanto, denominada de “a igreja dos 22
  • 21. A invasão do reino primogênitos arrolada nos céus” (Hebreus 12:23), constituída de “homens de toda tribo; e língua, e povo e nação”, comprados com o precioso sangue do Cordeiro de Deus (Apocalipse 5:9), constitui hoje o reino de Deus na terra. Nela, na igreja, o poder do reino de Deus está presente e operante no milagre maior de transformação de vidas, na expulsão de demônios e na libertação dos oprimidos do diabo. Portanto, a cada dia devemos nós, como cristãos, demonstrar pelo nosso modo de vida que o reino de Deus está em vigor agora mesmo. O modo de fazer isso é deixar que o Senhor Jesus governe soberanamente em nossa vida, guiando o nosso comportamento em tudo o que fazemos. Billy Graham afirmou muito bem que “o reino de Deus não é apenas uma esperança futura, mas uma realidade presente”. De fato, onde quer que homens e mulheres se voltem para Deus em arrependimento e fé, procurando fazer a vontade dele aqui na terra como ela é feita no céu, ali está o reino de Deus. O reino no futuro Daniel profetizou com muita clareza a vinda do reino messiânico de Deus a este mundo. Suas visões proféticas se estendem desde a sua época até o tempo final dos acontecimentos do mundo. O Senhor mostrou ao rei de Babilônia a imagem de um homem que representava os quatro grandes impérios do mundo: o babilônico, o medo- persa, o grego e o romano. Segundo essa profecia, no final dos tempos uma pedra atingirá a estátua e a reduzirá a pó. O vento se encarregará de fazer que esse pó desapareça, mas a pedra 23
  • 22. 1 TEU É O REINO se converterá em uma enorme montanha que encherá toda a terra. De acordo com a interpretação divina que Deus deu a Daniel, a vinda da pedra indica o retorno de Cristo para pôr um fim aos reinos da terra e estabelecer aqui o seu próprio reino de paz ejustiça. Jesus, ao voltar à terra, cumprirá as promessas do reino feitas a Davi (2 Samuel 7:16; Salmo 89:37-38). Tais promessas foram confirmadas pelo anjo a Maria, por ocasião do anúncio do nascimento de Jesus: “Disse-lhe então o anjo: Maria, não temas, achaste graça diante de Deus. Conceberás e darás à luz um filho, e pôr-lhe-ás o nome de Jesus. Este será grande, e será chamado Filho do Altíssimo. O Senhor Deus lhe dará o trono de Davi, seu pai. Ele reinará eternamente sobre a casa de Jacó, e o seu reinado não terá fim” (Lucas 1:30-33). A Bíblia ensina que o dia virá em que as nações do mundo, especialmente aquelas que têm oprimido a Is­ rael, se submeterão às leis e à justiça divinas. Nesse tempo, o governo de Deus será como uma forte luz a dissipar as trevas que têm sobrevindo a este mundo. Esse tempo será o milênio, quando todo o povo de Israel estará reunido na terra que Deus lhe prometeu, e Jerusalém será a capital do mundo. O trono de Cristo estará ali na Cidade Santa, pois a partir de Jerusalém Jesus proclamará suas leis para toda a humanidade. O advento de Cristo marcará o fim definitivo do governo humano sobre a terra. Cristo reinará sobre todas as nações do mundo. De acordo com o livro de Apocalipse, os quatro seres viventes e os vinte e quatro anciãos que João viu no céujá proclamaram, em cântico, essa gloriosa verdade (Apocalipse 5:9-10), que se cumprirá quando soar a sétima trombeta e as vozes celestiais proclamarem: “Os reinos do mundo vieram a ser de nosso Senhor e do 24
  • 23. A invasão do reino seu Cristo, e ele reinará para todo o sempre” (Apocalipse 11:15). Os crentes que forem transformados no rapto, ou ressuscitados na primeira ressurreição, “reinarão com ele durante os mil anos” (Apocalipse 20:6). A principal característica do reinado de Cristo será a justiça e a paz, pois naquele reino jamais haverá lugar para a opressão ou a guerra. O profeta registrou: “Vêm dias, diz o Senhor, em que levantarei a Davi um Renovo justo, um rei que reinará e prosperará, e praticará ojuízo e a justiça na terra. Nos seus dias Judá será salvo, e Israel habitará seguro. Este será o seu nome, com que o nomearão: O Senhor, Nossa Justiça” (Jeremias 23:5-6). Embora não nos tenha sido dada nenhuma data para a vinda de Cristo, a partir da perspectiva de Deus podemos perceber que esse evento ocorrerá muito breve. O fato de a igreja primitiva ter enfatizado tanto essa segunda vinda deve dar-nos um sentido de urgência, uma vez que estamos vivendo vinte séculos mais próximos desse glorioso acontecimento do que os nossos irmãos do primeiro século. Por isso devemos levar a sério as advertências bíblicas e permanecer vigilantes, pois o Rei virá a qualquer momento. Apesar de às vezes vermos o aparente triunfo do mal ao nosso redor, devemos estar certos de que os propósitos de Deus continuam a avançar com firmeza para o dia em que toda a terra será cheia de sua glória, e em que todas as nações o adorarão. Primeiramente no milênio, quando Jesus Cristo estabelecerá seu reino terreno, e depois, para todo o sempre, na eternidade. E quanto mais nos aproximamos do final dos tempos, mais firmemente devemos nos apegar às verdades acerca do reino de Deus agora e no futuro. Devemos proclamar as novas do poder de Cristo que transforma vidas, para 25
  • 24. TEU É O REINO que os que não lhe conheçam tenham a oportunidade de preparar-se para a sua vinda. O evangelista Richard Vinyard, numa mensagem baseada em Colossenses 1:13: “Que nos tirou do poder das trevas, e nos transportou para o reino do Filho do seu amor”, afirmou: Fomos tirados do reino das trevas. Ospoderes do reino do inferno foram quebrantados. Fom,os trasladados para o reino do seu amado Filho. Hoje somos filhos do reino dos céus. Temos o céu dentro de nossos corações hoje à noite. Estamos vivendo no poder daquele reino. Então ele deve ter chegado ou não o sentiríamos. O reino deve ser disponível ou não poderíamos ser transportados para dentro dele. E desde que somos transportados para dentro dele, sabemos que o poder do reino dos céus tem chegado. (4) 26
  • 25. 3 Ogoverno do reino y EVIDENTE QUE UM reino só pode existir g J se tiver como seu cabeça um rei. Não existe reino ^ ^ sem rei. E no caso do reino de Deus, o seu rei é Deus Pai. Não sendo nosso propósito fazer aqui uma apresentação ampla desse rei, mostraremos apenas alguns aspectos de seu caráter mediante seus atributos e sua soberania. A Bíblia Sagrada afirma que o Deus que reina sobre todo o universo é Espírito (João 4:24), é vida (João 5:26), existe por si mesmo (Ex 3:14), é infinito (Salmo 145:3), é imutável, jamais muda (Salmo 102:27; Malaquias 3:6; Tiago 1:17), é a verdade (Deuteronômio 32:4; João 17:3), é amor (1 João 4:8), é eterno (Salmo 90:2; Jeremias 23:23-24), é onisciente (Salmo 147:4-5), e é onipotente (Mateus 19:26). Esses atributos divinos atestam a sua soberania sobre toda a criação. Nada escapa ao seu infinito poder, autoridade e glória. Sendo ele perfeito em grau infinito, Deus Pai não podejamais ser surpreendido, ou enganado ou derrotado. Sem comprometer a sua autoridade e seu propósito de consumar ao final de tudo a sua boa, agradável e perfeita vontade (Romanos 12:2), aprouve a 27
  • 26. I TEU É O REINO Deus dar ao homem o livre arbítrio, pelo qual é este responsável perante o seu Criador. Ribeiro do Vale escreveu um lindo soneto em que tenta expressar alguns dos atributos de Deus:(5) Os Nomes de Deus Querendo Deus gravar seus Nomes na opulência Do universo, estampou no espaço — Imensidade; E sobre a curva azul dos mares — Majestade; Sobre asflores — Beleza; no ar— - Resplandecência; Na multidão dos astros — Glória e Onipotência; No manto que recobre a terra — Variedade; Na semente das árvores — Fecundidade; Na fronte do homem estampou — Inteligência; E nas leis sábias que governam todo o mundo Deixou gravado claro seu — Saber Profundo. Mas, na sua obra-prima, o coração humano, Que a um tempo é o menor dos mundos e o maior, Soube, com traço fino e misterioso arcano, Esculpir de seus Nomes o mais belo — Amor! O reinado do Pai O reinado do Pai sobre a terra é eterno, como afirmou Moisés: “O Senhor reinará eterna e perpetuamente” (Êxodo 15:18). Os salmistas, quando falam desse reinado de Deus usam o verbo no presente: “Pois o reino é do Senhor, e ele domina entre as nações... Deus reina sobre 28
  • 27. O governo do reino as nações; Deus se assenta no seu santo trono” (Salmo 22:28; 47:8). O profeta Isaías, falando dos mensageiros de boas novas, afirma que eles dizem a Sião: “O teu Deus reina!” (Isaías 52:7). E Jeremias registrou: “Tu, ó Senhor, reinas eternamente, e o teu trono subsiste de geração em geração” (Lamentações 5:19). Mas o reinado do Pai vai muito além deste planeta em que vivemos. Quando Paulo afirma em Efésios 3:14- 15: “Por causa disto me ponho de joelhos perante o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, do qual toda a família nos céus e na terra toma o nome”,ele não está falando apenas de seres humanos, mas também de seres angelicais, que são criaturas de Deus. A mesma verdade aparece em Hebreus 12:9, em que o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo é chamado de “Pai dos espíritos”, expressão que parece incluir todos os seres morais criados por Deus, quer sejam homens, quer sejam anjos. O rei Nabucodonosor, de Babilônia, depois de humilhado por causa de seu orgulho, reconheceu a grandeza do reino de Deus, quando disse: “Eu bendisse o Altíssimo, e louvei, e glorifiquei ao que vive para sempre, cujo domínio é um domínio sempiterno, e cujo reino é de geração em geração. Todos os moradores da terra são reputados como nada; segundo a sua vontade ele opera no exército do céu e nos moradores da terra. Não há quem lhe possa deter a mão, nem lhe dizer: Que fazes?” (Daniel 4:34-35) As passagens bíblicas que acabamos de citar indicam que a Primeira Pessoa da Trindade, na qualidade de Criador de todas as coisas, reina soberanamente sobre toda a sua criação. Todavia, no que se refere a este mundo, o seu reino ainda não está de todo manifestado. Virá, porém, o dia em que esse reino se manifestará e se 29
  • 28. f TEU É O REINO estenderá ao mundo inteiro na pessoa do Filho. Salomão e a sulamita Segundo alguns estudiosos da Bíblia, entre eles N. W. Hutchings, o livro de Cantares, ou Cântico dos Cânticos, descreve tipologicamente o reinado de Cristo com a sua igreja. Considerando que o cântico narra um dos primeiros namoros de Salomão como rei de Israel, o pano de fundo desse cântico seria uma vinha que o rei possuía em Baal- Hamon, ao Norte do país, na qual, por falta de cuidado dos trabalhadores, pássaros e animais selvagens comiam as uvas. O rei, então, disfarçado de pastor, foi a Baal- Hamon inspecionar a vinha, e ali encontrou a linda camponesa sulamita. Ambos se apaixonaram um pelo outro. Como Salomão tivesse que retornar a Jerusalém a negócios, antes de partir prometeu à sulamita que voltaria e se casaria com ela. O rei cumpriu a sua promessa, levando ajovem para o seu palácio e casando- se com ela. Mas, apesar de todo o esplendor da corte, a sulamita sentia saudades da sua terra natal, e por isso Salomão voltou com ela a Baal-Hamon. Esse lindo cântico — o único que chegou até nós dos 1005 que ele escreveu (1 Reis 4:32) — possui uma preciosa lição tipológica acerca de Jesus como rei. No Cântico, Salomão é um tipo do Senhor Jesus, e a empregada sulamita um tipo da igreja. O amor que nutrem um pelo outro ilustra bem o amor de Jesus pela igreja: “Vós, maridos, amai as vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela” (Efésios 5:25). 30
  • 29. O governo do reino O esplendor de Salomão, descrito em 1 Reis 10:14-29, aponta para o Senhor Jesus Cristo como o Criador do Universo. E assim como o mais rico dos homens vai a Baal-Hamon disfarçado de simples pastor, assim veio Jesus à terra em pobreza, sem ter sequer onde repousar a cabeça. Diz a Bíblia: “A vinha do Senhor dos Exércitos é a casa de Israel” (Isaías 5:7), a quem Jesus foi enviado: “Eu não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel” (Mateus 15:24). Do mesmo modo como Salomão, disfarçado de pastor, não foi reconhecido pelos empregados da vinha, que o expulsaram, assim também Israel não reconheceu a Jesus Cristo como o Messias, o Rei da glória. Lemos em João 1:11-12: “Veio para o que era seu, mas os seus não o receberam. Mas a todos os que o receberam, àqueles que crêem no seu nome, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus”. Embora fosse Salomão rejeitado por seus próprios empregados em Baal-Hamon, a empregada sulamita não o rejeitara. Salomão significa paz em hebraico, e, portanto, como rei, era ele príncipe da paz. Sulamita é a forma feminina de Salomão, e significa filha da paz. Comparando os tipos de Cantares com os seus correspondentes antítipos do Novo Testamento, temos algumas lições importantes. Por exemplo, à pergunta da Sulamita em 1:7: “Diz-me, ó tu, a quem ama a minha alma: Onde apascentas o teu rebanho, onde o recolhes pelo meio-dia. Por que razão seria eu como a que anda errante pelos rebanhos dos teus companheiros?” ; Jesus responde: “Eu sou o bom pastor; eu conheço as minhas ovelhas, e as minhas ovelhas me conhecem” (João 10:14). Por ser estrangeira, a sulamita representa todos os 31
  • 30. TEU É O REINO povos gentílicos pelos quais Jesus morreu, João 3:16; Marcos 16:15. E assim como ajovem apresenta Salomão à sua mãe, que tipifica as nações; os crentes de cada nação apresentam Jesus ao seu povo, 3:4; Mateus 28:19-20. Salomão deseja entrar no lar da sulamita (2:9), e Jesus deseja entrar na igreja e em nosso coração (Apocalipse 3:20). Quando a sulamita abre a porta, Salomão a saúda (2:10-12), dizendo que o tempo de cantar chegou, que as flores estão florescendo, e que já se ouve a voz das rolas. Jesus, ao entrar em nossa vida, dá-nos uma nova vida e o gozo do Espírito Santo, simbolizado pela rola (Mateus 3:16. Veja também Lucas 12:27-31). O noivo chama a sulamita de jardim fechado, irmã minha, noiva minha, manancial fechado, fonte selada (4:12), e a igreja é uma virgem pura, santificada, separada do mundo (2 Coríntios 11:2). O Cântico dos Cânticos menciona um banquete associado com a mirra e a especiaria (5:1), o que aponta para a última ceia, realizada na noite em que Jesus foi traído por Judas. Mirra e especiarias estão associadas também com a preparação de um corpo para a sepultura, e por isso a sulamita tem um conturbado pesadelo (5:2- 5). Nesse pesadelo temos uma cena noturna (o orvalho) no Getsêmani, e uma figura de Cristo suando sangue (gotas da noite), despido da sua túnica (sobre a qual os soldados lançaram sortes), e tendo os pés lavados (ungidos para o sepultamento (Mateus 26:12). Uma cena típica da crucificação. Mais adiante, a descida de Salomão ao seujardim para colher os lírios (6:2) pode significar a ida de Jesus ao paraíso (Lucas 23:43), onde colheria os seus lírios, isto é, levaria “cativo o cativeiro” (Efésios 4:8). E quando a sulamita abre a porta, o noivo já não estava mais lá (5:6- 32
  • 31. O governo do reino 7), o que indica a ascensão de Jesus ao céu (Lucas 24:51). Ao ser perguntada acerca de seu noivo, a sulamita faz dele uma descrição (5:10-16) que corresponde à de Jesus glorificado (Lucas 9:28-36; Apocalipse 1:12-16). Depois, ao despertar de seu sono, a sulamita vê que seu noivo volta para ela, não há como um pobre pastor, mas em poder e glória (3:6-8), o que indica a volta de Cristo (Mateus 24:30). Jesus, ao retornar no final do período da Tribulação a fim de salvar Israel, ele virá como Rei dos reis e Senhor dos senhores (Apocalipse 19:12-13), com aquela glória que a empregada sulamita viu em Salomão. Depois a sulamita sobe do deserto encostada ao seu amado (8:5), o que corresponde ao rapto da igreja (1 Tessalonicenses 4:16:17). Finalmente, a transformação da humilde camponesa em rainha ilustra a transformação que experi­ mentaremos na volta do Senhor (1 Coríntios 15:51-52), quando receberemos um corpo perfeito.(6) O Cântico dos Cânticos, portanto, traz lições tipológicas importantíssimas para todos nós hoje. E como afirma Paulo em 1 Coríntios 10:11: “Tudo isto lhes aconteceu como exemplos, e estas coisas estão escritas para aviso nosso, para quem já são chegados os fins dos séculos” . A realeza de Jesus Alguns fariseus, ao interrogarem a Jesus acerca da época em que ele estabeleceria na terra o seu reino, tiveram como resposta: “O reino de Deus está dentro em vós” (Lucas 17:21). Aqueles religiosos devem ter ficado decepcionados com a resposta de Cristo, pois não 33
  • 32. TEU É O REINO viam com seus próprios olhos tal reino, nem o podiam compreender ou sentir. De maneira geral, os judeus esperavam da parte do Messias um domínio político e ditatorial, que rápida e heroicamente libertasse Israel de seus poderosos opressores. Suas mentes e atenções estavam de tal maneira voltadas para as dificuldades econômicas, religiosas e morais da nação, que só podiam esperar da parte de Deus um Cristo revolucionário, talvez como um dos Macabeus, que suplantasse pela força das armas o Império Romano e reinasse em Jerusalém “com vara de ferro”, conforme anunciava o Salmo 2, versículos 6, 8 e 9: “Eu ungi o meu Rei sobre o meu santo monte Sião... Pede-me, e eu te darei as nações por herança, e os fins da terra por tua possessão. Tu os regerás com vara de ferro; tu os despedaçarás como a um vaso de oleiro” . Um teólogo brasileiro descreve que esse anseio popu­ lar dos judeus pelo reino do Messias só concebiam esse reino como um poder político com as... acenadoras glórias da era dos Macabeus, cuja linhagem e cuja influência ainda coloriam os horizontes de Israel, a que se aliava a natural inclinação das mentes empolgadas por visões de grandeza terrena, esperava um Rei, na acepção consuetudinária do termo, aassentar-se num trono esplêndido, cercado de fâmulos e vassalos, poderosos contingentes armados e portentosos arraiais fortalecidos, soberbo e imperioso, magnífico e pomposo como nenhum outro na tradição de Israel.C) Tal interpretação de escrituras isoladas não poderia 34
  • 33. O govarno < /< >io/no apoiar-se no conjunto das claras profecias, pois estas falavam de um Messias desprezado, perseguido e aparentemente fraco, que seria levado à cruz como se leva um cordeiro ao matadouro (Isaías 53). Isso a maioria dos judeus não percebeu, como também não percebeu as profecias acerca da sua ressurreição e do estabelecimento por ele de seu reino eterno, porém inicialmente caracterizado por seus aspectos espiritual e moral. O mesmo teólogo atrás citado assinala, mais adiante que o evangelista Mateus, começando pela genealogia de Cristo, revela a sua intenção de destacar a realeza de Cristo. “Não rei nos moldes terrenos, segundo as prerrogativas políticas e o serviço de interesse materiais. Ao contrário, rei, rei grandioso e soberano, cumprimento real dos arrojados e constantes vaticínios dos profetas, vida plenamente em harmonia com a vontade divina, senhor augusto do presente e do além. Varão de Dores, tão majestoso na humilhação a que se condicionou, supremo na exaltação de que se aureolara, cumprida a missão redentora a que viera, restaurado ã glória celeste de onde procedera”.(8) Embora rejeitado pelo povo e incompreendido até mesmo por muitos de seus próprios discípulos, Jesus cumpriu fielmente a missão que lhe havia sido confiada pelo Pai, de resgatar com seu precioso sangue os que nele cressem. E depois de vencer o diabo e a morte, ele entregou aos seus primeiros súditos as boas novas de 35
  • 34. TEU É O REINO salvação, e os mandou proclamá-las a todos os povos.. Os súditos do reino de Deus, sobre os quais Jesus reina soberano, é chamado nas Escrituras de “raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus” (1 Pedro 2:9). Estes são alguns dos títulos da verdadeira Igreja. Esta fiel assembléia dos santos, enquanto estiver na terra como igreja militante, tem de lutar contra o reino das trevas, despoticamente governado por Satanás e seus agentes, e onde estão presos e escravizados todos os que ainda não nasceram de novo. O reinado de Jesus As Escrituras tratam também do aspecto escatológico do reino, a ser estabelecido aqui na terra com a vinda de Jesus para o Milênio. As referências bíblicas são abundantes: Deus prometeu a Abraão que da sua descendência sairiam reis (Gênesis 17:6). Jacó profetizou que o cetro não se apartaria de Judá, e que viria Silo, o Messias (Gênesis 49:8). Os profetas falaram de Cristo como rei (Isaías 9:6; Zacarias 9:9; Jeremias 23:5). De fato, Jesus nasceu como rei (Mateus 2:2,11,16-18), foi aclamado rei pelos judeus (João 12:12-16; Mateus 21:8-11), testificou da sua realeza diante de Pilatos (João 18:33-37), como rei foi coroado e crucificado (Mateus 27:29, 37), e como rei foi recebido em cima nos céus (Salmo 24:7-10). Não foi por acaso que Pilatos ordenou que fosse afixada no cimo da cruz um anúncio de que Jesus era rei, escrito em grego, a língua da ciência; em hebraico, a língua da religião, e em latim, a língua do governo. Como Rei dos reis e Senhor dos senhores Jesus é hoje 36
  • 35. O governo do reino glorificado (1 Timóteo 1:17; 6:15; Apocalipse 1:5; 15:3; 19:6). Como rei ele voltará com poder e grande glória (Mateus 16:27, 28; 25:34; Apocalipse 17:14;19:16), e reinará na terra durante mil anos (Ezequiel 37:22,24,25; Apocalipse 20:1-6; Daniel 2:44; 7:27; Mateus 19:28; Atos 2:30). Finalmente, como rei ele entregará o Reino ao Pai, no final do Milênio, quando toda a rebelião estiver para sempre aniquilada (1 Coríntios 15:24-28; Filipenses 2:9- 11). Segundo a aliança estabelecida entre Deus e Davi, através do profeta Natã (2 Samuel 7:1-17), a casa de Davi (sua linhagem), o trono de Davi e o reino de Israel durariam para sempre. Quando o anjo Gabriel anunciou aMaria o nascimento de Jesus, disse que ele seria grande, e o Senhor Deus lhe daria o trono de Davi seu pai, e que ele reinaria sobre a casa de Jacó para sempre, e seu reino não teria fim (Lucas 1:32, 33). Aqui estão as mesmas três palavras-chave da aliança davídica: trono, casa e reino. As nações não querem que Cristo reine sobre elas. Israel não quis e ainda não quer que Cristo reine sobre ele, mas Deus é fiel e executará a sua vontade. Jesus reinará!(9 ) 37
  • 36. 4 O acesso ao reino / ^ ) VISLUMBRE QUE O livro do Apocalipse í J nos mostra, com respeito a nossa eterna y— S recompensa, escapa à compreensão humana. Mas essas indicações do cumprimento do Reino foram dadas para animar-nos. Embora talvez não possamos compreender mentalmente o completo significado de nossa futura glória com Deus, podemos contar com essa realidade tão certos como aceitamos a verdadeira presença de Cristo em nós hoje. O Reino não nos foi revelado em etapas, como se fosse um acidente no plano de Deus. Cada parte deste eterno mosaico está sendo colocada no seu devido lugar, de acordo com a perfeita vontade divina. Ao longo da história e em nossos dias não tem faltado tentativas de construir o reino de Deus aqui na terra. Até mesmo a Igreja Católica Romana se considerou, durante os longos séculos do cesaropapismo, a recipiente e mantenedora desse reino. Podemos construir o reino ? Não há, nas Escrituras, nenhuma indicação de que seja possível aos homens construir aqui na terra o reino 39
  • 37. TEU É O REINO de Deus. É claro que se pode melhorar as condições espirituais, morais e sociais do mundo mediante a aplicação dos princípios do reino. Um bom exemplo dessa possibilidade é a aldeia de Shimabuko, no Japão: Durante a Segunda Guerra Mundial, Clarence W . Hall, correspondente de guerra dos Estados Unidos, ao visitar a aldeia de Shimabuko, em Okinawa, escreveu: Durante anos a aldeia não tivera cadeia, nem bordel, nem embriaguez, nem divórcio. Havia ali um alto nível de saúde e felicidade... Criaram uma democracia cristã na sua forma mais pura”. E que os mil habitantes de Shimabuko haviam recebido a , visita de um missionário que foi para o Japão, uns trinta anos antes, o qual deixara ali um exemplar da, Bíblia em poder de dois shimabukanos convertidos, Mejun Nakamura e Shasei Kina, respectivamente chefe eprofessor da aldeia. Ao partir, disse o missionário aos dois crentes: “Estudem este Livro, pois ele dará a vocês uma fé robusta. Quando a féé forte, tudo é forte”. Sem noção de culto ou templo cristão, os mil habitantes criaram o seu próprio sistema de adoração. O professor Kina fazia a leitura da Bíblia e todos repetiam em forma de cântico. Entoavam hinos e faziam orações voluntárias. Em seguida passavam a tratar dos problemas da aldeia, e, para cada questão, Kina procurava na Bíblia uma resposta. Após tomar parte num desses cultos, o motorista de Hall disse-lhe com ares de mofa: “Veja, tudo isso é resultado de uma, só Bíblia, e 40
  • 38. O acesso ao reino de dois fanáticos que querem viver como Jesus”. Impressionado com o que viu, o motorista acrescentou: “Talvez estejamos usando as armas erradas para tornar o mundo melhor”. Ele fazia referência às armas de guerra. Alguns anos depois de terminada a guerra, Clarence Hall voltou a Okinawa para ver o efeito da civilização que os norte-americanos tinham introduzido. Okinawa estava irreconhecível. Em lugar depequenas aldeias havia agora ruas, lojas, armazéns, clubes, cinemas, teatros, campos degolfe, piscinas, estação de rádio e televisão. Havia bares e prostíbulos. Hall procurou Shimabuko e a encontrou “cercada”pelo “progresso”. Entretanto, toda aquela confusão e aflição do “progresso” não a tinham atingido. Permanecia espiritualmente separada de tudo aquilo, baseando sua vida nos ensinos da Bíblia. E Clarence Hall não pôde esquecer do que lhe dissera seu motorista anos passados: “Talvez estejamos usando as armas erradas para tornar o mundo melhor!”(m ) Alguns “construtores ” do reino O exemplo de Shimabuko difere de diversos outros, como a pretensão do catolicismo romano de ter-se constituído, na Idade Média, o reino de Deus na terra mediante o exercício, pelo papa, dos poderes espiritual e secular, a que se convenciou chamar de cesaropapismo. Mas a história está aí para atestar o quanto tal pretensão esteve longe de se cumprir. Após a Segunda Grande Guerra surgiu um movimento que também pretendia construir aqui o reino de Deus. 41
  • 39. TEU É O REINO Foi a Teologia do Evangelho Social. O conhecido livro Em seus passos que faria Jesus ?,.por sinal em si mesmo um bom livro, tem sido considerado um produto dessa tentativa, que também ficou conhecida como evangelho do caminho de Jericó, em virtude da sua ênfase nas melhorias das condições sociais do mundo. Mais recentemente, teólogos católicos e protestantes intentaram construir o reino de Deus através do movimento conhecido como Teologia da Libertação. Gustavo Gutierrez, os irmãos Boff e Ruben Alves são alguns dos mais conhecidos propagadores desse movimento que analiso em meu livro O Deus dos Pobres, traduzido e editado na língua espanhola com o título El Senor de los Pobres. Em virtude da poderosa influência do evangelho em nações como Inglaterra e Estados Unidos da América, alguns estudiosos da Bíblia chegaram a propor que esses países se tornaram os sucessores de Israel como representantes do reino de Deus na terra. Todavia, à luz de passagens claríssimas das Escrituras, como a de 1 Pedro 2:7-10, o reino de Deus não foi entregue a nenhuma nação em particular, mas à igreja. Por isso não há como negar a responsabilidade da igreja, e de cada cristão em particular, de ser o “sal da terra” e a “luz do mundo” , contribuindo de modo decisivo para as melhorias das condições de vida da sua comunidade. A luz de Mateus 25:34-40, Jesus continua faminto em cada pessoa faminta, continua com sede em cada sedento, continua preso em cada prisioneiro. Os perigos do conformismo O fato de ser a salvação um dom de Deus, e não o 42
  • 40. O acesso ao reino produto do nosso bom desempenho pessoal, não significa que temos o direito de cruzar os braços e nos tornarmos indiferentes à miséria humana. Justamente quando a Bíblia afirma que somos salvos pela graça de Deus, mediante a fé, ela conclui que “somos criação de Deus realizada em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou de antemão para que nós as praticássemos” (Efésios 2:10, NVI). As vezes enfatizamos tanto a salvação pela graça que acabamos nos esquecendo de que as obras são o fruto da salvação, e de que “a fé, se não tiver obras, é morta em si mesma” (Tiago 2:17). Não há a menor dúvida, portanto, de que devem os cristãos contribuir para que haja, no mundo, os sinais benditos da presença do reino. Muitas coisas boas hoje presentes na sociedade são frutos diretos ou indiretos do cristianismo, como hospitais, orfanatos, lar de idosos, o fim da escravatura, e até mesmo o preço fixo no comércio, que aboliu no ocidente o injusto e corrupto sistema de regateio. Neste último caso, os cristãos se inspiraram nas palavras de Jesus: “Seja o vosso ‘Sim’, sim; e o vosso ‘Não’, não” (Mateus 5:37). A respeito da verdadeira missão da igreja, escrevi, em 1989: Seguindo o exemplo de Cristo, a evangelização inclui o serviço. Disse Jesus: “Eu para isso nasci e para isso vim ao mundo, a fim de dar testemunho da verdade” (João 18:37), e: “Pois o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos” (Marcos 10:45). Comentando o pedido dos filhos de Zebedeu, de se assentarem um à direita e o outro à esquerda de Jesus, John Stott 43
  • 41. TEU É O REINO afirmou que “o símbolo de uma liderança autenticamente cristã não é a veste de púrpura de um imperador, mas o avental batido de um escravo; não um trono de marfim e ouro, mas uma bacia de água para a lavagem dos pés”. Meu amigo, pastor Ricardo Gondim Rodrigues, que realiza em Fortaleza, no Nordeste brasileiro, notável obra espiritual e social, disse, num dos boletins semanais da sua grande e atuante congregação, que a igreja evangélica, omissa em muitas de suas áreas, deve voltar às suas origens, aoprimeiro amor de uma fé simples sem ser simplista. Eis suas palavras: “A Igreja não é lugar de posições, títulos, e fama. Aqui se aprende a servir. Aprendemos a arte de amar, a Deus e ao semelhante. Organização, comissões, atas e plenárias devem ficar sempre na perspectiva de servir à visão maior que é levar as pessoas a amarem e servirem o Deus vivo. Evangelizar, cuidar e orar deveriam ser conjugados em todos os tempos com todos os pronomes ”.(u) Stott insiste na necessidade de a igreja se dispor a seguir o exemplo de Cristo: Onde está o espírito de aventura, o senso de desinteresseira solidariedade com os menos privilegiados? Onde estão os cristãos dispostos a colocar o serviço acima da segurança, a compaixão acima do conforto, a dureza acima da vida fácil? Milhares de tarefas cristãs pioneiras, que desafiam a nossa complacência e 44
  • 42. O acesso ao reino demandam risco, aguardam para serem feitas. A insistência na segurança é incompatível com o caminho da cruz. Que aventuras ousadas fo­ ram a encarnação e a expiação! Que quebra de convenções e decoro ter o Deus Todo-poderoso renunciado a seus privilégios a fim de se vestir de carne e levar o pecado do homem! Jesus não tinha segurança nenhuma a não ser em seu Pai. De modo que seguir a Jesus é sempre aceitarpelo menos certa medida de incerteza, perigo e rejeição por amor a ele. (1 2 ) O que diz a Bíblia Através das páginas do Novo Testamento, e em espe­ cial nos evangelhos e no livro de Atos, nos deparamos constantemente com apelos à salvação que indicam “como” somos introduzidos no seio do reino de Deus. “Arrependei-vos, pois está próximo o reino dos céus” (3:2). “Arrependei-vos e crede no evangelho” (Marcos 1:15). “Então, saindo eles [os doze), pregavam ao povo que se arrependesse” (Marcos 6:12). “Antes, se não vos arrependerdes, todos de igual modo perecereis” (Lucas 13:3). Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado...” (Atos 2:38). “Arrependei-vos, pois, e convertei-vos, para que sejam apagados os vossos pecados...” (Atos 3:19). “Crê no Senhor Jesus Cristo, e serás salvo, tu e a tua casa” (Atos 16:31). No evangelho de João são bem conhecidos os versículos que indicam a necessidade da fé em Cristo e da posse dele para a salvação. Vejamos: “Mas a todos os que o receberam, àqueles que crêem no seu nome, deu- lhes o poder de serem feitos filhos de Deus” (3:12). “Para 45
  • 43. TEU E O REINO que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (3:16). “Todo aquele que crê no Filho tem a vida eterna” (3:36). São fortes, na Bíblia, as palavras que indicam fé, arrependimento, conversão e posse. Mas essas palavras indicam apenas o lado humano, aquilo que temos de fazer. Embora a salvação seja um dom gratuito de Deus, cabe a nós aceitá-la ou não mediante escolha nossa. Deus, pelo Espírito Santo, apela à nossa vontade. “Quem quiser, tome de graça da água da vida” (Apocalipse 22:17). Devemos receber o reino Se construir o reino revela o ego insubmisso pretendendo o impossível pelo esforço próprio, receber o reino revela, por outro lado, o ego submisso e receptivo, de mãos vazias, aceitando alegremente o dom da graça de Deus. Recebemos o reino pela fé, em humildade. A expressão “pobres de espírito”, de Mateus 5:3, quer dizer também suficientemente humilde e receptivo para receber das mãos de Deus o seu dom inefável. Como Deus mesmo estabeleceu o princípio de que o orgulho fecha a porta da graça, somente os que possuem um espírito renunciado, esvaziado de qualquer vaidade, estão aptos a estender a mão e tomar posse da salvação. O esforço humano em estabelecer o reino pode ser comparado à tentativa da vespa que tenta escapar através da vidraça. Em seu desespero ela se joga repetidamente contra o obstáculo, em vão. Por fim, exausta, ela cai no peitoril dajanela, e então escapa livre através de pequena abertura, pois a janela não estava 46
  • 44. O acesso ao reino totalmente abaixada. Assim deve o crente cessar de lutar e deixar-se cair nas mãos onipotentes de Deus, de onde, livre, pode finalmente alçar vôo às maiores alturas. Frida Vingrem expressou essa verdade ao escrever, num lindo hino, que “às alturas santas ninguém voa, sem as asas da humilhação”. Como recebemos o reino O ato em si de recebimento do reino possui alguns passos, como no início de um relacionamento de amizade entre duas pessoas. Conhecido evangelista internacional sugere estes cinco passos: (a) A etapa da aproximação. Esta é a etapa experimental. Você não tem certeza se quer entregar-se inteiramente a outrapessoa. E a fase do sim e não. (b) A etapa na qual há a decisão interior de se dar a alguém — a fase da decisão. (c) Você leva a cabo a decisão — você realmente faz a entrega interior a outra pessoa, (d) Tendo- se dado à outrapessoa, você está agora livrepara receber daquela pessoa. Há um intercâmbio de si mesmos — você pertence àquela pessoa, e aquela pessoa pertence a você. Vocês são um. (e) Há um ajuste contínuo e mútuo de mente à mente, vontade à vontade, e de ser a ser através dos anos. A amizade se desdobra. (1 3 ) Desejo destacar três desses passos, a saber: a aproximação, a decisão e a entrega. Esses passos poderiam também ser chamados deconflito mental, crise emocional e resolução do conflito. 47
  • 45. TEU É O REINO A aproximação, ou conflito mental. Esta etapa pode durar muito tempo, anos até, ou pode ser vencida em apenas alguns minutos. Como pastor, conheço pessoas que ainda não venceram essa etapa em dez anos, e sei de outras que o fizeram rapidamente, em um culto. A razão por que em alguns casos tal aproximação é lenta se deve à hesitação. No caso de uma amizade humana, a hesitação pode estar em ambos os lados, mas nunca em se tratando de amizade com Deus, pois da parte dele não há nenhuma hesitação. Tudo foi feito e tudo está perfeitamente arranjado. E como disse Jesus: “Vinde, pois tudo já está preparado” (Lucas 14:17). Jesus, ao exclamar na cruz: “Está consumado”, colocava um ponto final na obra redentora que viera realizar. Da parte dele, do Pai e do Espírito Santo não há nada mais a fazer. Agora, tudo depende de nós. Infelizmente, como todas as religiões ensinam a busca de Deus pelo homem, algumas pessoas acham que o mesmo ocorre no cristianismo bíblico. Um amigo meu mostrou-me um original sob o título: “A trajetória do homem em busca de Deus”, e eu sugeri-lhe que mudasse o título para: “A trajetória de Deus em busca do homem”, pois é exatamente isso que ensinam as Escrituras. O pecador não pode encontrar a Deus pelo fato de estar sempre correndo para longe dele, mas pode colocar-se no caminho de Deus para que seja achado por ele. Há um exemplo clássico de como podemos nos colocar, mesmo involuntariamente, na condição de sermos achados por Deus. Quando findou a Segunda Grande Guerra, a família alemã Schuricht substituiu o “deus” Hitler pelo “deus” Stalin. Rodolfo, filho dessa família, tornou-se comunista 48
  • 46. O acesso ao reino fanático e fundou o primeiro clube comunista parajovens em 1947. Um ano depois a organização contava 4.500 membros, e, na qualidade de dirigente, Rodolfo odiava tanto os não comunistas e era tão odiado por eles que sequer podia andar livremente. Cerca de dois anos e meio mais tarde, um jovem procurou Rodolfo e pediu demissão do clube. Tinha começado a ler a Bíblia e desejava seguir a Cristo. O dirigente perguntou-lhe que estupidez o tinha levado a ler um livro tão cheio de mentiras e contradições, e então o jovem pediu-lhe que lhe mostrasse essas mentiras e contradições da Bíblia. Poucos dias depois o vice-presidente, com enorme brilho na face, também procurou Rodolfo pela mesma razão: tinha-se convertido. Replicando às mesmas agressões verbais, o demissionário pediu a Rodolfo que lhe mostrasse as mentiras da Bíblia. Duplamente desafiado, o líder comunista decidiu estudar a Bíblia e anotar suas contradições. Em seis meses leu-a de capa a capa sem encontrar uma só das muitas contradições que esperava achar. Então, numa manhã, ao levantar-se da cama, ajoelhou-se e, pela primeira vez em sua vida, orou: “O Deus, se tu és o verdadeiro Deus, o Deus vivo, e se Jesus Cristo é o teu Filho, então liberta-me, salva-me e dá a tua paz ao meu coração” . Esta foi a sua primeira oração, e Deus respondeu imediatamente, enchendo seu coração de alegria e paz. Rodolfo buscou então o seu camarada e confessou- lhe sua fé em Cristo, dizendo: “Agora sigo contigo no mesmo caminho, e vou abandonar imediatamente o partido comunista. Andava nas trevas, ignorante da Palavra de Deus. Comprei uma Bíblia com o propósito 49
  • 47. TEU É O REINO de descobrir mentiras para te libertar, mas nesse santo livro encontrei a salvação. Agora, ambos iremos confessar a nossa fé e procurar servir o nosso Mestre e Senhor”.(1 4 ) O colocar-se em contato com a Bíblia foi a maneira de Rodolfo ser achado por Deus. Para ilustrar quanto tempo podemos resistir ao apelo de Deus e permanecer na fase de aproximação, transcrevo aqui, de outro livro meu, um testemunho bem antigo: Há mais de um século, quando ainda não existia o túnel de São Gotardo, os que se dirigiam à Suíça procedentes da Itália, ou vice-versa, tinham de transpor o desfiladeiro do mesmo nome a pé, o que exigia muito tempo. Como era comum naquele tempo viajar-se em grupos, alguns pedreiros de Lugano se dirigiam à Suíça em busca de melhores salários. Entre estes estava Antônio, um jovem que depois de evangelizado por uma senhora, ganhara desta uma Bíblia de luxo, encadernada a couro. Embora a recebesse, não se interessou em lê-la, pois não queria saber nada do Cristianismo. Já em seu posto de trabalho em Glarus, Antônio, enquanto ajudava na construção de um edifício, zombava e praguejava com os colegas de tudo que fosse sagrado. De repente, ao rebocar uma parede, deparou com um vão que devia ser preenchido com um tijolo. Subitamente lembrou- se da Bíblia em sua bagagem e disse aos colegas: — Camaradas, ocorre-me uma boa brincadeira. Vou colocar esta Bíblia neste vão. Em virtude do tamanho, a Bíblia foi 50
  • 48. O acesso ao reino espremida, danificando a encadernação. — Vejam! — disse Antônio. — Agora reboco à frente e quero ver se o diabo consegue tirá-la daqui! Semanas mais tarde ele voltou à sua pátria. No dia 10 de maio de 1851, irrompeu em Glarus um grande incêndio que destruiu 490 edifícios. Embora a cidade toda estivesse em ruínas, decidiu-se reconstruí-la. Umpedreiro perito do norte da Itália, de nome João, foi incumbido de examinar uma residência ainda nova, porém parcialmente destruída. Batendo com seu martelo em diversos pontos de uma parede intacta, a certa altura deslocou-se uma parte do reboco e surgiu um livro embutido na parede. Bastante admirado ele o puxou. Era uma Bíblia... Como teria ido parar ali? Era-lhe inexplicável, especialmente porque já possuíra uma, mas tinham-na tomado. “Esta eles não me tomarão”, cogitou. João tornou-se um leitor da Bíblia em todas as suas horas livres. Embora entendesse apenas algumas partes dos Evangelhos e dos Salmos, aprendeu e compreendeu que era um pecador. Descobriu também que Deus o amava e que poderia obter o perdão dos seus pecados pela fé no Senhor Jesus. Quando, no outono, regressou ã sua pátria e à sua família, anunciou por toda a parte a sua salvação em Cristo. Munido de uma mala de Bíblias, João aproveitava suas horas livres para divulgar o evangelho. Assim, chegou ele à região onde residia Antônio e armou sua estante de Bíblias 51
  • 49. TEU É O REINO numa feira. Quando Antônio, perambulando pela feira, parou diante da estante de João, disse: — Ora, Bíblias! Disso não preciso. Basta-me ir a Glarus, pois lá tenho uma bem escondida na parede. Gostaria de saber se o diabo consegue tirá-la dali. João fitou o homem seriamente e disse: — Tome cuidado, jovem! Zombar é fácil. O que você diria se eu lhe mostrasse a tal Bíblia ? — Você não me enganaria — replicou Antônio. -—Reconhecê-la-ia imediatamente, pois ela está marcada. — E asseverou: — Nem o diabo consegue tirá-la da parede! João buscou a Bíblia e perguntou: — Amigo, reconhece esta marca? Ao ver a Bíblia danificada, Antônio calou-se, perplexo. — Você está vendo ?No entanto não foi o diabo quem a retirou da parede, mas Deus, para que você pudesse reconhecer que ele vive. Ele quer salvá-lo também. Nesse instante, embora com sua consciência o acusando, Antônio extravasou todo o ódio acumulado contra Deus. Chamou os amigos: — Ei, colegas! O que este sujeito, com sua estante religiosa, procura aqui ? Em poucos segundos a estante de João estava arrasada e ele mesmo violentamente agredido. Os agressores rapidamente desapareceram en­ tre o povo. Desde então Antônio revoltava-se cada vez mais contra Deus. Certo dia, depois de beber em demasia, caiu do andaime a dezessete metros de 52
  • 50. O acesso no reino altura e foi hospitalizado em estado grave. João, ao saber do acidente, foi visitá-lo no hospital. Embora impressionado com a atitude de João, o coração de Antônio continuava empedernido. João o visitou cada semana. Decorrido algum tempo, o acidentado começou a ler a Bíblia, inicialmente como passatempo, e mais tarde com interesse. Certa ocasião leu em Hebreus 12:5: “Filho meu, não menosprezes a correção que vem do Senhor”. Ora, isso se ajustava bem a seu caso. Antônio prosseguiu a leitura, e a Palavra de Deus, capaz de esmiuçar a penha, passou a operar em sua vida. Reconheceu sua culpa e confessou-a a Deus. Creu verdadeiramente na obra de Cristo consumada na cruz. Sua alma convalescera, porém seu quadril, paralisado, o incapacitava para a sua antiga profissão. Encontrou um serviço condizente com suas aptidões, e, mais tarde, casou-se com a filha de João, agora seu sogro, amigo e pai na fé. Antôniojá está, há muito, na pátria celestial, mas a Bíblia por ele emparedada permanece como uma valiosa herança de seus descendentes. (1 5 ) A decisão. O segundo passo é o da decisão, ou crise emocional. Nessa etapa você sabe quejá não pode resistir ao apelo do amor de Deus, que o conflito íntimo em que você vive exige providências da sua parte. Nesse estágio da decisão você pode experimentar grande perturbação. Toda a sua vida poderá ser confrontada com as exigências do evangelho. Assim 53
  • 51. TEU É O REINO como quando Jesus chegou o rei Herodes “alarmou- se e com ele toda Jerusalém”, assim também ocorre com você quando Jesus bate à porta de sua vida. O evangelho nos desarranja antes de nos consertar. Seus pais poderão opor-se à sua decisão; o futuro cônjuge ou o cônjuge poderá ameaçá-lo com o término do relacionamento; suas amizades poderão abandoná-lo. Todas estas coisas, e muitas outras mais, poderão pressionar você a dizer “não” a Cristo, mas o profundo anseio de sua alma poderá clamar mais alto e realmente levá-lo a decidir pelo “sim” . Recordo-me de quando estive nessa fase. Eu havia sido comunista e ateu. Havia passado anos lendo literatura marxista que considerava enorme tolice a Bíblia e a vida cristã. Agora prestava o serviço militar, e no quartel havia conhecido o evangelho não apenas pregado, mas vivido de fato por alguns soldados crentes. Era muito forte o meu anseio por uma mudança radical em toda a minha vida, mas o que diriam os meus antigos amigos de ideologia? O que diriam os meus novos colegas de farda, aos quais eu já havia impressionado com os meus conhecimentos ideológicos? Mas, graças a Deus, prevaleceu o irresistível apelo do amor de Deus. Numa quarta-feira à noite, no templo da Igreja Metodista de Resende, estado do Rio de Janeiro, fui de tal modo envolvido por ondas do amor de Deus que não contive as lágrimas. Semanas mais tarde, no templo da Assembléia de Deus da mesma cidade, ergui meu braço cansado em sinal de que estava decidido a seguir a Cristo, custasse o que custasse. Era o dia 17 de setembro de 1959, e passou-me pela mente que eu deveria aguardar o domingo seguinte para tomar aquela decisão, pois seria então no dia do meu vigésimo 54
  • 52. aniversário. Resolutamente afastei aquele pensamento, e assim, publicamente, entreguei a minha vida a Cristo naquela noite memorável. No dia 8 do seguinte mês de novembro, eu e mais alguns jovens descemos às águas do batismo. A entrega, ou a resolução do conflito. E esta a fase de consumação de todo um processo de aproximação, conflito e decisão. Finalmente você se entregou a ele, e pertence a ele. Em muitos casos a pessoa que entrega verdadeiramente a sua vida a Cristo enfrenta tremendas batalhas espirituais. Poderá ver o seu lar transformado num inferno, ser deserdado pelos pais, perder o namorado (ou a namorada) etc. Há países em que tal decisão pode significar até a morte. Na China, por exemplo, é comum os ministros perguntarem aos novos crentes, antes do batismo, se eles estão dispostos a morrer pela sua fé, e muitas vezes é este o preço que se paga pela entrega da vida a Cristo. Há uma linda figura nas palavras de Jesus: “Em verdade, em verdade vos digo que se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica só. Mas se morrer, produz muito fruto” (João 12:24). A Vida desceu a este mundo perdido na pessoa de Jesus, a fim de elevar-nos do reino das trevas ao reino da sua maravilhosa luz. Mas como é que a vida sobe de um nível para o outro? Somente através da entrega. Ilustremos com os reinos da natureza. Começando com o mais inferior deles, o mineral, temos depois o reino vegetal, depois o reino animal, e acima deste o reino do homem. O reino de Deus é o quinto e o último, o mais elevado. A única chance que tem a vida de elevar-se é apegar-se ao reino O acesso ao reino 55
  • 53. TEU É O REINO imediatamente superior. Como isso ocorre? Olhemos para uma linda flor, alva e perfumada, medrando em feio lodaçal. A flor lança a sua semente, que é totalmente imersa no charco. A vida inferior do charco, para elevar-se ao nível superior do reino da flor tem de se apegar àquela semente e entregar-se por completo a ela. A partir daí, todo o processo de transformação se inicia, e assim a vida do inferior reino mineral se eleva para o superior reino vegetal. O reino do homem, por sua vez, tornou-se um charco de lodo por causa do pecado. Davi, ao ser salvo, percebeu em que triste condição havia estado: “Tirou-me de um lago horrível, de um charco de lodo” (Salmo 40:2). O pecado trouxe trevas e morte a esse reino humano, que perdeu a sua beleza e a imagem e semelhança com a divindade. O ser humano desceu tanto que foi além do inferior reino animal, tornando-se pior do que as bestas feras; pior do que a criação bruta. Mas foi precisamente a esse degradado reino humano, alienado de Deus, que Jesus veio. Como aquela árvore que Moisés lançou nas águas de Mara a fim de sará-las (Êxodo 15:23-25), assimfoiJesus lançado àsprofundezas damorte. “O Verbo se fez carne, e habitou entre nós” (João 1:14). Henry Barraclough descreve esta verdade nos versos de um lindo hino: A sua vida gastou aqui perdidos pra salvar; Na cruz sangrenta se deu a si, afim de os resgatar. O povo com apatia viu a prova desse amor; E sua graça jam ais mediu um mundo pecador... (1 6 ) Eis aí a chance de nos elevarmos do reino humano ao 56
  • 54. O acesso ao reino reino divino! Da mesma maneira como a vida no reino mineral, para elevar-se, tem de se entregar à vida do reino vegetal que desceu até ela, assim também devemos nós entregar sem reservas a nossa vida humana à semente do reino de Deus, Jesus, e deixar que os processos vitais do reino superior operem livremente em nós. Somente assim a nossa vida inferior entra na nova dimensão da Vida superior do reino de Deus. Arrependimento e conversão Mas precisamos ainda analisar dois importantes termos bíblicos: o arrependimento e a conversão. Eles aparecem separados, como fases seqüentes, no apelo de Pedro: “Arrependei-vos, pois, e convertei-vos” (Atos 3:19). O arrependimento precede a entrega, e esta marca o início da conversão. Arrepender-se, portanto, significa entristecer-se por causa do modo de vida errado que apessoa vive, e desejar mudar completamente esse modo de vida. A palavra tem também o significado de voltar-se, de reverter completamente a direção da vida da pessoa. O arrependimento bíblico é tão urgente quanto apropriado, pois o reino há tanto tempo aguardado está agora presente e bem junto de cada um de nós. “O reino de Deus está dentro de vós” (Lucas 17:20). Tanto na mensagem pregada por João Batista como na que pregaram Jesus e os apóstolos, é forte a ênfase nos resultados do arrependimento. “Produzi, pois, frutos dignos de arrependimento”, bradava o Batista. “Quem não negar-se a si mesmo não pode ser meu discípulo”, ensinava Jesus. “Portanto, se alguém está em Cristo, é nova criação. As coisas antigasjá passaram; eis que coisas 57
  • 55. TEU É O REINO novas surgiram!” (2 Coríntios 5:17, NVI), é a tônica de Paulo. E mais: “Agora, porém, despojai-vos também de tudo: da ira, da cólera, da malícia, da maledicência, das palavras torpes da vossa boca. Não mintais uns aos outros, pois já vos despistes do velho homem com os seus feitos, e vos vestistes do novo, que se renova para o conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou” (Colossenses 3:8-10). O passo que se segue ao arrependimento é o da conversão, que por sua vez produz no arrependido um sentimento de pobreza espiritual, de pequenez e de humildade, que são os frutos do verdadeiro arrependimento e da fé. O apóstolo Paulo descreve a experiência cristã em três estágios distintos, sendo o primeiro deles a vivificação, relacionada com o arrependimento, e o segundo, a ressurreição, nesse caso uma ressurreição moral, um novo tipo de vida, não mais centralizado em si próprio, mas em Cristo. A conversão implica no abandono, por parte do convertido, do senhorio e da justiça próprios. O convertido passa a centralizar-se em seu Salvador, e a valer-se daquelajustiça superior, adquirida por Jesus no Calvário. O terceiro resultado da conversão é o que Paulo chama de “assentado nas regiões celestiais em Cristo Jesus” (Efésios 2:5-6), o que corresponde ao novo nascimento. O papel do Espírito Santo E decisivo o papel do Espírito Santo em nossa salvação. E ele quem convence o mundo do pecado, dajustiça e do juízo (João 16:8-11). E ele quem nos leva à fé e ao 58
  • 56. O acesso ao reino arrependimento, e é ele quem nos regenera. Diz a Bíblia: “Não por obras de justiça praticadas por nós, mas segundo a sua misericórdia ele nos salvou mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo” (Tito 3:5). O Espírito Santo, portanto, faz que o convertido viva um novo tipo de vida, ou “em novidade de vida”, usando uma expressão paulina. Essa vida nova tem como marcas: a justiça, que diz respeito ao relacionamento fraterno com todas as pessoas; a santidade (Efésios 5:24), que diz respeito ao nosso relacionamento com Deus; a pureza, que diz respeito ao nosso afastamento de todas as obras da carne, conforme relacionadas em Gálatas 5:16-21; e, a verdade, que significa o nosso apego a Jesus e à sua Palavra (1 Coríntios 5:7). O alvo final do Espírito Santo é a produção no crente da colheita do Espírito (Gálatas 5:22-23), que quer dizer, em outras palavras, trazer à vida do crente a imagem de Deus em Cristo (Colossenses 3:10). Falando desse maravilhoso processo, diz Paulo que “ somos transformados de glória em glória na mesma imagem, como pelo Espírito do Senhor” (2 Coríntios 3:18). 59
  • 57. 5 Os súditos do reino SERMÃO DE JESUS registrado por Mateus, especialmente no quinto capítulo de seu Evangelho, tem sido considerado por muitos estudiosos da Bíblia como a ética do reino. Esse sermão não consiste de uma nova lista de mandamentos, como o decálogo, mas sim de uma descrição clara e simples de como devem viver as pessoas que entram no reino de Não há dúvida de que as exigências éticas desse sermão de Jesus são incomparavelmente maiores do que qualquer outro mandamento contido nas Escrituras. A superioridade do sermão do monte em relação aos dez mandamentos, por exemplo, é equivalente à luz do sol em relação à luz da lua. Mas as exigências de Jesus não têm por objetivo levar seus ouvintes ao desespero, mas conduzi-las, mediante o arrependimento e o novo nascimento, a um novo padrão de vida, vivido não no poder do nosso desempenho pessoal, mas pela poderosa ação do Espírito Santo em nosso coração. Mesmo estando as exigências de Jesus definidas em termos absolutos, como: “Sede vós, pois, perfeitos, como perfeito é o vosso Pai que está nos céus” (Mateus 5:48), Deus. 61
  • 58. TEU É O REINO ainda assim não devemos encará-las como inatingíveis, mas como um constante desafio em nosso aperfeiçoamento espiritual. Se não podemos alcançar as estrelas, devemos, pelo menos, nos orientar por elas enquanto navegamos no tempestuoso mar desta vida presente. Em nossa sucinta análise do sermão do monte nos restringiremos às bem-aventuranças. Convém, entretanto, que apresentemos aqui uma definição do termo “bem-aventurado”, que aparece repetidas vezes nas páginas da Bíblia, tanto do Antigo como do Novo Testamento. De acordo com Mounce, “bem-aventurado descreve uma alegria cujo segredo está dentro da própria pessoa” .(1 7) Diferentemente dos pagãos, que chamavam seus deuses de “os bem-aventurados” , como seres privilegiados que desfrutam uma felicidade digna de ser atingida pelos seus adoradores, os israelitas jamais atribuíram esse título ao seu Deus. Na Bíblia, “bem-aventurados” são aqueles que se aproximam de Deus, em humildade e reverência, reconhecendo a soberania dele sobre todas as coisas, como Criador e Redentor. Eis alguns exemplos, tirados dos Salmos: “Bem-aventurados todos aqueles que nele se refugiam” (Salmo 2:12); “Bem-aventurado aquele cuja transgressão é perdoada” (Salmo 32:1); “ Bem- aventurada é a nação cujo Deus é o Senhor” (Salmo 33:12); “Bem-aventurado aquele a quem tu escolhes, e fazes chegar a ti” (Salmo 65:4); “Bem-aventurados os que habitam em tua casa” (Salmo 84:4); “ Bem- aventurados os que observam a justiça, que praticam o que é correto em todos os tempos” (Salmo 106:3); “Bem- aventurados os que trilham caminhos retos, e andam na 62
  • 59. Os súditos do reino lei do Senhor. Bem-aventurados os que guardam os seus estatutos...” (Salmo 119:1-2), etc. Os pobres Jesus inicia seu discurso exclamando que não são os ricos e poderosos que são bem-aventurados, mas os pobres e humildes, os de espírito renunciado. “Pobre”, aqui, não quer dizer apenas alguém destituído de bens, mas qualquer pessoa que, em sua necessidade, busca a ajuda de Deus, como Davi, que disse: “Eu sou pobre e necessitado, mas tu, ó Senhor, cuidas de mim” (Salmo 40:17). E mais adiante: “Os pobres verão isto, e se agradarão; vós, que buscais a Deus, reviva o vosso coração” (Salmo 69:32). A palavra grega parapobres tem o sentido de “extrema pobreza” , por derivar-se de “um verbo que significa ‘rastejar’ ou ‘agachar-se’ (a forma substantiva é usada para designar o mendigo, alguém em pobreza abjeta)”(1 8 ). Ser pobre de espírito significa, portanto, depender totalmente de outrem para ajuda, especialmente de Deus. E como lemos no Salmo 34:6: “Clamou este pobre, e o Senhor o ouviu; salvou-o de todas as suas angústias” . O fato de Mateus acrescentar à palavra “pobre” o qualificativo de espírito fez que Calvino sugerisse aqui um tipo de pobreza especial: apobrezaevangélica. “São Mateus ajuntando este epíteto restringe a bem-aventurança a somente aqueles que, disciplinados pela cruz, aprenderam a ser humildes”.(1 9 ) Seja como for, a gloriosa verdade é que o reino pertence aos que assumem a posição de absoluta dependência de Deus, e nesse reino entram triunfantes mediante a obra redentora de Cristo. 63
  • 60. TEU É O REINO Os que choram A expressão “os que chorara” refere-se aos servos de Deus que sofrem na terra por causa do curso deste mundo tenebroso, que vive o seu dia a dia como se Deus nunca existisse. Esse curso do mundo, por ser totalmente oposto ao reino de Deus, faz que os filhos de Deus nadem contra a correnteza, sofrendo todo o tipo de oposição por parte dos pecadores. Phillips traduz essa expressão por “os que sabem o que significa a tristeza” . Os que choram, portanto, choram de tristeza pela condição pecaminosa do mundo. Mas os tristes serão consolados, conforme proclamou Isaías: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque o Senhor me ungiu para pregar as boas- novas aos pobres... a consolar todos os tristes, e ordenar acerca dos tristes de Sião que se lhes dê ornamento por cinza, óleo de alegria por tristeza, veste de louvor por espírito angustiado...” (Isaías 61:1-3). Os mansos A terceira bem-aventurança destina-se aos mansos. Entre os Evangelhos sinópticos, apenas Mateus usa a palavra grega para “mansos”, e isso em três ocasiões distintas. A segunda vez que encontramos essa palavra, em Mateus 11:28-30, Jesus convida a todos os cansados e sobrecarregados deste mundo para que vão a ele, tomem sobre si o seu jugo, e aprendam que o Senhor é “manso e humilde de coração”. A ultima referencia a “manso” ocorre no final do ministério terreno de Jesus, quando ele entra em Jerusalém montado num jumento, em cumprimento 64
  • 61. Os súditos do reino àprofecia de Zacarias: “O teu rei vira a ti,justo e salvador, humilde, montado em jumento, num jumentinho, filho de jumenta” (Mateus 21:5; Zacarias 9:9). Jesus exemplificou aqui na terra o tipo de mansidão que requer de todos os que ingressam no seu reino. Longe de tentar estabelecer um reino político através da força, como tantos outros o fizeram antes dele, Jesus viveu entre nós uma vida de serviço sacrificial e humilde, tanto para Deus como para todos os seres humanos. Um dos maiores mestres da Bíblia escreveu acerca da humildade: O ensino do Novo Testamento é que devemos ser suplicantes e não auto-suficientes. Este fato é um grande choque para a vaidade contemporânea. Exatamentepor esta razão é que eu me convenço de sua veracidade. Pode uma profunda, consciência de Deus surgir ou ser imposta a conceitos auto-suficientes ?A essência do divino é a humildade. Oprimeiro passo para encontrar a Deus é destruir nosso orgulho, dar- lhe um tiro mortal para que, humilhados até o pó, sejamos exaltados até às alturas; tão tocados que rompamos num cântico; tão submissos que sejamos cônscios de nós mesmos. A fonte de nossa vida, espiritual será, daí por diante, gratidão, exaltada gratidão porque, não tendo nada, possuímos tudo”.{w) A humildade, ou mansidão, é, portanto, a característica dos que vão herdar a terra e ter, aqui, abundância de paz (Salmo 37:11). Todas as coisas que 65
  • 62. TEU É O REINO realmente dão satisfação genuína e duradoura estão destinadas aos mansos, os únicos que de fato podem gozar a vida. Os que têm fome e sede dejustiça Milhões de pessoas que hoje vivem no mundo jamais sofreram a amarga experiência da fome e da sede. Por isso não lhes é fácil entender o verdadeiro significado das palavras de Jesus. Mas no mundo antigo, em virtude de guerras e secas prolongadas, uma parcela muito grande da população vivia contentemente à beira dessas tragédias, às vezes fugindo de perseguição ou atravessando longos desertos sem a devida provisão do precioso líquido. Jesus sabia que, mediante tais figuras vividas, seus ouvintes avaliariam corretamente o anseio pela justiça que todo filho do reino deve ter, pois ele fala, não da fome e sede físicas, mas da espiritual. Os filhos de Coré, no Salmo 42:1-2, usam a sede como figura de seu profundo anseio espiritual: “Como o cervo anseia pelas correntes das águas, assim suspira a minha alma por ti, ó Deus. A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo.” Mas o que é ajustiça? Frei Heitor Pinto escreveu um interessante poema àjustiça, que diz: O Justiça, guia da nossa vida, que seria do mundo sem ti?! Tu és inventora das leis; mestra dos bons costumes; tu alevantas as virtudes e abates os vícios. Tu és a inimiga da azeda discórdia e conservadora da doce paz. Tu espantas os maus e asseguras os bons. Sem ti, a ordem é desordem, a vida é morte, o descanso é 66
  • 63. Os súditos do reino trabalho, a glória é infâmia, o bem é mal. Tu destruíste a confusão egeraste a boa governança. Tu livras os inocentes e condenas os culpados. Tu alegras osjustos tristes e entristeces osjustos alegres, para que deixadas as suas vãs e temporais alegrias, alcancem os verdadeiros e eternos contentamentos. Finalmente, tu és aquela gloriosa escada de Jacó, que com uma ponta estava na terra e com a outra tocava no céu, pela qual subiam uns e outros desciam: porque tu alevantas os justos e santos até os altos céus, e derribas os ímpios e danados até os profundos dos abismos. (2 1 ) Que bom seria se ajustiça cumprisse com rigor o seu importante papel na sociedade! Entretanto, quantas pessoas não têm sido vítimas da corrupção justamente da parte daqueles que têm o dever de fazer justiça! Um brasileiro no exterior, ao ser perguntado como ia o Brasil, respondeu ironicamente que ia muito bem, pois “cinco por cento da população não tinha de que se queixar, e noventa e cinco por cento não tinha a quem se queixar” . Ele falava da impunidade dos poucos que se enriquecem à custa do desamparo de muitos. No presente contexto do sermão do montej ustiçavem a ser aquelas condições sociais e espirituais que prevalecerão em nosso mundo por ocasião do reino milenial de Cristo, quando a vontade de Deus será feita na terra como agora é ela feita no céu. A promessa de Cristo é que Deus satisfará plenamente a todos aqueles que, como os filhos de Coré, todos os dias suspiram pela oportunidade de viver em plena harmonia com a vontade divina. 67
  • 64. TEU É O REINO Jesus se serve, aqui, da figura de um banquete espiritual em que famintos e sedentos encontram farta satisfação para as suas mais profundas necessidades. “O Senhor dos Exércitos preparará neste monte a todos os povos uma festa com animais gordos, uma festa com vinhos puros, com coisas gordurosas, e vinhos velhos, bem purificados” (Isaías 25:6). No último livro da Bíblia, afirma Jesus: “ Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas. Ao que vencer darei do maná escondido, e lhe darei uma pedra branca, e na pedra um novo nome escrito, o qual ninguém conhece senão aquele que o recebe” (Apocalipse 2:17). Um grande homem de Deus observou que “nunca conseguimos obter o suficiente daquilo que na verdade não queremos. Fomos criados para Deus e nada, exceto sua presença, nos satisfaz” .(2 2 ) Portanto, a justiça pela qual os servos de Deus suspiram é muito superior a todo o tipo dejustiça terrena, e inclui a consumação final da obra redentora de Jesus no Calvário, o que se dará por ocasião de sua volta em triunfo para reinar aqui na terra. Os súditos do reino de Deus, vivendo ainda na carne, anseiam pelo momento ainda futuro da ressurreição dos que dormiram em Cristo, ou da transformação dos cristãos vivos, por ocasião do arrebatamento. Somente então se cumprirá o que Paulo escreveu: “Pelo que Deus o exaltou soberanamente, e lhe deu um nome que é sobre todo o nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho dos que estão nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Cristo Jesus é o Senhor, para glória de Deus Pai” (Filipenses 2 : 10- 11). 68
  • 65. Os misericordiosos A misericórdia é outra característica dos súditos do reino de Deus (Mateus 5:7-8). A palavra significa compaixão despertada pela miséria alheia, e perdão. No Novo Testamento o termo significa “bondade”, e a ele estão associadas expressões como “ amor persistente” e “cheios de compaixão”, evidentemente compaixão pelos que estão perdidos, e sofrem. Dentro do contexto bíblico, a misericórdia praticada pelos súditos do reino não é simplesmente o fruto de emoções passageiras ou de uma filantropia interesseira, tão comuns nas religiões de mercado, baseadas na salvação pelas obras. Os bem-aventurados misericordiosos são aquelas pessoas fiéis a um relacionamento de aliança, que praticam a misericórdia com uma bondade intencional. A vida humana de milhões, nos dias de Jesus, não passava de verdadeira tragédia, tanto na Palestina como na maioria das outras nações. Eram espantosas a crueldade e a brutalidade infligidas pelas pessoas livres às multidões escravizadas. Em Roma, por exemplo, os escravos viviam à mercê do capricho de seus senhores, na maioria das vezes cruéis, que tinham pleno direito de tirar-lhes a vida quando bem o quisessem. “De um tal Pólio, cavaleiro do tempo de Augusto, consta que foi censurado por atirar os escravos vivos ao seu lago para sustentar lampreias, que depois se aprazia em saborear na sua mesa!”(2 3 ) Atribui-se a Aristóteles a expressão: “O escravo é um utensílio com vida, e um utensílio é um escravo sem vida”. Foi nesse contexto que Jesus veio ao mundo, como bem escreveu Rui na sua célebre Prece de Natal: 69
  • 66. TEU É O REINO “Enquanto César cuidava do império, e Roma do mundo, assomavas Tu ao canto de uma província e na vileza de um estábulo, sem que Roma, nem o império, nem César Te percebessem, para ficar à posteridade a lição indelével de que a política ignora sempre os seus mais formidáveis interesses” . Jesus exemplificou essa compaixão em seu ministério. Mateus afirma, para citarmos apenas esse evangelista: “Vendo ele as multidões, tinha grande compaixão delas, porque andavam cansadas e abatidas, como ovelhas que não têm pastor” (9:36). “Saindo Jesus, viu uma grande multidão, e, possuído de grande compaixão para com ela, curou os seus enfermos” (14:14). E mais adiante: “Jesus chamou os discípulos e lhes disse: Tenho compaixão da multidão... Movido de compaixão, Jesus tocou-lhes os olhos. Imediatamente recuperaram a vista, e o seguiram” (15:32; 20:34). Os misericordiosos, portanto, são aqueles que, como Jesus, mostram misericórdia aos fracos, aos desamparados, aos pequeninos, possuindo assim “o mesmo sentimento que houve em Cristo Jesus” (Filipenses 2:5). Mas misericórdia é palavra sinônima de perdão. Os cavaleiros da antiguidade davam o nome de “Misericórdia” ao punhal que traziam à sua direita, com o qual matavam o adversário derribado, se este não pedisse misericórdia. A Bíblia afirma que aos misericordiosos Deus mostrará misericórdia. Essa reciprocidade está presente na oração do Pai Nosso, em que Jesus enfatiza a necessidade de perdoar para ser perdoado: “Perdoa as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores” (Mateus 6:12). O verdadeiro súdito do reino 70
  • 67. Os súditos do reino de Deus, portanto, é aquela pessoa incapaz de guardar mágoas ou ressentimentos contra quem quer que seja. Ele mantém sempre uma atitude perdoadora. Um experiente conselheiro sugere diversos passos para quem deseja de fato perdoar, sendo este um deles: Mesmo quando cheio do poder do Espírito Santo, a pessoa deve tomar uma decisão consciente de perdoar aquele que pecou contra ela. Veja, mesmo depois de nos tornarmos crentes, Deus nunca remove nosso livre arbítrio. Nós sempre temos a oportunidade e responsabilidade de escolher o que faremos. Deus não nos fará perdoar, mas ele nos ajudará aperdoar, se nossa escolha for obedecê-lo. Davi escreveu: “Venha a tua mão socorrer-me, pois escolhi os teus preceitos ” (Salmo 119:173). Quando tomamos a decisão consciente de perdoar aos outros, Deus nos ajuda. (2 4) Apiano, no primeiro volume do seu livro Maravilhas do Egito, narra surpreendente caso testemunhado por ele próprio na cidade de Roma, nos dias de Caio César. No grande circo exibia-se aopovo um combate em grande escala com as feras. Foi introduzido o escravo de um cruel ex-cônsul da África do Norte. O nome do escravo era Androcles. Ao vê- lo à distância, diz Apiano, o leão estacou como que surpreendido, depois aproximou-se vagarosamente do homem, e, tranqüilamente começou a lamber-lhe os pés e as mãos. Androcles, ao passo que se submetia às carícias 71
  • 68. TEU É O REINO de um animal tão feroz, readquiriu a perdida coragem e, aos poucos, volveu os olhos para o leão. Então, diz Apiano, ainda o homem e o leão trocaram efusivas saudações, como quem se reconhecia um ao outro. Sendo isso deveras pasmoso, o povo rompeu em altos gritos de aclamações. Caio César chamou Androcles a si, e indagou a razão daquela cena. Foi então que Androcles relatou a estranha e surpreendente história. Disse ele que, havendo fugido de seu cruel Senhor, escondera-se numa caverna em deserto solitário. Nessa caverna entrou, depois de algum tempo, um leão com uma pata ferida, a sangrar, dando a conhecerpor seus gemidos, a torturante dor que sentia. A princípio, Androcles ficou atemorizado, mas o leão ergueu a pata para ele, que viu uma enorme lasca de madeira enterrada na sola de seu pé. Com cuidado, removeu-a, então, tratando a ferida o melhor que pôde. O leão deitou-separa repousar. Anos depois é que os dois se encontraram novamente nesse famoso dia no circo. Como Androcles fora misericordioso para com o leão, alcançou agora misericórdia também”.(2 5 ) Ninguém perdoou mais do que Deus e do que Jesus. A Bíblia está cheia de expressões que falam do amor perdoador de Deus, e o Salmo 136 é bom exemplo, ao afirmar vinte e seis vezes que “o seu amor dura para sempre”. Noutro Salmo, lemos que “Quanto está longe o oriente do ocidente, assim [o Senhor] afasta de nós as nossas transgressões” (Salmo 103:12). Note que não se trata da distância entre o norte e o sul, que é finita, mas 72
  • 69. Os súditos do reino entre o oriente e o ocidente, que é infinita. Se pudéssemos tomar um avião rumo ao norte, em dado momento alcançaríamos o nosso alvo; mas se esse alvo é o oriente ou o ocidente, então nunca o alcançaríamos. E assim que devemos perdoar. Gamaliel de Jabné, famoso rabino do primeiro século, dizia: “Enquanto você for misericordioso, o Misericordioso lhe será misericordioso” .(2 6 ) O perdão de Deus está condicionado ao perdão com que perdoamos aos outros. Jesus deixou essa verdade bem clara quando disse: “Pois se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial vos perdoará a vós. Porém se não perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celestial não perdoará as vossas” (Mateus 6:14-15). Kay Arthur afirma que “deixar de perdoar vai con­ tra todo o evangelho da salvação, que lhe traz o perdão dos pecados, das suas dívidas, outorgado por um Deus santo. Recusar-se a perdoar é negar ou esquecer o conteúdo da salvação. E o mesmo que dizer: ‘Deus o perdoará, mas eu não. O seu pecado, companheiro, é grande demais!’ ” (27) Portanto, todos os que verdadeiramente foram perdoados por Deus, não fazem outra coisa senão perdoar. Os puros de coração Embora a pureza sexual esteja presente aqui, a expressão puros de coração é mais abrangente e inclui a retidão e a inteireza ou sobriedade. Trata-se portanto, de pessoas que não têm o eu dividido, mas unido e harmônico. Tiago considera sinônimas as expressõesduplo ânimo 73
  • 70. TEU É O REINO e coração impuro, quando afirma: “Vós, de duplo ânimo, purificai os corações” (Tiago 4:8). A bem-aventurança dos puros de coração é que verão a Deus. A Bíblia diz que essa será a maior bênção que um ser humano possa receber, uma vez que ninguém jamais viu a Deus (João 1:18), pelo fato de Deus habitar na luz inacessível (1 Timóteo 6:16). A promessa de Apocalipse 22:4, de que os salvos verão a Deus, terá o seu cumprimento pleno quando recebermos o nosso novo corpo, pela ressurreição ou pela transformação, por ocasião do regresso do Senhor Jesus. Enquanto esse glorioso dia não chega, podemos ter uma visão mais profunda de Deus mesmo neste tempo presente, através de uma comunhão mais íntima com ele. Os pacificadores A virtude da pacificação torna os que a possuem em filhos de Deus. Sendo Deus um Deus de paz, que pelo sangue de seu próprio Filho fez a paz entre nós e ele, quando reconciliamos as pessoas umas com as outras, fazendo isso de todo o coração, então herdamos de nosso Pai celestial essa virtude dele. Um pastor evangélico de gênio extremamente agressivo tentavajustificar as suas atitudes belicosas junto a outro pastor, dizendo que herdara de seu pai aquele temperamento. O colega retrucou que, como cristãos, todos nós temos um novo pai, o Pai Celestial, de quem nos tornamos herdeiros. Davi nos diz que devemos procurar a paz e segui-la (Salmo 34:14), e o autor de Hebreus nos manda seguir a paz com todos (Hebreus 12:14). Lincoln, o presidente dos Estados Unidos da América ao tempo em que aquela 74
  • 71. Os súditos do reino nação viveu a sua maior crise social — a guerra civil — agiu como perfeito pacificador, jamais tomando partido entre os estados do Norte e os do Sul, e essa atitude foi decisiva para a pacificação do pós-guerra e o fortalecimento de toda a nação. Em seu propósito de sempre buscar a paz com todos, Lincoln conseguiu tornar-se amigo de um forte adversário político, provocando críticas de alguns amigos. Sua resposta foi: “Não é nosso dever acabar com os nossos inimigos? Eu acabei com um deles, fazendo dele um amigo” . Não é sem motivo que os norte-americanos, e tantos outros povos, não conseguem esquecer-se de Lincoln, o Pacificador. Os que sofrem perseguição Esta bem-aventurança destina-se somente àqueles que são perseguidos “por causa da justiça”, ou seja, que sofrem pelo fato de perseverarem na prática da fé cristã, afastando-se do pecado e de todo o tipo de corrupção. Especialmente quando um fiel servo de Deus assume um cargo de influência em uma empresa ou um mandato público, onde a corrupção existe, e esse crente rejeita participar de manobras ou negociatas desonestas, é certo que a perseguição virá de muitas formas. A sociedade em geral tem a tendência de perseguir e afastar de seu meio tanto os que descem abaixo do nível moral dela quanto aos que se elevam acima dela. Por isso estão nos presídios os criminosos comuns, que matam, estupram, assaltam e roubam. Mas também são banidos do meio social os que se elevam acima da média, como tem acontecido com tantos, dentre eles João Bunyan, que passou 20 anos encarcerado sem nunca ter 75
  • 72. TEU É O REINO sidojulgado, somente porque desejava viver o evangelho como Jesus viveu. É como o próprio Jesus afirmou: “Quem pratica o mal odeia a luz e não se aproxima da luz, temendo que as suas obras sejam manifestas” (João 3:20, NVI). Um cristão verdadeiramente honesto incomoda muito os que vivem na prática da desonestidade, que tudo fazem para se livrar dele. “Todos os que desejam viver piamente em Cristo padecerão perseguições” (2 Timóteo 3:12), afirma o apóstolo Paulo. Sei de crentes que perderam bom emprego público por se recusarem a participar de negócios escusos que envolviam até mesmo os seus coniventes superiores. Jesus diz que o reino dos céus pertence a essas pessoas perseguidas. Não somente estão elas dentro do reino; este lhes pertence, é delas. 76