Seminário Biologia e desenvolvimento da matrinxa.pptx
Almanaque o Voo da Gralha Azul numero 8 set out nov 2011
1.
2. Revista Literária
―O Voo da Gralha
Azul‖
n0. 8 – Paraná, setembro/outubro/novembro 2011
Idealização, seleção e edição:
José Feldman
Contatos, sugestões, colaborações:
pavilhaoliterario@gmail.com
voodagralhaazul@gmail.com
http://singrandohorizontes.blogspot.com
Endereço para correspondencia:
Rua das Mangueiras, 296-A
Cep.87080-680
Maringá/PR
Que a humanidade possa aprender com a nossa Gralha-azul e entender que o equilíbrio e o respeito
ecológico entre fauna e flora é fundamental para a existência do Homem na face da Terra!!!
Prezado Leitor
Este almanaque não tem a pretensão e nunca poderá ser considerada como substituição aos livros, jornais, colunas, etc. que circulam virtualmente ou
não, mas sim como mola propulsora de incentivo ao cidadão para buscar novos conhecimentos, ou relembrar aqueles perdidos na névoa do passado.
Por que o Voo da Gralha Azul? A Gralha Azul, que assim como semeia o pinheiro, ela alça voo e semeia no coração de cada um que alcançar, o pinhão
da cultura, em todas as suas manifestações.
Ao leitor, novos conhecimentos.
Ao escritor ou aspirante a tal, sejam poetas, trovadores, romancistas, dramaturgos, compositores, etc., um caminho de conhecimento e inspiração.
Obrigado por me permitir dividir consigo estes breves momentos,
José Feldman
3. SUMÁRIO
ACADEMIAS ESTANTE DE LIVROS
ACADEMIA CAMPINENSE DE LETRAS ......................................... 155 ANTONIO BRÁS CONSTANTE
Hoje é seu Aniversário! "Prepare-se".......................................122
ADEMAR MACEDO ÁTILA JOSÉ BORGES
Matando o Porco. Eu Contos .....................................................166
MENSAGENS POÉTICAS N. 399 BRANQUINHO DA FONSECA
Uma Trova Nacional ................................................................ 163 O Barão ..................................................................................... 43
Uma Trova Potiguar ................................................................ 164 CAROLINA RAMOS
Uma Trova Premiada ............................................................... 164 Lançamento do Livro de Poesias ―Destino‖ ................................. 3
Uma Trova de Ademar ............................................................. 164 GUIMARÃES ROSA
...E Suas Trovas Ficaram ......................................................... 164 7 Contos do Livro Primeiras Histórias
Estrofe do Dia .......................................................................... 164 Sorôco, sua mãe, sua filha ........................................................ 74
Soneto do Dia .......................................................................... 164 A menina de lá .......................................................................... 75
Os irmãos Dagobé ...................................................................... 76
BIOGRAFIAS Pirlimpsiquice........................................................................... 77
Fatalidade ................................................................................. 78
Abílio César Borges ...................................................................29 Substância................................................................................. 79
Adalcinda Camarão ....................................................................25 A partida do audaz navegante ................................................... 80
Adelto Gonçalves .......................................................................18 ISABEL FURINI (ORGANIZADORA)
Anderson Braga Horta ............................................................. 142 Passageiros do Espelho (Antologia de Contos) ..........................164
Antonio Brás Constante ............................................................ 122 JOÃO UBALDO RIBEIRO
Antônio Cândido da Silva ...........................................................67 O Sorriso do Lagarto.................................................................168
Branquinho da Fonseca .............................................................45 JOSÉ MARINS (ORGANIZADOR)
Carlos Reverbel ..........................................................................88 A brisa é você: Mini contos.......................................................101
Cláudio Batista Feitosa ...............................................................69 LYA LUFT
Emilia Pardo Barzón ............................................................... 137 A Asa Esquerda do Anjo ............................................................ 89
Fernando Campanella .............................................................. 154 MARIO QUINTANA
Glorinha Rattes ........................................................................ 134 80 anos de poesia ...................................................................... 72
Jardel Estevão Barbosa Silva ................................................... 150
Jussára C. Godinho ....................................................................59 FOLCLORE
Lafcádio Hearn ―Koizumi Yakumo‖............................................86
Laurindo Rabelo ........................................................................48 O Amigo da Onça ......................................................................145
Lya Luft ......................................................................................90
Natália Correia ........................................................................ 101 HAICAIS
Nilton da Costa Teixeira ........................................................... 130
Nilton Manoel.............................................................................10 NILTON MANOEL
Raul de Leoni .......................................................................... 160 Poesia Magica (haicais)................................................................ 5
Valdeck Almeida de Jesus .........................................................96
Victor Giudice ......................................................................... 125
MENSAGEM
CINEMA ARISTÓTELES ONASSIS
Talvez ........................................................................................ 1
Obras de Shakespeare no Cinema ............................................. 120
O ESCRITOR COM A PALAVRA
CURIOSIDADES DE NOSSA LÍNGUA
A. A. DE ASSIS
VÍCIOS DE LINGUAGEM A Moça do Jipe .......................................................................... 27
Tautologia ................................................................................ 147 ALBERTO PACO
Uma Estranha Mulher ...............................................................162
ENTREVISTA ANTONIO BRÁS CONSTANTE
A Partida Do Homem Mais Veloz Do Mundo ..............................118
IALMAR PIO SCHNEIDER Contos da Delegacia Brasil ........................................................121
O Homem atrás do escritor, o Escritor atrás do homem .............55 Mamãe, a Professora Sumiu!.....................................................110
Uma Feira de Doces para Alimentar o Pensamento .................... 81
ANTÔNIO CÂNDIDO DA SILVA
Bar do Zizi ................................................................................ 66
4. APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA Ode à água ...............................................................................142
Celulares ....................................................................................52 ARTHUR RIMBAUD
ARTHUR RIMBAUD O barco ébrio ...........................................................................104
Aurora — XXII ....................................................................... 106 Vogais ......................................................................................105
ARTUR DE AZEVEDO Minha boêmia (Fantasia) ..........................................................105
A Ama-Seca ................................................................................12 BRANQUINHO DA FONSECA
A "Não-me-toques!‖ ..................................................................32 Naufrágio .................................................................................. 42
CAROLINA RAMOS Arquipélago das sereias ............................................................ 42
Do Cotidiano ................................................................................ 2 Castanheiros, irmãos… .............................................................. 42
CINTIAN MORAES FERNANDO CAMPANELLA
A diferença entre Viver Bem e Viver Melhor ...............................93 Ao vento ...................................................................................151
DIEGO OLIVEIRA Ninféias ....................................................................................152
Um Minuto ............................................................................... 102 Luz cadente ..............................................................................152
EMILIA PARDO BAZÁN Refabulando .............................................................................152
Oito Nozes ................................................................................ 135 Capela dos ossos .......................................................................152
FERNANDO CAMPANELLA La Campanella ..........................................................................152
Conversa de Compadres ............................................................ 150 A media luz ..............................................................................153
HUMBERTO DE CAMPOS Alquimia ..................................................................................153
A Rosa Azul ................................................................................. 4 Olhos ........................................................................................153
O Filósofo ...................................................................................40 Tua beleza................................................................................153
INGLÊS DE SOUSA Consummatum .........................................................................153
A Quadrilha de Jacob Patacho ....................................................59 Frutos da terra .........................................................................153
JARDEL ESTEVÃO BARBOSA SILVA Pássaros ...................................................................................154
O Perfume ................................................................................ 148 GLORINHA RATTES
J.B.XAVIER Desabafo ...................................................................................133
A Espera .....................................................................................11 Espelho ....................................................................................133
JORGE LUIS BORGES Exemplo de vida.......................................................................133
O Outro .................................................................................... 106 O que fica .................................................................................134
JUSSARA C. GODINHO Sublime amor .........................................................................134
Meninos de rua ..........................................................................51 JUSSARA C GODINHO
LAFCÁDIO HEARN Amor, sentimento estranho ....................................................... 59
A Promessa ................................................................................83 LAURINDO RABELO
LUIS FERNANDO VERÍSSIMO ―O que fazes, ó minh’alma?‖ .................................................... 46
Metamorfose............................................................................. 123 Dois impossíveis ........................................................................ 47
MIGUEL FALABELLA LYA LUFT
Saudade .....................................................................................97 Canção na plenitude .................................................................. 82
NILTO MACIEL NATÁLIA CORREIA
Vou ser herói, Maria ..................................................................31 ―A defesa do poeta‖ ................................................................. 98
OTTO MELANDER Fiz um conto para me embalar .................................................. 99
A Mulher e o Cachorro ................................................................70 Auto retrato .............................................................................. 99
PETRUS ALPHONSUS Queixa das almas jovens censuradas ......................................... 99
Humor do Século XII ................................................................ 144 Ode à paz .................................................................................100
SAMUEL CASTIEL JR. A alma......................................................................................100
Noturnas ....................................................................................68 Falavam me de amor ................................................................100
VICÊNCIA JAGUARIBE NILTON DA COSTA TEIXEIRA
Mas a vida...A vida não se passa a limpo ....................................22 A fonte luminosa ......................................................................132
VICTOR GIUDICE PADRE CELSO DE CARVALHO
O Arquivo ................................................................................. 124 A lenda dos caminhos ..............................................................102
Soneto .....................................................................................103
POESIAS Diamantina em serenata ...........................................................103
RAUL DE LEONI ..............................................................................
ADALCINDA CAMARÃO A hora cinzenta ........................................................................158
Bom dia, Belém ..........................................................................24 Argila .......................................................................................158
Espaço-tempo .............................................................................25 Decadência ...............................................................................158
ANDERSON BRAGA HORTA Transubstanciação ...................................................................158
Salmo para Célia ..................................................................... 139 Desconfiando ............................................................................159
A tartaruga............................................................................... 140 ― Almas desoladoramente frias…‖ ...........................................159
Sísifo ........................................................................................ 141 Crepuscular ..............................................................................159
Rio ........................................................................................... 141 Unidade ....................................................................................159
(A)mar(o) ................................................................................. 141 Pudor .......................................................................................159
Ciranda .................................................................................... 141 Prudência .................................................................................160
5. Aos que sonham ....................................................................... 160 JUSSARA C. GODINHO
SAMUEL CASTIEL JR. Trovas ....................................................................................... 52
Flor Tropical .............................................................................67 NILTON DA COSTA TEIXEIRA
VALDECK ALMEIDA DE JESUS Trovas dispersas ......................................................................132
A vida pulsa ..............................................................................95 NILTON MANOEL (SP)
Coração de pedra ........................................................................95 Trovas ....................................................................................... 10
Cicatrizes ...................................................................................95 TROVAS
Tema: Paciência ........................................................................ 19
SOPA DE LETRAS TROVAS EM IMAGEM
A. A. de Assis (PR) ..................................... 12,18, 35, 89, 104, 110
ADELTO GONÇALVES Ademar Macedo (RN) ................................................................. 55
Cinco séculos de poesia brasileira ..............................................15 Alberto Paco (PR) ...................................................................... 95
FUNDAÇÃO BIBLIOTECA NACIONAL ...............................................50 Austregésilo de Miranda Alves (BA) ........................................... 41
Dáguima Verônica (MG) ............................................................. 66
Élbea Priscila de Souza e Silva (SP)........................................... 15
TROVAS Francisco Pessoa Reis (CE) .............................................................
Hermoclydes S. Franco (RJ) ...................................................... 21
A. A. DE ASSIS Nemésio Prata Crisóstomo (CE) .............................................. 9, 31
Tábua de Trovas ........................................................................35 Wagner Marques Lopes (MG) ...................................... 5, 27, 50, 70
BAÚ DE TROVAS WALDIR NEVES
Nova Friburgo 1960 ................................................................. 111 Trovas ......................................................................................177
ELIANA RUIZ JIMENEZ XVII JOGOS FLORAIS DE CURITIBA
Trova-Legenda (Participe!) ....................................................... 175 Regulamento ............................................................................174
Trovas de 9 a 15 de outubro .................................................... 176
IALMAR PIO SCHNEIDER
Trovas ........................................................................................58
Este Almanaque não pode ser comercializado em hipótese alguma.
Caso assim o desejar, deve-se contatar o/s autor/es para obter
autorização.
Respeite os Direitos do Autor.
6. 1
ARISTÓTELES ONASSIS
Mensagem
Talvez algumas pessoas queiram o meu mal.
TALVEZ Mas irei continuar plantando a semente da fraternidade
por onde passar.
Talvez eu venha a envelhecer rápido demais.
Mas lutarei para que cada dia tenha valido a pena. Talvez eu fique triste ao concluir que não consigo seguir o
ritmo da música.
Talvez eu sofra inúmeras desilusões no decorrer de Mas então, farei que a música siga o compasso dos meus
minha vida. passos.
Mas farei que elas percam a importância diante dos
gestos de amor que encontrei. Talvez eu nunca consiga enxergar um arco-íris.
Mas aprenderei a desenhar um, nem que seja dentro do
Talvez eu não tenha forças para realizar todos os meus meu coração.
ideais.
Mas jamais irei me considerar um derrotado. Talvez hoje eu me sinta fraco.
Mas amanhã irei recomeçar, nem que seja de uma
Talvez em algum instante eu sofra uma terrível queda. maneira diferente.
Mas não ficarei por muito tempo olhando para o chão.
Talvez eu não aprenda todas as lições necessárias.
Talvez um dia o sol deixe de brilhar. Mas terei a consciência que os verdadeiros ensinamentos
Mas então irei me banhar na chuva. já estão gravados em minha alma.
Talvez um dia eu sofra alguma injustiça. Talvez eu me deprima por não ser capaz de saber a letra
Mas jamais irei assumir o papel de vítima. daquela música.
Mas ficarei feliz com as outras capacidades que possuo.
Talvez eu tenha que enfrentar alguns inimigos.
Mas terei humildade para aceitar as mãos que se Talvez eu não tenha motivos para grandes
estenderão em minha direção. comemorações.
Mas não deixarei de me alegrar com as pequenas
Talvez numa dessas noites frias, eu derrame muitas conquistas.
lágrimas.
Mas não terei vergonha por esse gesto. Talvez a vontade de abandonar tudo torne-se a minha
companheira.
Talvez eu seja enganado inúmeras vezes. Mas ao invés de fugir, irei correr atrás do que almejo.
Mas não deixarei de acreditar que em algum lugar alguém
merece a minha confiança. Talvez eu não seja exatamente quem gostaria de ser.
Mas passarei a admirar quem sou.
Talvez com o tempo eu perceba que cometi grandes Porque no final saberei que, mesmo com incontáveis
erros. dúvidas, eu sou capaz de construir uma vida melhor.
Mas não desistirei de continuar trilhando meu caminho.
E se ainda não me convenci disso, é porque como diz
Talvez com o decorrer dos anos eu perca grandes aquele ditado: “ainda não chegou o fim”
amizades. Porque no final não haverá nenhum “talvez” e sim a
Mas irei aprender que aqueles que realmente são meus certeza de que a minha vida valeu a pena e eu fiz o
verdadeiros amigos nunca estarão perdidos. melhor que podia.
7. 2
Carolina Ramos
Do Cotidiano
Fim de tarde. Friozinho abelhudo penetrava Disfarçou, fingindo não vê-lo. Foi puxado pela
por onde quer que lhe fosse permitido entrar, manga.
encolhendo ombros e aconchegando corpos.
– Moço, me dá um dinheirinho? Tô cum fome.
Pressa. Pressa de voltar para casa. De rever a
esposa, os filhos, os entes queridos. Pressa de Era tudo que não queria ouvir! Engoliu a
trocar os sapatos pela comodidade dos chinelos saliva que o reflexo, condicionado à chegada
velhos, das meias de lã, ma maioria das vezes do hamburger, lhe fizera crescer na boca.
furadas no dedão. Pressa de sumir dentro do
pijama quentinho. De saborear o jantar – Hoje não, meu filho…Não tenho trocado. –
fumegante e depois esparramar-se na Procurou ignorar a presença incômoda do
poltrona, frente à TV para cochilar e falar mal menino, saboreando, com os olhos, a iguaria,
dela. cujo aroma lhe excitava as glândulas salivares.
Apertou o hamburger com volúpia, fazendo o
Fim de tarde fria. Noite a insinuar-se, mais fria ―catchup‖ escorrer pelas bordas. Chegou a
ainda. abrir a boca para a primeira mordida, não
consumada.
Sem esposa, nem filhos, sem aquela pressa que
movia tantas pernas, Reginaldo caminhava Ao seu lado, o garoto permanecia fascinado
sem motivação maior, arrastando os passos pelo petisco fumegante, entre fritas e folhas de
até a lanchonete mais próxima, menos cheia alface.
de gente descompromissada, como ele, e,
portanto, menos tumultuada pelo vozerio das Reginaldo engoliu em seco. Tivesse dinheiro no
massas. bolso e tudo estaria resolvido. O remorso
antecipou-se à consumação, importunando-o
Roído de fome, passou a perna por sobre a mais do que a própria fome. Pensou em divir o
banqueta redonda, repousando os cotovelos pitéu. Lambuzou-se todo! Os olhos do garoto
no balcão de formica. Consultou os bolsos. Eles continuavam, gulosos, namorando o
é que ditavam o pedido. Os apelos do hamburger.
estômago eram secundários. Fim de mês.
Minguava, no fundo da algibeira, a carteira Capitulou. Pediu um saquinho de papel e
murcha. Não dava para muito. E, justamente encheu-o de batatas fritas. Embrulhou o
naquele início frio de uma noite que prometia hamburger num guardanapo e entregou-o,
ser gélida, sentia uma fome de cão vadio! inteiro, à fome que se estampava na carinha
esquálida. E achou que seria pouco!
– Um hamburger com fritas. Ah… e um
cafezinho pingado. Alegria e surpresa coloriram a face ´pálida do
menino que balbuciou qualquer coisa
– Bebida? ininteligível e disparou porta afora, temeroso
de possível arrependimento.
Lembrou-se da carteira murcha.
Sobraram para Reginaldo, desapontamento e
– Não…obrigado. Só o cafezinho. frustração total!
Aguardou, impaciente. Perdera o jantar! A fome continuava firme. E
a fuga precipitada roubava-lhe, ainda, a
Chegaram juntos: – o hamburger e o garoto modesta satisfação do espetáculo
de olhos tristes. Seis ou sete anos, no máximo. proporcionado pela sua renúncia. Queria ver
8. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 3
morrer a fome do guri! Fome a ser morta por a mãe, maltrapilha, e com mais duas crianças,
ele! Morte da qual não se arrependeria, sua finada refeição.
jamais! Direito seu!
O sorriso do menino foi, sem dúvida, o que de
Contentou-se com o cafezinho morno e duas mais gratificante recebera da vida!
fritas sobradas no prato. E enfrentou
novamente a noite, mais fria do que antes, A caminho da modesta vaga que ocupava,
ignorando os reclamos do estômago vazio. numa casa de cômodos, esqueceu-se da fome.
Chegou mesmo a envergonhar-se dela!.
Meio quarteirão adiante, uma surpresa. Fonte:
Sentado na calçada, encostado à parede, o RAMOS, Carolina. Interlúdio: contos.SP: EditorAção, abril 1993.
mesmo garoto, olhos menos tristes, dividia com
Carolina Ramos
Lançamento do Livro
de Poesias ―Destino‖,
em 23 de Novembro
9. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 4
Humberto de Campos
A Rosa Azul
O comendador Luiz de Faria
acabava de fechar os olhos à velha
marquesa de São Justino, adoçando-lhe o
O comendador interrompeu um momento a
narrativa, recostou-se na almofada, e
continuou:
momento da morte com a noticia alvissareira
e mentirosa da completa regeneração do seu A sua paciência de jardineiro era absorvida,
neto, o estudante Guilherme de Araújo, entretanto, por uma idéia, que era um sonho:
quando o encontrei à porta da casa funerária, encontrar a rosa azul das legendas do Oriente,
à espera do seu automóvel. Abalado, ainda, de que tivera noticia, uma noite, ao ler os
pela emoção daquele instante, em que tivera poemas latinos dos velhos monges medievais.
de lançar mão de uma falsidade para Para isso, casava ele as sementes, os brotos,
perfumar o último sopro de uma vida de fundia os enxertos, combinando as terras, com
virtudes e sofrimentos, o antigo par do reino que as cobria, e as águas, com que as regava,
português aceitou um lugar no meu ―taxi‖, e esperando, ansioso, o aparecimento, no topo
confessou-me, em viagem: da haste, do sonhado botão azul! Ao fim de
setenta anos de experiências e sonhos, em que
- A mentira, meu amigo, é, às vezes, uma se lhe misturavam na imaginação as chagas
necessidade. Aquela de que me socorri há vermelhas de Cristo e as manchas celestes da
meia hora, para suavizar a morte de uma sua rosa encantada, surgiu, afinal, no
santa, de uma senhora cuja maior esperança coroamento de um galho de roseira, um botão
consistia no futuro de um neto que se azul, como o céu. Centenário e curvado, o
desgarrara do lar, era tão necessária como a velhinho não resistiu à emoção; adoeceu, e,
do prior da Cartuxa para alegrar a agonia conduzido à cela, ajoelhou-se diante do
daquele célebre monge do Bussaco. Crucificado, pedindo-lhe, entre soluços
pungentes, que, como prêmio à santidade da
Eu olhei, interrogativamente, o meu sua vida, não lhe cerrasse os olhos sem que eles
companheiro de viagem, e ele, percebendo a vissem, contentes, o desabrochar da sua rosa
ignorância, indagou, com admiração: azul.
- Não conhece, então, a lenda da rosa azul? Uma nova pausa, e o meu companheiro
tornou:
À minha afirmativa, que lhe pareceu estranha,
o comendador apoiou as mãos robustas no - Em volta do santo velhinho, no catre do
castão de ouro da bengala, e contou: mosteiro, todos choravam, compungidos. E foi,
então, que, divulgada de boca em boca, foi a
- No Mosteiro da Cartuxa, no Bussaco, em noticia ter a um convento das proximidades,
Portugal, vivia, em séculos que já se foram, um onde jazia, orando e sonhando, uma linda
piedoso e santo monge, cuja vida se consumia, infanta de Portugal. Moça e formosa, e, além
inteira, entre a oração e as rosas. Jardineiro da de formosa e moça, – fidalga e portuguesa,
alma e das flores, passava ele as manhãs de compreendeu a pequenina freira, no jardim
joelhos, no silencio da nave, aos pés de um do seu sonho, o valor daquela ilusão, e correu
Cristo crucificado, e as tardes, no pequeno à sua cela, consumindo toda uma noite a
jardim da ordem, curvado diante das roseiras, fazer, com os seus dedos de neve, uma viçosa
que ele próprio plantava e regava. flor de seda azul, que perfumou, ela própria,
com essência de gerânio. E no dia seguinte,
pela manhã, morria no seu catre, sorrindo
entre lágrimas de alegria, por ter nas mãos
10. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 5
tremulas, por um milagre do céu, a sua rosa - Feliz, meu amigo, aquele que morre, como
azul! esse monge e a marquesa, apertando nas
mãos a rosa, mesmo mentirosa, de uma roseira
O ―taxi‖ parava no meio-fio da calçada, o de que cuidou toda a vida.
comendador acrescentou, estendendo-me a
mão agradecida: Fonte:
Domínio Público
Nilton Manoel
Poesia Magica
(haicais)
1 7
Chove… Noite longa! Música na rua!
Insone faço barquinhos O caminhão passa e vejo
e a aurora não chega. meu fogão sem gás!
2 8
No céu estrelado, Menino de rua,
a bola redonda, agita, - dorme e sonha à porta da igreja -,
o dia das bruxas. sem família e escola.
3 9
É noite. Os barulhos Dois corpos inertes.
são tantos… e um pernilongo, Sangue escorrendo no chão!
deixa-me acordado. Há droga no crime?
4 10
Muro antigo, os bichos, Na estreita calçada,
movimentam-se, com medo o bípede e o quadrúpede,
de uma lagartixa. desfilam na corrente.
5 11
Famintos de espaço, Calça desbotada,
cupins, mudam de lugar, rasgada, cós baixo… é a moda!
nas tábuas da mesa, Quanta mulher linda!
6 12
Na cômoda antiga, Rua descalça:
um jornaleiro de louça! - o povo clama e reclama,
O guri se foi. e o prefeito? Viaja!
11. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 6
13 26
No escuro da rua, Um tiro no escuro.
alguém corre e agita a mão, A estrela sai de cartaz
ao táxi que passa. e a platéia chora.
14 27
Na grama verdinha Boteco de esquina,
a perereca faz cooper o pai ausente, acredita
e assusta a madame. que, a família, é chope.
15 28
No verão há menos Brisa leve. Velas
fofoqueiros que, no inverno.; aromáticas nos ares…
o sorvete acalma! Rituais diversos.
16 29
A ágil libélula, Na ausência da lua,
voa e sobrevoa, a fonte. namorados de esquina,
da praça da escola. se esquecem do mundo.
17
Na praça, a menina, 30
namora, entre belas flores. Na manhã de Sol,
É um buquê de sonhos! a libélula descansa,
18 num varal de roupas.
Em céu de bons ventos 31
e a meninada feliz, Campo Santo, a brisa
solta pipa e canta. da madrugada, clareia,
19 idéias macabras.
A mosca chateia, 32
o corpo suado do chapa, Delicia de vida!
na usina de açúcar. Quando há cravo e canela,
20 o arroz é doce.
Deitados na grama 33
da praça, um casal namora Cheia de cupins,
e, o Sol nem se foi. morre aos poucos, a figueira,
21 da praça sem nome.
Na fria manhã, 34
o entregador de jornal, Sopa quente… as letras
traz notícias de ontem. do macarrão, revelam-me
22 palavras e idéias.
Em banca de feira, 35
o preço do feijão jalo, A cigarra canta
vende mais arroz. na palmeira sem parar
23 e nem todos a ouve.
Friagem na rua, 36
sob a marquise, o homem só, No xaxim do alpendre,
põe jornais no tênis. a samambaia desfolha,
24 folhinhas no chão.
Na estreita calçada, 37
portões, folhagem, floreiras… Saudade: – mão única.;
pedestres, na rua! campas, estátuas, fantasmas.
25 Desfecho da vida.
Na coleta, o lixo, 38
nem pesa na mão sofrida, Na areia macia,
do rapaz cansado. a juventude faz festa,
com as ondas do mar.
12. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 7
39 52
Fogos de fim de ano Céus azuis. Planícies!
e, o poeta, cheio de versos, Cidades. Sonhos. Poder.
sonha com bonança. Quadros sociais.
40 53
Venta e chove forte , Sete de setembro.
vejo da vidraça, na rua, Independência ou morte. Sorte.
os ônibus lotados. Um bem-te-vi canta.
41 54
Real na pele, É carnaval. Festa
o rico chupa sorvete, do povo que sonha e sua
e o pobre gelinho.= em paz com alegria.
42 55
Natal! Luzes… lojas… Os flocos dengosos
Sonhos… Novas esperanças! do algodão caem no chão…
e o homem só, esmola! Tapetes plumosos.
43 56
Na falha da folha O poeta olha o céu,
da goiabeira, o sol crava, Sonha, sonha, sonha e sonha…
lâminas de luz. Desperta e escreve!
44 57
Máscaras, confetes, A inveja lateja
pelas ruas quanto samba! na alma abatida e sem calma.
Carnaval é festa! Espinhos daninhos.
45 58
O homem com a pá, Primavera, festa
cava a cova e guarda os restos. da natureza. A beleza
Com o fim vive a vida. está da alma da gente.
46 59
No xaxim de areia, Na mata, o perfume,
a robusta samambaia revela os mistérios lindos
quer dengo sem dengue. que a natureza tem.
47 60
Cantigas, bandeiras, Nos galhos secos,
batatas, quentões, fogueiras… as aves pintam a tarde,
é junho na roça. e o canto é saudade.
48 61
No fogão de lenha, Há uva na parreira
o gosto do bom café, e o néctar de cada cacho
tem casa de campo. tornam-me um eterno.
49 62
Chapéus de lã, ventos Na rua o homem só
de frente fria, caem não pesa na minha consciência.
folhas secas no chão. Virou postal.
50 63
A lua cheia e redonda, Saudade é a avenida
toma conta das estrelas.; dos que vão antes de mim!
e o poeta, versa. E eu vou pra onde.
51 64
Na folha branquinha, Na rua do empório,
consoantes e vogais, em dias de promoção,
ondeiam meus sonhos. o povo faz fila .
13. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 8
65 78
A velha senhora, Sentado no chão,
entra no mercado, na farmácia… o menino, sem destino,
Não ri nem chora. mastiga um filão.
66 79
O sapo coaxa, Lua baça, esfria!
no lago da fazenda, É frente fria na gente
em noite estrelada. e rua vazia.
67 80
Os campos se vão Como a vida é bela!
e as aves silvestres ficam, Fartura! Há arroz com mistura.
mais urbanizadas. Viva a mortadela.
68 81
No verde minguado Venta. É primavera.;
de aves e animais, os homens, perfume em todos os lares, lume
plantam mais cinzas… de nova quimera.
69 82
Escureceu e o campo No pé de abacate,
revela as luzes singelas o bem-te-vi canta bem…
de mil pirilampos. Um cachorro late.
70 83
Luzes estelares Queimada de cana!
de abril… sutil poesia Venta e a palha atormenta
em todos os lares. o fim de semana!
71 84
Na lã do chapéu Tarde sossegada,
De leve flocos de neve na rede, eu mato a sede
Invernam meu céu. com limonada.
72 85
Junho. A lua brilha. Em noite de vento
Na roça qualquer palhoça tem sempre o vulto de alguém
faz fogo e quadrilha. procurando alento.
73 86
Comédia medonha, A beira do rio
o salário do operário, verde e robusto o arbusto
não paga o que sonha. balança macio.
74 87
Tapete de flores, Rua longa, fria,
no chão a emoção muito pó… O homem vai só,
de perfuma em cores. sem lar, na agonia!
75 88
Na clara manhã Pobre e sem afeto,
canta um galo e numa planta nada de novo para o povo,
salta e salta a rã… sem terra e sem teto.
76 89
Na porta da firma, O mínimo vem!
por salário, o operário, O salário do operário,
faz greve e se afirma. faz sofrer? Amém!
77 90
Fim de tarde… o Sol Escura noite. O céu
movimenta-se e inventa estrelado me vê calado
as cores do arrebol. com sonhos ao léu.
14. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 9
91 faz formas no chão.
No sótão, guardados 99
dos antigos da família, Magro o gato persa,
dão vida aos cupins. no canto da sala, embala,
92 muita conversa.
Na rua devassa, 100
cenas constantes, obscenas, Sentadas no chão
assustam quem passa. crianças batem mansas
93 figuras com a mão.
Na quadra de esporte 101
a bola rola, rola e enrola, Chove forte e o rio
o atleta sem sorte. de baixa borda transborda.
94 e a vida num fio.
Férias escolares 102
nas noites de lua, a rua, Pula, corcoveia…
têm bolas nos ares. no embalo pára o cavalo
e o peão, na areia.
95 103
Folhas no chão. Flor branca e bela.
Grilos. Sombras. Espantalhos visão de impacto o cacto
mexem com a visão.; de minha janela.
96 104
Na gaiola, canta Rua molhada,
o canário e o hinário, a parada brusca de um fusca,
é encanto e vida traz confusão danada.
97 105
O grão de feijão, Balcão de perfumes.
descobre, na mesa do pobre, Rosa Maria, formosa,
que é ouro-tesouro. é meiguice e ciúmes.
98
Seca, mansamente, Fonte:
cai a folha e o vento lento Usina de Letras
15. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 10
Nilton Manoel
Trovas
1 e geme sem dor com ela!
Quem tem vida vive atento
pêlos caminhos que enfrenta; 9
brinda as farpas do momento Solteiro? – Querida! Ó vida
com chocolate e pimenta. de prazeres… sonhos tantos!
Casados? ? Os nós da lida,
2 cegam os reais encantos!?
O chifre em terra rachada
em bucolismo infernal, 10
é o adorno que traça a estrada No lirismo de meu povo
da carência de água e sal. sonho e tenho sempre fé
que num dia de sol novo
3 será plena a paz.. de pé!
Florestas? – Quero espigões!
e a fauna toda enjaulada! 11
… e a moda de altos portões, Enfim dono dos saberes
esconde a noite estrelada. da vida, em música e dança,
4 concluo que, o fim dos seres
Depois dos cinqüenta, creio, é o limite da esperança.
tudo é lucro e coerência;
homem que não faz rodeio, 12
sabe o que vale a existência. Corre-se tanto, mas tanto,
pelo pódio e sua glória
que, o enfim é o fúnebre pranto,
5 de um troféu ao fim da história!
Homem é o que sabe ser
companheiro, amigo e irmão; 13
Quem preza o Bem, sabe ter Quando há morte programada
da vida toda a emoção. pelos quadrantes da terra,
homens que não valem nada
6 sentem paz plantando guerra.
Meu pai, exemplo perfeito
de luta e vitalidade; 14
ao partir, por ser direito, Cavalgando sem rodeios
deixou sincera saudade. por galáxias estreladas,
o poeta, em seus anseios
7 tece trovas requintadas.
Quando o homem é Homem não chora,
enfrenta as farpas da vida,
vence a fauna hostil com a flora
tornando a estrada florida.
8 Nilton Manoel
O amante da Filomena,
se encontra o ex-marido dela,
treme tanto de dar pena…
N ilton Manoel Teixeira, capricorniano
de 3 de janeiro, nasceu em Ribeirão
Preto-SP, onde vive.
16. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 11
Professor e contabilista. Casa do Poeta e do Escritor de Ribeirão Preto (
Começou nos anos sessenta publicando fundador e 1º presidente),
seus textos no mimeógrafo à álcool e escrevendo Clube Internacional da Boa Leitura.
para jornais. Com apoio de Luiz Otávio Instituto Histórico e Geográfico de Uruguaiana.
(fundador da União Brasileira de Trovadores) Instituto Histórico e Geográfico do Distrito
implantou os Jogos Florais em sua cidade e como Federal.
presidente da secção ubeteana de Ribeirão Ordem dos Velhos Jornalistas.
Preto, realiza eventos locais e nacionais. The International Academy of Letters of England.
Na área da Literatura, esteve no União Brasileira de Escritores.
Conselho Municipal de Cultura, por três gestões. Usina de Letras etc.
Tem editados:-Trovas da Juventude;
Cantigas do meu terreiro; Caviar, gororoba e sal Tem o título de Magnífico Trovador pela
de frutas, Poesia Mágica (haicais) e folhetos de Ordem Brasileira dos Poetas da Literatura de
Cordel ao estilo tradicional. Cordel;
Pertence a: Mérito Cultural pelo Instituto Histórico e
Academia Anapolina de Filosofia, Ciências e Geográfico de Uruguaiana,
Letras. Medalha de Ouro, no I Aniversário do
Academia Brasileira de Trova. Clube dos Trovadores Capixabas,
Academia de Letras de Uruguaiana, Honra ao Mérito pela Ordem Brasileira
Academia de Letras Fronteira Sudoeste do Rio dos Poetas da Literatura de Cordel.
Grande do Sul. Mérito Cultural Pablo Neruda, em 2004
Academia Friburguense de Letras.
Academia Goianiense de Letras. No http://www.movimentodasartes.com.br/
Academia Internacional de Ciências assina a coluna Trovador
Humanísticas.
Academia Internacional de Heráldica e Fontes:
Genealogia. Usina das Letras
Portal CEN
Academia de Letras de Ribeirão Preto.
Academia Petropolitana de Poesia.
Academia Poços-caldense de Letras.
Academia Ribeirãopretana de Poesia.
Academia Santista de Letras.
Academia Virtual Brasileira de Letras.
J.B.Xavier
A Espera
Por sobre o banco onde eu estava
sentado, pendiam galhos de chorões que Muitos bons dias dei, muito acenei para
iam até o chão, mas ainda assim, por os passageiros que ansiavam por
entre essa maravilhosa prisão verde, eu liberdade, por fugir da clausura de horas
podia ver os ônibus que chegavam, e horas de viagens claustrofóbicas.
vindos de todos os Estados do país.
Sorri um riso amarelo, e acenei
Coloridos, eles se misturavam num claudicante para os sorrisos das crianças,
caleidoscópio maravilhoso de cores e filhos de migrantes que vinham tentar a
formas,num magnífico balé de titãs. sorte na cidade grande. Mas não tive
tempo de ficar triste, porque os galhos
Às seis horas da manhã lá estava eu, verdes, gentilmente manipulados pela
sentado num banco da pequena praça brisa da manhã, acariciaram meu rosto
que havia em frente à área de ternamente, alisaram meus cabelos e
desembarque do terminal rodoviário de farfalharam alegres, certamente gratos
uma das maiores cidades do país. pelo sol que surgia por trás dos edifícios,
17. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 12
numa promessa de um cálido banho de mim, restando apenas uma umidade em
vida. meus dedos, único sinal de que ela
existira e ensinara-me algo sobre a
Reflexos vívidos e faiscantes lascas de luz seqüência eterna dos ciclos.
transformavam as poças da chuva da
noite anterior em bateias repletas de Uma brisa mais ousada veio me dar seu
esfuziantes diamantes. bom dia e o galho estremeceu num
frenesi de prazer, feliz pela visita bem
Como garimpeiro cuidadoso, toquei vinda.
uma dessas jóias que pendiam frágeis na
ponta de uma delicada folhinha que Apenas por observar esse encontro
balouçava suavemente à minha frente. maravilhoso, fui ungido com a bênção de
ter sobre mim as lágrimas de felicidade
Gentilmente ela aceitou meu convite e, do orvalho remanescente. Então um
assim, de repente, eu tinha uma obra de grande e multicolorido ônibus surgiu
arte na ponta dos dedos. Olhei atônito entre os demais, e, numa janela
aquele universo minúsculo, aquela esfera ocasional senti, antes de ver, teu sorriso
perfeita, na qual Deus faz demonstrações maravilhoso e as doces promessas de
magistrais de engenharia celestial e pude amor que dele rescendiam.
ver seus espelhos refletindo o mundo ao
meu redor, como a lembrar-me de Olhei durante aquela pequena
minha própria pequenez diante da eternidade que durou tua chegada e
beleza universal. lembrando de Louis Armstrong, pensei
comigo mesmo:
Frágil, e com a certeza de já ter vivido o
suficiente para tocar-me a alma, a Que mundo maravilhoso!
pequenina gotícula chegou ao fim de Fonte:
sua eternidade e desfez-se diante de http://www.jbxavier.com.br/visualizar.php?idt=4572
Artur de Azevedo
A Ama-Seca
a mais leve infidelidade conjugal como
O
Romualdo, marido de D. de roubar o sino de São Francisco de
Eufêmia, era um rapaz sério, lá Paula; mas – vejam como o diabo as
isso era, e tão incapaz de cometer arma! Um dia D. Eufêmia foi chamada,
18. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 13
a toda a pressa, a Juiz de Fora, para ver
o pai que estava gravemente enfermo, e - Boa noite.
como o Romualdo não podia naquela
ocasião deixar a casa comercial de que - Como se chama?
era guarda-livros (estavam a dar
balanço), resignou-se a ver partir a - Antonieta.
senhora acompanhada pelos três
meninos, o Zeca, o Cazuza, o Bibi, e a - Pode dar-me uma palavra?
ama-seca deste último, que era ainda de
colo. - Por que não falou no bonde?
Foi a primeira vez que o Romualdo se - Era impossível… estava tanta gente… e
separou da família. Custou-lhe muito, estes elétricos são tão iluminados.
coitado, e mais lhe custou quando, ao
cabo de uma semana, D. Eufêmia lhe - Mas o sinhô bolinou que não foi graça!
escreveu, dizendo que o velho estava vamos, diga: que deseja?
livre de perigo, mas a convalescença
seria longa, e o seu dever de filha era - Desejo saber onde mora.
ficar junto dele um mês pelo menos.
- Não tenho casa minha; tou empregada
O Romualdo resignou-se. Que remédio!… numa famia ali mais adiente, por siná
que não stou satisfeita, e ando
Durante os primeiros tempos saía do procurando outra arrumação.
escritório e metia-se em casa, mas no fim
de alguns dias entendeu que devia dar - Onde poderemos falar em particular?
alguns passeios pelos arrabaldes, hoje
este, amanhã aquele. Era um meio, - Não sei.
como outro qualquer, de iludir a
saudade. - Você sai amanhã à noite?
Uma noite coube a vez ao Andaraí - Amanhã não, porque saí hoje, e não
Grande. O Romualdo tomou o bonde do quero abusá.
Leopoldo, e teve a fortuna ou a desgraça
de se sentar ao lado da mulatinha mais - Então, depois de amanhã?
dengosa e bonita que ainda tentou um
marido, cuja mulher estivesse em Juiz de - Pois sim.
Fora.
- Onde a espero?
Nessa noite fatal a virtude do Romualdo
deu em pantanas: tencionando ele ir até - Onde o sinhô quisé.
o fim da linha, como fazia todas as
noites, apeou-se na Rua Mariz e Barros, - Na Praça Tiradentes, no ponto dos
ali pelas alturas da Travessa de São bondes. As oito horas.
Salvador. A mulata havia se apeado
algumas braças antes. - Na porta do armazém do Derby?
E ele viu, à luz de um lampião, o vulto - Isso!
dela saltitante e esquivo, e apressou o
passo para apanhá-la, o que conseguiu - Tá dito! Inté depois d‘amanhã às oito
facilmente, porque, pelos modos, ela já hora.
contava com isso.
- Não falte!
- Boa noite!
19. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 14
- Não farto não! - Que homens sem-vergonha!… Não
podem ver uma mulata!…
No dia seguinte, o Romualdo contou a
sua aventura a um companheiro de O Romualdo perturbou-se, mas
escritório que era useiro e vezeiro nessas disfarçou, perguntando:
cavalarias… baixas, e o camarada levou
a condescendência ao ponto de confiar- - E agora? E preciso anunciar! Não
lhe a chave de um ninho que tinha podemos ficar sem ama-seca!
preparado adrede para os contrabandos
do amor. - Já mandei o Zeca pôr um anúncio no
Jornal do Brasil.
Antonieta foi pontual; à hora marcada
lá estava à porta do Derby, com ares de No dia seguinte, o Romualdo saiu muito
quem esperava o bonde. cedo; ao voltar para casa, a primeira
coisa que perguntou à senhora foi:
O Romualdo aproximou-se, fez um sinal,
afastou-se e ela seguiu-o… - Então? Já temos ama-seca?. .
Dez dias depois, estava ele - Já; é uma mulatinha bem jeitosa, mas
arrependidíssimo da sua conquista fácil, e tem cara de sapeca. Chama-se
com remorsos de haver enganado D. Antonieta.
Eufêmia, aquela santa! Procurava agora
meios e modos de se ver livre da mulata, - Hem? Antonieta?
cuja prosódia era capaz de lançar água
na fervura da mais violenta paixão. - Que tens, homem?
Vendo que não podia evitá-la, tomou o - Nada; não tenho nada… E jeitosa?…
Romualdo a deliberação de fugir-lhe, e Tem cara de sapeca?… Manda-a
uma noite deixou-a à porta do ninho, embora! Não serve! Nem quero vê-la!…
esperando debalde por ele. Lembrou-se,
mas era tarde, que havia prometido - Ora essa! Por quê? Olha, ela aí vem.
dar-lhe uni anel, justamente nessa noite.
Antonieta chegou, efetivamente, com o
- Diabo! pensou ele, Antonieta vai supor Bibi ao colo; mas o Romualdo tinha
que lhe fugi por causa do anel! fechado os olhos, dizendo consigo:
Voltou, afinal, D. Eufêmia de Juiz de - Que escândalo!… rebenta a bomba!…
Fora. Veio no trem da manhã, este diabo vai reclamar o anel!.
inesperadamente, e já não encontrou o
marido em casa. Mas como nada ouvisse, o mísero abriu
os olhos e – oh! milagre! – era outra
Estava furiosa, porque a ama-seca de Antonieta!.
Bibi deixara-se ficar na estação da
Barra. Podia ser que não fosse de Ele pensou, os leitores também pensaram
propósito. O mais certo, porém, era o ter que fosse a mesma; não era.
sido desencaminhada por um sujeito que
vinha no trem a namorá-la desde Decididamente, há um Deus para os
Paraíbuna. maridos que enganam as suas mulheres.
Quando D. Eufêmia contou isso ao Fonte:
Domínio Público
marido, acrescentou indignada:
20. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 15
Adelto Gonçalves
Cinco séculos de
poesia brasileira
I O primeiro volume da série, Antologia
da poesia barroca brasileira, traz poemas
Os professores de Literatura
Brasileira tanto do ensino médio
como do ensino universitário já não
de Gregório de Matos (1636-1696), Bento
Teixeira (c.1561-1600), Manuel Botelho de
Oliveira (1636-1711) e Sebastião da Rocha
precisam se preocupar tanto para Pita (1660-1738), selecionados por
elaborar seus planos de ensino nem Emerson Tin, doutorando em Literatura
consultar uma grande quantidade de Brasileira pela Unicamp, responsável
livros nem sempre disponíveis nas também pelo prefácio, por notas
bibliotecas de escolas ou mesmo de explicativas e de natureza literária,
universidades públicas ou privadas. Foi contextual e lexical e por uma pequena
pensando nisso que a Companhia notícia biográfica de cada autor que
Editora Nacional e a Lazuli Editora ajudam a tornar cada poema mais
decidiram editar uma série de cinco livros legível ao leitor pouco versado na
sobre a poesia brasileira desde a produção barroca luso-brasileira.
formação do País até o começo do século Não é preciso dizer que na produção
XX, entregando a tarefa a uma equipe poética do período a primazia é de
de jovens críticos e professores já com Gregório de Matos, o que levou o
experiência em sala de aula, todos organizador da antologia a selecionar 40
ligados à Universidade Estadual de de seus poemas. Seu contemporâneo
Campinas (Unicamp). Botelho de Oliveira aparece com 20
poemas, enquanto Rocha Pita,
O resultado é uma edição que merece consagrado autor da História da
toda a confiança do leitor e que permite América portuguesa, tem resgatada a
―pensar a história da poesia no Brasil e sua um tanto esquecida produção na
suas principais linhas de força, ao longo Academia Brasílica dos Esquecidos.
de cinco séculos‖, como assinala na Quem, porém, abre a antologia é Bento
apresentação do primeiro dos cinco Teixeira, conhecido especialmente pelo
volumes Paulo Franchetti, professor poema épico ―Prosopopéia‖, que tem
titular de Teoria Literária na Unicamp, como modelo ―Os Lusíadas‖, de Luís de
responsável também pela apresentação Camões (1524?-1580).
dos demais livros.
21. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 16
II a pouca modéstia, a biografia de Tomás
Antônio Gonzaga que este articulista
C om seleção e notas de Pablo
Simpson, o segundo volume da série,
Antologia da poesia árcade brasileira,
escreveu.
III
dedica os maiores espaços, como não
poderia deixar de ser, a Cláudio Manuel
da Costa (1729-1789) e Tomás Antônio J á Antologia da poesia romântica
brasileira, com seleção e notas de Pablo
Gonzaga (1744-1810), mas também Simpson, Pedro Marques e Cristiane
contempla parte da produção de Santa Escolastico Siniscalchi, é um volume mais
Rita Durão (1822?-1784), Domingos encorpado, em razão mesmo da
Caldas Barbosa (1738-1800), Basílio da necessidade de abranger maior número
Gama (1741-1795), Alvarenga Peixoto de autores. O período, a rigor, vai de
(1744-1793) e Silva Alvarenga (1749-1814). 1836, quando o poeta Gonçalves de
Magalhães (1811-1882) publicou um ensaio
Reúne o que de melhor produziu a na revista Niterói, editada em Paris,
poesia árcade e, de certo modo, ajuda-a lançando as idéias de um programa
a recuperar um lugar que nem sempre para a edificação de uma literatura
lhe foi reconhecido pela crítica, genuinamente brasileira, sob a influência
especialmente a da primeira metade do da natureza americana, até meados da
século XX, que viu com prevenção a segunda metade do século XIX. E
estilização e o apego de seus poetas a configura a presença do Romantismo em
cânones não só portugueses como terras brasileiras.
italianos, esquecendo-se de que, à época,
o Brasil não existia como nação Além do citado Gonçalves de Magalhães,
organizada e, na verdade, éramos todos o volume abrange autores díspares como
portugueses. Sousândrade (1832-1902), autor de ―O
Guesa Errante―, poema redescoberto
Como assinala Paulo Franchetti na pelos concretistas Augusto e Haroldo de
apresentação, o Arcadismo, embora não Campos (1929-2003) a partir da década
tenha recebido a fortuna crítica e a de 60 do século passado, e Gonçalves
recepção entusiasmada com que o Dias (1823-1864), autor da antológica
Barroco tem sido contemplado nos ―Canção do exílio‖ e de alguns dos mais
últimos anos, já pode ser visto de modo importantes poemas da lírica indianista
mais favorável. Além disso, o próprio brasileira.
movimento de constituição de
agremiações intelectuais, as famosas Reúne ainda Luís Gama (1830-1882), com
academias, diz o professor, ―parece mais suas sátiras aos comportamentos, tipos e
simpático, quando se considera que o uso situações de sua época, Bernardo
dos pseudônimos e a valorização do Guimarães (1825-1884), com sua poesia
talento como único requisito para erótica e, às vezes, até pornográfica,
admissão dos membros encenavam, na Álvares de Azevedo (1831-1952), com sua
sociedade estratificada do século XVIII, o fina e sepulcral poesia, Laurindo Rabelo
ideal de uma aristocracia de espírito e (1826-1864), com sua poesia satírica e
não de sangue‖. fescenina, Casimiro de Abreu (1839-1860),
com sua lírica de tons suaves, Castro
Para isso, muito contribuíram os recentes Alves (1847-1871), com seus versos
estudos de Jorge Ruedas de la Serna, grandiloqüentes em favor dos escravos,
Vania Pinheiro Chaves, Ivan Teixeira, Fagundes Varela (1841-1875), com seus
Alcir Pécora, Melânia Silva de Aguiar, poemas religiosos uns, amorosos outros,
Sérgio Alcides, Ronald Polito, Joaci de inspiração regional ou sertaneja,
Pereira Furtado, José Ramos Tinhorão, Juvenal Galeno (1836-1931), com seus
Luís André Nepomuceno e, se permitem versos francamente populares, e
22. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 17
Junqueira Freire (1832-1855), com seus que essa geração ocupou na sociedade
poemas de monge atormentado. de seu tempo que a ela se deve a criação
da Academia Brasileira de Letras, como
IV lembra Pedro Marques na sua
introdução.
C om seleção e notas de Pedro
Marques, Antologia da poesia
parnasiana brasileira apresenta poemas
Se muitas vezes os modernistas atacaram
sem medidas o parnasianismo, isso se deu
de 14 poetas, entre consagrados e outros por conta da necessidade que tinham de
menos conhecidos do grande público, oferecer alternativas para o que
mas não menos representativos do consideravam fórmulas gastas dos
parnasianismo. Entre os consagrados, parnasianos. Mas nunca deixaram de
estão Olavo Bilac (1865-1918) e Machado reconhecer a importância histórica do
de Assis (1839-1908), cuja produção como movimento.
poeta acabou abafada pelo êxito de
seus romances da última fase. Entre os V
menos afamados, estão Luís Delfino
(1834-1910), B.Lopes (1859-1916) e
Francisca Júlia (1870-1920), única mulher
entre os poetas reunidos.
C om seleção e notas da professora
Francine Ricieri, doutora em Teoria e
História Literária na área de Literatura
Brasileira pela Unicamp, Antologia da
Lembra Franchetti na apresentação que poesia simbolista e decadente brasileira
o parnasianismo, em seu grande reúne nove poetas de um movimento
momento, ocupou lugar proeminente que, ao não alcançar a repercussão do
em jornais, revistas, conferências públicas parnasianismo, agrupa nomes ainda
e saraus burgueses, atraindo grande pouco conhecidos do público. Diz a
público para a poesia, o que, aliás, nunca organizadora em aprofundado estudo
haveria de se repetir, guardadas as introdutório à guisa de prefácio que esses
devidas proporções no tempo. É de poetas, como jamais pretenderam servir
ressaltar ainda que, desde os primeiros à causa nacional, ―foram usualmente
tempos do Brasil independente, a representados como alienados,
literatura esteve comprometida com as desenraizados, fúteis, irracionalistas,
questões vitais da nação, tendo assumido incompreensíveis, colonizados‖.
a bandeira da causa abolicionista.
Seja como for, como observa Franchetti
Encerrada a questão da abolição da na apresentação, a poesia simbolista
escravatura — embora a situação dos reserva muitas surpresas ―e a leitura
ex-escravos nunca tenha efetivamente desta antologia por certo ajudará a
preocupado o governo e as classes reverter a idéia de desinteresse que se
dirigentes –, e estabelecida a República, colou à produção simbolista‖. Para que
desapareceram os grandes temas épicos. esta frase não fique aqui assim um tanto
Assim, a poesia refluiu a um exclusivo solta, é de lembrar que Franchetti, autor
cultivo artístico, calcado em movimentos de As aves que aqui gorjeiam — a poesia
europeus posteriores ao Romantismo. do Romantismo ao Simbolismo (Lisboa,
Cotovia, 2005), navega por estas águas
Embora fique clara a influência do com mão de mestre, como diria Massaud
movimento francês, os parnasianos Moisés.
brasileiros procuraram um caminho
próprio, o que explica o fato de terem Missal e Broquéis, publicados no Rio de
caído no gosto da população ou pelo Janeiro em 1893, por Cruz e Sousa (1861-
menos daquele público letrado que se 1898), teriam sido a primeira
interessava pelas coisas do espírito. Com manifestação em livro no Brasil do
certeza, tal foi a importância do lugar Simbolismo ou Decadentismo. Por isso,
23. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 18
além de peças de Cruz e Sousa, que Por isso, seria aceitável que alguns
abrem o volume, a organizadora especialistas viessem a questionar a sua
recolheu poemas de Alphonsus de exclusão, mas a verdade é que o estudo
Guimaraens (1870-1921), B.Lopes (1859- introdutório de Francine Ricieri é tão
1916), Eduardo Guimaraens (1892-1928), bem embasado e didático e suas
Maranhão Sobrinho (1879-1915), Pedro extensas notas de leitura tão
Kilkerry (1885-1917), Da Costa e Silva esclarecedoras que essa se torna uma
(1885-1950), Emiliano Perneta (1866-1921) tarefa extremamente difícil e ingrata.
e Alceu Wamosy (1895-1923). É de notar _______________________
que B.Lopes aparece aqui também Antologia da Poesia Barroca Brasileira,
porque sua poesia tanto tem traços 157 Págs., 2007
parnasianos como simbolistas. Antologia da Poesia Árcade Brasileira,
126 Págs., 2007
Desses, o mais visível nos dias de hoje é Antologia da Poesia Romântica
Da Costa e Silva, em razão do trabalho Brasileira, 286 Págs., 2007
de resgate de sua poesia encetado por Antologia da Poesia Parnasiana
seu filho, o poeta Alberto da Costa e Brasileira, 227 Págs., 2007
Silva, ex-presidente da Academia Antologia da Poesia Simbolista E
Brasileira de Letras, que tratou de Decadente Brasileira, 223 Págs., 2008
republicar a produção do pai, embora Apresentação De Paulo Franchetti. São
Alphonsus de Guimaraens e Emiliano Paulo: Companhia Editora
Perneta também sejam frequëntemente Nacional/Lazuli Editora.
lembrados em estudos acadêmicos. Site: http://www.editoranacional.com.br/
E-mail: editoras@ibep-nacional.com.br
Outro bem conhecido seria Augusto dos
Anjos (1884-1914), cuja poesia apresenta
recursos e temas relacionados à poesia
simbolista, mas a organizadora preferiu
deixá-lo de fora da antologia,
A delto Gonçalves é doutor em Literatura
Portuguesa pela Universidade de São Paulo
e autor de Gonzaga, um Poeta do
Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999),
argumentando que incluí-lo seria Barcelona Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada,
fornecer do poeta ―uma visão que não 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002) e Bocage
condiz com a linha peculiar e tão – o Perfil Perdido (Lisboa, Caminho, 2003). E-
mail: adelto@unisanta.br
característica em que sua poesia se
definiu‖. Até porque a produção de Fonte:
Augusto dos Anjos guarda igualmente Literatura sem fronteiras
traços parnasianos e até mesmo pré-
modernistas.
24. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 19
Trovas
Tema: Paciência
Ante as agruras da vida, no altar do seu coração…
que nos chegam com freqüência, ERCY MARIA MARQUES DE FARIA
a conduta mais contida BAURU/SP
é seguir com paciência. ―Quando a dor chega a seu lar
HÉLIO PEDRO SOUZA paciência é uma virtude
NATAL/RN que se deve cultivar
com amor em plenitude!‖
A Paciência é uma virtude SÔNIA DITZEL MARTELO
que, junto à perseverança, PONTA GROSSA/PR
de nós, afasta a inquietude,
e traz de volta a esperança! Quem pratica a paciência,
DELCY RODRIGUES CANALLES como virtude na vida
PORTO ALEGRE/ RS supera toda ciência
vence a mais perversa lida.
Só com paciência se alcança WILTON DI CARLI
o que se espera da vida. GUARULHOS/SP
Siga com mais esperança
a cada meta vencida! Paciência tem limite,
LEONILDA YVONNETI SPINA eu sempre pensei assim;
LONDRINA/PR embora não acredite,
nosso amor chegou ao fim.
Dá-me, Deus, com certa urgência, NEIVA FERNANDES
a graça que aqui rabisco: CAMPOS DOS GOYTACAZES/RJ
dez por cento da paciência
que puseste em São Francisco! A virtude da paciência
HUMBERTO RODRIGUES NETO nos traz equilíbrio e paz
PIRITUBA/SP ao evitar a imprudência
de uma atitude fugaz.
Motorista, paciência… ALFREDO BARBIERI
Calma lá, meu companheiro! TAUBATÉ/SP
Não se esqueça: competência
nem sempre é chegar primeiro! Um desafio na vida
ANTONIO AUGUSTO DE ASSIS é vencer tribulações
MARINGÁ/PR e a paciência nos convida
a refrear emoções.
Não há nada que se negue MARINA GOMES DE SOUZA VALENTE
ao homem manso e cortês: BRAGANÇA PAULISTA/SP
a paciência consegue
muito mais do que a altivez! Quando a dor desta existência
RENATA PACCOLA FRISCHKORN torna-se um fardo pesado,
SÃO PAULO/SP a Deus peço a Paciência
e na fé sigo amparado!
É na sua deficiência, MARIA EMÍLIA LEITÃO MEDEIROS REDI
que o cego, na escuridão, PIRACICABA/SP
acende a luz da paciência
25. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 20
Contra a grande violência outro amor manda endereço.
e a total insegurança, CLÊNIO BORGES
é melhor ter paciência PORTO ALEGRE/RS
e uma dose de esperança,
ILZE SOARES Diante de tanta violência,
SÃO PAULO/SP serena, medita e ora;
espera com paciência
Paciência teve Jó e vive no aqui e agora.
que tantas dores sofreu, ELISA SANTOS
perdeu tudo, ficou só PONTA GROSSA/PR
mas, sua fé não morreu.
MIFORI Se teu viver é exemplar,
MOGI DAS CRUZES/SP com paciência e união,
tua vida há de brilhar,
Tenha a calma de um regato, como uma bela lição!
da criança a inocência; ARLENE LIMA
você verá que, de fato, MARINGÁ/PR
a tudo vence a paciência.
ADAMO PASQUARELLI A paciência na dor
SÃO JOSÉ DOS CAMPOS/SP é virtude de alma forte.
Vislumbra tão grande Amor,
vai vencer até a morte.
Neste mundo em que vivemos, ELISA ALDERANI
de tanta pressa e aflição RIBEIRÃO PRETO/SP
que paciência nós temos
para ajudar um irmão?! Paciência!… Paciência!…
DIAMANTINO FERREIRA Oh meu Deus, me dá um pouco…
CAMPOS DOS GOYTACAZES/RJ Pois se dela, há carência,
fico agindo como um louco.
Loja de conveniência, RAQUEL DELVAJE
farmácia e lanchonete PIRACICABA/SP
ofereçam ―Paciência‖
em comprimido ou tablete. Houve pedras no caminho…
GISLENO FEITOSA Em que eu tanto tropecei,
TERESINA/PI com paciência e carinho,
na esperança confiei!
Todas as dores do mundo, CÉLIA APPARECIDA SILLI BARBOSA
tem uma causa, uma essência. RIBEIRÃO PRETO/SP
Mas, com fé e amor profundo,
Deus nos provê Paciência! Paciência é uma virtude
DILMA RIBEIRO SUERO que se tem, mas que se gasta
ESTÁCIO/RJ quando se toma a atitude
de, para alguém, dizer: – Basta!
Paciência é um preceito ANTÓNIO JOSÉ BARRADAS BARROSO
de quem tem fé, confiança, PORTUGAL
e acredita no conceito:
―Quem espera sempre alcança‖ Tanta era a sua pobreza
DECIO RODRIGUES LOPES com humildade e decência,
MOGI DAS CRUZES/SP que, faltando o pão na mesa,
lhe sobrava a paciência.
Tenha paciência, senhora, OLÍVIA ALVAREZ MIGUEZ BARROSO
na vida tem recomeço; PORTUGAL
quando um amor vai embora,
26. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 21
Que Deus me dê paciência MARIA JOSÉ FRAQUEZA
para sofrer esta dor FUZETA/OLHÃO/PORTUGAL
de ver que a inconsciência
mata e diz que é por amor! Se a paciência faltar
GISELA ALVES SINFRÓNIO nas penas, que hão-de ser luz…
OLHÃO/PORTUGAL Lembra Deus a carregar
por nós, o peso da Cruz!
Em teus braços meu amor CLARISSE BARATA SANCHES
me sinto plena e feliz, GÓIS/PORTUGAL
tua paciência é calor,
dá a minha vida matiz. Se na dor, por excelência,
NORA LANZIERI O amor é primordial…
BUENOS AIRES/ARGENTINA Há o sofrer, com paciência,
De quem sofre d‘algum mal!
Os avanços da ciência, FERNANDO REIS COSTA
por vezes vão devagar, COIMBRA/PORTUGAL
preciso ter paciência Um homem sem paciência,
para uma cura aguardar… nem na dor tira vantagem;
ACIOLINDA SPRANGER e vê na sua existência
LAGOS/PORTUGAL uma vida sem coragem!
JORGE A. G. VICENTE
Se diz não ter paciência SUIÇA
pra ler, da Bíblia, conselhos; No sofrimento e na dor
use da sua valência: rogo a Deus Sua clemência,
Fale com Deus, de joelhos… resarei com mais fervor,
MARIA DA CONCEIÇÃO CUSTÓDIO para me dar paciência…
SANCHES ANTÓNIO BOAVIDA PINHEIRO
GOIS/PORTUGAL LISBOA/PORTUGAL
Com positiva paciência Paciência é virtude
obra boa descortina, que no mundo pouco abunda;
te diz a minha consciência hoje em qualquer latitude
que sempre Deus ilumina. está quase moribunda.
JAMIL WILLIAM PISCOYA AYALA EUCLIDES CAVACO
FERREÑAFE/PERU CANADÁ
Para todo o sofrimento Fonte:
É preciso Paciência Projeto de Trovas Para Uma Vida Melhor (Resultados da 2a. Etapa)
Um olhar com sentimento
A quem vive na indigência.
27. Almanaque Literário ―O Voo da Gralha Azul‖ – numero 8 – set/out/nov 2011 22
Vicência Jaguaribe
Mas a vida...A vida não se
passa a limpo
A velha senhora entrou no escândalo dos futuros sogros, que não
compartimento que sempre lhe servira pretendia ter filhos. Seus pais não se
de biblioteca e de gabinete. Em um horrorizavam mais com suas opiniões e
tempo em que a maioria das mulheres se posições fora dos eixos, conforme diziam.
dedicava às tarefas domésticas, aos Ela fora assim desde pequena. Fazia
cuidados com os filhos e com o marido, tudo diferente das irmãs. Não obedecia
ela passava horas naquela sala lendo e ao horário convencional de dormir nem
escrevendo. Quando o noivo mandara de comer, nunca se adaptou às
construir a casa onde morariam depois imposições da escola, não gostava do
de casados, ela só fizera uma exigência: que as outras meninas de sua idade
um aposento onde pudesse guardar seus gostavam. Era um astro que
livros, onde pudesse isolar-se para ler e determinava sua própria rotação, não
escrever. Nem ao menos perguntara lhe importando se as leis da Física
quantos quartos ou quantos banheiros mandavam ir para a direita ou para a
teria a casa, nem quisera saber o esquerda. Diante do inexorável, os pais
tamanho da cozinha. A casa tinha tiveram que capitular.
quintal, ficava do lado da sombra ou do
sol? Disso ela não quisera saber. Não Ele, o marido, nunca reclamara de seus
desperdiçaria seu tempo com coisas desse desvios do eixo da rotina. Amara-a
tipo. incondicionalmente até o fim da vida.
Ela lhe davaa impressão de que estava
Puxou a cadeira do birô, sentou-se e sempre na expectativa de que algo
aproximou o porta-retrato com uma acontecesse. A si mesmo ele dizia que a
fotografia do dia do casamento: ela e o mulher vivia sempre de véspera; para
noivo... não, ela e o marido. Quando ela nunca chegava o dia D. Sabia que
tiraram aquela foto já eram marido e escrevia muito, mas nunca conseguira
mulher, fora logo depois da cerimônia. que ela lhe mostrasse – a ele ou a outra
Passou a mão sobre a imagem do pessoa – os textos que produzia. Quando
marido e recordou como ele fora entrava no gabinete e surpreendia-a
apaixonado por ela. Uma paixão que a escrevendo, pedia-lhe permissão para ler
rotina do casamento não conseguira o produto da vez. A resposta era sempre
esfriar. Diante do desinteresse dela pelos a mesma:
assuntos domésticos, das horas que
roubava da convivência com ele e com - Não, agora não. Ainda está no
os filhos para dedicar à leitura e à rascunho, quando passar a limpo, você o
composição de seus textos, sua paciência lerá.
era uma fonte inesgotável, que parecia
renovar-se todos os dias. E ele não insistia. Respeitava-a e
amava-a demais para forçá-la a fazer
Sabia não ter sido uma boa mãe. Não qualquer coisa que a deixasse
se enquadrava nos parâmetros que contrariada ou constrangida.
determinavam se uma mulher era uma
boa mãe. Nunca se entusiasmara com a A velha senhora levantou-se e passou
maternidade e não escondera isso do em revista as estantes com seus livros.
noivo. Chegara mesmo a dizer, para Diante dos seus preferidos, parava.