SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 6
Baixar para ler offline
3 Personagens Bobocas e um Cineasta Autoral Babaca
ARGUMENTO_continuação
Eles avistam ESTERIÓTIPOULOS e CHAVÃO
sentados, cabisbaixos e com aspecto degradante, como se
estivessem doentes, prestes a morrer. Tentam falar com
as personagens de Lindolfo, mas elas estão em uma
espécie de letargia que os impedem de perceber ao
menos que há alguém ali. Questionam se esse não seria o
estado natural daquelas criaturas em tal ambiente, mas se
surpreendem ao verem ACLICHÊ em outra condição, de
pé. AGATATRISTE pergunta o que está acontecendo com
CHAVÃO e ESTERIÓTIPOULOS, no que é informada pela
femme fatale que eles são personagens menos lembrados
na trama e por isso ficam como natimortos, já ela por ser
uma ​sex symbol é mais lembrada e por isso tem uma
espécie de “energia extra” que lhe dá uma maior
vitalidade. Terapeuta e roteirista ficam bastante curiosos
sobre tal situação, e começam a crer que aqueles são de
fato personagens de um autor, mas não personagens
qualquer, eles são – segundo explica ACLICHÊ,
personagens que existe na mente do autor e de pelo
menos mais alguém, o que permite virem para àquele
plano de vida pouco antes de tornarem-se realidade, a
partir da interpretação de um ator ou pelo menos o contar
de história de alguém para outra pessoa. A autora de
teledramaturgia encontra uma personagem familiar, uma
jovem menina, uma das suas primeiras criações, a
personagem protagonista de uma de suas primeiras
dramaturgias, que fora deixada de lado, e que agora ela a
reencontra ali, naquele mundo frio e branco, totalmente
mal cuidada, ela está suja, com um cabelão até os
joelhos, semelhante a Samara do filme de terror. Ela se
compadece da situação moribunda de sua personagem e
decide que irá ajudá-la, que irá trabalhar em sua historia
e fazê-la acontecer, que não irá desistir daquela ideia e
permitir que ela saia do limbo e venha a existir. Dito isso
a personagem melhora consideravelmente o seu aspecto,
conseguindo até esboçar um sorriso. AGATATRISTE volta
ao grupo e diz que sabe como ajudar as três personagens
de Lindolfo.
AGATATRISTE e RASPUTIN encontram Lindolfo
trabalhando no set de filmagem do filme de ADEVALDO.
Ele está bastante atarefado, com um pesado colete de
serviço cheio de bolsos, nas mãos uma claquete e uma
prancheta, orienta atores e técnicos ao mesmo tempo
enquanto recebe bronca de ADEVALDO. No intervalo a
roteirista consegue se aproximar do cineasta autoral e
explicar o motivo de sua visita. Lindolfo se recusa
veementemente a retornar a ideia de fazer o filme onde
estão as personagens bobocas que pediram ajuda a
AGATATRISTE, argumentando que toda pessoa deve
reconhecer suas limitações e aceitar aquilo que está mais
a mão. A roteirista está prestes a desistir que ele retome
seu projeto cinematográfico, mesmo mencionando que
não devemos jamais desistir de nossos sonhos e não se
submeter a condições tão degradantes para a alma como
é a situação dele onde seu rival ADEVALDO lhe humilha e
se aproveita de forma intensa de suas incapacidades...
mesmo assim ele insisti que não irá retornar jamais a
trabalhar naquela historia. Quando AGATATRISTE está
prestes a desistir o terapeuta começa a elogiar as
personagens do cineasta autoral, mencionando o quanto
eles são interessantes, mas que poderiam ficarem melhor
caso recebessem alguns ajustes. Os elogios deixam
Lindolfo envaidecido, as palavras são suficientes para que
o pseudo-cineasta se sinta mais aberto. Ele fica um bom
tempo refletindo… até que ADEVALDO lhe humilha mais
uma vez chamando-o para trabalhar, deixando Lindolfo
mordido e fazendo-o voltar ao trabalho e também
informar que estará livre à meia-noite.
Pela manhã ADEVALDO chega ao seu set de
filmagem e observa que Lindolfo já se encontra lá
orientando três atores que ele não conhece. Ao perguntar
onde está o resto da equipe Lindolfo informa que chegou
mais cedo para melhor orientar aqueles três figurantes,
que na verdade é ESTERIÓTIPOULOS, ACLICHÊ e
CHAVÃO. ADEVALDO elogia seu assistente e ao mesmo
tempo lhe ofende com uma piada sobre suas
incapacidades. Lindolfo engole seco a ofensa e volta a
trabalhar suas personagens que estão felizes por estarem
num set profissional, e ao som de “Tente Outra Vez” do
Raul Seixas o cineasta autoral irá colocar suas três
personagens em cena de uma maneira totalmente
atabalhoada, aproveitando brechas de atenção dos
técnicos, figurantes reais, produtores e atores para inserir
de forma sorrateira e rocambolesca suas personagens
imaginárias, que aparecem quase como que
fantasmagoricamente nas cenas, em segundo plano,
desfocados, atrás de cortinas, confundindo-se às vezes
com o cenário. Lindolfo balança a câmara num momento
de distração do operador, mexe nos objetos de cena e
afasta partes do cenário somente para tentar inserir no
filme os seus personagens “o mais natural possível”.
Na sala de edição/finalização o diretor rival chama Lindolfo
pra conversar sobre aqueles estranhos personagens que
aparecem sorrateiramente nas cenas. Antes mesmo de
ADEVALDO concluir seu sermão de quem é que manda ali,
ele é convencido por Lindolfo a manter aquelas aparições
sem lógica narrativa, sem pretexto e sem função
dramática alguma, munido de um discurso intelectualóide
sobre a cultura cinematográfica hermética nacional,
anti-Hollywood e dos cânones da narrativa convencional
emburrecedora eurocêntrica, estética da fome, etc.,
ludibriando e convencendo seu rival de tal maneira que a
presença daqueles seres que saíram da imaginação do
cineasta autoral direto para o filme alheio sem passar por
algum filtro é mantida e até reforçada na pós-produção.
Lindolfo feliz ao perceber como fora fácil passar a perna
no seu desafeto e ao mesmo tempo ficar livre daqueles
três personagens boboca que tanto lhe infernizava.
Ao sair do elevador Lindolfo dá de cara com suas três
personagens bobocas, tomando um baita susto. Ele tenta
mostrar que está atrasado para um compromisso, tenta
desviar, driblar aquelas suas figuras incômodas. Lindolfo
meio constrangido agradece o apreço e tenta se
desvencilhar, mas é impedido, agora por CHAVÃO, que lhe
entrega um presente. Ao abrir o embrulho Lindolfo ver o
roteiro que ele havia jogado no lixo no início do filme. Ele
se emociona e chega até esboçar um sorriso. Ao gaguejar
um “obrigado” é logo abraçado com entusiasmo pelos três
personagens que tentam passar carinho ao autor, mas
Lindolfo fica enojado com aquela demonstração explícita
de sentimentos, e vai embora.
O filme de ADEVALDO tá estreando em um
importante festival de cinema da capital. Na cerimônia de
premiação do festival Lindolfo comparece para se deliciar
com a desgraça que seu rival está prestes a passar, seja
com a falta de prêmios para o filme ou mesmo para as
vaias que ele receberá quando for mencionado. Mas o que
acontece é o contrário, o filme de ADEVALDO começa a
receber a maioria dos prêmios, e culmina ao receber o de
melhor diretor. Lindolfo está totalmente transtornado, de
boca-aberta e olhando para os lados perguntando aos
outros convidados se está havendo engano na distribuição
dos prêmios, pergunta quem fazia parte da comissão
julgadora e se haveria algum complô, teoria da
conspiração, etc… Quando ADEVALDO sobe ao palco para
receber o prêmio principal de melhor filme, Lindolfo
começa a deixar o recinto injuriado, mas antes de sair do
auditório ele é apontado por ADEVALDO como o principal
colaborador na feitura daquele filme tão “revolucionário”,
tão “inusitado”, cheio de personagens “enigmáticos”,
segundo a opinião dos jurados. Ele chama ao palco o
maior responsável pela aquela “inovação” narrativa na
linguagem cinematográfica, todos aplaudem um surpreso
LINDOLFO que vai ao microfone ovacionado.
No palco ele recebe do seu rival o prêmio de melhor
filme, deixando-o sem palavras. Ali Lindolfo reconhece
que quando você não desisti do seu sonho e leva a sua
ideia até as últimas consequências, não desistindo nunca,
você é sempre recompensado. Lindolfo menciona o quão
são privilegiados de fazerem cinema no Brasil e ainda
mais com dinheiro público, que se eles tivessem que tirar
do próprio bolso pra fazer aqueles filmes malucos jamais
sairiam do papel, e por isso são sortudos por terem esse
patrocínio do governo/povo para fazerem àquelas
sandices que ninguém entende mas segundo certo grupo
de pessoas é algo esplendoroso, cinema de autor,
inovação de linguagem, e outras encheções de linguiça.
Após mais aplausos de aclamação é a vez de Lindolfo
oferecer aquele prêmio para as pessoas mais importantes
para ele naquele auditório: as ideias criativas, as suas três
personagens bobocas… Num ponto distante do salão estão
as suas personagens na penumbra, por trás de uma
misteriosa nuvem de fumaça. Lindolfo desce do palco e
vai até suas ideias diferenciadas que ele abandonara mas
fora salvo por vontade de existir delas próprias. Ele
reconhece o esforço das três e admira tamanha coragem e
ousadia, e petulância, e capacidade de quebrar barreiras e
de finalmente se tornarem parte do imaginário de todos
nós, mesmo aparecendo de supetão no filme de outrem.
Lindolfo se aproxima lentamente passando pelas
mesas dos convidados com os olhos marejados com
tamanha emoção que nada lembra o sujeito frio e distante
da maior parte do filme, mas que agora está se
derretendo diante daquelas criaturas que são tiradas da
sombra e levada a luz e abraçadas pelo seu criador… é a
reconciliação definitiva do destrambelhado criador e suas
estabanadas criaturas.

Mais conteúdo relacionado

Mais procurados

Apresentação para décimo primeiro ano de 2012 3, aula 13-14
Apresentação para décimo primeiro ano de 2012 3, aula 13-14Apresentação para décimo primeiro ano de 2012 3, aula 13-14
Apresentação para décimo primeiro ano de 2012 3, aula 13-14luisprista
 
Charles G. Finney - As Sete Faces do Dr. Lao
Charles G. Finney - As Sete Faces do Dr. LaoCharles G. Finney - As Sete Faces do Dr. Lao
Charles G. Finney - As Sete Faces do Dr. LaoHerman Schmitz
 
O auto da barca do inferno de Gil Vicente
O auto da barca do inferno de Gil VicenteO auto da barca do inferno de Gil Vicente
O auto da barca do inferno de Gil VicenteOtivo Junior
 
Auto da barca do Inferno
Auto da barca do InfernoAuto da barca do Inferno
Auto da barca do InfernoMargarida Ramos
 
Simbologia das barcas
Simbologia das barcasSimbologia das barcas
Simbologia das barcasesomalucos
 
Auto da barca do inferno fidalgo-quest, interp. global31quest (blog9 10-11)
Auto da barca do inferno   fidalgo-quest, interp. global31quest (blog9 10-11)Auto da barca do inferno   fidalgo-quest, interp. global31quest (blog9 10-11)
Auto da barca do inferno fidalgo-quest, interp. global31quest (blog9 10-11)paulaoliveiraoliveir2
 
Resumos de português (3º teste)
Resumos de português (3º teste)Resumos de português (3º teste)
Resumos de português (3º teste)Ana Beatriz Neiva
 
Jornalismo literário formas de abertura
Jornalismo literário   formas de aberturaJornalismo literário   formas de abertura
Jornalismo literário formas de aberturaaulasdejornalismo
 
Querô romance peça espetáculo pdf 1
Querô romance peça espetáculo pdf 1Querô romance peça espetáculo pdf 1
Querô romance peça espetáculo pdf 1Adélia Nicolete
 
Cena do fidalgo (1) (1)
Cena do fidalgo (1) (1)Cena do fidalgo (1) (1)
Cena do fidalgo (1) (1)inesislinda
 
Alto da barca do inferno fidalgo
Alto da barca do inferno  fidalgoAlto da barca do inferno  fidalgo
Alto da barca do inferno fidalgowatilde
 
50669819 auto-da-barca-do-inferno-introducao ppt
50669819 auto-da-barca-do-inferno-introducao ppt50669819 auto-da-barca-do-inferno-introducao ppt
50669819 auto-da-barca-do-inferno-introducao pptpaulaoliveiraoliveir2
 
Análise de noite na taverna, de álvares de azevedo
Análise de noite na taverna, de álvares de azevedoAnálise de noite na taverna, de álvares de azevedo
Análise de noite na taverna, de álvares de azevedoma.no.el.ne.ves
 
Auto da barca do inferno
Auto da barca do infernoAuto da barca do inferno
Auto da barca do infernoSonia Ramos
 

Mais procurados (20)

Auto da Barca do Inferno
Auto da Barca do InfernoAuto da Barca do Inferno
Auto da Barca do Inferno
 
Auto da Barca do Inferno
Auto da Barca do InfernoAuto da Barca do Inferno
Auto da Barca do Inferno
 
Apresentação para décimo primeiro ano de 2012 3, aula 13-14
Apresentação para décimo primeiro ano de 2012 3, aula 13-14Apresentação para décimo primeiro ano de 2012 3, aula 13-14
Apresentação para décimo primeiro ano de 2012 3, aula 13-14
 
Charles G. Finney - As Sete Faces do Dr. Lao
Charles G. Finney - As Sete Faces do Dr. LaoCharles G. Finney - As Sete Faces do Dr. Lao
Charles G. Finney - As Sete Faces do Dr. Lao
 
O auto da barca do inferno de Gil Vicente
O auto da barca do inferno de Gil VicenteO auto da barca do inferno de Gil Vicente
O auto da barca do inferno de Gil Vicente
 
Auto da barca do Inferno
Auto da barca do InfernoAuto da barca do Inferno
Auto da barca do Inferno
 
Simbologia das barcas
Simbologia das barcasSimbologia das barcas
Simbologia das barcas
 
Auto da barca do inferno fidalgo-quest, interp. global31quest (blog9 10-11)
Auto da barca do inferno   fidalgo-quest, interp. global31quest (blog9 10-11)Auto da barca do inferno   fidalgo-quest, interp. global31quest (blog9 10-11)
Auto da barca do inferno fidalgo-quest, interp. global31quest (blog9 10-11)
 
Resumos de português (3º teste)
Resumos de português (3º teste)Resumos de português (3º teste)
Resumos de português (3º teste)
 
Jornalismo literário formas de abertura
Jornalismo literário   formas de aberturaJornalismo literário   formas de abertura
Jornalismo literário formas de abertura
 
Querô romance peça espetáculo pdf 1
Querô romance peça espetáculo pdf 1Querô romance peça espetáculo pdf 1
Querô romance peça espetáculo pdf 1
 
Cena do fidalgo (1) (1)
Cena do fidalgo (1) (1)Cena do fidalgo (1) (1)
Cena do fidalgo (1) (1)
 
Cena inicial
Cena inicialCena inicial
Cena inicial
 
Figuras de palavras
Figuras de palavrasFiguras de palavras
Figuras de palavras
 
Alto da barca do inferno fidalgo
Alto da barca do inferno  fidalgoAlto da barca do inferno  fidalgo
Alto da barca do inferno fidalgo
 
Abi analise em ppt
Abi analise em pptAbi analise em ppt
Abi analise em ppt
 
50669819 auto-da-barca-do-inferno-introducao ppt
50669819 auto-da-barca-do-inferno-introducao ppt50669819 auto-da-barca-do-inferno-introducao ppt
50669819 auto-da-barca-do-inferno-introducao ppt
 
Análise de noite na taverna, de álvares de azevedo
Análise de noite na taverna, de álvares de azevedoAnálise de noite na taverna, de álvares de azevedo
Análise de noite na taverna, de álvares de azevedo
 
Auto da barca do inferno
Auto da barca do infernoAuto da barca do inferno
Auto da barca do inferno
 
Controle mental coraline
Controle mental   coralineControle mental   coraline
Controle mental coraline
 

Semelhante a 3 personagens bobocas e um cineasta autoral babaca

Até que a Sorte nos Separe
Até que a Sorte nos SepareAté que a Sorte nos Separe
Até que a Sorte nos SepareLeticiaMM2018
 
RESENHA CRÍTICA DO FILME "ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA"
RESENHA CRÍTICA DO FILME "ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA"RESENHA CRÍTICA DO FILME "ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA"
RESENHA CRÍTICA DO FILME "ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA"eveelang
 
Fanzine de divulgação do Filme Febre do Rato
Fanzine de divulgação do Filme Febre do RatoFanzine de divulgação do Filme Febre do Rato
Fanzine de divulgação do Filme Febre do RatoAMEOPOEMA Editora
 
Análise Semiótica - O Labirinto do Fauno - Primeira e Última Cena
Análise Semiótica - O Labirinto do Fauno - Primeira e Última CenaAnálise Semiótica - O Labirinto do Fauno - Primeira e Última Cena
Análise Semiótica - O Labirinto do Fauno - Primeira e Última CenaDaniel Caldas
 
Especificidade do Texto Literário
Especificidade do Texto LiterárioEspecificidade do Texto Literário
Especificidade do Texto LiterárioJoselaine
 
Apresentação para décimo primeiro ano de 2015 6, aula 19-20
Apresentação para décimo primeiro ano de 2015 6, aula 19-20Apresentação para décimo primeiro ano de 2015 6, aula 19-20
Apresentação para décimo primeiro ano de 2015 6, aula 19-20luisprista
 
Apresentação para décimo ano de 2011 2, aula 47
Apresentação para décimo ano de 2011 2, aula 47Apresentação para décimo ano de 2011 2, aula 47
Apresentação para décimo ano de 2011 2, aula 47luisprista
 
Gênero Resenha.pptx
Gênero Resenha.pptxGênero Resenha.pptx
Gênero Resenha.pptxGustavoPaz34
 
Gênero Resenha.ppt
Gênero Resenha.pptGênero Resenha.ppt
Gênero Resenha.pptGustavo Paz
 
Roteiro 0006
Roteiro 0006Roteiro 0006
Roteiro 0006Bruno G.
 
Cinemadepiratininga
CinemadepiratiningaCinemadepiratininga
Cinemadepiratiningaguestd61629
 
Miro.baia.arte.da.expressao.teatro
Miro.baia.arte.da.expressao.teatroMiro.baia.arte.da.expressao.teatro
Miro.baia.arte.da.expressao.teatroAriane Mafra
 
Filme - Central do Brasil
Filme - Central do BrasilFilme - Central do Brasil
Filme - Central do BrasilNael.Passos
 
Indexação e resumo de filmes
Indexação e resumo de filmesIndexação e resumo de filmes
Indexação e resumo de filmesMarina Macambyra
 
Acre 018 julho, agosto, setembro de 2020 ebook
Acre 018 julho, agosto, setembro de 2020 ebookAcre 018 julho, agosto, setembro de 2020 ebook
Acre 018 julho, agosto, setembro de 2020 ebookAMEOPOEMA Editora
 

Semelhante a 3 personagens bobocas e um cineasta autoral babaca (20)

Aula de teatro
Aula de teatroAula de teatro
Aula de teatro
 
Até que a Sorte nos Separe
Até que a Sorte nos SepareAté que a Sorte nos Separe
Até que a Sorte nos Separe
 
RESENHA CRÍTICA DO FILME "ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA"
RESENHA CRÍTICA DO FILME "ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA"RESENHA CRÍTICA DO FILME "ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA"
RESENHA CRÍTICA DO FILME "ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA"
 
Fanzine de divulgação do Filme Febre do Rato
Fanzine de divulgação do Filme Febre do RatoFanzine de divulgação do Filme Febre do Rato
Fanzine de divulgação do Filme Febre do Rato
 
Análise Semiótica - O Labirinto do Fauno - Primeira e Última Cena
Análise Semiótica - O Labirinto do Fauno - Primeira e Última CenaAnálise Semiótica - O Labirinto do Fauno - Primeira e Última Cena
Análise Semiótica - O Labirinto do Fauno - Primeira e Última Cena
 
Teatro do oprimido
Teatro do oprimidoTeatro do oprimido
Teatro do oprimido
 
A crise de identidade
A crise de identidadeA crise de identidade
A crise de identidade
 
Especificidade do Texto Literário
Especificidade do Texto LiterárioEspecificidade do Texto Literário
Especificidade do Texto Literário
 
Apresentação para décimo primeiro ano de 2015 6, aula 19-20
Apresentação para décimo primeiro ano de 2015 6, aula 19-20Apresentação para décimo primeiro ano de 2015 6, aula 19-20
Apresentação para décimo primeiro ano de 2015 6, aula 19-20
 
Apresentação para décimo ano de 2011 2, aula 47
Apresentação para décimo ano de 2011 2, aula 47Apresentação para décimo ano de 2011 2, aula 47
Apresentação para décimo ano de 2011 2, aula 47
 
Gênero Resenha.pptx
Gênero Resenha.pptxGênero Resenha.pptx
Gênero Resenha.pptx
 
Gênero Resenha.ppt
Gênero Resenha.pptGênero Resenha.ppt
Gênero Resenha.ppt
 
Roteiro 0006
Roteiro 0006Roteiro 0006
Roteiro 0006
 
Filme nacional
Filme nacionalFilme nacional
Filme nacional
 
Morte e Recomeço
Morte e RecomeçoMorte e Recomeço
Morte e Recomeço
 
Cinemadepiratininga
CinemadepiratiningaCinemadepiratininga
Cinemadepiratininga
 
Miro.baia.arte.da.expressao.teatro
Miro.baia.arte.da.expressao.teatroMiro.baia.arte.da.expressao.teatro
Miro.baia.arte.da.expressao.teatro
 
Filme - Central do Brasil
Filme - Central do BrasilFilme - Central do Brasil
Filme - Central do Brasil
 
Indexação e resumo de filmes
Indexação e resumo de filmesIndexação e resumo de filmes
Indexação e resumo de filmes
 
Acre 018 julho, agosto, setembro de 2020 ebook
Acre 018 julho, agosto, setembro de 2020 ebookAcre 018 julho, agosto, setembro de 2020 ebook
Acre 018 julho, agosto, setembro de 2020 ebook
 

3 personagens bobocas e um cineasta autoral babaca

  • 1. 3 Personagens Bobocas e um Cineasta Autoral Babaca ARGUMENTO_continuação Eles avistam ESTERIÓTIPOULOS e CHAVÃO sentados, cabisbaixos e com aspecto degradante, como se estivessem doentes, prestes a morrer. Tentam falar com as personagens de Lindolfo, mas elas estão em uma espécie de letargia que os impedem de perceber ao menos que há alguém ali. Questionam se esse não seria o estado natural daquelas criaturas em tal ambiente, mas se surpreendem ao verem ACLICHÊ em outra condição, de pé. AGATATRISTE pergunta o que está acontecendo com CHAVÃO e ESTERIÓTIPOULOS, no que é informada pela femme fatale que eles são personagens menos lembrados na trama e por isso ficam como natimortos, já ela por ser uma ​sex symbol é mais lembrada e por isso tem uma espécie de “energia extra” que lhe dá uma maior vitalidade. Terapeuta e roteirista ficam bastante curiosos sobre tal situação, e começam a crer que aqueles são de fato personagens de um autor, mas não personagens qualquer, eles são – segundo explica ACLICHÊ, personagens que existe na mente do autor e de pelo menos mais alguém, o que permite virem para àquele plano de vida pouco antes de tornarem-se realidade, a partir da interpretação de um ator ou pelo menos o contar de história de alguém para outra pessoa. A autora de teledramaturgia encontra uma personagem familiar, uma jovem menina, uma das suas primeiras criações, a personagem protagonista de uma de suas primeiras dramaturgias, que fora deixada de lado, e que agora ela a reencontra ali, naquele mundo frio e branco, totalmente mal cuidada, ela está suja, com um cabelão até os joelhos, semelhante a Samara do filme de terror. Ela se compadece da situação moribunda de sua personagem e
  • 2. decide que irá ajudá-la, que irá trabalhar em sua historia e fazê-la acontecer, que não irá desistir daquela ideia e permitir que ela saia do limbo e venha a existir. Dito isso a personagem melhora consideravelmente o seu aspecto, conseguindo até esboçar um sorriso. AGATATRISTE volta ao grupo e diz que sabe como ajudar as três personagens de Lindolfo. AGATATRISTE e RASPUTIN encontram Lindolfo trabalhando no set de filmagem do filme de ADEVALDO. Ele está bastante atarefado, com um pesado colete de serviço cheio de bolsos, nas mãos uma claquete e uma prancheta, orienta atores e técnicos ao mesmo tempo enquanto recebe bronca de ADEVALDO. No intervalo a roteirista consegue se aproximar do cineasta autoral e explicar o motivo de sua visita. Lindolfo se recusa veementemente a retornar a ideia de fazer o filme onde estão as personagens bobocas que pediram ajuda a AGATATRISTE, argumentando que toda pessoa deve reconhecer suas limitações e aceitar aquilo que está mais a mão. A roteirista está prestes a desistir que ele retome seu projeto cinematográfico, mesmo mencionando que não devemos jamais desistir de nossos sonhos e não se submeter a condições tão degradantes para a alma como é a situação dele onde seu rival ADEVALDO lhe humilha e se aproveita de forma intensa de suas incapacidades... mesmo assim ele insisti que não irá retornar jamais a trabalhar naquela historia. Quando AGATATRISTE está prestes a desistir o terapeuta começa a elogiar as personagens do cineasta autoral, mencionando o quanto eles são interessantes, mas que poderiam ficarem melhor caso recebessem alguns ajustes. Os elogios deixam Lindolfo envaidecido, as palavras são suficientes para que o pseudo-cineasta se sinta mais aberto. Ele fica um bom tempo refletindo… até que ADEVALDO lhe humilha mais
  • 3. uma vez chamando-o para trabalhar, deixando Lindolfo mordido e fazendo-o voltar ao trabalho e também informar que estará livre à meia-noite. Pela manhã ADEVALDO chega ao seu set de filmagem e observa que Lindolfo já se encontra lá orientando três atores que ele não conhece. Ao perguntar onde está o resto da equipe Lindolfo informa que chegou mais cedo para melhor orientar aqueles três figurantes, que na verdade é ESTERIÓTIPOULOS, ACLICHÊ e CHAVÃO. ADEVALDO elogia seu assistente e ao mesmo tempo lhe ofende com uma piada sobre suas incapacidades. Lindolfo engole seco a ofensa e volta a trabalhar suas personagens que estão felizes por estarem num set profissional, e ao som de “Tente Outra Vez” do Raul Seixas o cineasta autoral irá colocar suas três personagens em cena de uma maneira totalmente atabalhoada, aproveitando brechas de atenção dos técnicos, figurantes reais, produtores e atores para inserir de forma sorrateira e rocambolesca suas personagens imaginárias, que aparecem quase como que fantasmagoricamente nas cenas, em segundo plano, desfocados, atrás de cortinas, confundindo-se às vezes com o cenário. Lindolfo balança a câmara num momento de distração do operador, mexe nos objetos de cena e afasta partes do cenário somente para tentar inserir no filme os seus personagens “o mais natural possível”. Na sala de edição/finalização o diretor rival chama Lindolfo pra conversar sobre aqueles estranhos personagens que aparecem sorrateiramente nas cenas. Antes mesmo de ADEVALDO concluir seu sermão de quem é que manda ali, ele é convencido por Lindolfo a manter aquelas aparições sem lógica narrativa, sem pretexto e sem função dramática alguma, munido de um discurso intelectualóide sobre a cultura cinematográfica hermética nacional,
  • 4. anti-Hollywood e dos cânones da narrativa convencional emburrecedora eurocêntrica, estética da fome, etc., ludibriando e convencendo seu rival de tal maneira que a presença daqueles seres que saíram da imaginação do cineasta autoral direto para o filme alheio sem passar por algum filtro é mantida e até reforçada na pós-produção. Lindolfo feliz ao perceber como fora fácil passar a perna no seu desafeto e ao mesmo tempo ficar livre daqueles três personagens boboca que tanto lhe infernizava. Ao sair do elevador Lindolfo dá de cara com suas três personagens bobocas, tomando um baita susto. Ele tenta mostrar que está atrasado para um compromisso, tenta desviar, driblar aquelas suas figuras incômodas. Lindolfo meio constrangido agradece o apreço e tenta se desvencilhar, mas é impedido, agora por CHAVÃO, que lhe entrega um presente. Ao abrir o embrulho Lindolfo ver o roteiro que ele havia jogado no lixo no início do filme. Ele se emociona e chega até esboçar um sorriso. Ao gaguejar um “obrigado” é logo abraçado com entusiasmo pelos três personagens que tentam passar carinho ao autor, mas Lindolfo fica enojado com aquela demonstração explícita de sentimentos, e vai embora. O filme de ADEVALDO tá estreando em um importante festival de cinema da capital. Na cerimônia de premiação do festival Lindolfo comparece para se deliciar com a desgraça que seu rival está prestes a passar, seja com a falta de prêmios para o filme ou mesmo para as vaias que ele receberá quando for mencionado. Mas o que acontece é o contrário, o filme de ADEVALDO começa a receber a maioria dos prêmios, e culmina ao receber o de melhor diretor. Lindolfo está totalmente transtornado, de boca-aberta e olhando para os lados perguntando aos outros convidados se está havendo engano na distribuição dos prêmios, pergunta quem fazia parte da comissão
  • 5. julgadora e se haveria algum complô, teoria da conspiração, etc… Quando ADEVALDO sobe ao palco para receber o prêmio principal de melhor filme, Lindolfo começa a deixar o recinto injuriado, mas antes de sair do auditório ele é apontado por ADEVALDO como o principal colaborador na feitura daquele filme tão “revolucionário”, tão “inusitado”, cheio de personagens “enigmáticos”, segundo a opinião dos jurados. Ele chama ao palco o maior responsável pela aquela “inovação” narrativa na linguagem cinematográfica, todos aplaudem um surpreso LINDOLFO que vai ao microfone ovacionado. No palco ele recebe do seu rival o prêmio de melhor filme, deixando-o sem palavras. Ali Lindolfo reconhece que quando você não desisti do seu sonho e leva a sua ideia até as últimas consequências, não desistindo nunca, você é sempre recompensado. Lindolfo menciona o quão são privilegiados de fazerem cinema no Brasil e ainda mais com dinheiro público, que se eles tivessem que tirar do próprio bolso pra fazer aqueles filmes malucos jamais sairiam do papel, e por isso são sortudos por terem esse patrocínio do governo/povo para fazerem àquelas sandices que ninguém entende mas segundo certo grupo de pessoas é algo esplendoroso, cinema de autor, inovação de linguagem, e outras encheções de linguiça. Após mais aplausos de aclamação é a vez de Lindolfo oferecer aquele prêmio para as pessoas mais importantes para ele naquele auditório: as ideias criativas, as suas três personagens bobocas… Num ponto distante do salão estão as suas personagens na penumbra, por trás de uma misteriosa nuvem de fumaça. Lindolfo desce do palco e vai até suas ideias diferenciadas que ele abandonara mas fora salvo por vontade de existir delas próprias. Ele reconhece o esforço das três e admira tamanha coragem e ousadia, e petulância, e capacidade de quebrar barreiras e
  • 6. de finalmente se tornarem parte do imaginário de todos nós, mesmo aparecendo de supetão no filme de outrem. Lindolfo se aproxima lentamente passando pelas mesas dos convidados com os olhos marejados com tamanha emoção que nada lembra o sujeito frio e distante da maior parte do filme, mas que agora está se derretendo diante daquelas criaturas que são tiradas da sombra e levada a luz e abraçadas pelo seu criador… é a reconciliação definitiva do destrambelhado criador e suas estabanadas criaturas.