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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS
Organizadores
Adne Abbud Righi
Aline Tiemi Matsumura
Aline Siqueira Nunes
Beatriz Nogueira Torrano da Silva
Carlos Eduardo Amancio
Cintia Iha
Emmanuelle da Silva Costa
Janaína Morimoto Meyer
José Hernandes Lopes Filho
Kleber Alves Gomes
Leonardo Hamachi
Professor Responsável
Cláudia Maria Furlan
Autores
Adne Abbud Righi
Alejandra Matiz Lopez
Alice Nagai
Aline Tiemi Matsumura
Aline Siqueira Nunes
Andrés Ochoa C. Edgar
Augusto César de Barros Tomba
Beatriz Nogueira Torrano da Silva
Bruna Silvestroni Pimentel
Carmen Eusebia Palacios Jara
Carlos Eduardo Amancio
Carolina Angélica Araujo de Azevedo
Carolina Krebs Kleingesinds
Carolina Lopes Bastos
Cintia Iha
Emmanuelle da Silva Costa
Fabio Nauer da Silva
Fernanda Mendes de Rezende
Giuliano Maselli Locosselli
Guilherme Marcello Queiroga Cruz
Janaína Morimoto Meyer
Janaína Pires Santos
Jenifer de Carvalho Lopes
José Hernandes Lopes Filho
Jonas Weissmann Gaiarsa
Juliana Hanna Leite El Ottra
Keyla Rodrigues
Kleber Alves Gomes
Leonardo Hamachi
Lucas Macedo Felix
Luiza Teixeira-Costa
Mariane Souza Baena
Mariana Crotti Franco
Natália Ravanelli
Paula Natália Pereira
Paulo Tamaso Mioto
Paulo Marcelo Rayner Oliveira
Rafael Cruz
Sarah Aparecida Soares
Vitor Barão
São Paulo
2012
Botânica no Inverno 2012 / Org. de Adne Abbud Righi...[et al.]. – São
Paulo : Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, 2012.
183 p. : il.
ISBN 978-85-85658-29-8
1. Botânica. 2. Extensão. 3. Pós-Graduação. I. Righi, Adne Abbud.
II. Título.
Índice
Índice...............................................................................................................................i
Apresentação.................................................................................................................iii
1
Estrutura e Desenvolvimento.............................................................................................1
Estrutura e desenvolvimento da raiz..............................................................................3
O Caule: um enfoque na atividade cambial.................................................................11
Folha: desenvolvimento, estrutura e função................................................................23
Estruturas reprodutivas em angiospermas..................................................................43
Fitormônios no desenvolvimento vegetal.....................................................................55
Metabolismo Secundário..............................................................................................57
2
Diversidade e Evolução....................................................................................................65
Interações Planta-Ambiente.........................................................................................67
Interação Planta-Planta................................................................................................77
Plantas Parasitas..........................................................................................................83
A origem do cloroplasto e a evolução dos eucariontes fotossintetizantes..................89
Biodiversidade e Ecologia de Macroalgas Marinhas Brasileiras.................................97
Estratégias de defesa antioxidantes em macroalgas................................................105
O trabalho na taxonomia vegetal e seus principais métodos.....................................111
3
Recursos.........................................................................................................................117
Estrutura genômica, sequenciamento e elementos de transposição........................119
Biomassa como Fonte de Energia: Biocombustíveis.................................................127
Bioinformática.............................................................................................................133
Organismos Geneticamente Modificados no contexto da Botânica..........................139
Organismos geneticamente codificados e a cultura de tecidos.................................147
Biologia Sintética........................................................................................................155
Plantas e Sociedade...................................................................................................159
Ficocolóides: Polissacarídeos das algas marinhas...................................................169
i
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
ii
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Apresentação
O Departamento de Botânica do Instituto de Biociências da Universidade de São
Paulo (IB-USP) é cenário de constante aprendizado, troca de conhecimentos, fluxo intenso
de alunos de graduação e pós-graduação e muitas, muitas histórias!!! Desde professores
eternizados em nomes de plantas aos recém-contratados (que já começam a deixar seus
vestígios pelos andares), todos, em uníssono aos alunos de pós-graduação, buscam contribuir
para o desenvolvimento cada vez maior da nossa segunda casa! E por que não tornar nossa
casa mais acolhedora nos gélidos dias de inverno da capital paulista? E por que não alunos
de pós-graduação tornarem-se “professores” e “orientadores” por 15 dias apresentando as
diversas linhas de pesquisas desenvolvidas ao longo de tantos anos? Assim começou um
curso de extensão universitária do departamento: ‘Botânica no Inverno’.
Na primeira edição do curso a iniciativa dos alunos de pós-graduação logo teve apoio
unânime dos docentes do departamento de Botânica, bem como do então diretor do IB-USP,
Prof. Dr. Wellington Braz Carvalho Delitti. O empenho de todos (professores e alunos)
durante a primeira edição foi tamanha que culminou em enorme sucesso! Neste ano de 2012
contamos com apoio de toda equipe do IB, o atual diretor Prof. Dr. Carlos E. F. da Rocha, o
coordenador da pós-graduação Prof. Dr. Renato de Mello-Silva, a chefe do departamento
Profa. Dra. Marie-Anne Van Sluys, bem como dos demais docentes, funcionários e discentes.
O resultado deste entrosamento de sucesso extrapolou as vagas oferecidas. Contamos com
449 inscritos de quase todo território nacional!!! E também alcançamos outros países da
América Latina!!
Além de promover o contato dos alunos de graduação e recém-graduados com
laboratórios e linhas de pesquisa do Departamento de Botânica IB- USP, o curso busca
revisar, com os alunos de graduação e recém-graduados, conceitos fundamentais de
Anatomia Vegetal, Sistemática e Taxonomia, Fisiologia Vegetal, Ficologia, Biologia
Molecular, Biologia Celular e Fitoquímica, e ressaltar as intercomunicações de cada sub-
área! E, finalmente, o “Botânica no Inverno” é uma tentativa de auxiliar futuros acadêmicos
e interessados na área a elaborar perguntas científicas relevantes nos diversos campos da
Botânica, tendo em mente sua aplicação em pesquisa científica de base ou aplicada.
Desejamos a todos um excelente aproveitamento do curso e seus desdobramentos!!!
Comissão Organizadora do II Botânica no Inverno
iii
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Estrutura e Desenvolvimento
1
Estrutura e
Desenvolvimento
1
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Estrutura e desenvolvimento da raiz
Estrutura e desenvolvimento da raiz
Aline Tiemi Matsumura
Paulo Marcelo Rayner Oliveira
Na condição de organismos sésseis, os vegetais apresentam limitações nos
mecanismos de fuga, na capacidade de luta, na aquisição de recursos hídricos e nutrientes,
além de outras condições adversas impostas pelo ambiente circundante. Dentre estas
condições destacam-se os fatores nutricional e hídrico. Em geral as plantas retiram grande
parte dos nutrientes do solo, assim como a água.
Em grande parte das plantas, a principal região responsável pela absorção de água e
nutrientes é o sistema radicular. Ele também é responsável pelo armazenamento e condução
destes, além de ter como função a fixação da planta em seu substrato. Entretanto, cabe
ressaltar que, dependendo da espécie, bem como seu habitat, a raiz pode perder parte de suas
funções ou adquirir novas. Podemos citar como exemplo as plantas epífitas (como diversos
membros da família Bromelliaceae), as quais possuem um sistema radicular rudimentar que
confere apenas sustentação, sendo assim toda parte de absorção de água e nutrientes
realizada por outros órgãos como folhas e caule. Em alguns casos extremos como no caso de
algumas orchidaceaes, a parte aérea da planta é reduzida a tal ponto que as raízes são as
responsáveis pela fotossíntese.
O crescimento e desenvolvimento do sistema radicular pode sofrer influência de
vários estímulos ambientais tais como a gravidade, luz, umidade, nutrientes, temperatura e
resistência física do solo. Dessa forma, a planta deve apresentar características que lhe
permitam adaptar-se às condições ambientais impostas, garantindo o máximo de vantagem
para seu crescimento e desenvolvimento. Desde o estudo pioneiro de Darwin (1880), estudos
fisiológicos e anatômicos acerca do comportamento da raiz modulados por estímulos físicos
vêm sendo realizados.
É fato que nas plantas praticamente todos os eventos relacionados ao crescimento e
desenvolvimento são regulados por pequenas moléculas orgânicas coletivamente
denominadas fitormônios, sendo os principais as auxinas, citocininas, giberelinas, ácido
abscísico e o etileno. Ao contrario dos animais, não existem nas plantas órgãos
especializados para a biossíntese hormonal, embora possam existir diferenças na capacidade
biossintética de cada órgão. Os efeitos dessas moléculas podem ser altamente complexos,
pois uma única célula pode responder a vários hormônios simultaneamente e um único
hormônio pode atuar em vários tipos de tecido.
Desenvolvimento do sistema radicular
A raiz é um órgão que tem sua formação ainda no estágio embrionário da planta. Esta
raiz embrionária é chamada de radícula, que surge através da diferenciação celular que
origina o eixo hipocótilo/radícula. Após a germinação e a emergência da radícula, tem início
o desenvolvimento e o crescimento do órgão.
A raiz pode ser dividida em três partes: a zona meristemática, zona de alongamento e
zona de maturação. A origem destes tecidos está em um grupo de células localizados no
meristema apical da raiz, denominado centro quiescente – região com células de baixa taxa
mitótica – que é circundado por uma camada de células que apresentam altas taxas de
3
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
1. Estrutura e Desenvolvimento
divisões mitóticas. Acima deste grupo de células inicia-se a diferenciação nos diferentes
tecidos da raiz de acordo com sua posição. Abaixo do centro quiescente forma-se a coifa, um
tecido de consistência mucilaginosa com função de proteção do meristema apical radicular.
A zona meristemática é a região responsável pelo crescimento do órgão. É constituída
pela protoderme, meristema fundamental e procâmbio, que dão origem, respectivamente, à
epiderme, córtex e ao cilindro vascular.
A epiderme é o tecido de revestimento da raiz. Acima da zona de divisão celular
(quando o xilema se encontra parcialmente maduro) ocorre a expansão das células
epidérmicas em pelos radiculares, que aumentam a superfície de contato otimizando a
absorção.
O córtex origina a exoderme (abaixo da epiderme) e a endoderme (camada mais
interna), esta última apresentando uma faixa de suberina denominada estria de Caspary,
responsável por impedir a passagem de água e solutos entre as células. Tanto a epiderme
quanto o córtex são perdidos em plantas que apresentam crescimento secundário.
No cilindro vascular o tecido mais externo é o periciclo, de onde se originam as
raízes laterais. A maturação tanto do xilema quanto do floema é centrípeta. O xilema forma
projeções em direção ao periciclo (protoxilema) e diferencia-se em metaxilema no centro. Os
polos de protoxilema se revezam na extremidade com o protofloema. Em alguns casos,
quando o xilema não se diferencia no centro este é ocupado pela medula (tecido
meristemático).
Figura 1 - Esquema geral dos tecidos da raiz primária. Ao lado direito esquema simplificado de um corte
transversal na zona meristemática (abaixo) e após a maturação dos tecidos vasculares (acima).
Sabe-se que o crescimento radicular deriva-se de dois eventos primários básicos: de
um lado as divisões das celulares meristemáticas apicais, e de outro pelo processo de
4
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Estrutura e desenvolvimento da raiz
alongamento das células filhas. No nível físico das células o alongamento celular é
direcionado pela interação entre a turgescência e a expansão da parede celular, evento este
mediado pelo hormônio auxina.
A auxina é tida como hormônio do crescimento, por ser uma das suas principais
funções. Na raiz, sua atuação pode variar de acordo com o local em questão. Na região
apical, a auxina atua no controle do processo de divisão das células que circundam o centro
quiescente e na diferenciação celular. No entanto na zona de alongamento, como o próprio
nome sugere, a auxina desempenha o seu papel principal que é promover o alongamento das
células.
Além disso, a auxina participa na organogênese. No sistema radicular este hormônio
promove a iniciação das raízes laterais. Este processo ocorre a partir do transporte polar de
forma basípeta deste hormônio, ou seja, da parte aérea para a parte radicular. Este transporte
é feito através de transportadores que promovem dois eventos, o influxo e o efluxo. O
influxo de auxina é mediado por proteínas denominadas AUX/LAX, enquanto que o efluxo é
mediado por proteínas denominadas PIN. Sabe-se que a auxina induz a síntese de um outro
hormônio chamado etileno, que se apresenta na forma de gás. Em virtude do transporte polar
da auxina, ocorre um aumento no gradiente de deste hormônio, induzindo por sua vez a
síntese de etileno. Isto gera um acúmulo de etileno na região próxima ao meristema. Por
consequência, tem-se uma redução na capacidade de difusão da auxina ocasionando também
um acúmulo deste hormônio na região. Em resposta a este acúmulo de auxina algumas
células do periciclo, responsivas a este hormônio, entram em processo de divisão e
diferenciação, dando origem ao primórdio radicular.
Entretanto, não somente a auxina e o etileno participam deste processo, sendo outro
hormônio participante a citocinina. Na raiz este hormônio atua de forma antagônica à auxina.
Isso impede que uma quantidade de auxina além do necessário chegue ao ápice
meristemático e provoque fortes alterações na região.
Todavia vale lembrar que o antagonismo ou a sinergia entre a auxina e a citocinina é
dependente do balanço endógeno destes dois hormônios.
Sabe-se que o principal centro produtor de citocinina na planta são as raízes, da
mesma forma que acontece com o ácido abscísico (ABA). O ABA é uma molécula produzida
principalmente quando a planta se encontra em uma situação que possa comprometer o seu
crescimento e/ou desenvolvimento como, por exemplo, submetida ao déficit hídrico, altas
concentrações de sal, baixas temperaturas, entre outros. Uma das mais clássicas atuações do
ácido abscísico é a sinalização para o fechamento estomático.
Coordenação no crescimento do sistema radicular
Ao fazer uma analise comparativa entre a parte aérea e a parte radicular, é notável a
existência de eventos bastante similares como, por exemplo, os tropismos. Dentre todos
serão destacados o gravitropismo (crescimento em resposta à gravidade), o tigmotropismo
(crescimento em resposta ao toque, ou seja, resposta às barreiras mecânicas) e o
hidrotropismo (crescimento em resposta aos níveis de água disponíveis).
Em uma primeira análise temos o hidrotropismo, que é o crescimento direcionado a
regiões com maior conteúdo disponível de água. Nesta mesma vertente, temos o
tigmotropismo, que é o direcionamento do crescimento em sentido contrário a barreiras
5
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
1. Estrutura e Desenvolvimento
mecânicas como solos compactados, rochas ou até mesmo raízes de outras plantas.
De um modo mais detalhado temos o gravitropismo. A percepção do estímulo
gravitrópico é medida pelos estatólitos, amiloplastos especializados na percepção do
estímulo gravitacional. Da mesma forma, existem células especializadas na percepção da
gravidade, as quais alocam os estatólitos, denominadas estatócitos. Basicamente, a percepção
do estímulo à resposta gravitrópica é gerenciada pela sedimentação dos estatólitos na
superfície inferior dos estatócitos. Estas estruturas estão presentes principalmente na coifa.
O principal hormônio que atua na resposta gravitrópica é a auxina. Até onde se sabe,
o transporte lateral da auxina gera uma taxa de alongamento celular diferenciada. Em
síntese, o lado onde há uma menor concentração de auxina cresce mais do que o lado de
maior concentração. Isso ocorre devido ao fato de que a concentração hormonal que induz o
alongamento celular estaria supra-ótimo, acarretando uma inibição do alongamento celular e,
consequentemente, moldando a raiz e gerando uma curvatura que vai direcionar o
crescimento do órgão.
Outro elemento que também parece ser um fator bastante importante é o nível de
cálcio. Acredita se que o cálcio possa provocar um rearranjo dos transportadores de auxina,
direcionando o fluxo deste hormônio para a parte inferior da raiz, resultando na resposta
gravitrópica.
Com tudo isso, é notável a complexidade do processo de crescimento e
desenvolvimento do sistema radicular. Ainda há muito a se fazer para que novos avanços
sejam feitos e uma gama de dúvidas sejam solucionadas no que se refere aos processos
fisiológicos envolvidos na morfologia e anatomia das raízes, assim como as interações
ambientais que medeiam tais processos.
Absorção de água e manutenção do potencial hídrico em raízes
Diversos eventos da planta dependem da absorção e transporte de água. A água
possui propriedade polar que a torna um excelente solvente. Além disso, ela permite a
estabilidade da temperatura da planta, já que a água exige uma alta energia para sua
temperatura ser alterada. A transpiração (evaporação das moléculas da superfície que
acumulam energia do sol) também é um importante componente para a termorregulação das
plantas, necessária também para absorção de CO2 e transporte de nutrientes.
A água se direciona no solo e na planta guiada pelo potencial hídrico. O potencial
hídrico é a energia potencial da água em relação a um estado padrão. A água migra de uma
região de maior potencial para uma menor. O potencial hídrico é a soma do potencial de
massa ou pressão hidrostática (depende do volume de água em um mesmo espaço; é positiva
quando a células está túrgida, por exemplo) e o potencial de soluto ou pressão osmótica
(quanto maior a concentração de soluto menor o valor, pois ele reduz a energia da água).
Como citado anteriormente, as raízes possuem pelos que aumentam a superfície de
absorção. Em geral, a absorção é maior nos tecidos próximos aos ápices (tecido mais jovem),
permitindo que novas raízes sejam capazes de buscar e absorver água. Uma vez dentro da
raiz a água pode entrar pela raiz de 3 formas (ver figura 2):
• Apoplástica: neste caso, a água não atravessa membranas, passando pelas paredes
celulares ou qualquer espaço extracelular.
• Simplástica: a água passa via plasmodesmas (extensões da membrana que conectam os
6
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Estrutura e desenvolvimento da raiz
citoplasmas da célula).
• Transmembrânica: a água atravessa a membrana semipermeável, sem o auxílio de
plasmodesmas.
Ao chegar na endoderme, a água deve passar obrigatoriamente pela estria de
Caspary, já mencionada, que impede o transporte via apoplasto, forçando a passagem
pela membrana plasmática. Uma vez no xilema, ela é encaminhada para as folhas, por
onde é perdida na forma de vapor pelo estômato. Os espaços intercelulares na mesofilo
(ver capítulo de Folha) facilitam o direcionamento da água contra a gravidade, pois
geram uma diferença de potencial hídrico.
O xilema facilita o transporte porque suas células sofrem morte programada e
espessamento da parede, permitindo que a planta suporte altas pressões. As células
são conectadas via pontoações (falta de parede secundária que permite a conexão
entre células via plasmodesmas), facilitando a passagem de água. Quando o ar
consegue passar pela endoderme pode ocorrer interrupção do fluxo de água
(cavitação), neste caso ela passa por outra conexão da célula adjacente.
Um fenômeno comum durante a noite é a pressão positiva da raiz. Neste caso,
as raízes acumulam solutos no xilema, forçando a água a migrar para dentro pelo
potencial de soluto. Essa pressão gerada pode desobstruir as células que sofreram
cavitação. Esse fenômeno pode ser observado nas folhas no início do dia, quando a
seiva do xilema é exsudada pelos poros nas folhas.
Absorção e transporte de nutrientes
Além de transportar água, as raízes também transportam outros nutrientes
juntos. Podemos separá-los em orgânicos (mais utilizado na agricultura) e inorgânicos.
Os nutrientes inorgânicos são mais comuns no solo, pois em geral a presença de
diversos microorganismos que competem pelos nutrientes orgânicos os tornam menos
disponíveis.
Os principais nutrientes para as plantas, considerados essenciais por
participarem do metabolismo ou estrutura da planta, podem ser classificados em
macronutrientes, presentes em grandes concentrações no tecido vegetal (N, K, Ca, Mg,
P, S e Si) e micronutrientes, necessários em menores concentrações (Cl, Fe, B, Mn, Na,
7
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Figura 2: Possíveis rotas de absorção de água.
1. Estrutura e Desenvolvimento
Zn, Cu, Ni, Mo). Os obtidos pelo gás carbônico ou água geralmente não entram nesta
classificação (C, O, N). A falta ou excesso destes nutrientes costumam acarretar
sintomas na planta. Reconhecer qual mineral está provocando o distúrbio na planta é
essencial para a agricultura, entretanto, não é algo tão simples, na medida em que a
falta de um componente pode induzir deficiência ou acúmulo de outro no organismo. No
caso da deficiência, uma pista importante é a mobilidade dos nutrientes na planta, pois
os imóveis geram deficiência local enquanto os móveis são visíveis em tecidos mais
velhos, já que eles remobilizam os nutrientes escassos para os tecidos jovens.
Dependendo da espécie e do nutriente, podem existir diferenças de qual região cada
um deles é absorvido pela raiz.
A morfologia da raiz também depende da disponibilidade destes nutrientes.
Sabe-se que o nitrogênio e o fósforo são os principais macronutrientes limitantes ao
crescimento. A disponibilidade de nitrogênio e fósforo podem alterar a arquitetura da
raiz inibindo ou promovendo o crescimento da raiz principal e o crescimento e formação
de raízes laterais. Em Arabidopsis thaliana, altas concentrações globais de nitrogênio
inibem o crescimento tanto da raiz primária como laterais, enquanto sua falta promove o
alongamento de raízes laterais. Entretanto, altas concentrações locais são capazes de
promoverem o crescimento da raiz lateral. Cabe ressaltar que o efeito da falta ou
excesso de nitrogênio depende da sua fonte (nitrato, amônio, compostos orgânicos etc),
do ambiente e da espécie de planta a ser estudada. O principal hormônio envolvido
neste processo é a citocinina, que sinaliza o estado nutricional da planta para a parte
aérea, desta forma modulando seu crescimento em função da disponibilidade de
nitrogênio.
O excesso de fósforo promove o desenvolvimento da raiz primária, enquanto sua
falta promove o desenvolvimento de raízes laterais. Como o fósforo é um nutriente de
baixa mobilidade, sua disponibilidade no solo é reduzida, justificando as mudanças que
sua falta causa na arquitetura da raiz. Entretanto, pouco se sabe ainda sobre os
mecanismos de regulação envolvidos neste processo.
Dependendo do ambiente, as plantas possuem algumas adaptações para
captação de nutrientes. Um exemplo são plantas carnívoras, que obtém os nutrientes
escassos no solo através de armadilhas que capturam pequenos animais. Outro são
plantas que se associam com fungos ou bactérias. Em troca de carboidratos, as plantas
recebem nutrientes ou água, caracterizando uma relação simbiótica. A associação com
fungos é denominada micorriza, ocorre em condições naturais e é distribuída em quase
todos os grupos. Já na associação com bactérias o caso mais comum são o das plantas
leguminosas, que formam nódulos nas raízes da planta hospedeira e fornecem
compostos nitrogenados fixados do ar atmosférico.
A nível celular, os nutrientes entram nas células vegetais através de proteínas
transportadoras. Apenas a água e muito raramente íons são capazes de atravessar as
camadas de fosfolipideos, o restante sendo transportado por proteínas inseridas nestas
camadas. O transporte pode ocorrer por 3 formas:
• Dependente de energia (ATP), sendo chamadas de ATPases ou bombas de ATP.
• Canais, ou proteínas transmembranas nas quais moléculas e íons podem se
difundir.
• Cotransportadores, proteínas que não atravessam completamente a membrana e
são mais seletivos.
O transporte por canais é sempre passivo, ou seja, sem gasto de energia. A
única forma de regulação é a abertura e o fechamento, que dependem de sinais como
luz ou hormônios. Um canal muito estudado são as aquaporinas, que permitem a
passagem de água para dentro das células de forma acelerada. Sabe-se atualmente
que elas não são específicas para moléculas de água, podendo transportar desde
8
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Estrutura e desenvolvimento da raiz
gases a pequenas moléculas de outras substâncias, como a uréia.
O transporte por cotransportadores dependem da sua ligação com o substrato.
Em geral, a taxa de transporte neste caso é muito mais lenta que seu transporte pelo
canal. A ligação do soluto gera uma mudança na conformação na membrana,
permitindo sua entrada na célula. O transporte pode ser passivo ou ativo. No transporte
ativo a molécula entra na célula contra o seu gradiente de concentração. A energia vem
de uma diferença de potencial elétrico ou químico, provindo de um segundo soluto.
Em geral, o nitrato, o cloro, o fosfato e o sulfato entram na célula por transporte
ativo, enquanto o sódio, magnésio e cálcio entram de forma passiva.
Bibliografia
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Mineral Nutrients across the Membranes of Plant Cells. The Plant Cell. v. 11. p. 661-675.
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Mochizuki, S. et al. 2005. The Arabidopsis WAVY GROWTH 2 Protein Modulates Root Bending
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Spartz, A. K.; Gray, W. M. 2008. Plant hormone receptors: new perspective. Genes Dev. v.
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Stepanova, A. N. et al. 2007. Multilevel Interactions between Ethylene and Auxin in Arabidopsis
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Walter, A.; Schurr, U. 2005. Dynamics of Leaf and Root Growth: Endogenous Control versus
Environmental Impact. Annals of Botany. v. 95. p. 891-900.
Livros didáticos
Esau, K. 1898. Anatomia das plantas com sementes; tradução: Berta Lange de Morretes. São
Paulo, Edgard Blücher, 1974, 1976 reimpressão.
Kerbauy, G.B. 2008. Fisiologia Vegetal. 2 ed. Guanabara Koogan.
Taiz, L.; Zeiger, E. 2009. Fisiologia Vegetal. 4 ed. Artmed.
9
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
O Caule: um enfoque na atividade cambial
O Caule: um enfoque na atividade cambial
Carolina Lopes Bastos
Giuliano Locosselli
Seja ele uma estrutura de morfologia complexa, com diferentes padrões anatômicos e
múltiplas funções, ou apenas um órgão de sustentação para as porções fotossintetizantes e
reprodutivas das plantas, o caule é uma estrutura de grande importância no contexto da
biologia vegetal. São diversos os estudos da anatomia, fisiologia, e morfologia externa deste
órgão, que pode estar altamente modificado em sua estrutura, assumir função
fotossintetizante, crescer em espessura e formar madeira, ou continuar herbáceo durante todo
o desenvolvimento da planta. Neste capítulo, algumas características caulinares serão
abordadas, com um enfoque na atividade do câmbio vascular, seja ela padrão ou variante, e
nos hormônios responsáveis por essa atividade, bem como no registro dendrocronológico da
atividade deste tecido tão importante.
Crescimento primário
O caule em crescimento primário é formado por três sistemas de tecidos: dérmico,
constituído pela epiderme; fundamental, que no caule corresponde ao córtex, composto por
parênquima, colênquima e/ou esclerênquima, e à medula, formada principalmente por
parênquima medular; e o vascular, composto por xilema e floema primários (Esau, 1974).
No caule, a epiderme permanence como tecido de revestimento até que seja
substituída pela periderme em plantas com crescimento em espessura (crescimento
secundário) ou se mantém dessa forma durante todo o desenvolvimento do vegetal, em
plantas herbáceas.
O córtex caulinar começa logo abaixo da epiderme e tem no periciclo (a camada mais
externa do cilindro vascular) o seu limite; pode ser composto por células parênquimáticas,
geralmente com cloroplastos; um colênquima também pode estar presente, em geral externo
ao parênquima, com espessamentos na parede primária de diversos tipos em suas células; e
em alguns grupos, pode haver esclerênquima no córtex, ou mesmo esclereídes de diversos
tipos dispersos por esta região do caule. A endoderme também está presente no caule, com
ou sem estria de Caspary, como a camada mais interna do córtex. Já a medula é formada por
células parenquimáticas em maioria, com espaços intercelulares amplos em geral, e pode
conter também estruturas secretoras, como também pode ocorrer no córtex (Esau, 1974).
O cilindro vascular caulinar é composto por xilema e floema primários, bem como
periciclo, neste estágio do desenvolvimento do vegetal. A forma como estes tecidos estão
organizados no cilindro vascular, desde o periciclo até a medula, quando presente, é
conhecida por estelo, e permite-nos esquematizar a estrutura do caule e da raiz em
crescimento primário, além de estudar comparativamente a diversidade desta estruturação.
11
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
1. Estrutura e Desenvolvimento
Figura 1 - Esquema exemplificando dois dos tipos de estelos mais comuns em Dicotiledôneas e
Monocotiledôneas. Note que existem mais tipos de estelos para ambos os grupos, como
protostelos, do tipo haplostelo, actinostelo e plectostelo, sifonostelos ectoflóicos e anfiflóicos,
dictiostelos, atactostelos, etc., que não foram mostrados no esquema com fins de simplificação
(Esquema: Bastos, CL).
Atividade cambial
Com a colonização do ambiente terrestre pelas plantas, uma série de mudanças
estruturais e funcionais ocorreu nos vegetais. Devido à imobilidade e às novas demandas
ambientais, sistemas de proteção contra a dessecação, de absorção de água e nutrientes do
solo, de transporte eficiente de assimilados e suporte mecânico se desenvolveram. O sistema
vascular foi uma das principais inovações para o sucesso do estabelecimento e expansão das
plantas superiores. Nas dicotiledôneas lenhosas e coníferas, o xilema e floema secundários
são produzidos pela atividade do meristema lateral denominado câmbio.
O câmbio é formado por uma camada de células denominadas iniciais cambiais, que
são divididas em duas categorias, as iniciais fusiformes e as radiais. As iniciais fusiformes
são células alongadas no eixo axial, que se dividem e formam as células do sistema axial
pertencentes ao floema e ao xilema. No floema, as células derivadas das iniciais fusiformes
formarão os elementos de tubo crivado, células companheiras e células parenquimáticas em
dicotiledôneas lenhosas, e células crivadas, células de Strasburger e células parenquimáticas
em coníferas. Já no xilema, as iniciais fusiformes formarão elementos de vaso, fibras e
células do parênquima axial nas dicotiledôneas lenhosas e traqueídes e células do
parênquima axial nas coníferas. Por outro lado, as iniciais radiais formarão as células que
compõem o raio parenquimático, tanto nas dicotiledôneas lenhosas quanto nas coníferas.
Estas células especializadas que se originaram a partir das iniciais cambiais possuem
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
O Caule: um enfoque na atividade cambial
um importante papel na manutenção das espécies no ambiente terrestre. Elas garantem a
condução contínua de água desde o solo até as folhas, permitem que os foto-assimilados
possam ser transportados a diferentes partes do vegetal e ainda garantem o suporte mecânico
de toda a porção aérea das plantas.
Variações cambiais
Tipos de variações
Além de sua atividade padrão no caule, de produção de células do xilema secundário
para o interior do órgão e células do floema secundário para o exterior, o câmbio vascular
pode desempenhar sua função de outras formas, ou mesmo estar ativo em vários locais ao
mesmo tempo. As variações cambiais podem ser de vários tipos, e podem ocorrer em
árvores, como Avicennia (Acanthaceae), arbustos (algumas espécies de Bignonicaeae,
Menispermaceae, etc), herbáceas (a raiz da beterraba, Beta vulgaris (Amaranthaceae), por
exemplo), mas principalmente em lianas (a ordem Fabales, Sapindaceae, Bignoniaceae,
Malphighiaceae, Menispermaceae, Apocinaceae, Rubiaceae, Icacinaceae, Acanthaceae, entre
outras famílias) (Esau, (1974), Angyalossy et al. (2012)).
As variações cambiais estão presentes ao longo da filogenia das plantas vasculares,
segundo Angyalossy e colaboradores (2012), sendo encontradas desde Gnetales até
Magnoliídeas e Eudicotiledôneas, mas de formas diferentes em cada grupo. As variações
cambiais são divididas em dois grupos principais: variações originadas de um único câmbio,
ou aquelas advindas de múltiplos câmbios (Angyalossy et al., 2012).
No primeiro tipo, em que apenas um câmbio é responsável pela variação encontrada,
temos ainda subtipos (Angyalossy et al., 2012):
a) Câmbio regular, com atividade normal, mas com conformação irregular ou desigual,
gerando um caule de formato irregular.
Famílias em que ocorre: Apocynaceae, Leguminosae and Rubiaceae.
Figura 2. Aspidosperma sp. (Apocynaceae) e outra liana ilustram a variação cambial produzida por um único câmbio
de produção padrão mas forma irregular (Fotos: Bastos, CL, material gentilmente cedido por Angyalossy, V)
b) Xilema interrompido por arcos ou cunhas de floema.
Famílias em que ocorre: Bignoniaceae, Celastraceae, Malpighiaceae e Icacinaceae.
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
1. Estrutura e Desenvolvimento
Figura 3. Lianas de Bignoniaceae ilustrando a variação cambial do tipo cunhas de floema (Fotos: Bastos, CL, material
gentilmente cedido por Angyalossy, V).
c) Segmentos compostos por elementos axiais do xilema e do floema separados por largas
porções de raios floemáticos e xilemáticos.
Famílias em que ocorre: Aristolochiaceae e Menispermaceae.
Figura 4. Exemplo de lianas com variação cambial em que o xilema e o floema ficam segmentados, por conta dos largos raios. À
esquerda, Aristolochiaceae, e à direita, outra liana com a mesma estruturação (Fotos: Bastos, CL, material gentilmente cedido por
Angyalossy, V).
d) Floema incluso no xilema, derivado de um único câmbio.
Família em que ocorre: Acanthaceae.
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
O Caule: um enfoque na atividade cambial
Figura 5 - Esquema ilustrando um caule com floema incluso (Esquema: Bastos, CL)
No segundo tipo, em que múltiplos câmbios são responsáveis pela formação da
variação encontrada, existem dois sub-tipos, segundo Angyalossy et al. (2012):
a) Câmbios sucessivos.
Famílias em que ocorre: lianas de Menispermaceae e algumas Fabales.
Figura 6. Exemplos de câmbios sucessivos em uma Leguminosa (esquerda) e outra liana em que este tipo também
ocorre (Fotos: Bastos, CL, material gentilmente cedido por Angyalossy, V).
b) Cilindros vasculares compostos.
Família em que ocorre: exclusivo de Sapindaceae.
Figura 7. Caules compostos em Sapindaceae (Fotos: Bastos, CL, material gentilmente cedido por Angyalossy, V).
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
1. Estrutura e Desenvolvimento
Podem acontecer também combinações de mais de um tipo de variação cambial.
Alguns exemplos citados por Angyalossy et al. (2012) são: Bignoniaceae e Malpighiaceae
com cunhas de floema e partes do xilema dispersas por proliferação de parênquima; em
Piperaceae, elementos vasculares axiais em segmentos combinados a cilindros secundários
externos, entre outros exemplos.
Figura 8 - Exemplo de combinação de variações cambiais em Leguminosae.
Caule de formato irregular (achatado) e com câmbios sucessivos (Fotos:
Bastos, CL, material gentilmente cedido por Angyalossy, V)
Cabe ressaltar que, para algumas famílias, algumas variações cambiais podem ser
utilizadas para fins taxonômicos, como acontece em Sapindaceae, Menispermaceae, e lianas
de Bignoniaceae (Angyalossy et al., 2012).
A fisiologia da variação cambial: injúrias e flexibilidade
Como já mencionado acima, as variações cambiais são mais comuns em lianas que
em espécies de qualquer outro hábito. Enquanto a maioria das árvores exibe um modelo
padrão de crescimento secundário, com um único câmbio produzindo floema para o exterior
e xilema para o interior, as lianas apresentam várias configurações vasculares alternativas
(Schenck, 1893; Pfeiffer, 1926; Obaton, 1960).
Em estudos realizados por Putz & Holbrook (1991), comparando-se lianas e plântulas
de espécies arbóreas, as lianas mostraram-se três vezes mais flexíveis em experimentos de
torção que as arbóreas. A capacidade das lianas de manter o xilema funcional após uma
deformação (sua resistência), também foi muito maior nas lianas que em espécies arbóreas
(Putz & Holbrook, 1991). A compartimentalização dos caules das lianas, onde tecidos
lignificados, relativamente inflexíveis, estão associados a tecidos não lignificados (macios),
pode permitir às lianas funcionar mais como cabos do que como cilindros sólidos (Obaton,
1960; Putz & Holbrook, 1991), garantindo flexibilidade e maior resistência à dobras e
contorções que ocorrem durante seu crescimento em direção ao dossel (Ewers & Fisher,
1991)
Em uma revisão de trabalhos acerca de injúrias naturais ou induzidas
experimentalmente em caules de lianas, Fisher & Ewers (1991) atestaram que esta anatomia
caulinar “anômala” de algumas famílias permite a divisão ordenada do caule e a rápida
reparação de interrupções vasculares causadas por injúrias, além do aumento da flexibilidade
já comentada. Ou seja, a presença de variações cambiais pode ser associada a diversas
funções nos vegetais; além das já citadas, podemos adicionar a melhor condução de
fotossintatos (Pace et al., 2011) e o desenvolvimento xilemático (Lima et al., 2010).
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
O Caule: um enfoque na atividade cambial
Controle hormonal da atividade cambial
Como em todo processo de desenvolvimento, a atividade cambial é finamente
regulada pelos sinais hormonais. A atividade cambial é sinalizada pela presença integrada de,
principalmente, auxina (AIA) giberelinas (GA) e citocininas. Cada um destes hormônios é
produzido em uma parte da planta e é transportado até a região cambial, onde modulará a
atividade deste meristema secundário.
A auxina é produzida especialmente pelas folhas jovens. Este hormônio move-se de
forma polarizada nos tecidos vasculares, em especial, através do câmbio e elementos
vasculares em diferenciação. O movimento basípeto da auxina cria um gradiente de
concentração ao longo do câmbio, sendo as regiões mais próximas a fonte, as com a maior
concentração, e as mais distantes, com a menor contração de auxina.
A auxina é um dos principais hormônios responsáveis pela atividade cambial. A
presença deste hormônio induz o início das divisões celulares das iniciais cambiais. O
desenvolvimento das células derivadas, provenientes da divisão das iniciais cambiais, e as
características das células maduras depende pode depender da ação de outros hormônios, que
somente agem na presença da auxina.
Os produtos da atividade cambial, floema e xilema secundários, dependem da
concentração da auxina na zona cambial. Altas concentrações de auxina determinam a
produção de floema preferencialmente. Por outro lado, concentrações menores de auxina
resultam numa produção maior de xilema. Diferenças nas concentrações de auxina, além de
determinar o produto da atividade cambial, também influenciam as características das células
produzidas. Uma concentração relativamente maior de auxina estimula o rápido
amadurecimento das células produzidas pelo cambio, o que significa uma deposição
acelerada da parede secundária e lignina. Com a deposição da lignina, a expansão celular
fica mais restrita já que diminui a plasticidade das células derivadas. Como um resultado do
estimulo do amadurecimento das células, o gradiente de concetração de auxina, desde a fonte
até os drenos, resulta num gradiente de variação dos tamanhos das células produzidas pelo
câmbio, em especial as células condutoras do xilema.
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
1. Estrutura e Desenvolvimento
Figura 9 - Esquematização do gradiente de concentração de auxina dentro de uma árvore, desde a fonte
aos drenos. A) Representação de uma árvore, contendo a copa, o tronco principal e as raízes. B)
Representação da do gradiente de concentração de auxina. C) Representação da variação das
dimensões dos elementos de vaso em diferentes porções do xilema, conforme o gradiente de
concentração de auxina.
Já as giberelinas são produzidas pelas folhas maduras, e são transportadas através do
floema para outros órgãos das plantas. As giberelinas possuem um importante papel no
estimula da atividade cambial, sendo relacionada à formação e ao desenvolvimento de fibras
no xilema. Uma maior concentração de giberelinas estimula a formação de uma maior
quantidade de fibras a partir das iniciais cambiais. Porém, a giberelina somente age na
presença de uma concentração mínima de auxina.
Por fim, as citoquininas possuem um papel sobre a atividade cambial considerado
incerto até o momento. A citoquinina é produzida nos ápices radiculares é transporta pelo
fluxo de água no xilema resultante da transpiração foliar.
Registro do produto da atividade cambial e dendrocronologia
A interação entre as ações de cada hormônio produzido em diferentes partes das
plantas modula os produtos da atividade cambial, ficando assim, a fisiologia da planta
registrada especialmente no lenho. A anatomia pode ser considerada como uma evidência, e
um registro, da fisiologia da planta num determinado momento de sua vida. Esta relação
temporal do registro fica mais evidente quando são analisadas sob a perspectiva dos anéis de
crescimento presentes no xilema.
A dendrocronologia tem como objetivo primordial estudar a sequência de anéis de
crescimento em plantas lenhosas para determinar o ano calendário de formação de cada um
deles (Stokes & Smiley 1996). Por mais trivial que seja este objetivo, a datação dos anéis de
crescimento abre um leque de possibilidades, já que as plantas podem manter, no lenho, um
registro biológico de grande parte dos eventos que influenciaram o seu crescimento ao longo
da vida.
Como registro natural, os anéis de crescimento são considerados um dos mais
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
O Caule: um enfoque na atividade cambial
precisos. Esta confiança na datação provém da elaboração das cronologias de
crescimento baseadas na replicação populacional e em métodos estatísticos robustos.
A dendrocronologia é uma ciência recente, em amplo desenvolvimento. Seus
primeiros laboratórios foram estabelecidos na América do Norte e na Europa por volta da
década de 1920, os quais tinham como principal objetivo datar artefatos históricos e
arqueológicos com base nas sequências de anéis de crescimento. A partir da década de 1970,
a dendrocronologia passou a ser utilizada para responder uma variada gama de questões
científicas, desde compreensão da ecologia de algumas espécies, até a reconstrução climática
do último milênio, sob o olhar das mudanças climáticas (Scweingtruber 1996).
Pressupostos da dendrocronologia
Anéis de crescimento visíveis
Qualquer estudo de dendrocronologia inicia-se com a identificação dos anéis de
crescimento. Esses são camadas sucessivas, concêntricas, presentes na madeira, demarcada
por variações na anatomia do lenho. Basicamente, são demarcados por traqueídes achatadas
e de parede mais espessa nas coníferas, e por uma disposição variada de estruturas
anatômicas nas angiospermas (Figura 10).
Estas disposições podem ser caracterizadas por uma redução gradual, ou abrupta, dos
diâmetros dos vasos, ou pela presença de uma faixa de parênquima marginal, ou uma
camada fibrosa, entre outras. Os anéis podem ser delimitados pela presença de uma ou mais
destas características.
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Figura 10- Exemplos de anéis de crescimento em uma espécie de conífera: Podocarpus
lambertii Klotzsh ex Endl. (A preparação histológica e B preparação macroscópica) e numa
espécie de angiosperma: Hymenaea courbaril L. (C preparação histológica e D preparação
macroscópica).
1. Estrutura e Desenvolvimento
Anéis de crescimento anuais
Para que uma espécie possa ser utilizada num estudo de dendrocronologia, ela precisa
possuir anéis de crescimento que são formados a cada ano. Somente assim, a atribuição de
um ano calendário ao anel de crescimento poderá ser realizada.
Anéis de crescimento sensitivos
Os anéis de crescimento podem ser classificados quanto à sensitividade: em
complacentes e sensitivos. Os anéis considerados complacentes possuem pouca variação no
tamanho ao longo de uma série de crescimento, enquanto que os anéis sensitivos possuem
uma grande variação na dimensão ao longo do lenho.
Ambientes com condições de crescimento próximas do ótimo induzem um
crescimento anual praticamente constante, o que resulta em anéis complacentes. Já
ambientes com uma condição mais estressante de crescimento tendem a produzir anéis mais
sensitivos. Como exemplos de ambientes que produzem anéis sensitivos (ideais para coleta
de amostras), podem ser listados: locais com grande drenagem (encostas de morro, solos
com altas concentrações de silte e areia, solos rasos), ambientes com grande demanda
evaporativa (cerrado e caatinga), solos pobres em nutrientes, locais com propensão ao
congelamento, entre outros.
Este parâmetro pode ser medido e indexado com o cálculo da sensitividade média, a
qual é uma medida da variância do tamanho dos anéis de crescimento. A sensitividade média
varia numa escala de 0 a 1, na qual os valores entre 0 e 0.19 são considerados baixos, e
portanto os anéis tendem a ser complacentes. Valores entre 0.20 e 0.29 são considerados
intermediários, e acima de 0.30, são sensitivos e ideais para uma análise dendrocronológica.
Figura 11 - Comparação entre anéis de crescimento considerados
sensitivos e os complacentes (modificado, Stokes & Smiley 1996).
Sinal comum
Os anéis de crescimento sensitivos precisam possuir um padrão de crescimento
(também definido como sinal) comum numa população. Este padrão de crescimento é o
20
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
O Caule: um enfoque na atividade cambial
utilizado na datação cruzada, para a atribuição de um ano calendário a cada anel de
crescimento.
Datação cruzada
O processo de datação cruzada é o cerne de qualquer trabalho de dendrocronologia.
O objetivo dela é a identificação do padrão comum de crescimento na população, o qual
resulta na construção de uma cronologia mestre para a datação. Durante este processo, há
apenas dois problemas que podem ser enfrentados, a presença de anéis de crescimento
faltantes ou a presença de anéis de crescimento falsos. A identificação e correção destes dois
problemas são essenciais ao sucesso do processo de datação cruzada.
Figura 12. Tipos de problemas que podem ser identificados em cronologias de anéis de crescimento: anéis faltantes (no caso
confluentes) e anéis falsos (camadas de crescimento que foram formadas em algum momento durante a estação de crescimento).
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22
BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Folha: desenvolvimento, estrutura e função
Folha: desenvolvimento, estrutura e função
Aline Siqueira Nunes
Leonardo Hamachi
Mariane Sousa Baena
Paula Natália Pereira
Paulo Tamaso Mioto
Rafael Cruz
A folha é um órgão de grande importância para a planta por ser o principal
responsável pela realização da fotossíntese. Ao longo do Curso de Inverno, serão abordados
vários de seus aspectos, em dois módulos subsequentes: na Parte I trataremos da estrutura
foliar, com considerações sobre a evolução, ontogênese, forma e anatomia desse órgão; na
Parte II será visto sua função com abordagens sobre o papel da folha no corpo vegetal. A
aula começará abordando o surgimento das folhas nas primeiras plantas terrestres e, então,
como as folhas se desenvolvem a partir do meristema apical caulinar, realizam suas funções
quando completamente desenvolvidas e, por fim, como se dá o processo de senescência
foliar. Ao considerarmos a planta como um todo, observamos que há um período inicial no
qual a folha necessita de um aporte de energia e matéria orgânica para que possa crescer. Aos
poucos ela passa a ser capaz, através da fotossíntese, de produzir carboidratos que serão
enviados para o restante da planta. A partir de certo ponto a folha começa a entrar em
processo de senescência, no qual a maior parte dos seus componentes é exportada para
tecidos mais jovens. Todos esses processos são finamente regulados nas plantas, o que
permite que elas mantenham sua homeostase.
Parte I
Origem das plantas terrestres e as primeiras folhas
As primeiras evidências de vegetais terrestres encontradas são esporos, datados de
460 milhões de anos, cuja morfologia sugere que foram produzidos por plantas parecidas
com hepáticas. Por volta de 420 milhões de anos atrás, fósseis mostram que as plantas ainda
apresentavam uma estrutura bastante simples com ramos aéreos já providos de células
condutoras de água, sendo um fóssil de Cooksonia o primeiro registro de planta vascular
encontrado. As primeiras plantas terrestres não possuíam folhas, sendo compostas apenas de
estruturas caulinares e, de acordo com a teoria do teloma de Zimmermann, as folhas teriam
surgido através de uma redução de um sistema de ramos laterais. Primeiramente, houve uma
modificação da estrutura dicotômica para a formação de um eixo principal e ramos laterais
(overtopping). Em seguida, os ramos que se posicionavam formando uma estrutura
tridimensional ficaram restritos a apenas um plano (planation) e, por fim, tecido
parenquimático fotossintetizante começa a se formar entre os ramos, ligando-os (webbing),
Figura 1.
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
1. Estrutura e Desenvolvimento
Figura 1-Esquema ilustrando o surgimento das folhas a partir de uma planta
ancestral que apresentava apenas ramos segundo a teoria do teloma. A. Planta
formada apenas por ramos, com padrão de ramificação dicotômico. B. Planta
formada de um eixo principal e ramos laterais. C. Os ramos sofrem uma
modificação em sua estrutura, estando agora posicionados em apenas um plano.
D. Concrescimento de tecido parenquimático (em cinza) entre os ramos,
formando a lâmina foliar.
Plantas com folhas evoluíram há 410 milhões de anos e os microfilos de
Baragwanathia longifolia foram as primeiras estruturas foliares encontradas no registro
fóssil. Durante o período Devoniano (~420-350 milhões de anos) ocorreu uma explosão de
diversidade nas plantas e surgiram características que possibilitaram que plantas terrestres,
antes ocupando apenas áreas úmidas, pudessem colonizar áreas mais secas. Nesse período,
folhas de formas mais complexas evoluíram a partir de folhas incipientes e, como conferiam
uma vantagem adaptativa ao ambiente terrestre, foram mantidas ao longo da evolução.
Atualmente podemos dividir as folhas em simples ou compostas, sendo que as folhas simples
possuem lâminas foliares inteiras e as folhas compostas apresentam a lâmina subdividida em
folíolos. A subdivisão da lâmina foliar em folíolos maximiza a área fotossintética e diminui a
tensão mecânica potencial que uma superfície única e inteira, como as lâminas simples,
sofreria. Atualmente, quase todas as plantas vasculares possuem folhas e as espécies afilas
(sem folhas) evoluíram através de perda secundária a partir de um ancestral que possuía
folhas. Entretanto, as plantas afilas, em geral, desenvolveram outras estratégias
fotossintéticas como caules ou raízes fotossintetizantes.
Diferentemente dos animais, que apresentam crescimento fechado e determinado, os
vegetais apresentam crescimento aberto e indeterminado. A forma geral que vemos nos
animais adultos é determinada no início do desenvolvimento e uma vez que os animais se
tornam adultos (capazes de se reproduzir), sua forma não mudará muito ao longo de sua
vida. Por outro lado, as plantas continuam a crescer por toda a vida e sua forma geral não é
definida na fase embrionária. Dessa forma, seu desenvolvimento é dito indeterminado. Além
disso, seu número de partes não é fixo (é, na maior parte das vezes, impossível predizermos
quantos galhos ou folhas uma árvore adulta possuirá) sendo assim também denominado
aberto. Os animais, ao contrário, têm uma forma corporal pré-programada e com número de
partes definido (por exemplo, seres humanos terão cinco dedos em cada mão), sendo
considerados, portanto, de crescimento fechado. As plantas têm essa capacidade de crescer
durante toda a sua vida devido à retenção, na fase adulta, de regiões meristemáticas com
potencial pra se multiplicar e formar tecidos. Essas zonas meristemáticas, denominadas
meristema apical caulinar (MAC) e meristema apical radicular são posicionadas cedo no
desenvolvimento. Um embrião vegetal é muito simples quando comparado ao de um animal,
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Folha: desenvolvimento, estrutura e função
consistindo basicamente da radícula, hipocótilo, cotilédones, meristema apical caulinar e
meristema apical radicular. É a partir da atividade desses dois meristemas apicais que todo o
corpo da planta adulta se forma após a germinação da semente e mutações que suprimem a
formação de um deles, em geral, são fatais.
Especificamente, a arquitetura primária das partes aéreas da planta é derivada do
meristema apical caulinar, o qual produz folhas, internós e gemas axilares. Diferenças
aparentemente simples na iniciação do órgão a partir do MAC podem resultar em
morfologias dramaticamente divergentes. Dessa maneira, a organização e manutenção do
meristema continuam a ser uma questão fundamental nos estudos de desenvolvimento das
plantas.
Ontogênese foliar
O desenvolvimento foliar pode ser dividido em quatro estágios: iniciação,
diferenciação inicial, desenvolvimento do eixo da folha e, por fim, origem e histogênese da
lâmina foliar. A iniciação da folha ocorre por meio de divisões que ocorrem em um pequeno
grupo de células lateralmente situadas em relação ao ápice do caule, o que resulta na
formação do primórdio foliar. Este primórdio, que consiste em uma protoderme, uma região
central de tecido fundamental e procâmbio tem a forma de um pequeno cone, com a face
adaxial achatada. As células apicais do primórdio foliar apresentam diferenciação
relativamente rápida, sendo grande parte do crescimento no sentido próximo-distal dado por
crescimento intercalar. O crescimento em comprimento do eixo é acompanhado pelo
aumento na largura, como resultado de divisões celulares na região adaxial, proporcionando
um aumento em volume do primórdio foliar. Feixes vasculares acessórios podem se
desenvolver a partir dessa região.
O desenvolvimento da lâmina foliar ocorre durante o crescimento em comprimento e
espessura do primórdio por meio de células das margens que continuam a se dividir,
formando a blastozona/meristema marginal. O crescimento marginal varia entre as regiões
do primórdio foliar de modo que, nas folhas pecioladas, tal crescimento é reprimido na base,
da qual se originará o pecíolo. A partir de divisões de células iniciais marginais, originam-se
os tecidos da lamina foliar (epiderme, mesofilo e tecidos vasculares).
Trabalhos recentes, com base em anatomia e biologia molecular, têm descrito etapas
em três fases: iniciação, morfogênese primária e expansão e morfogênese secundária. A
iniciação foliar a partir dos flancos do meristema apical caulinar é um processo ainda não
completamente entendido, porém sabe-se que mutações que o afetam têm um impacto
dramático na forma final da folha e que muitos aspectos da morfologia foliar são
determinados nessa fase inicial de desenvolvimento. As primeiras mudanças detectadas no
MAC são um pico de auxina e um afrouxamento das microfibrilas de celulose da parede
celular na região do meristema onde estará posicionado o futuro primórdio. Essa mudança na
consistência das microfibrilas se deve a expressão aumentada de genes ligados à produção de
expansina, uma proteína que regula a extensibilidade da parede celular, e é necessária para
que o primórdio foliar possa emergir do meristema. Outro marcador do local de iniciação são
os genes KNOX, que se expressam no MAC, porém são reprimidos no local da iniciação do
primórdio na fase em que nenhuma mudança morfológica é observada ainda no MAC. O
meristema apical caulinar é uma estrutura radialmente simétrica e a iniciação de órgãos
laterais, num padrão filotático, implica na quebra dessa simetria, o que segundo as teorias
mecânicas da filotaxia (mechanical phyllotactic theories) ocorreria devido a uma diferença
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
1. Estrutura e Desenvolvimento
de tensão entre a camada L1 e os tecidos subjacentes. De acordo com essas teorias, as forças
mecânicas teriam um papel fundamental na definição do local de iniciação do primórdio.
Porém, para entender as forças de tensão é necessário entender o papel do turgor, as
propriedades da parede celular, a arquitetura do citoesqueleto e o processo de crescimento de
uma maneira geral. Entretanto, entender a regulação genética de todos estes processos tem
se mostrado uma tarefa bastante complicada. Desta forma, não é um consenso entre
pesquisadores que a contribuição das forças mecânicas na determinação da filotaxia seja
fundamental. O termo morfogênese primária é usado para descrever os processos que
estabelecem a forma básica da folha, relacionada à sua simetria e sub-regiões. Na fase de
expansão e morfogênese secundária ocorre aumento na superfície e no volume final da folha,
cuja expansão pode ser isométrica ou alométrica, podendo o órgão manter ou alterar a forma
estabelecida durante a morfogênese primária.
Figura 2-Secção longitudinal do ápice caulinar de Coleus
sp., mostrando o meristema apical, primórdios foliares e
gemas axilares.
Genética molecular do desenvolvimento foliar
Recentemente muitos progressos têm sido feitos no entendimento dos mecanismos
moleculares que regulam o desenvolvimento das folhas. Duas famílias de fatores de
transcrição são conhecidas por estarem envolvidas no controle do desenvolvimento foliar, os
genes KNOTTED-like da classe 1 (KNOX1) e os genes LEAFY/FLORICAULA (LFY/FLO).
Os genes KNOX1 são conhecidos por seu papel importante na manutenção da
indeterminação dos tecidos do MAC (sua expressão mantém os células em estado
meristemático), porém análises moleculares indicam que os genes KNOX1 também se
expressam durante o desenvolvimento de folhas compostas. Neste tipo de folha a expressão
dos genes KNOX1 faz com que os tecidos se mantenham por mais tempo em estado
meristemático, conferindo às folhas uma capacidade maior de crescimento indeterminado.
Este tempo mais longo de indeterminação do primórdio é necessário para que as elaborações
da lâmina, como folíolos e lobos, possam se desenvolver. Os genes KNOX1 estão envolvidos
no desenvolvimento das folhas compostas de quase todas as linhagens de eudicotiledôneas
analisadas até o momento e uma exceção importante nessa tendência de expressão do gene
KNOX1 no primórdio de folhas compostas é observada em Pisum (ervilha), onde este gene
não se expressa nos primórdios nem em folhas mais velhas. Em Pisum, os tecidos são
mantidos em estado indiferenciado por mais tempo através da expressão do gene LFY/FLO e
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Folha: desenvolvimento, estrutura e função
mutações neste gene fazem com que a folha de ervilha se torne simples.
Existem vários genes que são antagonistas ao KNOX1 e LFY/FLO, pois promovem a
diferenciação dos tecidos onde se expressam. Este é o caso dos genes que controlam o
estabelecimento da polaridade abaxial-adaxial nas folhas. As folhas possuem tecidos
bastante diferentes nas faces abaxial e adaxial, que desempenham funções distintas. Na face
adaxial, comumente, encontra-se uma camada de parênquima paliçádico, que otimiza a
fotossíntese e uma camada espessa de cutícula sobre a epiderme. Em geral, na face abaxial
encontra-se o parênquima lacunoso e um maior número de estômatos, que regulam as trocas
gasosas e a transpiração. Toda essa diversidade de tecidos é gerada a partir da expressão de
muitos genes, que além de serem antagonistas ao KNOX1 e LFY/FLO também são
antagonistas entre si. Em geral, genes que se expressam na face adaxial reprimem a
expressão de genes que se expressam na face abaxial e vice-versa. Mais especificamente a
polaridade abaxial-adaxial é estabelecida pela repressão mútua entre os genes HD-ZIPIII e o
gene KANADI. Experimentos mostram que mutantes que não expressam algum dos genes de
identidade abaxial ou adaxial desenvolvem folhas que não possuem lamina foliar e são
aciculiformes (que lembram gavinhas ou espinhos). Assim, o estabelecimento correto da
polaridade abaxial-adaxial é necessário e, pode-se dizer, um pré-requisito para que ocorra a
expansão da lâmina foliar. A expansão da lâmina foliar e também a diferenciação dos tecidos
diversos que a compõem foram adaptações que maximizaram a fotossíntese ao mesmo
tempo em que minimizaram a perda de água para o ambiente, sendo assim importantes
inovações para a conquista do ambiente terrestre pelas plantas.
A forma da folha
Embora alguns padrões do desenvolvimento foliar pareçam ser comuns em plantas
vasculares, diferenças na ontogênese, em vários aspectos, levam a uma gama de formas
finais distintas que tornam a folha o órgão vegetativo mais plástico dentre as traqueófitas,
adquirindo grande importância em estudos taxonômicos, ecofisiológicos e na área de
genética molecular do desenvolvimento, visto que é um ótimo modelo para investigar a
regulação gênica fina devido a toda a variação de formas.
Na maioria das plantas vasculares encontramos associada à axila da folha uma gema
de estrutura semelhante ao ápice caulinar, podendo assumir atividade semelhante a este e dar
origem a um ramo. Ela pode ser facilmente identificada à vista desarmada ou com o auxílio
de uma lupa tornando-se a melhor estrutura capaz de individualizar uma folha
morfologicamente. Esta característica, no entanto, surgiu tardiamente dentro da filogenia das
traqueófitas e plantas como as licófitas, monilófitas e cicadófitas não apresentam gemas
axilares. Consequentemente, também não possuem este tipo de ramificação.
Uma vez individualizada, a forma da folha pode ser melhor entendida subdividindo-a
em uma porção conhecida como lâmina (mais apical e geralmente expandida) e uma porção
conhecida como base (associada à inserção da folha no caule) morfoanatomicamente
distintas. A base da folha comumente é cilíndrica em não monocotiledôneas, sendo chamada
de pecíolo (e, mais especificamente, de estipe nas samambaias). Em monocotiledôneas a
base costuma ser expandida e envolvente, sendo chamada bainha. Ambas as estruturas
podem co-ocorrer na base (uma bainha proximal e pecíolo distal) e não são exclusivas destes
grupos (há monocotiledôneas pecioladas e não monocotiledôneas com bainhas). A base ainda
pode ser imperceptível morfologicamente e a folha é assim chamada séssil. Projeções
laterais da base podem surgir nos primeiros estágios de formação da folha, sendo chamadas
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
1. Estrutura e Desenvolvimento
de estípulas, que podem assumir diversas funções. Geralmente ocorrem aos pares, mas
possuem morfologia bastante variável. Em gramíneas é comum ainda o surgimento de uma
projeção adaxial entre a bainha e a lâmina foliar conhecida como lígula, também de
morfologia variável. Em algumas plantas, principalmente leguminosas e marantáceas, um
intumescimento do pecíolo conhecido como pulvino ocorre e está relacionado ao movimento
da lâmina foliar de velocidade variável, desencadeado por higroscopia e/ou potencial
elétrico, relacionado à proteção da folha ou à melhor captação de luz.
A lâmina foliar pode assumir diversas dimensões, de milímetros a metros. Varia
muito em sua simetria, podendo ser desde perfeitamente simétrica bilateralmente até
completamente assimétrica. Algumas folhas são curtas, semelhantes a escamas e
relacionadas à proteção de gemas: os catafilos. Outras acumulam uma grande quantidade de
água, sendo suculentas. Algumas são cilíndricas, o que muitas vezes está relacionado a um
crescimento adaxial muito incipiente durante a ontogênese. Folhas relacionadas a estruturas
reprodutivas muitas vezes são diferentes das demais e chamadas de brácteas.
Numa lâmina foliar expandida geralmente o tecido vascular é facilmente perceptível,
traçando vários padrões. Numa primeira classificação, podemos dividi-las em grandes
grupos: folhas uninérveas (uma única nervura, como geralmente presente nas licófitas), com
venação dicotômica (comum nas plantas com sementes, exceto em angiospermas), com
venação reticulada (geralmente com uma nervura central distinta e nervuras laterais que
partem desta e se conectam, formando uma trama com terminações livres, comuns em
angiospermas não monocotiledôneas) e com venação paralela (as nervuras correm
paralelamente da base ao ápice da folha com poucas conexões entre ela e sem terminações
livres, condição comum em monocotiledôneas).
A folha como um todo ou suas partes (lâmina, folíolo, estípulas) podem sofrer
modificações muito especializadas a determinadas funções. Estas modificações podem ser as
gavinhas, geralmente alongadas, cilíndricas e, muitas vezes, com crescimento helicoidal,
relacionado à escalada em um suporte (plantas trepadeiras). Podem também ser cilíndricas e
alongadas, mas muito lignificadas e geralmente pontudas, relacionadas à proteção e
conhecidas como espinhos. Espinhos podem facilmente ser confundidos com acúleos,
também pontudos, que são apenas projeções da epiderme e tecido subjacentes, mas não
relacionados à modificação de um órgão como um todo e, portanto, sem topologia tão bem
definida como os espinhos. Em plantas carnívoras, a lâmina foliar pode ser modificada em
armadilhas de invertebrados apressórias, adesivas, suctórias ou em forma de jarro e liberam
enzimas proteolíticas necessárias para a carnivoria.
As estruturas foliares podem ser glabras ou possuírem um grande número de tricomas
(pilosas), de funções diversas. Seus pigmentos podem estar regularmente presentes em toda a
lâmina dando-a uma cor geralmente verde, devido à clorofila. No entanto, com a presença de
outros pigmentos e disposição diferencial destes, de plastídeos e de tricomas, que
influenciam na reflexão luminosa, a folha pode apresentar cores diferentes na face abaxial e
adaxial. As diferenças de cores ainda podem formar manchas, listras, pontos ou outras
formas em uma mesma face e a folha é dita variegada.
Ao longo da evolução, em diversos momentos, a lâmina foliar sofreu divisão,
individualizando folíolos e dando origem às folhas compostas. Uma folha com dois ou três
folíolos é dita bi ou trifoliolada, respectivamente. Se a folha tem mais de três folíolos, eles
podem partir todos de um mesmo ponto e a folha é palmada (em forma de palma) ou
possuírem um eixo cilíndrico alongado (raque) no qual os folíolos se inserem sendo pinada
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Folha: desenvolvimento, estrutura e função
(em forma de pena). Se uma folha pinada tem folíolos terminais pares, é paripinada. Se
possuir um único folíolo terminal, é imparipinada. Há ainda folhas com um único folíolo,
denominadas unifolioladas, derivadas evolutivamente de uma condição composta, com uma
articulação na base do folíolo como testemunha desta redução de número de folíolos.
Filogeneticamente as folhas compostas podem ter origem por lobação gradual da lâmina
foliar com um aprofundamento tão intenso dos lobos que estes atingiram a nervura principal
gerando os folíolos (divisão), outra hipótese é que elas tenham surgido por homeose. Diz-se
que ocorreu homeose quando no local de formação de um determinado órgão, outro órgão ou
características de outro órgão são expressos. Dessa maneira, as folhas compostas teriam
surgido através de uma alteração no padrão de desenvolvimento das folhas simples, e várias
estruturas simples (folíolos) teriam se formado onde uma lâmina foliar única deveria ser
produzida (multiplicação). Nesse caso, as estruturas simples seriam como folhas simples
sendo produzidas por uma estrutura caulinar, assim características caulinares estariam sendo
expressas no desenvolvimento das folhas compostas, que por sua vez teriam uma identidade
mista, sendo um órgão intermediário entre caule e folha. Assim como a lâmina simples pode
portar modificações da base, os folíolos podem ter modificações de segunda ordem
associadas a eles, como peciololos, pulvínulos e estipelas (respectivamente pecíolos,
pulvinos e estípulas de segunda ordem).
No ápice caulinar, os espaços entre o surgimento de um primórdio e outro
subsequente podem vir a se alongar, dando origem, na maturação a um internó, que na planta
adulta pode ser identificado como as regiões caulinares que separam os pontos de inserção
de folhas: os nós. No entanto, alguns desses espaços podem não vir a se alongar e mais de
uma folha pode ocupar o mesmo nó. A esta disposição chamamos de filotaxia e pode ser
alterna (uma folha por nó), oposta (duas folhas por nó, sendo geralmente uma folha
posicionada a 180° em relação à outra do mesmo nó) ou verticilada (três ou mais folhas por
nó). Uma folha alterna pode estar disposta em relação à anterior em um mesmo lado do caule
(monóstica), em dois ou três lados do caule (dística ou trística) ou em tantos lados que
chegam a formar uma espiral, vista do alto do ramo (espiralada, comumente presente em
rosetas). Em folhas opostas, comumente os pares de folhas estão posicionados a 90° em
relação ao anterior, vistas do alto do ramo (opostas cruzadas) ou no mesmo plano (opostas
dísticas). Uma planta pode apresentar regularmente folhas muito semelhantes ou estas
podem variar em forma (junto ao nó e internós associados) e neste caso, a planta apresenta
heterofilia. Se a variação é em relação à idade da planta (por exemplo, indivíduos juvenis
apresentam uma determinada morfologia e indivíduos adultos, outra) a planta apresenta
heteroblastia.
Deve-se atentar ao fato de que condições intermediárias não só existem como são
bastante comuns na natureza e as categorizações humanas não conseguem refletir toda a
magnitude realística existente. Toda esta diversidade morfológica está relacionada às funções
fisiológicas da planta, é determinada por processos evolutivos atuantes ao longo de milhões
de anos e foi gerada por alterações nos padrões de ontogênese das primeiras plantas
vasculares.
Anatomia foliar
As folhas, de modo geral, compartilham muitas similaridades quanto aos tecidos que
as formam, de modo que a diversidade anatômica observada entre os diversos tipos foliares
está principalmente relacionada à organização desses tecidos na constituição do órgão. Em
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
1. Estrutura e Desenvolvimento
linhas gerais, a anatomia foliar consiste em sistema de revestimento composto por epiderme,
tecido fundamental da lâmina foliar diferenciado predominantemente em mesofilo
parenquimático e sistema vascular distribuído na forma de nervuras. Embora a maior parte
das folhas apresente uma lâmina ampla e relativamente fina, algumas podem apresentar
características muito diversas, podendo ser espessas e suculentas ou mesmo tubulares, como
a cebolinha. Toda gama de formas e modos de vida têm sua correspondência na anatomia,
mas ainda que sejam encontradas diversas particularidades entre os tipos foliares observados
na natureza, a anatomia foliar reflete as principais atribuições desse órgão: fotossíntese e
respiração.
Epiderme: células de paredes anticlinais justapostas sem espaços intercelulares,
superfície externa recoberta por cutícula e presença de estômatos configuram as principais
características da epiderme foliar (Figura 3A). Como região limítrofe entre os tecidos
foliares e o ambiente externo, a epiderme possibilita penetração da luz para a realização da
fotossíntese e trocas gasosas com o meio ao mesmo tempo em que protege os tecidos
internos de agressões externas, como injúrias e principalmente perda de água por
transpiração. Frequentemente é formada por uma única camada de células isodiamétricas,
com parede celular primária e delgada que pode ter contorno retilíneo ou sinuoso em maior
ou menor grau, dependendo da espécie, da face da folha, ou mesmo das características
ambientais às quais está exposta. Entretanto, podem ocorrer folhas com epiderme
multisseriada e com paredes lignificadas, neste caso, com a função de refletir ao ambiente o
excesso de radiação solar recebida em sua superfície.
Tricomas tectores e glandulares são estruturas frequentes geralmente relacionadas à
proteção (Figura 3B). Os tricomas tectores apresentam grande diversidade de formas e
funções variadas, como proteção contra o dessecamento e radiação solar excessiva; os
glandulares apresentam células que produzem e/ou armazenam substâncias químicas que em
muitos casos configuram proteção à herbivoria. Existem, ainda, estruturas com funções mais
específicas, como os tricomas escamiformes das bromélias, que têm a função de captar vapor
de água disperso no ar.
Estômatos ocorrem mais comumente na face abaxial das folhas (hipostomáticas),
como uma forma de minimizar a transpiração excessiva, mas há espécies com folhas
anfietomáticas (Figura 3C) e epiestomáticas. Algumas xerófitas apresentam cutícula
notavelmente espessa (Figura 3A) e estômatos localizados no interior de invaginações da
epiderme (criptas), o que ajuda a minimizar os efeitos da baixa humidade relativa do ar.
Mesofilo: principal tecido fotossintetizante das folhas. É predominantemente
parenquimático e apresenta abundância de cloroplastos, podendo ter aspecto homogêneo ou
estar organizado em parênquima paliçádico e lacunoso (Figura 3). O parênquima paliçádico
é formado por uma ou mais camadas de células prismáticas alongadas e densamente
agrupadas, dispostas perpendicularmente à superfície da lâmina (Figura 3A e D). Em muitas
mesófitas o parênquima paliçádico localiza-se justaposto ou próximo à epiderme na face
adaxial da folha, sendo esta denominada dorsiventral (Figura 3A e D). Em folhas de
xerófitas, esse tecido pode ocorrer em ambas as faces da lâmina, o que a caracteriza como
isobilateral. O parênquima paliçádico aparenta ser um tecido arranjado em células bem
justapostas quando observado em uma secção transversal de folha, mas a partir de cortes
paradémicos podemos observar que este apresenta arranjo mais frouxo, e dessa forma,
possibilita a passagem de parte da luz recebida pela superfície para os demais tecidos
foliares.
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Folha: desenvolvimento, estrutura e função
O parênquima lacunoso apresenta células de formatos variados e vacúolos grandes e
um sistema de amplos espaços intercelulares (Figura 3 A, D e G). Esta disposição favorece a
passagem da luz captada pela superfície adaxial e sua distribuição entre o parênquima
clorofiliano, mas a principal característica desse tecido é que o arranjo espaçado entre as
células amplia a superfície de contato entre estas e o ar presente no interior da folha, o qual
está em continuidade com a atmosfera através, principalmente, dos estômatos. Em
crassuláceas é notável a presença de mesofilo homogêneo na região da face adaxial formado
por células prismáticas finamente justapostas, sem espaços intercelulares expressivos (Figura
3E). As células deste tipo foliar apresentam vacúolos especialmente grandes, dispondo-se em
um arranjo compactado. Neste caso, há otimização no uso do gás carbônico produzido
durante a fotossíntese, reduzindo a necessidade de liberação ao meio externo.
Em folhas suculentas é comum a presença de mesofilo disposto em muitas camadas
de células, com região central ocupada por parênquima armazenador de água, rodeado por
parênquima clorofiliano (Figura 3F); em algumas espécies o parênquima armazenador pode
estabelecer contato com a epiderme no ápice da folha, constituindo um verdadeiro túnel
translúcido que permite a passagem de luz e sua captação pelo tecido clorofiliano
circundante. Esta estrutura é uma característica das chamadas window leaves (folhas-janelas)
e é de grande importância especialmente para plantas que vivem em ambientes áridos e
apresentam a maior parte de seu corpo enterrada no solo, para proteger-se do calor
excessivo.
Sistema vascular: ocorre na forma de nervuras interligadas e entremeadas no
mesofilo, compostas predominantemente por feixes colaterais de xilema e floema primários.
No padrão reticulado característico de folhas que apresentam lâmina ampla (como a maioria
das angiospermas não monocotiledôneas) em secção transversal observamos, geralmente,
uma nervura central de grande dimensão e nervuras secundárias periféricas relativamente
menores (Fig. 3G e H). O padrão de venação paralela é observado em folhas longas (Figura
3I), típicas de monocotiledôneas, nas quais observamos, em secção transversal, feixes
vasculares semelhantes entre si dispostos lado a lado por toda a extensão do corte. Em
muitos casos há feixes de fibras alternados com os feixes vasculares, dando maior
sustentação ao órgão.
Os feixes vasculares foliares apresentam normalmente xilema primário voltado para a
face adaxial, como uma continuidade do traço foliar observado no caule. Em folhas
pecioladas, os feixes vasculares da lâmina podem confluir em um único feixe em direção ao
pecíolo. Muitas vezes ocorrem cordões de esclerênquima associados aos feixes vasculares
formando projeções que fazem conexão com a epiderme em ambas as faces da folha (Figura
3J). Os feixes vasculares paralelinérveos são envolvidos pela bainha do feixe, composta de
parênquima (Figura 3I) podendo apresentar esclerênquima. É comum a presença de
colênquima ou esclerênquima nas regiões da nervura central em continuidade com o pecíolo
e no bordo foliar, com a função de sustentar uma ampla lâmina foliar (Figura 3 G, H e J).
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
1. Estrutura e Desenvolvimento
Figura 3-Secções transversais de diferentes tipos foliares. A e B – Capparis yco
(Capparaceae), região do mesofilo; C – Drosera sp. (Droseraceae), região da nervura
central; D – Avicennia sp. (Acanthaceae), região do mesofilo; E – Encholirium sp.
(Bromeliaceae); F – (Xanthorrhoeaceae); G – Guatteria sp. (Annonaceae); H – C. yco,
nervura central; I – Zea mays; J – C. yco, região do bordo foliar.
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Folha: desenvolvimento, estrutura e função
Parte II
A fotossíntese
Um dos principais processos fisiológicos que ocorre na folha madura é a fotossíntese,
fonte de quase toda a biomassa existente no planeta. Os primeiros experimentos com plantas
relacionados a este fenômeno datam de 1648, quando Johannes Baptista Von Helmont
colocou uma árvore de chorão (Salyx sp.) com aproximadamente 2 kg para crescer em um
pote contendo 90 kg de terra (a terra pesada seca). Depois de cinco anos a árvore pesava 72
kg, mas ele não detectou diferenças de massa nos 90 kg de terra seca. Sua conclusão
(parcialmente correta) foi de que, para crescer, a planta retirou toda sua massa da água.
Apesar de Von Helmont receber o crédito por um dos primeiros experimentos envolvendo
fotossíntese, alguns historiadores argumentam que essa foi uma imitação de outro
experimento feito cerca de 200 anos antes por Nicolau de Cusa.
Quase um século depois, em 1771, Joseph Priestley deixou uma planta dentro de um
frasco vedado com uma vela queimando. Após pouco tempo a vela apagou e não podia mais
ser acesa. Depois de esperar por quase um mês, ele acendeu a vela (usando a luz do sol
refletida em espelhos) e ela queimou normalmente. Sua conclusão foi que, de alguma forma,
as plantas alteram a composição do ar. Foi dele também o famoso experimento de colocar
um camundongo em um frasco vedado e observar que ele morria rapidamente (deixando o ar
“viciado”, segundo as palavras dos cientistas da época). Ao colocar o camundongo junto
com uma planta notou-se que ele vivia por mais tempo. Concluiu-se que as plantas tinham a
capacidade de “desviciar” o ar do frasco.
Quinze anos mais tarde, baseado nesses experimentos, Jan Ingen-Housz descobriu
que se o frasco fosse coberto de modo a não deixar entrar luz, a planta também “viciava” o
ar. Conclusão: para que a planta possa “desviciar” o ar é necessário que haja luz – no escuro
ela se comportaria de maneira semelhante a um animal. Assim, já no final do século XVIII,
as bases para entender a fotossíntese haviam sido lançadas, relacionando o consumo de CO2
e a emissão de O2 das plantas com a luz. Hoje em dia já existe um vasto conhecimento
acerca do processo de fotossíntese, englobando as mais diversas áreas da Biologia.
Apesar de comumente ser resumido a uma reação química, o processo da fotossíntese
é muito mais complexo. Didaticamente, esse fenômeno pode ser dividido em duas etapas: a
etapa fotoquímica e a etapa bioquímica. É importante ressaltar que, apesar dessa divisão, os
dois processos não são independentes. No entanto, para facilitar a compreensão, as duas
etapas serão abordadas separadamente.
A etapa fotoquímica acontece nos tilacoides, que são estruturas formadas por um
sistema de membranas presente nos cloroplastos. De fato, esse processo não poderia ocorrer
em outro lugar, porque envolve um represamento de prótons (H+
) no espaço interno dos
tilacoides para impulsionar a formação de ATP. O ATP gerado aqui vai ser usado junto com o
NADPH na etapa bioquímica, abordada a seguir. Mas como esses compostos, tão custosos
em termos de energia, são gerados?
Nas membranas dos tilacoides existem dois complexos proteicos denominados
fotossistema I e fotossistema II, baseado na ordem em que foram descobertos. Cada
fotossistema é composto de um grupo de moléculas chamado de complexo antena e um
centro de reação. Quando a luz incide nos pigmentos contidos nos complexos antena, fótons
se chocam com os elétrons dessas moléculas deixado-os energizados. A energia é então
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
1. Estrutura e Desenvolvimento
transferida para o centro de reação. Com essa grande quantidade de energia que chega, a
molécula de clorofila que aí se encontra perde um elétron, que terá que ser reposto
imediatamente. No caso do fotossistema II, que é onde a cadeia começa, o elétron será
proveniente da fotoxidação de uma molécula de água. Com a quebra dessa molécula,
ocorrerá a liberação do oxigênio observada já há tanto tempo. O elétron perdido pelo
fotossistema II vai passar por várias proteínas de membrana, perdendo energia. Quando
chegar ao fotossistema I ganhará um novo “impulso” até ser incorporado a uma molécula de
NADP+
, gerando NADPH. A energia dissipada no transporte dos elétrons vai ser usada no
bombeamento de H+
para o espaço interno dos tilacoides, gerando um forte gradiente
eletroquímico. Esse gradiente vai sendo desfeito por uma proteína que também está na
membrana dos tilacoides, chamada H+
-ATPase. A ATPase vai desfazer o gradiente de H+
e
usar essa energia para a síntese de ATP. Ao final da etapa fotoquímica, portanto, teremos a
produção de ATP e NADPH. A ordem da cadeia de transporte de elétrons, incluindo os
carregadores de elétrons que não foram citados acima é a seguinte: fotossistema II 
plastoquinona citocromo b 6f plastocianina fotossistema I ferredoxina   
ferredoxina-NADPH redutase NADP +
.
Uma vez gerados, o ATP e o NADPH serão usados para impulsionar a etapa
bioquímica da fotossíntese, também conhecida como ciclo de Calvin. É nesta etapa que
ocorre a assimilação do CO2, através da ação da enzima ribulose 1,5 bifosfato carboxilase
oxigenase (abreviada para Rubisco). Ao final desse processo, serão geradas moléculas com
três carbonos chamadas de trioses-fosfato que mais tarde serão convertidas em açúcares
(com seis carbonos). Note que depois de assimilado o CO2, a primeira molécula estável que
se forma contém três carbonos. Por isso as plantas que operam exclusivamente nesse tipo de
fotossíntese são chamadas de C3. Porém, a Rubisco não tem apenas a função de carboxilase.
Ela também pode funcionar como oxigenase, sendo que essas duas funções competem pelo
mesmo sítio ativo da enzima. Quando a Rubisco funciona como oxigenase, ela desencadeia
um ciclo que “desperdiça” cerca de 25% do CO2 assimilado, chamado de fotorrespiração.
Esse processo é intrigante, já que, apesar de ninguém saber exatamente a sua função, parece
ser indispensável para as plantas. Existem outros dois tipos de fotossíntese nos quais o
primeiro composto estável formado tem quatro carbonos: a fotossíntese C4 e o metabolismo
ácido das crassuláceas (CAM).
A fotossíntese C4 é um mecanismo de concentração de CO2, que aumenta a
eficiência de carboxilação da Rubisco porque diminui a sua atividade de oxigenase (Imagine
um cabo de guerra entre a concentração de CO2 e de O2 – quando uma delas aumenta muito,
a atividade da Rubisco vai acabar pendendo para esse lado). É comum em plantas pioneiras
ou de crescimento rápido. Para que o ciclo C4 ocorra, é necessário que a planta tenha uma
anatomia especial, chamada de anatomia Kranz (coroa, em alemão). Nessas plantas, os
cloroplastos (e, consequentemente, a clorofila) são mais abundantes em células que estão na
região da bainha vascular. As células ao redor dessas (células do mesofilo) são capazes de
assimilar o CO2 na forma de ácido orgânico, que é levado até as células da bainha e
descarboxilado lá, liberando novamente o CO2. A enzima que faz a primeira assimilação do
CO2 no mesofilo é a fosfoenolpiruvato carboxilase e a enzima responsável pela
descarboxilação dos ácidos orgânicos é, na maioria dos casos, a enzima málica. Assim, as
células da bainha ficam com uma concentração muito alta de CO2, minimizando a
fotorrespiração.
O CAM é um mecanismo dedicado principalmente à conservação de água. É muito
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Folha: desenvolvimento, estrutura e função
comum em ambientes com limitação de água – não só desertos, mas ambientes nos quais a
planta não tem contato com a água do solo, como o ambiente epifítico. Essas plantas são
capazes de abrir os estômatos somente à noite (quando a umidade relativa do ar é mais alta)
e assimilar CO2 na forma de ácidos orgânicos. Os ácidos acumulados durante a noite serão
descarboxilados de dia, provendo as células com CO2 mesmo com os estômatos fechados. É
interessante que essas plantas utilizam as mesmas enzimas de carboxilação e
descarboxilação das plantas C4, a fosfoenolpiruvato carboxilase e a enzima málica. Como
essas plantas abrem os estômatos apenas nos períodos de maior umidade, a perda de água é
drasticamente reduzida. O controle estomático, portanto, é um processo que está
intimamente ligado à fotossíntese e à capacidade de sobrevivência das plantas.
Rotas Fonte Dreno
A folha atinge sua maturidade fotossintética ainda jovem, quando seu
desenvolvimento se encontra a aproximadamente de 30 a 50% completo. Nesse estágio o
órgão em questão passa a desempenhar o papel de uma folha ou órgão-fonte, pois é capaz de
produzir fotossintatos, principalmente carboidratos e compostos nitrogenados, suficientes
para a sua manutenção e para exportar a todos os outros órgãos que não são capazes de
atender às suas próprias demandas metabólicas, denominados dreno.
Nesse momento, a entrada de fotoassimilados na folha-fonte é bloqueada e novas vias
de transporte são abertas para suprir os drenos. Esse processo se inicia na porção apical da
folha e se estende sentido base a medida que os tecidos se tornam maduros. Sendo assim, ao
nível de órgão, a porção apical da folha passa a exportar seiva elaborada para a porção basal
imatura da folha. Enquanto, ao nível de organismo, as folhas maduras exportam para folhas
que se encontram em fase inicial de desenvolvimento e todos os outros drenos da planta.
Convencionou-se chamar esse trajeto da seiva elaborada de rotas fonte-dreno.
Essas rotas dependem de alguns fatores como (1) a proximidade: as folhas maduras
superiores exportam seiva para o meristema apical caulinar em crescimento e folhas jovens
imaturas, folhas inferiores exportam para o sistema radicular enquanto folhas intermediárias
exportam em ambas as direções. (2) O desenvolvimento: durante o desenvolvimento da parte
vegetativa da planta os principais drenos são os ápices caulinares e radiculares, durante a
fase reprodutiva, os principais drenos são as flores e os frutos. (3) As conexões vasculares: as
folhas estão geralmente conectadas a órgãos superiores e inferiores dentro de um certo limite
de distância ao longo do eixo longitudinal da planta que depende da espécie, essa ligação é
chamada de orstóstico.
A perda de alguma folha, por predação ou poda, por exemplo, pode resultar em
modificações na rota de seiva. Nesse caso, se folhas dreno próximas a uma folha fonte for
perdida, as últimas poderão suprir folhas mais distantes com seiva elaborada. Isso ocorre
devido ao fato de, existirem interconexões vasculares em, ou anastomoses, entre as vias do
floema além das conexões diretas entre os órgãos.
Relações hídricas da folha
A folha tem papel fundamental no transporte de água ao longo de todo organismo da
planta. Do solo, a água é absorvida pelas raízes, passando pelo xilema radicular, xilema
caulinar e chegando à folha, onde a tensão superficial da água em evaporação nas paredes
das células do mesofilo gera um potencial hídrico intenso o suficiente para que a água seja
transportada até mesmo ao longo de grandes organismos como as arbóreas. Finalmente, a
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
1. Estrutura e Desenvolvimento
água atravessa os estômatos, presentes na epiderme foliar, e alcança a atmosfera.
Para se entender como é formada uma pressão negativa e intensa nas folhas capaz de
gerar potencial hídrico suficiente para mover a água em grandes distâncias, mesmo sob
influência da gravidade, é necessário o estudo da dinâmica da água no interior das folhas. No
mesofilo a água proveniente do xilema em contato com as células do parênquima e suas
respectivas paredes celulares forma interfaces curvas ar/água. À medida que a água evapora,
o raio dessas porções curvas da molécula diminui, o que resulta numa pressão negativa
segundo a equação:
Ψл = - 2T/r
Sendo T a tensão superficial da água (7,28 x 10 -8 MPa x m) e r, o raio das interfaces
curvas ar/água.
Após a evaporação, a água no espaço intercelular será perdida para a atmosfera
através do processo da difusão dado pela equação:
Js = - Ds x Δcs/Δx
Sendo que Ds é a densidade da água, Δcs é a variação da concentração de água entre
os locais onde ocorrerá o processo e Δx, a distância que será percorrida pela água. A esse
fenômeno dá-se o nome de transpiração, que pode ser dividido em dois outros fenômenos: a
transpiração cuticular, na qual a planta perde apenas 5% da água total pela cutícula e a
estomática, na qual a maior parte da água é perdida pelos estômatos.
A ocorrência da transpiração estomática depende de dois fatores. O primeiro é a diferença de
concentração do vapor d'água entre a atmosfera e as lacunas do mesofilo, sendo que esse
parâmetro varia com a temperatura. O segundo é a resistência à difusão que, por sua vez, é
composta por duas outras variáveis. A resistência à difusão pelo poro estomático,
denominada resistência estomática e a resistência da camada de ar estática que se forma ao
redor da folha, ou resistência da camada limítrofe.
Como a espessura da camada limítrofe e a temperatura da atmosfera não estão sob o
controle das plantas, o controle biológico em curto prazo da resistência estomática depende
exclusivamente da abertura e do fechamento dos estômatos.
A atividade estomática
Os estômatos são estruturas presentes nas plantas terrestres. Na maioria das espécies,
eles se distribuem, preferencialmente, na face abaxial da folha. Contudo, na maioria das
monocotiledôneas é observada uma densidade similar de estômatos nas faces adaxial e
abaxial. Os estômatos são formados pelas células-guarda que margeiam o poro estomático
(ostíolo) e em muitas espécies, essas são circundadas pelas células subsidiárias. As células-
guarda são classificadas em dois tipos: tipo elíptico, comum à maioria das plantas e outras do
tipo halter, encontradas, principalmente, nas gramíneas. A mudança no formato das células-
guarda está associada à parede espessa ao redor do ostíolo e a presença de microfibrilas de
celulose dispostas radialmente (tipo elíptico) ou obliquamente (tipo halter) ao poro
estomático. Dessa forma, quando túrgidas, há a abertura do ostíolo e quando flácidas, o poro
estomático se fecha. Esses processos ocorrem em resposta à entrada ou à saída de água das
células-guarda. Quando o poro estomático se abre, há um aumento na pressão hidrostática e
no potencial de turgor. Por outro lado, quando esse se fecha ocorre uma redução na pressão
de turgor e de suas paredes. Com o desenvolvimento das células-guarda são formadas as
câmaras subestomáticas no mesofilo foliar, adjacentes ao complexo estomático, cuja função
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BOTÂNICA NO INVERNO 2012
Apostila botanica no_inverno_2012
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Apostila botanica no_inverno_2012

  • 1.
  • 2.
  • 3. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS Organizadores Adne Abbud Righi Aline Tiemi Matsumura Aline Siqueira Nunes Beatriz Nogueira Torrano da Silva Carlos Eduardo Amancio Cintia Iha Emmanuelle da Silva Costa Janaína Morimoto Meyer José Hernandes Lopes Filho Kleber Alves Gomes Leonardo Hamachi Professor Responsável Cláudia Maria Furlan Autores Adne Abbud Righi Alejandra Matiz Lopez Alice Nagai Aline Tiemi Matsumura Aline Siqueira Nunes Andrés Ochoa C. Edgar Augusto César de Barros Tomba Beatriz Nogueira Torrano da Silva Bruna Silvestroni Pimentel Carmen Eusebia Palacios Jara Carlos Eduardo Amancio Carolina Angélica Araujo de Azevedo Carolina Krebs Kleingesinds Carolina Lopes Bastos Cintia Iha Emmanuelle da Silva Costa Fabio Nauer da Silva Fernanda Mendes de Rezende Giuliano Maselli Locosselli Guilherme Marcello Queiroga Cruz Janaína Morimoto Meyer Janaína Pires Santos Jenifer de Carvalho Lopes José Hernandes Lopes Filho Jonas Weissmann Gaiarsa Juliana Hanna Leite El Ottra Keyla Rodrigues Kleber Alves Gomes Leonardo Hamachi Lucas Macedo Felix Luiza Teixeira-Costa Mariane Souza Baena Mariana Crotti Franco Natália Ravanelli Paula Natália Pereira Paulo Tamaso Mioto Paulo Marcelo Rayner Oliveira Rafael Cruz Sarah Aparecida Soares Vitor Barão São Paulo 2012
  • 4. Botânica no Inverno 2012 / Org. de Adne Abbud Righi...[et al.]. – São Paulo : Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, 2012. 183 p. : il. ISBN 978-85-85658-29-8 1. Botânica. 2. Extensão. 3. Pós-Graduação. I. Righi, Adne Abbud. II. Título.
  • 5. Índice Índice...............................................................................................................................i Apresentação.................................................................................................................iii 1 Estrutura e Desenvolvimento.............................................................................................1 Estrutura e desenvolvimento da raiz..............................................................................3 O Caule: um enfoque na atividade cambial.................................................................11 Folha: desenvolvimento, estrutura e função................................................................23 Estruturas reprodutivas em angiospermas..................................................................43 Fitormônios no desenvolvimento vegetal.....................................................................55 Metabolismo Secundário..............................................................................................57 2 Diversidade e Evolução....................................................................................................65 Interações Planta-Ambiente.........................................................................................67 Interação Planta-Planta................................................................................................77 Plantas Parasitas..........................................................................................................83 A origem do cloroplasto e a evolução dos eucariontes fotossintetizantes..................89 Biodiversidade e Ecologia de Macroalgas Marinhas Brasileiras.................................97 Estratégias de defesa antioxidantes em macroalgas................................................105 O trabalho na taxonomia vegetal e seus principais métodos.....................................111 3 Recursos.........................................................................................................................117 Estrutura genômica, sequenciamento e elementos de transposição........................119 Biomassa como Fonte de Energia: Biocombustíveis.................................................127 Bioinformática.............................................................................................................133 Organismos Geneticamente Modificados no contexto da Botânica..........................139 Organismos geneticamente codificados e a cultura de tecidos.................................147 Biologia Sintética........................................................................................................155 Plantas e Sociedade...................................................................................................159 Ficocolóides: Polissacarídeos das algas marinhas...................................................169 i BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 7. Apresentação O Departamento de Botânica do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP) é cenário de constante aprendizado, troca de conhecimentos, fluxo intenso de alunos de graduação e pós-graduação e muitas, muitas histórias!!! Desde professores eternizados em nomes de plantas aos recém-contratados (que já começam a deixar seus vestígios pelos andares), todos, em uníssono aos alunos de pós-graduação, buscam contribuir para o desenvolvimento cada vez maior da nossa segunda casa! E por que não tornar nossa casa mais acolhedora nos gélidos dias de inverno da capital paulista? E por que não alunos de pós-graduação tornarem-se “professores” e “orientadores” por 15 dias apresentando as diversas linhas de pesquisas desenvolvidas ao longo de tantos anos? Assim começou um curso de extensão universitária do departamento: ‘Botânica no Inverno’. Na primeira edição do curso a iniciativa dos alunos de pós-graduação logo teve apoio unânime dos docentes do departamento de Botânica, bem como do então diretor do IB-USP, Prof. Dr. Wellington Braz Carvalho Delitti. O empenho de todos (professores e alunos) durante a primeira edição foi tamanha que culminou em enorme sucesso! Neste ano de 2012 contamos com apoio de toda equipe do IB, o atual diretor Prof. Dr. Carlos E. F. da Rocha, o coordenador da pós-graduação Prof. Dr. Renato de Mello-Silva, a chefe do departamento Profa. Dra. Marie-Anne Van Sluys, bem como dos demais docentes, funcionários e discentes. O resultado deste entrosamento de sucesso extrapolou as vagas oferecidas. Contamos com 449 inscritos de quase todo território nacional!!! E também alcançamos outros países da América Latina!! Além de promover o contato dos alunos de graduação e recém-graduados com laboratórios e linhas de pesquisa do Departamento de Botânica IB- USP, o curso busca revisar, com os alunos de graduação e recém-graduados, conceitos fundamentais de Anatomia Vegetal, Sistemática e Taxonomia, Fisiologia Vegetal, Ficologia, Biologia Molecular, Biologia Celular e Fitoquímica, e ressaltar as intercomunicações de cada sub- área! E, finalmente, o “Botânica no Inverno” é uma tentativa de auxiliar futuros acadêmicos e interessados na área a elaborar perguntas científicas relevantes nos diversos campos da Botânica, tendo em mente sua aplicação em pesquisa científica de base ou aplicada. Desejamos a todos um excelente aproveitamento do curso e seus desdobramentos!!! Comissão Organizadora do II Botânica no Inverno iii BOTÂNICA NO INVERNO 2012
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  • 9. Estrutura e Desenvolvimento 1 Estrutura e Desenvolvimento 1 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
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  • 11. Estrutura e desenvolvimento da raiz Estrutura e desenvolvimento da raiz Aline Tiemi Matsumura Paulo Marcelo Rayner Oliveira Na condição de organismos sésseis, os vegetais apresentam limitações nos mecanismos de fuga, na capacidade de luta, na aquisição de recursos hídricos e nutrientes, além de outras condições adversas impostas pelo ambiente circundante. Dentre estas condições destacam-se os fatores nutricional e hídrico. Em geral as plantas retiram grande parte dos nutrientes do solo, assim como a água. Em grande parte das plantas, a principal região responsável pela absorção de água e nutrientes é o sistema radicular. Ele também é responsável pelo armazenamento e condução destes, além de ter como função a fixação da planta em seu substrato. Entretanto, cabe ressaltar que, dependendo da espécie, bem como seu habitat, a raiz pode perder parte de suas funções ou adquirir novas. Podemos citar como exemplo as plantas epífitas (como diversos membros da família Bromelliaceae), as quais possuem um sistema radicular rudimentar que confere apenas sustentação, sendo assim toda parte de absorção de água e nutrientes realizada por outros órgãos como folhas e caule. Em alguns casos extremos como no caso de algumas orchidaceaes, a parte aérea da planta é reduzida a tal ponto que as raízes são as responsáveis pela fotossíntese. O crescimento e desenvolvimento do sistema radicular pode sofrer influência de vários estímulos ambientais tais como a gravidade, luz, umidade, nutrientes, temperatura e resistência física do solo. Dessa forma, a planta deve apresentar características que lhe permitam adaptar-se às condições ambientais impostas, garantindo o máximo de vantagem para seu crescimento e desenvolvimento. Desde o estudo pioneiro de Darwin (1880), estudos fisiológicos e anatômicos acerca do comportamento da raiz modulados por estímulos físicos vêm sendo realizados. É fato que nas plantas praticamente todos os eventos relacionados ao crescimento e desenvolvimento são regulados por pequenas moléculas orgânicas coletivamente denominadas fitormônios, sendo os principais as auxinas, citocininas, giberelinas, ácido abscísico e o etileno. Ao contrario dos animais, não existem nas plantas órgãos especializados para a biossíntese hormonal, embora possam existir diferenças na capacidade biossintética de cada órgão. Os efeitos dessas moléculas podem ser altamente complexos, pois uma única célula pode responder a vários hormônios simultaneamente e um único hormônio pode atuar em vários tipos de tecido. Desenvolvimento do sistema radicular A raiz é um órgão que tem sua formação ainda no estágio embrionário da planta. Esta raiz embrionária é chamada de radícula, que surge através da diferenciação celular que origina o eixo hipocótilo/radícula. Após a germinação e a emergência da radícula, tem início o desenvolvimento e o crescimento do órgão. A raiz pode ser dividida em três partes: a zona meristemática, zona de alongamento e zona de maturação. A origem destes tecidos está em um grupo de células localizados no meristema apical da raiz, denominado centro quiescente – região com células de baixa taxa mitótica – que é circundado por uma camada de células que apresentam altas taxas de 3 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 12. 1. Estrutura e Desenvolvimento divisões mitóticas. Acima deste grupo de células inicia-se a diferenciação nos diferentes tecidos da raiz de acordo com sua posição. Abaixo do centro quiescente forma-se a coifa, um tecido de consistência mucilaginosa com função de proteção do meristema apical radicular. A zona meristemática é a região responsável pelo crescimento do órgão. É constituída pela protoderme, meristema fundamental e procâmbio, que dão origem, respectivamente, à epiderme, córtex e ao cilindro vascular. A epiderme é o tecido de revestimento da raiz. Acima da zona de divisão celular (quando o xilema se encontra parcialmente maduro) ocorre a expansão das células epidérmicas em pelos radiculares, que aumentam a superfície de contato otimizando a absorção. O córtex origina a exoderme (abaixo da epiderme) e a endoderme (camada mais interna), esta última apresentando uma faixa de suberina denominada estria de Caspary, responsável por impedir a passagem de água e solutos entre as células. Tanto a epiderme quanto o córtex são perdidos em plantas que apresentam crescimento secundário. No cilindro vascular o tecido mais externo é o periciclo, de onde se originam as raízes laterais. A maturação tanto do xilema quanto do floema é centrípeta. O xilema forma projeções em direção ao periciclo (protoxilema) e diferencia-se em metaxilema no centro. Os polos de protoxilema se revezam na extremidade com o protofloema. Em alguns casos, quando o xilema não se diferencia no centro este é ocupado pela medula (tecido meristemático). Figura 1 - Esquema geral dos tecidos da raiz primária. Ao lado direito esquema simplificado de um corte transversal na zona meristemática (abaixo) e após a maturação dos tecidos vasculares (acima). Sabe-se que o crescimento radicular deriva-se de dois eventos primários básicos: de um lado as divisões das celulares meristemáticas apicais, e de outro pelo processo de 4 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 13. Estrutura e desenvolvimento da raiz alongamento das células filhas. No nível físico das células o alongamento celular é direcionado pela interação entre a turgescência e a expansão da parede celular, evento este mediado pelo hormônio auxina. A auxina é tida como hormônio do crescimento, por ser uma das suas principais funções. Na raiz, sua atuação pode variar de acordo com o local em questão. Na região apical, a auxina atua no controle do processo de divisão das células que circundam o centro quiescente e na diferenciação celular. No entanto na zona de alongamento, como o próprio nome sugere, a auxina desempenha o seu papel principal que é promover o alongamento das células. Além disso, a auxina participa na organogênese. No sistema radicular este hormônio promove a iniciação das raízes laterais. Este processo ocorre a partir do transporte polar de forma basípeta deste hormônio, ou seja, da parte aérea para a parte radicular. Este transporte é feito através de transportadores que promovem dois eventos, o influxo e o efluxo. O influxo de auxina é mediado por proteínas denominadas AUX/LAX, enquanto que o efluxo é mediado por proteínas denominadas PIN. Sabe-se que a auxina induz a síntese de um outro hormônio chamado etileno, que se apresenta na forma de gás. Em virtude do transporte polar da auxina, ocorre um aumento no gradiente de deste hormônio, induzindo por sua vez a síntese de etileno. Isto gera um acúmulo de etileno na região próxima ao meristema. Por consequência, tem-se uma redução na capacidade de difusão da auxina ocasionando também um acúmulo deste hormônio na região. Em resposta a este acúmulo de auxina algumas células do periciclo, responsivas a este hormônio, entram em processo de divisão e diferenciação, dando origem ao primórdio radicular. Entretanto, não somente a auxina e o etileno participam deste processo, sendo outro hormônio participante a citocinina. Na raiz este hormônio atua de forma antagônica à auxina. Isso impede que uma quantidade de auxina além do necessário chegue ao ápice meristemático e provoque fortes alterações na região. Todavia vale lembrar que o antagonismo ou a sinergia entre a auxina e a citocinina é dependente do balanço endógeno destes dois hormônios. Sabe-se que o principal centro produtor de citocinina na planta são as raízes, da mesma forma que acontece com o ácido abscísico (ABA). O ABA é uma molécula produzida principalmente quando a planta se encontra em uma situação que possa comprometer o seu crescimento e/ou desenvolvimento como, por exemplo, submetida ao déficit hídrico, altas concentrações de sal, baixas temperaturas, entre outros. Uma das mais clássicas atuações do ácido abscísico é a sinalização para o fechamento estomático. Coordenação no crescimento do sistema radicular Ao fazer uma analise comparativa entre a parte aérea e a parte radicular, é notável a existência de eventos bastante similares como, por exemplo, os tropismos. Dentre todos serão destacados o gravitropismo (crescimento em resposta à gravidade), o tigmotropismo (crescimento em resposta ao toque, ou seja, resposta às barreiras mecânicas) e o hidrotropismo (crescimento em resposta aos níveis de água disponíveis). Em uma primeira análise temos o hidrotropismo, que é o crescimento direcionado a regiões com maior conteúdo disponível de água. Nesta mesma vertente, temos o tigmotropismo, que é o direcionamento do crescimento em sentido contrário a barreiras 5 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 14. 1. Estrutura e Desenvolvimento mecânicas como solos compactados, rochas ou até mesmo raízes de outras plantas. De um modo mais detalhado temos o gravitropismo. A percepção do estímulo gravitrópico é medida pelos estatólitos, amiloplastos especializados na percepção do estímulo gravitacional. Da mesma forma, existem células especializadas na percepção da gravidade, as quais alocam os estatólitos, denominadas estatócitos. Basicamente, a percepção do estímulo à resposta gravitrópica é gerenciada pela sedimentação dos estatólitos na superfície inferior dos estatócitos. Estas estruturas estão presentes principalmente na coifa. O principal hormônio que atua na resposta gravitrópica é a auxina. Até onde se sabe, o transporte lateral da auxina gera uma taxa de alongamento celular diferenciada. Em síntese, o lado onde há uma menor concentração de auxina cresce mais do que o lado de maior concentração. Isso ocorre devido ao fato de que a concentração hormonal que induz o alongamento celular estaria supra-ótimo, acarretando uma inibição do alongamento celular e, consequentemente, moldando a raiz e gerando uma curvatura que vai direcionar o crescimento do órgão. Outro elemento que também parece ser um fator bastante importante é o nível de cálcio. Acredita se que o cálcio possa provocar um rearranjo dos transportadores de auxina, direcionando o fluxo deste hormônio para a parte inferior da raiz, resultando na resposta gravitrópica. Com tudo isso, é notável a complexidade do processo de crescimento e desenvolvimento do sistema radicular. Ainda há muito a se fazer para que novos avanços sejam feitos e uma gama de dúvidas sejam solucionadas no que se refere aos processos fisiológicos envolvidos na morfologia e anatomia das raízes, assim como as interações ambientais que medeiam tais processos. Absorção de água e manutenção do potencial hídrico em raízes Diversos eventos da planta dependem da absorção e transporte de água. A água possui propriedade polar que a torna um excelente solvente. Além disso, ela permite a estabilidade da temperatura da planta, já que a água exige uma alta energia para sua temperatura ser alterada. A transpiração (evaporação das moléculas da superfície que acumulam energia do sol) também é um importante componente para a termorregulação das plantas, necessária também para absorção de CO2 e transporte de nutrientes. A água se direciona no solo e na planta guiada pelo potencial hídrico. O potencial hídrico é a energia potencial da água em relação a um estado padrão. A água migra de uma região de maior potencial para uma menor. O potencial hídrico é a soma do potencial de massa ou pressão hidrostática (depende do volume de água em um mesmo espaço; é positiva quando a células está túrgida, por exemplo) e o potencial de soluto ou pressão osmótica (quanto maior a concentração de soluto menor o valor, pois ele reduz a energia da água). Como citado anteriormente, as raízes possuem pelos que aumentam a superfície de absorção. Em geral, a absorção é maior nos tecidos próximos aos ápices (tecido mais jovem), permitindo que novas raízes sejam capazes de buscar e absorver água. Uma vez dentro da raiz a água pode entrar pela raiz de 3 formas (ver figura 2): • Apoplástica: neste caso, a água não atravessa membranas, passando pelas paredes celulares ou qualquer espaço extracelular. • Simplástica: a água passa via plasmodesmas (extensões da membrana que conectam os 6 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 15. Estrutura e desenvolvimento da raiz citoplasmas da célula). • Transmembrânica: a água atravessa a membrana semipermeável, sem o auxílio de plasmodesmas. Ao chegar na endoderme, a água deve passar obrigatoriamente pela estria de Caspary, já mencionada, que impede o transporte via apoplasto, forçando a passagem pela membrana plasmática. Uma vez no xilema, ela é encaminhada para as folhas, por onde é perdida na forma de vapor pelo estômato. Os espaços intercelulares na mesofilo (ver capítulo de Folha) facilitam o direcionamento da água contra a gravidade, pois geram uma diferença de potencial hídrico. O xilema facilita o transporte porque suas células sofrem morte programada e espessamento da parede, permitindo que a planta suporte altas pressões. As células são conectadas via pontoações (falta de parede secundária que permite a conexão entre células via plasmodesmas), facilitando a passagem de água. Quando o ar consegue passar pela endoderme pode ocorrer interrupção do fluxo de água (cavitação), neste caso ela passa por outra conexão da célula adjacente. Um fenômeno comum durante a noite é a pressão positiva da raiz. Neste caso, as raízes acumulam solutos no xilema, forçando a água a migrar para dentro pelo potencial de soluto. Essa pressão gerada pode desobstruir as células que sofreram cavitação. Esse fenômeno pode ser observado nas folhas no início do dia, quando a seiva do xilema é exsudada pelos poros nas folhas. Absorção e transporte de nutrientes Além de transportar água, as raízes também transportam outros nutrientes juntos. Podemos separá-los em orgânicos (mais utilizado na agricultura) e inorgânicos. Os nutrientes inorgânicos são mais comuns no solo, pois em geral a presença de diversos microorganismos que competem pelos nutrientes orgânicos os tornam menos disponíveis. Os principais nutrientes para as plantas, considerados essenciais por participarem do metabolismo ou estrutura da planta, podem ser classificados em macronutrientes, presentes em grandes concentrações no tecido vegetal (N, K, Ca, Mg, P, S e Si) e micronutrientes, necessários em menores concentrações (Cl, Fe, B, Mn, Na, 7 BOTÂNICA NO INVERNO 2012 Figura 2: Possíveis rotas de absorção de água.
  • 16. 1. Estrutura e Desenvolvimento Zn, Cu, Ni, Mo). Os obtidos pelo gás carbônico ou água geralmente não entram nesta classificação (C, O, N). A falta ou excesso destes nutrientes costumam acarretar sintomas na planta. Reconhecer qual mineral está provocando o distúrbio na planta é essencial para a agricultura, entretanto, não é algo tão simples, na medida em que a falta de um componente pode induzir deficiência ou acúmulo de outro no organismo. No caso da deficiência, uma pista importante é a mobilidade dos nutrientes na planta, pois os imóveis geram deficiência local enquanto os móveis são visíveis em tecidos mais velhos, já que eles remobilizam os nutrientes escassos para os tecidos jovens. Dependendo da espécie e do nutriente, podem existir diferenças de qual região cada um deles é absorvido pela raiz. A morfologia da raiz também depende da disponibilidade destes nutrientes. Sabe-se que o nitrogênio e o fósforo são os principais macronutrientes limitantes ao crescimento. A disponibilidade de nitrogênio e fósforo podem alterar a arquitetura da raiz inibindo ou promovendo o crescimento da raiz principal e o crescimento e formação de raízes laterais. Em Arabidopsis thaliana, altas concentrações globais de nitrogênio inibem o crescimento tanto da raiz primária como laterais, enquanto sua falta promove o alongamento de raízes laterais. Entretanto, altas concentrações locais são capazes de promoverem o crescimento da raiz lateral. Cabe ressaltar que o efeito da falta ou excesso de nitrogênio depende da sua fonte (nitrato, amônio, compostos orgânicos etc), do ambiente e da espécie de planta a ser estudada. O principal hormônio envolvido neste processo é a citocinina, que sinaliza o estado nutricional da planta para a parte aérea, desta forma modulando seu crescimento em função da disponibilidade de nitrogênio. O excesso de fósforo promove o desenvolvimento da raiz primária, enquanto sua falta promove o desenvolvimento de raízes laterais. Como o fósforo é um nutriente de baixa mobilidade, sua disponibilidade no solo é reduzida, justificando as mudanças que sua falta causa na arquitetura da raiz. Entretanto, pouco se sabe ainda sobre os mecanismos de regulação envolvidos neste processo. Dependendo do ambiente, as plantas possuem algumas adaptações para captação de nutrientes. Um exemplo são plantas carnívoras, que obtém os nutrientes escassos no solo através de armadilhas que capturam pequenos animais. Outro são plantas que se associam com fungos ou bactérias. Em troca de carboidratos, as plantas recebem nutrientes ou água, caracterizando uma relação simbiótica. A associação com fungos é denominada micorriza, ocorre em condições naturais e é distribuída em quase todos os grupos. Já na associação com bactérias o caso mais comum são o das plantas leguminosas, que formam nódulos nas raízes da planta hospedeira e fornecem compostos nitrogenados fixados do ar atmosférico. A nível celular, os nutrientes entram nas células vegetais através de proteínas transportadoras. Apenas a água e muito raramente íons são capazes de atravessar as camadas de fosfolipideos, o restante sendo transportado por proteínas inseridas nestas camadas. O transporte pode ocorrer por 3 formas: • Dependente de energia (ATP), sendo chamadas de ATPases ou bombas de ATP. • Canais, ou proteínas transmembranas nas quais moléculas e íons podem se difundir. • Cotransportadores, proteínas que não atravessam completamente a membrana e são mais seletivos. O transporte por canais é sempre passivo, ou seja, sem gasto de energia. A única forma de regulação é a abertura e o fechamento, que dependem de sinais como luz ou hormônios. Um canal muito estudado são as aquaporinas, que permitem a passagem de água para dentro das células de forma acelerada. Sabe-se atualmente que elas não são específicas para moléculas de água, podendo transportar desde 8 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 17. Estrutura e desenvolvimento da raiz gases a pequenas moléculas de outras substâncias, como a uréia. O transporte por cotransportadores dependem da sua ligação com o substrato. Em geral, a taxa de transporte neste caso é muito mais lenta que seu transporte pelo canal. A ligação do soluto gera uma mudança na conformação na membrana, permitindo sua entrada na célula. O transporte pode ser passivo ou ativo. No transporte ativo a molécula entra na célula contra o seu gradiente de concentração. A energia vem de uma diferença de potencial elétrico ou químico, provindo de um segundo soluto. Em geral, o nitrato, o cloro, o fosfato e o sulfato entram na célula por transporte ativo, enquanto o sódio, magnésio e cálcio entram de forma passiva. Bibliografia Chrispeels, M.J.; Crawford, N.M. & Schroeder, J.I. 1999. Proteins for Transport of Water and Mineral Nutrients across the Membranes of Plant Cells. The Plant Cell. v. 11. p. 661-675. Fan, L. et al. 2006. Progressive Inhibition by Water Deficit of Cell Wall Extensibility and Growth along the Elongation Zone of Maize Roots Is Related to Increased Lignin Metabolism and Progressive Stelar Accumulation of Wall Phenolics. Plant. Physiol. v. 140. p. 603-612. Mochizuki, S. et al. 2005. The Arabidopsis WAVY GROWTH 2 Protein Modulates Root Bending in Response to Environmental Stimuli. Plant Cell. v. 17. p. 537-547. Osmont, K.S.; Sibout, R. & Hardtke, C.S. 2007. Hidden Branches: Developments in Root System Architecture. Annu. Rev. Plant Biol. v. 58. p. 93–113. Spartz, A. K.; Gray, W. M. 2008. Plant hormone receptors: new perspective. Genes Dev. v. 22(16). p. 2139-2148. Stepanova, A. N. et al. 2007. Multilevel Interactions between Ethylene and Auxin in Arabidopsis Roots. The Plant Cell. v. 19. p. 2169-2185. Vanneste, S.; Friml, J. 2009. Auxin: A trigger for change in plant development. Cell. v. 136. p. 1005-1016. Verslues, P. E. et al. 2006. Methods and concepts in quantifying resistance to drought, salt and freezing, abiótic stresses that affect plant water status. The Plant Journal. v. 45. p. 523-539. Walter, A.; Schurr, U. 2005. Dynamics of Leaf and Root Growth: Endogenous Control versus Environmental Impact. Annals of Botany. v. 95. p. 891-900. Livros didáticos Esau, K. 1898. Anatomia das plantas com sementes; tradução: Berta Lange de Morretes. São Paulo, Edgard Blücher, 1974, 1976 reimpressão. Kerbauy, G.B. 2008. Fisiologia Vegetal. 2 ed. Guanabara Koogan. Taiz, L.; Zeiger, E. 2009. Fisiologia Vegetal. 4 ed. Artmed. 9 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 18.
  • 19. O Caule: um enfoque na atividade cambial O Caule: um enfoque na atividade cambial Carolina Lopes Bastos Giuliano Locosselli Seja ele uma estrutura de morfologia complexa, com diferentes padrões anatômicos e múltiplas funções, ou apenas um órgão de sustentação para as porções fotossintetizantes e reprodutivas das plantas, o caule é uma estrutura de grande importância no contexto da biologia vegetal. São diversos os estudos da anatomia, fisiologia, e morfologia externa deste órgão, que pode estar altamente modificado em sua estrutura, assumir função fotossintetizante, crescer em espessura e formar madeira, ou continuar herbáceo durante todo o desenvolvimento da planta. Neste capítulo, algumas características caulinares serão abordadas, com um enfoque na atividade do câmbio vascular, seja ela padrão ou variante, e nos hormônios responsáveis por essa atividade, bem como no registro dendrocronológico da atividade deste tecido tão importante. Crescimento primário O caule em crescimento primário é formado por três sistemas de tecidos: dérmico, constituído pela epiderme; fundamental, que no caule corresponde ao córtex, composto por parênquima, colênquima e/ou esclerênquima, e à medula, formada principalmente por parênquima medular; e o vascular, composto por xilema e floema primários (Esau, 1974). No caule, a epiderme permanence como tecido de revestimento até que seja substituída pela periderme em plantas com crescimento em espessura (crescimento secundário) ou se mantém dessa forma durante todo o desenvolvimento do vegetal, em plantas herbáceas. O córtex caulinar começa logo abaixo da epiderme e tem no periciclo (a camada mais externa do cilindro vascular) o seu limite; pode ser composto por células parênquimáticas, geralmente com cloroplastos; um colênquima também pode estar presente, em geral externo ao parênquima, com espessamentos na parede primária de diversos tipos em suas células; e em alguns grupos, pode haver esclerênquima no córtex, ou mesmo esclereídes de diversos tipos dispersos por esta região do caule. A endoderme também está presente no caule, com ou sem estria de Caspary, como a camada mais interna do córtex. Já a medula é formada por células parenquimáticas em maioria, com espaços intercelulares amplos em geral, e pode conter também estruturas secretoras, como também pode ocorrer no córtex (Esau, 1974). O cilindro vascular caulinar é composto por xilema e floema primários, bem como periciclo, neste estágio do desenvolvimento do vegetal. A forma como estes tecidos estão organizados no cilindro vascular, desde o periciclo até a medula, quando presente, é conhecida por estelo, e permite-nos esquematizar a estrutura do caule e da raiz em crescimento primário, além de estudar comparativamente a diversidade desta estruturação. 11 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 20. 1. Estrutura e Desenvolvimento Figura 1 - Esquema exemplificando dois dos tipos de estelos mais comuns em Dicotiledôneas e Monocotiledôneas. Note que existem mais tipos de estelos para ambos os grupos, como protostelos, do tipo haplostelo, actinostelo e plectostelo, sifonostelos ectoflóicos e anfiflóicos, dictiostelos, atactostelos, etc., que não foram mostrados no esquema com fins de simplificação (Esquema: Bastos, CL). Atividade cambial Com a colonização do ambiente terrestre pelas plantas, uma série de mudanças estruturais e funcionais ocorreu nos vegetais. Devido à imobilidade e às novas demandas ambientais, sistemas de proteção contra a dessecação, de absorção de água e nutrientes do solo, de transporte eficiente de assimilados e suporte mecânico se desenvolveram. O sistema vascular foi uma das principais inovações para o sucesso do estabelecimento e expansão das plantas superiores. Nas dicotiledôneas lenhosas e coníferas, o xilema e floema secundários são produzidos pela atividade do meristema lateral denominado câmbio. O câmbio é formado por uma camada de células denominadas iniciais cambiais, que são divididas em duas categorias, as iniciais fusiformes e as radiais. As iniciais fusiformes são células alongadas no eixo axial, que se dividem e formam as células do sistema axial pertencentes ao floema e ao xilema. No floema, as células derivadas das iniciais fusiformes formarão os elementos de tubo crivado, células companheiras e células parenquimáticas em dicotiledôneas lenhosas, e células crivadas, células de Strasburger e células parenquimáticas em coníferas. Já no xilema, as iniciais fusiformes formarão elementos de vaso, fibras e células do parênquima axial nas dicotiledôneas lenhosas e traqueídes e células do parênquima axial nas coníferas. Por outro lado, as iniciais radiais formarão as células que compõem o raio parenquimático, tanto nas dicotiledôneas lenhosas quanto nas coníferas. Estas células especializadas que se originaram a partir das iniciais cambiais possuem 12 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 21. O Caule: um enfoque na atividade cambial um importante papel na manutenção das espécies no ambiente terrestre. Elas garantem a condução contínua de água desde o solo até as folhas, permitem que os foto-assimilados possam ser transportados a diferentes partes do vegetal e ainda garantem o suporte mecânico de toda a porção aérea das plantas. Variações cambiais Tipos de variações Além de sua atividade padrão no caule, de produção de células do xilema secundário para o interior do órgão e células do floema secundário para o exterior, o câmbio vascular pode desempenhar sua função de outras formas, ou mesmo estar ativo em vários locais ao mesmo tempo. As variações cambiais podem ser de vários tipos, e podem ocorrer em árvores, como Avicennia (Acanthaceae), arbustos (algumas espécies de Bignonicaeae, Menispermaceae, etc), herbáceas (a raiz da beterraba, Beta vulgaris (Amaranthaceae), por exemplo), mas principalmente em lianas (a ordem Fabales, Sapindaceae, Bignoniaceae, Malphighiaceae, Menispermaceae, Apocinaceae, Rubiaceae, Icacinaceae, Acanthaceae, entre outras famílias) (Esau, (1974), Angyalossy et al. (2012)). As variações cambiais estão presentes ao longo da filogenia das plantas vasculares, segundo Angyalossy e colaboradores (2012), sendo encontradas desde Gnetales até Magnoliídeas e Eudicotiledôneas, mas de formas diferentes em cada grupo. As variações cambiais são divididas em dois grupos principais: variações originadas de um único câmbio, ou aquelas advindas de múltiplos câmbios (Angyalossy et al., 2012). No primeiro tipo, em que apenas um câmbio é responsável pela variação encontrada, temos ainda subtipos (Angyalossy et al., 2012): a) Câmbio regular, com atividade normal, mas com conformação irregular ou desigual, gerando um caule de formato irregular. Famílias em que ocorre: Apocynaceae, Leguminosae and Rubiaceae. Figura 2. Aspidosperma sp. (Apocynaceae) e outra liana ilustram a variação cambial produzida por um único câmbio de produção padrão mas forma irregular (Fotos: Bastos, CL, material gentilmente cedido por Angyalossy, V) b) Xilema interrompido por arcos ou cunhas de floema. Famílias em que ocorre: Bignoniaceae, Celastraceae, Malpighiaceae e Icacinaceae. 13 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 22. 1. Estrutura e Desenvolvimento Figura 3. Lianas de Bignoniaceae ilustrando a variação cambial do tipo cunhas de floema (Fotos: Bastos, CL, material gentilmente cedido por Angyalossy, V). c) Segmentos compostos por elementos axiais do xilema e do floema separados por largas porções de raios floemáticos e xilemáticos. Famílias em que ocorre: Aristolochiaceae e Menispermaceae. Figura 4. Exemplo de lianas com variação cambial em que o xilema e o floema ficam segmentados, por conta dos largos raios. À esquerda, Aristolochiaceae, e à direita, outra liana com a mesma estruturação (Fotos: Bastos, CL, material gentilmente cedido por Angyalossy, V). d) Floema incluso no xilema, derivado de um único câmbio. Família em que ocorre: Acanthaceae. 14 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 23. O Caule: um enfoque na atividade cambial Figura 5 - Esquema ilustrando um caule com floema incluso (Esquema: Bastos, CL) No segundo tipo, em que múltiplos câmbios são responsáveis pela formação da variação encontrada, existem dois sub-tipos, segundo Angyalossy et al. (2012): a) Câmbios sucessivos. Famílias em que ocorre: lianas de Menispermaceae e algumas Fabales. Figura 6. Exemplos de câmbios sucessivos em uma Leguminosa (esquerda) e outra liana em que este tipo também ocorre (Fotos: Bastos, CL, material gentilmente cedido por Angyalossy, V). b) Cilindros vasculares compostos. Família em que ocorre: exclusivo de Sapindaceae. Figura 7. Caules compostos em Sapindaceae (Fotos: Bastos, CL, material gentilmente cedido por Angyalossy, V). 15 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 24. 1. Estrutura e Desenvolvimento Podem acontecer também combinações de mais de um tipo de variação cambial. Alguns exemplos citados por Angyalossy et al. (2012) são: Bignoniaceae e Malpighiaceae com cunhas de floema e partes do xilema dispersas por proliferação de parênquima; em Piperaceae, elementos vasculares axiais em segmentos combinados a cilindros secundários externos, entre outros exemplos. Figura 8 - Exemplo de combinação de variações cambiais em Leguminosae. Caule de formato irregular (achatado) e com câmbios sucessivos (Fotos: Bastos, CL, material gentilmente cedido por Angyalossy, V) Cabe ressaltar que, para algumas famílias, algumas variações cambiais podem ser utilizadas para fins taxonômicos, como acontece em Sapindaceae, Menispermaceae, e lianas de Bignoniaceae (Angyalossy et al., 2012). A fisiologia da variação cambial: injúrias e flexibilidade Como já mencionado acima, as variações cambiais são mais comuns em lianas que em espécies de qualquer outro hábito. Enquanto a maioria das árvores exibe um modelo padrão de crescimento secundário, com um único câmbio produzindo floema para o exterior e xilema para o interior, as lianas apresentam várias configurações vasculares alternativas (Schenck, 1893; Pfeiffer, 1926; Obaton, 1960). Em estudos realizados por Putz & Holbrook (1991), comparando-se lianas e plântulas de espécies arbóreas, as lianas mostraram-se três vezes mais flexíveis em experimentos de torção que as arbóreas. A capacidade das lianas de manter o xilema funcional após uma deformação (sua resistência), também foi muito maior nas lianas que em espécies arbóreas (Putz & Holbrook, 1991). A compartimentalização dos caules das lianas, onde tecidos lignificados, relativamente inflexíveis, estão associados a tecidos não lignificados (macios), pode permitir às lianas funcionar mais como cabos do que como cilindros sólidos (Obaton, 1960; Putz & Holbrook, 1991), garantindo flexibilidade e maior resistência à dobras e contorções que ocorrem durante seu crescimento em direção ao dossel (Ewers & Fisher, 1991) Em uma revisão de trabalhos acerca de injúrias naturais ou induzidas experimentalmente em caules de lianas, Fisher & Ewers (1991) atestaram que esta anatomia caulinar “anômala” de algumas famílias permite a divisão ordenada do caule e a rápida reparação de interrupções vasculares causadas por injúrias, além do aumento da flexibilidade já comentada. Ou seja, a presença de variações cambiais pode ser associada a diversas funções nos vegetais; além das já citadas, podemos adicionar a melhor condução de fotossintatos (Pace et al., 2011) e o desenvolvimento xilemático (Lima et al., 2010). 16 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 25. O Caule: um enfoque na atividade cambial Controle hormonal da atividade cambial Como em todo processo de desenvolvimento, a atividade cambial é finamente regulada pelos sinais hormonais. A atividade cambial é sinalizada pela presença integrada de, principalmente, auxina (AIA) giberelinas (GA) e citocininas. Cada um destes hormônios é produzido em uma parte da planta e é transportado até a região cambial, onde modulará a atividade deste meristema secundário. A auxina é produzida especialmente pelas folhas jovens. Este hormônio move-se de forma polarizada nos tecidos vasculares, em especial, através do câmbio e elementos vasculares em diferenciação. O movimento basípeto da auxina cria um gradiente de concentração ao longo do câmbio, sendo as regiões mais próximas a fonte, as com a maior concentração, e as mais distantes, com a menor contração de auxina. A auxina é um dos principais hormônios responsáveis pela atividade cambial. A presença deste hormônio induz o início das divisões celulares das iniciais cambiais. O desenvolvimento das células derivadas, provenientes da divisão das iniciais cambiais, e as características das células maduras depende pode depender da ação de outros hormônios, que somente agem na presença da auxina. Os produtos da atividade cambial, floema e xilema secundários, dependem da concentração da auxina na zona cambial. Altas concentrações de auxina determinam a produção de floema preferencialmente. Por outro lado, concentrações menores de auxina resultam numa produção maior de xilema. Diferenças nas concentrações de auxina, além de determinar o produto da atividade cambial, também influenciam as características das células produzidas. Uma concentração relativamente maior de auxina estimula o rápido amadurecimento das células produzidas pelo cambio, o que significa uma deposição acelerada da parede secundária e lignina. Com a deposição da lignina, a expansão celular fica mais restrita já que diminui a plasticidade das células derivadas. Como um resultado do estimulo do amadurecimento das células, o gradiente de concetração de auxina, desde a fonte até os drenos, resulta num gradiente de variação dos tamanhos das células produzidas pelo câmbio, em especial as células condutoras do xilema. 17 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 26. 1. Estrutura e Desenvolvimento Figura 9 - Esquematização do gradiente de concentração de auxina dentro de uma árvore, desde a fonte aos drenos. A) Representação de uma árvore, contendo a copa, o tronco principal e as raízes. B) Representação da do gradiente de concentração de auxina. C) Representação da variação das dimensões dos elementos de vaso em diferentes porções do xilema, conforme o gradiente de concentração de auxina. Já as giberelinas são produzidas pelas folhas maduras, e são transportadas através do floema para outros órgãos das plantas. As giberelinas possuem um importante papel no estimula da atividade cambial, sendo relacionada à formação e ao desenvolvimento de fibras no xilema. Uma maior concentração de giberelinas estimula a formação de uma maior quantidade de fibras a partir das iniciais cambiais. Porém, a giberelina somente age na presença de uma concentração mínima de auxina. Por fim, as citoquininas possuem um papel sobre a atividade cambial considerado incerto até o momento. A citoquinina é produzida nos ápices radiculares é transporta pelo fluxo de água no xilema resultante da transpiração foliar. Registro do produto da atividade cambial e dendrocronologia A interação entre as ações de cada hormônio produzido em diferentes partes das plantas modula os produtos da atividade cambial, ficando assim, a fisiologia da planta registrada especialmente no lenho. A anatomia pode ser considerada como uma evidência, e um registro, da fisiologia da planta num determinado momento de sua vida. Esta relação temporal do registro fica mais evidente quando são analisadas sob a perspectiva dos anéis de crescimento presentes no xilema. A dendrocronologia tem como objetivo primordial estudar a sequência de anéis de crescimento em plantas lenhosas para determinar o ano calendário de formação de cada um deles (Stokes & Smiley 1996). Por mais trivial que seja este objetivo, a datação dos anéis de crescimento abre um leque de possibilidades, já que as plantas podem manter, no lenho, um registro biológico de grande parte dos eventos que influenciaram o seu crescimento ao longo da vida. Como registro natural, os anéis de crescimento são considerados um dos mais 18 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 27. O Caule: um enfoque na atividade cambial precisos. Esta confiança na datação provém da elaboração das cronologias de crescimento baseadas na replicação populacional e em métodos estatísticos robustos. A dendrocronologia é uma ciência recente, em amplo desenvolvimento. Seus primeiros laboratórios foram estabelecidos na América do Norte e na Europa por volta da década de 1920, os quais tinham como principal objetivo datar artefatos históricos e arqueológicos com base nas sequências de anéis de crescimento. A partir da década de 1970, a dendrocronologia passou a ser utilizada para responder uma variada gama de questões científicas, desde compreensão da ecologia de algumas espécies, até a reconstrução climática do último milênio, sob o olhar das mudanças climáticas (Scweingtruber 1996). Pressupostos da dendrocronologia Anéis de crescimento visíveis Qualquer estudo de dendrocronologia inicia-se com a identificação dos anéis de crescimento. Esses são camadas sucessivas, concêntricas, presentes na madeira, demarcada por variações na anatomia do lenho. Basicamente, são demarcados por traqueídes achatadas e de parede mais espessa nas coníferas, e por uma disposição variada de estruturas anatômicas nas angiospermas (Figura 10). Estas disposições podem ser caracterizadas por uma redução gradual, ou abrupta, dos diâmetros dos vasos, ou pela presença de uma faixa de parênquima marginal, ou uma camada fibrosa, entre outras. Os anéis podem ser delimitados pela presença de uma ou mais destas características. 19 BOTÂNICA NO INVERNO 2012 Figura 10- Exemplos de anéis de crescimento em uma espécie de conífera: Podocarpus lambertii Klotzsh ex Endl. (A preparação histológica e B preparação macroscópica) e numa espécie de angiosperma: Hymenaea courbaril L. (C preparação histológica e D preparação macroscópica).
  • 28. 1. Estrutura e Desenvolvimento Anéis de crescimento anuais Para que uma espécie possa ser utilizada num estudo de dendrocronologia, ela precisa possuir anéis de crescimento que são formados a cada ano. Somente assim, a atribuição de um ano calendário ao anel de crescimento poderá ser realizada. Anéis de crescimento sensitivos Os anéis de crescimento podem ser classificados quanto à sensitividade: em complacentes e sensitivos. Os anéis considerados complacentes possuem pouca variação no tamanho ao longo de uma série de crescimento, enquanto que os anéis sensitivos possuem uma grande variação na dimensão ao longo do lenho. Ambientes com condições de crescimento próximas do ótimo induzem um crescimento anual praticamente constante, o que resulta em anéis complacentes. Já ambientes com uma condição mais estressante de crescimento tendem a produzir anéis mais sensitivos. Como exemplos de ambientes que produzem anéis sensitivos (ideais para coleta de amostras), podem ser listados: locais com grande drenagem (encostas de morro, solos com altas concentrações de silte e areia, solos rasos), ambientes com grande demanda evaporativa (cerrado e caatinga), solos pobres em nutrientes, locais com propensão ao congelamento, entre outros. Este parâmetro pode ser medido e indexado com o cálculo da sensitividade média, a qual é uma medida da variância do tamanho dos anéis de crescimento. A sensitividade média varia numa escala de 0 a 1, na qual os valores entre 0 e 0.19 são considerados baixos, e portanto os anéis tendem a ser complacentes. Valores entre 0.20 e 0.29 são considerados intermediários, e acima de 0.30, são sensitivos e ideais para uma análise dendrocronológica. Figura 11 - Comparação entre anéis de crescimento considerados sensitivos e os complacentes (modificado, Stokes & Smiley 1996). Sinal comum Os anéis de crescimento sensitivos precisam possuir um padrão de crescimento (também definido como sinal) comum numa população. Este padrão de crescimento é o 20 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 29. O Caule: um enfoque na atividade cambial utilizado na datação cruzada, para a atribuição de um ano calendário a cada anel de crescimento. Datação cruzada O processo de datação cruzada é o cerne de qualquer trabalho de dendrocronologia. O objetivo dela é a identificação do padrão comum de crescimento na população, o qual resulta na construção de uma cronologia mestre para a datação. Durante este processo, há apenas dois problemas que podem ser enfrentados, a presença de anéis de crescimento faltantes ou a presença de anéis de crescimento falsos. A identificação e correção destes dois problemas são essenciais ao sucesso do processo de datação cruzada. Figura 12. Tipos de problemas que podem ser identificados em cronologias de anéis de crescimento: anéis faltantes (no caso confluentes) e anéis falsos (camadas de crescimento que foram formadas em algum momento durante a estação de crescimento). Bibliografia Sugerida Aloni, R. 2010. The induction of vascular tissues by auxin. In:Davis P. Plant Hormones – Biosynthesis, Signal Transduction, Action. Springer. Aloni, R.; Langhans, M.; Aloni, E.; Dreieicher, E. & Ullrich, C.I. 2005. Root-shynthesized cytokinin in Arabdopsis is distributed in shoot by transpiration stream. Journal of Experimental Botany. v. 56. p. 1535-1544. Angyalossy, V.; Angeles, G.; Pace, M.R.; Dias-Leme, C.L.; Lima, A.C.; Lohmann, L.G. & Madero-Vega, C. 2012. An overview on the anatomy, development, and evolution of the vascular system of lianas. Plant Ecology and Diversity. p. 1-16. Dayan, J.; Voronin, N.; Gong, F.; Sun, T.; Hedden, P.; Fromm, H. & Aloni, R. 2012. Leaf-induced Gibberellin Signaling is essential for internode elongation, cambial activity and fiber differentiation in Tabacco stems. The Plant Cell. v. 24. p. 66-79. Elo, A.; Immanen, J.; Nieminen, K.; Helariutta, Y. 2009. Stem cell function during plant vascular development. Seminars in Cell & Development Biology. v. 20. p. 1097-1106. Esau, K. 1974, Anatomia das plantas com sementes, Editora Blucher, São Paulo, 293pg. Ewers, F.W. & Fisher, J.B. 1991. Why vines have narrow stems: histological trends in Bauhinia (Fabaceae). Oecologia v. 88. p. 233-237. Fisher, J.B. & Ewers, F.W. 1991. Structural responses to stem injury in vines, p. 99–124. In F. E. 21 BOTÂNICA NO INVERNO 2012 9 anos 8 anos7 anos 6 anos Anel falsoAnel confluente
  • 30. 1. Estrutura e Desenvolvimento Putz and H. A. Mooney (eds.), The Biology of Vines. Cambridge University Press, New York, NY. Grissino-Meyer, H.D. 2001. Evaluating crossdating accuracy: a manual and tutorial for the computer program Cofecha. Tree-ring Research. v. 57(2). p. 205-221. Ko, J.; Han, K.; Park, S. & Yang, J. 2004. Plant body weight-induced secondary growth in arabidopsis and its transcription phenotype revealed by whole-transcriptome profiling. Plant Physiology. v. 135. p. 1069-1083. Lima, A.; Pace, M. & Angyalossy, V. 2010. Seasonality and growth rings in lianas of Bignoniaceae. Trees-Structure and Function. v. 24. p. 1045–1060. Obaton, M. 1960. Les lianes ligneuses à structure anormale des forêts denses d’Afrique Ocidentale. Annales des Sciences Naturelles. v. 12(1). p. 1-220. Pace, M.R.; Lohmann, L.G. & Angyalossy V. 2011. Evolution of dis- parity between the regular and variant phloem in Bignonieae (Bignoniaceae). American Journal of Botany. v. 98. p. 602–618. Pfeiffer, H. 1926. Das Abnorme Dickenwachstum – Handbuch der Pflanzenanatomie. Band IX. Verlag von Gebrüder Borntraaeger. Berlin. Putz, F.E. & Holbrook, N.M. 1991. Biomechanical studies of vines, p. 73–97. In F. E. Putz and H. A. Mooney (eds.), The Biology of Vines. Cambridge University Press, New York, NY. Scarpella, E. & Meijer, A.H. 2004. Pattern formation in the vascular system of monocot and dicot plant species. New Phytologist. v. 164. p. 209-242. Schenck, H. 1893. Beiträge zur Biologie und Anatomie der Lianen, im Besonderen der in Brasilien einheimischen Arten. II. Theil. Beiträge zur Anatomie der Lianen. Jena. Schöngart, J.; Junk, W.J.; Piedade, M.T.F.; Ayres, J.M.; Hüttermann, A. & Worbes, M., 2004, Teleconnection between tree growth in the Amazonian flood-plains and El Niño-Southern Oscillation effect. Global Chnage Biology. v. 10. p. 683-692. Schweingruber, F.H. 1988. Tree rings. Basics and applications of dendrochronology. Kluwer, Academic press, Dordrecht, Boston, London. Schweingruber, F.H. 1996. Tree rings and environment dendroecology, Birmensdorf, Swiss Federal Institute for Forest, Snow and Landscape Research, Berne, Stuttgart, Vienna, Haupt, 609 pg. Stokes, A.M. & Smiley, T.L., 1996, An introduction to tree-ring dating, The University of Arizona Press, Tucson. 22 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 31. Folha: desenvolvimento, estrutura e função Folha: desenvolvimento, estrutura e função Aline Siqueira Nunes Leonardo Hamachi Mariane Sousa Baena Paula Natália Pereira Paulo Tamaso Mioto Rafael Cruz A folha é um órgão de grande importância para a planta por ser o principal responsável pela realização da fotossíntese. Ao longo do Curso de Inverno, serão abordados vários de seus aspectos, em dois módulos subsequentes: na Parte I trataremos da estrutura foliar, com considerações sobre a evolução, ontogênese, forma e anatomia desse órgão; na Parte II será visto sua função com abordagens sobre o papel da folha no corpo vegetal. A aula começará abordando o surgimento das folhas nas primeiras plantas terrestres e, então, como as folhas se desenvolvem a partir do meristema apical caulinar, realizam suas funções quando completamente desenvolvidas e, por fim, como se dá o processo de senescência foliar. Ao considerarmos a planta como um todo, observamos que há um período inicial no qual a folha necessita de um aporte de energia e matéria orgânica para que possa crescer. Aos poucos ela passa a ser capaz, através da fotossíntese, de produzir carboidratos que serão enviados para o restante da planta. A partir de certo ponto a folha começa a entrar em processo de senescência, no qual a maior parte dos seus componentes é exportada para tecidos mais jovens. Todos esses processos são finamente regulados nas plantas, o que permite que elas mantenham sua homeostase. Parte I Origem das plantas terrestres e as primeiras folhas As primeiras evidências de vegetais terrestres encontradas são esporos, datados de 460 milhões de anos, cuja morfologia sugere que foram produzidos por plantas parecidas com hepáticas. Por volta de 420 milhões de anos atrás, fósseis mostram que as plantas ainda apresentavam uma estrutura bastante simples com ramos aéreos já providos de células condutoras de água, sendo um fóssil de Cooksonia o primeiro registro de planta vascular encontrado. As primeiras plantas terrestres não possuíam folhas, sendo compostas apenas de estruturas caulinares e, de acordo com a teoria do teloma de Zimmermann, as folhas teriam surgido através de uma redução de um sistema de ramos laterais. Primeiramente, houve uma modificação da estrutura dicotômica para a formação de um eixo principal e ramos laterais (overtopping). Em seguida, os ramos que se posicionavam formando uma estrutura tridimensional ficaram restritos a apenas um plano (planation) e, por fim, tecido parenquimático fotossintetizante começa a se formar entre os ramos, ligando-os (webbing), Figura 1. 23 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 32. 1. Estrutura e Desenvolvimento Figura 1-Esquema ilustrando o surgimento das folhas a partir de uma planta ancestral que apresentava apenas ramos segundo a teoria do teloma. A. Planta formada apenas por ramos, com padrão de ramificação dicotômico. B. Planta formada de um eixo principal e ramos laterais. C. Os ramos sofrem uma modificação em sua estrutura, estando agora posicionados em apenas um plano. D. Concrescimento de tecido parenquimático (em cinza) entre os ramos, formando a lâmina foliar. Plantas com folhas evoluíram há 410 milhões de anos e os microfilos de Baragwanathia longifolia foram as primeiras estruturas foliares encontradas no registro fóssil. Durante o período Devoniano (~420-350 milhões de anos) ocorreu uma explosão de diversidade nas plantas e surgiram características que possibilitaram que plantas terrestres, antes ocupando apenas áreas úmidas, pudessem colonizar áreas mais secas. Nesse período, folhas de formas mais complexas evoluíram a partir de folhas incipientes e, como conferiam uma vantagem adaptativa ao ambiente terrestre, foram mantidas ao longo da evolução. Atualmente podemos dividir as folhas em simples ou compostas, sendo que as folhas simples possuem lâminas foliares inteiras e as folhas compostas apresentam a lâmina subdividida em folíolos. A subdivisão da lâmina foliar em folíolos maximiza a área fotossintética e diminui a tensão mecânica potencial que uma superfície única e inteira, como as lâminas simples, sofreria. Atualmente, quase todas as plantas vasculares possuem folhas e as espécies afilas (sem folhas) evoluíram através de perda secundária a partir de um ancestral que possuía folhas. Entretanto, as plantas afilas, em geral, desenvolveram outras estratégias fotossintéticas como caules ou raízes fotossintetizantes. Diferentemente dos animais, que apresentam crescimento fechado e determinado, os vegetais apresentam crescimento aberto e indeterminado. A forma geral que vemos nos animais adultos é determinada no início do desenvolvimento e uma vez que os animais se tornam adultos (capazes de se reproduzir), sua forma não mudará muito ao longo de sua vida. Por outro lado, as plantas continuam a crescer por toda a vida e sua forma geral não é definida na fase embrionária. Dessa forma, seu desenvolvimento é dito indeterminado. Além disso, seu número de partes não é fixo (é, na maior parte das vezes, impossível predizermos quantos galhos ou folhas uma árvore adulta possuirá) sendo assim também denominado aberto. Os animais, ao contrário, têm uma forma corporal pré-programada e com número de partes definido (por exemplo, seres humanos terão cinco dedos em cada mão), sendo considerados, portanto, de crescimento fechado. As plantas têm essa capacidade de crescer durante toda a sua vida devido à retenção, na fase adulta, de regiões meristemáticas com potencial pra se multiplicar e formar tecidos. Essas zonas meristemáticas, denominadas meristema apical caulinar (MAC) e meristema apical radicular são posicionadas cedo no desenvolvimento. Um embrião vegetal é muito simples quando comparado ao de um animal, 24 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 33. Folha: desenvolvimento, estrutura e função consistindo basicamente da radícula, hipocótilo, cotilédones, meristema apical caulinar e meristema apical radicular. É a partir da atividade desses dois meristemas apicais que todo o corpo da planta adulta se forma após a germinação da semente e mutações que suprimem a formação de um deles, em geral, são fatais. Especificamente, a arquitetura primária das partes aéreas da planta é derivada do meristema apical caulinar, o qual produz folhas, internós e gemas axilares. Diferenças aparentemente simples na iniciação do órgão a partir do MAC podem resultar em morfologias dramaticamente divergentes. Dessa maneira, a organização e manutenção do meristema continuam a ser uma questão fundamental nos estudos de desenvolvimento das plantas. Ontogênese foliar O desenvolvimento foliar pode ser dividido em quatro estágios: iniciação, diferenciação inicial, desenvolvimento do eixo da folha e, por fim, origem e histogênese da lâmina foliar. A iniciação da folha ocorre por meio de divisões que ocorrem em um pequeno grupo de células lateralmente situadas em relação ao ápice do caule, o que resulta na formação do primórdio foliar. Este primórdio, que consiste em uma protoderme, uma região central de tecido fundamental e procâmbio tem a forma de um pequeno cone, com a face adaxial achatada. As células apicais do primórdio foliar apresentam diferenciação relativamente rápida, sendo grande parte do crescimento no sentido próximo-distal dado por crescimento intercalar. O crescimento em comprimento do eixo é acompanhado pelo aumento na largura, como resultado de divisões celulares na região adaxial, proporcionando um aumento em volume do primórdio foliar. Feixes vasculares acessórios podem se desenvolver a partir dessa região. O desenvolvimento da lâmina foliar ocorre durante o crescimento em comprimento e espessura do primórdio por meio de células das margens que continuam a se dividir, formando a blastozona/meristema marginal. O crescimento marginal varia entre as regiões do primórdio foliar de modo que, nas folhas pecioladas, tal crescimento é reprimido na base, da qual se originará o pecíolo. A partir de divisões de células iniciais marginais, originam-se os tecidos da lamina foliar (epiderme, mesofilo e tecidos vasculares). Trabalhos recentes, com base em anatomia e biologia molecular, têm descrito etapas em três fases: iniciação, morfogênese primária e expansão e morfogênese secundária. A iniciação foliar a partir dos flancos do meristema apical caulinar é um processo ainda não completamente entendido, porém sabe-se que mutações que o afetam têm um impacto dramático na forma final da folha e que muitos aspectos da morfologia foliar são determinados nessa fase inicial de desenvolvimento. As primeiras mudanças detectadas no MAC são um pico de auxina e um afrouxamento das microfibrilas de celulose da parede celular na região do meristema onde estará posicionado o futuro primórdio. Essa mudança na consistência das microfibrilas se deve a expressão aumentada de genes ligados à produção de expansina, uma proteína que regula a extensibilidade da parede celular, e é necessária para que o primórdio foliar possa emergir do meristema. Outro marcador do local de iniciação são os genes KNOX, que se expressam no MAC, porém são reprimidos no local da iniciação do primórdio na fase em que nenhuma mudança morfológica é observada ainda no MAC. O meristema apical caulinar é uma estrutura radialmente simétrica e a iniciação de órgãos laterais, num padrão filotático, implica na quebra dessa simetria, o que segundo as teorias mecânicas da filotaxia (mechanical phyllotactic theories) ocorreria devido a uma diferença 25 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 34. 1. Estrutura e Desenvolvimento de tensão entre a camada L1 e os tecidos subjacentes. De acordo com essas teorias, as forças mecânicas teriam um papel fundamental na definição do local de iniciação do primórdio. Porém, para entender as forças de tensão é necessário entender o papel do turgor, as propriedades da parede celular, a arquitetura do citoesqueleto e o processo de crescimento de uma maneira geral. Entretanto, entender a regulação genética de todos estes processos tem se mostrado uma tarefa bastante complicada. Desta forma, não é um consenso entre pesquisadores que a contribuição das forças mecânicas na determinação da filotaxia seja fundamental. O termo morfogênese primária é usado para descrever os processos que estabelecem a forma básica da folha, relacionada à sua simetria e sub-regiões. Na fase de expansão e morfogênese secundária ocorre aumento na superfície e no volume final da folha, cuja expansão pode ser isométrica ou alométrica, podendo o órgão manter ou alterar a forma estabelecida durante a morfogênese primária. Figura 2-Secção longitudinal do ápice caulinar de Coleus sp., mostrando o meristema apical, primórdios foliares e gemas axilares. Genética molecular do desenvolvimento foliar Recentemente muitos progressos têm sido feitos no entendimento dos mecanismos moleculares que regulam o desenvolvimento das folhas. Duas famílias de fatores de transcrição são conhecidas por estarem envolvidas no controle do desenvolvimento foliar, os genes KNOTTED-like da classe 1 (KNOX1) e os genes LEAFY/FLORICAULA (LFY/FLO). Os genes KNOX1 são conhecidos por seu papel importante na manutenção da indeterminação dos tecidos do MAC (sua expressão mantém os células em estado meristemático), porém análises moleculares indicam que os genes KNOX1 também se expressam durante o desenvolvimento de folhas compostas. Neste tipo de folha a expressão dos genes KNOX1 faz com que os tecidos se mantenham por mais tempo em estado meristemático, conferindo às folhas uma capacidade maior de crescimento indeterminado. Este tempo mais longo de indeterminação do primórdio é necessário para que as elaborações da lâmina, como folíolos e lobos, possam se desenvolver. Os genes KNOX1 estão envolvidos no desenvolvimento das folhas compostas de quase todas as linhagens de eudicotiledôneas analisadas até o momento e uma exceção importante nessa tendência de expressão do gene KNOX1 no primórdio de folhas compostas é observada em Pisum (ervilha), onde este gene não se expressa nos primórdios nem em folhas mais velhas. Em Pisum, os tecidos são mantidos em estado indiferenciado por mais tempo através da expressão do gene LFY/FLO e 26 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 35. Folha: desenvolvimento, estrutura e função mutações neste gene fazem com que a folha de ervilha se torne simples. Existem vários genes que são antagonistas ao KNOX1 e LFY/FLO, pois promovem a diferenciação dos tecidos onde se expressam. Este é o caso dos genes que controlam o estabelecimento da polaridade abaxial-adaxial nas folhas. As folhas possuem tecidos bastante diferentes nas faces abaxial e adaxial, que desempenham funções distintas. Na face adaxial, comumente, encontra-se uma camada de parênquima paliçádico, que otimiza a fotossíntese e uma camada espessa de cutícula sobre a epiderme. Em geral, na face abaxial encontra-se o parênquima lacunoso e um maior número de estômatos, que regulam as trocas gasosas e a transpiração. Toda essa diversidade de tecidos é gerada a partir da expressão de muitos genes, que além de serem antagonistas ao KNOX1 e LFY/FLO também são antagonistas entre si. Em geral, genes que se expressam na face adaxial reprimem a expressão de genes que se expressam na face abaxial e vice-versa. Mais especificamente a polaridade abaxial-adaxial é estabelecida pela repressão mútua entre os genes HD-ZIPIII e o gene KANADI. Experimentos mostram que mutantes que não expressam algum dos genes de identidade abaxial ou adaxial desenvolvem folhas que não possuem lamina foliar e são aciculiformes (que lembram gavinhas ou espinhos). Assim, o estabelecimento correto da polaridade abaxial-adaxial é necessário e, pode-se dizer, um pré-requisito para que ocorra a expansão da lâmina foliar. A expansão da lâmina foliar e também a diferenciação dos tecidos diversos que a compõem foram adaptações que maximizaram a fotossíntese ao mesmo tempo em que minimizaram a perda de água para o ambiente, sendo assim importantes inovações para a conquista do ambiente terrestre pelas plantas. A forma da folha Embora alguns padrões do desenvolvimento foliar pareçam ser comuns em plantas vasculares, diferenças na ontogênese, em vários aspectos, levam a uma gama de formas finais distintas que tornam a folha o órgão vegetativo mais plástico dentre as traqueófitas, adquirindo grande importância em estudos taxonômicos, ecofisiológicos e na área de genética molecular do desenvolvimento, visto que é um ótimo modelo para investigar a regulação gênica fina devido a toda a variação de formas. Na maioria das plantas vasculares encontramos associada à axila da folha uma gema de estrutura semelhante ao ápice caulinar, podendo assumir atividade semelhante a este e dar origem a um ramo. Ela pode ser facilmente identificada à vista desarmada ou com o auxílio de uma lupa tornando-se a melhor estrutura capaz de individualizar uma folha morfologicamente. Esta característica, no entanto, surgiu tardiamente dentro da filogenia das traqueófitas e plantas como as licófitas, monilófitas e cicadófitas não apresentam gemas axilares. Consequentemente, também não possuem este tipo de ramificação. Uma vez individualizada, a forma da folha pode ser melhor entendida subdividindo-a em uma porção conhecida como lâmina (mais apical e geralmente expandida) e uma porção conhecida como base (associada à inserção da folha no caule) morfoanatomicamente distintas. A base da folha comumente é cilíndrica em não monocotiledôneas, sendo chamada de pecíolo (e, mais especificamente, de estipe nas samambaias). Em monocotiledôneas a base costuma ser expandida e envolvente, sendo chamada bainha. Ambas as estruturas podem co-ocorrer na base (uma bainha proximal e pecíolo distal) e não são exclusivas destes grupos (há monocotiledôneas pecioladas e não monocotiledôneas com bainhas). A base ainda pode ser imperceptível morfologicamente e a folha é assim chamada séssil. Projeções laterais da base podem surgir nos primeiros estágios de formação da folha, sendo chamadas 27 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 36. 1. Estrutura e Desenvolvimento de estípulas, que podem assumir diversas funções. Geralmente ocorrem aos pares, mas possuem morfologia bastante variável. Em gramíneas é comum ainda o surgimento de uma projeção adaxial entre a bainha e a lâmina foliar conhecida como lígula, também de morfologia variável. Em algumas plantas, principalmente leguminosas e marantáceas, um intumescimento do pecíolo conhecido como pulvino ocorre e está relacionado ao movimento da lâmina foliar de velocidade variável, desencadeado por higroscopia e/ou potencial elétrico, relacionado à proteção da folha ou à melhor captação de luz. A lâmina foliar pode assumir diversas dimensões, de milímetros a metros. Varia muito em sua simetria, podendo ser desde perfeitamente simétrica bilateralmente até completamente assimétrica. Algumas folhas são curtas, semelhantes a escamas e relacionadas à proteção de gemas: os catafilos. Outras acumulam uma grande quantidade de água, sendo suculentas. Algumas são cilíndricas, o que muitas vezes está relacionado a um crescimento adaxial muito incipiente durante a ontogênese. Folhas relacionadas a estruturas reprodutivas muitas vezes são diferentes das demais e chamadas de brácteas. Numa lâmina foliar expandida geralmente o tecido vascular é facilmente perceptível, traçando vários padrões. Numa primeira classificação, podemos dividi-las em grandes grupos: folhas uninérveas (uma única nervura, como geralmente presente nas licófitas), com venação dicotômica (comum nas plantas com sementes, exceto em angiospermas), com venação reticulada (geralmente com uma nervura central distinta e nervuras laterais que partem desta e se conectam, formando uma trama com terminações livres, comuns em angiospermas não monocotiledôneas) e com venação paralela (as nervuras correm paralelamente da base ao ápice da folha com poucas conexões entre ela e sem terminações livres, condição comum em monocotiledôneas). A folha como um todo ou suas partes (lâmina, folíolo, estípulas) podem sofrer modificações muito especializadas a determinadas funções. Estas modificações podem ser as gavinhas, geralmente alongadas, cilíndricas e, muitas vezes, com crescimento helicoidal, relacionado à escalada em um suporte (plantas trepadeiras). Podem também ser cilíndricas e alongadas, mas muito lignificadas e geralmente pontudas, relacionadas à proteção e conhecidas como espinhos. Espinhos podem facilmente ser confundidos com acúleos, também pontudos, que são apenas projeções da epiderme e tecido subjacentes, mas não relacionados à modificação de um órgão como um todo e, portanto, sem topologia tão bem definida como os espinhos. Em plantas carnívoras, a lâmina foliar pode ser modificada em armadilhas de invertebrados apressórias, adesivas, suctórias ou em forma de jarro e liberam enzimas proteolíticas necessárias para a carnivoria. As estruturas foliares podem ser glabras ou possuírem um grande número de tricomas (pilosas), de funções diversas. Seus pigmentos podem estar regularmente presentes em toda a lâmina dando-a uma cor geralmente verde, devido à clorofila. No entanto, com a presença de outros pigmentos e disposição diferencial destes, de plastídeos e de tricomas, que influenciam na reflexão luminosa, a folha pode apresentar cores diferentes na face abaxial e adaxial. As diferenças de cores ainda podem formar manchas, listras, pontos ou outras formas em uma mesma face e a folha é dita variegada. Ao longo da evolução, em diversos momentos, a lâmina foliar sofreu divisão, individualizando folíolos e dando origem às folhas compostas. Uma folha com dois ou três folíolos é dita bi ou trifoliolada, respectivamente. Se a folha tem mais de três folíolos, eles podem partir todos de um mesmo ponto e a folha é palmada (em forma de palma) ou possuírem um eixo cilíndrico alongado (raque) no qual os folíolos se inserem sendo pinada 28 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 37. Folha: desenvolvimento, estrutura e função (em forma de pena). Se uma folha pinada tem folíolos terminais pares, é paripinada. Se possuir um único folíolo terminal, é imparipinada. Há ainda folhas com um único folíolo, denominadas unifolioladas, derivadas evolutivamente de uma condição composta, com uma articulação na base do folíolo como testemunha desta redução de número de folíolos. Filogeneticamente as folhas compostas podem ter origem por lobação gradual da lâmina foliar com um aprofundamento tão intenso dos lobos que estes atingiram a nervura principal gerando os folíolos (divisão), outra hipótese é que elas tenham surgido por homeose. Diz-se que ocorreu homeose quando no local de formação de um determinado órgão, outro órgão ou características de outro órgão são expressos. Dessa maneira, as folhas compostas teriam surgido através de uma alteração no padrão de desenvolvimento das folhas simples, e várias estruturas simples (folíolos) teriam se formado onde uma lâmina foliar única deveria ser produzida (multiplicação). Nesse caso, as estruturas simples seriam como folhas simples sendo produzidas por uma estrutura caulinar, assim características caulinares estariam sendo expressas no desenvolvimento das folhas compostas, que por sua vez teriam uma identidade mista, sendo um órgão intermediário entre caule e folha. Assim como a lâmina simples pode portar modificações da base, os folíolos podem ter modificações de segunda ordem associadas a eles, como peciololos, pulvínulos e estipelas (respectivamente pecíolos, pulvinos e estípulas de segunda ordem). No ápice caulinar, os espaços entre o surgimento de um primórdio e outro subsequente podem vir a se alongar, dando origem, na maturação a um internó, que na planta adulta pode ser identificado como as regiões caulinares que separam os pontos de inserção de folhas: os nós. No entanto, alguns desses espaços podem não vir a se alongar e mais de uma folha pode ocupar o mesmo nó. A esta disposição chamamos de filotaxia e pode ser alterna (uma folha por nó), oposta (duas folhas por nó, sendo geralmente uma folha posicionada a 180° em relação à outra do mesmo nó) ou verticilada (três ou mais folhas por nó). Uma folha alterna pode estar disposta em relação à anterior em um mesmo lado do caule (monóstica), em dois ou três lados do caule (dística ou trística) ou em tantos lados que chegam a formar uma espiral, vista do alto do ramo (espiralada, comumente presente em rosetas). Em folhas opostas, comumente os pares de folhas estão posicionados a 90° em relação ao anterior, vistas do alto do ramo (opostas cruzadas) ou no mesmo plano (opostas dísticas). Uma planta pode apresentar regularmente folhas muito semelhantes ou estas podem variar em forma (junto ao nó e internós associados) e neste caso, a planta apresenta heterofilia. Se a variação é em relação à idade da planta (por exemplo, indivíduos juvenis apresentam uma determinada morfologia e indivíduos adultos, outra) a planta apresenta heteroblastia. Deve-se atentar ao fato de que condições intermediárias não só existem como são bastante comuns na natureza e as categorizações humanas não conseguem refletir toda a magnitude realística existente. Toda esta diversidade morfológica está relacionada às funções fisiológicas da planta, é determinada por processos evolutivos atuantes ao longo de milhões de anos e foi gerada por alterações nos padrões de ontogênese das primeiras plantas vasculares. Anatomia foliar As folhas, de modo geral, compartilham muitas similaridades quanto aos tecidos que as formam, de modo que a diversidade anatômica observada entre os diversos tipos foliares está principalmente relacionada à organização desses tecidos na constituição do órgão. Em 29 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 38. 1. Estrutura e Desenvolvimento linhas gerais, a anatomia foliar consiste em sistema de revestimento composto por epiderme, tecido fundamental da lâmina foliar diferenciado predominantemente em mesofilo parenquimático e sistema vascular distribuído na forma de nervuras. Embora a maior parte das folhas apresente uma lâmina ampla e relativamente fina, algumas podem apresentar características muito diversas, podendo ser espessas e suculentas ou mesmo tubulares, como a cebolinha. Toda gama de formas e modos de vida têm sua correspondência na anatomia, mas ainda que sejam encontradas diversas particularidades entre os tipos foliares observados na natureza, a anatomia foliar reflete as principais atribuições desse órgão: fotossíntese e respiração. Epiderme: células de paredes anticlinais justapostas sem espaços intercelulares, superfície externa recoberta por cutícula e presença de estômatos configuram as principais características da epiderme foliar (Figura 3A). Como região limítrofe entre os tecidos foliares e o ambiente externo, a epiderme possibilita penetração da luz para a realização da fotossíntese e trocas gasosas com o meio ao mesmo tempo em que protege os tecidos internos de agressões externas, como injúrias e principalmente perda de água por transpiração. Frequentemente é formada por uma única camada de células isodiamétricas, com parede celular primária e delgada que pode ter contorno retilíneo ou sinuoso em maior ou menor grau, dependendo da espécie, da face da folha, ou mesmo das características ambientais às quais está exposta. Entretanto, podem ocorrer folhas com epiderme multisseriada e com paredes lignificadas, neste caso, com a função de refletir ao ambiente o excesso de radiação solar recebida em sua superfície. Tricomas tectores e glandulares são estruturas frequentes geralmente relacionadas à proteção (Figura 3B). Os tricomas tectores apresentam grande diversidade de formas e funções variadas, como proteção contra o dessecamento e radiação solar excessiva; os glandulares apresentam células que produzem e/ou armazenam substâncias químicas que em muitos casos configuram proteção à herbivoria. Existem, ainda, estruturas com funções mais específicas, como os tricomas escamiformes das bromélias, que têm a função de captar vapor de água disperso no ar. Estômatos ocorrem mais comumente na face abaxial das folhas (hipostomáticas), como uma forma de minimizar a transpiração excessiva, mas há espécies com folhas anfietomáticas (Figura 3C) e epiestomáticas. Algumas xerófitas apresentam cutícula notavelmente espessa (Figura 3A) e estômatos localizados no interior de invaginações da epiderme (criptas), o que ajuda a minimizar os efeitos da baixa humidade relativa do ar. Mesofilo: principal tecido fotossintetizante das folhas. É predominantemente parenquimático e apresenta abundância de cloroplastos, podendo ter aspecto homogêneo ou estar organizado em parênquima paliçádico e lacunoso (Figura 3). O parênquima paliçádico é formado por uma ou mais camadas de células prismáticas alongadas e densamente agrupadas, dispostas perpendicularmente à superfície da lâmina (Figura 3A e D). Em muitas mesófitas o parênquima paliçádico localiza-se justaposto ou próximo à epiderme na face adaxial da folha, sendo esta denominada dorsiventral (Figura 3A e D). Em folhas de xerófitas, esse tecido pode ocorrer em ambas as faces da lâmina, o que a caracteriza como isobilateral. O parênquima paliçádico aparenta ser um tecido arranjado em células bem justapostas quando observado em uma secção transversal de folha, mas a partir de cortes paradémicos podemos observar que este apresenta arranjo mais frouxo, e dessa forma, possibilita a passagem de parte da luz recebida pela superfície para os demais tecidos foliares. 30 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 39. Folha: desenvolvimento, estrutura e função O parênquima lacunoso apresenta células de formatos variados e vacúolos grandes e um sistema de amplos espaços intercelulares (Figura 3 A, D e G). Esta disposição favorece a passagem da luz captada pela superfície adaxial e sua distribuição entre o parênquima clorofiliano, mas a principal característica desse tecido é que o arranjo espaçado entre as células amplia a superfície de contato entre estas e o ar presente no interior da folha, o qual está em continuidade com a atmosfera através, principalmente, dos estômatos. Em crassuláceas é notável a presença de mesofilo homogêneo na região da face adaxial formado por células prismáticas finamente justapostas, sem espaços intercelulares expressivos (Figura 3E). As células deste tipo foliar apresentam vacúolos especialmente grandes, dispondo-se em um arranjo compactado. Neste caso, há otimização no uso do gás carbônico produzido durante a fotossíntese, reduzindo a necessidade de liberação ao meio externo. Em folhas suculentas é comum a presença de mesofilo disposto em muitas camadas de células, com região central ocupada por parênquima armazenador de água, rodeado por parênquima clorofiliano (Figura 3F); em algumas espécies o parênquima armazenador pode estabelecer contato com a epiderme no ápice da folha, constituindo um verdadeiro túnel translúcido que permite a passagem de luz e sua captação pelo tecido clorofiliano circundante. Esta estrutura é uma característica das chamadas window leaves (folhas-janelas) e é de grande importância especialmente para plantas que vivem em ambientes áridos e apresentam a maior parte de seu corpo enterrada no solo, para proteger-se do calor excessivo. Sistema vascular: ocorre na forma de nervuras interligadas e entremeadas no mesofilo, compostas predominantemente por feixes colaterais de xilema e floema primários. No padrão reticulado característico de folhas que apresentam lâmina ampla (como a maioria das angiospermas não monocotiledôneas) em secção transversal observamos, geralmente, uma nervura central de grande dimensão e nervuras secundárias periféricas relativamente menores (Fig. 3G e H). O padrão de venação paralela é observado em folhas longas (Figura 3I), típicas de monocotiledôneas, nas quais observamos, em secção transversal, feixes vasculares semelhantes entre si dispostos lado a lado por toda a extensão do corte. Em muitos casos há feixes de fibras alternados com os feixes vasculares, dando maior sustentação ao órgão. Os feixes vasculares foliares apresentam normalmente xilema primário voltado para a face adaxial, como uma continuidade do traço foliar observado no caule. Em folhas pecioladas, os feixes vasculares da lâmina podem confluir em um único feixe em direção ao pecíolo. Muitas vezes ocorrem cordões de esclerênquima associados aos feixes vasculares formando projeções que fazem conexão com a epiderme em ambas as faces da folha (Figura 3J). Os feixes vasculares paralelinérveos são envolvidos pela bainha do feixe, composta de parênquima (Figura 3I) podendo apresentar esclerênquima. É comum a presença de colênquima ou esclerênquima nas regiões da nervura central em continuidade com o pecíolo e no bordo foliar, com a função de sustentar uma ampla lâmina foliar (Figura 3 G, H e J). 31 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 40. 1. Estrutura e Desenvolvimento Figura 3-Secções transversais de diferentes tipos foliares. A e B – Capparis yco (Capparaceae), região do mesofilo; C – Drosera sp. (Droseraceae), região da nervura central; D – Avicennia sp. (Acanthaceae), região do mesofilo; E – Encholirium sp. (Bromeliaceae); F – (Xanthorrhoeaceae); G – Guatteria sp. (Annonaceae); H – C. yco, nervura central; I – Zea mays; J – C. yco, região do bordo foliar. 32 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 41. Folha: desenvolvimento, estrutura e função Parte II A fotossíntese Um dos principais processos fisiológicos que ocorre na folha madura é a fotossíntese, fonte de quase toda a biomassa existente no planeta. Os primeiros experimentos com plantas relacionados a este fenômeno datam de 1648, quando Johannes Baptista Von Helmont colocou uma árvore de chorão (Salyx sp.) com aproximadamente 2 kg para crescer em um pote contendo 90 kg de terra (a terra pesada seca). Depois de cinco anos a árvore pesava 72 kg, mas ele não detectou diferenças de massa nos 90 kg de terra seca. Sua conclusão (parcialmente correta) foi de que, para crescer, a planta retirou toda sua massa da água. Apesar de Von Helmont receber o crédito por um dos primeiros experimentos envolvendo fotossíntese, alguns historiadores argumentam que essa foi uma imitação de outro experimento feito cerca de 200 anos antes por Nicolau de Cusa. Quase um século depois, em 1771, Joseph Priestley deixou uma planta dentro de um frasco vedado com uma vela queimando. Após pouco tempo a vela apagou e não podia mais ser acesa. Depois de esperar por quase um mês, ele acendeu a vela (usando a luz do sol refletida em espelhos) e ela queimou normalmente. Sua conclusão foi que, de alguma forma, as plantas alteram a composição do ar. Foi dele também o famoso experimento de colocar um camundongo em um frasco vedado e observar que ele morria rapidamente (deixando o ar “viciado”, segundo as palavras dos cientistas da época). Ao colocar o camundongo junto com uma planta notou-se que ele vivia por mais tempo. Concluiu-se que as plantas tinham a capacidade de “desviciar” o ar do frasco. Quinze anos mais tarde, baseado nesses experimentos, Jan Ingen-Housz descobriu que se o frasco fosse coberto de modo a não deixar entrar luz, a planta também “viciava” o ar. Conclusão: para que a planta possa “desviciar” o ar é necessário que haja luz – no escuro ela se comportaria de maneira semelhante a um animal. Assim, já no final do século XVIII, as bases para entender a fotossíntese haviam sido lançadas, relacionando o consumo de CO2 e a emissão de O2 das plantas com a luz. Hoje em dia já existe um vasto conhecimento acerca do processo de fotossíntese, englobando as mais diversas áreas da Biologia. Apesar de comumente ser resumido a uma reação química, o processo da fotossíntese é muito mais complexo. Didaticamente, esse fenômeno pode ser dividido em duas etapas: a etapa fotoquímica e a etapa bioquímica. É importante ressaltar que, apesar dessa divisão, os dois processos não são independentes. No entanto, para facilitar a compreensão, as duas etapas serão abordadas separadamente. A etapa fotoquímica acontece nos tilacoides, que são estruturas formadas por um sistema de membranas presente nos cloroplastos. De fato, esse processo não poderia ocorrer em outro lugar, porque envolve um represamento de prótons (H+ ) no espaço interno dos tilacoides para impulsionar a formação de ATP. O ATP gerado aqui vai ser usado junto com o NADPH na etapa bioquímica, abordada a seguir. Mas como esses compostos, tão custosos em termos de energia, são gerados? Nas membranas dos tilacoides existem dois complexos proteicos denominados fotossistema I e fotossistema II, baseado na ordem em que foram descobertos. Cada fotossistema é composto de um grupo de moléculas chamado de complexo antena e um centro de reação. Quando a luz incide nos pigmentos contidos nos complexos antena, fótons se chocam com os elétrons dessas moléculas deixado-os energizados. A energia é então 33 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 42. 1. Estrutura e Desenvolvimento transferida para o centro de reação. Com essa grande quantidade de energia que chega, a molécula de clorofila que aí se encontra perde um elétron, que terá que ser reposto imediatamente. No caso do fotossistema II, que é onde a cadeia começa, o elétron será proveniente da fotoxidação de uma molécula de água. Com a quebra dessa molécula, ocorrerá a liberação do oxigênio observada já há tanto tempo. O elétron perdido pelo fotossistema II vai passar por várias proteínas de membrana, perdendo energia. Quando chegar ao fotossistema I ganhará um novo “impulso” até ser incorporado a uma molécula de NADP+ , gerando NADPH. A energia dissipada no transporte dos elétrons vai ser usada no bombeamento de H+ para o espaço interno dos tilacoides, gerando um forte gradiente eletroquímico. Esse gradiente vai sendo desfeito por uma proteína que também está na membrana dos tilacoides, chamada H+ -ATPase. A ATPase vai desfazer o gradiente de H+ e usar essa energia para a síntese de ATP. Ao final da etapa fotoquímica, portanto, teremos a produção de ATP e NADPH. A ordem da cadeia de transporte de elétrons, incluindo os carregadores de elétrons que não foram citados acima é a seguinte: fotossistema II  plastoquinona citocromo b 6f plastocianina fotossistema I ferredoxina    ferredoxina-NADPH redutase NADP + . Uma vez gerados, o ATP e o NADPH serão usados para impulsionar a etapa bioquímica da fotossíntese, também conhecida como ciclo de Calvin. É nesta etapa que ocorre a assimilação do CO2, através da ação da enzima ribulose 1,5 bifosfato carboxilase oxigenase (abreviada para Rubisco). Ao final desse processo, serão geradas moléculas com três carbonos chamadas de trioses-fosfato que mais tarde serão convertidas em açúcares (com seis carbonos). Note que depois de assimilado o CO2, a primeira molécula estável que se forma contém três carbonos. Por isso as plantas que operam exclusivamente nesse tipo de fotossíntese são chamadas de C3. Porém, a Rubisco não tem apenas a função de carboxilase. Ela também pode funcionar como oxigenase, sendo que essas duas funções competem pelo mesmo sítio ativo da enzima. Quando a Rubisco funciona como oxigenase, ela desencadeia um ciclo que “desperdiça” cerca de 25% do CO2 assimilado, chamado de fotorrespiração. Esse processo é intrigante, já que, apesar de ninguém saber exatamente a sua função, parece ser indispensável para as plantas. Existem outros dois tipos de fotossíntese nos quais o primeiro composto estável formado tem quatro carbonos: a fotossíntese C4 e o metabolismo ácido das crassuláceas (CAM). A fotossíntese C4 é um mecanismo de concentração de CO2, que aumenta a eficiência de carboxilação da Rubisco porque diminui a sua atividade de oxigenase (Imagine um cabo de guerra entre a concentração de CO2 e de O2 – quando uma delas aumenta muito, a atividade da Rubisco vai acabar pendendo para esse lado). É comum em plantas pioneiras ou de crescimento rápido. Para que o ciclo C4 ocorra, é necessário que a planta tenha uma anatomia especial, chamada de anatomia Kranz (coroa, em alemão). Nessas plantas, os cloroplastos (e, consequentemente, a clorofila) são mais abundantes em células que estão na região da bainha vascular. As células ao redor dessas (células do mesofilo) são capazes de assimilar o CO2 na forma de ácido orgânico, que é levado até as células da bainha e descarboxilado lá, liberando novamente o CO2. A enzima que faz a primeira assimilação do CO2 no mesofilo é a fosfoenolpiruvato carboxilase e a enzima responsável pela descarboxilação dos ácidos orgânicos é, na maioria dos casos, a enzima málica. Assim, as células da bainha ficam com uma concentração muito alta de CO2, minimizando a fotorrespiração. O CAM é um mecanismo dedicado principalmente à conservação de água. É muito 34 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 43. Folha: desenvolvimento, estrutura e função comum em ambientes com limitação de água – não só desertos, mas ambientes nos quais a planta não tem contato com a água do solo, como o ambiente epifítico. Essas plantas são capazes de abrir os estômatos somente à noite (quando a umidade relativa do ar é mais alta) e assimilar CO2 na forma de ácidos orgânicos. Os ácidos acumulados durante a noite serão descarboxilados de dia, provendo as células com CO2 mesmo com os estômatos fechados. É interessante que essas plantas utilizam as mesmas enzimas de carboxilação e descarboxilação das plantas C4, a fosfoenolpiruvato carboxilase e a enzima málica. Como essas plantas abrem os estômatos apenas nos períodos de maior umidade, a perda de água é drasticamente reduzida. O controle estomático, portanto, é um processo que está intimamente ligado à fotossíntese e à capacidade de sobrevivência das plantas. Rotas Fonte Dreno A folha atinge sua maturidade fotossintética ainda jovem, quando seu desenvolvimento se encontra a aproximadamente de 30 a 50% completo. Nesse estágio o órgão em questão passa a desempenhar o papel de uma folha ou órgão-fonte, pois é capaz de produzir fotossintatos, principalmente carboidratos e compostos nitrogenados, suficientes para a sua manutenção e para exportar a todos os outros órgãos que não são capazes de atender às suas próprias demandas metabólicas, denominados dreno. Nesse momento, a entrada de fotoassimilados na folha-fonte é bloqueada e novas vias de transporte são abertas para suprir os drenos. Esse processo se inicia na porção apical da folha e se estende sentido base a medida que os tecidos se tornam maduros. Sendo assim, ao nível de órgão, a porção apical da folha passa a exportar seiva elaborada para a porção basal imatura da folha. Enquanto, ao nível de organismo, as folhas maduras exportam para folhas que se encontram em fase inicial de desenvolvimento e todos os outros drenos da planta. Convencionou-se chamar esse trajeto da seiva elaborada de rotas fonte-dreno. Essas rotas dependem de alguns fatores como (1) a proximidade: as folhas maduras superiores exportam seiva para o meristema apical caulinar em crescimento e folhas jovens imaturas, folhas inferiores exportam para o sistema radicular enquanto folhas intermediárias exportam em ambas as direções. (2) O desenvolvimento: durante o desenvolvimento da parte vegetativa da planta os principais drenos são os ápices caulinares e radiculares, durante a fase reprodutiva, os principais drenos são as flores e os frutos. (3) As conexões vasculares: as folhas estão geralmente conectadas a órgãos superiores e inferiores dentro de um certo limite de distância ao longo do eixo longitudinal da planta que depende da espécie, essa ligação é chamada de orstóstico. A perda de alguma folha, por predação ou poda, por exemplo, pode resultar em modificações na rota de seiva. Nesse caso, se folhas dreno próximas a uma folha fonte for perdida, as últimas poderão suprir folhas mais distantes com seiva elaborada. Isso ocorre devido ao fato de, existirem interconexões vasculares em, ou anastomoses, entre as vias do floema além das conexões diretas entre os órgãos. Relações hídricas da folha A folha tem papel fundamental no transporte de água ao longo de todo organismo da planta. Do solo, a água é absorvida pelas raízes, passando pelo xilema radicular, xilema caulinar e chegando à folha, onde a tensão superficial da água em evaporação nas paredes das células do mesofilo gera um potencial hídrico intenso o suficiente para que a água seja transportada até mesmo ao longo de grandes organismos como as arbóreas. Finalmente, a 35 BOTÂNICA NO INVERNO 2012
  • 44. 1. Estrutura e Desenvolvimento água atravessa os estômatos, presentes na epiderme foliar, e alcança a atmosfera. Para se entender como é formada uma pressão negativa e intensa nas folhas capaz de gerar potencial hídrico suficiente para mover a água em grandes distâncias, mesmo sob influência da gravidade, é necessário o estudo da dinâmica da água no interior das folhas. No mesofilo a água proveniente do xilema em contato com as células do parênquima e suas respectivas paredes celulares forma interfaces curvas ar/água. À medida que a água evapora, o raio dessas porções curvas da molécula diminui, o que resulta numa pressão negativa segundo a equação: Ψл = - 2T/r Sendo T a tensão superficial da água (7,28 x 10 -8 MPa x m) e r, o raio das interfaces curvas ar/água. Após a evaporação, a água no espaço intercelular será perdida para a atmosfera através do processo da difusão dado pela equação: Js = - Ds x Δcs/Δx Sendo que Ds é a densidade da água, Δcs é a variação da concentração de água entre os locais onde ocorrerá o processo e Δx, a distância que será percorrida pela água. A esse fenômeno dá-se o nome de transpiração, que pode ser dividido em dois outros fenômenos: a transpiração cuticular, na qual a planta perde apenas 5% da água total pela cutícula e a estomática, na qual a maior parte da água é perdida pelos estômatos. A ocorrência da transpiração estomática depende de dois fatores. O primeiro é a diferença de concentração do vapor d'água entre a atmosfera e as lacunas do mesofilo, sendo que esse parâmetro varia com a temperatura. O segundo é a resistência à difusão que, por sua vez, é composta por duas outras variáveis. A resistência à difusão pelo poro estomático, denominada resistência estomática e a resistência da camada de ar estática que se forma ao redor da folha, ou resistência da camada limítrofe. Como a espessura da camada limítrofe e a temperatura da atmosfera não estão sob o controle das plantas, o controle biológico em curto prazo da resistência estomática depende exclusivamente da abertura e do fechamento dos estômatos. A atividade estomática Os estômatos são estruturas presentes nas plantas terrestres. Na maioria das espécies, eles se distribuem, preferencialmente, na face abaxial da folha. Contudo, na maioria das monocotiledôneas é observada uma densidade similar de estômatos nas faces adaxial e abaxial. Os estômatos são formados pelas células-guarda que margeiam o poro estomático (ostíolo) e em muitas espécies, essas são circundadas pelas células subsidiárias. As células- guarda são classificadas em dois tipos: tipo elíptico, comum à maioria das plantas e outras do tipo halter, encontradas, principalmente, nas gramíneas. A mudança no formato das células- guarda está associada à parede espessa ao redor do ostíolo e a presença de microfibrilas de celulose dispostas radialmente (tipo elíptico) ou obliquamente (tipo halter) ao poro estomático. Dessa forma, quando túrgidas, há a abertura do ostíolo e quando flácidas, o poro estomático se fecha. Esses processos ocorrem em resposta à entrada ou à saída de água das células-guarda. Quando o poro estomático se abre, há um aumento na pressão hidrostática e no potencial de turgor. Por outro lado, quando esse se fecha ocorre uma redução na pressão de turgor e de suas paredes. Com o desenvolvimento das células-guarda são formadas as câmaras subestomáticas no mesofilo foliar, adjacentes ao complexo estomático, cuja função 36 BOTÂNICA NO INVERNO 2012