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E STA D O D E M I N A S   ●   S Á B A D O ,         2 3      D E      J U N H O          D E   2 0 1 2



   4                                                                                              POLÍTICA




Entre os nomes listados pelas Nações Unidas em 1974 como vítimas da ditadura constava
o de Dilma Rousseff. O então general Otávio Medeiros era citado como um dos torturadores


ONU denunciou repressão
         JOSIE JERONIMO              redigir em português o texto da
                                                                                                                                     ARQUIVO/EM - 6/12/68


                                     denúncia, trabalho que deman-
    O Ministério das Relações Ex-    daria seis meses. O Ministério
teriores recebeu em novembro         das Relações Exteriores tam-
de 1974 denúncia de violação         bém alegava que os aponta-
dos direitos humanos, encami-        mentos não faziam sentido,
nhada pela Organização das Na-       pois não havia registro de agres-
ções Unidas (ONU), relatando         sões a presas no país. “Já nesta
casos de tortura de 335 mulhe-       DSI (Divisão de Segurança de In-
res brasileiras, entre elas Dilma    formações) não há registro nem
Vana Rousseff. A atual presiden-     conhecimento de torturas no
te é a 56ª mulher descrita no        Brasil.” O documento também
anexo 7 da denúncia da ONU.          reserva anexo para detalhar a
No documento em inglês ela é         morte de 12 mulheres que so-
apresentada como uma “estu-          freram agressões de militares,                                                                                         Trecho do relatório em que a militante Dilma é citada entre 335 nomes
dante de Minas Gerais, presa em      por pertencer a grupos revolu-
São Paulo em 1970, condenada a       cionários. A denúncia questiona
13 meses em agosto de 1971 no        ainda o paradeiro de quatro de-                                                                                        tratar os relatos como “técnica       em escalar consultores jurídicos
estado da Guanabara, bem co-         saparecidas. Os documentos                                                                                             subversiva de tornar a imagem         para elaborar “defesa” do Brasil
mo a quatro anos pelo Segundo        que se tornaram públicos nesta                                                                                         negativa do país no exterior”.        junto à ONU, se o organismo in-
Tribunal Militar em São Paulo,       semana, e estão sob a guarda do                                                                                        Para contornar as críticas que re-    ternacional decidisse questio-
em 18 de setembro de 1971”.          Arquivo Nacional, são uma                                                                                              cebia de instituições internacio-     nar o país de forma mais incisi-
    Apesar de a primeira denún-      compilação da troca de ofícios                                                                                         nais que monitoravam as viola-        va. As informações sobre viola-
cia, que chegou em setembro de       entre o Ministério das Relações                                                                                        ções aos direitos humanos, os         ções de direitos humanos eram
1972, relatar atrocidades come-      Exteriores e o Ministério da Jus-                                                                                      militares criaram um gabinete         tratadas como “dossiês” contra
tidas pelos militares, o governo     tiça e têm 258 páginas.                                                                                                interministerial para avaliar as      o governo. “No sentido de que o
só analisou formalmente o avi-           As denúncias de violação aos                                                                                       denúncias que chegavam. O Ita-        presente processo deva ser ins-
so em maio de 1975 e decidiu ig-     direitos humanos chegaram à                                                                                            maraty seria o responsável por        truído para servir de base à res-
norar o alerta da ONU, alegando      ONU por intermédio da Federa-                                                                                          reunir as denúncias, como coor-       posta que o Brasil deva apresen-
que o documento atacava a            ção Sindical Mundial, então pre-                                                                                       denador do grupo de trabalho.         tar como defesa, no âmbito da
imagem de importantes qua-           sidida por Enrique Pastorino,                                                                                             Mas uma ordem expressa             ONU. Assim, proponho o seu
dros do regime. “A citação de        que assina o texto. Além das                                                                                           em um ofício do Ministério das        encaminhamento à DSI deste
conceituados oficiais de nossas      mulheres torturadas, o docu-         Octávio Medeiros, em 1968: apontado até pela ONU como torturador                  Relações Exteriores deixa claro       ministério para que informe a
Forças Armadas, como os gene-        mento lista mulheres mortas e                                                                                          que toda informação terá que          respeito das acusações formula-
rais Confúcio, Bandeira, Octávio     desaparecidas durante exercí-                                                                                          ser compartilhada, acabando           das no dossiê anexo”, orientou
Medeiros e Euclides Figueiredo       cio de militância revolucionária.    (…) Mulheres fazem visitas e são       condições tem de adentrar pelo             assim com qualquer possibili-         o consultor jurídico Hélio Fon-
(todos da ativa) e comandante        Relato da organização interna-       obrigadas a tirar a rouba e se         mérito da questão sem o pre-               dade de a pasta responsável pe-       seca, antes de o governo decidir
Clemente, atual diretor da Aca-      cional informa ao governo bra-       submeter a exame ginecológi-           cioso concurso do Departamen-              lo contato com instituições es-       ignorar a resposta à ONU.
demia de Polícia (reserva), como     sileiro sobre violência sexual       co”, traz a denúncia da ONU en-        to de Polícia Federal”, assina             trangeiras cuidar sozinha das             No documento, o Ministério
supostos torturadores leva-nos       contra as mulheres, praticada        caminhada ao Ministério das            Edelberto Luiz da Silva, que ocu-          denúncias. “O Ministério da Jus-      da Justiça também lista nomes
a crer ser prudente não darmos       pelos militares. “Em São Paulo       Relações Exteriores.                   pava o cargo de consultor jurí-            tiça funciona como órgão inter-       de desaparecidos e mortos polí-
crédito a tais denúncias”, escre-    os oficiais, sargentos e agentes         Além de determinar o arqui-        dico do ministério.                        no de coordenação ao qual se-         ticos que representariam o
ve o tenente-coronel Juarez de       da Operação Bandeirantes fre-        vamento das denúncias, a con-                                                     rão transmitidas as informa-          maior “risco” para a imagem do
Deus Gomes da Silva, diretor da      quentemente estupram presas          sultoria jurídica do MRE indi-         IMAGEM Os documentos reve-                 ções recebidas pelo Itamaraty         país, pois o episódio dos crimes
Divisão da Segurança de Infor-       políticas antes, durante e depois    cou que o documento fosse              lam que a ordem era ignorar as             dos organismos internacio-            não tinha suporte jurídico elabo-
mações do Ministério da Justiça,     de infligirem torturas cruéis. (…)   analisado pelo Ministério da           denúncias internacionais, mas              nais”, ordenaram os militares,        rado pelos consultores. Além da
à época.                             Na cidade de Belo Horizonte,         Justiça, aos cuidados do Depar-        os militares estavam preocupa-             para controlar as informações         denúncia da Federação Sindical
    Outro argumento, além de a       em unidade policial, jovens en-      tamento de Polícia Federal. “To-       dos com o estrago que a reper-             que chegavam do exterior.             Mundial, o governo militar foi
denúncia ferir a honra de mili-      tre 12 e 15 anos são torturadas      davia, se outro for o entendi-         cussão das agressões poderia                  Em vez de apurar as denún-         acionado a responder por agres-
tares renomados, foi a falta de      na presença de presos políticos,     mento de vossa senhoria, creio         causar na imagem do Brasil no              cias, os documentos mostram           sões a outros 1.081 cidadãos bra-
um “tradutor exclusivo” para         como forma de demonstração.          que esta consultoria poucas            exterior. A ordem interna era              que os militares se apressaram        sileiros relacionados pela ONU.




Medeiros, um nome ligado à tortura
       MARIA CLARA PRATES
                                                                                                                                          MEMÓRIA
    O advogado Genival Touri-
                                                                                                                                                                                                                                 ARQUIVO/CB/D.A PRESS




nho, deputado cassado duran-
te a ditadura militar, revelou
                                                                                       Nunca falei com                               Tentativa frustrada
que o então tenente-coronel
Octávio Aguiar Medeiros tortu-
                                                                                       ele. Mas posso                                de golpe
rou presos quando estava lota-
do nas dependências da 4ª Re-
                                                                                       atestar que ele
gião Militar, na Rua Juiz de Fo-
ra, Barro Preto, Região Centro-
                                                                                       participou                                    A passagem do general Golbery do Couto e
                                                                                                                                     Silva (foto) por Belo Horizonte, foi
Sul da capital. Conhecido à
época apenas como Medeiros,
                                                                                       de vários                                     motivada por uma tentativa frustrada de
                                                                                                                                     golpe contra o governo de Juscelino
o oficial do Exército teria sido o
responsável pelo espancamen-
                                                                                       espancamentos na                              Kubitschek. Em 24 de agosto de 1954,
                                                                                                                                     quando Getúlio Vargas se suicidou,
to de vários presos políticos,
durante o período de repres-
                                                                                       Rua Juiz de Fora                              Golbery era adjunto do Departamento de
                                                                                                                                     Estudos da Escola Superior de Guerra               golpe. Suas aspirações foram barradas no
são. O general, que chefiou o te-                                                                                                    (ESG). Em fevereiro de 1955, JK foi lançado        Movimento de 11 de Novembro, chefiado
mido Serviço Nacional de In-                                                                                                         pelo Partido Social Democrático (PSD)              pelo ministro da Guerra de João Café Filho,
formações (SNI), de 1978 a                                                                                                           como candidato a presidente da República,          general Henrique Lott, que assegurou a
1985, e ainda o Comando Mili-                                                                                                        tendo como vice João Goulart. O grupo              posse de JK e Goulart. Em razão disso,
tar da Amazônia (CMA), tem                                                             ■ Genival Tourinho, deputado cassado          militar da ESG, liderado por Golbery, não          Golbery foi preso por oito dias e depois
seu nome na relação de tortu-                                                          pela ditadura e advogado que defendeu         apoiou Juscelino e, quando ele foi eleito,         transferido para a 4ª Divisão do Exército na
radores do livro Brasil: tortura                                                       vários presos políticos a partir de 1965,     tentaram impedir sua posse com um                  capital mineira.
nunca mais. Coincidência ou                                                            se referindo ao general Medeiros
não, em seu depoimento ao
Conselho de Defesa dos Direi-
tos Humanos de Minas Gerais          mais aguerridos grupos de re-        vários espancamentos na Rua            que Golbery, depois de deixar o            Golbery apontou o general Me-            De janeiro a agosto de 1980
(Conedh-MG), em 25 de outu-          sistência à ditadura militar, o      Juiz de Fora.”                         governo, classificou o colega de           deiros como suposto autor.            foram registrados no país 46
bro de 2001, a presidente Dilma      Comando de Libertação Nacio-            Com intensa vida política,          farda como “trapalhão”, duran-             “Ah, bom, eu estava meio em           atentados políticos contra ban-
Rousseff citou como um de            nal, o Colina, ao qual a presiden-   que o levou à Câmara dos Depu-         te um encontro dos dois na sede            dúvida, porque isso não está          ca de jornais, associações civis,
seus torturadores em Minas           te era filiada.                      tados em 1969 e depois na legis-       do extinto Banco Cidade de São             me parecendo coisa do Pires           redações, entre outros, além do
um homem que atendia pela                A perseguição a Dilma Rous-      latura de 1974, Tourinho revela        Paulo, em Brasília, às 16h. “Gol-          (Leônidas Pires, ministro do          que causou a morte da funcio-
alcunha de dr. Medeiros.             seff teria se iniciado a partir da   que, além do general Medeiros,         bery queria se inteirar das cir-           Exército durante o governo Jo-        nária da Ordem dos Advogados
    O general Medeiros, que dei-     informação de que ela planeja-       o também temido general Gol-           cunstâncias do atentado que so-            sé Sarney). Está me cheirando a       do Brasil (OAB) do Rio Lyda
xou a cena nacional em 1987 ao       va a fuga de um dos cabeças do       bery do Couto e Silva viveu por        fri em 1980, a 300 metros do ae-           coisa do Medeiros... Eu não te-       Monteiro da Silva. A denúncia
entrar para a reserva, cruzou o      movimento, Ângelo Pezzuti,           dois anos em Belo Horizonte,           roporto de Brasília, ocorrido no           nho dúvida nenhuma em dizer           de Tourinho não foi investiga-
caminho de Dilma ao presidir o       que estava detido no Presídio        servindo também na 4ª Divisão          dia anterior.” Tourinho teve o             que efetivamente isso foi tra-        da, mas lhe rendeu um proces-
Inquérito Policial Militar (IPM)     de Linhares, em Juiz de Fora, Zo-    do Exército, ainda no posto de         carro alvejado por tiros logo de-          palhada do Medeiros”, conta o         so com base na Lei de Segurança
que resultou na prisão da então      na da Mata. O advogado Geni-         major. Segundo o advogado,             pois de denunciar envolvimen-              advogado em um trecho do li-          Nacional, que resultou, em
militante, em 1970, no Rio de Ja-    val Tourinho, que defendeu vá-       Golbery – considerado um dos           to de oficiais do Exército em              vro. Antes do atentado, Genival       1981, na sua condenação a seis
neiro. À época, o militar chefia-    rios presos políticos a partir de    ideólogos do golpe militar de          ações de extrema direita.                  Tourinho denunciou os gene-           meses de prisão e na cassação
va o Centro de Preparação de         1965, contou que viu o então         1964 que depôs o presidente                                                       rais Antônio Bandeira, Milton         de direitos políticos.
Oficiais da Reseva (CPOR), em        tenente-coronel Medeiros vá-         João Goulart e chegou à chefia         TRAPALHADA Segundo Touri-                  Tavares de Souza e José Luiz
Belo Horizonte. Atuando em           rias vezes na sede da 4ª Divisão     da Casa Civil no governo do ge-        nho, que relatou o encontro                Coelho como responsáveis pe-
Minas, o general Medeiros ga-        do Exército em Belo Horizonte.       neral Ernesto Geisel em 1974 –         em seu livro Baioneta calada e             lo que chamou de Operação                 LEIA AMANHÃ
nhou notoriedade nacional ao         “Nunca falei com ele. Mas pos-       não via o general Medeiros com         baioneta falada, depois de ou-             Cristal, que incluía uma série            NOVOS RELATOS SOBRE DILMA
conseguir pôr fim a um dos           so atestar que ele participou de     bons olhos. O advogado lembra          vir a descrição do atentado,               de atentados terroristas.                 E O PERÍODO DA DITADURA

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  • 1. E STA D O D E M I N A S ● S Á B A D O , 2 3 D E J U N H O D E 2 0 1 2 4 POLÍTICA Entre os nomes listados pelas Nações Unidas em 1974 como vítimas da ditadura constava o de Dilma Rousseff. O então general Otávio Medeiros era citado como um dos torturadores ONU denunciou repressão JOSIE JERONIMO redigir em português o texto da ARQUIVO/EM - 6/12/68 denúncia, trabalho que deman- O Ministério das Relações Ex- daria seis meses. O Ministério teriores recebeu em novembro das Relações Exteriores tam- de 1974 denúncia de violação bém alegava que os aponta- dos direitos humanos, encami- mentos não faziam sentido, nhada pela Organização das Na- pois não havia registro de agres- ções Unidas (ONU), relatando sões a presas no país. “Já nesta casos de tortura de 335 mulhe- DSI (Divisão de Segurança de In- res brasileiras, entre elas Dilma formações) não há registro nem Vana Rousseff. A atual presiden- conhecimento de torturas no te é a 56ª mulher descrita no Brasil.” O documento também anexo 7 da denúncia da ONU. reserva anexo para detalhar a No documento em inglês ela é morte de 12 mulheres que so- apresentada como uma “estu- freram agressões de militares, Trecho do relatório em que a militante Dilma é citada entre 335 nomes dante de Minas Gerais, presa em por pertencer a grupos revolu- São Paulo em 1970, condenada a cionários. A denúncia questiona 13 meses em agosto de 1971 no ainda o paradeiro de quatro de- tratar os relatos como “técnica em escalar consultores jurídicos estado da Guanabara, bem co- saparecidas. Os documentos subversiva de tornar a imagem para elaborar “defesa” do Brasil mo a quatro anos pelo Segundo que se tornaram públicos nesta negativa do país no exterior”. junto à ONU, se o organismo in- Tribunal Militar em São Paulo, semana, e estão sob a guarda do Para contornar as críticas que re- ternacional decidisse questio- em 18 de setembro de 1971”. Arquivo Nacional, são uma cebia de instituições internacio- nar o país de forma mais incisi- Apesar de a primeira denún- compilação da troca de ofícios nais que monitoravam as viola- va. As informações sobre viola- cia, que chegou em setembro de entre o Ministério das Relações ções aos direitos humanos, os ções de direitos humanos eram 1972, relatar atrocidades come- Exteriores e o Ministério da Jus- militares criaram um gabinete tratadas como “dossiês” contra tidas pelos militares, o governo tiça e têm 258 páginas. interministerial para avaliar as o governo. “No sentido de que o só analisou formalmente o avi- As denúncias de violação aos denúncias que chegavam. O Ita- presente processo deva ser ins- so em maio de 1975 e decidiu ig- direitos humanos chegaram à maraty seria o responsável por truído para servir de base à res- norar o alerta da ONU, alegando ONU por intermédio da Federa- reunir as denúncias, como coor- posta que o Brasil deva apresen- que o documento atacava a ção Sindical Mundial, então pre- denador do grupo de trabalho. tar como defesa, no âmbito da imagem de importantes qua- sidida por Enrique Pastorino, Mas uma ordem expressa ONU. Assim, proponho o seu dros do regime. “A citação de que assina o texto. Além das em um ofício do Ministério das encaminhamento à DSI deste conceituados oficiais de nossas mulheres torturadas, o docu- Octávio Medeiros, em 1968: apontado até pela ONU como torturador Relações Exteriores deixa claro ministério para que informe a Forças Armadas, como os gene- mento lista mulheres mortas e que toda informação terá que respeito das acusações formula- rais Confúcio, Bandeira, Octávio desaparecidas durante exercí- ser compartilhada, acabando das no dossiê anexo”, orientou Medeiros e Euclides Figueiredo cio de militância revolucionária. (…) Mulheres fazem visitas e são condições tem de adentrar pelo assim com qualquer possibili- o consultor jurídico Hélio Fon- (todos da ativa) e comandante Relato da organização interna- obrigadas a tirar a rouba e se mérito da questão sem o pre- dade de a pasta responsável pe- seca, antes de o governo decidir Clemente, atual diretor da Aca- cional informa ao governo bra- submeter a exame ginecológi- cioso concurso do Departamen- lo contato com instituições es- ignorar a resposta à ONU. demia de Polícia (reserva), como sileiro sobre violência sexual co”, traz a denúncia da ONU en- to de Polícia Federal”, assina trangeiras cuidar sozinha das No documento, o Ministério supostos torturadores leva-nos contra as mulheres, praticada caminhada ao Ministério das Edelberto Luiz da Silva, que ocu- denúncias. “O Ministério da Jus- da Justiça também lista nomes a crer ser prudente não darmos pelos militares. “Em São Paulo Relações Exteriores. pava o cargo de consultor jurí- tiça funciona como órgão inter- de desaparecidos e mortos polí- crédito a tais denúncias”, escre- os oficiais, sargentos e agentes Além de determinar o arqui- dico do ministério. no de coordenação ao qual se- ticos que representariam o ve o tenente-coronel Juarez de da Operação Bandeirantes fre- vamento das denúncias, a con- rão transmitidas as informa- maior “risco” para a imagem do Deus Gomes da Silva, diretor da quentemente estupram presas sultoria jurídica do MRE indi- IMAGEM Os documentos reve- ções recebidas pelo Itamaraty país, pois o episódio dos crimes Divisão da Segurança de Infor- políticas antes, durante e depois cou que o documento fosse lam que a ordem era ignorar as dos organismos internacio- não tinha suporte jurídico elabo- mações do Ministério da Justiça, de infligirem torturas cruéis. (…) analisado pelo Ministério da denúncias internacionais, mas nais”, ordenaram os militares, rado pelos consultores. Além da à época. Na cidade de Belo Horizonte, Justiça, aos cuidados do Depar- os militares estavam preocupa- para controlar as informações denúncia da Federação Sindical Outro argumento, além de a em unidade policial, jovens en- tamento de Polícia Federal. “To- dos com o estrago que a reper- que chegavam do exterior. Mundial, o governo militar foi denúncia ferir a honra de mili- tre 12 e 15 anos são torturadas davia, se outro for o entendi- cussão das agressões poderia Em vez de apurar as denún- acionado a responder por agres- tares renomados, foi a falta de na presença de presos políticos, mento de vossa senhoria, creio causar na imagem do Brasil no cias, os documentos mostram sões a outros 1.081 cidadãos bra- um “tradutor exclusivo” para como forma de demonstração. que esta consultoria poucas exterior. A ordem interna era que os militares se apressaram sileiros relacionados pela ONU. Medeiros, um nome ligado à tortura MARIA CLARA PRATES MEMÓRIA O advogado Genival Touri- ARQUIVO/CB/D.A PRESS nho, deputado cassado duran- te a ditadura militar, revelou Nunca falei com Tentativa frustrada que o então tenente-coronel Octávio Aguiar Medeiros tortu- ele. Mas posso de golpe rou presos quando estava lota- do nas dependências da 4ª Re- atestar que ele gião Militar, na Rua Juiz de Fo- ra, Barro Preto, Região Centro- participou A passagem do general Golbery do Couto e Silva (foto) por Belo Horizonte, foi Sul da capital. Conhecido à época apenas como Medeiros, de vários motivada por uma tentativa frustrada de golpe contra o governo de Juscelino o oficial do Exército teria sido o responsável pelo espancamen- espancamentos na Kubitschek. Em 24 de agosto de 1954, quando Getúlio Vargas se suicidou, to de vários presos políticos, durante o período de repres- Rua Juiz de Fora Golbery era adjunto do Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra golpe. Suas aspirações foram barradas no são. O general, que chefiou o te- (ESG). Em fevereiro de 1955, JK foi lançado Movimento de 11 de Novembro, chefiado mido Serviço Nacional de In- pelo Partido Social Democrático (PSD) pelo ministro da Guerra de João Café Filho, formações (SNI), de 1978 a como candidato a presidente da República, general Henrique Lott, que assegurou a 1985, e ainda o Comando Mili- tendo como vice João Goulart. O grupo posse de JK e Goulart. Em razão disso, tar da Amazônia (CMA), tem ■ Genival Tourinho, deputado cassado militar da ESG, liderado por Golbery, não Golbery foi preso por oito dias e depois seu nome na relação de tortu- pela ditadura e advogado que defendeu apoiou Juscelino e, quando ele foi eleito, transferido para a 4ª Divisão do Exército na radores do livro Brasil: tortura vários presos políticos a partir de 1965, tentaram impedir sua posse com um capital mineira. nunca mais. Coincidência ou se referindo ao general Medeiros não, em seu depoimento ao Conselho de Defesa dos Direi- tos Humanos de Minas Gerais mais aguerridos grupos de re- vários espancamentos na Rua que Golbery, depois de deixar o Golbery apontou o general Me- De janeiro a agosto de 1980 (Conedh-MG), em 25 de outu- sistência à ditadura militar, o Juiz de Fora.” governo, classificou o colega de deiros como suposto autor. foram registrados no país 46 bro de 2001, a presidente Dilma Comando de Libertação Nacio- Com intensa vida política, farda como “trapalhão”, duran- “Ah, bom, eu estava meio em atentados políticos contra ban- Rousseff citou como um de nal, o Colina, ao qual a presiden- que o levou à Câmara dos Depu- te um encontro dos dois na sede dúvida, porque isso não está ca de jornais, associações civis, seus torturadores em Minas te era filiada. tados em 1969 e depois na legis- do extinto Banco Cidade de São me parecendo coisa do Pires redações, entre outros, além do um homem que atendia pela A perseguição a Dilma Rous- latura de 1974, Tourinho revela Paulo, em Brasília, às 16h. “Gol- (Leônidas Pires, ministro do que causou a morte da funcio- alcunha de dr. Medeiros. seff teria se iniciado a partir da que, além do general Medeiros, bery queria se inteirar das cir- Exército durante o governo Jo- nária da Ordem dos Advogados O general Medeiros, que dei- informação de que ela planeja- o também temido general Gol- cunstâncias do atentado que so- sé Sarney). Está me cheirando a do Brasil (OAB) do Rio Lyda xou a cena nacional em 1987 ao va a fuga de um dos cabeças do bery do Couto e Silva viveu por fri em 1980, a 300 metros do ae- coisa do Medeiros... Eu não te- Monteiro da Silva. A denúncia entrar para a reserva, cruzou o movimento, Ângelo Pezzuti, dois anos em Belo Horizonte, roporto de Brasília, ocorrido no nho dúvida nenhuma em dizer de Tourinho não foi investiga- caminho de Dilma ao presidir o que estava detido no Presídio servindo também na 4ª Divisão dia anterior.” Tourinho teve o que efetivamente isso foi tra- da, mas lhe rendeu um proces- Inquérito Policial Militar (IPM) de Linhares, em Juiz de Fora, Zo- do Exército, ainda no posto de carro alvejado por tiros logo de- palhada do Medeiros”, conta o so com base na Lei de Segurança que resultou na prisão da então na da Mata. O advogado Geni- major. Segundo o advogado, pois de denunciar envolvimen- advogado em um trecho do li- Nacional, que resultou, em militante, em 1970, no Rio de Ja- val Tourinho, que defendeu vá- Golbery – considerado um dos to de oficiais do Exército em vro. Antes do atentado, Genival 1981, na sua condenação a seis neiro. À época, o militar chefia- rios presos políticos a partir de ideólogos do golpe militar de ações de extrema direita. Tourinho denunciou os gene- meses de prisão e na cassação va o Centro de Preparação de 1965, contou que viu o então 1964 que depôs o presidente rais Antônio Bandeira, Milton de direitos políticos. Oficiais da Reseva (CPOR), em tenente-coronel Medeiros vá- João Goulart e chegou à chefia TRAPALHADA Segundo Touri- Tavares de Souza e José Luiz Belo Horizonte. Atuando em rias vezes na sede da 4ª Divisão da Casa Civil no governo do ge- nho, que relatou o encontro Coelho como responsáveis pe- Minas, o general Medeiros ga- do Exército em Belo Horizonte. neral Ernesto Geisel em 1974 – em seu livro Baioneta calada e lo que chamou de Operação LEIA AMANHÃ nhou notoriedade nacional ao “Nunca falei com ele. Mas pos- não via o general Medeiros com baioneta falada, depois de ou- Cristal, que incluía uma série NOVOS RELATOS SOBRE DILMA conseguir pôr fim a um dos so atestar que ele participou de bons olhos. O advogado lembra vir a descrição do atentado, de atentados terroristas. E O PERÍODO DA DITADURA