Breve descrição das pegadas encontradas na jazida de Bouro I.
Trabalho apresentado no Concurso Cientistas em Ação, Centro de Ciência Viva de Estremoz, 2017.
Poster pegadas de dinossáurios na jazida do bouro - pegadas «estranhas».
1. António Xavier, professor nas Caldas da Rainha, descobriu
em 1995 um pequeno afloramento calcário na Serra do
Bouro com 3 ou 4 pegadas de dinossáurios, no local
conhecido por “pedras Negras”.
Pegadas de dinossáurios na serra do Bouro – pegadas «estranhas»
Rodrigo Araújo, João Cazalta, Inês Chélinho, João Roboredo - 6º e 7º anos
Agrupamento de escolas de Paço de Arcos – Grupo de Paleontologia (GP)
As grandes depressões são identificadas como pegadas de saurópodes pela presença de várias sinapomorfias do
grupo – grandes dimensões (pegadas de pés alcançando os 80 cm de comprimento), postura quadrupede (mãos e
pés), mão elítica mostrando a presença de metacarpos com disposição semicircular e impressões de pés que se
alargam anteriormente (Wilson 2005).
Dentro de Sauropoda as pegadas podem ser atribuídas a Eusauropoda com base na presença de uma impressão
bem marcada do calcanhar por detrás dos dígitos, indicadora de uma almofada carnuda do pé,
Salta à vista foi a aparente discrepância entre a boa preservação das impressões dos
pés, onde são bem visíveis as marcas dos unguais / dígitos e a aparente má
preservação das pegadas das respetivas mãos, preservadas apenas como umas
pequeníssimas depressões em forma de meia lua, sem quaisquer detalhes, e que só a
posição relativa às impressões dos pés permitem confirmar que se trata de mãos.
As impressões dos dígitos / unguais das pegadas
dos pés recurvadas são referidas como uma
sinapomorfia ou de Neosauropoda,
Sucessivas saídas de campo permitiram que os alunos do
GP confirmassem a origem dinossauriana da amostra de
pegadas (preservadas como epirrelevos côncavos), que foi
aumentando com os trabalhos de limpeza desse e de outros
afloramentos, que surgem sempre num mesmo nível calcário
com bivalves marinhos datado do Jurássico superior
(Kimmeridgiano, cerca de 150 milhões de anos).
Descobrimos depois uma pista em que a morfologia da mão é totalmente distinta. Apresenta uma forma distinta,
em feijão, com uma grande garra no dígito I e integra pista também larga.
Sugerimos que, como ocorre na jazida
de Ardley (Jurássico médio de
Inglaterra), dois saurópodes distintos
tenham passado em conjunto na zona,
formando um grupo não
monoespecífico, como acontece com os
grandes ungulados em África. Mais uma
razão para considerarmos estas
pegadas como «estranhas».
Dois segmentos de pistas de sauropodes, com a mesma direcção e sentido. Um deles deixou
impressão de mão "típica", com um ungual I bem saliente e onde são se observam ainda as
impressões de outros unguais/ dígitos ou extremidades dos metacarpos. A heteropodia aproxima-se de
1 para 3. O outro deixou uma impressão de mão mais reduzida, sem qualquer detalhe de unguais,
dígitos ou extremidade distal dos metacarpos. Consequentemente a heteropodia é bastante mais
elevada, rondando 1 para 7.
Os terópodes deinonicossáurios são famosos através do “Velociraptor” – possuem uma grande
garra no digito II do pé, retráctil e hiperatrofiada, em forma de foice, que funcionalmente não
tocaria no solo – as suas pegadas serão didáctilas. Esta sinapomorfia só foi reconhecida no
registo icnológico em 1994.
Duas pegadas sucessivas, correspondendo aos pé esquerdo e direito de um terópode são
identificadas no afloramento «principal». Estão quase em linha reta e uma análise mais
detalhada, apesar da má preservação, permite reconhecer que a impressão do dígito II é
muito curta. O que pode representar a passagem do primeiro deinonicossaurio reconhecido
em Portugal. Terceira razão para considerarmos estas pegadas como «estranhas».
Em alguns casos as impressões das mãos estão localizadas muito
perto da zona anterior das pegadas das pés, permitindo supor que
possa ter ocorrido sobreposição parcial do autopode posterior sobre a
impressão deixada pela mão do mesmo lado do corpo – a pressão
exercida pela extremidade do membro posterior pode empurrar o
substrato para a frente, esbatendo, alterando, diminuindo as
dimensões das pegadas das mãos, pelo que a heteropodia real
poderá ter sido inferior.
Em Dezembro de 2004, colocaram à vista um novo segmento de pista de sauropode, confirmando pela primeira vez que os autores eram do tipo
wide-guage, deixando pistas largas.
Mais uma vez, encontramos pegadas de pés com as impressões dos dígitos / unguais bem preservadas, com rotação para fora da linha média
da pista e pegadas de mãos muito reduzidas, com forma de uma pequena meia-lua e sem qualquer detalhe de dígitos / unguais.
Neste caso, o grande afastamento das impressões dos autopodes do mesmo lado do corpo implica que a elevada heteropodia observada (cerca
de 1 para 7) seja real e não um artefacto preservacional.
Para distinguirmos pegadas / pistas de saurópodes aplicamos vários critérios:
. Configuração das pistas (estreitas, largas, muito largas);
. Colocação relativa das pegadas de mãos e/ou pés relativamente à linha média da
pista
. Morfologia geral das pegadas de mãos e de pés
. Disposição e número das impressões dos dígitos / unguais, tanto de mãos como de
pés
. Heteropodia
Mas não se conhece no mundo a combinação pistas largas e heteropodia de 1:6 ou 1:7, como acontece nesta jazida. Quem poderá ter deixado estas pistas? Primeira
razão para considerarmos estas pegadas como «estranhas».
Sugerimos que o autor poderá ser um neosauropode titanossauriforme de um grupo ainda desconhecido (as pistas largas a partir do Jurássico superior são atribuídas a
este grupo), com mão digítigrada de pequenas dimensões, provavelmente de um grupo de titanossaurios avançado, pela perda das falanges manuais.
Todas estas caraterísticas diferentes podem combinar-se.