1. Justiça FederallPE
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PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
Ia Vara
PROCESSO: 0020334-25.2011.4.05.8300
CLASSE: 32 AÇÃO POPULAR
AUTOR: ANTONIO JORDÃO DE OLIVEIRA NETO E OUTRO
RÉU: UNIÃO E OUTROS
DECISÃO
Registro eletrônico
Vistos etc.
ANTÔNIO JORDÃO DE OLIVEIRA NETO, e LILIANE MEDEIROS VIANA
PERITORE impetraram a presente ação popular em face da União, Estado
de Pernambuco e do INSTITUTO DE MEDICINA INTEGRAL DE PERNAMBUCO
IMIP, e requestaram medida 1iminar para que seja determinado ao
Estado de Pernambuco a imediata reabertura do CENTRO DE TRANSPLANTES
DE MEDULA ÓSSEA DO'HEMOPE - CTMO do HEMOPE.
Relatam, aqui em rápida síntese, que o ato de fechamento do
CENTRO DE TRANSPLANTES DE MEDULA ÓSSEA DO HEMOPE - CTMO, fundação pública
estadual, feriu a legalidade e a moralidade da gestão pública.
Foram juntadas manifestações do IMIP (fls. 36/43), da União (fls.
64/85), e do Estado de Pernambuco (fls. 86/99).
É o que basta relatar. Passo a decidir.
É de elementar sabença que o caput do art. 5° da
Constituição Federal garante a todos o direito à vida, do qual decorre
o direito à saúde, elevado à condição de direito social pelo art. 6° do
texto constitucional, senão vejamos:
"Art. 5 o Todos são igua is perante a lei, sem dis tinção
de qualquer na tureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito J vida, ~ liberdade, J igualdade, ~ segurança e ~
propr iedade, ( ... )".
"Art. t? São direitos sociais a educação, a saúde, o
trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência
social, a proteção ~ maternidade e J infância, a
assistência aos desamparados, na forma desta
Cons ti tuição".
No artigo 196 de nossa Magna Carta, está disposVJ,l..e···a
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saúde é direito de todos e dever do Estado, o qual, por todas as suas
esferas, deve prover à populaçâo 09 meios ao adequado acesso à saúde.
Nesse sentido:
"CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO.
TRATAMENTO MÉDICO HOSPITALAR E FORNECIMENTO DE
MEDICAMENTOS. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. DISPONIBILIZAÇÃO
DE LEITO EM UTI. POSSIBILIDADE. 1. Agravo de Instrumento
manejado em face da decisão que deferiu, em parte,
pedido liminar que compeliu a União, o Estado do Ceará e
o Município de Fortaleza a disponibilizar uma vaga na
UTI para a ora Agravada. 2. O direito à saúde esta
previsto em nível
constitucional, sendo direito
universal de dever prestacional
todos e do Estado em
todas as suas esferas, devendo este prover os meios ao
seu adequado acesso e promoção. 3. Decisão que apenas
buscou assegurar os meios adequados à sobrevivência da
Agravada, que não tem condições de arcar com os al tos
custos de sua internação, até o deslinde da ação
ordinária. Agravo de Instrumento improvido. (AG
200905001174854, Desembargador Federal Geraldo Apoliano,
TRF5 Terceira Turma, 02/06/2010) (grifos
acrescentados)'!
No âmbito da legislaçâo infraconstitucional, relevante notar,
nos termos do art. 2° da Lei n° 8.080/90, que "a saúde é um direito
fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições
indispensáveis ao seu pleno exercicio".
Observa-se dos autos que o CTMO, fundação pública vinculada à
Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco, prestava tradicionalmente um
serviço público de saúde Qe alta complexidade e excelência, ao
desempenhar, duas importantissimas ações para seus pacientes: o
transplante de medula óssea propriamente dito, procedimento almejado por
uma série de pessoas enfermas e de relativa gravidade que compõem extensa
lista de espera (fls. 25/27), e o acompanhamento médico dos pacientes
transplantados.
Tudo isso reclama continuidade, nos termos da Constituição
Federal.
Por intermédio de Nota Oficial juntada à fl. 22, vê-se que o
Estado delegou parcialmente sua responsabilidade constitucional com a
saúde, já consolidada nessa área especifica, para a iniciativa privada,
enquanto esta deveria atuar apenas de forma complementar e não
substitutivamente, ex vi dos termos do art. 199 da Lei Maior, in verbis:
"Art. 199. A assistência à saúde é livre à inicia ti va
privada.
§ 1° - As instituições privadas poderão participar de
forma complementar do sistema único de saúde, segundo
diretrizes deste, mediante contra to de direi to público
ou convênio, tendo preferência as erit i.de.des
filantrópicas e as sem fins lucrativos." ~
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Observa-se, pois, uma espécie de negligência aos deveres
político-institucionais da entidade de direito público interno em alusão
(Estado de Pernambuco).
Com efeito, resta incontroverso EOS autos que o serviço de
extrema importância pública prestado pelo CTMO, o qual contava com 03
lei tos, foi transferido para os lei tos credenciados do SUS no Hospital
Português, onde já constavam leitos no total de 6 para tal
disponibilidade. Dessa forma, é evidente a sensível diminuição na
estrutura hospitalar de atendimento ã saúde da população, em tudo
censurável.
Adicionalmente, por força do disposto na Constituição (art.
37, XXI) e na lei 8.666/93 (arts. 24 e 25), a Administração Pública deve
realizar licitação pública previamente a qualquer transpasse da prestação
de serviços de assistência ã saúde para a iniciativa privada.
Nesse sentido:
"MINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
LEGITIMIDADE ATIVA E INTERESSE DE AGIR DO MINISTÉRIO
PÚBLICO FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. DESNECESSIDADE DA
PRESENÇA DA UNIÃO NO FEITO. DENUNCIA çÃO À LIDE
REJEITADA. DEFESA NÃO CERCEADA. SUS. REALIZAÇÃO DE
CONTRATO ENTRE UNIDADE DA FEDERAÇÃO E EMPRESA PRIVADA
PARA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE.
NECESSIDADE DE LICITAÇÃO PRÉVIA. CONTRATO ANULADO.
PEDIDO DE RESSARCIMENTO REJEITADO. 1. O ~nistério
PúbLico FederaL é parte Legítima no feito, com interesse
de agir, na medida em que, ocorrendo a contratação de
rede hospitaLar privada, no âmbito do SUS, sem Licitação
prévia, pode e deve requerer a anuLação do referido
contrato, a fim de proteger o patrimônio púbLico, o que
determina a competência da Justiça FederaL (art. 129,
III, da C.F., e art. 6°, VII, "b", da Lei CompLementar
n° 75/93). 2. O pedido é juridicamente possível em razão
da exigência de contratação de serviços pela
Administração mediante lici tação, nos termos da Lei n°
8.666/93 e do art. 37, XXI, da C.F. 3. Não deve a União
integrar o feito como litisconsorte necessário, pois não
participou do contrato e não será atingida por qualquer
que seja o desfecho do processo. 4. Descabida a
denunciação à lide, na medida em que o hospital,
integrante do pólo passivo da ação, suportará os mesmos
ônus processuais do Estado do Maranhão. 5. Não há
cerceamento de defesa quando indeferido pedido de
produção de provas desnecessárias à instrução do
processo. 6. Por força do disposto no art. 37, XXI, da
C.F" e dos arts. 24 e 25, da Lei n° 8.666/93, deve-se,
a fim de serem obedecidos os princípios norteadores da
Administração PúbLica, reaLizar Licitação prévia nas
hipóteses de prestação de serviços de assistência à
saúde de cLienteLa do SUS, sob pena do contrato ser
anuLado. 7. Descabe a condenação do Estado do Maranhão
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no ressarcimento aos cofres públicos dos valores por ele
repassados à hospital privado, na medida em que os
serviços de assistência à saúde foram prestados à
clientela do SUS. 8. Agravo retido, apelação e remessa
oficial não providos. (AC 199801000467570, JUIZ CARLOS
ALBERTO SIMÕES DE TOMAZ (CONV.), TRFl TERCEIRA TURMA
SUPLEMENTAR (INATIVA) r DJ DATA:14/11/2002 PAGINA:373.-
grifas acrescentados)"
Desse modo , resta patente que a decisão de fechar o CTMO do
HEMOPE e transferir por completo a responsabilidade do atendimento dos
pacientes para o Hospital Português foi efetuada em desrespeito aos
direitos sociais fundamentais do cidadãor às normas de regência da
licitação r à moralidade e ao patrimônio públicos.
Posto isto DEFIRO A MEDIDA LIMINAR requestada na petição
inicial r o que faço com apoio no art. 5°r § 4°, da Lei n° 4.717/65r para
determinar ao Estado de Pernarnbucor suspensos por inteiror os efeitos do
ato indigi tado r a imediata reabertura e funcionamento regular do CENTRO
DE TRANSPLANTES DE MEDULA ÓSSEA DO HEMOPE.
Concedo o prazo de 30 (trinta) dias para o inteiro cumprimento
desta providência.
de 2012 .•.