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Ficha
informativa
n.º 4
A descrição do real e o papel das sensações
1. O espaço real
As descrições, por vezes fotográficas, seguem uma geografia precisa, nos
arruamentos, nos jardins, nos largos. Sabemos com exatidão onde mora grande parte das
suas personagens. É que todos os elementos que caracterizam e identificam o meio
geográfico personalizam a ação e as personagens, criando no leitor, simultaneamente, a
ilusão da realidade. […]
A naturalidade do diálogo e a descrição dos espaços cénicos urbanos, quer de interior
quer de exterior, onde decorre a ação, são ingredientes de que Eça se serve para provocar
no leitor a sensação de autenticidade da sua ficção.
Ficha informativa n.º 4
O cenário urbano recriado não é, porém, na narrativa queirosiana, um mero pano de
fundo. Ele motiva o diálogo, compartimenta e dinamiza a ação, complementando o próprio
caráter das personagens. […]
Poderá dizer-se em suma que a descrição dos ambientes […] pretende tornar crível ao
leitor o mundo romanesco criado pelo escritor, desempenhando a recriação dos cenários
urbanos autênticos importante papel de credibilidade [e pressupõe] a intenção de
evidenciar através da paisagem urbana, até de ambientes de interior, determinadas
situações da narrativa, em consonância com o caráter das personagens.
A. Campos Matos (org. e coord.), Dicionário de Eça de Queirós,
2.ª edição, Lisboa, Editorial Caminho, 1993, pp. 380-382.
Ficha informativa n.º 4
2. A importância das sensações
Ficha informativa n.º 4
Sensações Exemplos Papel das sensações
Visuais «Mas era no camarote, quando a luz caía sobre o seu colo ebúrneo
e as suas tranças de oiro, que ela [Maria Monforte] oferecia
verdadeiramente a encarnação de um ideal da Renascença […].»
(Cap. I, pp. 25-26)
– Conferir dinamismo descritivo e
vivacidade à narrativa.
– Tornar a descrição do real
mais sugestiva, apelando ao uso
dos sentidos.
– Recriar não só espaços e
personagens, como também a
ambiência que os rodeia.
– Transportar o leitor para
«dentro» da narrativa, através
das emoções e dos instintos.
– Expandir a perceção da obra
literária.
As perceções sensoriais são
transmitidas, muitas vezes,
através de recursos expressivos
como a sinestesia, a comparação,
a metáfora, o uso expressivo do
adjetivo e do advérbio.
Olfativas «[…] os lilases das jarras exalavam um aroma vivo, a que se
misturava o do creme queimado, tocado de um fio de limão […].»
(Cap. III, p. 68)
Auditivas «Mas o Eusebiozinho, a um repelão mais forte, rolara no chão,
soltando gritos medonhos.» (Cap. III, p. 77)
«[Eusebiozinho] abriu a boca, e como de uma torneira lassa veio
de lá escorrendo, num fio de voz, um recitativo lento e babujado:
É noite […].» (Cap. III, p. 80)
Táteis «Este pesado e enorme angora, branco com malhas louras, era
agora […] o fiel companheiro de Afonso. Tinha nascido em Santa
Olávia, e recebera então o nome de «Bonifácio» […].» (Cap. I, p.
14)
Gustativas «Mas o rapaz, abraçando-o mais forte, dava-lhe grandes razões,
num murmúrio de mimo doce como um beijo, que ia pondo na
face do velho uma fraqueza indulgente.» (Cap. III, p. 69)

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  • 2. A descrição do real e o papel das sensações 1. O espaço real As descrições, por vezes fotográficas, seguem uma geografia precisa, nos arruamentos, nos jardins, nos largos. Sabemos com exatidão onde mora grande parte das suas personagens. É que todos os elementos que caracterizam e identificam o meio geográfico personalizam a ação e as personagens, criando no leitor, simultaneamente, a ilusão da realidade. […] A naturalidade do diálogo e a descrição dos espaços cénicos urbanos, quer de interior quer de exterior, onde decorre a ação, são ingredientes de que Eça se serve para provocar no leitor a sensação de autenticidade da sua ficção. Ficha informativa n.º 4
  • 3. O cenário urbano recriado não é, porém, na narrativa queirosiana, um mero pano de fundo. Ele motiva o diálogo, compartimenta e dinamiza a ação, complementando o próprio caráter das personagens. […] Poderá dizer-se em suma que a descrição dos ambientes […] pretende tornar crível ao leitor o mundo romanesco criado pelo escritor, desempenhando a recriação dos cenários urbanos autênticos importante papel de credibilidade [e pressupõe] a intenção de evidenciar através da paisagem urbana, até de ambientes de interior, determinadas situações da narrativa, em consonância com o caráter das personagens. A. Campos Matos (org. e coord.), Dicionário de Eça de Queirós, 2.ª edição, Lisboa, Editorial Caminho, 1993, pp. 380-382. Ficha informativa n.º 4
  • 4. 2. A importância das sensações Ficha informativa n.º 4 Sensações Exemplos Papel das sensações Visuais «Mas era no camarote, quando a luz caía sobre o seu colo ebúrneo e as suas tranças de oiro, que ela [Maria Monforte] oferecia verdadeiramente a encarnação de um ideal da Renascença […].» (Cap. I, pp. 25-26) – Conferir dinamismo descritivo e vivacidade à narrativa. – Tornar a descrição do real mais sugestiva, apelando ao uso dos sentidos. – Recriar não só espaços e personagens, como também a ambiência que os rodeia. – Transportar o leitor para «dentro» da narrativa, através das emoções e dos instintos. – Expandir a perceção da obra literária. As perceções sensoriais são transmitidas, muitas vezes, através de recursos expressivos como a sinestesia, a comparação, a metáfora, o uso expressivo do adjetivo e do advérbio. Olfativas «[…] os lilases das jarras exalavam um aroma vivo, a que se misturava o do creme queimado, tocado de um fio de limão […].» (Cap. III, p. 68) Auditivas «Mas o Eusebiozinho, a um repelão mais forte, rolara no chão, soltando gritos medonhos.» (Cap. III, p. 77) «[Eusebiozinho] abriu a boca, e como de uma torneira lassa veio de lá escorrendo, num fio de voz, um recitativo lento e babujado: É noite […].» (Cap. III, p. 80) Táteis «Este pesado e enorme angora, branco com malhas louras, era agora […] o fiel companheiro de Afonso. Tinha nascido em Santa Olávia, e recebera então o nome de «Bonifácio» […].» (Cap. I, p. 14) Gustativas «Mas o rapaz, abraçando-o mais forte, dava-lhe grandes razões, num murmúrio de mimo doce como um beijo, que ia pondo na face do velho uma fraqueza indulgente.» (Cap. III, p. 69)