Minha apresentação sobre A Razão Sem Voto, texto de Luís Roberto Barroso, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), sobre A Função Representativa e Majoritária das Cortes Constitucionais.
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Luís Roberto Barroso: Ministro do STF e ex-presidente do TSE
1.
2. LUÍS ROBERTO BARROSO • É um jurista, professor e magistrado brasileiro, atualmente ministro
do Supremo Tribunal Federal (STF), do qual é vice-presidente. É ex-
presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
• Em 23 de maio de 2013, a presidente da República, Dilma Rousseff,
indicou-o para ocupar a vaga aberta pela aposentadoria do ministro
Carlos Ayres Britto no Supremo Tribunal Federal. Anteriormente,
Barroso havia sido considerado como cotado para o cargo em outras
ocasiões. Após ser sabatinado pelo Senado Federal, foi aprovado com
26 votos favoráveis e 1 contrário na Comissão de Constituição e
Justiça e 59 votos favoráveis e 6 contrários no Plenário.
• Bacharel em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ, 1980), onde atualmente é professor titular de Direito
Constitucional. Mestre em Direito pela Yale Law School (EUA, 1988),
Doutor em Direito Público pela UERJ (2008) e Visiting Scholar
(Professor Visitante, em português) por Harvard Law School, EUA, 2011.
3. MARK TUSHNET
Tushnet se formou no Harvard College e na Yale Law School e atuou como assistente
jurídico do juiz Thurgood Marshall, é especialista em direito e teoria constitucional,
incluindo direito constitucional comparado. Sua pesquisa inclui estudos de revisão
constitucional nos Estados Unidos e em todo o mundo, e a criação de outras “instituições
para proteger a democracia constitucional”. Ele também escreve na área de história
legal e particularmente constitucional, com trabalhos sobre o desenvolvimento da lei de
direitos civis nos Estados Unidos e uma história da Suprema Corte na décadade 1930.
Os caminhos dele e do Barroso se cruzaram algumas vezes ao longo dos anos. Barroso lia
seus textos, em mais à frente, passou a encontrar, aqui e ali, em seminários e eventos
acadêmicos. Durante sua estada como visiting scholar em Harvard, em 2011, teve
oportunidade de trocar ideias em mais de uma ocasião. No Brasil também, em Porto
Alegre.
Outro debate foi na Universidade de Harvard, em Cambridge, nos Estados Unidos, a
propósito das relações entre direito e política e, particularmente, do papel de supremas
cortes e tribunais constitucionais em uma democracia. Nessa matéria, possuíam
questões, tinham pontos de observação diferentes. Tais divergências não eram
propriamente filosóficas ou ideológicas. Em verdade, ao menos em boa parte, elas
podem ser creditadas à experiência recente de nossos países no tocante à jurisdição
constitucional.
4. UM DOSSIÊ SOBRE TAXONOMIA DAS GERAÇÕES DO DIREITO
No modelo antigo, a Constituição era compreendida, essencialmente, como um documento político, cujas normas não
eram aplicáveis diretamente, ficando na dependência de desenvolvimento pelo legislador ou pelo administrador.
Tampouco existia o controle de constitucionalidade das leis pelo Judiciário – ou, onde existia, era tímido e pouco
relevante. Nesse ambiente, vigorava a centralidade da lei e a supremacia do parlamento.
No Estado Constitucional de Direito, a Constituição passa a valer como norma jurídica. A partir daí, ela não apenas
disciplina o modo de produção das leis e atos normativos, como estabelece determinados limites para o seu conteúdo,
além de impor deveres de atuação ao Estado.
Nesse novo modelo, vigora a centralidade da Constituição e a supremacia judicial, como tal entendida a primazia de um
tribunal constitucional ou suprema corte na interpretação final e vinculante das normas constitucionais. A expressão
jurisdição constitucional designa a interpretação e aplicação da Constituição por órgãos judiciais. No caso brasileiro –
e dos países que seguem o modelo americano em geral –, essa competência é exercida por todos os juízes e tribunais,
situando-se o Supremo Tribunal Federal no topo do sistema. A jurisdição constitucional compreende duas atuações.
5. JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL: DUAS ATUAÇÕES PARTICULARES
A primeira, de aplicação direta da Constituição às
situações nela contempladas. Exemplo: O
reconhecimento de direito à liberdade de expressão
sem censura prévia. Logo, não precisam que uma norma
seja criada para regular seus efeitos, produzem efeitos
a partir da promulgação da Constituição.
A segunda atuação envolve a aplicação indireta da
Constituição, que se dá quando o intérprete a utiliza
como parâmetro para aferir a validade de uma norma
infraconstitucional (controle de constitucionalidade) ou
para atribuir a ela o melhor sentido, em meio a
diferentes possibilidades (interpretação conforme a
Constituição).
6. JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL: DUAS ATUAÇÕES PARTICULARES
Em suma: a jurisdição constitucional compreende o poder exercido por
juízes e tribunais na aplicação direta da Constituição, no desempenho do
controle de constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público em
geral e na interpretação do ordenamento infraconstitucional conforme a
Constituição.
Do ponto de vista político-institucional, o desempenho da jurisdição
constitucional por supremas cortes ou tribunais constitucionais mundo
afora envolve dois tipos de atuação: a contramajoritária e a representativa.
A atuação contramajoritária é um dos temas mais analisados na teoria
constitucional, que há muitas décadas discute a legitimidade democrática
da invalidação de atos do Legislativo e do Executivo por órgão jurisdicional.
Já a função representativa tem sido largamente ignorada pela doutrina e
pelos formadores de opinião em geral.
7. EFEITO BACKLASH DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL: REAÇÕES POLÍTICAS
Levando em consideração a ascensão do constitucionalismo, torna-se
comum evidenciarmos decisões judiciais em assuntos que geram
polêmicas e a partir disso, gerar descontentamento popular, ocasionando
reação política contrária ao que foi decidido.
Ainda que não seja possível prever os desdobramentos deste fenômeno,
decerto, a jurisdição constitucional, ainda que progressista pode ocasionar
ainda que de forma não direta, crescimento político conservador,
ocasionando assim, retrocesso social em questões sensíveis politicamente.
Em 1972, no caso Furman vs. Georgia, a Suprema Corte dos Estados Unidos,
decidiu por 5 a 4, que a pena de morte não era compatível com a 8ª Emenda
da Constituição Norte-Americana, no qual proíbe penas cruéis e incomuns, o
que parecia o fim da pena capital avassalou movimentos políticos e grupos
conservadores que lutaram para endurecer as legislação penal,
conquistando diversos cargos no parlamento e também no Executivo.
8. A CRISE DA REPRESENTAÇÃO POLÍTICA
Até que ponto é possível afirmar, sem apegar-se a uma ficção ou a uma
idealização desconectada dos fatos, que os atos legislativos correspondem,
efetivamente, à vontade majoritária?
Há muitas décadas, em todo o mundo democrático, é recorrente o discurso
acerca da crise dos parlamentos e das dificuldades da representação política.
Em países de voto obrigatório, como o Brasil, um percentual muito baixo de
eleitores é capaz de se recordar em quem votou nas últimas eleições
parlamentares.
Disfuncionalidade, corrupção, captura por interesses privados são temas
globalmente associados à atividade política. E, não obstante isso, em qualquer
Estado democrático, política é um gênero de primeira necessidade. Mas as
insuficiências da democracia representativa, na quadra atual, são
excessivamente óbvias para serem ignoradas. A consequência inevitável é a
dificuldade de o sistema representativo expressar, efetivamente, a vontade
majoritária da população.
9. O PAPEL CONTRAMAJORITÁRIO DAS CORTES SUPREMAS E O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
O Supremo Tribunal Federal, como as cortes constitucionais em
geral, exerce o Controle de Constitucionalidade dos atos
normativos, inclusive os emanados do Poder Legislativo e da
chefia do Poder Executivo.
No desempenho de tal atribuição, pode invalidar atos do
Congresso Nacional – composto por representantes eleitos pelo
povo brasileiro – e do Presidente da República, eleito com mais
de meia centena de milhões de votos. Vale dizer: onze Ministros
do STF (na verdade seis, pois basta a maioria absoluta), que
jamais receberam um voto popular, podem sobrepor a sua
interpretação da Constituição à que foi feita por agentes
políticos investidos de mandato representativo e legitimidade
democrática. Doutrina chama “Dificuldade Contramajoritária”.
10. O PAPEL REPRESENTATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Cumpre registrar que esse papel contramajoritário do Supremo Tribunal Federal tem sido exercido, como é próprio, com razoável
parcimônia. De fato, nas situações em que não estejam em jogo direitos fundamentais e os pressupostos da democracia, a Corte
deve ser deferente para com a liberdade de conformação do legislador e a razoável discricionariedade do administrador. Por isso
mesmo, é relativamente baixo o número de dispositivos de leis federais efetivamente declarados inconstitucionais, sob a vigência
da Constituição de 1988.
Acerca do importante papel democrático da jurisdição constitucional, é possível apresentar algumas decisões significativas do
Supremo Tribunal Federal que contribuíram para o avanço social no Brasil. Todas elas têm natureza constitucional, mas produzem
impacto em um ramo específico do Direito, como enunciado abaixo:
Direito Civil: proibição da prisão por dívida no caso de depositário infiel, reconhecendo a eficácia e prevalência do Pacto de San
Jose da Costa Rica em relação ao direito interno; Direito Penal: declaração da inconstitucionalidade da proibição de progressão
para regime mais favorável de cumprimento de pena, em caso de crimes hediondos e equiparáveis; Direito à Saúde: determinação
de fornecimento de gratuito de medicamentos necessários ao tratamento da AIDS em pacientes sem recursos financeiros; Direito
das Mulheres: direito à antecipação terapêutica do parto em caso de feto anencefálico; constitucionalidade da Lei Maria da Penha,
que reprime a violência doméstica contra a mulher.
11. O PRINCÍPIO DO CONTRAMAJORITARISMO NO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL E A UNIÃO HOMOAFETIVA (ADPF 132/RJ E ADIN 42777)
O Princípio do Contramajoritarismo, no dizente à sua aplicabilidade e seu
respectivo exercício pelo Supremo Tribunal Federal para que se alcance a
proteção de direitos de determinados grupos sociais, os quais se encontram em
minoria e possuem seus direitos violados, buscando ilustrar o funcionamento
do princípio em estudo na jurisdição brasileira através do caso da união
homoafetiva.
Em 2011, depois de julgar a Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental – ADPF 132 conexa com a Ação Direta de Inconstitucionalidade –
ADI 42777, por votação unânime, o Supremo Tribunal Federal, reconheceu a união
estável homossexual como uma entidade familiar e a ela atribuiu todos os
direitos equiparando essas relações com as uniões estáveis que são formadas
por homens e mulheres.
12. ADPF 742/2020: SUPREMO DETERMINA QUE GOVERNO FEDERAL ELABORE
PLANO DE COMBATE À COVID-19 PARA POPULAÇÃO QUILOMBOLA
Em 2021, o STF determinou que o Governo Federal
elaborasse, no prazo de 30 dias, plano nacional
de enfrentamento da pandemia da Covid-19
voltado à população quilombola, com
providências e protocolos sanitários para
assegurar a eficácia da vacinação na fase
prioritária. A formulação contou com a
participação de representantes da Coordenação
Nacional de Articulação das Comunidades
Negras Rurais Quilombolas (Conaq). A decisão
foi tomada pelo Plenário da Corte, na sessão
virtual encerrada em 23/02/21, ao julgar
procedente a Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental (ADPF) 742.
13. CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Um desses valores fundamentais é o direito de cada indivíduo a igual respeito e
consideração, isto é, a ser tratado com a mesma dignidade dos demais – o que inclui
ter os seus interesses e opiniões levados em conta. A democracia, portanto, para
além da dimensão procedimental de ser o governo da maioria, possui igualmente
uma dimensão substantiva, que inclui igualdade, liberdade e justiça. É isso que a
transforma, verdadeiramente, em um projeto coletivo de autogoverno, em que
ninguém é deliberadamente deixado para trás. Mais do que o direito de participação
igualitária, democracia significa que os vencidos no processo político, assim como
os segmentos minoritários em geral, não estão desamparados e entregues à própria
sorte. Justamente ao contrário, conservam a sua condição de membros igualmente
dignos da comunidade política. Em quase todo o mundo, o guardião dessas
promessas é a suprema corte ou o tribunal constitucional, por sua capacidade de ser
um fórum de princípios – isto é, de valores constitucionais, e não de política – e de
razão pública – isto é, de argumentos que possam ser aceitos por todos os envolvidos
no debate. Seus membros não dependem do processo eleitoral e suas decisões têm
de fornecer argumentos normativos e racionais que a suportem”. (BARROSO, 2006)