Este documento descreve João Patrocínio, um homem negro que vivia na década de 1940 em São João do Jaguaribe e sustentava sua grande família vendendo peixes que pescava. Ele vendia principalmente curimatãs e também traíras, piaus, piranhas e carás a preços acessíveis. Seus filhos ajudavam vendendo água e no café da Carminda. João Patrocínio sempre estava feliz e orgulhoso de sua grande família.
JOSÉ MARIA CHAVES - SOBRAMES - CE- ANTOLOGIA - 2012
1. JOSÉ MARIA CHAVES – SOBRAMES CE – ANTOLOGIA 2012 –
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JOÃO PATROCÍNIO
Começo, como começa o Padre Zezinho, em sua Utopia: “Das muitas coisas do
meu tempo de criança, Guardo vivo na lembrança...”.
Pois bem, guardo bem vivo na lembrança, a figura de João Patrocínio. Era o
que se podeia chamar – um homem de cor, mais acizentado do que preto,
baixo e forte, sem se musculoso.
Morava na descida da ladeira, por trás da Igreja de são João Batista, no
caminho do portão do rio. Sim, existia uma cerca, bem feita, de ripas de
aroeira, sustendadas, à espaços intercalados, por morões de pau d’arco,
fincada ao longo da margem do rio Jaguaribe, com um grande portão –
espécie de “Portal de Entrada”- que dava aceso ao pequeno vilarejo de são
João do Juguaribe, dos anos quarenta.
João Patrocínio sustentava sua família, que não era pequena, instalada em
uma casinha de tijolo e telha, próxima a cerca, com venda de seus peixes,
pescados nos poços do Jaguaribe, resultantes das cheias, especialmente no
poço do Tomé, ou, bem mais distante, na lagoa do Umarí .Cordas de
curimatãs, muitas vezes ovadas, era a preferencia dos seus fregueses.
Todavia, a um preço mais baixo, comercializava piaus ou mesmo traíras;
piranhas e carás (acarás) eram vendidos ao preço de “fim de feira”, isto é,
bem acessível ao povo de menor poder aquisitivo. Alguns de seus filhos,
como era o caso do Zé e do Eliseu, ajudavam na obtenção das finanças,
através de outros afazeres, especialmente como botadores de água. Estes se
encarregavam do abastecimento d’água “potável”, às casas da pequena vila,
retirando-a de pequenas cacimbas cavadas nas areias do leito fluvial
jaguaribano. Cada botador tinha sua clientela fiel. Quem se abastecia com o
Zé, não o fazia com outro botador. As filhas, o ajudavam no Café da Carminda,
melhorando a receita dos Patrocínios; e, assim o João conseguia
contrabalançar o binômio receita/despesa na manutenção familiar.
O velho Patrocínio vivia sempre sorridente; estava, continuadamente, de
bem com a vida!
Lembro-me, muito bem, presenciá-lo no açougue, sorriso no rosto, falando
muito alto, acerca da renca de filhos; naquela hora, enfatizava: “Todos os
2. meus filhos têm uma marca, começam pela letra”E”, é o Zé, é o Chico, é a
Leocrice, é a Roseli; só não é com “E” o Aliseu.
Na verdade, este seu último filho referido, se escrevia Eliseu.
Lembranças de um passado, já tão distante, mas que me causou muitas
alegrias!