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Moncorvo Filho não ficou satisfeito em oferecer esses serviços por
meio de uma organização de caridade privada; ele esperava que o
Instituto se tornasse o alicerce de um programa nacional de
assistência à infância. Em março de 1919, idealizou o
Departamento da Criança, um apêndice do Instituto, que deveria
atuar como uma agência de pesquisa e recolhimento de dados.
Todas as informações coletadas seriam disponibilizadas pelo
governo federal. Os estatutos do Departamento estipulavam o
estudo de diversos aspectos da assistência à infância: a manutenção
de registros detalhados das instituições privadas e oficiais dedicadas
à assistência a menores; a coleta de todo tipo de dados estatísticos e
demográficos; a realização de congressos (incluindo o Primeiro
Congresso Brasileiro da Proteção à Infância) e o estabelecimento de
uma Exposição ou Museu da Infância, sobre os quais teremos
oportunidade de discorrer mais adiante. Dos 24 artigos dos
estatutos, oito referiam-se ao fornecimento de informações ou à
cooperação com o governo, num esforço para lembrar aos "poderes
públicos" os aspectos negativos do progresso
A preocupação com a maternidade e a infância no Brasil não é um fenômeno recente.
Desde finais do século XIX, o discurso médico já abordava temas como a alimentação
das crianças e a mortalidade infantil, chegando a discutir os hábitos culturais presentes
na criação e na educação dos filhos, como ocorria, por exemplo, com a chamada
amamentação mercenária, referência à contratação de amas-de-leite, algo extremamente
criticado pelos jovens doutores brasileirosi. Este era apenas um dos muitos erros que os
novos especialistas da infância – os médicos puericultores – acreditavam encontrar nas
famílias brasileiras. Mães ignorantes, descuidadas e até mesmo desinteressadas,
apareciam em seus relatórios como as principais responsáveis pela doença e morte de
seus filhos. Isso, articulado aos anseios nacionalistas e pressupostos cientificistas que
permeavam o saber médico em finais do século XIX e início do século XX, gerou entre
os médicos a crença de que eles deveriam interferir diretamente em questões de
natureza privada – como era o caso da criação dos filhos – o que se justificava em nome
de um bem maior, qual seja, a preservação da saúde e da vida dos futuros cidadãos
brasileiros. Produtores de uma vasta “literatura de aconselhamento” ou da “pedagogia
materna”, os médicos assumiram gradativamente o papel de defensores da saúde
materno-infantil, embora com uma ênfase maior em torno da figura da criança, vista
como o “futuro da nação”. Partindo de uma visão instrumental das mães, os médicos
pretendiam, através da educação e orientação nos preceitos de higiene infantil, minorar
os problemas ligados à saúde de seus filhos, principalmente no que se refere aos altos
índices de mortalidade. Essa preocupação manifestou-se de forma concreta na criação
de instituições de atendimento à criança, como foi o caso do Instituto de Proteção e
Assistência à Infância no Rio de Janeiro, fundado pelo pediatra Dr. Moncorvo Filho no
final do século XIX. O Instituto oferecia atendimento médico e assistencial para as
mulheres grávidas e puéperas e para seus filhos, ao mesmo tempo em que se ocupava da
divulgação dos preceitos de higiene infantil através de palestras e propagandasii.
Devido ao sucesso de sua atuação na proteçãomaterno-infantil, ao longo das décadas
seguintes à de sua criação, o Instituto ganhou filiais em vários estados brasileiros, entre
eles o Paraná, que teve seu Instituto de Proteção e Assistência à
Infância fundado no ano de 1921, pelo médico Dr. Eurípides Garcez do Nascimento.
Anais do VII Seminário Fazendo Gênero
28, 29 e 30 de Agosto de 2006.
Mas não foram os médicos os únicos a se preocuparem com a situação da infância
desamparada. Vários setores da população empenharam-se nessa “verdadeira cruzada
para proteger as crianças pobres de doenças, das precárias condições de sobrevivência e
daquilo que alguns acreditavam ser a ignorância e superstição de suas mães”iii. Embora
alguns passassem a exigir cada
vez mais a intervenção do Estado na resolução dos problemas relacionados à saúde
maternoinfantil, muitos atuaram por sua própria conta, fundando desde as primeiras
décadas do século XX, instituições de caridade dedicadas a amenizar os problemas
ligados ao desenvolvimento da criança brasileira. De acordo com a historiadora Ana
Paula Martins, a fundação de tais organizações demonstra “como o problema da
infância e da maternidade desassistidas começava a mobilizar médicos e cidadãos das
classes mais favorecidas, principalmente as mulheres”iv.
O Estado brasileiro do início do século XX era ainda bastante incipiente e, portanto,
incapaz de engendrar a sistematização de uma política social. Ao longo da Primeira
República, a hegemonia política da oligarquia cafeeira ditou os rumos da economia
nacional, bem como das políticas de Estado, que estiveram por um determinado tempo
voltadas para os interesses de tais setores da elite brasileira, oferecendo vantagens para a
produção e exportação do café, bem como subsídios para a
manutenção do seu preço no mercado internacional. O processo de “modernização
forçada” levado a cabo pelos setores mais influentes do cenário político brasileiro gerou
uma série de novos problemas sociais e agravou outros. A extensão da governabilidade
a espaços antes esquecidos implicava em adentrar um terreno no qual as tensões sociais
se faziam muito presentes, e para as quais o Estado parecia não possuir soluçãov. A
filantropia, especialmente a feminina, foi uma das alternativas encontradas nesse
contexto para suavizar o problema social no Brasil, cabendo às senhoras de caridade
amenizarem a pobreza daqueles indivíduos abandonados pela sorte, dentre os
quais se destacavam as mães pobres e seus filhosvi. Tendo como base a representação
da mulhermãe- dona-de-casa, construiu-se a imagem da “senhora”, esposa dedicada e
mãe abnegada, sempre disposta a levar conforto aos necessitados, estendendo para a
esfera pública suas funções domésticas. No caso brasileiro, tais instituições femininas
tiveram uma atuação importante desde as primeiras décadas do século XX,
principalmente no que se refere à proteção à maternidade e à infância. Segundo Fabiana
Rodrigues, “dada a própria natureza do Estado brasileiro em seus anos de formação, o
papel das instituições filantrópicas femininas foi fundamental na elaboração de
programas pioneiros de assistência materno-infantil”vii. Desta forma, as primeiras
instituições brasileiras de amparo à saúde materno-infantil surgiram em ambiente
privado, e foram organizadas por médicos, religiosos e, principalmente, pelos grupos de
mulheres. Com ascensão de Getúlio Vargas ao poder, em 1930, o Estado passou a
demonstrar uma maior preocupação em relação às questões sociais e, dentre elas,
aquelas concernentes à maternidade e à infância. Segundo a historiadora Ana Paula
Martins, foi durante o governo Vargas
Anais do VII Seminário Fazendo Gênero
28, 29 e 30 de Agosto de 2006.
que, “pela primeira vez no Brasil parecia ocorrer uma coincidência de interesses entre o
governo federal e os médicos, que vinham desde o século XIX defendendo a
intervenção do Estado nos assuntos referentes à saúde de uma forma geral, e à proteção
à criança e a maternidade”viii.
Nesse sentido, quando finalmente tomou as rédeas dessa assistência, o que só veio a
ocorrer de fato no final da década de 1930, o Estado já encontrou pronto, em grande
medida, um modelo de assistência à maternidade e à infância, modelo este que já vinha
sendo utilizado por instituições particulares há pelo menos meio século. E não foi
apenas como “fonte de inspiração” que o Estado recorreu às instituições particulares. O
modelo de assistencialismo do Departamento Nacional da Criança (DNCr), órgão criado
pelo governo Vargas no ano de 1940, e que a partir de então tornouse
o centro de coordenação das políticas públicas nacionais para a maternidade e a
infância, tinha por base a idéia da cooperação entre Estado e sociedade. Ao lado de
equipamentos criados por iniciativa do poder público, como os Postos de Puericultura e
as Casas da Criança, previa-se a atuação de instituições criadas pela iniciativa privada,
como as Associações de Proteção à Maternidade e à Infância (APMI’s), como
importantes centros de difusão das políticas elaboradas pelo governo central. De acordo
com André Pereira, o Departamento preconizava uma espécie de
arranjo corporativoix, no qual Estado e sociedade atuariam de forma conjunta no
combate aos problemas que afligiam mães e filhos. Ao Estado caberia elaborar as
políticas, bem como organizar, orientar e fiscalizar a iniciativa privada, a qual seria a
grande responsável pela aplicação dessas políticas. Nesse sentido, a proposta do DNCr
implicava uma participação ativa da sociedade, ou de certos setores em especial, entre
eles os médicos, as autoridades públicas e os “cidadãosproeminentes” da sociedade
brasileirax. O poder público não se eximia, assim, de seu papel
regulador da sociedade, mas contava com a ajuda das camadas privilegiadas da
população para levar adiante seus projetos.




A partir de 1940 e 1941, os Estados da Federação passaram a criar estruturas
semelhantes, epor vezes vinculadas, ao Departamento Nacional da Criança; os




Departamentos Estaduais da
Criança (DECr), como o que foi criado no Paraná no ano de 1947. Tais órgãos eram os
responsáveis
pela implementação das diretrizes nacionais, elaboradas pelo DNCr, e pelo
estabelecimento de
redes de proteção à maternidade e à infância estaduais. Como no caso do programa
nacional
organizado pelo DNCr, também no plano estadual destacava-se o papel de fundamental
importância
da iniciativa privada, a qual deveria dedicar-se ao atendimento direto da população,
trabalhando em
colaboração com o Estado na proteção às mães e crianças.
No caso paranaense, a criação do Departamento Estadual da Criança (DECr)
representou um
importante momento da sistematização das políticas de proteção à maternidade e à
infância. Embora
algumas diretrizes políticas de saúde materno-infantil já fossem implementadas desde o
governo de
Manoel Ribas (1932-1939), foi ao longo dos governos de Moyses Lupion (1947-1951) e
Bento
Anais do VII Seminário Fazendo Gênero
28, 29 e 30 de Agosto de 2006.
Munhoz da Rocha Netto (1951-1955) que essas políticas lograram um alcance
considerável. O
recém-criado departamento funcionava como um intermediário entre as diretrizes do
DNCr e a sua
aplicação nas municipalidades. A idéia de cooperação entre Estado e sociedade estava
presente no
próprio decreto-lei de criação do Departamento Estadual da Criança paranaense, tendo
em vista que
este enumerava como funções do novo Departamento “estimular e orientar a
organização de
estabelecimentos municipais e particulares, destinados à proteção da maternidade, da
infância e da
adolescência”, bem como “promover a cooperação do Estado com os municípios e
instituições de
caráter privado, mediante a concessão de subvenção ou auxílio estadual destinado à
manutenção e
ao desenvolvimento”xi dos serviços a serem prestados. De acordo com o Decreto de
criação, ficava
ainda sob a responsabilidade do Departamento a realização de inquéritos e estudos
relativos aos
problemas materno-infantis, bem como a promoção de campanhas para a orientação da
opinião
pública e a organização e manutenção de serviços própriosxii.
Dentre os serviços do DECr, destacava-se o “Centro de Puericultura da Capital”, que
prestava assistência obstetrícia domiciliar às gestantes e puérperas, oferecia atendimento
médicosocial
à criança, fornecia alimento aos lactantes necessitados, oferecia serviços ambulatoriais,
internamento e assistência dentária profilática às crianças doentes, além da visitação e
assistência
social dos seus clientes. O DECr mantinha também algumas divisões médicas
especializadas, não
só no Centro de Puericultura, mas também no Hospital das Crianças, através do qual
eram feitos o
estudo e a pesquisa de problemas relativos à biologia, a higiene e a medicina das
crianças e
adolescentes.
A campanha em favor da mãe e do filho levada a cabo no Paraná, principalmente nos
quatro
anos do primeiro governo de Lupion, ganhou visibilidade nacional e o slogan “Um
posto de
puericultura em cada município”, elaborado por este governo, foi muito elogiado em
diversas
jornadas nacionais de puericultura e pediatria. Entre 1947, ano de criação do DECr, e
1960, foram
criadas mais de 167 novas APMI’s, 20 maternidades e 167 Postos de Puericultura,
atendendo a um
número considerável de mães e crianças. Como no caso do programa nacional
organizado pelo
DNCr, também no plano estadual a iniciativa privada teve um papel de fundamental
importância,
dedicando-se ao atendimento direto da população e trabalhando em colaboração com o
Estado na
proteção às mães e crianças. E, como o DECr ainda não possuía verbas suficientes para
o
desenvolvimento pleno do projeto, dependia também financeiramente, em grande
medida, dessa
iniciativa privada. A importância dessa atuação conjunta é constantemente ressaltada,
como se
observa através da afirmação de que “para se obter resultados positivos nesse sentido, é
mister que
existam – profusamente espalhadas por todo o território do Estado – associações
especializadas, de
caráter particular e dirigidas por pessoas que possuam capacidade para bem servir a
coletividade; as
associações, naturalmente, serão organizadas de acordo com moldes oficiais”xiii. Desta
forma é
Anais do VII Seminário Fazendo Gênero
28, 29 e 30 de Agosto de 2006.
possível perceber que as entidades filantrópicas receberam um papel relevante dentro
das novas
políticas de saúde pública, sendo constantemente chamadas a cooperar com o Estado em
sua obra
assistencial.
Podemos perceber, nesse sentido, que governo federal, governo estadual e sociedade
empenharam-se na realização desta que era considerada uma tarefa patriótica, qual seja,
o cuidado
com as mães, principalmente as pobres, e seus filhos. Nesse sentido, as campanhas
empreendias em
prol da infância, fossem elas paranaense, paulista ou brasileira ligavam-se diretamente a
um projeto
político mais amplo, qual seja, o do bom desenvolvimento da população. Tal projeto,
entre outras
coisas, passa pela maternidade e pela infância, mas na verdade tinha como finalidade o
futuro da
nação.

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Moncorvo filho não ficou satisfeito em oferecer esses serviços por meio de uma organização de caridade privada

  • 1. Moncorvo Filho não ficou satisfeito em oferecer esses serviços por meio de uma organização de caridade privada; ele esperava que o Instituto se tornasse o alicerce de um programa nacional de assistência à infância. Em março de 1919, idealizou o Departamento da Criança, um apêndice do Instituto, que deveria atuar como uma agência de pesquisa e recolhimento de dados. Todas as informações coletadas seriam disponibilizadas pelo governo federal. Os estatutos do Departamento estipulavam o estudo de diversos aspectos da assistência à infância: a manutenção de registros detalhados das instituições privadas e oficiais dedicadas à assistência a menores; a coleta de todo tipo de dados estatísticos e demográficos; a realização de congressos (incluindo o Primeiro Congresso Brasileiro da Proteção à Infância) e o estabelecimento de uma Exposição ou Museu da Infância, sobre os quais teremos oportunidade de discorrer mais adiante. Dos 24 artigos dos estatutos, oito referiam-se ao fornecimento de informações ou à cooperação com o governo, num esforço para lembrar aos "poderes públicos" os aspectos negativos do progresso
  • 2. A preocupação com a maternidade e a infância no Brasil não é um fenômeno recente. Desde finais do século XIX, o discurso médico já abordava temas como a alimentação das crianças e a mortalidade infantil, chegando a discutir os hábitos culturais presentes na criação e na educação dos filhos, como ocorria, por exemplo, com a chamada amamentação mercenária, referência à contratação de amas-de-leite, algo extremamente criticado pelos jovens doutores brasileirosi. Este era apenas um dos muitos erros que os novos especialistas da infância – os médicos puericultores – acreditavam encontrar nas famílias brasileiras. Mães ignorantes, descuidadas e até mesmo desinteressadas, apareciam em seus relatórios como as principais responsáveis pela doença e morte de seus filhos. Isso, articulado aos anseios nacionalistas e pressupostos cientificistas que permeavam o saber médico em finais do século XIX e início do século XX, gerou entre os médicos a crença de que eles deveriam interferir diretamente em questões de natureza privada – como era o caso da criação dos filhos – o que se justificava em nome de um bem maior, qual seja, a preservação da saúde e da vida dos futuros cidadãos brasileiros. Produtores de uma vasta “literatura de aconselhamento” ou da “pedagogia materna”, os médicos assumiram gradativamente o papel de defensores da saúde materno-infantil, embora com uma ênfase maior em torno da figura da criança, vista como o “futuro da nação”. Partindo de uma visão instrumental das mães, os médicos pretendiam, através da educação e orientação nos preceitos de higiene infantil, minorar os problemas ligados à saúde de seus filhos, principalmente no que se refere aos altos índices de mortalidade. Essa preocupação manifestou-se de forma concreta na criação de instituições de atendimento à criança, como foi o caso do Instituto de Proteção e Assistência à Infância no Rio de Janeiro, fundado pelo pediatra Dr. Moncorvo Filho no final do século XIX. O Instituto oferecia atendimento médico e assistencial para as mulheres grávidas e puéperas e para seus filhos, ao mesmo tempo em que se ocupava da divulgação dos preceitos de higiene infantil através de palestras e propagandasii. Devido ao sucesso de sua atuação na proteçãomaterno-infantil, ao longo das décadas seguintes à de sua criação, o Instituto ganhou filiais em vários estados brasileiros, entre eles o Paraná, que teve seu Instituto de Proteção e Assistência à Infância fundado no ano de 1921, pelo médico Dr. Eurípides Garcez do Nascimento. Anais do VII Seminário Fazendo Gênero 28, 29 e 30 de Agosto de 2006. Mas não foram os médicos os únicos a se preocuparem com a situação da infância
  • 3. desamparada. Vários setores da população empenharam-se nessa “verdadeira cruzada para proteger as crianças pobres de doenças, das precárias condições de sobrevivência e daquilo que alguns acreditavam ser a ignorância e superstição de suas mães”iii. Embora alguns passassem a exigir cada vez mais a intervenção do Estado na resolução dos problemas relacionados à saúde maternoinfantil, muitos atuaram por sua própria conta, fundando desde as primeiras décadas do século XX, instituições de caridade dedicadas a amenizar os problemas ligados ao desenvolvimento da criança brasileira. De acordo com a historiadora Ana Paula Martins, a fundação de tais organizações demonstra “como o problema da infância e da maternidade desassistidas começava a mobilizar médicos e cidadãos das classes mais favorecidas, principalmente as mulheres”iv. O Estado brasileiro do início do século XX era ainda bastante incipiente e, portanto, incapaz de engendrar a sistematização de uma política social. Ao longo da Primeira República, a hegemonia política da oligarquia cafeeira ditou os rumos da economia nacional, bem como das políticas de Estado, que estiveram por um determinado tempo voltadas para os interesses de tais setores da elite brasileira, oferecendo vantagens para a produção e exportação do café, bem como subsídios para a manutenção do seu preço no mercado internacional. O processo de “modernização forçada” levado a cabo pelos setores mais influentes do cenário político brasileiro gerou uma série de novos problemas sociais e agravou outros. A extensão da governabilidade a espaços antes esquecidos implicava em adentrar um terreno no qual as tensões sociais se faziam muito presentes, e para as quais o Estado parecia não possuir soluçãov. A filantropia, especialmente a feminina, foi uma das alternativas encontradas nesse contexto para suavizar o problema social no Brasil, cabendo às senhoras de caridade amenizarem a pobreza daqueles indivíduos abandonados pela sorte, dentre os quais se destacavam as mães pobres e seus filhosvi. Tendo como base a representação da mulhermãe- dona-de-casa, construiu-se a imagem da “senhora”, esposa dedicada e mãe abnegada, sempre disposta a levar conforto aos necessitados, estendendo para a esfera pública suas funções domésticas. No caso brasileiro, tais instituições femininas tiveram uma atuação importante desde as primeiras décadas do século XX, principalmente no que se refere à proteção à maternidade e à infância. Segundo Fabiana Rodrigues, “dada a própria natureza do Estado brasileiro em seus anos de formação, o papel das instituições filantrópicas femininas foi fundamental na elaboração de
  • 4. programas pioneiros de assistência materno-infantil”vii. Desta forma, as primeiras instituições brasileiras de amparo à saúde materno-infantil surgiram em ambiente privado, e foram organizadas por médicos, religiosos e, principalmente, pelos grupos de mulheres. Com ascensão de Getúlio Vargas ao poder, em 1930, o Estado passou a demonstrar uma maior preocupação em relação às questões sociais e, dentre elas, aquelas concernentes à maternidade e à infância. Segundo a historiadora Ana Paula Martins, foi durante o governo Vargas Anais do VII Seminário Fazendo Gênero 28, 29 e 30 de Agosto de 2006. que, “pela primeira vez no Brasil parecia ocorrer uma coincidência de interesses entre o governo federal e os médicos, que vinham desde o século XIX defendendo a intervenção do Estado nos assuntos referentes à saúde de uma forma geral, e à proteção à criança e a maternidade”viii. Nesse sentido, quando finalmente tomou as rédeas dessa assistência, o que só veio a ocorrer de fato no final da década de 1930, o Estado já encontrou pronto, em grande medida, um modelo de assistência à maternidade e à infância, modelo este que já vinha sendo utilizado por instituições particulares há pelo menos meio século. E não foi apenas como “fonte de inspiração” que o Estado recorreu às instituições particulares. O modelo de assistencialismo do Departamento Nacional da Criança (DNCr), órgão criado pelo governo Vargas no ano de 1940, e que a partir de então tornouse o centro de coordenação das políticas públicas nacionais para a maternidade e a infância, tinha por base a idéia da cooperação entre Estado e sociedade. Ao lado de equipamentos criados por iniciativa do poder público, como os Postos de Puericultura e as Casas da Criança, previa-se a atuação de instituições criadas pela iniciativa privada, como as Associações de Proteção à Maternidade e à Infância (APMI’s), como importantes centros de difusão das políticas elaboradas pelo governo central. De acordo com André Pereira, o Departamento preconizava uma espécie de arranjo corporativoix, no qual Estado e sociedade atuariam de forma conjunta no combate aos problemas que afligiam mães e filhos. Ao Estado caberia elaborar as políticas, bem como organizar, orientar e fiscalizar a iniciativa privada, a qual seria a grande responsável pela aplicação dessas políticas. Nesse sentido, a proposta do DNCr implicava uma participação ativa da sociedade, ou de certos setores em especial, entre eles os médicos, as autoridades públicas e os “cidadãosproeminentes” da sociedade brasileirax. O poder público não se eximia, assim, de seu papel
  • 5. regulador da sociedade, mas contava com a ajuda das camadas privilegiadas da população para levar adiante seus projetos. A partir de 1940 e 1941, os Estados da Federação passaram a criar estruturas semelhantes, epor vezes vinculadas, ao Departamento Nacional da Criança; os Departamentos Estaduais da Criança (DECr), como o que foi criado no Paraná no ano de 1947. Tais órgãos eram os responsáveis pela implementação das diretrizes nacionais, elaboradas pelo DNCr, e pelo estabelecimento de redes de proteção à maternidade e à infância estaduais. Como no caso do programa nacional organizado pelo DNCr, também no plano estadual destacava-se o papel de fundamental importância da iniciativa privada, a qual deveria dedicar-se ao atendimento direto da população, trabalhando em colaboração com o Estado na proteção às mães e crianças. No caso paranaense, a criação do Departamento Estadual da Criança (DECr) representou um importante momento da sistematização das políticas de proteção à maternidade e à infância. Embora
  • 6. algumas diretrizes políticas de saúde materno-infantil já fossem implementadas desde o governo de Manoel Ribas (1932-1939), foi ao longo dos governos de Moyses Lupion (1947-1951) e Bento Anais do VII Seminário Fazendo Gênero 28, 29 e 30 de Agosto de 2006. Munhoz da Rocha Netto (1951-1955) que essas políticas lograram um alcance considerável. O recém-criado departamento funcionava como um intermediário entre as diretrizes do DNCr e a sua aplicação nas municipalidades. A idéia de cooperação entre Estado e sociedade estava presente no próprio decreto-lei de criação do Departamento Estadual da Criança paranaense, tendo em vista que este enumerava como funções do novo Departamento “estimular e orientar a organização de estabelecimentos municipais e particulares, destinados à proteção da maternidade, da infância e da adolescência”, bem como “promover a cooperação do Estado com os municípios e instituições de caráter privado, mediante a concessão de subvenção ou auxílio estadual destinado à manutenção e ao desenvolvimento”xi dos serviços a serem prestados. De acordo com o Decreto de criação, ficava ainda sob a responsabilidade do Departamento a realização de inquéritos e estudos relativos aos problemas materno-infantis, bem como a promoção de campanhas para a orientação da opinião pública e a organização e manutenção de serviços própriosxii. Dentre os serviços do DECr, destacava-se o “Centro de Puericultura da Capital”, que prestava assistência obstetrícia domiciliar às gestantes e puérperas, oferecia atendimento médicosocial à criança, fornecia alimento aos lactantes necessitados, oferecia serviços ambulatoriais, internamento e assistência dentária profilática às crianças doentes, além da visitação e assistência social dos seus clientes. O DECr mantinha também algumas divisões médicas especializadas, não só no Centro de Puericultura, mas também no Hospital das Crianças, através do qual eram feitos o estudo e a pesquisa de problemas relativos à biologia, a higiene e a medicina das crianças e adolescentes. A campanha em favor da mãe e do filho levada a cabo no Paraná, principalmente nos quatro anos do primeiro governo de Lupion, ganhou visibilidade nacional e o slogan “Um posto de puericultura em cada município”, elaborado por este governo, foi muito elogiado em diversas jornadas nacionais de puericultura e pediatria. Entre 1947, ano de criação do DECr, e 1960, foram
  • 7. criadas mais de 167 novas APMI’s, 20 maternidades e 167 Postos de Puericultura, atendendo a um número considerável de mães e crianças. Como no caso do programa nacional organizado pelo DNCr, também no plano estadual a iniciativa privada teve um papel de fundamental importância, dedicando-se ao atendimento direto da população e trabalhando em colaboração com o Estado na proteção às mães e crianças. E, como o DECr ainda não possuía verbas suficientes para o desenvolvimento pleno do projeto, dependia também financeiramente, em grande medida, dessa iniciativa privada. A importância dessa atuação conjunta é constantemente ressaltada, como se observa através da afirmação de que “para se obter resultados positivos nesse sentido, é mister que existam – profusamente espalhadas por todo o território do Estado – associações especializadas, de caráter particular e dirigidas por pessoas que possuam capacidade para bem servir a coletividade; as associações, naturalmente, serão organizadas de acordo com moldes oficiais”xiii. Desta forma é Anais do VII Seminário Fazendo Gênero 28, 29 e 30 de Agosto de 2006. possível perceber que as entidades filantrópicas receberam um papel relevante dentro das novas políticas de saúde pública, sendo constantemente chamadas a cooperar com o Estado em sua obra assistencial. Podemos perceber, nesse sentido, que governo federal, governo estadual e sociedade empenharam-se na realização desta que era considerada uma tarefa patriótica, qual seja, o cuidado com as mães, principalmente as pobres, e seus filhos. Nesse sentido, as campanhas empreendias em prol da infância, fossem elas paranaense, paulista ou brasileira ligavam-se diretamente a um projeto político mais amplo, qual seja, o do bom desenvolvimento da população. Tal projeto, entre outras coisas, passa pela maternidade e pela infância, mas na verdade tinha como finalidade o futuro da nação.