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PAULO DE CAMARGO
free-lance para a Folha de S.Paulo
Após 11 anos de educação básica, quatro ou cinco de graduação e pelo menos dois de mestrado
e três de doutorado, o pesquisador consegue o almejado título de doutor, o que o torna apto a
iniciar sua carreira. Mal sabe ele, no entanto, que, ao receber o diploma, em média aos 35 anos,
esse "recém-nascido" pesquisador estará apenas no início da tarefa mais difícil: encontrar um
lugar ao sol.
No Brasil, os mais de 20 anos de estudo não são
suficientes nem para a obtenção de uma bolsa, já que o
funil é muito estreito. As principais agências de
financiamento de pesquisas no país não atendem nem
a 10% da demanda por bolsas. Para ter uma idéia,
somente o CNPq (Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico) tem cerca de
16 mil pedidos de bolsa para 2004, dos quais espera
atender a apenas mil.
Além de trabalhar nas instituições públicas —onde a
concorrência acirrada é combinada com uma
remuneração que deixa a desejar—, o pesquisador
pode tentar ir para as faculdades privadas (e se dedicar
quase integralmente a dar aulas para aumentar seu
salário), ser contratado pelo departamento de pesquisa
de uma empresa (e perder em autonomia no
direcionamento de seu trabalho) ou ser adotado por um
centro do exterior (e deixar o país). Escolhas nada
fáceis para quem sonhou por anos seguir a carreira de
cientista no país onde nasceu.
As dificuldades começam nas universidades públicas, onde os concursos para ocupar uma
cadeira de docente estão cada vez mais raros. Nas universidades federais, segundo a Andes
(Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior), não há abertura
significativa de vagas desde o governo de Fernando Collor (1990-1992).
Caso supere esse obstáculo, o profissional contará com estabilidade, mas terá também de lidar
com baixos salários —no topo da carreira, um professor de universidade federal pode chegar a
receber um salário de, no máximo, R$ 4.900, segundo a Andes.
Quem se depara com essa situação não imagina que a
pós-graduação sempre foi a menina-dos-olhos do
sistema educacional brasileiro. Estruturada a partir da
década de 50, levou o país à liderança da produção
científica na América Latina. Hoje, o sistema titula
quase 7.000 doutores por ano —e tem a meta,
estipulada pelo governo Lula, de chegar a 10 mil
anualmente.
A superprodução de cérebros, no entanto, precisa vir
acompanhada de uma política mais abrangente para a
Fotos Cris Bierrenbach/Folha Imagem
José Artur Fernandes: "O valor da bolsa acaba
forçando as pessoas a procurar subempregos"
Página 1 de 6Folha Online - Sinapse - Projetos suspensos - 30/03/2004
30/3/2004http://tools.folha.com.br/print.html?skin=emcimadahora&url=http%3A//www1.folha.u...
área, segundo Elizabeth Balbachevsky, 47,
pesquisadora do Nupes (Núcleo de Pesquisas sobre
Ensino Superior), da Universidade de São Paulo.
"Quando resolvi ser pesquisadora, achei que bastava
me doutorar, mas encontrei um cenário de muita
competição", conta a bióloga Patrícia Narvaes, 34, que
recebeu o título em setembro passado e, até agora,
pôde participar de apenas um concurso, no Instituto
Butantan, em São Paulo.
Enquanto se prepara para outro, fora de sua área de
atuação, Patrícia estuda alternativas, como procurar
uma vaga de professora em faculdade particular ou
prestar concursos em outros Estados. "Se não
conseguir, penso até em mudar de área", afirma.
O biólogo José Artur Barroso Fernandes, 37, vive um
dilema parecido. Fernandes está no segundo ano do
doutorado na Faculdade de Educação da USP e
concorre pela terceira vez a uma bolsa. Se não tiver sucesso, terá de recorrer, como fez no
mestrado, a empréstimos e a trabalhos temporários para conseguir continuar sua pesquisa em
educação ambiental.
Mesmo se conseguir a bolsa, Fernandes sabe que não será fácil sobreviver. O CNPq paga R$
1.267 por mês ao doutorando, e as agências de financiamento de pesquisa proíbem o vínculo
empregatício a seus bolsistas. "Esses valores acabam forçando as pessoas a procurar
subempregos", diz.
A situação é tão conhecida que, em meados deste mês, em uma decisão inédita, o CNPq e a
Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) decidiram permitir a
mestrandos e a doutorandos bolsistas que também se dediquem à docência, como professores
substitutos em instituições públicas, para melhorar seus rendimentos.
Ainda assim, segundo o professor Manoel Barral-Netto, do CNPq, muitos desses profissionais
altamente qualificados vão ser obrigados a mudar de rota. "O mercado acadêmico não pode ser
mais a única meta dos doutores recém-formados. Atingiu-se um ponto de saturação", diz.
Depois das instituições públicas, a opção mais imediata
dos doutores é, em geral, procurar uma vaga em
universidades particulares. Estas, para atender a
exigências da Lei de Diretrizes e Bases (1996), são
obrigadas a contratar uma cota mínima de mestres e
doutores —33% de seu quadro total de professores.
O vento contrário, nesse caso, é a falta de tempo:
contratados na maioria das vezes como horistas, ou
seja, remunerados por hora de aula (entre R$ 20 e R$
40, em média), esses potenciais pesquisadores acabam
optando por aumentar essa carga ao máximo e deixam
de lado a pesquisa.
Airton Carlos Almeida Borges, 50, fez essa escolha há
11 anos. Pós-doutor pela USP em astrofísica
extragaláctica —área que estuda galáxias além da Via
Láctea—, ele chegou a um ponto da carreira no qual
teria de deixar o país se quisesse continuar a pesquisa.
Mas temia que, ao voltar, não encontrasse perspectiva
de conseguir um trabalho. "Via a situação de colegas que, ao voltarem, com família e filhos, não
encontravam emprego", diz.
Borges acabou radicalizando e passou a dar aulas no Colégio Bandeirantes, uma escola de
classe média alta na zona sul de São Paulo, onde ficou dez anos. Desde o ano passado, é
Patricia Narvaes: "Achei que bastava me doutorar,
mas encontrei muita competição"
Jéferson Ortiz: "Seria injusto se eu me radicasse no
exterior"
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professor de matemática aplicada no IBTA (Instituto Brasileiro de Tecnologia Avançada). "Aquilo
de que abri mão na carreira ganhei na vida social e familiar", justifica.
Casado e pai de um filho, Borges afirma que não se sente frustrado por ter deixado a carreira na
universidade pública e a pesquisa. "Continuo estudando para me manter atualizado, mas não
quero mais ser pesquisador", diz. Sabe que ganha melhor do que se tivesse continuado na rota
original, mas o preço pago foi ter deixado para trás mais de uma década de pesquisas científicas.
Para Elizabeth Balbachevsky, do Nupes-USP, os benefícios da entrada dos doutores nas
instituições privadas não devem ser desprezados. "Isso foi bom para o país, pois colaborou para
melhorar a qualidade do corpo docente", diz.
No entanto, mesmo esse mercado tende a se extinguir, com a progressiva titulação dos
professores das próprias faculdades privadas. Para Carlos Benedito Martins, diretor do Núcleo de
Estudos sobre Ensino Superior da UnB (Universidade de Brasília), a situação estará estagnada
em breve. "Nem as universidades públicas nem as privadas poderão garantir a absorção dos
doutores", alerta.
Um outro caminho leva doutores e pós-doutores em direção a empresas privadas.
O físico Marcelo Bueno, 35, é um dos que seguiram nesse caminho. Bueno concluiu doutorado e
pós-doutorado na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) com o sonho de se tornar um
pesquisador em sua área, a eletrodinâmica.
Hoje, é gerente comercial do Genius, um instituto de desenvolvimento de tecnologia criado pela
Gradiente, que faz a ponte entre universidades e empresas. "Vivi um drama existencial quando
resolvi deixar tudo em razão da falta de perspectiva financeira", lembra. "Mas agora me sinto
plenamente realizado", diz.
Nem todos têm, como Bueno, a chance de descobrir um campo de atuação novo e permanecer
no país. Sem perspectiva por aqui, alguns acabam aceitando o convite de instituições
estrangeiras e partem. Os argumentos contrários —além dos óbvios, que se referem à distância
da família, dos amigos e da cultura— incluem o peso de não poder devolver o que o país
possibilitou ao profissional em anos de estudo.
É o caso do físico Jéferson Altenhofen Ortiz, 33, cientista formado pela Unicamp que desenvolve
pesquisas sobre raios cósmicos de alta energia. Em seu doutorado, Ortiz permaneceu 15 meses
nos Estados Unidos, no Bartol Research Institute, da Universidade de Delaware, com bolsa da
Capes e estudando sob orientação de físicos renomados. No final do estágio, recebeu uma oferta
para ficar por lá e fazer seu pós-doutorado.
Sem querer passar mais tempo longe da família, Ortiz recusou a oferta e voltou ao Brasil,
acreditando que encontraria condições para seguir seu trabalho por aqui. "Acho que seria injusto
se, depois de estudar com recursos do governo brasileiro, eu me radicasse no exterior", diz. Ao
chegar, passou um ano tentando obter uma bolsa. "Na Fapesp [Fundação de Amparo à Pesquisa
do Estado de São Paulo], disseram que meu projeto não era prioritário."
O cientista pesquisou por conta própria durante um ano e resolveu voltar para os EUA. Quando
preparava as malas, obteve uma resposta positiva do CNPq, que lhe concedeu uma bolsa.
"Acabei ficando, mas, se voltar a ter problemas desse tipo, terei de rever a decisão", afirma o
cientista.
Com saudade, mas sem remorsos, a goiana Sandra Castro, 36, preferiu não arriscar e se fixou na
Alemanha, depois de passar pelos EUA. Ela trabalha no ESO (European Southern Observatory),
em Munique, desenvolvendo softwares para a análise dos dados obtidos pelos telescópios do
projeto VLT (Very Large Telescope).
"Fazer pesquisa no Brasil é sempre um pouco frustrante, já que, volta e meia, há ameaças de
falta de recursos", diz a pesquisadora, pós-graduada em astrofísica pela Unicamp. "O melhor
lugar para um pesquisador é aquele onde encontra condições de trabalho", defende.
O "êxodo" de cientistas brasileiros preocupa os órgãos financiadores. O CNPq, desde 1997, faz
auditoria nas bolsas concedidas para pesquisadores que estudam fora.
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30/3/2004http://tools.folha.com.br/print.html?skin=emcimadahora&url=http%3A//www1.folha.u...
O órgão estima que 2,5% dos bolsistas acabem ficando nos institutos estrangeiros. Nesses
casos, o Tribunal de Contas da União pede ressarcimento do valor investido. Hoje, há 783
processos em curso, envolvendo cerca de R$ 265 milhões.
Para enfrentar esse cenário, o CNPq, em vez de pedir a devolução do dinheiro, vem negociando
apoio à pesquisa como moeda de troca. De acordo com Erney Plessmann Jr., presidente do
órgão, o instituto negociou com a Microsoft, no final de 2003, duas bolsas nos Estados Unidos.
Em troca, autorizou que um cientista brasileiro (ex-bolsista) fosse contratado pela companhia sem
o processo de ressarcimento.
De modo geral, quase todos os órgãos financiadores regionais reduziram o número de bolsas
para o exterior por considerarem que o sistema do país é capaz de oferecer oportunidades
similares. A Fapesp, por exemplo, não concedeu nenhuma bolsa de doutorado desse tipo em
2003.
O pesquisador Elisio Contini, que trabalha no projeto Labex-França (um "laboratório virtual" de
ciências agrárias), da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), é favorável à
internacionalização dos pesquisadores e afirma que há uma falsa polêmica quando se fala em
evasão de cérebros. "Precisamos de mais cientistas brasileiros estudando nos grandes centros
de produção do conhecimento, ainda que temporariamente. Muitos desses profissionais acabam
voltando com uma bagagem enorme, que deve ser aproveitada."
O outro lado da moeda é que, enquanto alguns pesquisadores buscam oportunidades de trabalho
em faculdades privadas, em empresas ou no exterior, as universidades públicas sofrem com a
falta de professores qualificados. Nas instituições federais, esse déficit já chega a cerca de 8.000
docentes, segundo dados de 2002 reunidos pela Andes.
Na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), a aposentadoria iminente de quatro
pesquisadores colocou em risco a qualidade do único curso de pós-graduação em biomedicina do
país avaliado com a nota 6, a maior dada pela Capes.
"Certamente, não vamos deixar o curso fechar, mas não há como substituir um professor com 30
anos de pesquisa por outro iniciante sem perda de qualidade", afirma o coordenador do
programa, Márcio Nogueira de Souza. "Talvez percamos a nota 6", diz. Nos últimos dez anos, só
houve um concurso para seu departamento.
Para a professora Elizabeth Balbachevsky, do Nupes-USP, o desafio agora não se resume a abrir
vagas no sistema público, mas é mudar características históricas da pós-graduação, que, desde o
início, se voltou quase exclusivamente para a pesquisa. "Qual é a vantagem de ter uma pós tão
grande se ela só reproduz a torre de marfim universitária e não gera inovação tecnológica?",
questiona.
O debate sobre a vinculação entre inovação tecnológica e pesquisa vem ganhando fôlego e lugar
de destaque nas discussões sobre o rumo a ser dado à política da área no país.
Quem defende a inovação se espelha no que vem ocorrendo no restante do mundo desenvolvido,
onde há uma acirrada disputa pela propriedade da ciência e da tecnologia, pela corrida por novas
patentes e pelos lucros advindos dos direitos de propriedade. Trata-se de encontrar mecanismos
para transformar a pesquisa em inovações tecnológicas —que poderão levar o país, segundo
seus defensores, ao desenvolvimento econômico e à geração de empregos.
"Temos falado tanto em exclusão social, mas hoje vivemos outra, igualmente perigosa: a
tecnológica", afirma o empresário Américo Martins Craveiro, 46, presidente da Anpei (Associação
Nacional de Pesquisa, Desenvolvimento e Engenharia das Empresas Inovadoras). Para Craveiro,
a lentidão do crescimento dos processos de inovação é assustadora. "Corremos o risco de perder
cada vez mais competitividade", alerta.
Há, porém, quem veja outros perigos. "A universidade só tem a obrigação de fazer pesquisa de
boa qualidade, não necessariamente de caráter comercial", defende Abílio Baeta Neves, ex-
presidente da Capes.
O cientista Elisio Contini publicou um estudo que mostra que a corrida internacional pelo
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Endereço da página:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u787.shtml
Links no texto:
Comunidade Européia reage contra fuga de cérebros
http://www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u786.shtml
A meca da pesquisa
http://www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u785.shtml
conhecimento está quase toda concentrada em três grandes blocos: América do Norte; Japão e
países do Leste Asiático; e Europa. Eles respondem por 85% dos gastos mundiais com pesquisa
e desenvolvimento, investindo US$ 732 bilhões na área (leia textos às págs. 10 e 12).
No Brasil, nem sequer há consenso sobre quanto é investido em pesquisa. O Ministério da
Ciência e Tecnologia trabalha com o dado de 1% do PIB (equivalente a cerca de R$ 1,3 bilhão),
mas pretende redefinir a metodologia do cálculo por acreditar que o dado está superestimado. Há
quem fale em 0,3% (R$ 390 milhões).
Mas, se a meta é chegar a 2%, como prega o governo federal, o país não poderá abrir mão de
investimentos privados. "Há uma carência enorme de empresas que realizem pesquisas no Brasil.
Se criarmos condições para que essas empresas se constituam ou para que multinacionais
instalem seus centros de pesquisa aqui, criaremos mercado para os novos doutores", acredita
Contini.
No meio dessa crise está a discussão sobre a Lei de Inovação, um conjunto de medidas que deve
ser votado ainda neste ano pelo Congresso.
Quando entrar em vigor, a nova legislação poderá permitir, por exemplo, que o governo libere
linhas de financiamento para empresas que realizem pesquisas de interesse da indústria. O
governo planeja também a criação de uma agência que tenha como missão exclusiva estimular a
pesquisa conjunta de empresas e centros de pesquisa em setores estratégicos.
Também neste ano deverá ser apresentado à comunidade acadêmica o novo Plano Nacional de
Pós-Graduação, que estabelece as linhas prioritárias de estímulo à pesquisa para os próximos
seis anos. Uma das principais novidades do programa é a intersecção da política de pesquisa
com a política industrial do governo, justamente com o objetivo de estimular o investimento
privado. "Temos recebido sinais importantes de que a indústria está disposta a cooperar", diz o
ministro da Ciência e Tecnologia, Eduardo Campos.
"A exclusiva orientação acadêmica da pesquisa universitária é um anacronismo. A função da pós-
graduação é formar o profissional da pesquisa necessária para o país em todas as áreas, mas, no
mundo globalizado, essa função não pode ser aproveitada apenas no contexto acadêmico", diz a
pesquisadora Elizabeth.
"Falar de inovação não quer dizer que se vá tirar recursos de áreas que não tenham aplicações
industriais. São questões complementares. A pesquisa universitária tem uma lógica e uma ética
que não podem ser confundidas com a lógica e a ética da empresa. A primeira visa ao
conhecimento, e a segunda, ao lucro. A questão urgente é saber compatibilizar essas lógicas e
essas éticas —esse é o desafio do qual não podemos fugir", acredita Carlos Vogt, presidente da
Fapesp.
Esse equilíbrio entre interesses e investimentos públicos e privados ainda está muito longe de ser
alcançado, mas parece ser um dos caminhos a serem percorridos.
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  • 1. PAULO DE CAMARGO free-lance para a Folha de S.Paulo Após 11 anos de educação básica, quatro ou cinco de graduação e pelo menos dois de mestrado e três de doutorado, o pesquisador consegue o almejado título de doutor, o que o torna apto a iniciar sua carreira. Mal sabe ele, no entanto, que, ao receber o diploma, em média aos 35 anos, esse "recém-nascido" pesquisador estará apenas no início da tarefa mais difícil: encontrar um lugar ao sol. No Brasil, os mais de 20 anos de estudo não são suficientes nem para a obtenção de uma bolsa, já que o funil é muito estreito. As principais agências de financiamento de pesquisas no país não atendem nem a 10% da demanda por bolsas. Para ter uma idéia, somente o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) tem cerca de 16 mil pedidos de bolsa para 2004, dos quais espera atender a apenas mil. Além de trabalhar nas instituições públicas —onde a concorrência acirrada é combinada com uma remuneração que deixa a desejar—, o pesquisador pode tentar ir para as faculdades privadas (e se dedicar quase integralmente a dar aulas para aumentar seu salário), ser contratado pelo departamento de pesquisa de uma empresa (e perder em autonomia no direcionamento de seu trabalho) ou ser adotado por um centro do exterior (e deixar o país). Escolhas nada fáceis para quem sonhou por anos seguir a carreira de cientista no país onde nasceu. As dificuldades começam nas universidades públicas, onde os concursos para ocupar uma cadeira de docente estão cada vez mais raros. Nas universidades federais, segundo a Andes (Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior), não há abertura significativa de vagas desde o governo de Fernando Collor (1990-1992). Caso supere esse obstáculo, o profissional contará com estabilidade, mas terá também de lidar com baixos salários —no topo da carreira, um professor de universidade federal pode chegar a receber um salário de, no máximo, R$ 4.900, segundo a Andes. Quem se depara com essa situação não imagina que a pós-graduação sempre foi a menina-dos-olhos do sistema educacional brasileiro. Estruturada a partir da década de 50, levou o país à liderança da produção científica na América Latina. Hoje, o sistema titula quase 7.000 doutores por ano —e tem a meta, estipulada pelo governo Lula, de chegar a 10 mil anualmente. A superprodução de cérebros, no entanto, precisa vir acompanhada de uma política mais abrangente para a Fotos Cris Bierrenbach/Folha Imagem José Artur Fernandes: "O valor da bolsa acaba forçando as pessoas a procurar subempregos" Página 1 de 6Folha Online - Sinapse - Projetos suspensos - 30/03/2004 30/3/2004http://tools.folha.com.br/print.html?skin=emcimadahora&url=http%3A//www1.folha.u...
  • 2. área, segundo Elizabeth Balbachevsky, 47, pesquisadora do Nupes (Núcleo de Pesquisas sobre Ensino Superior), da Universidade de São Paulo. "Quando resolvi ser pesquisadora, achei que bastava me doutorar, mas encontrei um cenário de muita competição", conta a bióloga Patrícia Narvaes, 34, que recebeu o título em setembro passado e, até agora, pôde participar de apenas um concurso, no Instituto Butantan, em São Paulo. Enquanto se prepara para outro, fora de sua área de atuação, Patrícia estuda alternativas, como procurar uma vaga de professora em faculdade particular ou prestar concursos em outros Estados. "Se não conseguir, penso até em mudar de área", afirma. O biólogo José Artur Barroso Fernandes, 37, vive um dilema parecido. Fernandes está no segundo ano do doutorado na Faculdade de Educação da USP e concorre pela terceira vez a uma bolsa. Se não tiver sucesso, terá de recorrer, como fez no mestrado, a empréstimos e a trabalhos temporários para conseguir continuar sua pesquisa em educação ambiental. Mesmo se conseguir a bolsa, Fernandes sabe que não será fácil sobreviver. O CNPq paga R$ 1.267 por mês ao doutorando, e as agências de financiamento de pesquisa proíbem o vínculo empregatício a seus bolsistas. "Esses valores acabam forçando as pessoas a procurar subempregos", diz. A situação é tão conhecida que, em meados deste mês, em uma decisão inédita, o CNPq e a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) decidiram permitir a mestrandos e a doutorandos bolsistas que também se dediquem à docência, como professores substitutos em instituições públicas, para melhorar seus rendimentos. Ainda assim, segundo o professor Manoel Barral-Netto, do CNPq, muitos desses profissionais altamente qualificados vão ser obrigados a mudar de rota. "O mercado acadêmico não pode ser mais a única meta dos doutores recém-formados. Atingiu-se um ponto de saturação", diz. Depois das instituições públicas, a opção mais imediata dos doutores é, em geral, procurar uma vaga em universidades particulares. Estas, para atender a exigências da Lei de Diretrizes e Bases (1996), são obrigadas a contratar uma cota mínima de mestres e doutores —33% de seu quadro total de professores. O vento contrário, nesse caso, é a falta de tempo: contratados na maioria das vezes como horistas, ou seja, remunerados por hora de aula (entre R$ 20 e R$ 40, em média), esses potenciais pesquisadores acabam optando por aumentar essa carga ao máximo e deixam de lado a pesquisa. Airton Carlos Almeida Borges, 50, fez essa escolha há 11 anos. Pós-doutor pela USP em astrofísica extragaláctica —área que estuda galáxias além da Via Láctea—, ele chegou a um ponto da carreira no qual teria de deixar o país se quisesse continuar a pesquisa. Mas temia que, ao voltar, não encontrasse perspectiva de conseguir um trabalho. "Via a situação de colegas que, ao voltarem, com família e filhos, não encontravam emprego", diz. Borges acabou radicalizando e passou a dar aulas no Colégio Bandeirantes, uma escola de classe média alta na zona sul de São Paulo, onde ficou dez anos. Desde o ano passado, é Patricia Narvaes: "Achei que bastava me doutorar, mas encontrei muita competição" Jéferson Ortiz: "Seria injusto se eu me radicasse no exterior" Página 2 de 6Folha Online - Sinapse - Projetos suspensos - 30/03/2004 30/3/2004http://tools.folha.com.br/print.html?skin=emcimadahora&url=http%3A//www1.folha.u...
  • 3. professor de matemática aplicada no IBTA (Instituto Brasileiro de Tecnologia Avançada). "Aquilo de que abri mão na carreira ganhei na vida social e familiar", justifica. Casado e pai de um filho, Borges afirma que não se sente frustrado por ter deixado a carreira na universidade pública e a pesquisa. "Continuo estudando para me manter atualizado, mas não quero mais ser pesquisador", diz. Sabe que ganha melhor do que se tivesse continuado na rota original, mas o preço pago foi ter deixado para trás mais de uma década de pesquisas científicas. Para Elizabeth Balbachevsky, do Nupes-USP, os benefícios da entrada dos doutores nas instituições privadas não devem ser desprezados. "Isso foi bom para o país, pois colaborou para melhorar a qualidade do corpo docente", diz. No entanto, mesmo esse mercado tende a se extinguir, com a progressiva titulação dos professores das próprias faculdades privadas. Para Carlos Benedito Martins, diretor do Núcleo de Estudos sobre Ensino Superior da UnB (Universidade de Brasília), a situação estará estagnada em breve. "Nem as universidades públicas nem as privadas poderão garantir a absorção dos doutores", alerta. Um outro caminho leva doutores e pós-doutores em direção a empresas privadas. O físico Marcelo Bueno, 35, é um dos que seguiram nesse caminho. Bueno concluiu doutorado e pós-doutorado na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) com o sonho de se tornar um pesquisador em sua área, a eletrodinâmica. Hoje, é gerente comercial do Genius, um instituto de desenvolvimento de tecnologia criado pela Gradiente, que faz a ponte entre universidades e empresas. "Vivi um drama existencial quando resolvi deixar tudo em razão da falta de perspectiva financeira", lembra. "Mas agora me sinto plenamente realizado", diz. Nem todos têm, como Bueno, a chance de descobrir um campo de atuação novo e permanecer no país. Sem perspectiva por aqui, alguns acabam aceitando o convite de instituições estrangeiras e partem. Os argumentos contrários —além dos óbvios, que se referem à distância da família, dos amigos e da cultura— incluem o peso de não poder devolver o que o país possibilitou ao profissional em anos de estudo. É o caso do físico Jéferson Altenhofen Ortiz, 33, cientista formado pela Unicamp que desenvolve pesquisas sobre raios cósmicos de alta energia. Em seu doutorado, Ortiz permaneceu 15 meses nos Estados Unidos, no Bartol Research Institute, da Universidade de Delaware, com bolsa da Capes e estudando sob orientação de físicos renomados. No final do estágio, recebeu uma oferta para ficar por lá e fazer seu pós-doutorado. Sem querer passar mais tempo longe da família, Ortiz recusou a oferta e voltou ao Brasil, acreditando que encontraria condições para seguir seu trabalho por aqui. "Acho que seria injusto se, depois de estudar com recursos do governo brasileiro, eu me radicasse no exterior", diz. Ao chegar, passou um ano tentando obter uma bolsa. "Na Fapesp [Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo], disseram que meu projeto não era prioritário." O cientista pesquisou por conta própria durante um ano e resolveu voltar para os EUA. Quando preparava as malas, obteve uma resposta positiva do CNPq, que lhe concedeu uma bolsa. "Acabei ficando, mas, se voltar a ter problemas desse tipo, terei de rever a decisão", afirma o cientista. Com saudade, mas sem remorsos, a goiana Sandra Castro, 36, preferiu não arriscar e se fixou na Alemanha, depois de passar pelos EUA. Ela trabalha no ESO (European Southern Observatory), em Munique, desenvolvendo softwares para a análise dos dados obtidos pelos telescópios do projeto VLT (Very Large Telescope). "Fazer pesquisa no Brasil é sempre um pouco frustrante, já que, volta e meia, há ameaças de falta de recursos", diz a pesquisadora, pós-graduada em astrofísica pela Unicamp. "O melhor lugar para um pesquisador é aquele onde encontra condições de trabalho", defende. O "êxodo" de cientistas brasileiros preocupa os órgãos financiadores. O CNPq, desde 1997, faz auditoria nas bolsas concedidas para pesquisadores que estudam fora. Página 3 de 6Folha Online - Sinapse - Projetos suspensos - 30/03/2004 30/3/2004http://tools.folha.com.br/print.html?skin=emcimadahora&url=http%3A//www1.folha.u...
  • 4. O órgão estima que 2,5% dos bolsistas acabem ficando nos institutos estrangeiros. Nesses casos, o Tribunal de Contas da União pede ressarcimento do valor investido. Hoje, há 783 processos em curso, envolvendo cerca de R$ 265 milhões. Para enfrentar esse cenário, o CNPq, em vez de pedir a devolução do dinheiro, vem negociando apoio à pesquisa como moeda de troca. De acordo com Erney Plessmann Jr., presidente do órgão, o instituto negociou com a Microsoft, no final de 2003, duas bolsas nos Estados Unidos. Em troca, autorizou que um cientista brasileiro (ex-bolsista) fosse contratado pela companhia sem o processo de ressarcimento. De modo geral, quase todos os órgãos financiadores regionais reduziram o número de bolsas para o exterior por considerarem que o sistema do país é capaz de oferecer oportunidades similares. A Fapesp, por exemplo, não concedeu nenhuma bolsa de doutorado desse tipo em 2003. O pesquisador Elisio Contini, que trabalha no projeto Labex-França (um "laboratório virtual" de ciências agrárias), da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), é favorável à internacionalização dos pesquisadores e afirma que há uma falsa polêmica quando se fala em evasão de cérebros. "Precisamos de mais cientistas brasileiros estudando nos grandes centros de produção do conhecimento, ainda que temporariamente. Muitos desses profissionais acabam voltando com uma bagagem enorme, que deve ser aproveitada." O outro lado da moeda é que, enquanto alguns pesquisadores buscam oportunidades de trabalho em faculdades privadas, em empresas ou no exterior, as universidades públicas sofrem com a falta de professores qualificados. Nas instituições federais, esse déficit já chega a cerca de 8.000 docentes, segundo dados de 2002 reunidos pela Andes. Na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), a aposentadoria iminente de quatro pesquisadores colocou em risco a qualidade do único curso de pós-graduação em biomedicina do país avaliado com a nota 6, a maior dada pela Capes. "Certamente, não vamos deixar o curso fechar, mas não há como substituir um professor com 30 anos de pesquisa por outro iniciante sem perda de qualidade", afirma o coordenador do programa, Márcio Nogueira de Souza. "Talvez percamos a nota 6", diz. Nos últimos dez anos, só houve um concurso para seu departamento. Para a professora Elizabeth Balbachevsky, do Nupes-USP, o desafio agora não se resume a abrir vagas no sistema público, mas é mudar características históricas da pós-graduação, que, desde o início, se voltou quase exclusivamente para a pesquisa. "Qual é a vantagem de ter uma pós tão grande se ela só reproduz a torre de marfim universitária e não gera inovação tecnológica?", questiona. O debate sobre a vinculação entre inovação tecnológica e pesquisa vem ganhando fôlego e lugar de destaque nas discussões sobre o rumo a ser dado à política da área no país. Quem defende a inovação se espelha no que vem ocorrendo no restante do mundo desenvolvido, onde há uma acirrada disputa pela propriedade da ciência e da tecnologia, pela corrida por novas patentes e pelos lucros advindos dos direitos de propriedade. Trata-se de encontrar mecanismos para transformar a pesquisa em inovações tecnológicas —que poderão levar o país, segundo seus defensores, ao desenvolvimento econômico e à geração de empregos. "Temos falado tanto em exclusão social, mas hoje vivemos outra, igualmente perigosa: a tecnológica", afirma o empresário Américo Martins Craveiro, 46, presidente da Anpei (Associação Nacional de Pesquisa, Desenvolvimento e Engenharia das Empresas Inovadoras). Para Craveiro, a lentidão do crescimento dos processos de inovação é assustadora. "Corremos o risco de perder cada vez mais competitividade", alerta. Há, porém, quem veja outros perigos. "A universidade só tem a obrigação de fazer pesquisa de boa qualidade, não necessariamente de caráter comercial", defende Abílio Baeta Neves, ex- presidente da Capes. O cientista Elisio Contini publicou um estudo que mostra que a corrida internacional pelo Página 4 de 6Folha Online - Sinapse - Projetos suspensos - 30/03/2004 30/3/2004http://tools.folha.com.br/print.html?skin=emcimadahora&url=http%3A//www1.folha.u...
  • 5. Endereço da página: http://www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u787.shtml Links no texto: Comunidade Européia reage contra fuga de cérebros http://www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u786.shtml A meca da pesquisa http://www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u785.shtml conhecimento está quase toda concentrada em três grandes blocos: América do Norte; Japão e países do Leste Asiático; e Europa. Eles respondem por 85% dos gastos mundiais com pesquisa e desenvolvimento, investindo US$ 732 bilhões na área (leia textos às págs. 10 e 12). No Brasil, nem sequer há consenso sobre quanto é investido em pesquisa. O Ministério da Ciência e Tecnologia trabalha com o dado de 1% do PIB (equivalente a cerca de R$ 1,3 bilhão), mas pretende redefinir a metodologia do cálculo por acreditar que o dado está superestimado. Há quem fale em 0,3% (R$ 390 milhões). Mas, se a meta é chegar a 2%, como prega o governo federal, o país não poderá abrir mão de investimentos privados. "Há uma carência enorme de empresas que realizem pesquisas no Brasil. Se criarmos condições para que essas empresas se constituam ou para que multinacionais instalem seus centros de pesquisa aqui, criaremos mercado para os novos doutores", acredita Contini. No meio dessa crise está a discussão sobre a Lei de Inovação, um conjunto de medidas que deve ser votado ainda neste ano pelo Congresso. Quando entrar em vigor, a nova legislação poderá permitir, por exemplo, que o governo libere linhas de financiamento para empresas que realizem pesquisas de interesse da indústria. O governo planeja também a criação de uma agência que tenha como missão exclusiva estimular a pesquisa conjunta de empresas e centros de pesquisa em setores estratégicos. Também neste ano deverá ser apresentado à comunidade acadêmica o novo Plano Nacional de Pós-Graduação, que estabelece as linhas prioritárias de estímulo à pesquisa para os próximos seis anos. Uma das principais novidades do programa é a intersecção da política de pesquisa com a política industrial do governo, justamente com o objetivo de estimular o investimento privado. "Temos recebido sinais importantes de que a indústria está disposta a cooperar", diz o ministro da Ciência e Tecnologia, Eduardo Campos. "A exclusiva orientação acadêmica da pesquisa universitária é um anacronismo. A função da pós- graduação é formar o profissional da pesquisa necessária para o país em todas as áreas, mas, no mundo globalizado, essa função não pode ser aproveitada apenas no contexto acadêmico", diz a pesquisadora Elizabeth. "Falar de inovação não quer dizer que se vá tirar recursos de áreas que não tenham aplicações industriais. São questões complementares. A pesquisa universitária tem uma lógica e uma ética que não podem ser confundidas com a lógica e a ética da empresa. A primeira visa ao conhecimento, e a segunda, ao lucro. A questão urgente é saber compatibilizar essas lógicas e essas éticas —esse é o desafio do qual não podemos fugir", acredita Carlos Vogt, presidente da Fapesp. Esse equilíbrio entre interesses e investimentos públicos e privados ainda está muito longe de ser alcançado, mas parece ser um dos caminhos a serem percorridos. Comunidade Européia reage contra fuga de cérebros A meca da pesquisa Enquete: Como solucionar a crise da pesquisa? Página 5 de 6Folha Online - Sinapse - Projetos suspensos - 30/03/2004 30/3/2004http://tools.folha.com.br/print.html?skin=emcimadahora&url=http%3A//www1.folha.u...
  • 6. Enquete: Como solucionar a crise da pesquisa? http://polls.folha.com.br/poll/0408502 Copyright Folha Online. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folha Online. Página 6 de 6Folha Online - Sinapse - Projetos suspensos - 30/03/2004 30/3/2004http://tools.folha.com.br/print.html?skin=emcimadahora&url=http%3A//www1.folha.u...