1) O documento discute a proposta de transposição de água do Açude Flor do Campo para o Açude Carnaubal em Crateús para combater a seca na região.
2) A transposição por adutora é apontada como a solução mais viável para evitar grandes perdas de água e impactos ambientais.
3) É sugerida a realização de estudos hidrológicos e a participação de vários órgãos para garantir uma solução eficaz e sustentável para o abastecimento da população.
Manual de normas e procedimentos para vacinação 2014
Transposição de água garante abastecimento
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TRANSPOSIÇÃO DAS ÁGUAS DO AÇUDE FLOR DO CAMPO
PARA O AÇUDE CARNAUBAL EM CRATÉUS
Joice Elias de França
Tecnóloga em Saneamento Ambiental. CREA: 46274
Joana Darc Albano Bezerra
Tecnóloga em Saneamento Ambiental
PROBLEMATIZAÇÃO
Está na sina do sertanejo sofrer com os males da seca, os rachões dos seus pés sofridos
têm que se adaptar com as rachaduras do chão seco, chão este que transmite a sensação
de vazio, de abandono e desespero por parte destes que têm que “aceitar” essas
condições.
O Nordeste possui, há mais de um Século, um órgão específico para ações contra a seca,
hoje denominado DNOCS (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas), onde
uma de suas finalidades é o beneficiamento de áreas e obras de proteção contra as secas
e inundações. Será que 104 anos de estudos, obras e investimentos não foram
suficientes para suprimir esse mal que ataca os nordestinos? Aqui surgem vários
questionamentos. Será que a política adotada contra a seca é eficaz? Ou será que os
investimentos não estão sendo suficientes?
Hoje as regões dos Sertões de Crateús e dos Inhamus, notadamente o Município de
Crateús, flagela-se para economizar os últimos 147.000 litros de água presentes no
açude que abastece a área urbana do município. Em se falando de perdas na área rural, a
situação é mais crítica ainda, o agricultor e o pecuarista choram desde o começo do ano
com as perdas de suas lavouras e dos seus rebanhos. Seus pastos viraram cemitério de
animais que não sobreviveram à seca.
Isso não é novidade para os órgãos gestores, ainda em 2012 a Secretaria de Negócios
Rurais, EMATERCE e a FUNCEME calcularam que até Maio deste ano a perda da
safra era superior a 90% (PREFEITURA MUNICIPAL DE CRATEÚS, 2012). Nesse
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mesmo mês a Prefeitura Municipal decretou por meio do instrumento jurídico n° 599 de
02 de Maio de 2012, situação de emergência.
Sabe-se que a Seca não é culpa de ninguém e é algo imprevisível. Mas o que causa
indignação aos 72.812 habitantes da área urbana e rural de Crateús é o descompromisso
por parte do poder público para solucionar o problema. Em 19 de Novembro de 2012 o
Governo do Estado do Ceará institui o Decreto n° 31.053 declarando a situação de
emergência ou estado de calamidade pública de 174 municípios devido ao período de
estiagem, dentre estes Crateús. Desde então espera-se ações em resposta a esse decreto.
Então conclui-se que não é algo novo, pois desde 2012 percebe-se a situação crítica que
esse Município estava passando. O que foi feito como medida preventiva para 2013,
2014 ou, sabe-se lá, 2015? As sugestões e iniciativas apresentadas até o momento são
meramente paliativas e emergenciais, o racionamento é uma delas, conforme dados da
CAGECE, o consumo mensal é 220 mil metros cúbicos por mês. Até quando a
população urbana de Crateús terá que consumir em média sete mil metros cúbicos de
água por dia, ou menos de 1 litro/hab./dia?
Nessa ocasião a única situação viável encontrada pela Companhia de Gestão dos
Recursos Hídricos (COGERH) e apresentada com estima e sabedoria é a transposição
da água do Açude Flor do Campo, localizado no Município de Novo Oriente, para o
Açude Carnaubal, em Crateús.
Um encontro realizado em junho de 2013 contou com representantes do Ministério
Público Estadual e das prefeituras de Crateús e Novo Oriente. Com o objetivo de
esclarecer o projeto de transposição das águas, o Presidente da Cogerh, Francisco
Rennys Aguiar Frota, acompanhado pelo Secretário dos Recursos Hídricos – SRH,
Cesar Pinheiro, abriu a reunião apresentando detalhes do projeto de transposição e
enfatizou que o mesmo não trará qualquer tipo de prejuízo para os municípios
envolvidos, já que, de acordo com o estudo técnico realizado pela Companhia, nesta
operação será liberado o volume de 7 milhões de m3
a partir do açude Flor do Campo e
que, deste montante, cerca de 65% chegue ao açude Carnaubal, em torno de 4,5 milhões
de m3
, suficiente para garantir o abastecimento de Crateús até fevereiro de 2014 e para
manter uma reserva no açude Flor do Campo suficiente para abastecer o município de
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Novo Oriente até dezembro de 2014, mesmo na hipótese de ocorrência de reduzida
precipitação nesta região na quadra chuvosa de 2014, comparável à seca de 2012
(PREFEITURA MUNICIPAL DE CRATEÚS, 2012).
Ressalta-se que essa proposta de transposição seria pelo recurso hídrico que interliga os
dois açudes, sofrendo infiltração e evaporação ou, ainda, a utilização dessa água para
consumo da população ribeirinha ao longo desses 42 km que interligam os açudes.
Conforme a mesma o montante de água perdido por esta ação é de 2,5 Milhões de
metros cúbicos. Ora, qualquer pessoa entende que esse não é o momento para se
desperdiçar uma quantidade tão grande desse recurso “finito” na região. Levando-se em
conta o dado da CAGECE referente ao consumo médio mensal atual da população de
Crateús, calcula-se que esses 2,5 Milhões dariam para abastecer mais de 11 meses essa
mesma população nessas mesmas condições. Então, será que esta é mesmo a solução
mais viável e adequada?
Lembra-se ainda que nessa proposta foi observado que a reserva restante do Açude Flor
do Campo é capaz de abastecer o Município de Novo Oriente durante o ano de 2014. E
se esse cenário de estiagem prolongar-se por 2014, o que será feito para abastecer
Crateús? Vamos esperar para saber?
A COGERH como justificativa de desassoreamento do rio que interliga os dois açudes,
está fazendo escavações, que caracterizam impacto a este recurso e a flora local (Figuras
1 e 2). Baseado em qual estudo a cogerh tem a autonomia para alterar as margens desse
recurso? O órgão Estadual responsável está ciente? A Lei Federal n° 12.651 de 25 de
Maio de 2012 caracteriza essa área como de Preservação Permanente, na qual requer
cuidados quando refere-se à intervenção na mesma.
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Figura 1: Escavação dentro do rio.
Figura 2: Escavação para desassoreamento.
Diante da problemática apresentada a População dos dois munícipios envolvidos
clamam por uma solução adequada, que não prejudique os recursos naturais, que não
haja desperdícios e que tenha efeito em escala temporal. A proposta de transposição é
eficaz, desde que, feita com estudos detalhados, seriedade e compromisso. Sugere-se
que a solução mais viável, se comparada à outra proposta, para realizar a transposição é
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através de uma adutora. Do ponto de vista técnico a execução de uma adutora é
favorável, pois garante a condução segura e total da água até o açude carnaubal,
evitando elevadas perdas (infiltração e evaporação) e conflitos, ao contrário da
condução da água ser realizada naturalmente pelo recurso hídrico.
Nesse momento sugere-se parceria entres instituições a fim de determinarem respostas
eficazes à questão. A COGERH, a Secretária de Recursos Hídricos, o DNOCS, a
CAGECE, juntamente com as prefeituras e o Governo do Estado devem recrutar seus
técnicos, solicitar propostas técnicas cabíveis. Recomenda-se um estudo hidro
geomorfológico, proporcionando o entendimento do cenário de previsão do ajuste,
evolução do rio e sistema fluvial em escala de bacia; sondagens no lençol freático da
bacia hidrográfica, identificando reservatórios subterrâneos aptos para exploração por
meio de poços, onde estes serviriam de complemento para a contribuição de água
fornecida pela adutora.
Ressalta-se que a construção da adutora não é um benefício apenas imediato, pois a
mesma possui um longo tempo de vida útil e pouca depreciação. A implantação da
adutora é caracterizada nessa situação como emergencial e preventiva para futuras
secas, visto que o Nordeste possui essa peculiaridade.
A proposta de transposição de água é fidedigna nesse momento de carência do recurso,
atendendo as premissas da Politica Nacional de Recursos Hídricos, lei Federal n° 9.433
de 1997, em que em situação de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o
consumo humano e a dessedentação de animais.
Ressalta-se que nos Fundamentos desse instrumento legal (capítulo I, artigo 1° e inciso
VI), a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação
do Poder Público, dos usuários e das comunidades, portanto, qualquer tipo de sugestão,
manifestos ou duvidas devem ser relevantes.
CARACTERIZAÇÃO DO MUNÍCIPIO DE CRATEÚS
O município de Crateús - CE tem uma população urbana de 52.644 e rural 20.168
habitantes (IBGE, 2010). O abastecimento de água é feito pelo açude Carnaubal (a 13,6
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km da cidade) que tem capacidade para reservar 82 milhões de m³ de água. Atualmente
o açude conta com 0,18% de sua capacidade, o que equivale em média 147 mil m³ de
água (COGERH, 2013).
A tabela 1 a seguir apresenta um levantamento do volume armazenado durante o último
ano (Julho/2012 à Junho de 2013), mostrando o comportamento do açude em dois
períodos. Percebe-se que nos meses de Janeiro à Maio, período de chuva, não houve
aumento no volume de água, somente uma drástica redução, caracterizando um período
de estiagem. Se analisarmos o período de Julho à Dezembro, verifica-se um grande
índice de redução de volume, passou de 24,70 para 3,12%. Levando essa perspectiva de
consumo para esse mesmo período desse ano com o volume atual do Carnaubal, há de
se haver uma grande preocupação por parte da população de Crateús, assim como,
principalmente do Poder Público.
Tabela 1: Levantamento anual do volume armazenado de Julho/2012 à Junho de 2013.
Data Volume % Volume m3
Redução
Mensal
Redução
Mensal M3
01/07/2012 24,70% 20.254.000,00
25/07/2012 22,55% 18.491.000,00 2,15% 1.763.000,00
25/08/2012 19,04% 15.612.800,00 3,51% 2.878.200,00
25/09/2012 15,63% 12.816.600,00 3,41% 2.796.200,00
25/10/2012 11,37% 9.323.400,00 4,26% 3.493.200,00
25/11/2012 4,12% 3.378.400,00 7,25% 5.945.000,00
25/12/2012 3,12% 2.558.400,00 1,00% 820.000,00
25/01/2013 2,18% 1.787.600,00 0,94% 770.800,00
25/02/2013 1,52% 1.246.400,00 0,66% 541.200,00
25/03/2013 1,28% 1.049.600,00 0,24% 196.800,00
25/04/2013 0,97% 795.400,00 0,31% 254.200,00
25/05/2013 0,01 475.600,00 0,39% 319.800,00
25/06/2013 0,00 147.600,00 0,40% 328.000,00
Fonte: COGERH, 2013
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OBJETIVOS
O Objetivo principal do Sistema Adutor a ser proposto é garantir a condução segura de
água bruta do açude Flor do Campo ao Açude Carnaubal a fim de suprir o
abastecimento de água da população de Crateús até fevereiro de 2014.
CONCEPÇÃO DA ADUTORA
As bacias Poti-Longá situam-se na porção ocidental do Ceará. Limitam-se a leste com
as bacias do Acaraú, Banabuiú e Coreaú e ao sul com a sub-bacia do Alto Jaguaribe.
Esta bacia é parte integrante da bacia do Parnaíba, localizada no estado do Piauí
(INESP, 2009). Por se tratar de uma bacia integrante à bacia de outro estado enseja-se
foco por partes dos órgãos integrantes do Conselho Nacional de Recursos Hídricos,
cabendo ao mesmo promover a articulação do planejamento de recursos hídricos com os
planejamentos nacional, regional, estaduais e dos setores usuários.
O rio Poti, principal rio desta bacia no Estado do Ceará, abrange a parte sul da Bacia.
Nasce no Ceará e escoa para o Piauí, possuindo aproximadamente 192,5 km de extensão
e tendo como principal afluente o rio Macambira. Já o rio Longá, localiza-se na porção
norte da bacia e escoa no sentido leste-oeste. A Bacia drenada pelos dois rios, em
conjunto, cobrem uma área de 16.761,78 Km2
, o equivalente a 12% do território
cearense.
No Pacto das águas da bacia Poti-longá de 2009 já foi considerado como um dos
principais sistemas de transferência por leito perenizado dessa bacia o trecho entre os
dois açudes em questão (Figura 3).
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Figura 3: Principais Sistemas de Transferência de água da Bacia Poti-longá.
Fonte: INESP, 2009
O ponto de captação está localizado no Açude Flor do Campo, que está inserido na
bacia Poti-Longá na cota 343,34 m, a ser executado no Município de Novo Oriente -
CE. Apresenta Capacidade total de 105 Milhões de m3
e hoje conta com uma reserva de
15.592.500,00 m³, ou seja, 14,85% da capacidade total (GOGERH, 2013).
A linha adutora se estenderá em média 42,00 Km a partir do ponto de captação até o
açude Carnaubal na cota 288,79m, se desenvolvendo ao longo das margens dos
afluentes do rio Poti. As condições favoráveis da topografia do terreno permitirão um
traçado da adutora sem muitos ajustes, em alguns trechos por conduto livre sem
necessidade de recalque, visto que, o ponto de captação está em uma cota maior que o
ponto de recebimento.
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Em um projeto de Adutora geralmente analisa-se os seguintes fatores: Vida útil da obra;
evolução da demanda da água; custo da obra, flexibilidade na ampliação do sistema e
custo da energia elétrica. Em relação à vida útil da adutora é em média 50 anos para
tubos de fibra de vidro impregnado em resinas, 25 anos para tubos PVC DeFoFo e Ferro
Fundido (FoFo), concluindo-se que é uma ação com benefícios prolongados. A
evolução da demanda da água vai depender dos usos e objetivos que essa adutora pode
gerar.
No estudo de concepção já pode incluir a possibilidade de ampliação dessa adutora ou
interligação com outros açudes dessa mesma bacia hidrográfica.
Em relação ao custo com energia elétrica, de inicio não se vê como um risco para a
aprovação do projeto, pois, como foi destacado anteriormente, a topografia favorece a
adução por gravidade. Pode-se ainda estabelecer um plano de período de
funcionamento. Consiste em dividir a adução por períodos. Por exemplo, a adução por
gravidade, que não gera custos, pode ser durante 24 horas. Já a adução por
bombeamento ser apenas nos períodos considerados fora da ponta, ou seja, o período de
horário com menor custo por Kw/h, compreendido entre 20h:30min à 17h:29min
(COELCE,2013).
Com extensão de 42,00 km, o sistema poderá fazer a adução através de tubulação de
ferro fundido (FoFo), PVC DeFoFo ou fibra de vidro impregnado em resinas de
poliéster (PRFV), onde a escolha é a partir de tais aspectos:
Condição de funcionamento hidráulico;
Pressão interna e durabilidade do material face às características do solo;
Cargas externas;
Natureza da água transportada;
Custo.
Há a necessidade do dimensionado um sistema de bombeamento com potência
adequada que garantirá uma pressão favorável para que a água chegue em boas
condições de vazão.
Sugere-se que a adutora seja enterrada, quando possível, para que evite danos ou uma
maior depreciação por efeitos naturais. A escavação das valas deve ser mecânica,
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maximizando a produção de escavação e assentamentos dos tubos. Pode-se ainda fazer a
escavação por trechos com várias equipes de trabalho.
A escavação de valas é um serviço muito comum, caracterizando-se por ser uma
escavação provisória, onde a vala é aberta, a obra é executada e a vala novamente
aterrada. Além disso, é uma escavação linear e normalmente de baixa profundidade,
cuja largura total pode em alguns casos ser obtida com uma única passada da caçamba
da escavadeira.
A produtividade horária média desse serviço varia de 100 a 240m³/h, dependendo das
condições de serviço e do tipo de solo (CARDOSO, 2002). As escavações com retro são
bastante simples de serem executadas, sobretudo no caso da largura da vala ter
exatamente a largura da caçamba. Isso permite com que o equipamento fique alinhado
com a escavação, depositando o material ao seu lado.
No decorrer dos serviços a fiscalização competente deverá atentar para os padrões
exigidos, a fim de garantir a segurança e o bom andamento da obra, sem retrabalhos, o
que gera custos e desperdício de tempo.
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REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei n° 9.433 de 8 de Janeiro de 1997, que institui a Política Nacional de
Recursos Hídricos.
BRASIL. Lei Federal n° 12.651 de 25 de Maio de 2012, que institui o Código Florestal.
CAGECE – Manual de Encargos de Obras de Saneamento – Agosto de 2004.
Cardoso, Francisco Ferreira. Serviços de Escavação: Equipamentos e aspectos
executivos. Fevereiro/2002. Escola Politécnica da Universidade de São Paulo
Departamento de Engenharia de Construção Civil. Acessado em:
http://pcc2435.pcc.usp.br/pdf/servicos_escavacao.pdf
CEARÁ. Decreto Estadual nº 31053 de 19 de novembro 2012.
http://crateus.ce.gov.br/capa/?p=16842. Acessado em 28/06/2013
COELCE. https://www.coelce.com.br/paraseusnegocios/alta-tensao/perguntas-e-
respostas.aspx#. Acessado em 28/06/2013.
Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos – COGERH. http://www.hidro.ce.gov.br/.
Acessado em: 26/06/2013.
Departamento Nacional de Obras Contra as Secas – DNOCS. http://www.dnocs.gov.br/.
Acessado em: 27/06/2013.
INSTITUTO DE ESTUDOS E PESQUISAS PARA O DESENVOLVIMENTO DO
ESTADO DO CEARÁ. – INESP. Caderno Regional Das Bacias Poti-Longá. Fortaleza,
2009.
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.
http://www.censo2010.ibge.gov.br/sinopse/index.php?uf=23&dados=21. Acessado em
26/06/2013.
PREFEITURA MUNICIPAL DE CRATEÚS. Decreto Municipal n° n° 599 de 02 de
Maio de 2012.