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‘Remix’ sexista ou igualdade nas relações de género?
                                Elísio Estanque
                   Sociólogo – Centro de Estudos Sociais da FEUC
                        Diário de Coimbra, 24-NOV-2006


                             “Remix é o nome dado a uma música modificada
                       por outra pessoa ou pelo próprio produtor. Essa
                       modificação, na maioria dos casos, é feita por um DJ,
                       onde ele coloca uma batida animada e efeitos adicionais
                       criando uma versão dançante da música remixada”
                       (Wikipédia). Na discoteca com o mesmo nome, pelos
                       vistos, as relações entre ambos os sexos não foram ainda
                       “remisturadas” ou, se o foram, o resultado foi desastroso
                       já que, em vez de um ritmo dançante, minimamente
                       harmonioso ou sequer audível, o que temos é um ruído
                       insuportável e uma letra brejeira e sem poesia.
       Como diz Jean Baudrillard no livro “Simulacros e Simulação”, os signos e
as imagens dissimulam, como se por detrás delas não houvesse nada. Mas as
imagens podem ser assassinas do seu próprio modelo, mascarar e deformar
uma realidade mais profunda. Essa realidade profunda, que aqui se esconde e
ao mesmo tempo se agride sob a aparência de um corpo sexualmente
atraente, é a própria condição feminina.
       Um artigo anterior que publiquei neste jornal (30/10/06) suscitou um
debate com a comunidade estudantil de Coimbra a propósito da ‘praxe’ e do
‘feminismo’ – debate em curso no blogue: http://boasociedade.blogspot.com –,
onde é notória a confusão instalada em torno deste conceito e da conjugação
entre igualdade e diferença sexual. Este poster publicitário revela uma
mentalidade que não pode deixar de chocar qualquer cidadão minimamente
consciente do estatuto da mulher na sociedade democrática. Ele foi-me
entregue por uma colega indignada com esta imagem da mulher como mero
objecto sexual. Mas será que a juventude estudantil é sensível a isso? Será
que as raparigas em particular percebem a arrogância sexista que isto
reflecte? Ou será que apenas respondem entusiasmadas ao apelo do cartaz:
“noite da mulher – 6 bebidas 3,5€”?
       O feminismo é um movimento político que busca a desnaturalização e
superação das relações hierárquicas entre mulheres e homens, que luta pela
igualdade social, política, cultural e económica entre os sexos, com base na
crítica à estrutura patriarcal, que subsiste na sociedade actual e que serve de
base ao machismo. Não procura levar as mulheres a arredar os homens das
suas posições de poder para os substituir, mas sim obrigar a sociedade e as
instituições a cumprir o que está constitucionalmente consagrado, ou seja, o
direito ao igual tratamento, à igualdade de oportunidades e à não discriminação
nos mais diversos domínios da vida social.
       A diferença não é, portanto, incompatível com a igualdade. Não faz
sentido a defesa de qualquer tipo de “igualização social”, nesta ou noutras
matérias. Pelo contrário, é fundamental que se afirmem as diferenças para
que, com liberdade e autonomia individual se reforce o sentido de comunidade.
Uma comunidade fundada na partilha de valores, na solidariedade entre
cidadãs e cidadãos livres e emancipados que todos temos o direito (e o dever)
de ser, e que hoje está ameaçada pelo individualismo consumista e alienante.
Subscrevo a formulação de Boaventura de Sousa Santos quando defende que
“é preciso reivindicar a diferença quando a igualdade é opressiva, e a
igualdade quando a diferença é excludente”.
       O cartaz da discoteca “Remix” revela uma agressão grosseira à condição
da mulher, um machismo primário inadmissível no meio universitário. A
imagem fala por si: para além da nudez, dos cabelos compridos molhados, da
fotografia a preto e branco sob as letras vermelhas, há um subtexto que
espelha uma absoluta incultura e falta de formação. É claro que o poster não
foi feito por estudantes nem por praxistas (presumo eu), mas o simples facto
de existir e de ser dirigido à comunidade estudantil, sem qualquer protesto
visível, não deixa de ser revelador.
       Noutros anúncios que ultimamente circulam nas faculdades, dedicados a
cursos de formação práticos, também lá está a mesma mensagem: a parte dos
trabalhos domésticos, costurar, passar a ferro, cozinhar, etc, obviamente, é
escrita no feminino e destinada apenas às raparigas! Pois claro! Volte-se ao
antigamente: mulheres em casa a bordar, a limpar e a tomar conta dos filhos e
homens no futebol, nos copos e na vida pública em geral! E é impressionante
que as jovens universitárias de hoje não percebam que é por estas e por
outras que o seu futuro profissional está a ser hipotecado! De facto, parece que
estamos em processo de acelerada regressão a este nível. E quando tudo isto
acontece ao nível de quem tem ou está em vias de conseguir uma “formação
superior”, como será no resto do país?

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  • 1. ‘Remix’ sexista ou igualdade nas relações de género? Elísio Estanque Sociólogo – Centro de Estudos Sociais da FEUC Diário de Coimbra, 24-NOV-2006 “Remix é o nome dado a uma música modificada por outra pessoa ou pelo próprio produtor. Essa modificação, na maioria dos casos, é feita por um DJ, onde ele coloca uma batida animada e efeitos adicionais criando uma versão dançante da música remixada” (Wikipédia). Na discoteca com o mesmo nome, pelos vistos, as relações entre ambos os sexos não foram ainda “remisturadas” ou, se o foram, o resultado foi desastroso já que, em vez de um ritmo dançante, minimamente harmonioso ou sequer audível, o que temos é um ruído insuportável e uma letra brejeira e sem poesia. Como diz Jean Baudrillard no livro “Simulacros e Simulação”, os signos e as imagens dissimulam, como se por detrás delas não houvesse nada. Mas as imagens podem ser assassinas do seu próprio modelo, mascarar e deformar uma realidade mais profunda. Essa realidade profunda, que aqui se esconde e ao mesmo tempo se agride sob a aparência de um corpo sexualmente atraente, é a própria condição feminina. Um artigo anterior que publiquei neste jornal (30/10/06) suscitou um debate com a comunidade estudantil de Coimbra a propósito da ‘praxe’ e do ‘feminismo’ – debate em curso no blogue: http://boasociedade.blogspot.com –, onde é notória a confusão instalada em torno deste conceito e da conjugação entre igualdade e diferença sexual. Este poster publicitário revela uma mentalidade que não pode deixar de chocar qualquer cidadão minimamente consciente do estatuto da mulher na sociedade democrática. Ele foi-me entregue por uma colega indignada com esta imagem da mulher como mero objecto sexual. Mas será que a juventude estudantil é sensível a isso? Será que as raparigas em particular percebem a arrogância sexista que isto reflecte? Ou será que apenas respondem entusiasmadas ao apelo do cartaz: “noite da mulher – 6 bebidas 3,5€”? O feminismo é um movimento político que busca a desnaturalização e superação das relações hierárquicas entre mulheres e homens, que luta pela igualdade social, política, cultural e económica entre os sexos, com base na crítica à estrutura patriarcal, que subsiste na sociedade actual e que serve de base ao machismo. Não procura levar as mulheres a arredar os homens das suas posições de poder para os substituir, mas sim obrigar a sociedade e as instituições a cumprir o que está constitucionalmente consagrado, ou seja, o direito ao igual tratamento, à igualdade de oportunidades e à não discriminação nos mais diversos domínios da vida social. A diferença não é, portanto, incompatível com a igualdade. Não faz sentido a defesa de qualquer tipo de “igualização social”, nesta ou noutras matérias. Pelo contrário, é fundamental que se afirmem as diferenças para que, com liberdade e autonomia individual se reforce o sentido de comunidade. Uma comunidade fundada na partilha de valores, na solidariedade entre cidadãs e cidadãos livres e emancipados que todos temos o direito (e o dever)
  • 2. de ser, e que hoje está ameaçada pelo individualismo consumista e alienante. Subscrevo a formulação de Boaventura de Sousa Santos quando defende que “é preciso reivindicar a diferença quando a igualdade é opressiva, e a igualdade quando a diferença é excludente”. O cartaz da discoteca “Remix” revela uma agressão grosseira à condição da mulher, um machismo primário inadmissível no meio universitário. A imagem fala por si: para além da nudez, dos cabelos compridos molhados, da fotografia a preto e branco sob as letras vermelhas, há um subtexto que espelha uma absoluta incultura e falta de formação. É claro que o poster não foi feito por estudantes nem por praxistas (presumo eu), mas o simples facto de existir e de ser dirigido à comunidade estudantil, sem qualquer protesto visível, não deixa de ser revelador. Noutros anúncios que ultimamente circulam nas faculdades, dedicados a cursos de formação práticos, também lá está a mesma mensagem: a parte dos trabalhos domésticos, costurar, passar a ferro, cozinhar, etc, obviamente, é escrita no feminino e destinada apenas às raparigas! Pois claro! Volte-se ao antigamente: mulheres em casa a bordar, a limpar e a tomar conta dos filhos e homens no futebol, nos copos e na vida pública em geral! E é impressionante que as jovens universitárias de hoje não percebam que é por estas e por outras que o seu futuro profissional está a ser hipotecado! De facto, parece que estamos em processo de acelerada regressão a este nível. E quando tudo isto acontece ao nível de quem tem ou está em vias de conseguir uma “formação superior”, como será no resto do país?