O documento discute como a depressão se tornou o diagnóstico mais comum para descrever formas de sofrimento mental na atualidade. Isso ocorreu porque a vida passou a ser vista como uma empresa a ser medida por resultados, inibindo perguntas sobre o desejo. Além disso, o foco em tarefas e metas desativou o conflito, e sintomas passaram a substituir perguntas sobre o sofrimento. Isso trouxe como consequência uma visão individualizada da depressão.
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Depressão e vida
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Depressão: 'Pessoas olham a própria vida
como se fosse uma empresa a ser medida
pelos resultados', diz psicanalista
Amanda Mont’Alvão Veloso
De São Paulo para a BBC News Brasil
21 março 2021
'Não precisamos de um batalhão de psicólogos, psicanalistas, psiquiatras, especialistas em
sintomas. Precisamos de muita gente atenta ao sofrimento', diz Dunker sobre o que chamamos de
depressão
Que nome tem o sofrimento de nossa época? Conversas do cotidiano, diagnósticos e
levantamentos mundiais afirmam que é depressão. Segundo a Organização Mundial da
Saúde (OMS), mais de 300 milhões de pessoas no mundo convivem com o transtorno
mental, cuja incidência aumentou mais de 18% entre 2005 e 2015.
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2. 06/07/2022 19:46 Depressão: 'Pessoas olham a própria vida como se fosse uma empresa a ser medida pelos resultados', diz psicanalista - B…
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A depressão tem nomeado uma série de formas, descrições e vivências distintas, mas nem
sempre foi assim. Houve um tempo em que se sofria de outros nomes, mas a própria
recorrência do diagnóstico da depressão oferece pistas de como está nosso sistema de
desejos e escolhas nos últimos 40 anos, explica o psicanalista Christian Dunker.
Professor titular do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), Dunker
acaba de lançar o livro Uma biografia da depressão (Paidós). Depois de falar por milhões, a
depressão ganha voz para documentar sua história e apresentar seus familiares, colocando
em narrativa sua existência e suas relações com trabalho, cultura e economia.
O psicanalista, que é coordenador do Laboratório de Teoria Social, Filosofia e Psicanálise da
USP, onde pesquisa as formas de sofrimento no neoliberalismo, afirma que o foco em tarefas
e resultados tem inibido as perguntas sobre o desejo de cada um.
As causas daquilo que faz sofrer deixaram de importar, e uma lista de sintomas passou a
servir respostas onde deveria haver mais perguntas.
"Depressão e ansiedade acabam sendo duas formas de sofrer que vão compactando a
narrativa, a tal ponto que o sujeito acaba se resumindo a 'eu sou um depressivo'. Faz parte da
depressão essa demissão de contar sua própria história e dividi-la com o outro", afirma, em
entrevista à BBC News Brasil.
Isso trouxe consequências.
"Durante 40 anos a gente olhou pra depressão
como meramente um efeito de déficit de
neurotransmissores. Portanto, não fazia
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diferença como você fala da sua vida, pra quem,
como você se entende. Agora estamos pagando
a conta desses anos que, entre outras coisas, não
investiram no que podemos chamar de
instâncias protetivas."
Se há uma profilaxia para a depressão, ela
precisa passar pelo cuidado consigo e com os
próprios limites, explica o autor.
"Não precisamos de um batalhão de psicólogos,
psicanalistas, psiquiatras, especialistas em
sintomas. Precisamos de muita gente atenta ao
sofrimento, de práticas que transmitam para as
pessoas que elas podem se cuidar e se prevenir,
cada qual do seu jeito".
Confira os principais trechos da entrevista:
BBC News Brasil - Como a depressão chegou ao
posto de diagnóstico mais frequente para se descrever as formas de sofrimento mental em
nossa época?
Christian Dunker - Existem várias condições para que a gente eleja uma determinada forma
de sofrimento como aquela que melhor nos representa. Isso aconteceu ao longo da História
com a histeria, a hipocondria e a melancolia. Dá a impressão de que essa palavra vai
representando cada vez mais gente até que se esgota e precisa ser substituída por outra,
pois passa a representar tantas variantes de sofrimento que perde sua eficácia em termos
das gramáticas de reconhecimento.
"Depressão" foi eleita, e não outra, principalmente porque desde os anos 70 ela é uma forma
de sofrimento onde o conflito não aparece como muito fundamental, mas, sim o jogo de
intensidades: nossos afetos, ânimos, nossa motivação. Isso passa a ser muito valorizado
justamente nesse momento histórico em que as pessoas começam a olhar para sua própria
vida como se ela fosse uma empresa, como se ela pudesse ser medida pelos resultados; a
gente entra numa cultura de avaliacionismo.
Os anos 70 inventam a ideia do no limits [não há limites], de que a gente pode e deve ser
feliz, como diz a definição de "saúde" pela OMS: o mais completo estado de bem-estar bio,
psíquico e social. Se isso não é uma idealização do que alguém pode esperar da vida, então
não sei o que é!
Em comparação com isso, aqueles que têm outro modo de funcionamento, que estão em
outro tempo, que não conseguem fazer frente à lógica do produzir e consumir, ganham
visibilidade, porque é como se estivessem ofendendo não só a si mesmos e aos familiares,
mas a todos nós e ao sistema. Alguém que se recusa a sair da cama, alguém que perdeu a
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4. 06/07/2022 19:46 Depressão: 'Pessoas olham a própria vida como se fosse uma empresa a ser medida pelos resultados', diz psicanalista - B…
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vontade é alguém que perdeu o desejo numa cultura em que o desejo é farto, livre e
identificado com o consumo; daí a visibilidade dessa forma de sofrimento.
'Alguém que se recusa a sair da cama, alguém que perdeu a vontade é alguém que perdeu o
desejo numa cultura em que o desejo é farto', aponta o psicanalista
BBC News Brasil - Quais as consequências desse apagamento do conflito?
Dunker - Tem teorias que valorizam o conflito, mas há também aquelas que vão dizer "olha,
o conflito não é tão importante". Acho que essas outras maneiras de pensar são adequadas
ao momento atual. Vamos lembrar de 1989, ano em que o muro de Berlim cai. É o fim das
utopias, da Guerra Fria, de um mundo em que a gente tinha uma geografia muito clara de
direita e esquerda, Ocidente e oriente. Esse é o mundo do conflito.
Essa premissa vai sendo reduzida e aparece uma nova forma, que diz assim: no fundo, o
conflito só existe pra quem não sabe gerenciar as coisas e não sabe se organizar. Porque em
uma vida em estrutura de listas, em que o objetivo é relativamente simples, o conflito que
você tem é local, como realizar tarefas e entregar resultados. Se a gente se orienta pra isso,
não tem motivo pra se perguntar o porquê dessa tarefa ou daquela outra; o foco é no
resultado, no fim. Com isso, a gente perde o foco no processo. Se você entregar o resultado,
está bom.
BBC News Brasil - Como isso aparece no dia a dia?
Dunker - Se for pra virar a noite pra entregar a pauta, você vira a noite; se for pra trabalhar
no fim de semana, você trabalha; se for pra prejudicar alguém, você faz isso também. Ou
seja, a gente foi criando um esquema de relações profundamente ofensivo pra nosso cuidado
de si e para nossa subjetividade. A desativação do conflito deu muito resultado porque fez as
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empresas descobrirem que ao aumentar o sofrimento das pessoas, você aumenta o resultado
e a performance.
Mas isso também foi acelerado pela linguagem digital e a formação das comunidades
virtuais. Se estou tendo um conflito com você, eu dou um delete, um unfollow, cancelo.
São dois procedimentos básicos que têm muito a ver com a emergência da depressão: diante
da contrariedade, module a realidade: então, mude de país, de casa, de relacionamento e de
ambiente. O segundo é altere a paisagem mental: tome uma coisa, cheire outra, tome outra
pra dormir, acordar, transar... Se você tiver uma boa realidade construída, tudo vai ficar bem.
Não, tudo vai ficar deprimido!
BBC News Brasil - Por que a narrativa contemporânea da depressão é marcada pela
individualização do sofrimento, como "aquele que fracassa sozinho", "fica à margem" e
"não performa suficientemente"?
Dunker - A depressão tem um mecanismo importante que é a autoavaliação. Freud falava
que o supereu observa, julga e pune. O supereu é uma interiorização de uma certa versão da
lei, frequentemente patológica e obscena. É uma versão da lei que é a sua lei.
Deleuze, Foucault e vários críticos apontaram o momento em que você não precisa mais de
um feitor te ameaçando e falando alto com você. Pelo contrário, o gestor é soft, ameno, tem
valores humanísticos. Mas ele sabe ativar em você essa autoavaliação que já está em todos
nós, mas vamos dizer, tem a preferência do deprimido.
"Estou falando com ela agora, será que está sendo interessante?". Quando me autoavalio,
não estou mais com você, estou nesse circuito superegoico. Isso produz cansaço porque é
como você levar uma vida dupla: estou com as pessoas e estou na paralela com essa
contabilidade íntima. A gente sabe que o cansaço abre-se para uma correlação com a
depressão.
Nesse contexto, a ansiedade é como fazer valer essa lei de que "eu controlo". Eu controlo
fora. Se não controlo, é porque não tenho os meios, o dinheiro, o poder nem a fama pra fazer
isso. E eu controlo dentro, tomando uma pílula, meditando.
Essa ideia da controlabilidade vai transformar minha relação com o desejo, ainda a ser
nomeado, numa relação com metas e coisas que posso contabilizar. Isso é terrível porque
voltando ao processo depressivo, vou começar a me relacionar com meu desejo
transformando-o em demandas, tarefas. Você começa a se perguntar cronicamente "mas o
que será que eu quero?" e começa a se responder numa via tipicamente depressiva que é "eu
não quero isso, eu não quero aquilo lá também".
Isso funciona como uma inibição do desejo e já não consigo sair da cama. Estou me
produzindo uma inibição no desejo porque o desejo me provoca ansiedade, já que ela está
ligada a métricas que não alcanço. Disso decorre um rebaixamento do eu, um sentimento de
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inferioridade e a progressão dessa culpabilização que tão frequentemente caracteriza o
depressivo.
Tem ainda a experiência com o prazer. Um depressivo cruza uma certa fronteira quando
começa a perceber que tem um problema na capacidade de sentir prazer. Ele toma mesmo
vinho, dança com mesma mulher, vai ao mesmo jogo, lê o mesmo livro e não tem aquela
satisfação que teve algum dia. Muitas vezes isso é dado pela dificuldade do depressivo de
sustentar cadeias mais extensas de satisfação, que envolvem você ir encontrando satisfação
durante o processo e não só no fim. Uma coisa característica são os prazeres rápidos, curtos
e que estão à mão.
E aí você vai ter a coligação mórbida e tão frequente do depressivo com o álcool e com
certas dependências, como a de pornografia.
Como uma empresa, estamos gerindo nossos desejos e emoções como uma lista de tarefas,
explica Dunker
BBC News Brasil - No livro você aborda o quanto o conceito do que chamamos de
ansiedade também foi passando por uma perda da historicidade.
Dunker - Sim, e provavelmente a depressão e a ansiedade são uma coisa só. São partes de
um mesmo processo em que você tem sujeitos que estão mais próximos de um polo ou de
outro, mas a grande maioria trafega entre "eu me aproximo do desejo, isso me dá uma crise
de ansiedade" e "eu recuo do desejo e daí faço uma crise depressiva". Pra sair da depressão,
eu volto para a ansiedade. São muitas as fórmulas que combinam essas duas coisas.
Para a psicanálise, a ansiedade é uma forma específica da angústia, e angústia tem uma
dupla função: ela pode ser o início de um desejo, ou o ponto de recuo. Encontrei a angústia:
GETTY IMAGES/DRAFTER123
7. 06/07/2022 19:46 Depressão: 'Pessoas olham a própria vida como se fosse uma empresa a ser medida pelos resultados', diz psicanalista - B…
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eu vou pra frente e me arrisco, ou eu volto e pelo menos protejo meu eu de sofrer. Esse
circuito fica mais compreensível se a gente juntar as coisas.
Mas o DSM [Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, sistema de
classificação utilizado pela psiquiatria] separou e isso faz parte do universo que criou a
depressão, ou seja, a ideia de que os nossos transtornos mentais já não têm mais estrutura
narrativa, têm estrutura de lista. Tal e tal sintoma, então é depressão. Tal e tal sintoma, então
é ansiedade. Qual é a causa? Não importa.
Depressão e ansiedade acabam sendo duas formas de sofrer que vão compactando a
narrativa, a tal ponto que o sujeito acaba se resumindo a "eu sou um depressivo". Faz parte
da depressão esse déficit narrativo, essa demissão de contar sua própria história, sua vida, e
dividi-la com o outro.
BBC News Brasil - Há alertas sobre a incidência de depressão durante e no pós-pandemia.
Você acha que estamos discutindo as perdas o Brasil está vivendo?
Dunker - Se por um lado o descaso na condução da crise sanitária pelo governo, o desdém
pelo luto e a ausência de reverência com pessoas que pertenciam à cultura constituem uma
tragédia particular brasileira, por outro marcam a negação do luto, que é uma das vias pelas
quais a depressão também se instala.
Tipicamente o sujeito diz "ah, não perdi nada, eu só ganhei. Isso são números, são curvas, isso
aí não me afeta". Mas afeta de um outro jeito, isso volta como uma depressão inexplicável.
Vamos ver os lutos que você deixou pelo caminho.
No começo da pandemia no Brasil, os primeiros dados de pesquisa foram de aumento
massivo de depressão, mas, na clínica, curiosamente isso não se confirmou tanto assim. Há
casos de exceção, como quem está na frente de batalha ou os jornalistas; aí eu vejo
realmente um aumento substancial de depressão e ansiedade porque ligados ao contexto.
Em outro grupo muito extenso, a gente tem vidas que diminuíram a sua aceleração e isso
sempre tem um valor terapêutico para o depressivo, porque ele está lutando contra a
autoavaliação e um atraso crônico em relação ao tempo do mundo. Estou sugerindo que
muitos depressivos foram protegidos da sua depressão pela quarentena, pelo "fica em casa".
BBC News Brasil - Da mesma forma, muito tem se falado sobre depressão entre crianças e
adolescentes.
Dunker - Uma criança de 4, 5 anos que não se dá bem com a tela e que estava nesse
momento de descoberta real do outro tridimensional. Ela teve acesso a um novo brinquedo e
perdeu. Quando volta?
E você vai ter no outro lado jovens que estão no momento de "vou sair de casa, estou
começando um novo momento de vida, me formando, entrando na faculdade". Você tinha
uma grande idealização numa cultura já marcada por um forte sentimento de desempenho e
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https://www.bbc.com/portuguese/geral-56381902 8/17
felicidade obrigatória. "Uhu, entrei na faculdade! Mas isso não é uma faculdade. É uma
telinha, em que o cara aparece de vez em quando, nem olha na minha cara. Não é o que foi
prometido". Você vai encontrar aí alguns elementos propícios para quadros ansiosos e
depressivos porque não há partilha com o outro.
Vou acrescentar um grupo a estes que você falou: o dos idosos, em que você tem, de fato,
perdas que incitam a processos depressivos. Perdas reais, sem condição de elaboração do
luto. Dependendo, claro, da condição de cada um, os idosos enfrentam situações em que um
ano a menos não tem reposição.
Christian Dunker aponta para a situação desafiadora de crianças pequenas que estavam
descobrindo o 'outro tridimensional' e, com a pandemia, perderam este 'novo brinquedo'
BBC News Brasil - Pensando nessa incidência tão massiva da depressão, qual a importância
das políticas públicas de prevenção?
Dunker - Durante 40 anos a gente olhou pra depressão como meramente um efeito de
déficit de neurotransmissores. Portanto, não fazia diferença como você fala da sua vida, pra
quem, como você se entende. Agora estamos pagando a conta de 40 anos que, entre outras
coisas, não investiram no que podemos chamar de instâncias protetivas.
Tem que olhar para as situações de sofrimento das pessoas. O sofrimento mal tratado vira
sintoma. Não precisamos de um batalhão de psicólogos, psicanalistas, psiquiatras,
especialistas em sintomas. Precisamos de muita gente atenta ao sofrimento, de práticas que
transmitam para as pessoas que elas podem se cuidar e se prevenir da formação de
sintomas, cada qual do seu jeito.
REUTERS/AMANDA PEROBELLI
9. 06/07/2022 19:46 Depressão: 'Pessoas olham a própria vida como se fosse uma empresa a ser medida pelos resultados', diz psicanalista - B…
https://www.bbc.com/portuguese/geral-56381902 9/17
Veja como é difícil inocular uma saúde pública que não seja regra geral. Esse processo de
encontrar os próprios mecanismos de proteção ainda não entrou na nossa cultura. A gente
tem uma cultura de "vá à academia", "coma verde", mas quanto a cuidar de si, as pessoas não
sabem por onde começar.
Comece pela atenção ao sofrimento. Não é normal todo o sofrimento. Esse é suportável? De
onde ele vem? Professores, pais, todo mundo tem implicação nisso. Esse processo de
atenção ao sofrimento envolve, por exemplo, atenção a processos de isolamento. Nem
sempre alguém que está num quarto jogando videogame está em isolamento, mas, às vezes
está. Às vezes está fazendo isso para não ver os outros, e não como uma mediação para estar
com os outros.
Mas tem que ir lá ver, conversar, investigar, porque você não vai bater o olho e ver que tem
um problema. Isso tem a ver com como as pessoas narram, nomeiam. E evitar nomeações
fáceis como "isso é uma depressão": vai tomar antidepressivo. Remédio sem palavra não é
bom. Palavra, em relação, protege. Principalmente quando a relação consegue produzir
certos efeitos protetivos, como intimidade (confiança, porto seguro) e comunalidade
(pertenço a um coletivo, um grupo, uma família).
Psicanalista e professor da USP acaba de lançar o livro 'Uma biografia da depressão' (Paidós)
BBC News Brasil - No livro você destaca a importância que o significante depressão
adquiriu a partir da Crise de 1929. Qual a relação entre grandes crises econômicas e a
depressão na saúde mental?
Dunker - Aparentemente o significante depressão foi antes usado na economia e depois na
psicologia. Ele existia, mas adquiriu grande popularidade depois que as pessoas
interpretaram um estado de mundo - falta de emprego, inflação, perda de valor, decaimento
REPRODUÇÃO
10. 06/07/2022 19:46 Depressão: 'Pessoas olham a própria vida como se fosse uma empresa a ser medida pelos resultados', diz psicanalista - B…
https://www.bbc.com/portuguese/geral-56381902 10/17
- como isso é depressão. Não vamos ignorar as condições que temos de linguagem, trabalho
e desejo. O ano de 1973 é quando pela primeira vez se aplica em um país - no Chile de
Pinochet - as ideias do neoliberalismo da escola austríaca. Depois vieram Margaret Thatcher
e Ronald Reagan e isso se tornou indiscutível - "a economia é isso, essa é a lei geral, você tem
que aceitar". Isso foi até 2008.
Acho que podemos datar o reinado da depressão de 1973 a 2008. Não que o neoliberalismo
tenha passado - pelo contrário, está mais vivo e exigindo mais de cada um de nós -, mas,
porque, em 2008, parece que começamos a nos dar conta de que não está certo você
impingir sofrimento ao outro para produzir mais e indefinidamente.
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