Memórias de um Tempo_Meio Ambiente_Saneamento Básico em Bagé
1. Memórias de um tempo
Bagé, Arroio que
te quero vivo
Uma das primeiras manifestações de
rua que fizemos em Bagé – senão a
primeira – no período pré-redemocratização,
foi com alunos das
faculdades de Agronomia e Veterinária. O
Diretório Acadêmico de Veterinária era
presidido pelo Flavio Spartel, competente
profissional que tem o prazer de encontrar
sempre que vou a Dom Pedrito. O de
Agronomia, pelo Dagoberto Lima,
atualmente morando na Suíça na condição
de um dos maiores executivos de uma
empresa líder do setor fumageiro.
Se estou bem lembrado, foi no ano de
1981. Acompanhados do ambientalista
José Lutzemberger, descemos a Avenida
Sete de Setembro numa grande
caminhada e nos dirigimos para a Panela
do Candal, onde lançamos a campanha
“Bagé, Arroio que te quero vivo”. Era um
movimento em oposição à pretensão da
administração municipal da época que
queria canalizar o Arroio Bagé, que corta a
zona urbana do município, transformando-o
em cloaca de concreto. Em seu discurso,
Lutzberger afirmou que fazer isso seria
como “varrer o lixo para debaixo do
tapete”.
Conto isso para resgatar que o tema
ambiental, especialmente a preocupação
com a recuperação de nossos arroios,
sempre esteve presente na minha
militância política. Tanto, que a questão
integrou as sete campanhas eleitorais que
disputei no município – duas para vereador
e cinco para prefeito. Depois disso e já na
condição de vereador, em época de
estiagem, percorri todo o leito do Arroio
Bagé em sua parte urbana, subindo da
sede campestre do Caixeiral para o norte.
O mesmo fiz no Pérez, no Gontan e no
Tábua. Assumi, assim, um compromisso
ético com a luta pela recuperação e
preservação de nossos arroios.
Hora de executar
Eleito para a Prefeitura tinha que partir
do discurso para a prática. Em 1999, já
com meu projeto de disputar, pela quarta
vez a Prefeitura, e com a certeza de que
tinha chegado a nossa hora, negociei com
o meu amigo deputado Pompeo de Mattos,
do PDT, umas emendas ao orçamento da
União. Apresentei, naquele ano, duas
emendas para municípios indicados por
ele, com o compromisso de que Pompeo,
em 2000, apresentaria uma emenda no
2. valor de R$ 150 mil para investirmos em
saneamento básico em Bagé. No mesmo
ano, convenci o deputado Marcos Rolim a
também destinar igual valor para o mesmo
objetivo. No meu último ano na Câmara
Federal, antes da renúncia para assumir a
Prefeitura, destinei R$ 300 mil para
saneamento básico no município que eu
tinha certeza governaria a partir de 2001.
Desta forma, no orçamento do
Governo Federal de 2001 tínhamos R$
600 mil destinados para obras que
começassem a criar as condições para
diminuirmos os impactos do esgoto urbano
sob os arroios que cortam a nossa cidade.
Era o começo. Mas, ao contrário do que
aconteceu nos dois governos do presidente
Lula e que ocorre agora na gestão da
presidenta Dilma, na época de Fernando
Henrique Cardoso a oposição era tratada
“à mingua”. As verbas não eram liberadas.
O controle da liberação das emendas
parlamentares era exercido a partir do
gabinete do ministro Euclides Scalco, da
Secretaria Geral da Presidência. Passamos
Memórias de um tempo
todo o ano de 2001 tentando empenhar
aquelas verbas. Na semana anterior ao
Natal daquele ano, assim como na semana
que antecedeu o ano novo, acampei em
Brasilia. Passei dias intermináveis sentado
na ante-sala da chefia de gabinete da
Secretaria de Desenvolvimento Urbano.
Fiquei tão conhecido que algumas pessoas
acreditavam que eu era funcionário da
casa. Num destes plantões, presenciei um
assessor da secretaria recebendo um
telefonema do Palácio do Planalto, com
ordens para liberar recursos para um
determinado município.
Estava quase desistindo. Fui visitar um
conhecido que trabalhava na Casa Civil, no
Palácio do Planalto. Em determinado
momento me ocorreu um pensamento: e
seu eu telefonasse daqui, me passando
por um assessor do ministro Scalco, e
determinasse o empenho das emendas
para Bagé? Era o que restava. E foi o que
eu fiz. Liguei para o mesmo assessor da
Secretaria de Desenvolvimento Urbano,
que recebera aquela ligação, me
apresentei como Antonio Augusto, falando
3. em nome do ministro. “Meu caro, o
ministro pediu para liberar as emendas
para Bagé”, disse e, rapidamente me
despedi, desejando um feliz ano novo para
ele e sua família.
Voltei àquela repartição para me
despedir dos amigos que fizera e para
verificar se tinha dado certo a minha
estratégia. Numa das salas, um assessor
me disse: “prefeito, o senhor deu sorte, as
suas emendas serão empenhadas”. Sei
que foi uma transgressão. Mas quando
percebi a inconsistência de critérios, não
hesitei. Foi com aqueles recursos que
iniciamos a caminhada que, entre obras
executadas e recursos assegurados, criou
condições para que Bagé saísse de 30%
Memórias de um tempo
de esgoto coletado e nada tratado para
80% coletado e tratado. Um grande pulo.
A gravata e o esgoto
O meu amigo Sapiran Brito, na
campanha eleitoral de 1992, quando tentei
pela segunda vez a Prefeitura e ele era o
candidato a vice do Vargas, ironizava um
programa que fizemos no bairro de São
Martim em que eu, de terno, aparecia
quase dentro de um esgoto denunciando a
precária situação de Bagé neste setor.
Eram as famosas “valas fétidas”.
Na semana que vem conto mais um
pouco sobre o programa de saneamento
ambiental que executamos em Bagé, entre
2001 e 2008.
*Esse texto faz parte de Memórias de Um Tempo, uma série publicada no Jornal Minuano de Bagé,
em que procurei resgatar fatos de nossa gestão de oito anos na Prefeitura Municipal.