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Redes colaborativas e empoderamento feminino: a força das conexões digitais como
ferramenta para a educação e trabalho para meninas e mulheres
Maíra Medeiros, abril de 2015.
Introdução
Ao manter o olhar para algumas sociedades ocidentais, como a americana e a maioria das do
oeste europeu – e que muitas vezes moldam a visão de outras sociedades ocidentais em
desenvolvimento, como a brasileira – poderia-se dizer, superficialmente, que algumas questões
relacionadas ao gênero, como a participação na educação (incluindo-se aí primária, secundária
e universitária) e no ambiente de trabalho estariam praticamente superadas, excetuando-se
problemas como igualdade salarial ou participação em determinadas carreiras acadêmicas, tais
como ciência e engenharia, para citar apenas algumas.
No entanto, ao observar algumas sociedades orientais, principalmente as com presença
majoritária em sua população da crença muçulmana e de países concentrados no Oriente Médio
e no norte da África, pode-se verificar que o acesso à educação e ao trabalho remunerado por
meninas e mulheres adultas ainda é bastante restrito, quando não proibido – seja por questões
culturais, seja por normas legislativas e políticas.
Ainda assim, mesmo em regiões sub-desenvolvidas e com acesso precário à recursos como
energia elétrica ou mesmo água, já se podem observar movimentos, lideranças e organizações
não-governamentais que, por meio de ferramentas tecnológicas, como computadores e
dispositivos móveis (tablets e celulares), e conexões via internet, estão liderando mudanças
significativas em ambientes inóspitos, ao propiciar possibilidades de educação a distância,
empoderamento por meio de trabalho remunerado, e arrecadação de recursos ao redor do
globo. Além disso, o alcance da divulgação de tais iniciativas ganha um potencial muito mais
poderoso com a rapidez e a distribuição das redes sociais e das mídias digitais.
Este artigo se propõe a apresentar os principais meios, propiciados pelo acesso e uso da internet
por movimentos organizados, pelos quais são possibilitados o acesso à educação e ao trabalho
por mulheres, ou mesmo a ampliação da divulgação das questões de exploração e de
cerceamento de direitos femininos relacionados à educação e ao trabalho.
Para exemplificar, apresentam-se dois estudos de caso: o Fundo Malala, liderado por Malala
Yousafzai, laureada pelo Prêmio Nobel da Paz em 2014, cujo principal objetivo é incentivar
meninas de todo o mundo a ir à escola; e as iniciativas lideradas por Khalida Brohi, cujo projeto
nasce com o objetivo de proteger mulheres paquistanesas do costume de assassinato por honra,
e que migra para uma iniciativa de empoderamento por meio do trabalho remunerado.
Palavras-chave: empoderamento feminino, educação, conexão digital, internet,
compartilhamento.
Acesso à internet, dispositivos móveis e computadores em regiões remotas e sub-
desenvolvidas
Antes de apresentar os meios digitais disponíveis para a conexão nas regiões e comunidades
mencionadas, é importante mencionar a disponibilidade dos recursos necessários para
satisfazer com qualidade e velocidade necessárias para os trabalhos desenvolvidos pelos
movimentos e comunidades.
RIBEIRO, MERLI e SILVA (2012) expõem a extensão do problema da acessibilidade digital:
O acesso equitativo e qualitativo à Internet se tornou hoje um
horizonte a ser alcançado por repercutir diretamente na circulação
da informação, do conhecimento e da cultura. Não por acaso, a
universalização da banda larga tem sido objeto de leis, de programas
governamentais e uma preocupação amplamente reconhecida por
organismos multilaterais.1
Entre os recursos imprescindíveis para a conexão digital, podemos citar: energia (sendo ela
elétrica, solar, ou quaisquer outras que forneçam combustível para o carregamento de baterias
para o funcionamento dos dispositivos digitais, como computadores, notebooks, tablets e
celulares); acesso aos dispositivos, seja por sua disponibilização a preços acessíveis para o nível
de renda destas populações, seja por locação ou ainda doação e disponibilização de centros
gratuitos para acesso aos dispositivos; e acesso à internet – o que pode significar problemas de
acesso à áreas remotas (questões geográficas), falta de investimento nestas regiões pelas
empresas provedoras de serviços, devido à baixa atratividade de mercado, e ainda questões
culturais, religiosas e políticas, que podem coibir o acesso ou mesmo proibi-lo inteiramente.
Segundo dados do Facebook2
, apenas 2,7 bilhões de pessoas em todo o mundo estão
conectadas à internet – ou 1/3 de toda a população global. Ou seja: 2/3 da população de todo o
mundo ainda não tem acesso à internet. Ainda segundo dados do Facebook, a taxa de adesão à
internet cresce globalmente em 9% ao ano – índice considerado baixo, considerando-se o
volume de investimentos em tecnologia, e o número de pessoas ainda sem acesso.
Ainda sobre dados de acesso à internet, o gráfico abaixo apresenta o índice de penetração da
internet em alguns países em desenvolvimento:
Figura 1. Usuários de internet em países emergentes. Fonte: UIT, acessado em
http://www.caminhosdabandalarga.org.br/2012/11/capitulo-7/, em 22/04/2015.
Ao avaliarmos o poder que o acesso digital traz a sociedades restringidas deste direito, é
consideravelmente importante avaliar a problemática criada a partir destas restrições: a
chamada “exclusão digital”, associada à crescente importância das Tecnologias de Informação e
Comunicação (TIC’s) no desenvolvimento econômico dos países, torna ainda mais iminente o
risco de marginalização dos grupos excluídos das práticas educativas. Assim, um novo prisma da
1 RIBEIRO, MERLI e SILVA (2012). Exclusão digital no Brasil e em países emergentes: um panorama da primeira década do século
XXI. Acessado em http://www.caminhosdabandalarga.org.br/2012/11/capitulo-7/, em 22/04/2015.
2 https://newsroom.fb.com/news/2013/08/technology-leaders-launch-partnership-to-make-internet-access-available-to-all/,
acessado em 22/04/2015. Technology Leaders Launch Partnership to Make Internet Access Available to All. Datado de 21/08/2013.
exclusão social é desenvolvido, gerado a partir da incapacidade de participar da sociedade da
informação – o que significa exclusão do acesso às tecnologias e aos meios de aprendizado para
desenvolver as habilidades necessárias ao uso das novas ferramentas digitais. (RIBEIRO, MERLI
e SILVA, 2012 e CLARO, 2011).
Entre as iniciativas desenvolvidas que buscam minimizar o problema do acesso digital, podem-
se citar duas, lideradas pelos principais atores do mercado da internet hoje: Facebook, entre as
redes sociais, e Google, entre as ferramentas de busca.
A iniciativa internet.org, liderada pelo Facebook, tem como objetivo tornar o acesso à internet
possível aos 2/3 da população global que ainda não estão conectadas. O projeto tem a parceria
de empresas de tecnologia como Ericsson, MediaTek, Nokia, Opera, Qualcomm e Samsung, que
juntas unirão esforços para desenvolver práticas, compartilhar conhecimentos e mobilizar a
indústria e governos para tornar o mundo mais digital. A iniciativa conta ainda com organizações
não-governamentais, acadêmicos e pesquisadores. Os três principais desafios desta iniciativa
são: tornar o acesso à internet economicamente mais acessível, usar os dados de maneira mais
eficiente, e dar suporte para o desenvolvimento de novos negócios que tenham como foco
tornar dispositivos e acesso mais acessíveis. Ou seja, em resumo, teríamos a redução de custos
e de dados, e a facilitação de novos negócios sustentáveis.3
Um dos projetos já em teste desta iniciativa é um drone solar, que foi construído para facilitar o
acesso à Internet em áreas remotas. O protótipo, batizado de "Aquila", foi realizado no Reino
Unido. Segundo Mark Zuckerberg, CEO e fundador do Facebook, "dispositivos como este
ajudarão a conectar o mundo todo, pois atendem a um custo acessível 10% da população
mundial que vive em comunidades isoladas, sem infraestrutura de Internet existente”. O objetivo
é manter-se em cima de uma área por vários meses, e transmitir o serviço de Internet.4
A iniciativa do Google, batizada de Loon, é semelhante, pois trata de oferecer acesso digital para
áreas remotas, mas a partir de balões. Segundo o site do projeto, o Loon é uma rede de balões
que viaja pelo espaço, para conectar pessoas em áreas rurais e remotas, ajudar a preencher
falhas de cobertura e ajudar a recuperar a conexão com a Internet em áreas que passaram por
desastres. A tecnologia do sistema funciona assim:
Os balões do Projeto Loon flutuam na estratosfera, a uma altura duas
vezes maior que a de aeronaves e fenômenos meteorológicos. Há
várias camadas de vento na estratosfera, cada uma com variações
em direção e velocidade. Os balões Loon vão para onde são
necessários, subindo ou descendo por uma camada de vento que
sopre na direção desejada. Cada balão pode fornecer conectividade
a uma área de aproximadamente 40 km de diâmetro no solo, usando
uma tecnologia de comunicação sem fio chamada LTE. Por meio de
parceria com empresas de telecomunicações que compartilham o
espectro da rede celular, permitimos que as pessoas se conectem à
rede do balão diretamente dos seus smartphones e outros
dispositivos com suporte à LTE. Os balões retransmitem o tráfego
3
https://newsroom.fb.com/news/2013/08/technology-leaders-launch-partnership-to-make-internet-access-available-to-all/,
acessado em 22/04/2015. Technology Leaders Launch Partnership to Make Internet Access Available to All. Datado de 21/08/2013.
4http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/tecnologia/2015/03/27/interna_tecnologia,568386/faceboo
k-faz-primeiro-teste-com-drone-para-prover-internet.shtml, acessado em 22/04/2015. Facebook faz primeiro teste
com drone para prover Internet. 27/03/2015.
sem fio dos telefones celulares e outros dispositivos de volta para a
Internet global usando links de alta velocidade.5
O Projeto Loon testou sua mais nova tecnologia de rádio LTE em uma escola rural brasileira, Linoca
Gayoso, que nunca tinha tido acesso à Internet antes.
Figuras 2, 3 e 4. Balões do Projeto Loon. Fonte: http://www.google.com/loon/where/, acessado em 22/04/2015.
Para entender a importância do acesso digital para o crescimento e desenvolvimento das
economias, podemos mencionar um estudo realizado pela consultoria Deloitte, intitulado “O
Valor da Conectividade (Value of Connectivity, em seu título original), divulgado em fevereiro de
2014. Este documento traz dados que indicam que, com a expansão do acesso à internet em
países em desenvolvimento a níveis vistos hoje em economias desenvolvidas, seria possível
incrementar a economia destes locais em 25%, gerando US$ 2,2 trilhões no PIB, e mais de 140
milhões de novos empregos, e tirando 160 milhões de pessoas da pobreza. Isso se deve
principalmente ao acesso a informações de nutrição, saúde e prevenção de doenças, e a
ferramentas básicas de saúde, serviços financeiros e educacionais.6
Figura 5. Impactos econômicos da extensão da penetração da internet por região. Fonte:
http://internet.org/press/value-of-connectivity, acessado em 22/04/2015.
5 http://www.google.com/loon/, acessado em 22/04/2015. O que é o projeto Loon?
6
http://internet.org/press/value-of-connectivity, acessado em 22/04/2015. Value of Connectivity,
23/02/2014.
Economia da informação e compartilhamento: ambientes de abundância de conhecimento e
distribuição ampliada (redes distribuídas) – peer to peer
“(...) O Homo communicans é um ser sem interior e sem corpo, que
vive em uma sociedade sem segredo; um ser totalmente voltado para
o social, que só existe através da troca e da informação, em uma
sociedade tornada transparente graças às novas “máquinas de
comunicação”. (BRETON, 1995).
Em sociedades onde há o cerceamento e restrições de acesso à informação e ao conhecimento
– no todo ou em partes, no caso de proibições direcionadas exclusivamente ao gênero feminino
– o papel da comunicação, e essencialmente da capacidade de distribuição destas comunicações
a regiões remotas, a custos consideravelmente reduzidos, quando comparados a formatos
tradicionais, como o impresso, torna-se fundamental para o empoderamento e educação de
camadas da população que, de outra forma, se manteriam isoladas e empobrecidas.
Breton (1995) reforça a questão da transparência como item fundamental na nova sociedade
de comunicação: “(...) não há mais um nível onde agiria o indivíduo e um nível que seria o da
sociedade: um e outro se encontram fundidos em um laço social moderno unitário. É a
transparência que permite essa fusão: graças à comunicação, o homem é transparente à
sociedade, e a sociedade é transparente ao homem. Os modernos meios de comunicação
fundarão sua política de expansão sobre o tema: nada, nenhuma parte, deve permanecer em
segredo.”. Assim, com a transparência considerada como termo máximo, é possível que “(...) a
sociedade se autorregule, graças à retroação e ao caráter aberto das vias de comunicação” e
ainda que “pequenas comunidades de vida possuem as capacidades reguladoras mais
importantes” (BRETON, 1995). Então, torna-se possível a realização de iniciativas nascidas a
partir do uso de um ou de poucos computadores em áreas remotas ou miseráveis, e que sejam
locais, autorreguladas, sem hierarquias verticalizadas – e que ilustram na prática o poder desta
nova sociedade onde a comunicação é o verdadeiro valor.
Considerando então valores tais como transparência e autorregulação, podemos analisar
porque as iniciativas comunitárias que tem acesso a conexões digitais conseguem obter níveis
de sucesso e permanência consideravelmente mais altos do que iniciativas similares sem tais
conexões. Fica evidente que a comunicação transparente e sem barreiras permite que os
projetos possam espalhar e compartilhar suas mensagens a um número imensamente maior de
pessoas e regiões, a custos praticamente zero. A eliminação de barreiras geográficas, aliada ao
empoderamento trazido pela autorregulação das iniciativas, permite que praticamente
quaisquer projetos possam ter graduações consideráveis de êxito, desde que seus membros
tenham engajamento e dedicação à causa, eliminando-se barreiras de filtros, censura ou ainda
de custos proibitivos.
Entre os elementos importantes a serem considerados para o sucesso de tais iniciativas,
devemos considerar o ambiente nos quais estão inseridas, regradas basicamente em um cenário
de economia da informação, que conta, entre outras características, com alguns elementos
fundamentais: um ambiente de abundância da informação (uma vez conectado, o indivíduo tem
acesso a um volume de dados que permitem pesquisas, trocas de informações, buscas,
verificação de dúvidas, comparações com situações similares em outras regiões do mundo, etc);
a possibilidade do compartilhamento – peer to peer – o que permite processos produtivos entre
pares e colaboração voluntária; processos de reprodução a custos reduzidos; abertura para
novas possibilidades de leis de direitos autorais que permitam ampliação da acessibilidade dos
dados a custos reduzidos ou zero; financiamento coletivo (permitindo que a captação de
recursos para projetos seja mais efetiva e tenha maior alcance); a democratização das
ferramentas de comunicação; e, principalmente, a ampliação do acesso à informação e seu
compartilhamento.
Quando mencionamos a importância da conexão digital para o empoderamento de
comunidades, esse valor da web reside, essencialmente, em sua capacidade de proporcionar
acesso imediato à informação (SHAPIRO e VARIAN, 1999). Este é o valor essencial para as
populações que mencionamos no início do artigo: mulheres e meninas, isoladas ou proibidas de
irem à escola ou de realizarem trabalho remunerado, permanecem presas a um sistema onde a
ignorância e a falta de informação prevalecem. Segundo dados do Fundo Malala7
, há hoje
aproximadamente 62 milhões de meninas fora da escola, sendo que, entre as que estudam, a
média de permanência nos bancos escolares é de apenas 3 anos. O acesso à informação e à
educação, possíveis a distância e a custos relativamente menores via internet, permitiriam a
ampliação da educação de comunidades com acesso restrito a este direito.
Figura 6. Média em anos de permanência na escola por país. Fonte: http://community.malala.org/12-years-free-
education-1026865390.html, com dados da Unesco. Acessado em 23/04/2015.
Além do acesso, outro elemento importante para estas populações é a democratização das
ferramentas de produção e da distribuição. Segundo Chris Anderson8
, “o melhor exemplo disso
é o computador pessoal, que pôs todas as coisas, desde máquinas de impressão até os estúdios
de produção de filmes e músicas, nas mãos de todos”. Com um computador pessoal, ou ainda
um dispositivo móvel (como um celular ou tablet), todos podem ser produtores; com conexão à
Internet, todos podem ser distribuidores – sem ter a necessidade da intermediação de empresas
produtoras e distribuidoras, barateando o processo e permitindo o acesso aos conteúdos a um
maior número de pessoas.
Em continuidade aos elementos que permitem a ampliação de acesso à educação e ao trabalho
por meio dos meios digitais, devemos mencionar os processos peer to peer (ou P2P). Segundo
BAUWENS9
,
(...) o P2P designa todos os processos que visam aumentar a
participação generalizada de participantes equipotenciais. (...) [os
processos P2P] produzem valor de uso através da cooperação livre
entre produtores que tem acesso a capital distribuído: este é o modo
de produção P2P, um ‘terceiro modo de produção’, diferente da
produção com fins lucrativos e da produção pública efetuada por
companhias detidas pelo estado. O seu produto não reside num valor
7 http://www.malala.org/#main/home/, acessado em 23/04/2015.
8 ANDERSON, Chris. A Cauda Longa. 5 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006, p. 52.
9
BAUWENS, Michel. A Economia Política da Produção entre Pares. Disponível:
http://p2pfoundation.net/A_Economia_Pol%C3%ADtica_da_Produ%C3%A7%C3%A3o_entre_Pares
de troca destinado ao mercado, mas num valor de uso dirigido a uma
comunidade de utilizadores”.
Outro aspecto importante do P2P é que, neste modo de produção, cada indivíduo contribui de
acordo com as suas capacidades e vontades, e retira de acordo com as suas necessidades. Não
há reciprocidade obrigatória associada. Além disso, um fator que contribui radicalmente para o
sucesso de iniciativas comunitárias é o fato de que “os processos P2P ocorrem em redes
distribuídas. As redes distribuídas são redes em que os agentes autônomos podem determinar
livremente o seu comportamento e ligações sem o intermédio obrigatório de centros. (...) as
redes distribuídas não são o mesmo que redes descentralizadas, nas quais os centros são
obrigatórios. O P2P baseia-se num poder distribuído e no acesso distribuído aos recursos
(BAUWENS)10
. Assim, fica evidente que a autonomia dos processos e sua dinâmica voluntária
contribuem de maneira essencial para o êxito das iniciativas baseadas em processos P2P.
Devemos ainda mencionar os aspectos relacionados ao financiamento coletivo (ou
crowdfunding). Tendo como base estruturas referenciadas no P2P, projetos que captam
recursos por meio de crowdfunding apresentam maior facilidade de captação, por permitirem a
qualquer pessoa (sendo física ou jurídica) a realizarem a doação, sendo ela de quaisquer valores,
ou valores previamente estipulados (mas, que de maneira geral, apresentam valores mínimos
bastante acessíveis). Segundo a pesquisa “Retrato Financiamento Coletivo Brasil 2013/2014”11
,
74% das pessoas que fazem o financiamento coletivo acontecer no Brasil ganham até R$
6.000,00 por mês. Outro dado interessante refere-se à arrecadação: 25% dos realizadores dos
projetos financiados arrecadaram entre R$ 10 a 20 mil, e outros 25% arrecadaram entre R$ 20
a 50 mil. Ou seja: os doadores são pessoas com faixa de renda da classe média, e o valor
arrecadado total é consideravelmente baixo, quando comparado a outros projetos bancados
pela iniciativa privada ou governos. Um dado relevante que é apresentado pela pesquisa é um
dos fatores que são considerados importantes nos projetos financiados: a transparência –
possibilitada de maneira abrangente pelos recursos digitais. 72% das pessoas disseram que a
transparência é fator fundamental para decidir apoiar um projeto, e ainda 64% só apoiam
projetos que apresentem o uso da verba de forma transparente.
Estudos de caso: Fundo Malala e Khalida Brohi
Fundo Malala
Malala Yousafzai é uma ativista educacional paquistanesa, que fundou o Fundo Malala, cujo
objetivo é empoderar meninas por meio de educação secundária de qualidade, a fim de inspirar
mudanças positivas nas suas comunidades. Hoje, o Fundo Malala atua em países como o
Paquistão, Nigéria, Jordânia, Líbano, Serra Leoa e Quênia, além de defender campanhas de
educação femininas ao redor do mundo.
Malala ficou conhecida mundialmente após ser laureada com o Prêmio Nobel da Paz em 2014,
como reconhecimento à sua luta pela defesa dos direitos pela educação de meninas em seu
país. Ela foi baleada em 2012 por um ativista talibã no rosto no trajeto à escola em sua região
natal, o Vale do Swat, no Paquistão.12
10 BAUWENS, Michel. A Economia Política da Produção entre Pares. Disponível:
http://p2pfoundation.net/A_Economia_Pol%C3%ADtica_da_Produ%C3%A7%C3%A3o_entre_Pares
11 http://pesquisa.catarse.me/, acessado em 23/04/2015.
12 Com base em informações retiradas de http://www.malala.org/#main/home/, acessado em 23/04/2015.
Entre os aspectos importantes a serem considerados neste estudo, é que o Fundo Malala utiliza
intensamente os meios digitais para a divulgação de sua causa, e para captar recursos para seus
projetos. Entre os meios digitais mantidos pelo Fundo estão um site (www.malala.org), onde é
possível conhecer a história de Malala, os objetivos do Fundo, e os projetos apoiados; um blog
(http://community.malala.org/), onde há atualizações periódicas sobre as atividades do Fundo
e de Malala, além de histórias sobre os apoiadores e doadores do Fundo, e mantém contas em
algumas redes sociais, como o Facebook (https://www.facebook.com/MalalaFund), Twitter
(https://twitter.com/MalalaFund), YouTube (https://www.youtube.com/user/MalalaFund) e
Google+ (https://plus.google.com/109709154395371226419/posts). A exploração de todos
estes recursos de comunicação digitais, bem como a atualização constante nas redes sociais com
notícias e projetos defendidos, permitem uma distribuição altamente amplificada das
informações, possibilitando a maior difusão da causa do Fundo, e também uma melhoria
considerável nas capacidades de captação de recursos e de voluntários para os projetos.
Khalida Brohi
Khalida Brohi, paquistanesa, ativista e empreendedora, é fundadora e diretora da Sughar
Empowerment Society. A instituição provê educação, competências e oportunidades de trabalho
para empoderar mulheres de regiões tribais do Paquistão, para que possam ganhar papéis de
liderança em suas casas e comunidades.13
A partir de uma iniciativa nascida a partir do uso de um computador em sua aldeia, Brohi lidera
um projeto que nasce com o objetivo de proteger mulheres paquistanesas do costume de
assassinato por honra, e que migra para um belo projeto de empoderamento.
Pelo Facebook, Brohi iniciou a campanha chamada WAKE UP, "Acorda", contra os crimes de
honra. A campanha se tornou enorme em poucos meses, e a mídia se conectou com a
campanha.
Em 2013, sua instituição lançou a Sughar Hub, em parceria com o site TripAdvisor, que consistia
em uma sala de cimento no meio de uma aldeia, e para onde foram convidadas organizações
para trabalhar lá. Foi criada uma plataforma para que as organizações sem fins lucrativos
pudessem abordar outras questões que a Sughar não aborda, e que fosse um lugar fácil para dar
treinamentos, usar como uma escola agrícola, ou mesmo como um mercado. Até agora, 900
mulheres já foram auxiliadas, em 24 aldeias do Paquistão.
A instituição Sughar dispõe de um site (http://www.sughar.org/), um blog
(http://sugharwomen.blogspot.com.br/ - onde é possível fazer doações on-line), e participa de
algumas redes sociais, como o Facebook (https://www.facebook.com/SugharWomen). Além
disso, Brohi divulga o projeto nos meios digitais, como por exemplo em sua palestra publicada
no TED
(http://www.ted.com/talks/khalida_brohi_how_i_work_to_protect_women_from_honor_killi
ngs/transcript?language=en).
13 Com base em dados acessados em http://www.ted.com/speakers/khalida_brohi, acessado em 23/04/2015.
Referências bibliográficas
ANDERSON, Chris. A Cauda Longa. 5 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006, p. 52.
BAUWENS, Michel. A Economia Política da Produção entre Pares. Disponível:
http://p2pfoundation.net/A_Economia_Pol%C3%ADtica_da_Produ%C3%A7%C3%A3o_entre_P
ares
BRETON, Phillipe. La formation d’une nouvelle utopie”. In – L’utopie de la communication. Paris:
La Découverte, 1995, p. 49-62.
http://community.malala.org/12-years-free-education-1026865390.html, Acessado em
23/04/2015.
http://internet.org/press/value-of-connectivity, acessado em 22/04/2015. Value of
Connectivity, 23/02/2014.
http://pesquisa.catarse.me/, acessado em 23/04/2015.
http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/tecnologia/2015/03/27/interna_tecnolo
gia,568386/facebook-faz-primeiro-teste-com-drone-para-prover-internet.shtml, acessado em
22/04/2015. Facebook faz primeiro teste com drone para prover Internet. 27/03/2015.
http://www.google.com/loon/, acessado em 22/04/2015. O que é o projeto Loon?
http://www.google.com/loon/where/, acessado em 22/04/2015.
http://www.malala.org/#main/home/, acessado em 23/04/2015.
http://www.ted.com/speakers/khalida_brohi, acessado em 23/04/2015.
https://newsroom.fb.com/news/2013/08/technology-leaders-launch-partnership-to-make-
internet-access-available-to-all/, acessado em 22/04/2015. Technology Leaders Launch
Partnership to Make Internet Access Available to All. Datado de 21/08/2013.
RIBEIRO, MERLI e SILVA. Exclusão digital no Brasil e em países emergentes: um panorama da
primeira década do século XXI. Acessado em
http://www.caminhosdabandalarga.org.br/2012/11/capitulo-7/, em 22/04/2015.
SHAPIRO, Carl, VARIAN, Hal R. A Economia da Informação. Rio de Janeiro: Campus, 1999. P. 22

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Redes colaborativas e empoderamento feminino

  • 1. Redes colaborativas e empoderamento feminino: a força das conexões digitais como ferramenta para a educação e trabalho para meninas e mulheres Maíra Medeiros, abril de 2015. Introdução Ao manter o olhar para algumas sociedades ocidentais, como a americana e a maioria das do oeste europeu – e que muitas vezes moldam a visão de outras sociedades ocidentais em desenvolvimento, como a brasileira – poderia-se dizer, superficialmente, que algumas questões relacionadas ao gênero, como a participação na educação (incluindo-se aí primária, secundária e universitária) e no ambiente de trabalho estariam praticamente superadas, excetuando-se problemas como igualdade salarial ou participação em determinadas carreiras acadêmicas, tais como ciência e engenharia, para citar apenas algumas. No entanto, ao observar algumas sociedades orientais, principalmente as com presença majoritária em sua população da crença muçulmana e de países concentrados no Oriente Médio e no norte da África, pode-se verificar que o acesso à educação e ao trabalho remunerado por meninas e mulheres adultas ainda é bastante restrito, quando não proibido – seja por questões culturais, seja por normas legislativas e políticas. Ainda assim, mesmo em regiões sub-desenvolvidas e com acesso precário à recursos como energia elétrica ou mesmo água, já se podem observar movimentos, lideranças e organizações não-governamentais que, por meio de ferramentas tecnológicas, como computadores e dispositivos móveis (tablets e celulares), e conexões via internet, estão liderando mudanças significativas em ambientes inóspitos, ao propiciar possibilidades de educação a distância, empoderamento por meio de trabalho remunerado, e arrecadação de recursos ao redor do globo. Além disso, o alcance da divulgação de tais iniciativas ganha um potencial muito mais poderoso com a rapidez e a distribuição das redes sociais e das mídias digitais. Este artigo se propõe a apresentar os principais meios, propiciados pelo acesso e uso da internet por movimentos organizados, pelos quais são possibilitados o acesso à educação e ao trabalho por mulheres, ou mesmo a ampliação da divulgação das questões de exploração e de cerceamento de direitos femininos relacionados à educação e ao trabalho. Para exemplificar, apresentam-se dois estudos de caso: o Fundo Malala, liderado por Malala Yousafzai, laureada pelo Prêmio Nobel da Paz em 2014, cujo principal objetivo é incentivar meninas de todo o mundo a ir à escola; e as iniciativas lideradas por Khalida Brohi, cujo projeto nasce com o objetivo de proteger mulheres paquistanesas do costume de assassinato por honra, e que migra para uma iniciativa de empoderamento por meio do trabalho remunerado. Palavras-chave: empoderamento feminino, educação, conexão digital, internet, compartilhamento. Acesso à internet, dispositivos móveis e computadores em regiões remotas e sub- desenvolvidas Antes de apresentar os meios digitais disponíveis para a conexão nas regiões e comunidades mencionadas, é importante mencionar a disponibilidade dos recursos necessários para satisfazer com qualidade e velocidade necessárias para os trabalhos desenvolvidos pelos movimentos e comunidades.
  • 2. RIBEIRO, MERLI e SILVA (2012) expõem a extensão do problema da acessibilidade digital: O acesso equitativo e qualitativo à Internet se tornou hoje um horizonte a ser alcançado por repercutir diretamente na circulação da informação, do conhecimento e da cultura. Não por acaso, a universalização da banda larga tem sido objeto de leis, de programas governamentais e uma preocupação amplamente reconhecida por organismos multilaterais.1 Entre os recursos imprescindíveis para a conexão digital, podemos citar: energia (sendo ela elétrica, solar, ou quaisquer outras que forneçam combustível para o carregamento de baterias para o funcionamento dos dispositivos digitais, como computadores, notebooks, tablets e celulares); acesso aos dispositivos, seja por sua disponibilização a preços acessíveis para o nível de renda destas populações, seja por locação ou ainda doação e disponibilização de centros gratuitos para acesso aos dispositivos; e acesso à internet – o que pode significar problemas de acesso à áreas remotas (questões geográficas), falta de investimento nestas regiões pelas empresas provedoras de serviços, devido à baixa atratividade de mercado, e ainda questões culturais, religiosas e políticas, que podem coibir o acesso ou mesmo proibi-lo inteiramente. Segundo dados do Facebook2 , apenas 2,7 bilhões de pessoas em todo o mundo estão conectadas à internet – ou 1/3 de toda a população global. Ou seja: 2/3 da população de todo o mundo ainda não tem acesso à internet. Ainda segundo dados do Facebook, a taxa de adesão à internet cresce globalmente em 9% ao ano – índice considerado baixo, considerando-se o volume de investimentos em tecnologia, e o número de pessoas ainda sem acesso. Ainda sobre dados de acesso à internet, o gráfico abaixo apresenta o índice de penetração da internet em alguns países em desenvolvimento: Figura 1. Usuários de internet em países emergentes. Fonte: UIT, acessado em http://www.caminhosdabandalarga.org.br/2012/11/capitulo-7/, em 22/04/2015. Ao avaliarmos o poder que o acesso digital traz a sociedades restringidas deste direito, é consideravelmente importante avaliar a problemática criada a partir destas restrições: a chamada “exclusão digital”, associada à crescente importância das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC’s) no desenvolvimento econômico dos países, torna ainda mais iminente o risco de marginalização dos grupos excluídos das práticas educativas. Assim, um novo prisma da 1 RIBEIRO, MERLI e SILVA (2012). Exclusão digital no Brasil e em países emergentes: um panorama da primeira década do século XXI. Acessado em http://www.caminhosdabandalarga.org.br/2012/11/capitulo-7/, em 22/04/2015. 2 https://newsroom.fb.com/news/2013/08/technology-leaders-launch-partnership-to-make-internet-access-available-to-all/, acessado em 22/04/2015. Technology Leaders Launch Partnership to Make Internet Access Available to All. Datado de 21/08/2013.
  • 3. exclusão social é desenvolvido, gerado a partir da incapacidade de participar da sociedade da informação – o que significa exclusão do acesso às tecnologias e aos meios de aprendizado para desenvolver as habilidades necessárias ao uso das novas ferramentas digitais. (RIBEIRO, MERLI e SILVA, 2012 e CLARO, 2011). Entre as iniciativas desenvolvidas que buscam minimizar o problema do acesso digital, podem- se citar duas, lideradas pelos principais atores do mercado da internet hoje: Facebook, entre as redes sociais, e Google, entre as ferramentas de busca. A iniciativa internet.org, liderada pelo Facebook, tem como objetivo tornar o acesso à internet possível aos 2/3 da população global que ainda não estão conectadas. O projeto tem a parceria de empresas de tecnologia como Ericsson, MediaTek, Nokia, Opera, Qualcomm e Samsung, que juntas unirão esforços para desenvolver práticas, compartilhar conhecimentos e mobilizar a indústria e governos para tornar o mundo mais digital. A iniciativa conta ainda com organizações não-governamentais, acadêmicos e pesquisadores. Os três principais desafios desta iniciativa são: tornar o acesso à internet economicamente mais acessível, usar os dados de maneira mais eficiente, e dar suporte para o desenvolvimento de novos negócios que tenham como foco tornar dispositivos e acesso mais acessíveis. Ou seja, em resumo, teríamos a redução de custos e de dados, e a facilitação de novos negócios sustentáveis.3 Um dos projetos já em teste desta iniciativa é um drone solar, que foi construído para facilitar o acesso à Internet em áreas remotas. O protótipo, batizado de "Aquila", foi realizado no Reino Unido. Segundo Mark Zuckerberg, CEO e fundador do Facebook, "dispositivos como este ajudarão a conectar o mundo todo, pois atendem a um custo acessível 10% da população mundial que vive em comunidades isoladas, sem infraestrutura de Internet existente”. O objetivo é manter-se em cima de uma área por vários meses, e transmitir o serviço de Internet.4 A iniciativa do Google, batizada de Loon, é semelhante, pois trata de oferecer acesso digital para áreas remotas, mas a partir de balões. Segundo o site do projeto, o Loon é uma rede de balões que viaja pelo espaço, para conectar pessoas em áreas rurais e remotas, ajudar a preencher falhas de cobertura e ajudar a recuperar a conexão com a Internet em áreas que passaram por desastres. A tecnologia do sistema funciona assim: Os balões do Projeto Loon flutuam na estratosfera, a uma altura duas vezes maior que a de aeronaves e fenômenos meteorológicos. Há várias camadas de vento na estratosfera, cada uma com variações em direção e velocidade. Os balões Loon vão para onde são necessários, subindo ou descendo por uma camada de vento que sopre na direção desejada. Cada balão pode fornecer conectividade a uma área de aproximadamente 40 km de diâmetro no solo, usando uma tecnologia de comunicação sem fio chamada LTE. Por meio de parceria com empresas de telecomunicações que compartilham o espectro da rede celular, permitimos que as pessoas se conectem à rede do balão diretamente dos seus smartphones e outros dispositivos com suporte à LTE. Os balões retransmitem o tráfego 3 https://newsroom.fb.com/news/2013/08/technology-leaders-launch-partnership-to-make-internet-access-available-to-all/, acessado em 22/04/2015. Technology Leaders Launch Partnership to Make Internet Access Available to All. Datado de 21/08/2013. 4http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/tecnologia/2015/03/27/interna_tecnologia,568386/faceboo k-faz-primeiro-teste-com-drone-para-prover-internet.shtml, acessado em 22/04/2015. Facebook faz primeiro teste com drone para prover Internet. 27/03/2015.
  • 4. sem fio dos telefones celulares e outros dispositivos de volta para a Internet global usando links de alta velocidade.5 O Projeto Loon testou sua mais nova tecnologia de rádio LTE em uma escola rural brasileira, Linoca Gayoso, que nunca tinha tido acesso à Internet antes. Figuras 2, 3 e 4. Balões do Projeto Loon. Fonte: http://www.google.com/loon/where/, acessado em 22/04/2015. Para entender a importância do acesso digital para o crescimento e desenvolvimento das economias, podemos mencionar um estudo realizado pela consultoria Deloitte, intitulado “O Valor da Conectividade (Value of Connectivity, em seu título original), divulgado em fevereiro de 2014. Este documento traz dados que indicam que, com a expansão do acesso à internet em países em desenvolvimento a níveis vistos hoje em economias desenvolvidas, seria possível incrementar a economia destes locais em 25%, gerando US$ 2,2 trilhões no PIB, e mais de 140 milhões de novos empregos, e tirando 160 milhões de pessoas da pobreza. Isso se deve principalmente ao acesso a informações de nutrição, saúde e prevenção de doenças, e a ferramentas básicas de saúde, serviços financeiros e educacionais.6 Figura 5. Impactos econômicos da extensão da penetração da internet por região. Fonte: http://internet.org/press/value-of-connectivity, acessado em 22/04/2015. 5 http://www.google.com/loon/, acessado em 22/04/2015. O que é o projeto Loon? 6 http://internet.org/press/value-of-connectivity, acessado em 22/04/2015. Value of Connectivity, 23/02/2014.
  • 5. Economia da informação e compartilhamento: ambientes de abundância de conhecimento e distribuição ampliada (redes distribuídas) – peer to peer “(...) O Homo communicans é um ser sem interior e sem corpo, que vive em uma sociedade sem segredo; um ser totalmente voltado para o social, que só existe através da troca e da informação, em uma sociedade tornada transparente graças às novas “máquinas de comunicação”. (BRETON, 1995). Em sociedades onde há o cerceamento e restrições de acesso à informação e ao conhecimento – no todo ou em partes, no caso de proibições direcionadas exclusivamente ao gênero feminino – o papel da comunicação, e essencialmente da capacidade de distribuição destas comunicações a regiões remotas, a custos consideravelmente reduzidos, quando comparados a formatos tradicionais, como o impresso, torna-se fundamental para o empoderamento e educação de camadas da população que, de outra forma, se manteriam isoladas e empobrecidas. Breton (1995) reforça a questão da transparência como item fundamental na nova sociedade de comunicação: “(...) não há mais um nível onde agiria o indivíduo e um nível que seria o da sociedade: um e outro se encontram fundidos em um laço social moderno unitário. É a transparência que permite essa fusão: graças à comunicação, o homem é transparente à sociedade, e a sociedade é transparente ao homem. Os modernos meios de comunicação fundarão sua política de expansão sobre o tema: nada, nenhuma parte, deve permanecer em segredo.”. Assim, com a transparência considerada como termo máximo, é possível que “(...) a sociedade se autorregule, graças à retroação e ao caráter aberto das vias de comunicação” e ainda que “pequenas comunidades de vida possuem as capacidades reguladoras mais importantes” (BRETON, 1995). Então, torna-se possível a realização de iniciativas nascidas a partir do uso de um ou de poucos computadores em áreas remotas ou miseráveis, e que sejam locais, autorreguladas, sem hierarquias verticalizadas – e que ilustram na prática o poder desta nova sociedade onde a comunicação é o verdadeiro valor. Considerando então valores tais como transparência e autorregulação, podemos analisar porque as iniciativas comunitárias que tem acesso a conexões digitais conseguem obter níveis de sucesso e permanência consideravelmente mais altos do que iniciativas similares sem tais conexões. Fica evidente que a comunicação transparente e sem barreiras permite que os projetos possam espalhar e compartilhar suas mensagens a um número imensamente maior de pessoas e regiões, a custos praticamente zero. A eliminação de barreiras geográficas, aliada ao empoderamento trazido pela autorregulação das iniciativas, permite que praticamente quaisquer projetos possam ter graduações consideráveis de êxito, desde que seus membros tenham engajamento e dedicação à causa, eliminando-se barreiras de filtros, censura ou ainda de custos proibitivos. Entre os elementos importantes a serem considerados para o sucesso de tais iniciativas, devemos considerar o ambiente nos quais estão inseridas, regradas basicamente em um cenário de economia da informação, que conta, entre outras características, com alguns elementos fundamentais: um ambiente de abundância da informação (uma vez conectado, o indivíduo tem acesso a um volume de dados que permitem pesquisas, trocas de informações, buscas, verificação de dúvidas, comparações com situações similares em outras regiões do mundo, etc); a possibilidade do compartilhamento – peer to peer – o que permite processos produtivos entre pares e colaboração voluntária; processos de reprodução a custos reduzidos; abertura para novas possibilidades de leis de direitos autorais que permitam ampliação da acessibilidade dos dados a custos reduzidos ou zero; financiamento coletivo (permitindo que a captação de
  • 6. recursos para projetos seja mais efetiva e tenha maior alcance); a democratização das ferramentas de comunicação; e, principalmente, a ampliação do acesso à informação e seu compartilhamento. Quando mencionamos a importância da conexão digital para o empoderamento de comunidades, esse valor da web reside, essencialmente, em sua capacidade de proporcionar acesso imediato à informação (SHAPIRO e VARIAN, 1999). Este é o valor essencial para as populações que mencionamos no início do artigo: mulheres e meninas, isoladas ou proibidas de irem à escola ou de realizarem trabalho remunerado, permanecem presas a um sistema onde a ignorância e a falta de informação prevalecem. Segundo dados do Fundo Malala7 , há hoje aproximadamente 62 milhões de meninas fora da escola, sendo que, entre as que estudam, a média de permanência nos bancos escolares é de apenas 3 anos. O acesso à informação e à educação, possíveis a distância e a custos relativamente menores via internet, permitiriam a ampliação da educação de comunidades com acesso restrito a este direito. Figura 6. Média em anos de permanência na escola por país. Fonte: http://community.malala.org/12-years-free- education-1026865390.html, com dados da Unesco. Acessado em 23/04/2015. Além do acesso, outro elemento importante para estas populações é a democratização das ferramentas de produção e da distribuição. Segundo Chris Anderson8 , “o melhor exemplo disso é o computador pessoal, que pôs todas as coisas, desde máquinas de impressão até os estúdios de produção de filmes e músicas, nas mãos de todos”. Com um computador pessoal, ou ainda um dispositivo móvel (como um celular ou tablet), todos podem ser produtores; com conexão à Internet, todos podem ser distribuidores – sem ter a necessidade da intermediação de empresas produtoras e distribuidoras, barateando o processo e permitindo o acesso aos conteúdos a um maior número de pessoas. Em continuidade aos elementos que permitem a ampliação de acesso à educação e ao trabalho por meio dos meios digitais, devemos mencionar os processos peer to peer (ou P2P). Segundo BAUWENS9 , (...) o P2P designa todos os processos que visam aumentar a participação generalizada de participantes equipotenciais. (...) [os processos P2P] produzem valor de uso através da cooperação livre entre produtores que tem acesso a capital distribuído: este é o modo de produção P2P, um ‘terceiro modo de produção’, diferente da produção com fins lucrativos e da produção pública efetuada por companhias detidas pelo estado. O seu produto não reside num valor 7 http://www.malala.org/#main/home/, acessado em 23/04/2015. 8 ANDERSON, Chris. A Cauda Longa. 5 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006, p. 52. 9 BAUWENS, Michel. A Economia Política da Produção entre Pares. Disponível: http://p2pfoundation.net/A_Economia_Pol%C3%ADtica_da_Produ%C3%A7%C3%A3o_entre_Pares
  • 7. de troca destinado ao mercado, mas num valor de uso dirigido a uma comunidade de utilizadores”. Outro aspecto importante do P2P é que, neste modo de produção, cada indivíduo contribui de acordo com as suas capacidades e vontades, e retira de acordo com as suas necessidades. Não há reciprocidade obrigatória associada. Além disso, um fator que contribui radicalmente para o sucesso de iniciativas comunitárias é o fato de que “os processos P2P ocorrem em redes distribuídas. As redes distribuídas são redes em que os agentes autônomos podem determinar livremente o seu comportamento e ligações sem o intermédio obrigatório de centros. (...) as redes distribuídas não são o mesmo que redes descentralizadas, nas quais os centros são obrigatórios. O P2P baseia-se num poder distribuído e no acesso distribuído aos recursos (BAUWENS)10 . Assim, fica evidente que a autonomia dos processos e sua dinâmica voluntária contribuem de maneira essencial para o êxito das iniciativas baseadas em processos P2P. Devemos ainda mencionar os aspectos relacionados ao financiamento coletivo (ou crowdfunding). Tendo como base estruturas referenciadas no P2P, projetos que captam recursos por meio de crowdfunding apresentam maior facilidade de captação, por permitirem a qualquer pessoa (sendo física ou jurídica) a realizarem a doação, sendo ela de quaisquer valores, ou valores previamente estipulados (mas, que de maneira geral, apresentam valores mínimos bastante acessíveis). Segundo a pesquisa “Retrato Financiamento Coletivo Brasil 2013/2014”11 , 74% das pessoas que fazem o financiamento coletivo acontecer no Brasil ganham até R$ 6.000,00 por mês. Outro dado interessante refere-se à arrecadação: 25% dos realizadores dos projetos financiados arrecadaram entre R$ 10 a 20 mil, e outros 25% arrecadaram entre R$ 20 a 50 mil. Ou seja: os doadores são pessoas com faixa de renda da classe média, e o valor arrecadado total é consideravelmente baixo, quando comparado a outros projetos bancados pela iniciativa privada ou governos. Um dado relevante que é apresentado pela pesquisa é um dos fatores que são considerados importantes nos projetos financiados: a transparência – possibilitada de maneira abrangente pelos recursos digitais. 72% das pessoas disseram que a transparência é fator fundamental para decidir apoiar um projeto, e ainda 64% só apoiam projetos que apresentem o uso da verba de forma transparente. Estudos de caso: Fundo Malala e Khalida Brohi Fundo Malala Malala Yousafzai é uma ativista educacional paquistanesa, que fundou o Fundo Malala, cujo objetivo é empoderar meninas por meio de educação secundária de qualidade, a fim de inspirar mudanças positivas nas suas comunidades. Hoje, o Fundo Malala atua em países como o Paquistão, Nigéria, Jordânia, Líbano, Serra Leoa e Quênia, além de defender campanhas de educação femininas ao redor do mundo. Malala ficou conhecida mundialmente após ser laureada com o Prêmio Nobel da Paz em 2014, como reconhecimento à sua luta pela defesa dos direitos pela educação de meninas em seu país. Ela foi baleada em 2012 por um ativista talibã no rosto no trajeto à escola em sua região natal, o Vale do Swat, no Paquistão.12 10 BAUWENS, Michel. A Economia Política da Produção entre Pares. Disponível: http://p2pfoundation.net/A_Economia_Pol%C3%ADtica_da_Produ%C3%A7%C3%A3o_entre_Pares 11 http://pesquisa.catarse.me/, acessado em 23/04/2015. 12 Com base em informações retiradas de http://www.malala.org/#main/home/, acessado em 23/04/2015.
  • 8. Entre os aspectos importantes a serem considerados neste estudo, é que o Fundo Malala utiliza intensamente os meios digitais para a divulgação de sua causa, e para captar recursos para seus projetos. Entre os meios digitais mantidos pelo Fundo estão um site (www.malala.org), onde é possível conhecer a história de Malala, os objetivos do Fundo, e os projetos apoiados; um blog (http://community.malala.org/), onde há atualizações periódicas sobre as atividades do Fundo e de Malala, além de histórias sobre os apoiadores e doadores do Fundo, e mantém contas em algumas redes sociais, como o Facebook (https://www.facebook.com/MalalaFund), Twitter (https://twitter.com/MalalaFund), YouTube (https://www.youtube.com/user/MalalaFund) e Google+ (https://plus.google.com/109709154395371226419/posts). A exploração de todos estes recursos de comunicação digitais, bem como a atualização constante nas redes sociais com notícias e projetos defendidos, permitem uma distribuição altamente amplificada das informações, possibilitando a maior difusão da causa do Fundo, e também uma melhoria considerável nas capacidades de captação de recursos e de voluntários para os projetos. Khalida Brohi Khalida Brohi, paquistanesa, ativista e empreendedora, é fundadora e diretora da Sughar Empowerment Society. A instituição provê educação, competências e oportunidades de trabalho para empoderar mulheres de regiões tribais do Paquistão, para que possam ganhar papéis de liderança em suas casas e comunidades.13 A partir de uma iniciativa nascida a partir do uso de um computador em sua aldeia, Brohi lidera um projeto que nasce com o objetivo de proteger mulheres paquistanesas do costume de assassinato por honra, e que migra para um belo projeto de empoderamento. Pelo Facebook, Brohi iniciou a campanha chamada WAKE UP, "Acorda", contra os crimes de honra. A campanha se tornou enorme em poucos meses, e a mídia se conectou com a campanha. Em 2013, sua instituição lançou a Sughar Hub, em parceria com o site TripAdvisor, que consistia em uma sala de cimento no meio de uma aldeia, e para onde foram convidadas organizações para trabalhar lá. Foi criada uma plataforma para que as organizações sem fins lucrativos pudessem abordar outras questões que a Sughar não aborda, e que fosse um lugar fácil para dar treinamentos, usar como uma escola agrícola, ou mesmo como um mercado. Até agora, 900 mulheres já foram auxiliadas, em 24 aldeias do Paquistão. A instituição Sughar dispõe de um site (http://www.sughar.org/), um blog (http://sugharwomen.blogspot.com.br/ - onde é possível fazer doações on-line), e participa de algumas redes sociais, como o Facebook (https://www.facebook.com/SugharWomen). Além disso, Brohi divulga o projeto nos meios digitais, como por exemplo em sua palestra publicada no TED (http://www.ted.com/talks/khalida_brohi_how_i_work_to_protect_women_from_honor_killi ngs/transcript?language=en). 13 Com base em dados acessados em http://www.ted.com/speakers/khalida_brohi, acessado em 23/04/2015.
  • 9. Referências bibliográficas ANDERSON, Chris. A Cauda Longa. 5 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006, p. 52. BAUWENS, Michel. A Economia Política da Produção entre Pares. Disponível: http://p2pfoundation.net/A_Economia_Pol%C3%ADtica_da_Produ%C3%A7%C3%A3o_entre_P ares BRETON, Phillipe. La formation d’une nouvelle utopie”. In – L’utopie de la communication. Paris: La Découverte, 1995, p. 49-62. http://community.malala.org/12-years-free-education-1026865390.html, Acessado em 23/04/2015. http://internet.org/press/value-of-connectivity, acessado em 22/04/2015. Value of Connectivity, 23/02/2014. http://pesquisa.catarse.me/, acessado em 23/04/2015. http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/tecnologia/2015/03/27/interna_tecnolo gia,568386/facebook-faz-primeiro-teste-com-drone-para-prover-internet.shtml, acessado em 22/04/2015. Facebook faz primeiro teste com drone para prover Internet. 27/03/2015. http://www.google.com/loon/, acessado em 22/04/2015. O que é o projeto Loon? http://www.google.com/loon/where/, acessado em 22/04/2015. http://www.malala.org/#main/home/, acessado em 23/04/2015. http://www.ted.com/speakers/khalida_brohi, acessado em 23/04/2015. https://newsroom.fb.com/news/2013/08/technology-leaders-launch-partnership-to-make- internet-access-available-to-all/, acessado em 22/04/2015. Technology Leaders Launch Partnership to Make Internet Access Available to All. Datado de 21/08/2013. RIBEIRO, MERLI e SILVA. Exclusão digital no Brasil e em países emergentes: um panorama da primeira década do século XXI. Acessado em http://www.caminhosdabandalarga.org.br/2012/11/capitulo-7/, em 22/04/2015. SHAPIRO, Carl, VARIAN, Hal R. A Economia da Informação. Rio de Janeiro: Campus, 1999. P. 22