O documento discute dois tipos de magia - a Baixa Magia, baseada no corpo e na terra, e a Alta Magia, intelectualizada e controladora. A Alta Magia está morrendo pois as pessoas não aceitam mais suas ladainhas fora da realidade, enquanto a Baixa Magia ressurge em movimentos como um canto do cisne. O futuro da magia está na física quântica e na realidade virtual, não na ordem mas no caos.
1. Dois tipos de magia são discriminados pelos estudiosos de todas as épocas: a
Alta Magia e a Baixa Magia. Jamais devem ser confundidas com magia negra ou
magia branca, que se tratam de tipos de magia arbitrariamente designados como
tal pela idiossincrasia da moral de quem as trata assim.
A Baixa Magia seria a magia de cunho terrestre, geralmente pagã (na acepção
etimológica original da palavra: do campo e não
como foi posteriormente adotada significando não-
cristão) é baseada no desregramento dos sentidos. É
baseada na carne, na terra, no suor, no sangue. É o
tipo de ritual praticado pelas tribos ditas primitivas e
pelos cultos afro-americanos em geral. A Alta Magia
seria a magia do controle, a magia do domínio da
realidade pelo homem. É um tipo de magia
intelectualizada e fria, baseada no puro espírito, ou
melhor, na separação platônica da carne e do
espírito. O Mago escraviza entidades, ordena coisas,
e para tal tem que ser controlado tanto por dentro
quanto por fora. O Mago Cerimonial (de Alta Magia) é
um sujeito que pratica a abstinência dos prazeres
corporais, pois só pode dominar o macrocosmo se
seu microcosmo estiver dominado. A missa é um
exemplo de ritual de Alta Magia, no sentido de que o
padre prega, faz sermão, amedronta, os outros
participantes do ritual. Eles comem a carne e bebem
o sangue de cristo (resquício pagão) e recebem o
Espírito Santo. Tudo muito frio e ordenado, baseado
no dogma de um livro (A missa já foi ainda mais cerimonial e cheia de etiqueta,
mas um concílio resolveu popularizar o ritual, trocando o latim e o padre de costas
pela conversa franca e ameaçadora de um padre regendo pessoas). Na verdade a
maioria dos magos cerimoniais era composta por padres ou abades. Eliphas Levi é
o maior exemplo.
Existe um sistema, um dogma, comum entre ocultistas modernos, que prega a
sucessão éonica. Éons seriam períodos de tempo regidos por uma divindade ou
característica dominante. Assim, períodos de tempo grandes, mais ou menos 2000
anos, recebem um rótulo, uma divindade, um signo zodiacal, uma característica
política, social e uma característica religiosa dominante. Acredita-se que o presente
éon começou neste século ou está por começar, e as características desse Novo
éon ainda são enevoadas. O primeiro éon (da época histórica) seria o da Deusa,
como geralmente a iconografia é egípcia (a idéia de Aeons seria originalmente
egípcia), Ísis ou Nut fica como regente desse período. Geralmente se atribui uma
organização social matriarcal a este período, mas esta idéia é historicamente
incorreta. A organização era tribal ou em clãs, em geral patriarcais mesmo
(Algumas sociedades já tinham até um estado semelhante ao moderno, mas
baseado em dinastias, como o Egito. Na verdade o Egito e o Oriente Médio nos
deram a religião e a organização social do próximo éon, o de Osíris, e mesmo hoje
existem tribos que vivem no éon de Ísis, os compartimentos não são estanques).
Os homens que viviam em meio à natureza abundante ainda não tinham
desenvolvido agricultura, simplesmente colhiam as dádivas da Deusa, Politeísmo,
amor filial, culto da terra, etc, como valores essenciais. Não se conhece muito a
respeito das culturas verdadeiramente do éon de Ísis simplesmente porque elas
não dominavam a escrita. O segundo éon se atribuiu ao deus Osíris. E é
basicamente o que conhecemos por cristianismo, feudalismo, patriarcado,
exploração indômita da terra, organização rígida, medo como método de coerção
social, progresso científico, absolutismo, etc.
Neste século ocorreu uma mudança mais brusca do que nos outros éons. O
mundo está mais unificado e age mais em conjunto, apesar das diferenças. Todo o
2. progresso científico gerou uma revolução a nível psicológico-antropológico muito
maior do que nós, que só conhecemos isto, podemos notar.
O individualismo não permite mais religiões de massa. A religião do futuro ou é
a ausência de religião ou uma religião individualizada. As pessoas não precisam
mais ser aceitas em seu grupo social para sobreviverem, como antigamente. As
pessoas não dependem mais dos filhos para comerem, portanto não precisam de
muitos filhos. Controlamos nossa fertilidade. Isso é um marco pouco percebido. A
TV foi a última e grandiosa manifestação do éon passado, com sua pregação para
as massas. Em pouco tempo, via Internet, ninguém vai assistir a mesma novela
que o vizinho, a diversificação vai ser tamanha que vai ser impossível passar uma
mensagem coerente no sentido de um conspiratório e paranóico domínio das
massas.
Enquanto a Baixa Magia ressurge em alguns movimentos, como num canto do
cisne, a Alta Magia morre. Ninguém mais agüenta uma ladainha fora da realidade
como a que acontece nas Igrejas, ninguém agüenta aprender hebraico e grego para
chamar espíritos, estudar cabala, e ficar fazendo pose de sério dentro de um
círculo. As pessoas estão cínicas e irreverentes demais para isto. Sentiriam-se
ridículas fazendo isso.
O futuro da magia está na física quântica e na realidade virtual. A catarse das
raves prova que o homem não deixou o corpo para trás, como se esperava no éon
passado. Informação é o poder do Mago moderno, que não trabalha nem com a
pena tampouco com a espada, trabalha com o teclado, à velocidade da luz. O mago
não trabalha na inocência ou na ordem, trabalha no Caos. E que fique entendido
que isso não é evolução, progresso, melhoria. É transformação, como da pupa para
borboleta ou de ser vivo para cadáver putrefato.
Extraído de Aurora Wirth
Adaptado por Spectrum