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Autor: HERMANN BAVINCK
(1854 -1921)
Bavinck pastoreou a Igreja
Reformada em Franeker, foi
Professor titular de Teologia
Sistematica em Kampem e finalmente
da Universidade Livre de Amsterda.
Bavinck apresentou, atraves de
sua pena, diversos assuntos da mais
alta importancia sobre: educa<;ao,
etica, familia, psicologia etc., sendo
sua obra Reformed Dogmatics
(Gereformeerd Dogmatiek), segundo os
crfticos, a mais relevante.
Bavinck, na sua piedade e estilo
de vida, influenciou muitos te6logos,
holandeses e norte-americanos da
linha reformada, entre eles Louis
Berkhof.
FUNDAMENTOS
TEOLOGICOS DA FE CRISTA
Autor: Hermann Bavinck
Professor Titular de Teologia,
Universidade Livre de Amsterda
Traduzido do Ingles por Vagner Barbosa
~
TEOLOGIA SISTEMATICA
Autor: Hermann Bavinck
Tradutor: Vagner Barbosa
Revisores: Ademar de Oliveira Godoy e Loyde Wenzel de Paula
Editor Responsavel: Arival Dias Casimiro
Setembro de 2001
Dados Internacionais de Catalogaao na Publicaao (CIP)
(Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Bavinck, Hermann
B354r Our reasonable faith. Traduzido da edi<;:ao holan-
desa, magnalia Dei, por Henry Zylstra. Grand Rapids: Baker
Book House, 1977.
559 p.
1. Teologia Sistematica. 2. Doutrina Crista. I. Titulo.
CDD-230
Copyright© 2001 por SOCEP
Fica explicitamente proibida qualquer forma de reprodw;:ao total ou parcial
deste livro, sem o expresso consentimento dos editores.
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Prodw;ao e Diagramar;ao:
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Tel.: 19-3455.7422
Filiadoa:
PREFACIO A TRADU<;AO BRASILEIRA
0
pensamento calvinista vi-
veu, no seculo XIX, uma
fase de reavivamento e
expansao.
Nos Estados Unidos, o Semi-
nario de Princeton foi o principal
centro de forma<;:ao e difusao do
calvinismo, Velha Escola, nas
Americas. Archibald Alexander
(1772-1851), Charles Hodge (1797-
1878), Archibald Alexander
Hodge (1823-1886) e Benjamin B.
Warfield (1851-1921), respectiva-
mente, foram os mestres formu-
ladores da Velha Teologia de
Princeton. Os principais elemen-
tos dessa teologia foram: a aceita-
c;ao da inspirac;ao plena da Biblia
e a sua infalfvel autoridade; a ado-
<;:ao do metodo indutivo para a sis-
tematiza<;:ao teol6gica; o ensino da
ciencia subordinado ateologia; a
defesa da fe ou do ensino bfblico
confessional como urn clever pas-
toral.
5
0 protestantismo brasileiro
foi, na sua origem, moldado pelo
calvinismo norte-americana, da
Velha Escola. As obras: Teologia
Sistematica, (3 volumes) de C.
Hodge e Esbo~os de Teologia, de A.
A. Hodge foram utilizadas como
texto principal na forma<;:ao de
pastores brasileiros. Atualmente,
essas obras estao traduzidas para
o portugues.
Herman Bavinck (1854 -
1921) foi, no final do seculo XIX,
juntamente com Abraham Kuy-
per, urn te6logo de destaque no
reavivamento neocalvinista na
Igreja Reformada Holandesa. Foi
professor de teologia sistematica
no Seminario Teol6gico em Kapen
(1882-1902) e na Universidade Li-
vre de Amsterdam (1902-1920). A
sua principal obra foi Gerefor-
meerde Dogmatiek, Dogmatica Re-
formada, em quatro volumes, ori-
ginalmente publicados entre 1895
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
e 1901, dos quais somente o segun-
do volume foi traduzido para o
ingles como A Doutrina de Deus.
Nao existe nenhuma obra de
Bavink traduzida para o portugu-
es. Bavinck influenciou profunda-
mente muitos te6logos reforma-
dos, holandeses e norte-america-
nos, sendo Louis Berkho( o mais
conhecido no Brasit por causa da
sua Teologia Sistematica.
Para Bavinck, a teologia era
o estudo sistematico do conheci-
mento de Deus, revelado em Cris-
to e na Biblia, e resumido pela
Igreja por meio dos credos, cate-
cismos e confiss6es. Segundo ele,
a religiao, o temor de Deus, deve ser
o elemento que inspira e anima n in-
vestigar;iio teol6gica. Isso deve mar-
car a cadencin da ciencia. 0 te6logo e
uma pesson que se esforr;a pnra falar
sabre Deus. Professar a teologia eum
trnbnlho santo. E realizar umn
6
ministrar;iio sacerdotal na casa do Se-
nhor. Isso epar si mesmo um servir;o
de culto, uma consagrar;iio da mente
e do corar;iio em honra ao Seu nome.
A SOCEP - Sociedade Cris-
ta Evangelica de Publica<;:6es
Ltt:la., de forma pioneira e inedi-
ta, traz ao publico brasileiro, o
pensamento de Bavinck. A obra
Teologia Sistenuitica: Os Funda-
mentos da Fe Crista, traduzida do
ingles, Our Rensonable Faith, e uma
sintese do pensamento teo16gico
de Bavinck, apresentada de ma-
neira simples, profunda e pasto-
ral.
Agradecemos ao rev. Her-
minsten Maia Pereira da Costa
pela c6pia em ingles. A SOCEP
pelo grande investimento e valio-
sa contribui<;:ao aos continuadores
do calvinismo no Brasil.
Arival Vias Casimiro
PREFAcio AEoic;Ao EM INGLES
A
queles que estao familia-
rizados com a hist6ria das
igrejas Reformadas da
Holanda- isto e, das gereformeerde
como distintas das Hervormde
Kerken- saberao que entre os her-
deiros da Afscheiding de 1834 e a
Dolenntie de 1886 nao ha nomes
tao estimados quanto os de
Abraham Kuyper e Hermann
Bavinck. Eles foram figuras her6i-
cas de realizac;:oes gigantescas no
trabalho cristao. Suas carreiras, re-
alizadas praticamente ao mesmo
tempo, no final do seculo XIX e no
comec;:o do seculo XX devem ser
consideradas como urn favor es-
pecial de Deus em beneficia do
Cristianismo Hist6rico tanto na
Europa quanto no N<1vo Mundo.
Esses dois homens, que com
o tempo chegaram a ser mencio-
nados juntos como partidarios da
causa da Reforma na Holanda,
tern sido frequentemente compa-
7
rados e contrastados. Alguns os
diferenciam da seguinte forma:
"Em Kuyper n6s temos urn exem-
plo de genio brilhante, em
Bavinck urn exemplo de talento
mentalmente preciso e de julga-
mento esclarecido". 0 Rev. J. H.
Landwehr, primeiro bi6grafo de
Bavinck, aponta outro contraste:
Bavinck tinha urn espirito
Aristotelico, enquanto Kuyper ti-
nha urn espirito Platonico.
Bavinck era o homem do conceito
claro e preciso, enquanto Kuyper
era o homem da ideia produtiva.
Bavinck trabalhou com dados his-
t6ricos; Kuyper trabalhou espe-
culativamente por meio da intui-
c;:ao. Bavinck tinha espirito carac-
teristicamente indutivo; Kuyper
tinha mente de natureza dedu-
tiva. Esses dois homens se
complementaram no renasci-
mento da vitalidade do Calvinis-
mo na vida e no pensamento da
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
Holanda do seculo XIX.
Hermann Bavinck nasceu
em 13 de dezembro de 1854. 0
centenario de seu nascimento foi
grandemente celebrado na
Holanda em 1954, e a natureza e
o escopo de suas contribui~5es
foram revistas com grande apre-
~o. Bavinck nasceu na cidade de
Hoogeveen na provincia de
Drenthe. Seu povo veio originari-
amente do condado de Bentheim.
Seu pai, o Rev. Jan Bavinck, foi urn
ministro das igrejas que em 1834
se interessaram em manter a pura
tradi~ao do Cristianismo Hist6ri-
co separada da Igreja do Estado
da Holanda.
0 jovem Bavinck alcan~ou
distin~ao como estudante de urn
colegio em Zwolle e foi para a Es-
cola Teol6gica de sua igreja em
Kampben. Ali ele permaneceu por
apenas urn ano. Ele quis ir para
Leiden para realizar seus estudos
teol6gicos superiores. Leiden deu
a ele pelo menos duas coisas: urn
grande respeito pela erudi~ao e
uma confronta~ao, em primeira
mao, com a moderna teologia li-
beralmente afetada. Essas duas li-
~5es foram de grande importan-
cia para ele. 0 ideal de uma eru-
di~ao teologicamente s6lida para
o Cristianismo Reformado orto-
doxo permaneceu firme em sua
vida no decorrer de toda a sua car-
reira. Seu conhecimento profundo
sobre os mais novos pensamentos
religiosos serviu para aprofundar
8
suas convic~5es Calvinistas e ha-
bilitou-o a elaborar uma teologia
realisticamente voltada para os
problemas de seu tempo.
Em 1880 ele se graduou em
Leiden, tendo feito sua disserta~ao
sobre a etica de Ulrico Zwinglio.
Ele trabalhou como ministro de
uma igreja em Franeker por urn
ano, e foi entao nomeado Profes-
sor de Dogmatica na Escola Teo-
16gica de Kampben. 0 assunto de
sua aula inicial, "A Ciencia da San-
ta Divindade" (De Wetenschap der
Heilige Godgeleerdheid, 1882), fasci-
nou-o durante toda a sua vida.
Durante a decada de seus arduos
estudos e ensino eficaz em
Kampben, Bavinck tres vezes foi
convidado para lecionar teologia
na Universidade Livre de Amster-
da. Ele s6 aceitou depois do ter-
ceiro convite, e s6 depois de satis-
fazer sua consciencia (veja sua
brochura Decline or Accept [Blijven
of Heengaan], Kampben, 1902) de
que isso nao prejudicaria a inte-
gridade da educa~ao teol6gica em
sua igreja. Foi s6 quando
Abraham Kuyper trocou a pasta
de catedratico em Amsterda pela
pasta de Ministro no governo de
Hague que Bavinck tornou-se seu
sucessor em Amsterda.
Bavinck era primariamente
o te6logo, o dogmatico. Sua
magnus opus sao os quatro volu-
mes de sua Reformed Dogmatics
(Gereformeerde Dognwtiek). Essa
obra foi o fruto de seu trabalho em
PREFAcro
Kampben, surgindo primeira-
mente durante os anos 1895-1901
e, depois, em uma forma revisa-
da, em 1906-1911. Urn volume de
sua obra, A Doutrina de Deus, edi-
tado e traduzido pelo Dr. W.
Hendriksen, foi publicado em
Grand Rapids em 1951. 0 presen-
te volume, Os Fundamentos de Nos-
sa Fe, escrito em 1909 como a
Magnalia Dei (As Maravilhosas
~h·as de Deus), e um resumo de
~:_:a Dogmatica em quatro volu-
::-:'.<:?5. Os Fundamentos,de Nossa Fee
=~cc?nos tecnico, menos exclusiva-
=~1ente profissionat mais intenci-
~nalmente popular do que a
~ .-gmfr.tica, e e mais amplamente
.::.:11parado por referencias da Es-
-::'·~tura, mas e, como a obra mai-
=·:·. urn livro de dogmatica Crista
·~, Asica. Ele apresenta claramente e
2:11 fina perspectiva as doutrinas
~·,n--.damentais do ensino bfblico.
Alguns tern dito que
Bavinck foi mais urn fil6sofo do
que urn te6logo. Everdade que
sua filosofia exibe a disciplina do
treinamento e da informa<;ao de
urn fil6sofo, mas o que ele queria
ser antes de tudo era urn te6logo
Escrituristico. Ecomo Landwehr
disse: II Assim como Calvino ex-
traiu seus pensamentos da Escri-
tura, Bavinck tambem sempre se
inclinou sobre a Escritura para
extrair dela as suas ideias, e sem-
pre foi guiado pela Escritura em
sua sistematizac;:ao de seus ensi-
nos". Alem disso, em seu exerci-
9
cio teol6gico ele nao era o espec-
tador imparcial que observava
descomprometidamente a reali-
dade da religiao. Em sua aula
inaugural em Amsterda, Religiiio
e Teologia, ele disse:
Religiao, o temor de Deus,
deve ser o elemento que inspira e
anima a investigac;:ao teol6gica.
Isso deve marcar a cadencia da
ciencia. 0 te6logo e uma pessoa
que se esforc;:a para falar sobre
Deus porque ele fala fora de Deus
e por meio de Deus. Professar a
teologia e fazer urn trabalho san-
to. Erealizar uma ministrac;:ao sa-
cerdotal na casa do Senhor. Isso e
por si mesmo urn servic;:o de cui-
to, uma consagrac;:ao da mente e
do cora<;ao em honra ao Seu nome.
Foi dessa forma que Bavinck
conduziu sua carreira. Seu primei-
ro bi6grafo, Landwehr, registra
como ele agia na sala de aula: A
lic;:ao, ele diz, transformava-se em
urn sermao, pois o professor fica-
va comovido com a verdade. A
maioria de seus bi6grafos registra
as palavras por ele pronunciadas
na fase terminal da doenc;:a que o
matou: II Agora minha erudic;:ao
de nada me vale, nem minha
Dogmatica: S6 a minha fe pode
me salvar". Com essa afirma<;ao
ele nao estava depreciando toda
uma vida de esforc;:o no estudo te-
ol6gico, estava apenas indicando
a correta ordem de importancia.
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
Quando o Dr. J. C. Rullmann
submeteu seu artigo sobre
Bavinck ao Christelijke Ency-
clopaedie em 1925, ele percebeu
que dificilmente poderia explicar
a obra de Bavinck melhor do que
fazendo uma cita<;:ao do colega de
Bavinck na Universidade Livre,
Dr. W. J. Geesink. Essa cita<;:ao
tambem sera litil para n6s. Dr.
Geesink disse - ele estava, natu-
ralmente, usando o idioma holan-
des:
Como professor, Bavinck es-
taria no lugar mais elevado de
qualquer faculdade de qualquer
universidade. Sua tremenda eru-
di<;:ao e sua vasta leitura tornaram-
no ricamente expressivo na sala de
aula. Sendo urn erudito profundo
e entusiasmado, ele tinha o dom
de descobrir problemas, e quan-
do ele os descobria, ele os levava
ao conhecimento de sua audien-
cia em termos compreensiveis. Se
ele tivesse a solu<;:ao, ele tambem
a dividia com seus ouvintes, nun-
ca de forma apressada, mas pau-
sadamente e com calma. E se ele
ainda nao tivesse a solu<;:ao, sua
erudi<;:ao honesta conservava-o
distante daquilo que era ilus6rio,
e que faria com que urn problema
fosse resolvido as custas da cria-
<;:ao de outro. E com seu respeito
pela 16gica e com sua minuciosa
disciplina na escola ele sabia mui-
to bern como afastar os perigos do
irracionalismo mesmo sabendo
10
que ha problemas que nao podem
ser resolvidos.
Como te6logo e dogmatico
por profissao, Bavinck seguiu
Calvino em sua teologia Reforma-
da. Fazendo isso, e levando em
conta, apesar de nao sem critica e
reserva, sua erudi<;:ao moderna e
seu conhecimento, ele ajudou a ti-
rar a teologia Reformada do
processo de endurecimento e
fossiliza<;:ao no qual estava
inserida desde cerca de 1750... As-
sim como Agostinho, que ele co-
loca na vanguarda de todos os
pensadores antes e depois do
quarto seculo, procurou na filoso-
fia da revela<;:ao uma resposta para
os problemas da vida e do mun-
do - por uma resposta, deve ser
dito, que satisfa<;:a tanto o cora<;:ao
quanto a mente.
Bavinck escreveu urn im-
pressionante numero de obras
substanciais nas areas de religiao
e teologia, filosofia e etica pratica,
e, de forma especial, tambem
psicologia e teoria da educa<;:ao.
A bibliografia de sua obra
publicada, que inclui alem de toda
a extensao das muitas palestras
inaugurais e outras palestras aca-
demicas que ele deu, mas que nao
incluem seu movimentado traba-
lho jornalistico, ocupam cerca de
sessenta itens na tabela de
Landwehr. Na area de religiao e
teologia, as seguintes obras devem
ser mencionadas alem da
PREFAC!O
Dogmatica Reformada e Os Funda-
mentos de Nossa Fe. Em 1888 ele
lan<;ou seu eterno cLissico sobre o
ecumenismo intitulado A Cato-
licidade do Cristianismo e a Igreja.
(De Katholiciteit van Christendom en
Kerk). Em 1894 ele deu uma pales-
tra definitiva sobre urn tema pri-
meiramente delineado por
Calvino e tambem grandemente
desenvolvido por Abraham
Kuyper, chamado Grar;a Cormnn
(De Algenreene Genade). Suas boni-
tas meditac;:oes em 0 Sacrificio do
Louvor (De Offerande des Lofs, 1901)
ja estavam na sua sexagesima edi-
<;ao na epoca de sua morte e fo-
ram traduzidas para o ingles e
publicadas nos Estados Unidos
em 1922. Urn tipo de livro
devocional, A Certeza da Fe (De
Zekerheid des Geloofs), foi publica-
do no mesmo ano. Importantes
tambem sao suas palestras minis-
tradas em 1911 intituladas Moder-
nismo e Ortodoxia (Modernisme en
Orthodoxie), e seu Clzamado e Rege-
nerar;ao (Roeping en Wedergeboorte)
de 1903.
Entre seus livros mais filoso-
ficamente orientados estao as
Conferencias Stone de Princeton,
proferidas em 1908 e publicadas
em ingles no ano seguinte como
A Filosofia da Revelar;flo: Etica para
Hoje (Hedendaagsche Moraal, 1902),
e as duas palestras filos6ficas de
1904 intituladas Filosofia Cristtl
(C{nistelijke Wetenschap) e 0 Mun-
do Cristiio e a Perspectiva de Vida
11
(Christelijke Wereldbeschou-
wing). Urn tema que ocupou
Bavinck por muito tempo e ao
qual ele dedicou sua mais madu-
ra reflexao foi a interliga<;ao entre
a religiao e o ensino. Nenhuma
institui<;ao de educa<;ao Crista
ortodoxa de nivel superior pode
ignorar suas varias publica<;oes
sobre esse assunto: Religiflo e Di-
vindade (Godsdienst en Godgeleer-
dheid, 1902), Educar;flo e Teologia
(Opleiding en Theologie, 1896), 0
Oficio do Doutor ou Professor de Te-
ologia (Het Doctorenambt, 1899), A
Autoridade da Igreja eaLiberdade da
Ciencia (Het Recht der Kerken en de
Vrijheid der Wetenschap, 1899), En-
sino e Filosofia (Geleerdheid en
Wetenschap, 1899), e A Escola Teo-
l6gica e a Universidade Livre
(Theologische School en Vrije
Universiteit, 1899).
Foi durante OS ultimos anos
de sua vida profissional que
Bavinck tornou-se expressivo nas
duas mais elevadas esferas de
vida e pensamento, que sao etica
aplicada e psicologia aplicada a
moral. Aprimeira categoria de in-
teresse pertencem obras como
0 Papel da Mulher na Sociedade
Moderna (De Vrouw in de
Hedendaagsche Maatschappij, 1918),
A Familia Crista, (Het Christelijke
Huisgezim, 1908), A Irnitar;flo de
Cristo na Vida Moderna (De
Navolging van Christus in het
Modern Leven, 1918), 0 Problema da
Guerra, (Het Problem van den
- - - - - - - - - -
Fundamentos Teol6gicos da Fe Cristii
Oorlog, 1915), e Cristianismo, Guer-
ra, eaLiga das Nar;oes (Christendom,
Oorlog, Volkenbond, 1920). Esta ul-
tima obra nos mostra como
Bavinck se interessava pelos pro-
blemas do nosso seculo. Alem dis-
so, deve ser dito que ele tinha urn
fino "senso de sua propria epoca".
Isso leva em conta sua pronunci-
ada preocupac;ao com Psicologia
e os principios de educac;ao. Em
1915 ele escreveu o tratado Sabre
o Sub Consciente (Het Onbewuste),
em 1897 Os Principios de Psicologia
(Beginselen der Psycologie), e em
1920 a Psicologia Bfblica e Religiosa
(Bijbelsche en Religieuse Psycologie).
Sua maior obra sobre a teoria da
educac;ao e Principios Pedag6gicos
(Paedagogische Beginselen, 1904).
Nao e de se admirar que essa area
de estudos tenha atraido tanto sua
atenc;ao. 0 livro Filosofia Educacio-
nal de Hermann Bavinck, escrito
pelo Dr. Cornelius Jaarsma
(Grand Rapids, 1935) eo livro De
Paedagogiek van Bavinck, escrito
pelo Dr. L. Van der Zweep
(Kampben, sem data) falam sobre
lSSO.
Hermann Bavinck visitou a
America duas vezes; a primeira
em 1892, quando foi convidado
pela Alianc;a das Igrejas Reforma-
das que adotam o Sistema
Presbiteriano, para ministrar uma
palestra em Toronto sobre o tema:
"A Influencia da Reforma Protes-
tante nas Condic;6es Morais e re-
ligiosas das Pessoas e Nac;oes"; e
12
a segunda foi em 1908, quando ele
demonstrou atraves de suas Con-
ferencias Stone de Princeton que
merecia ser considerado com
Kuyper, Warfield, Hodge, e Orr
como urn destacado te6logo
Calvinista moderno. Na vida po-
litica pratica ele era menos ativo
do que Kuyper, sendo mais incli-
nado afilosofia politica do que a
politica. Ele era, contudo, urn
membro da Casa Alta, represen-
tando o sul da Holanda nos Esta-
dos Gerais desde o anode 1911 em
diante. Seus melhores servic;os
nesta area de atuac;ao foram da-
dos como consultor e conselheiro
na area da educac;ao. A traduc;ao
das suas obras para o ingles tern
sido intermitente e dispersa. Des-
sa forma, desde muito tempo, ape-
nas 0 Sacrificio do Louvor, 0 Reina
de Deus, A Filosofia da Revelar;ao eo
pequeno tratado Evolur;ao estao
disponiveis em lingua inglesa. Os
Fundamentos de Nossa Fe e, por
isso, urn importante incremento.
Ai esta tambem uma biografia nao
definitiva. Tres precursores ja es-
creveram sobre isso. 0 primeiro
foi J. H. Landwehr com seu In
Memoriam, de 1921.0 segundo foi
o Dr. V. Hepp como seu Hermann
Bavinck, escrito tambem em 1921-
o prometido segundo volume que
da sequencia ao primeiro nunca
foi escrito. 0 terceiro foi A. B. W.
Kok, com seu Hermann Bavinck, de
1945. Uma boa quantidade de es-
tudos peri6dicos holandeses tern
PREFAcro
analisado as ideias de Bavinck.
Neste pais [USA] n6s temos, alem
do livro do Dr. Jaarma, a nao
publicada disserta<;ao de doutora-
do em Princeton, do Dr. Anthony
Hoekema da doutrina de Bavinck
sobre o Facto.
Podemos dizer que no con-
junto de sua apologia pelo Cristi-
anismo Escrituristico Reformado
Bavinck tinha quatro influencias
opostas em mente, sendo duas
delas de fora e duas delas de den-
tro da entao palida fe Reformada.
As duas influencias externas eram
o moderno liberalismo religioso e
o Catolicismo Romano. As duas
influencias internas eram uma or-
todoxia formal moribunda por
urn lado e o pietismo vazio de
outro. Ele falou com frequencia e
eloquencia contra todas essas for-
<;as. Observe, por exemplo, o sen-
timento e a perspectiva com que
ele defendeu o envolvimento do
mundo por urn Calvinismo uni-
versal, em vez de uma fuga do
mundo por urn pietismo sectario:
N6s nao podemos ser uma
seita. N6s nao podemos querer ser
uma seita e nao podemos ser uma,
a nao ser que neguemos o carater
absoluto da verdade. Alem disso,
0 reino dos ceus nao e deste mun-
do, mas exige que tudo neste
mundo o sirva. Eexclusivo e ciu-
mento, e se satisfaz quando nao ha
urn reino independente ou neutro
encostado nele. Naturalmente se-
15
ria muito mais facil abandonar
essa era aos seus pr6prios cami-
nhos, e procurar nossa for<;a ern
urn sossegado retiro. Todavia,
nem semelhante descanso nos e
permitido aqui. Porque toda cria-
tura e boa, e nada deve ser recu-
sado se for recebido com a<;6es de
gra<;:as, pois todas as coisas sao
santificadas pela Palavra de Deus
e ora<;:ao; portanto, a rejei<;:ao de
qualquer criatura e ingratidao
para com Deus, urn julgamento
errado ou uma deprecia<;:ao de
suas ben<;:aos e de suas dadivas.
Nossa guerra deve ser conduzida
somente contra o pecado. Ne-
nhum problema que dificulte os
relacionamentos entre os crentes
em Cristo deve existir. Nenhum
problema ou dificuldade virtual-
mente sem solu<;:ao, seja de ordem
social, polltica, e especialmente de
ordern cientlfica, devern existir,
nas quais nossa desconfian<;:a e fra-
queza se apoiem orgulhosamente
para tirar-nos da luta, talvez ate
mesmo sob a alega<;:ao de rnotiva-
<;:ao Crista, ou rejeitando a cultura
de nosso tempo como demoniaca.
Essa e uma das notas que
Bavinck gostava de entoar em de-
fesa da fe. Ele ensinava isso em sua
palestra intitulada A Catolicidade
do Cristianismo e a Igreja. Essa e
uma afirma<;:ao representativa. "A
fe", ele dizia, "tern a prornessa de
vit6ria sobre o mundo". 0 Dr.
Hepp muito apropriadamente es-
Fu11dame11tos Teol6gicos da Fe Cristii
creveu como conclusao da biogra-
fia de Bavinck, as seguintes pala-
vras:
0 que outrora foi dito sobre
Calvino serve tarnbern para ele: A
posteridade "nao pode encontrar
rnelhor forma de honrar seu pio-
14
neiro e rnestre do que confessar
corn o cora~ao e corn os Llbios:
Dele, por Ele e para Ele sao todas
as coisas. A Ele, pois, seja a gloria
para sernpre".
Agosto de 1955.
Henry Zylstra
~
INDICE
Prefacio aTradw;ao Brasileira ................................................................ 05
Prefacio aEdi<;:ao em Ingles ..................................................................... 07
1. 0 Maior Bern do Homem ................................................................. 17
2. 0 Conhecimento de Deus ................................................................ 25
3. A Revelac;:ao Geral ............................................................................. 33
4. 0 Valor da Revelac;:ao Geral ............................................................ 47
5. A Questao da Revelac;:ao Especial ................................................... 65
6. 0 Conteudo da Revela<;:ao Especial ................................................ 79
7. As Sagradas Escrituras ................................................................... 103
8. A Escritura e a Confissao .............................................................. 127
9. 0 Ser de Deus .................................................................................. 139
10. A Divina Trindade .......................................................................... 155
11. A Criac;:ao e a Providencia .............................................................. 175
12. A Origem, a Essencia eo Prop6sito do Homem ......................... 199
13. 0 Pecado e a Marte ......................................................................... 243
14. 0 Pacta da Grac;:a ............................................................................. 287
15. 0 Mediador da Alianc;:a .................................................................. 309
16. A Natureza Divina e a Natureza Humana de Cristo ................. 339
17. A Obra de Cristo em Sua Humilha<;:ao ......................................... 363
18. A Obra de Cristo em Sua Exaltac;:ao ............................................. 391
19. 0 Dom do Espirito Santo ............................................................... 423
20. A Vocac;:ao Crista ............................................................................. 443
21. A Justificac;:ao ................................................................................... 483
22. A Santificac;:ao .................................................................................. 515
23. A Igreja de Cristo ............................................................................ 563
24. A Vida Eterna .................................................................................. 597
15
CAPITULO
1l
0 MAIOR BEM oo HoMEM
D
eus, e somente Deus, eo
maior bern do homem.
Em um sentido geral po-
demos dizer que Deus e o maior
bern de todas as Suas criaturas,
pois Deus e o Criador e o
Sustentador de todas as coisas, a
fonte de todo o sere de toda a vida
e a fonte inesgotavel da qual flui
tudo o que e born. Todas as cria-
turas devem sua existencia so-
mente aquele que e o Ser unico,
eterno e onipresente.
Mas a ideia do mais eleva-
do bern, geralmente inclui o pen-
samento de que este bern e reco-
nhecido e desfrutado como tal
pelas pr6prias criaturas. Eclaro
que esse nao e o caso das criatu-
ras inanimadas e nao racionais. As
criaturas inanimadas possuem
apenas o ser, mas nao possuem o
principio da vida. Outras criatu-
ras, tais como as plantas, possu-
em o principio da vida, mas sao
17
desprovidas de consciencia. Os
animais, e verdade, possuem,
alem de sua existencia e de sua
vida, um certo tipo de conscien-
cia, mas essa consciencia alcan<;:a
apenas aquilo que pode ser visto
ou sentido ao seu redor. Eles sao
conscientes das coisas terrenas,
mas nao das celestiais; eles tern
consciencia da realidade, do pra-
zer e da utilidade, mas nao pos-
suem qualquer no<;:ao de verdade,
bondade e beleza; eles possuem
consciencia sensorial e desejo sen-
sorial e, portanto, satisfazem-se
com o que e sensorial e nao po-
dem penetrar atraves da ordem
espiritual.
0 caso do homem e diferen-
te. Ele e a criatura que, inicialmen-
te, foi criada a imagem e seme-
lhan<;:a de Deus, e essa origem di-
vina e essa marca divina nenhum
erro pode destruir. Contudo ele
perdeu, por causa do pecado, os
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
gloriosos atributos de conheci-
mento, justi<;a e santidade que es-
tavam contidos na imagem de
Deus. Todavia, esses atributos
ainda estao presentes em "peque-
nas reservas" remanescentes da
sua cria<;ao; essas reservas sao su-
ficientes nao somente para torna-
lo culpado, mas tambem para dar
testemunho de sua primeira gran-
deza e lembra-lo continuamente
de seu chamado divino e de seu
destino celestial.
Em todos os seus pensamen-
tos e em todas as suas obras, em
toda a vida e atividade do ho-
mem, fica claro que ele euma cri-
atura que nao pode ser plenamen-
te satisfeita com o que o mundo
fisico tern para oferecer. De fato
ele eurn cidadao de uma ordem
fisica, mas ele tambem se ergue
acima dessa ordem para uma or-
dem sobrenatural. Com seus pes
firmemente plantados no chao ele
levanta sua cabe<;a e lan<;a seu
olhar para cima. Ele tern conheci-
mento de coisas que sao visiveis
e temporais, mas tambem tern
consciencia de coisas que sao in-
visiveis e eternas. Seu desejo vai
alem do que eterreno, sensorial e
transit6rio e alcan<;a tambem os
bens celestiais, espirituais e eter-
nos.
0 homem compartilha sua
consciencia sensorial com os ani-
mais, mas alem dessas qualida-
des ele foi dotado de entendimen-
to e razao, que o tornam capaz de
18
pensar e levantar-se acima do
mundo de imagens sensoriais
para urn mundo de pensamentos
incorp6reos e para urn reino de
ideias eternas. 0 pensamento e o
conhecimento do homem, apesar
de serem extraidos de seu cerebra,
sao todavia em sua essencia uma
atividade inteiramente espiritual,
pois transcendem aquilo que ele
pode ver e tocar. Atraves do pen-
samento ele estabelece uma cone-
xao com urn mundo que ele nao
pode ver nem tocar, mas que e
real e que possui mais realidades
essenciais do que a corporalidade
desta terra. 0 que ele realmente
esta procurando nao euma reali-
dade tangivel, mas a verdade es-
piritual, a verdade que eunica,
eterna e imperecivel. Seu enten-
dimento s6 pode encontrar des-
canso na absoluta verdade Divi-
na.
Como dissemos, o homem
compartilha seu desejo sensorial
com os animais. Consequente-
mente, ele sente necessidade de
comida e bebida, luz e ar, traba-
lho e descanso, e ecompletamen-
te dependente da terra para sua
existencia fisica. Porem, acima
desse nivel de desejos ele possui
a vontade, que, dirigida pela sua
razao e pela sua consciencia, pro-
cura por bens maiores e mais ele-
vados. 0 prazer e a utilidade, ape-
sar de terem seu valor e seu lugar
em seu tempo, nao podem
satisfaze-lo totalmente; ele quer e
0 MAJOR BEM oo HoMEM
procura urn bern que nao se torna
born por causa das circunstanci-
as, mas que e born em e atraves
de si e para si mesmo, urn bern
imuhivet espiritual e eterno. E
novamente essa vontade s6 pode
encontrar descanso nas ben<;aos
absolutas e elevadas de Deus.
Tanto a razao quanto a von-
tade possuem, de acordo com o
ensino das Sagradas Escrituras,
sua raiz no cora<;ao do homem.
Com rela<;ao ao cora<;ao o autor de
Proverbios diz que deve ser guar-
dado com toda a diligencia, pois
dele procedem as saidas da vida
(Pv 4.23). Assim como o cora<;ao
no sentido fisico e 0 ponto de ori-
gem e de for<;a propulsora da cir-
cula<;ao do sangue, assim tam-
bern, espiritual e eticamente ele e
a fonte da mais elevada vida do
homem, a sede de sua auto cons-
ciencia, de seu relacionamento
com Deus, de sua subserviencia
aSua lei, enfim, de toda a sua na-
tureza morale espiritual. Portan-
to, toda a sua vida racional e
volitiva tern seu ponto de origem
no cora<;ao e e governada por ele.
Agora n6s veremos, em
Eclesiastes 3.11, que Deus colo-
cou o mundo no cora<;ao do ho-
mem1. Deus fez tudo formoso a
seu tempo, e fez tudo acontecer
no seu exato momento, no mo-
mento que Ele tinha fixado para
que acontecesse. Essa hist6ria no
seu conjunto ou em suas partes se
refere ao conselho de Deus e re-
vela a gloria desse conselho. E
Deus colocou o homem no meio
deste mundo e colocou a eterni-
dade no seu cora<;ao, de forma
que ele nao encontrasse descanso
nas manifesta<;oes visiveis e exter-
nas, mas que procurasse conhecer
os pensamentos eternos de Deus
no curso temporal da natureza e
da hist6ria.
Esse desideriunr aeternitatis,
essa ansia por uma ordem eterna,
que Deus plantou no cora<;ao do
homem, no mais intimo esconde-
rijo do seu ser, no centro de sua
personalidade, e a causa do fato
indiscutivel de que nem mesmo
tudo que pertence aordem tem-
poral pode satisfazer o homem.
Ele e urn ser sensoriat terreno, li-
mitado e mortal, mas ainda e atra-
ido para a eternidade e destina-
do a ela. Nao ha proveito para o
homem que possui uma boa es-
posa, filhos, casas e campos, te-
souros e propriedades, ou mesmo
o mundo todo, se perder a sua
alma (Mt 16.26). Nem mesmo o
mundo todo pode ter o mesmo
valor de urn homem. Ninguem e
tao rico que possa por qualquer
meio redimir a alma de seu ir-
mao, nem dar a Deus uma razao
para que fa<;a isso; a reden<;ao
da alma e preciosa demais para
que seja alcan<;ada por qualquer
7
A edi9ao de Almeida diz que Deus colocou nctemidade 110 cora9ao do lwmem (N doT).
19
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
criatura (Sl49.7-9).
* * * * *
Como geralmente acontece,
muitas pessoas estao plenamen-
te dispostas a admitir isso logo
que os prazeres sensoriais e os
tesouros terrenos sao citados. Elas
prontamente reconhecem que es-
sas coisas nao podem satisfazer o
homem e nao correspondem ao
seu destino elevado. Mas seu jul-
gamento e mudado logo que OS
assim chamados valores ideais -
ciencia, arte, cultura, o exercicio
da fidelidade, a bondade, a bele-
za, a dedicac;ao da vida em favor
do proximo, e o desejo de servir
ahumanidade- sao colocados em
cena. Porem, todas essas coisas
tambem pertencem ao mundo do
qual as Escrituras dizem que e
passageiro (1 Jo 2.17).
A ciencia, o conhecimento, e
o aprendizado certamente sao
boas dadivas, que descem do Pai
das Luzes, e portanto devem ser
levadas em alta estima.
Quando Paulo chama a sa-
bedoria do mundo de loucura di-
ante de Deus (1 Co 3.19), e quan-
do ele em outro lugar nos adver-
te contra a filosofia (Cl 2.8), ele
tern em mente a falsa e inutil su-
posta sabedoria que nao reconhe-
ce a sabedoria de Deus em sua
revelac;ao geral e em sua revela-
c;ao especial (1 Co 1.21) e que se
tornou nula em seus pr6prios ra-
20
ciocinios (Rm 1.21). Mas no restan-
te, Paulo e as Sagradas Escrituras,
em sua totalidade, colocam o co-
nhecimento e a sabedoria em urn
plano de grande importancia. E
nao poderia ser de outra forma,
pois a Biblia afirma que Deus e
sabio, que Ele tern conhecimento
perfeito de Si mesmo e de todas
as coisas, que pela Sua sabedoria
Ele estabeleceu o mundo, que Ele
manifesta a Sua multiforme sabe-
doria a Igreja, que em Cristo es-
tao escondidos todos os tesouros
da sabedoria e do conhecimento,
e que o Espirito e o Espirito da
sabedoria e do conhecimento, que
perscruta ate mesmo as
profundezas de Deus (Pv 3.19; Rm
11.33; 1 Co 2.10; Ef3.10; Cl2.3). Urn
livro do qual procedem mensa-
gens como essas nao pode subes-
timar o conhecimento nem pode
desprezar a filosofia. Pelo contra-
rio, nele aprendemos que a sabe-
doria e mais preciosa do que pe-
rolas, e tudo o que podemos de-
sejar nao pode ser comparado a
ela (Pv 3.15); ela e urn dom daque-
le que e o Deus do conhecimento
(Pv 2.6; 1 Sm 2.3).
0 que a Escritura exige e urn
conhecimento cuja origem seja o
temor do Senhor (Pv 1.7). Quan-
do essa conexao com o temor de
Deus erompida, o nome de co-
nhecimento e mantido, embora
sob falsas pretensoes, mas ele vai
se degenerando gradualmente
ate se transformar em uma sabe-
0 MAJOR BEM DO HOMEM
doria mundana, que e loucura
diante de Deus. Qualquer ciencia,
filosofia ou conhecimento que
pense poder se manter sobre suas
proprias pressuposic;:oes e que
pode tirar Deus de considerac;:ao,
transforma-se em seu proprio
oposto, e qualquer pessoa que
construa suas expectativas sobre
isso ficara desiludida.
Isso e facil de ser entendido.
Em primeiro lugar, a ciencia e a
filosofia sempre possuem urn ca-
rater especial e podem tornar-se
acessiveis a poucas pessoas. Es-
sas pessoas privilegiadas, que
podem dedicar toda a sua vida a
disciplina do aprendizado, po-
dem conhecer apenas uma peque-
na parte do todo, permanecendo,
assim, estranhos ao restante.
Qualquer que seja a satisfac;:ao
que o conhecimento possa dar,
todavia, ele nunca podera, devi-
do ao seu carater especial e limi-
tado, satisfazer as necessidades
profundas que foram plantadas
na natureza humana na criac;:ao, e
que estao presentes em todas as
pessoas.
Em segundo lugar, a filoso-
fia, que depois de urn periodo de
decadencia entra em periodo de
fortalecimento, sempre cria uma
expectativa extraordinaria e exa-
gerada. Nessas epocas ela vive a
esperanc;:a de que atraves de uma
seria investigac;:ao ela resolvera o
enigma do mundo. Mas sempre
depois dessa fervente expectativa
21
chega a velha desilusao. Em vez
de diminuir, os problemas au-
mentam com os estudos. 0 que
parece estar resolvido vern a ser
urn novo misterio, eo fim de todo
o conhecimento e entao novamen-
te a triste e as vezes desespera-
dora confissao de que o homem
caminha sobre a terra em meio a
enigmas, e que a vida e o destino
sao urn misterio.
Em terceiro lugar, e born
lembrar que tanto a filosofia
quanto a ciencia, mesmo que pu-
dessem chegar muito mais longe
do que chegam agora, ainda as-
sim nao poderiam satisfazer o co-
rac;ao do homem, pois o conheci-
mento sem a virtude, sem a base
moral, torna-se urn instrumento
nas maos do pecado para conce-
ber e executar grandes males, e
assim a cabec;:a que esta cheia de
conhecimento passa a trabalhar
para urn corac;:ao depravado. Nes-
se sentido o apostolo escreve:
Ainda que eu tenha o dom de pro-
fetizar e conhec;:a todos os miste-
rios e toda a ciencia; e ainda que
eu tenha tamanha fe a ponto de
transportar montes, se nao tiver
amor, nada serei (1 Co 13.2).
0 mesmo e verdade com re-
lac;:ao a arte. A arte tambern e urn
dom de Deus. Como o Senhor nao
e apenas verdade e santidade, mas
tambern gloria e expande a bele-
za de Seu nome sobre todas as
Suas obras, entao e Ele, tambem,
que, pelo Seu Espirito, equipa os
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
artistas com sabedoria e entendi-
mento e conhecimento em todo
tipo de trabalhos manuais (Ex
31.3; 35.31). A arte e, portanto, em
primeiro lugar, uma evidencia da
habilidade humana para criar.
Essa habilidade e de carater espi-
ritual, e da expressao aos seus
profundos anseios, aos seus altos
ideais, ao seu insaciavel anseio
pela harmonia. Alem disso, a arte
em todas as suas obras e formas
projeta urn mundo ideal diante
de nos, no qual as discordias de
nossa existencia na terra sao subs-
tituidas por uma gratificante har-
monia. Desta forma a beleza reve-
la o que neste mundo caido tern
sido obscurecido asabedoria mas
esta descoberto aos olhos do ar-
tista. E por pintar diante de nos
urn quadro de uma outra e mais
elevada realidade, a arte e urn
conforto para nossa vida, levanta
nossa alma da consterna<;:ao e en-
che nosso cora<;:ao de esperan<;:a e
alegria.
Mas apesar de tudo o que a
arte pode realizar, e apenas na
imagina<;:ao que nos podemos
desfrutar da beleza que ela reve-
la. A arte nao pode fechar o abis-
mo que existe entre o ideal e o
real. Ela nao pode transformar o
alem de sua visao no aqui de nos-
so mundo presente. Ela nos mos-
tra a gloria de Canaa adistancia,
mas nao nos introduz nesse pais
nem nos faz cidadaos dele. A arte
e muito, mas nao e tudo. Ela nao
22
e, como urn homem distinto uma
vez a chamou, a coisa mais nobre
e mais santa, a (mica religiao e a
unica salva<;:ao do homem. A arte
nao pode perdoar pecados. Ela
nao pode nos limpar de nossa
sujeira. E ela nao e capaz de en-
xugar nossas lagrimas nos fracas-
sos da vida.
Quanta a cultura, civiliza-
<;ao, humanitarismo, vida social,
ou seja la como voce quiser cha-
mar/ tambem nao e 0 mais eleva-
do bern do homem. Sem duvida
nos podemos falar de urn tipo de
progresso nas ideias humanitari-
as, e de urn desenvolvimento da
filantropia. Quando nos compara-
mos como o pobre e o doente, o
miseravel eo indigente, as viuvas
e os orfaos, os loucos e os prisio-
neiros eram freqiientemente trata-
dos em tempos anteriores e como
eles sao tratados agora, nos certa-
mente temos motivo de alegria e
de gratidao. Urn espirito de afeto
e de misericordia tern vindo sa-
bre aqueles que procuram os per-
didos e demonstram compaixao
pelos oprimidos. Mas, ao mesmo
tempo em que isso acontece nos
presenciamos uma tao medonha
suntuosidade de horriveis vicios,
de mamonismo, de prostitui<;ao,
alcoolismo e abomina<;6es seme-
lhantes, que somas constrangidos
a perguntar se estamos nos mo-
vendo para frente ou para tras.
Em urn momenta n6s somas oti-
mistas, mas no momenta seguin-
0 MAIOR BEM oo HoMEM
te somos mergulhados novamen-
te em urn pessimismo profunda.
Seja como for, uma coisa e
certa: Se a vida de servi<;o ahu-
manidade e de amor ao proximo
nao for baseada na lei de Deus, ela
perde sua for<;a e seu carater.
Alem disso, o amor ao proximo
nao e uma especie de auto peni-
tencia que surge espontilnea e na-
turalmente do cora<;ao humano. E
urn sentimento, ou melhor, e uma
a<;ao, e urn servi<;o que requer
uma tremenda for<;a de vontade e
que deve ser sempre sustentado
contra as imensas fon;as da preo-
cupa<;ao por si mesmo e da busca
dos proprios interesses. Alem dis-
so, o amor ao proximo frequen-
temente encontra pouco suporte
no proximo. As pessoas geral-
mente nao sao tao amaveis a pon-
to de nos podermos, naturalmen-
te, sem esfor<;o e luta, aprecia-las
e ama-las como amamos a nos
mesmos. Alem disso, o amor ao
proximo so pode ser sustentado
se, por urn lado, ele e baseado na
lei de Deus e, por outro lado, se
Deus nos concede o desejo de vi-
ver honradamente de acordo com
seus mandamentos.
* * * * *
A conclusao, portanto, e
aquela de Agostinho, que disse
que o cora<;ao do homem foi cria-
do por Deus e que por isso ele nao
pode encontrar descanso a nao ser
23
no corac;ao de Deus. Sendo assim,
todos os homens estao procuran-
do por Deus, mas eles nao o pro-
curam da forma certa nem no lu-
gar certo. Eles procuram aqui
embaixo, mas Ele esta la em cima.
Eles o procuram na terra, mas Ele
esta no ceu. Eles o procuram lon-
ge, mas Ele esta perto. Eles o pro-
curam no dinheiro, na proprieda-
de, na fama, no poder e na paixao;
e Ele esta no alto e santo lugar, e
tambem como contrito eo abati-
do de espirito (Is 57.15). Mas eles
o procuram como se, tateando,
pudessem encontra-lo (At 17.27).
Eles o procuram e ao mesmo tern-
po fogem dele. Eles nao se inte-
ressam em conhecer os seus cami-
nhos, e nao podem faze-lo sem
Ele. Eles se sentem atraidos a
Deus e ao mesmo tempo repeli-
dos por Ele.
Nisso, como Pascal profun-
damente observou, consiste a
grandeza e a miseria humana. Ele
anseia pela verdade e e falso por
natureza. Ele anseia por descan-
so e se lanc;a de uma diversao
para outra. Ele suspira por uma
felicidade permanente e eterna e
se agarra a prazeres momentane-
os. Ele procura por Deus e se per-
dena criatura. Ele e urn filho nas-
cido em casa e come as bolotas
dos porcos em terra estranha. Ele
abandonou a fonte de aguas vivas
e cavou cisternas rotas, que nao
retem as aguas (Jr 2.13). Ele e urn
faminto que sonha que esta co-
Fundamenfos Teol6gicos da Fe Crista
mendo e quando acorda descobre
que sua alma esta vazia; e e como
urn homem sedento que sonha
que esta bebendo, e quando acor-
da descobre que esta fraco e que
sua alma esta desfalecida (Is 29.8).
A ciencia nao pode explicar
essa contradi<;ao no homem. Ela
reconhece apenas sua grandeza e
nao sua miseria, ou apenas sua
miseria e nao sua grandeza. Ela o
eleva a grandes alturas ou o aper-
- - - - - - -
24
ta em urn abismo, pois ela nao co-
nhece a origem divina do homem
nem sua queda. Mas as Escritu-
ras conhecem tanto urn quanto o
outro, e lan<;am sua luz sobre o
homem e sobre a ra<;a humana; e
as contradi<;6es sao desfeitas, a
nevoa se esvai e as coisas ocultas
sao reveladas. 0 homem e urn
enigma cuja solu<;ao s6 pode ser
encontrada em Deus.
CAPITULO
~
0 CONHECIMENTO DE DEUS
D
eus e 0 mais elevado bern
do homem - esse e 0 tes-
temunho de toda a Escri-
tura.
A Biblia come<;:a dizendo que
Deus criou o homem asua propria
imagem e semelhan<;:a para fazer
com que ele soubesse que Deus e
o seu Criador eo amasse de todo
o seu cora<;:ao e vivesse com Ele em
eterna bem-aventuran<;a. E a Bi-
blia termina com a descri<;:ao da
nova Jerusalem, cujos habitantes
verao Deus face a face e terao Seu
nome escrito em sua testa.
Entre esses dois momentos
repousa a revela<;ao de Deus em
todo o seu comprimento e ampli-
tude. 0 conteudo dessa revela<;:ao
e a grande e {mica promessa
abrangente do pacto da Gra<;:a: Eu
serei o vosso Deus e v6s sereis
meu povo. E no centro e no ponto
mais elevado dessa revela<;:ao esta
o Emanuet o Deus Conosco. A
i
25
promessa e o seu cumprimento
caminham de maos dadas. A Pa-
lavra de Deus eo come<;:o, o prin-
cipio, a semente, e eo ato no qual
a semente alcan<;:a sua plena reali-
za<;:ao. Assim como no come<;:o,
Deus criou todas as coisas pela
Sua palavra, assim tambem pela
Sua palavra Ele criara, no curso
das eras, novos ceus e nova terra,
na qual o tabernaculo de Deus es-
tara entre os homens.
Epor isso que de Cristo, que
e a Palavra que se fez carne, diz-
se que echeio de Gra<;:a e de ver-
dade (Jo 1.14).
Ele ea Palavra que no come-
<;:o estava com Deus e Ele mesmo
era Deus, e como tal Ele era a vida
e a luz dos homens, pois o Pai
compartilha Sua vida com Cristo
e da expressao ao Seu pensamen-
to em Cristo, portanto a plenitu-
de do ser de Deus erevelada nEle.
Ele nao apenas nos apresenta o Pai
Fzmdamentos Teol6gicos da Fe Crista
e nos revela Seu nome, mas Ele
nos mostra o Pai em Si mesmo e
nos da o Pai. Cristo e a expressao
de Deus e a dadiva de Deus. Ele e
Deus revelando a Si mesmo e
Deus compartilhando a Si mesmo,
e portanto Ele e cheio de verdade
e tambem cheio de Gra<;:a. A pala-
vra da promessa, "Eu serei o vos-
so Deus", que estava incluida des-
de o momenta em que foi proferi-
da, estara em vigor ate o seu cum-
primento. Deus se da a Si mesmo
ao Seu povo para fazer com que o
Seu povo se entregue a Ele.
Nas Escrituras n6s encontra-
mos Deus constantemente repe-
tindo esta declara<;:ao: Eu sou o teu
Deus. Desde a promessa-mae em
Genesis 3.15 em diante, esse rico
testemunho, abrangendo todas as
ben<;:aos e a salva<;:ao, e repetido
varias vezes, seja na vida dos pa-
triarcas, seja na hist6ria do povo
de Israel, ou na Igreja do Novo
Testamento. E em resposta a essa
declara<;:ao a igreja vern usando
uma variedade sem fim de expres-
soes de fe, dizendo em gratidao e
louvor: //Tu es o nosso Deus, en6s
somos o Teu povo e ovelhas do
Teu pastoreio//.
Essa declara<;:ao de fe por
parte da igreja nao e uma doutri-
na cientifica/ nem uma cerimonia
de unidade que esta sendo repeti-
da, mas a confissao de uma reali-
dade sentida profundamente e de
uma convic<;:ao da realidade que
tern sido experimentada na vida.
26
Os profetas, os ap6stolos e os san-
tos que aparecem diante de nos no
Velho e no Novo Testamento e
posteriormente, na Igreja de Cris-
to, nao se sentaram e filosofaram
sobre Cristo em conceitos abstra-
tos, mas disseram o que Deus sig-
nifica para eles e que eles depen-
dem de Deus em todas as circuns-
tancias da vida. Deus nao era para
eles urn conceito frio, que eles pu-
dessem analisar racionalmente,
mas era a vida, for<;:a pessoal, uma
realidade infinitamente mais real
do que o mundo que os cercava.
Eles levavam em conta em suas
vidas, eles moravam em Sua ten-
cia, andavam como se estivessem
sempre diante de Sua face, servi-
am-no em Sua corte, e cultuavam-
no em Seu santuario.
A genuinidade e profundi-
dade de sua experiencia se expres-
sam na linguagem que eles usa-
ram para explicar o que Deus sig-
nificava para eles. Eles nao tinham
que se esfor<;:ar para encontrar
palavras/ pois os seus labios fala-
vam daquilo de que seu cora<;:ao
estava cheio, eo mundo e a natu-
reza forneceram-lhes figuras de
linguagem. Deus era para eles o
Rei, o Senhor, o Valente, o Cabe-
<;:a, o Pastor, o Salvador, o Reden-
tor, o Ajudador, o Medico, o Ho-
mem eo Pai. Toda a sua felicida-
de e bern estar, sua verdade e jus-
ti<;:a, sua vida e piedade, sua for<;:a
e poder, sua paz e seu descanso
eles encontraram em Deus. Para
0 CoNHECIMENTo DE DEus
eles Deus era o sole escudo, o pro-
tetor, a luz e o fogo, a cascata e a
nascente, a rocha eo abrigo, ore-
ft:igio e a torre, o premio e a som-
bra, a cidade eo templo. Todos os
be11S que o mundo tern para ofe-
recer eram considerados por eles
como a imagem e semelhanc;:a das
plenitudes insondaveis da salva-
c;:ao, disponiveis em Deus, para o
Seu povo. Foi por isso que Davi
no Salmo 16.2 disse a Jeova o se-
guinte: "Tu es o meu Senhor; ou-
tro bern nao possuo, senao a ti so-
mente1'. Da mesma forma Asafe
tambem cantou no Salmo 73:
"Quem mais tenho eu no ceu? Nao
ha outro em quem eu me
compraza na terra. Ainda que a
minha carne e o meu corac;:ao des-
falec;:am, Deus e a fortaleza do meu
corac;:ao e a minha heranc;:a para
sempre". 0 santo, coberto com
todas essas benc;:aos, seria nulo e
sem valor se nao tivesse Deus; e
quando vive em comunhao com
Deus ele nao se preocupa com o
que e terreno, pois o amor de Deus
supera todos os outros bens.
Tale a experiencia dos filhos
de Deus. Eles tiveram essa expe-
riencia porque Deus se apresentou
a eles, para alegria deles, na pes-
soa do Filho de Seu amor. Nesse
sentido Cristo disse que a vida
eterna, isto e, a totalidade da sal-
'ac;:ao, consiste no conhecimento
do unico e verdadeiro Deus e em
Jesus Cristo, que foi enviado por
Deus.
27
Cristo disse essas palavras
em urn momento propicio. Ele es-
tava atravessando o ribeiro
Cedrom para entrar no jardim do
Getsemani e travar ali a ultima
batalha. Todavia, antes de chegar
ao Getsemani, Ele se prepara
como nosso Sumo Sacerdote para
Sua paixao e morte e ora ao Pai
para que o Pai o glorifique em Seu
sofrimento para que depois o Fi-
lho glorifique o Pai ao entregar
todas as benc;:aos que Ele alcanc;:a-
ria pela Sua obediencia ate a mor-
te. E quando o Filho ora desta for-
ma, Ele nada deseja alem de fazer
a vontade do Pai. 0 Pai lhe deu
poder sobre toda a carne para que
o Filho pudesse dar a vida eterna
a todos aqueles que o Pai lhe dera.
Essa vida eterna consiste em co-
nhecer o unico e verdadeiro Deus
e Jesus Cristo, que foi enviado
para revela-lo (Jo 17.3).
* * * * *
0 conhecimento do qual Je-
sus fala aqui tern seu proprio ca-
niter peculiar. Ele e diferente de
qualquer outro conhecimento que
possa ser obtido, e essa diferenc;:a
nao e de grau, mas de principio e
de essencia. Essa diferenc;:a surge,
de forma clara, quando n6s come-
c;:amos a comparar os dois tipos de
conhecimento. 0 conhecimento
de Deus do qual Jesus falou, dife-
re do conhecimento das coisas cri-
adas com relac;:ao a sua ongem,
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
seu objeto, sua essencia e seus efei-
tos.
Ele difere, antes de mais
nada, em sua origem, pois ele e
completamente devido a Cristo.
De certa forma podemos dizer que
obtemos todo o outro conheci-
mento pela razao, pelo discerni-
mento e julgamento e pelo nosso
proprio esfor<;o e estudo. Mas
para obter esse conhecimento do
unico e verdadeiro Deus, nos,
como crian<;as, devemos esperar
que Cristo no-lo de. Esse conheci-
mento nao eencontrado fora de
Cristo, nem em escolas ou em fi-
losofos destacados. So Cristo co-
nhece o Pai. Ele estava com Deus
no inicio, descansou em Seu peito
e viu-o face a face. Ele mesmo era
Deus, o brilho da gloria de Deus e
a imagem expressa de Sua pessoa,
o proprio Filho amado e unigenito
do Pai, em quem o Pai tinha pra-
zer (Mt 3.17; Jo 1.14; Hb 1.3). Nada
no ser do Pai esta escondido para
o Filho, pois o Filho compartilha
da mesma natureza, dos mesmos
atributos e do mesmo conheci-
mento que o Pai. Ninguem conhe-
ce o Pai senao o Filho (Mt 11.27).
Esse Filho veio ate nos ere-
velou-nos o Pai. Ele revelou o
nome de Seu Pai aos homens. Foi
para isso que Ele se fez carne e
habitou na terra: para nos dar o
conhecimento do que e verdadei-
ro (1Jo 5.20). N6s nao conheciamos
Deus, nem tinhamos interesse em
conhecer os Seus caminhos, mas
28
Cristo motivou-nos a conhecer o
Pai. Ele nao era urn filosofo, nem
urn erudito, nem urn artista. Sua
obra era revelar-nos o nome do
Pai. Ele o fez, completamente,
durante toda a Sua vida. Ele reve-
lou Deus em Suas palavras, em
Suas obras, em Sua vida, em Sua
morte, em Sua pessoa e em tudo o
que Ele foi e fez. Ele nunca fez ou
disse qualquer coisa exceto aqui-
lo que viu Seu Pai fazendo. A Sua
comida era fazer a vontade de Seu
Pai. Quem quer que o tenha visto,
viu tambem o Pai (Jo 4.34; 8.26-28;
12.50; 14.9).
A Sua revela<;ao e confiavel
porque Ele e Jesus Cristo, o que
foi envindo. Ele recebeu do proprio
Deus o nome de Jesus porque Ele
foi enviado para salvar o Seu povo
dos seus pecados (Mt 1.21). E Ele
echamado Cristo porque Ele eo
Ungido do Pai, escolhido e quali-
ficado para o exercicio de todos os
Seus oficios pelo proprio Deus (Is
42.1; Mt 3.16). Ele e0 Unico Envi-
ado porque, ao contrario de mui-
tos falsos profetas, Ele nao veio em
Seu proprio nome, nem exaltou a
Si mesmo, nem procurou Sua pro-
pria honra. Mas Deus amou tanto
o mundo que deu Seu Filho
unigenito para que todo aquele
que nEle ere nao pere<;a, mas te-
nha a vida eterna, pois Ele e o en-
viado de Deus (Jo 3.16).
Aqueles, pois, que o aceitam
e creem nEle recebem o direito e
sao qualificados para usar o nome
0 CoNHECIMENTO DE DEus
de filhos de Deus (Jo 1.12). Eles
nasceram de Deus, partilham de
Sua natureza, eles conhecem Deus
sob as vistas de Cristo, Seu Filho.
Ninguem conhece o Filho senao o
Pai, e ninguem conhece o Pai se-
nao o Filho, e aquele a quem o Fi-
lho o quiser revelar (Mt 11.27).
Em segundo lugar, o conhe-
cimento de Deus difere do outro
conhecimento com rela<;ao ao seu
objeto. Quanto ao outro conheci-
mento, ele pode, especialmente
ern nosso tempo, ser rnuito arnplo
ern seu alcance, mas ele ainda gira
ern torno da criatura, elirnitado,
temporal e nunca pode alcan<;ar o
que eeterno. De fato, ha a revela-
<;ao do poder eterno de Deus e as
obras de Deus na natureza. Mas o
conhecimento derivado dessa fon-
te efraco, obscuro, contarninado
pelo erro, e nao tao irnportante. 0
hornern, conhecendo Deus atraves
da natureza, nao o glorificou
como Deus, e se tornou nulo ern
seu proprio raciocinio e mudou a
gloria do Deus incorruptivel em
semelhanc;:a da imagem da criatu-
ra. 0 rnundo e tanto urn oculta-
mento quanto uma revelac;:ao de
Deus (Rm 1.20-23).
Mas aquina orat;:ao sacerdo-
tal [Jo 17], o Unico que fica em evi-
dencia e Aquele que nos transmi-
te outro conhecimento e que nos
desafia a falar sobre o conhecinzen-
to de Deus! Quem pode compre-
ender Deus como objeto do conhe-
cimento humano? Como o ho-
29
mern pode conhecer Deus, o Infi-
nito e Incompreensivel, que nao
pode ser medido pelo tempo, nem
pela eternidade, em cuja presen-
<;a os anjos cobrem a face com as
asas, que vive ern luz inacessivel,
e a quem o homem nunca viu nem
pode ver? Como pode alguern as-
sim ser conhecido pelo homem,
cujo f6lego esta em suas narinas e
que e menos que nada e rnenos
que o vacuo? Como poderia ele
conhecer Deus, se seu melhor co-
nhecimento eurn trapo remenda-
do? Todo o seu conhecimento e
sabre, e nao de. 0 que ele sabe so-
bre a origem, a essencia e o pro-
posito das coisas? Ele nao esta ro-
deado de misterios por todos os
lados? Ele nao esta sempre beiran-
do a fronteira do desconhecido?
E n6s poderfamos supor que urn
homem pobre, fraco, pecaminoso
e carente poderia conhecer Deus,
o Sublime, o Santo, o Unico e
Todo-Poderoso Deus?
Ele esta fora de nossa com-
preensao, mas Cristo viu o Pai e
0 revelou a nos. Nos podemos
crer que Seu testemunho e verda-
deiro e digno de total aceita<;ao. E
se voce quer saber quem e Deus,
nao pergunte ao sabio, nem ao
escriba, nem aos debatedores de
nossos dias, mas procure por Cris-
to e ou<;:a o que Ele diz. Nao diga
em seu cora<;ao: "Quem subiu ao
ceu, ou quem desceu ao abismo?".
A palavra que Cristo proclama
esta perto de voce. Ele mesnw e"
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
Palavra, a perfeita revela<;ao do
Pai - igualmente justo, santo,
cheio de Gra<;a e de verdade. Em
Sua cruz todo o conteudo da fe do
Velho Testamento foi revelado:
"0 Senhor e misericordioso e
compassivo; longanimo e assaz
benigno. Nao repreende perpetu-
amente, nem conserva para sem-
pre a sua ira. Nao nos trata segun-
do os nossos pecados, nem nos re-
tribui consoante as nossas iniqui-
dades. Pois quanto o ceu se alteia
acima da terra, assim e grande a
sua misericordia para com os que
o temem. Quanto dista o Oriente
do Ocidente, assim afasta de nos
as nossas transgressi5es. Como urn
pai se compadece de seus filhos,
assim o Senhor se compadece dos
que o temem." (Sl103.8-13). Even-
do a gloria de Deus no espelho de
Sua palavra, nos gritamos em ex-
tase: Nos o conhecemos porque
Ele nos conheceu primeiro. "Nos
amamos porque Ele nos amou pri-
meiro" (1 Jo 4.19).
A origem e o conteudo de-
terminam tambem a peculiar es-
sencia do conhecimento de Deus.
Nos versiculos da ora<;ao sa-
cerdotal acima referida, Jesus fala
de urn conhecimento que nao e
mera informa<;ao, mas urn real co-
nhecimento. Ha uma grande dife-
ren<;a entre urn e outro. Obter in-
forma<;ao em livros a respeito de
plantas, animais, pessoas, paises
e povos nao significa ter conheci-
mento pessoal direto sobre esses
30
assuntos. Essa informa<;ao e sim-
plesmente baseada na descri<;ao
que outra pessoa fez sobre algum
assunto. Nesse sentido, a informa-
<;ao e apenas uma transmissao de
noticias. 0 conhecimento real in-
clui urn elemento de contato, urn
envolvimento pessoal e uma ati-
vidade do cora<;ao.
Everdade que uma descri-
<;ao pode ser encontrada na Pala-
vra do conhecimento de Deus que
Cristo da, e deste modo e possi-
vel ter uma informa<;ao sobre
Deus que difira essencialmente do
real conhecimento de Deus que
Cristo transmite. Urn tipo de co-
nhecimento da vontade do Senhor
desacompanhado de uma prepa-
ra<;ao do cora<;ao faz com que isso
seja possivel (Lc 12.47,48). 0 ho-
mem pode damar "Senhor! Se-
nhor!" e nao ter acesso ao Reino
dos ceus (Mt 7.21). Ha a fe, como
ados demonios, que nao condu-
zem ao amor, mas ao ternor e ao
tremor (Tg 2.19). Ha ouvintes da
palavra que nao querem ser pra-
ticantes dela e que portanto serao
frustrados (Tg 1.22)
Quando Jesus fala nesse tex-
to sobre o conhecimento de Deus,
Ele tern em mente urn conheci-
mento do mesmo tipo do conhe-
cimento que Ele mesmo possui.
Ele nao era urn teologo, nem urn
doutor ou professor de divinda-
de. Ele conhecia Deus atraves de
urn contato direto e pessoal; Ele
via Deus em todos os lugares, na
0 CONHECIMENTO DE DEUS
natureza, em Sua palavra, em Seu
servic;:o; Ele o amou acima de to-
das as coisas e foi obediente a Ele
em todas as coisas, ate mesmo na
morte de cruz. Seu conhecimento
da verdade era completo. 0 co-
nhecimento e o amor caminham
juntos.
Alem disso, conhecer Deus
nao consiste em ter uma grande
quantidade de conhecimento so-
bre Ele, mas em enxerga-lo napes-
soa de Cristo, em leva-lo em con-
ta nos caminhos de nossa vida, e
em sentir na alma Suas virtudes,
Sua justic;:a, Sua compaixao e Sua
Grac;:a.
Epor isso que esse conheci-
mento, em distinc;:ao ao outro co-
nhecimento/ recebe o nome de co-
nhecimento da fe. Ele nao e resul-
tado de estudo cientifico nem de
reflexao/ mas de uma fe infantile
simples. Essa fe e1 nao apenas urn
conhecimento seguro, mas uma
firme certeza de que, nao somen-
te para os outros, mas tambem
para mim, a remissao dos peca-
dos, a justic;:a e a salvac;:ao eterna
foram dadas por Deus/ somente
pela Sua Grac;:a, somente em con-
siderac;:ao aos meritos de Cristo.
Somente aqueles que se tornarem
como criancinhas poderao entrar
no reino dos ceus (Mt 18.3). 56 os
puros de corac;:ao podem vera face
de Deus (Mt 5.8). 56 aqueles que
nasceram da agua e do Espirito
podem entrar no reino (Jo 3.5).
Aqueles que conhecem o nome de
Deus confiam nEle (519.10). Deus
e conhecido na mesma proporc;:ao
em que Ele e amado.
Se n6s entendemos o conhe-
cimento de Deus dessa forma/ nao
devemos nos surpreender com o
fato de que sua operac;:ao e seu efei-
to seja nada menos que a vida eter-
na. De fato, parece existir pouca
relac;:ao entre o conhecimento e a
vida. Nao foi o autor de Eclesiastes
que disse que na muita sabedoria
ha muito enfado; e quem aumen-
ta ciencia aumenta tristeza; e ain-
da que nao ha limite para fazer li-
vros e o muito estudar e enfado
da carne (Ec 1.18; 12.12)?
Conhecimento e poder- isso
n6s podemos entender/ pelo me-
nos ate urn certo limite. Todo co-
nhecimento e urn triunfo do espi-
rito sobre urn certo assunto, uma
sujeic;:ao da terra ao senhorio do
homem. Mesmo na ordem natu-
rat a profundidade e a riqueza da
vida sao aumentadas pelo conhe-
cimento. Quanto maior foro co-
nhecimento, maior sera a intensi-
dade da vida. As criaturas inani-
madas nao possuem conhecimen-
to/ e elas nao vivem. Quando os
sentidos dos animais se desenvol-
vem, sua vida tambem se desen-
volve em satisfac;:ao e oportunida-
de. Entre os homens, a vida mais
rica e aquela que mais conhece.
Alem disso, como a vida do
insano, do imbecit do idiota, do
subdesenvolvido? Epobre e limi-
tada quando comparada com a de
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
urn pensador e poeta. Mas qual-
quer diferen<;a que possa ser no-
tada aqui e apenas urna diferen<;a
de grau. A propria vida nao e
rnudada por isso. E a vida, seja a
do rnais distinto erudito ou a do
rnais simples operario, deve ne-
cessariarnente terrninar na rnorte,
pois ela se enche apenas corn as
fontes lirnitadas deste rnundo.
Mas esse conhecimento de
que Cristo fala nao se refere a urna
criatura, mas ao verdadeiro Deus.
Se o conhecimento das coi-
sas visiveis podern enriquecer a
vida, o que o conhecimento de
Deus fara corn ela? Deus nao e urn
Deus de rnortos e nern da rnorte,
mas de vivos e da vida. Todos
aqueles que forarn recriados aSua
irnagern e descansarn ern Sua corn-
panhia sao elevados acirna do ni-
vel da rnorte e da rnortalidade.
II Aquele que ere ern rnirn", disse
Jesus, II ainda que rnorra, vivera;
e todo o que vive e ere em rnirn
nao rnorrera eternarnente" (J0
11.25,26). 0 conhecimento de
Deus ern Cristo traz consigo a vida
eterna, alegria imperturbavel,
benc;aos celestiais. Esses nao sao
apenas efeitos, pois o conhecimen-
to de Deus e, ern si rnesrno, urna
vida nova, eterna e aben<;oada.
De acordo corn esse ensino
das Sagradas Escrituras, a Igreja
Crista deterrninou o carater desse
32
corpo de conhecirnentos ou den-
cia que desde tempos antigos tern
sido charnado de Teologia ou Di-
vindade. A Teologia e a ciencia
que extrai o conhecimento de
Deus de Sua revela<;ao, que estu-
da e pensa sobre ela sob a orienta-
c;ao do Espirito Santo, e entao ten-
ta descreve-la de forma a honrar
a Deus. E urn te6logo, urn verda-
deiro te6logo, e aquele que fala de
Deus, atraves de Deus, sobre Deus
e sernpre no intuito de glorificar
Seu nome. Entre o estudado e o
simples ha apenas urna diferenc;a
de grau. Ambos possuern urn s6
Senhor, urna s6 fe, urn s6 batisrno,
urn s6 Deus e Pai de todos, o qual
e sobre todos, age por meio de to-
dos e esta em todos. E a Gra<;a foi
concedida a cada urn de n6s se-
gundo a propor<;ao do dom de
Cristo (Ef 4.5-7).
Nesse espirito, Calvino co-
mec;ou o catecismo de Genebra
com a questao: Quale 0 firn prin-
cipal do hornem? E a resposta
vern, clara e retumbante: Conhe-
cer Deus, por quem ele foi criado.
Da mesrna forma o Catecisrno de
Westminster corne<;a suas li<;oes
com a seguinte pergunta: Qual e
o fim supremo e principal do ho-
rnem? A resposta e breve e rica: 0
fim supremo e principal do ho-
rnern e glorificar a Deus e goza-lo
plena e eternarnente.
CAPITULO
~
A REVELA<;AO GERAL
§
e e verdade que 0 homem
pode ter conhecimento de
Deus, entao esse fato pres-
supoe que Deus, de Sua parte,
voluntariamente resolveu, de al-
guma forma, fazer-se conhecido
aohomem.
N6s nao podemos creditar o
conhecimento de Deus a n6s mes-
mos, anossa descoberta, investi-
ga<;:ao ou reflexao. Se esse conhe-
cimento nao nos fosse dado por
urn ato livre e espontaneo de
Deus, nao haveria qualquer pos-
sibilidade de que n6s o alcan<;:as-
semos pelos nossos pr6prios es-
for<;:os.
Quando nos referimos ao co-
nhecimento das coisas criadas, a
situa<;:ao e bern diferente. N6s so-
mos totalmente dependentes de
Deus ate mesmo para adquirir co-
nhecimento sobre as coisas cria-
3as, contudo, no momento da cri-
a<;:ao Ele encarregou o homem de
subjugar e dominar toda a terra,
equipou-o para realizar essa tare-
fa e deu-lhe interesse para isso. 0
homem esta acima da natureza.
Ele pode medir os fenomenos na-
turais, pode estuda-los e, ate cer-
to ponto, pode artisticamente cri-
ar objetos. Ele pode, de certa for-
ma, fazer com que a natureza se
revele a ele e descobrir seus segre-
dos.
Contudo, esta habilidade
tambem e limitada em todas as
formas nas quais esta disponivel.
Na medida em que a ciencia pe-
netra mais e mais fundo no feno-
meno e se aproxima da essencia
dele, ela ve que OS misterios au-
mentam e sente-se encurralada
por todos os lados pelo desconhe-
cido. Nao sao poucos os que es-
tao convencidos das limita<;:oes do
conhecimento humano a ponto de
dizer: "N6s nada sabemos", e, em
algumas ocasioes: "N6s nunca
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
chegaremos a saber".
Se tallimita<;ao do conheci-
mento humano logo se torna cla-
ra no estudo da natureza inanima-
da, ela se torna ainda mais nota-
vel no estudo das criaturas vivas,
animadas e racionais.
Isso acontece porque nessa
area n6s entramos em contato com
realidades que nao podem ser
manuseadas arbitrariamente. Elas
ficam diante de n6s em sua objeti-
vidade e podem ser conhecidas
por n6s na medida em que
correspondem aquilo que encon-
tramos em n6s mesmos. A vida, a
consciencia, o sentimento e a per-
cep<;ao, o entendimento e a razao,
o desejo e a vontade, nao podem
ser desmontadas e remontadas.
Nao sao de natureza med1nica,
mas organica; temos que
considera-los em si mesmos e
respeita-los em sua natureza mis-
teriosa. Desmembrar a vida e o
mesmo que mata-la.
Isso vale para a maior parte
da natureza humana, pois apesar
de ser verdade que o homem eurn
ser fisico e que essa dimensao nao
pode escapar de nossa percep<;ao,
e apenas sua manifesta<;ao exter-
na que n6s podemos perceber. Por
tras dessa manifesta<;ao esta uma
vida misteriosa que tern em sua
forma externa uma expressao im-
perfeita e inadequada. Ate urn cer-
to ponto o homem tern a habili-
dade de ocultar a outras pessoas
o mais intimo de sua natureza. Ele
34
pode controlar sua expressao
facial de modo que seus museu-
los faciais nao revelem o que esta
acontecendo dentro dele; ele pode
usar uma linguagem que esconda
seus pensamentos; ele pode, com
suas a<;6es, assumir uma atitude
que esteja em conflito como que
ele pensa. E ate mesmo quando
n6s estamos tratando com uma
pessoa que despreze essas sutile-
zas do engano, nosso conhecimen-
to sobre ele dependera grande-
mente daquilo que, de sua parte,
quiser revelar sobre si mesmo.
Alias, as vezes isso acontece de
forma involuntaria; 0 homem nao
tern controle absoluto sobre si
mesmo, e ele freqi.ientemente se
trai sem que tenha a inten<;ao de
faze-lo. Ao mesmo tempo ele
pode, atraves de sua vida, de suas
palavras e de seus feitos, com ou
sem o seu consentimento, revelar
o misterio de sua personalidade,
e n6s poderemos conhece-lo urn
pouco como ele e. 0 conhecimen-
to de uma pessoa s6 e possivel
quando ela, involuntariamente ou
consciente e deliberadamente ore-
vela a n6s.
Tais considera<;6es nos con-
duzem a urn correto entendimen-
to das condi<;6es sob as quais urn
ser humano pode dizer que tern
conhecimento de Deus. Deus e
absolutamente independente, per-
feitamente soberano. Ele nao de-
pende de n6s para coisa alguma,
mas n6s, tanto naturalmente
A REVELA<;:Ao GERAL
quanto racionalmente e moral-
mente, somos completamente de-
pendentes dEle. Portanto, n6s nao
temos controle e nao temos poder
sobre Ele, e por isso nao podemos
faze-lo o objeto de nosso estudo e
reflexao. A nao ser que Ele se per-
mita ser encontrado, n6s jamais o
encontraremos. A nao ser que Ele
se de a n6s, n6s jamais poderemos
recebe-lo. Alem do mais, Deus e
invisivel. Ele mora em luz inaces-
sivel e nenhum homem jamais o
viu e nem pode ver. Se Ele se man-
tiver oculto n6s nao podemos
traze-lo para o alcance de nossa
percep<_;:ao fisica ou espiritual; e, e
claro, sem qualquer tipo de per-
cep<_;:ao1 0 conhecimento nao e pos-
sivel. Finalmente, para encerrar-
mos o assunto, Deus e Todo-Po-
deroso. Ele tern nao apenas Suas
criaturas, mas tambem a Si mes-
mo sob total controle. Apesar dos
seres humanos estarem sempre se
revelando, algumas vezes mais
outras menos, seja de forma deli-
berada ou nao, Deus s6 se revela
na medida em Ele deseja faze-lo,
e s6 porque Ele o quer. Nao existe
algo como uma manifesta<_;:ao
involuntaria de Deus, ocorrendo
fora da esfera de Sua consciencia
e de Sua liberdade. Deus tern to-
tal, absoluto e perfeito controle
sobre Si mesmo, e Ele s6 se revela
na medida em que sente prazer
em fazer isso.
Portanto, o conhecimento de
Deus s6 e possivel atraves da re-
35
vela<_;:ao que Ele faz de Si mesmo.
0 conhecimento de Deus s6 e
acessivel ao homem quando, e s6
quando, Deus livremente deseja
revelar-se.
* * * * *
Essa auto apresenta<_;:ao de
Deus e geralmente chamada de
revela~ao. A Escritura usa varios
verbos para expressar essa reve-
la<_;:ao de Deus, tais como aparecer,
falar, ordenar, trabalhar, fazer co-
nhecido, e outros semelhantes.
Isso mostra que a revela<_;:ao nem
sempre acontece do mesmo modo,
mas de varias formas. Na pratica,
todas as obras de Deus, sejam pa-
lavras ou atos, sao partes consti-
tuintes da unica revela<_;:ao de
Deus, grande, abrangente, e sem-
pre continua. A cria<_;:ao, manuten-
<_;:ao e o dominio de todas as coi-
sas, o chamado e o destaque de
Israel, o envio de Cristo, a desci-
da do Espirito Santo, o registro da
Palavra de Deus, o sustento e a
propaga<_;:ao da Igreja, sao formas
pelas quais a revela<_;:ao de Deus
vern ate n6s. Cada uma dessas for-
mas nos revela algo de Deus. Nes-
se sentido, tudo o que existe e tudo
o que acontece pode conduzir-nos
ao conhecimento de Deus.
Essa revela<_;:ao pode ser ge-
ral ou especial, de acordo com as
suas caracteristicas.
Em primeiro lugar, a revela-
<_;:ao sempre tern sua origem em
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
urn ato livre da parte de Deus.
Nesse ato, como em todas as ou-
tras coisas, Ele e absolutamente
soberano, e age com perfeita liber-
dade. De fato, ha alguns que re-
pudiam a cren<;a em urn Deus pes-
soal e auto consciente, e ainda as-
sim falam de uma revela<;ao de
Deus. Isso da urn significado a
palavra que entra em conflito com
seu sentido usual. Do ponto de
vista daqueles para os quais a di-
vindade e apenas uma for<;a todo-
poderosa, impessoal e inconscien-
te, e possivel falar em uma mani-
festa<;ao involuntaria dessa for<;a,
mas nao de uma revela<;ao real,
pois essa e uma ideia que pressu-
poe a perfeita consciencia e liber-
dade de Deus. Toda revela<;ao dig-
na desse nome procede da ideia
de que Deus existe pessoalmente,
que Ele e consciente de Si mesmo
e que Ele pode fazer-se conhecido
as Suas criaturas. Nosso conheci-
mento humano de Deus tern sua
base e sua origem no conhecimen-
to que Deus tern de Si mesmo. A
nao ser que haja auto consciencia
e auto conhecimento em Deus,
nenhum conhecimento de Deus
sera possivel ao homem. Qual-
quer pessoa que negue isso che-
gara a conclusao irracional de que
nenhum conhecimento de Deus e
possivel, ou que Deus alcan<;a
auto consciencia somente no ho-
mem, o que coloca o homem no
lugar de Deus.
A Escritura ensina algo mui-
56
to diferente disso. Apesar de ser
inacessivel, a morada de Deus e
luz; Ele conhece a Si mesmo per-
feitamente e, portanto, pode reve-
lar-se a n6s. Ninguem conhece o
Filho senao o Pai; e ninguem co-
nhece o Pai senao o Filho, e aque-
le a quem o Filho o quiser revelar
(Mt 11.27).
Em segundo lugar, toda re-
vela<;ao que procede de Deus e
auto revelar;iio. Deus e a origem e
tambem o conteudo de Sua reve-
la<;ao. Isso faz com que seja ver-
dadeira a rnais elevada revelac;ao,
que veio a nos em Cristo, pois o
proprio Cristo disse que Ele reve-
lou o nome de Deus ao homem (Jo
17.6). 0 Filho unigenito, que esta
no seio do Pai, revelou-nos Deus
(Jo 1.18). Mas o mesmo e verdade
sobre qualquer revelac;ao que
Deus tenha dado ao homem sobre
Si mesmo. Todas as obras de Deus,
em natureza e em Grac;a, na cria-
c;ao e na regenerac;ao, no mundo e
na historia, mostram-nos algo sa-
bre o incompreensivel e adoravel
ser de Deus. Elas nao o fazem da
mesma forma e nem com o mes-
mo alcance; ha infinitas diferenc;as
entre elas. Uma obra fala de Sua
justic;a, e outra de Sua Grac;a; de
uma resplandece Seu poder infi-
nito, e de outra Sua divina sabe-
doria.
Contudo, todas juntas e cada
uma delas em seu proprio alcan-
ce, declaram-nos as poderosas
obras de Deus, e informam-nos
A REVELA<;:Ao GERAL
sobre Suas virtudes e perfei<;:oes,
sobre Seu sere Suas auto diferen-
cia<;:oes, sobre Seu pensarnento e
sobre Sua palavra, e sobre Sua
vontade e seu prazer.
Nessa conexao n6s nunca
devernos nos esquecer, e claro,
que a revela<;:ao de Deus, indepen-
denternente da riqueza de seu
conteudo, nunca sera identica ao
auto conhecimento de Deus. Esse
auto conhecimento ou auto cons-
ciencia e tao infinito quanto Seu
Sere Sua natureza, portanto, nao
esta sujeito aapreensao de qual-
quer criatura. A revela<;:ao de Deus
em Suas criaturas, tanto objetiva-
rnente nas obras de Sua mao quan-
to subjetivarnente na consciencia
de Suas criaturas racionais, pode
rnostrar, sernpre, apenas urna pe-
quena parte do infinito conheci-
mento que Deus tern de Si rnes-
rno. E nao sornente n6s, seres hu-
rnanos sobre a terra, mas tarnbern
os santos e os anjos nos ceus, e
tarnbern o Filho de Deus ern Sua
natureza hurnana, possuern urn
conhecimento de Deus que e dife-
rente ern principio e ern essencia
do auto conhecimento de Deus.
~-'co rnesrno tempo, o conhecimen-
to que Deus tern distribuido ern
Sua revela<;:ao, e que pode ser ob-
tido pelas criaturas racionais a
partir dessa revela<;:ao, lirnitado e
iinito como e e sera pelo resto da
eternidade, e, contudo, urn conhe-
cimento real e cornpleto. Deus se
re,·ela ern Suas obras exatamente
37
como Ele e. A partir dessa Sua re-
vela<;:ao n6s podernos conhece-lo.
Portanto, nao ha repouso para o
hornern ate que ele se coloque aci-
rna e alern da criatura e chegue ate
o proprio Deus. No estudo dare-
vela<;:ao nossa preocupa<;:ao deve
ser a de conhecer Deus. 0 prop6-
sito desse estudo nao e aprender
a usar alguns argurnentos e a fa-
lar algumas palavras. 0 objetivo
prirnario desse estudo e conduzir-
nos atraves da criatura ate o Cria-
dor, e fazer-nos encontrar descan-
so no cora<;:ao do Pai.
Ern terceiro lugar, a revela-
<;:ao que procede de Deus, e que
tern Deus como seu conteudo,
tarnbern tern Deus como seu pro-
p6sito. Essa revela<;:ao e dEle, e
atraves dEle e tarnbern para Ele;
Ele fez todas as coisas para Si rnes-
mo (Rrn 11.36; Pv 16.4). Apesar do
conhecimento de Deus, que e dis-
tribuido ern Sua revela<;:ao, ser es-
sencialrnente diferente de Seu
auto conhecimento, ele e tao rico,
tao arnplo e tao profundo, que
nunca pode ser totalrnente absor-
vido pela consciencia de qualquer
criatura racional. Os anjos exce-
dern o homern ern conhecimento,
e veern incessanternente a face do
Pai que esta nos ceus (Mt 18.10),
mas eles desejararn perscrutar as
coisas que nos forarn anunciadas
por aqueles que anunciararn o
Evangelho (1Pe 1.12). E na rnedi-
da ern que as pessoas pensarn
mais e rnais profundarnente sobre
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
a revela<;:ao de Deus elas sao mais
impelidas a damar como Paulo:
"6 profundidade da riqueza, tan-
to da sabedoria como do conheci-
mento de Deus! Quao insondaveis
sao os seus juizos, e quao
inescrutaveis, os seus caminhos"
(Rm 11.33)! Contudo, a revela<;:ao
nao pode ter o seu proposito final
no homem; ela o ultrapassa e se
levanta alto;m dele.
Everdade que o homem tern
urn importante lugar na revela<;:ao.
Ela e dirigida ara<;:a humana para
que o homem possa buscar a
Deus, se, porventura, tateando,
puder encontra-lo (At 17.27); e o
Evangelho deve ser pregado a to-
das as criaturas, para que, crendo,
tenham vida eterna (Me 16.15,16;
Jo 3.16,36). Mas esse nao pode ser
o proposito final e mais elevado
da revela<;:ao. Deus nao pode des-
cansar no homem. Pelo contrario,
o homem deve conhecer e servir a
Deus, motivo pelo qual deve, jun-
tamente com as outras criaturas,
e afrente delas, dar a Deus a de-
vida honra por todas as Suas
obras. Em Sua revela<;:ao, querela
passe alem do homem ou ao lado
do homem, Deus esta preparan-
do Seu proprio louvor, glorifican-
do Seu proprio nome, e manifes-
tando diante de Seus proprios
olhos, no mundo de Suas criatu-
ras, Suas excelencias e perfei<;:6es.
Pelo fato da revela<;:ao ser de Deus
e atraves de Deus, ela tern seu fim
e proposito tambem em Sua glo-
38
rifica<;:ao.
Toda essa revela<;:ao, que e
de Deus e atraves dele, tern seu
ponto mais elevado na pessoa de
Cristo. Nao e o firmamento
relampejante, nem a natureza po-
derosa, nem qualquer principe ou
genio da terra, nem qualquer filo-
sofo ou artista o ponto mais alto
da revela<;:ao de Deus, mas sim o
Filho do Homem. Cristo eo Ver-
ba feito carne, que estava no co-
me<;:o com Deus e que era Deus, o
Unigenito do Pai, a Imagem de
Deus, o brilho de Sua gloria e a
exata expressao de Sua pessoa;
quem o ve tambern ve o Pai (Jo
14.9). Nessa fe o Cristao permane-
ce de pe. Ele aprendeu a conhecer
Deus na pessoa de Jesus Cristo,
que foi enviado pelo proprio
Deus. Deus, que disse que nas tre-
vas resplandecera a luz, Ele mes-
mo resplandeceu em nosso cora-
<;:ao, para ilumina<;:ao do conheci-
mento da gloria de Deus, na face
de Cristo (2Co 4.6).
* * * * *
Desse ponto altamente
privilegiado o Cristao olha asua
volta, para a frente, para tras e
para todos os lados. E se, ao fazer
isso, a luz do conhecimento de
Deus, que recebe de Cristo, ele se
detem na natureza e na historia,
no ceu ou sobre a terra, entao ele
descobre tra<;:os do mesmo Deus
que ele aprendeu a conhecer e a
A REVELA<;:Ao GERAL
cultuar em Cristo como seu Pai.
0 Sol da justi<;a proporciona uma
vista maravilhosa que se estende
ate as extremidades da terra. Atra-
ves dessa luz ele olha para tra.s,
para as noites de tempos passa-
dos, e atraves dela ele penetra no
futuro de todas as coisas. A sua
frente e atras de si 0 horizonte e
claro, apesar do ceu estar geral-
mente encoberto pelas nuvens.
0 Cristao, que ve tudo aluz
da Palavra de Deus, pode ser qual-
quer coisa, menos estreito em sua
perspectiva. Ele tern amplitude de
cora<;ao e mente. Ele olha por toda
a terrae considera tudo como sen-
do seu, pois ele ede Cristo e Cris-
to ede Deus (1Co 3.21-23). Ele nao
pode desvincular sua cren<;a da re-
·ela<;ao de Deus em Cristo, a
quem ele deve sua vida e sua sal-
va<;ao, pois essa cren<;a tern urn
carater especial. Essa cren<;a nao
o exclui do mundo, mas coloca-o
em condi<;ao de seguir a pista da
revela<;ao de Deus na natureza e
na hist6ria, e coloca meios asua
disposi<;ao pelos quais ele pode
reconhecer a verdade, o bern e a
beleza e separa-los das rela<;6es
ralsas e pecaminosas dos homens.
Dessa forma, ele faz distin-
(ao entre uma revela<;ao geral e
uma revela<;ao especial de Deus.
:a revela<;ao geral Deus faz uso
da ocorrencia usual dos fenome-
:ws e do curso usual dos eventos;
:' :1 re·ela<;ao especial Ele geral-
:--:.1:'nte emprega meios nao usuais,
39
tais como apari<;6es, profecias e
milagres para fazer-se conhecido
ao homem. 0 conteudo da reve-
la<;:ao geral sao geralmente Seus
atributos de poder, sabedoria e
bondade; o conteudo da revela<;ao
especial sao especialmente a san-
tidade e a justi<;:a, a compaixao e a
Gra<;a. A revela<;ao geral edirigida
a todos os homens e, por meio da
gra<;a comum, serve para restrin-
gir a prolifera<;ao do pecado; are-
vela<;ao especial edirigida a todos
aqueles que vivem sob o Evange-
lho e possuem, pela Gra<;a especi-
al, o perdao dos pecados e a reno-
va<;ao de vida.
Apesar desses dois tipos de
revela<;ao serem essencialmente
distintos, eles estao intimamente
ligados urn ao outro. Os dois pos-
suem sua origem em Deus, em
Sua bondade soberana e em seu
favor. A revela<;ao geral e uma
dadiva do Verbo que estava com
Deus no principia, que fez todas
as coisas, que brilhou como a luz
nas trevas e iluminou todos os
homens que vieram ao mundo (Jo
1.1-9). A revela<;ao especial euma
dadiva do mesmo Verbo, que foi
feito carne em Cristo, e que agora
echeio de Gra<;:a e de verdade (Jo
1.14). A Gra<;:a eo conteudo de
ambas as revela<;6es, de tal forma
que uma seja indispensavel aou-
tra.
Ea gra<;:a comum que torna
possivel a Gra<;a especiat prepa-
ra o caminho para ela, e depois lhe
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
da o suporte; e a Grac;a especiat
por sua vez, ergue a grac;a comurn
ao seu proprio nivel e coloca-a a
seu servic;o. Ambas as revelac;oes
tern como proposito a conserva-
c;ao da rac;a humana; a primeira
sustentando-a e a segunda
redimindo-a; e desta forma as
duas cumprem a sua finalidade,
que e glorificar todas as excelen-
cias de Deus.
* * * * *
0 conteudo de ambas as re-
velac;oes, nao apenas o da especi-
al, mas tambem o da geral, esta
contido na Sagrada Escritura. A
revelac;ao geral, apesar de estar
contida na natureza, e, contudo,
extraida da Sagrada Escritura,
pois, sem ela, n6s, seres humanos,
por causa da escuridao de nosso
entendimento, nunca teriamos
sido capazes de encontra-la na
natureza. Sendo assim, a Escritu-
ra lanc;a luz sobre nosso caminho
atraves do mundo, e coloca em
nossas maos a verdadeira compre-
ensao da natureza e da historia.
Ela nos faz ver Deus onde nos de
outra forma nao o veriamos. Ilu-
minados por ela nos contempla-
mos as excelencias de Deus em
toda a expansao das obras de Suas
maos.
A propria criac;ao, ensinada
pela Escritura, demonstra a reve-
lac;ao de Deus na natureza, pois
ela e em si mesma um ato de re-
40
velac;ao, o inicio eo primeiro prin-
cipia de toda a revelac;ao posteri-
or. Se o mundo tivesse permane-
cido eternamente sozinho, ou se
tivesse sido eternamente descon-
siderado por Deus, ele nao teria
sido uma revelac;ao de Deus.
Alias, tal mundo teria sido urn
obstaculo a Deus e a Sua revela-
c;ao de Si mesmo. Mas quem quer
que o contemple junto com as Es-
crituras, desde a criac;ao do mun-
do, ere que Deus se revela em todo
o mundo. Toda obra da testemu-
nho de seu realizador a tal ponto
que em urn certo sentido pode ser
chamada de produto de seu reali-
zador.
Por ser o mundo, em urn
sentido absoluto, uma obra de
Deus, e por clever, tanto sua natu-
reza quanto seu ser, no comec;o e
sempre depois, ao seu Criador,
toda criatura manifesta algo das
excelencias e das perfeic;oes de
Deus. Logo que a revelac;ao de
Deus na natureza e negada ou li-
mitada somente ao corac;ao ou ao
sentimento do homem, surge o
perigo de que a criac;ao de Deus
nao seja reconhecida, que a natu-
reza seja governada por outro po-
der que aquele que governa o co-
rac;ao humano, e que desta forma,
quer seja abertamente, quer seja
de forma encoberta, o politeismo
seja introduzido no pensamento
humano. A Escritura, ao ensinar
a criac;ao, sustenta a revelac;ao de
Deus e ao mesmo tempo a unida-
A REVELA<;:Ao GERAL
de de Deus e a unidade do mun-
do.
Ah~m do mais, a Escritura
ensina nao apenas que Deus cha-
mou o mundo a existencia, mas
tambem que esse mundo e, conti-
nuamente, momento ap6s mo-
mento, sustentado e governado
por esse mesmo Deus. Ele e infi-
nitamente exaltado nao apenas
sobre todo o mundo, mas tambem
mora em todas as Suas criaturas
por Seu poder infinito e onipre-
sente. Ele nao esta longe de quem
quer que seja, pois nEle n6s vive-
mos, enos movemos, e existimos
(At 17.27,28). A revela<;ao que vern
ate n6s atraves do mundo, toda-
via, nao e apenas urn lembrete de
uma obra de Deus que Ele reali-
zou ha muito tempo atras: e urn
testemunho tambem daquilo que
Deus, em nossos tempos, quer e
faz.
~ Quando levantamos nossos
olhos podemos ver nao apenas
quem criou essas coisas e faz sair
o seu exercito em grande m:ime-
ro, mas tambem que Ele as chama
pelos seus nomes, pela grandeza
de Seu poder, porque Ele e forte
em poder e por isso nenhuma de-
las vern a £altar (Is 40.26). Os ceus
declaram as obras de Deus e o
firmamento anuncia as obras das
Suas maos (Sl 19.1). Ele se cobre
de luz como de urn manto e esten-
de os ceus como uma cortina. Ele
poe nas aguas 0 fundamento da
Sua morada e toma as nuvens por
41
Seu carro e voa nas asas do vento
(Sl 104.2,3). As montanhas e os
vales estao estabelecidos no lugar
que Deus tinha para eles prepara-
do e Ele os rega do alto de Sua
morada (Sl 104.8,13). Ele farta a
terra com o fruto de Suas obras,
faz crescer a relva para os animais
e as plantas para o servi<;o do ho-
mem, de forma que da terra tire o
seu pao e o vinho, que alegra o
cora<;ao do homem (Sl104.13-15).
Cingido de poder Ele, por Sua for-
<;a, consolida os montes e aplaca o
rugir dos mares (Sl65.6,7). Ele ali-
menta as aves do ceu e veste os
lirios do campo (Mt 6.26-30). Ele
faz nascer o sol sobre rnause bons
e faz vir chuvas sobre justos e in-
justos (Mt 5.45). Ele fez o homem
urn pouco menor do que os anjos,
e coroou-o com gloria e honra, e
deu-lhe dominio sobre as obras de
Suas maos (Sl 8.5,6).
Alem disso Ele cumpre Seu
conselho e estabelece Sua obra
tanto na natureza quanto na his-
t6ria. Ele de urn s6 fez todas as
na<;oes para habitar a terra (At
17.26). Ele destruiu a primeira ra<;a
humana no dih:ivio e ao mesmo
tempo preservou-a na familia de
Noe (Gn 6.6-9). Na torre de Babel
Ele confunde a linguagem dos ho-
mens e os dispersa sobre a face da
terra (Gn 11.7-8). E quando o
Altissimo dividiu entre as na<;oes
a sua heran<;a e separou os filhos
de Adao, Ele determinou os tem-
pos previamente estabelecidos e
Fundamentos Teol6gicos da Fe Cristii
os limites da sua habita<;ao, de
acordo como numero de tilhos em
Israel (Dt 32.8; At 17.26). Apesar
de ter escolhido os filhos de Israel
para serem os portadores de Sua
revela<;ao especial, e permitido
que as na<;6es pagas seguissem
seu proprio caminho (At 14.16),
Ele nao se esqueceu deles nem
abandonou-os a sua propria sor-
te. Pelo contrario, Ele nao os dei-
xou sem urn testemunho de Si
mesmo, fazendo o bern, dando-
lhes chuvas do ceu e esta<;6es fru-
tiferas, enchendo o cora<;ao deles
de fartura e de alegria (At 14.17).
0 que de Deus se pode conhecer
e manifesto entre eles, porque
Deus lhes manifestou (Rm 1.19),
para que eles busquem a Deus, se
porventura, tateando, possam
encontra-lo (At 17.27).
Por meio dessa revela<;ao
geral Deus preservou os povos e
conduziu-os ate a dispensa<;ao da
plenitude dos tempos, fazendo
com que todas as coisas conver-
gissem para Cristo, tanto as do ceu
como as da terra (Ef 1.10). De to-
das as na<;6es, povos, ra<;as e Hn-
guas Ele reuniu Sua igreja (Rm
11.25; Ef 2.14 e ss.; Ap 7.9), e pre-
para o fim do mundo, no qual os
salvos de todas as na<;:6es andarao
na luz da cidade de Deus, e todos
os reis e povos da terra darao sua
gloria e honra a Ele (Ap 21.24-26).
Na ciencia da teologia os ho-
mens tern tentado organizar todos
esses testemunhos da natureza e
42
da historia sobre a existencia e o
ser de Deus e classifica-los em gru-
pos. Por isso nos as vezes falamos
de seis evidencias da existencia de
Deus.
Em primeiro lugar, o mun-
do, sendo sempre tao poderoso e
abrangente, esta, contudo, conti-
nuamente dando testemunho de
que esta confinado ao espa<;o e ao
tempo, testemunhando, assim,
que e temporal, acidental e de ca-
rater dependente e que requer,
portanto, urn Ser eterno, essenci-
al e independente como a causa
final de todas as coisas. Esse e o
argumento cosmologico.
Em segundo lugar, o mun-
do, em suas leis e ordenan<;as, em
sua unidade e harmonia e na or-
ganiza<;:ao de todas as suas criatu-
ras, exibe urn proposito cuja expli-
ca<;:ao seria ridicula na base da ca-
sualidade, e que, portanto, apon-
ta para urn ser todo abrangente e
todo poderoso que com mente in-
finita estabeleceu esse proposito,
e por seu poder infinito e
onipresente age para alcanca-lo.
Esse e o argumento teologico.
Em terceiro 1ugar, ha na
consciencia de todos os homens
alguma no<;ao de urn ser supremo,
sobre o qual nao se pode conce-
ber algo que seja mais elevado, e
que e auto existente. Setal ser nao
existe, a maior, mais perfeita e
mais inevitavel ideia seria uma
ilusao, e o homem perderia sua
confian<;:a na validade de sua cons-
A REVELA<;:Ao GERAL
Ciencia. Esse e o argumento
ontol6gico.
0 quarto argumento e urn
coroL1rio do terceiro: o homem
nao e apenas urn ser racionat ele
tambem e urn ser moral. Ele sente
em sua consciencia que e limita-
do por uma lei que esta acima de
si mesmo e que requer obedien-
cia incondicional de sua parte. Tal
lei pressupoe urn santo e justo le-
gislador que pode preservar e des-
truir. Esse e o argumento moral.
Dois outros argumentos sao
adicionados a esses quatro, deri-
vados da similaridade ou corres-
pondencia de povos e da hist6ria
da humanidade. Eurn fenomeno
notavel que nao existam povos ou
na<;oes sem religiao. Alguns eru-
ditos tern argumento que nao e
bern assim, mas as investiga<;oes
hist6ricas tern provado mais e
mais que eles estao errados. Nao
ha tribos nem povos ateus. Esse fe-
nomeno e de grande imporhincia,
pois a absoluta universalidade
dessa no<;ao de religiao coloca di-
ante de nos uma escolha entre
duas op<;oes: ou nesse ponto a
humanidade esta sofrendo sob
uma supersti<;ao estupida, ou esse
conhecimento e servi<;o de Deus,
que em formas distorcidas apare-
ce entre todos os povos, esta ba-
seado na existencia de Deus.
Da mesma forma a hist6ria
da humanidade, quando vista a
luz da Escritura, exibe urn plano
e urn padrao que aponta para o
43
governo de todas as coisas por urn
ser supremo. Everdade que essa
ideia encontra todo tipo de obje-
<;6es e dificuldades tanto na vida
de individuos quanto na de na-
<;6es. Todavia e notavel que qual-
quer pessoa que fa<;a urn estudo
serio da hist6ria supoe que a his-
t6ria e algo no qual 0 planejamen-
to e a ordem sao evidentes e que
faz de sua tarefa a descoberta e a
continuidade desse planejamento
e dessa ordem. A hist6ria e a fila-
sofia da hist6ria estao baseadas na
fe, na providencia de Deus.
Todas essas assim chamadas
evidencias nao sao suficientes
para fazer com que o homem
creia. A ciencia e a filosofia tern
muito poucas evidencias capazes
de fazer isso. Pode ser que nas ci-
encias formais, como na matema-
tica e na 16gica, isso seja possivel,
mas no momento em que temos
contato como fenomeno real na
natureza, e tambem na hist6ria,
nossas argumenta<;oes e conclu-
soes, via de regra, sao objeto de
todo tipo de desconfian<;a e obje-
<;6es. Na religiao e na etica, na lei
e na estetica, depende ainda mais
da atitude do investigador se ele
se submete ou nao a essa convic-
<;ao. 0 insensato pode, apesar de
todo o testemunho contrario, di-
zer em seu cora<;ao que Deus nao
existe (5114.1), eo pagao, mesmo
tendo conhecimento de Deus, nao
o glorificou e nem lhe deu gra<;as
(Rm 1.21). Os argumentos da exis-
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
tencia de Deus acima menciona-
dos nao se dirigem ao homem
como uma criatura meramente
16gica e capaz de racionar, mas
como urn ser racional e moral. 0
apelo desses argumentos nao se
refere somente asua mente racio-
nal e analitica, mas tambem ao seu
corac;:ao e ao seu sentimento, sua
razao e sua consciencia. Eles tern
seu merito, fortalecendo a fee es-
tabelecendo o vinculo de ligac;:ao
entre a revelac;:ao de Deus fora do
homem e a Sua revelac;:ao dentro
dohomem.
* * * * *
Alem disso, a revelac;:ao de
Deus na natureza e na hist6ria nao
teria efeito sobre o homem se nao
houvesse algo no homem que re-
agisse a ela. A beleza da natureza
e da arte nao poderiam dar ao
homem qualquer prazer a nao ser
que ele tivesse urn sentimento de
beleza em seu peito. A lei moral
nao encontraria resposta nele se
ele nao reconhecesse a voz da
consciencia dentro de si. Os pen-
samentos que Deus, por Sua Pala-
vra, expressou no mundo seriam
incompreensiveis ao homem se
ele nao fosse em si mesmo urn ser
pensante. E da mesma forma are-
velac;:ao de Deus em todas as obras
das suas rnaos seriam totalmente
ininteligiveis ao homem se Deus
nao tivesse plantado em sua alma
urna inextinguivel noc;:ao de Sua
44
existencia e de Seu ser. 0 fato
indisputavel, todavia, e que Deus
acrescentou a Si mesmo arevela-
c;:ao externa na natureza e areve-
lac;:ao interna no homem. As inves-
tigac;:oes hist6ricas e psicol6gicas
da religiao revelam repetidamen-
te que a religiao nao pode ser
explicada a nao ser sobre a base
de uma noc;:ao nao criada pelo ho-
rnem. Ao firn de seu estudo os
pesquisadores sempre retornam a
proposic;:ao que eles repudiavam
desde o inicio, a de que o homem
e, no fundo, uma criatura religio-
sa.
A Escritura nao deixa qual-
quer duvida sobre isso. Depois de
Deus ter feito todas as coisas Ele
criou o homem, e criou-o aSua
imagern e sernelhanc;:a (Gn 1.26).
0 homem egerac;:ao de Deus (At
17.28). Embora, como o filho per-
dido da parabola, o homem tenha
fugido de sua casa paternal, rnes-
mo em seus mais distantes afasta-
rnentos ele acalenta uma memo-
ria de sua origem e finalidade. Em
sua mais profunda queda ele ain-
da conserva certos resquicios da
imagem de Deus segundo a qual
ele foi feito. Deus se revela fora do
homem; Ele se revela tarnbem
dentro do homem. Ele nao deixa
o corac;:ao e a consciencia humana
sem testemunho de si mesmo.
Essa revelac;:ao de Deus nao
deve ser considerada como uma
segunda revela<;ao, suplemen-
tando a primeira. Ela nao e urna
A REVELA<;:Ao G ERAL
fonte de conhecimento indepen-
dente da primeira. Ela e uma ca-
pacidade, uma sensibilidade, uma
direc;:ao para encontrar Deus em
Suas obras e entender Sua revela-
c;:ao. Euma consciencia do divino
em n6s que nos torna capazes de
ver o divino fora de n6s mesmos,
assim como o olho nos torna ca-
pazes de detectar luz e cor, e o
ouvido nos habilita a perceber os
sons. Trata-se, como disse Calvina,
de urn senso de divindade, ou,
como Paulo o descreveu, de uma
habilidade para ver as coisas invi-
siveis de Deus, isto e, Seu eterno
poder e dominio, nas coisas visi-
veis da criac;:ao.
Quando n6s tentamos anali-
sar esse senso de divindade nao
criado pelo homem, descobrimos
que ele consiste de dois elementos.
Em primeiro lugar, o senso de de-
pendencia absoluta e caracteristi-
co dele. Por baixo de nossa mente
e vontade, por baixo de nosso pen-
samento e ac;:ao, haem n6s uma
auto consciencia que e interde-
pendente com nossa propria exis-
tencia e parece coincidir com ela.
Antes de pensarmos, antes de de-
sejarmos, n6s somos, n6s existi-
mos. N6s existimos de uma forma
definida, e em unidade indissoluvel
com essa existencia n6s temos uma
nor;fio de existencia e uma nor;fio de
existirmos como somos. Eo nucleo
dessa identificac;:ao de auto exis-
tencia e auto consciencia eo senti-
menta de dependencia. No mais
45
profunda de nosso ser n6s somos,
sem auxilio da razao e anterior a
razao, conscientes de n6s mesmos
como seres criados, limitados e de-
pendentes. N6s somos dependen-
tes de tudo ao nosso redor, de
tudo no mundo espiritual e mate-
rial. 0 homem e urn dependente
do universo. Alem disso ele e de-
pendente, junto com outras coisas
criadas, e de uma forma absoluta,
de Deus, que eo unico ser eterno
e verdadeiro.
Mas esse senso de divinda-
de tern mais urn elemento consti-
tuinte. Se o ser cujo poder causou
esse sentimento permanecer total-
mente indefinido, entao esse seria
urn sentimento que conduziria o
homem a uma revolta impotente
ou a uma resignac;:ao est6ica, pas-
siva. Mas esse senso de divinda-
de tern em si urn senso da nature-
za daquele ser de quem o homem
se sente dependente. Eurn senso
do mais elevado e absoluto poder,
mas nao de uma forc;:a cega, irra-
cional, imperturbavel e impassiva,
equivalente ao destino ou a
necessidade. Mais do que isso, e
urn senso de uma forc;:a suprema,
que e tambem perfeitamente
justa, sabia e boa. Eurn senso de
urn poder eterno, mas tambern de
dominio, ou seja, absoluta perfei-
c;:ao de Deus. Portanto, esse senti-
menta de dependencia nao impli-
ca em desanimo e desespero em
nossa fraqueza, mas impele o ho-
mem areligiao, a servir e honrar
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
a Deus. Em outras palavras, a de-
pendencia da qual 0 homem e
consciente e urn tipo muito espe-
cial de consciencia do ser divino.
Ela contem em si o elemento de
liberdade. Essa nao e a dependen-
46
cia de urn escravo, mas de urn fi-
lho, embora seja de urn filho per-
dido. Esse senso de divindade,
portanto, como disse Calvino, e a
semente da religiao.
CAPITULO
~
0 VALOR DA REVELA<;Ao GERAL
A
o determinarmos o valor
da revelac;ao geral corre-
mos o risco tanto de
superestima-la quanto de
subestima-la. Quando n6s nos
concentramos detidamente sobre
as riquezas da Grac;a com a qual
Deus nos deu Sua revelac;ao espe-
cial, n6s costumamos ficar tao en-
cantados com ela que a revelac;ao
geral acaba perdendo seu signifi-
cado e merito para n6s. Por outro
lado, quando refletimos sobre a
bondade, a verdade e a beleza que
ha na revelac;ao geral de Deus na
natureza e na hist6ria da humani-
dade, pode acontecer que a Gra-
c;a especial, manifesta a n6s na
pessoa e obra de Cristo, perca sua
gloria e apelo aos olhos da alma.
Esse perigo de extraviar-se
para a esquerda ou para a direita
sempre existiu na igreja Crista, e
vez por outra a revelac;ao geral e
a revelac;ao especial sao ignoradas
47
ou negadas. Cada uma por sua
vez tern sido negada na teoria e
nao menos fortemente na pratica.
No presente a tentac;ao de se fa-
zer injustic;a arevelac;ao geral nao
etao forte quanto foi no passado.
Muito mais forte, contudo, eaten-
tac;ao, que se aproxima por todos
os lados, de reduzir a revelac;ao
especial aos mais estreitos limi-
tes, por exemplo, a pessoa de
Cristo, ou pior ainda, negar tudo
e fazer da pessoa de Cristo uma
parte da revelac;ao geral.
N6s temos que estar atentos
a essas duas tendencias; e n6s se-
remos mais prudentes se, aluz da
Sagrada Escritura, considerarmos
a hist6ria da humanidade e dei-
xarmos que ela nos ensine o que
OS povos devern a revelac;ao ge-
ral. Isso deixara claro para n6s
que, possuindo a luz dessa reve-
lac;ao, os homens tern realizado
grandes empreendimentos, em-
Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista
bora seu conhecimento e habilida-
de em outras areas encontre limi-
tes intransponiveis.
Quando o primeiro homem
e a primeira mulher transgredi-
ram a ordem de Deus no paraiso
sua puni<;ao nao foi imediata e
nem foi aplicada com total inten-
sidade. Eles nao morreram no
mesmo instante em que pecaram,
mas permaneceram vivos; eles
nao foram enviados para o infer-
no, mas receberam uma missao
para cumprir na terra; sua linha-
gem nao pereceu: eles receberam
a promessa da semente da mu-
lher. Em resumo, podemos dizer
que com o primeiro pecado hou-
ve o surgimento de uma condi<;ao
que Deus fixou, mas que o homem
nao era capaz de prever. Essa con-
di<;ao possui urn carater muito
especial. Enela que c6lera e Gra-
<;:a, puni<;:ao e ben<;:ao, julgamento
e longanimidade estao mesclados
uns com os outros. Essa e a con-
di<;ao que ainda existe na nature-
za e entre os homens e que abran-
ge os mais bern delineados con-
trastes.
N6s vivemos em urn mun-
do estranho, urn mundo que nos
apresenta tremendos contrastes.
0 alto eo baixo, o grandee ope-
queno, o sublime e o ridiculo, o
bonito eo feio, o tragico eo c6mi-
co, o berne o maC a verdade e a
mentira; tudo isso e encontrado
em urn inter-relacionamento in-
sondavel. A seriedade e a vaida-
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de da vida se agarram a n6s. Em
urn momento n6s estamos incli-
nados ao otimismo, e no momen-
to seguinte ao pessimismo. 0 ho-
mem que chora esta constante-
mente dando motivos ao homem
que ri. 0 mundo todo conserva o
born humor, que poderia ser me-
lhor descrito como urn sorriso
entre lagrimas.
A causa mais profunda des-
se presente estado do mundo e
essa: por causa do pecado do ho-
mem Deus esta constantemente
manifestando Sua ira e, ao mes-
mo tempo, movido pelo Seu pro-
prio prazer, revelando tambem
Sua Gra<;:a. N6s somos consumi-
dos pela Sua ira e saciados com a
Sua benignidade (Sl90. 7)4). Nao
passa de urn momento a Sua ira;
o Seu favor dura a vida inteira. Ao
anoitecer, pode vir o choro, mas a
alegria vern pela manha (Sl30.5).
A maldic,;ao e a benc,;ao sao tao sin-
gularmente interdependentes
que as vezes uma parece transfor-
mar-se em outra. Trabalhar no
suor do rosto e maldi<;ao e tam-
bern e benc,;ao. Tanto a maldic,;ao
quanta a benc,;ao apontam para a
cruz, que e ao mesmo tempo 0
mais alto julgamento e a Grac,;a
mais rica. Isso acontece porque a
cruz e o centro da hist6ria e a re-
concilia<;ao de todas as antiteses.
Essa condi<;ao teve inicio
imediatamente depois da queda
e, durante o primeiro periodo,
isto e, ate a chamada de Abraao,
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  • 1.
  • 2. Autor: HERMANN BAVINCK (1854 -1921) Bavinck pastoreou a Igreja Reformada em Franeker, foi Professor titular de Teologia Sistematica em Kampem e finalmente da Universidade Livre de Amsterda. Bavinck apresentou, atraves de sua pena, diversos assuntos da mais alta importancia sobre: educa<;ao, etica, familia, psicologia etc., sendo sua obra Reformed Dogmatics (Gereformeerd Dogmatiek), segundo os crfticos, a mais relevante. Bavinck, na sua piedade e estilo de vida, influenciou muitos te6logos, holandeses e norte-americanos da linha reformada, entre eles Louis Berkhof.
  • 3. FUNDAMENTOS TEOLOGICOS DA FE CRISTA Autor: Hermann Bavinck Professor Titular de Teologia, Universidade Livre de Amsterda Traduzido do Ingles por Vagner Barbosa
  • 4. ~ TEOLOGIA SISTEMATICA Autor: Hermann Bavinck Tradutor: Vagner Barbosa Revisores: Ademar de Oliveira Godoy e Loyde Wenzel de Paula Editor Responsavel: Arival Dias Casimiro Setembro de 2001 Dados Internacionais de Catalogaao na Publicaao (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Bavinck, Hermann B354r Our reasonable faith. Traduzido da edi<;:ao holan- desa, magnalia Dei, por Henry Zylstra. Grand Rapids: Baker Book House, 1977. 559 p. 1. Teologia Sistematica. 2. Doutrina Crista. I. Titulo. CDD-230 Copyright© 2001 por SOCEP Fica explicitamente proibida qualquer forma de reprodw;:ao total ou parcial deste livro, sem o expresso consentimento dos editores. Todos os direitos reservados por SOCEP Sociedade Crista Evangelica de Publicac;;oes Ltda. Rua Floriano Peixoto, 103- Centro Caixa Postal 98 - CEP 13450-970 E-mail: socep@socep.com.br Tel/Fax: 55 Oxx19- 3459.2000 Santa Barbara d'Oeste- SP -Brasil Impressao e Acabamento: Imprensa da Fe- SP Prodw;ao e Diagramar;ao: Propaganda, Marketing e Editora~ao Tel.: 19-3455.7422 Filiadoa:
  • 5. PREFACIO A TRADU<;AO BRASILEIRA 0 pensamento calvinista vi- veu, no seculo XIX, uma fase de reavivamento e expansao. Nos Estados Unidos, o Semi- nario de Princeton foi o principal centro de forma<;:ao e difusao do calvinismo, Velha Escola, nas Americas. Archibald Alexander (1772-1851), Charles Hodge (1797- 1878), Archibald Alexander Hodge (1823-1886) e Benjamin B. Warfield (1851-1921), respectiva- mente, foram os mestres formu- ladores da Velha Teologia de Princeton. Os principais elemen- tos dessa teologia foram: a aceita- c;ao da inspirac;ao plena da Biblia e a sua infalfvel autoridade; a ado- <;:ao do metodo indutivo para a sis- tematiza<;:ao teol6gica; o ensino da ciencia subordinado ateologia; a defesa da fe ou do ensino bfblico confessional como urn clever pas- toral. 5 0 protestantismo brasileiro foi, na sua origem, moldado pelo calvinismo norte-americana, da Velha Escola. As obras: Teologia Sistematica, (3 volumes) de C. Hodge e Esbo~os de Teologia, de A. A. Hodge foram utilizadas como texto principal na forma<;:ao de pastores brasileiros. Atualmente, essas obras estao traduzidas para o portugues. Herman Bavinck (1854 - 1921) foi, no final do seculo XIX, juntamente com Abraham Kuy- per, urn te6logo de destaque no reavivamento neocalvinista na Igreja Reformada Holandesa. Foi professor de teologia sistematica no Seminario Teol6gico em Kapen (1882-1902) e na Universidade Li- vre de Amsterdam (1902-1920). A sua principal obra foi Gerefor- meerde Dogmatiek, Dogmatica Re- formada, em quatro volumes, ori- ginalmente publicados entre 1895
  • 6. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista e 1901, dos quais somente o segun- do volume foi traduzido para o ingles como A Doutrina de Deus. Nao existe nenhuma obra de Bavink traduzida para o portugu- es. Bavinck influenciou profunda- mente muitos te6logos reforma- dos, holandeses e norte-america- nos, sendo Louis Berkho( o mais conhecido no Brasit por causa da sua Teologia Sistematica. Para Bavinck, a teologia era o estudo sistematico do conheci- mento de Deus, revelado em Cris- to e na Biblia, e resumido pela Igreja por meio dos credos, cate- cismos e confiss6es. Segundo ele, a religiao, o temor de Deus, deve ser o elemento que inspira e anima n in- vestigar;iio teol6gica. Isso deve mar- car a cadencin da ciencia. 0 te6logo e uma pesson que se esforr;a pnra falar sabre Deus. Professar a teologia eum trnbnlho santo. E realizar umn 6 ministrar;iio sacerdotal na casa do Se- nhor. Isso epar si mesmo um servir;o de culto, uma consagrar;iio da mente e do corar;iio em honra ao Seu nome. A SOCEP - Sociedade Cris- ta Evangelica de Publica<;:6es Ltt:la., de forma pioneira e inedi- ta, traz ao publico brasileiro, o pensamento de Bavinck. A obra Teologia Sistenuitica: Os Funda- mentos da Fe Crista, traduzida do ingles, Our Rensonable Faith, e uma sintese do pensamento teo16gico de Bavinck, apresentada de ma- neira simples, profunda e pasto- ral. Agradecemos ao rev. Her- minsten Maia Pereira da Costa pela c6pia em ingles. A SOCEP pelo grande investimento e valio- sa contribui<;:ao aos continuadores do calvinismo no Brasil. Arival Vias Casimiro
  • 7. PREFAcio AEoic;Ao EM INGLES A queles que estao familia- rizados com a hist6ria das igrejas Reformadas da Holanda- isto e, das gereformeerde como distintas das Hervormde Kerken- saberao que entre os her- deiros da Afscheiding de 1834 e a Dolenntie de 1886 nao ha nomes tao estimados quanto os de Abraham Kuyper e Hermann Bavinck. Eles foram figuras her6i- cas de realizac;:oes gigantescas no trabalho cristao. Suas carreiras, re- alizadas praticamente ao mesmo tempo, no final do seculo XIX e no comec;:o do seculo XX devem ser consideradas como urn favor es- pecial de Deus em beneficia do Cristianismo Hist6rico tanto na Europa quanto no N<1vo Mundo. Esses dois homens, que com o tempo chegaram a ser mencio- nados juntos como partidarios da causa da Reforma na Holanda, tern sido frequentemente compa- 7 rados e contrastados. Alguns os diferenciam da seguinte forma: "Em Kuyper n6s temos urn exem- plo de genio brilhante, em Bavinck urn exemplo de talento mentalmente preciso e de julga- mento esclarecido". 0 Rev. J. H. Landwehr, primeiro bi6grafo de Bavinck, aponta outro contraste: Bavinck tinha urn espirito Aristotelico, enquanto Kuyper ti- nha urn espirito Platonico. Bavinck era o homem do conceito claro e preciso, enquanto Kuyper era o homem da ideia produtiva. Bavinck trabalhou com dados his- t6ricos; Kuyper trabalhou espe- culativamente por meio da intui- c;:ao. Bavinck tinha espirito carac- teristicamente indutivo; Kuyper tinha mente de natureza dedu- tiva. Esses dois homens se complementaram no renasci- mento da vitalidade do Calvinis- mo na vida e no pensamento da
  • 8. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista Holanda do seculo XIX. Hermann Bavinck nasceu em 13 de dezembro de 1854. 0 centenario de seu nascimento foi grandemente celebrado na Holanda em 1954, e a natureza e o escopo de suas contribui~5es foram revistas com grande apre- ~o. Bavinck nasceu na cidade de Hoogeveen na provincia de Drenthe. Seu povo veio originari- amente do condado de Bentheim. Seu pai, o Rev. Jan Bavinck, foi urn ministro das igrejas que em 1834 se interessaram em manter a pura tradi~ao do Cristianismo Hist6ri- co separada da Igreja do Estado da Holanda. 0 jovem Bavinck alcan~ou distin~ao como estudante de urn colegio em Zwolle e foi para a Es- cola Teol6gica de sua igreja em Kampben. Ali ele permaneceu por apenas urn ano. Ele quis ir para Leiden para realizar seus estudos teol6gicos superiores. Leiden deu a ele pelo menos duas coisas: urn grande respeito pela erudi~ao e uma confronta~ao, em primeira mao, com a moderna teologia li- beralmente afetada. Essas duas li- ~5es foram de grande importan- cia para ele. 0 ideal de uma eru- di~ao teologicamente s6lida para o Cristianismo Reformado orto- doxo permaneceu firme em sua vida no decorrer de toda a sua car- reira. Seu conhecimento profundo sobre os mais novos pensamentos religiosos serviu para aprofundar 8 suas convic~5es Calvinistas e ha- bilitou-o a elaborar uma teologia realisticamente voltada para os problemas de seu tempo. Em 1880 ele se graduou em Leiden, tendo feito sua disserta~ao sobre a etica de Ulrico Zwinglio. Ele trabalhou como ministro de uma igreja em Franeker por urn ano, e foi entao nomeado Profes- sor de Dogmatica na Escola Teo- 16gica de Kampben. 0 assunto de sua aula inicial, "A Ciencia da San- ta Divindade" (De Wetenschap der Heilige Godgeleerdheid, 1882), fasci- nou-o durante toda a sua vida. Durante a decada de seus arduos estudos e ensino eficaz em Kampben, Bavinck tres vezes foi convidado para lecionar teologia na Universidade Livre de Amster- da. Ele s6 aceitou depois do ter- ceiro convite, e s6 depois de satis- fazer sua consciencia (veja sua brochura Decline or Accept [Blijven of Heengaan], Kampben, 1902) de que isso nao prejudicaria a inte- gridade da educa~ao teol6gica em sua igreja. Foi s6 quando Abraham Kuyper trocou a pasta de catedratico em Amsterda pela pasta de Ministro no governo de Hague que Bavinck tornou-se seu sucessor em Amsterda. Bavinck era primariamente o te6logo, o dogmatico. Sua magnus opus sao os quatro volu- mes de sua Reformed Dogmatics (Gereformeerde Dognwtiek). Essa obra foi o fruto de seu trabalho em
  • 9. PREFAcro Kampben, surgindo primeira- mente durante os anos 1895-1901 e, depois, em uma forma revisa- da, em 1906-1911. Urn volume de sua obra, A Doutrina de Deus, edi- tado e traduzido pelo Dr. W. Hendriksen, foi publicado em Grand Rapids em 1951. 0 presen- te volume, Os Fundamentos de Nos- sa Fe, escrito em 1909 como a Magnalia Dei (As Maravilhosas ~h·as de Deus), e um resumo de ~:_:a Dogmatica em quatro volu- ::-:'.<:?5. Os Fundamentos,de Nossa Fee =~cc?nos tecnico, menos exclusiva- =~1ente profissionat mais intenci- ~nalmente popular do que a ~ .-gmfr.tica, e e mais amplamente .::.:11parado por referencias da Es- -::'·~tura, mas e, como a obra mai- =·:·. urn livro de dogmatica Crista ·~, Asica. Ele apresenta claramente e 2:11 fina perspectiva as doutrinas ~·,n--.damentais do ensino bfblico. Alguns tern dito que Bavinck foi mais urn fil6sofo do que urn te6logo. Everdade que sua filosofia exibe a disciplina do treinamento e da informa<;ao de urn fil6sofo, mas o que ele queria ser antes de tudo era urn te6logo Escrituristico. Ecomo Landwehr disse: II Assim como Calvino ex- traiu seus pensamentos da Escri- tura, Bavinck tambem sempre se inclinou sobre a Escritura para extrair dela as suas ideias, e sem- pre foi guiado pela Escritura em sua sistematizac;:ao de seus ensi- nos". Alem disso, em seu exerci- 9 cio teol6gico ele nao era o espec- tador imparcial que observava descomprometidamente a reali- dade da religiao. Em sua aula inaugural em Amsterda, Religiiio e Teologia, ele disse: Religiao, o temor de Deus, deve ser o elemento que inspira e anima a investigac;:ao teol6gica. Isso deve marcar a cadencia da ciencia. 0 te6logo e uma pessoa que se esforc;:a para falar sobre Deus porque ele fala fora de Deus e por meio de Deus. Professar a teologia e fazer urn trabalho san- to. Erealizar uma ministrac;:ao sa- cerdotal na casa do Senhor. Isso e por si mesmo urn servic;:o de cui- to, uma consagrac;:ao da mente e do cora<;ao em honra ao Seu nome. Foi dessa forma que Bavinck conduziu sua carreira. Seu primei- ro bi6grafo, Landwehr, registra como ele agia na sala de aula: A lic;:ao, ele diz, transformava-se em urn sermao, pois o professor fica- va comovido com a verdade. A maioria de seus bi6grafos registra as palavras por ele pronunciadas na fase terminal da doenc;:a que o matou: II Agora minha erudic;:ao de nada me vale, nem minha Dogmatica: S6 a minha fe pode me salvar". Com essa afirma<;ao ele nao estava depreciando toda uma vida de esforc;:o no estudo te- ol6gico, estava apenas indicando a correta ordem de importancia.
  • 10. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista Quando o Dr. J. C. Rullmann submeteu seu artigo sobre Bavinck ao Christelijke Ency- clopaedie em 1925, ele percebeu que dificilmente poderia explicar a obra de Bavinck melhor do que fazendo uma cita<;:ao do colega de Bavinck na Universidade Livre, Dr. W. J. Geesink. Essa cita<;:ao tambem sera litil para n6s. Dr. Geesink disse - ele estava, natu- ralmente, usando o idioma holan- des: Como professor, Bavinck es- taria no lugar mais elevado de qualquer faculdade de qualquer universidade. Sua tremenda eru- di<;:ao e sua vasta leitura tornaram- no ricamente expressivo na sala de aula. Sendo urn erudito profundo e entusiasmado, ele tinha o dom de descobrir problemas, e quan- do ele os descobria, ele os levava ao conhecimento de sua audien- cia em termos compreensiveis. Se ele tivesse a solu<;:ao, ele tambem a dividia com seus ouvintes, nun- ca de forma apressada, mas pau- sadamente e com calma. E se ele ainda nao tivesse a solu<;:ao, sua erudi<;:ao honesta conservava-o distante daquilo que era ilus6rio, e que faria com que urn problema fosse resolvido as custas da cria- <;:ao de outro. E com seu respeito pela 16gica e com sua minuciosa disciplina na escola ele sabia mui- to bern como afastar os perigos do irracionalismo mesmo sabendo 10 que ha problemas que nao podem ser resolvidos. Como te6logo e dogmatico por profissao, Bavinck seguiu Calvino em sua teologia Reforma- da. Fazendo isso, e levando em conta, apesar de nao sem critica e reserva, sua erudi<;:ao moderna e seu conhecimento, ele ajudou a ti- rar a teologia Reformada do processo de endurecimento e fossiliza<;:ao no qual estava inserida desde cerca de 1750... As- sim como Agostinho, que ele co- loca na vanguarda de todos os pensadores antes e depois do quarto seculo, procurou na filoso- fia da revela<;:ao uma resposta para os problemas da vida e do mun- do - por uma resposta, deve ser dito, que satisfa<;:a tanto o cora<;:ao quanto a mente. Bavinck escreveu urn im- pressionante numero de obras substanciais nas areas de religiao e teologia, filosofia e etica pratica, e, de forma especial, tambem psicologia e teoria da educa<;:ao. A bibliografia de sua obra publicada, que inclui alem de toda a extensao das muitas palestras inaugurais e outras palestras aca- demicas que ele deu, mas que nao incluem seu movimentado traba- lho jornalistico, ocupam cerca de sessenta itens na tabela de Landwehr. Na area de religiao e teologia, as seguintes obras devem ser mencionadas alem da
  • 11. PREFAC!O Dogmatica Reformada e Os Funda- mentos de Nossa Fe. Em 1888 ele lan<;ou seu eterno cLissico sobre o ecumenismo intitulado A Cato- licidade do Cristianismo e a Igreja. (De Katholiciteit van Christendom en Kerk). Em 1894 ele deu uma pales- tra definitiva sobre urn tema pri- meiramente delineado por Calvino e tambem grandemente desenvolvido por Abraham Kuyper, chamado Grar;a Cormnn (De Algenreene Genade). Suas boni- tas meditac;:oes em 0 Sacrificio do Louvor (De Offerande des Lofs, 1901) ja estavam na sua sexagesima edi- <;ao na epoca de sua morte e fo- ram traduzidas para o ingles e publicadas nos Estados Unidos em 1922. Urn tipo de livro devocional, A Certeza da Fe (De Zekerheid des Geloofs), foi publica- do no mesmo ano. Importantes tambem sao suas palestras minis- tradas em 1911 intituladas Moder- nismo e Ortodoxia (Modernisme en Orthodoxie), e seu Clzamado e Rege- nerar;ao (Roeping en Wedergeboorte) de 1903. Entre seus livros mais filoso- ficamente orientados estao as Conferencias Stone de Princeton, proferidas em 1908 e publicadas em ingles no ano seguinte como A Filosofia da Revelar;flo: Etica para Hoje (Hedendaagsche Moraal, 1902), e as duas palestras filos6ficas de 1904 intituladas Filosofia Cristtl (C{nistelijke Wetenschap) e 0 Mun- do Cristiio e a Perspectiva de Vida 11 (Christelijke Wereldbeschou- wing). Urn tema que ocupou Bavinck por muito tempo e ao qual ele dedicou sua mais madu- ra reflexao foi a interliga<;ao entre a religiao e o ensino. Nenhuma institui<;ao de educa<;ao Crista ortodoxa de nivel superior pode ignorar suas varias publica<;oes sobre esse assunto: Religiflo e Di- vindade (Godsdienst en Godgeleer- dheid, 1902), Educar;flo e Teologia (Opleiding en Theologie, 1896), 0 Oficio do Doutor ou Professor de Te- ologia (Het Doctorenambt, 1899), A Autoridade da Igreja eaLiberdade da Ciencia (Het Recht der Kerken en de Vrijheid der Wetenschap, 1899), En- sino e Filosofia (Geleerdheid en Wetenschap, 1899), e A Escola Teo- l6gica e a Universidade Livre (Theologische School en Vrije Universiteit, 1899). Foi durante OS ultimos anos de sua vida profissional que Bavinck tornou-se expressivo nas duas mais elevadas esferas de vida e pensamento, que sao etica aplicada e psicologia aplicada a moral. Aprimeira categoria de in- teresse pertencem obras como 0 Papel da Mulher na Sociedade Moderna (De Vrouw in de Hedendaagsche Maatschappij, 1918), A Familia Crista, (Het Christelijke Huisgezim, 1908), A Irnitar;flo de Cristo na Vida Moderna (De Navolging van Christus in het Modern Leven, 1918), 0 Problema da Guerra, (Het Problem van den
  • 12. - - - - - - - - - - Fundamentos Teol6gicos da Fe Cristii Oorlog, 1915), e Cristianismo, Guer- ra, eaLiga das Nar;oes (Christendom, Oorlog, Volkenbond, 1920). Esta ul- tima obra nos mostra como Bavinck se interessava pelos pro- blemas do nosso seculo. Alem dis- so, deve ser dito que ele tinha urn fino "senso de sua propria epoca". Isso leva em conta sua pronunci- ada preocupac;ao com Psicologia e os principios de educac;ao. Em 1915 ele escreveu o tratado Sabre o Sub Consciente (Het Onbewuste), em 1897 Os Principios de Psicologia (Beginselen der Psycologie), e em 1920 a Psicologia Bfblica e Religiosa (Bijbelsche en Religieuse Psycologie). Sua maior obra sobre a teoria da educac;ao e Principios Pedag6gicos (Paedagogische Beginselen, 1904). Nao e de se admirar que essa area de estudos tenha atraido tanto sua atenc;ao. 0 livro Filosofia Educacio- nal de Hermann Bavinck, escrito pelo Dr. Cornelius Jaarsma (Grand Rapids, 1935) eo livro De Paedagogiek van Bavinck, escrito pelo Dr. L. Van der Zweep (Kampben, sem data) falam sobre lSSO. Hermann Bavinck visitou a America duas vezes; a primeira em 1892, quando foi convidado pela Alianc;a das Igrejas Reforma- das que adotam o Sistema Presbiteriano, para ministrar uma palestra em Toronto sobre o tema: "A Influencia da Reforma Protes- tante nas Condic;6es Morais e re- ligiosas das Pessoas e Nac;oes"; e 12 a segunda foi em 1908, quando ele demonstrou atraves de suas Con- ferencias Stone de Princeton que merecia ser considerado com Kuyper, Warfield, Hodge, e Orr como urn destacado te6logo Calvinista moderno. Na vida po- litica pratica ele era menos ativo do que Kuyper, sendo mais incli- nado afilosofia politica do que a politica. Ele era, contudo, urn membro da Casa Alta, represen- tando o sul da Holanda nos Esta- dos Gerais desde o anode 1911 em diante. Seus melhores servic;os nesta area de atuac;ao foram da- dos como consultor e conselheiro na area da educac;ao. A traduc;ao das suas obras para o ingles tern sido intermitente e dispersa. Des- sa forma, desde muito tempo, ape- nas 0 Sacrificio do Louvor, 0 Reina de Deus, A Filosofia da Revelar;ao eo pequeno tratado Evolur;ao estao disponiveis em lingua inglesa. Os Fundamentos de Nossa Fe e, por isso, urn importante incremento. Ai esta tambem uma biografia nao definitiva. Tres precursores ja es- creveram sobre isso. 0 primeiro foi J. H. Landwehr com seu In Memoriam, de 1921.0 segundo foi o Dr. V. Hepp como seu Hermann Bavinck, escrito tambem em 1921- o prometido segundo volume que da sequencia ao primeiro nunca foi escrito. 0 terceiro foi A. B. W. Kok, com seu Hermann Bavinck, de 1945. Uma boa quantidade de es- tudos peri6dicos holandeses tern
  • 13. PREFAcro analisado as ideias de Bavinck. Neste pais [USA] n6s temos, alem do livro do Dr. Jaarma, a nao publicada disserta<;ao de doutora- do em Princeton, do Dr. Anthony Hoekema da doutrina de Bavinck sobre o Facto. Podemos dizer que no con- junto de sua apologia pelo Cristi- anismo Escrituristico Reformado Bavinck tinha quatro influencias opostas em mente, sendo duas delas de fora e duas delas de den- tro da entao palida fe Reformada. As duas influencias externas eram o moderno liberalismo religioso e o Catolicismo Romano. As duas influencias internas eram uma or- todoxia formal moribunda por urn lado e o pietismo vazio de outro. Ele falou com frequencia e eloquencia contra todas essas for- <;as. Observe, por exemplo, o sen- timento e a perspectiva com que ele defendeu o envolvimento do mundo por urn Calvinismo uni- versal, em vez de uma fuga do mundo por urn pietismo sectario: N6s nao podemos ser uma seita. N6s nao podemos querer ser uma seita e nao podemos ser uma, a nao ser que neguemos o carater absoluto da verdade. Alem disso, 0 reino dos ceus nao e deste mun- do, mas exige que tudo neste mundo o sirva. Eexclusivo e ciu- mento, e se satisfaz quando nao ha urn reino independente ou neutro encostado nele. Naturalmente se- 15 ria muito mais facil abandonar essa era aos seus pr6prios cami- nhos, e procurar nossa for<;a ern urn sossegado retiro. Todavia, nem semelhante descanso nos e permitido aqui. Porque toda cria- tura e boa, e nada deve ser recu- sado se for recebido com a<;6es de gra<;:as, pois todas as coisas sao santificadas pela Palavra de Deus e ora<;:ao; portanto, a rejei<;:ao de qualquer criatura e ingratidao para com Deus, urn julgamento errado ou uma deprecia<;:ao de suas ben<;:aos e de suas dadivas. Nossa guerra deve ser conduzida somente contra o pecado. Ne- nhum problema que dificulte os relacionamentos entre os crentes em Cristo deve existir. Nenhum problema ou dificuldade virtual- mente sem solu<;:ao, seja de ordem social, polltica, e especialmente de ordern cientlfica, devern existir, nas quais nossa desconfian<;:a e fra- queza se apoiem orgulhosamente para tirar-nos da luta, talvez ate mesmo sob a alega<;:ao de rnotiva- <;:ao Crista, ou rejeitando a cultura de nosso tempo como demoniaca. Essa e uma das notas que Bavinck gostava de entoar em de- fesa da fe. Ele ensinava isso em sua palestra intitulada A Catolicidade do Cristianismo e a Igreja. Essa e uma afirma<;:ao representativa. "A fe", ele dizia, "tern a prornessa de vit6ria sobre o mundo". 0 Dr. Hepp muito apropriadamente es-
  • 14. Fu11dame11tos Teol6gicos da Fe Cristii creveu como conclusao da biogra- fia de Bavinck, as seguintes pala- vras: 0 que outrora foi dito sobre Calvino serve tarnbern para ele: A posteridade "nao pode encontrar rnelhor forma de honrar seu pio- 14 neiro e rnestre do que confessar corn o cora~ao e corn os Llbios: Dele, por Ele e para Ele sao todas as coisas. A Ele, pois, seja a gloria para sernpre". Agosto de 1955. Henry Zylstra
  • 15. ~ INDICE Prefacio aTradw;ao Brasileira ................................................................ 05 Prefacio aEdi<;:ao em Ingles ..................................................................... 07 1. 0 Maior Bern do Homem ................................................................. 17 2. 0 Conhecimento de Deus ................................................................ 25 3. A Revelac;:ao Geral ............................................................................. 33 4. 0 Valor da Revelac;:ao Geral ............................................................ 47 5. A Questao da Revelac;:ao Especial ................................................... 65 6. 0 Conteudo da Revela<;:ao Especial ................................................ 79 7. As Sagradas Escrituras ................................................................... 103 8. A Escritura e a Confissao .............................................................. 127 9. 0 Ser de Deus .................................................................................. 139 10. A Divina Trindade .......................................................................... 155 11. A Criac;:ao e a Providencia .............................................................. 175 12. A Origem, a Essencia eo Prop6sito do Homem ......................... 199 13. 0 Pecado e a Marte ......................................................................... 243 14. 0 Pacta da Grac;:a ............................................................................. 287 15. 0 Mediador da Alianc;:a .................................................................. 309 16. A Natureza Divina e a Natureza Humana de Cristo ................. 339 17. A Obra de Cristo em Sua Humilha<;:ao ......................................... 363 18. A Obra de Cristo em Sua Exaltac;:ao ............................................. 391 19. 0 Dom do Espirito Santo ............................................................... 423 20. A Vocac;:ao Crista ............................................................................. 443 21. A Justificac;:ao ................................................................................... 483 22. A Santificac;:ao .................................................................................. 515 23. A Igreja de Cristo ............................................................................ 563 24. A Vida Eterna .................................................................................. 597 15
  • 16.
  • 17. CAPITULO 1l 0 MAIOR BEM oo HoMEM D eus, e somente Deus, eo maior bern do homem. Em um sentido geral po- demos dizer que Deus e o maior bern de todas as Suas criaturas, pois Deus e o Criador e o Sustentador de todas as coisas, a fonte de todo o sere de toda a vida e a fonte inesgotavel da qual flui tudo o que e born. Todas as cria- turas devem sua existencia so- mente aquele que e o Ser unico, eterno e onipresente. Mas a ideia do mais eleva- do bern, geralmente inclui o pen- samento de que este bern e reco- nhecido e desfrutado como tal pelas pr6prias criaturas. Eclaro que esse nao e o caso das criatu- ras inanimadas e nao racionais. As criaturas inanimadas possuem apenas o ser, mas nao possuem o principio da vida. Outras criatu- ras, tais como as plantas, possu- em o principio da vida, mas sao 17 desprovidas de consciencia. Os animais, e verdade, possuem, alem de sua existencia e de sua vida, um certo tipo de conscien- cia, mas essa consciencia alcan<;:a apenas aquilo que pode ser visto ou sentido ao seu redor. Eles sao conscientes das coisas terrenas, mas nao das celestiais; eles tern consciencia da realidade, do pra- zer e da utilidade, mas nao pos- suem qualquer no<;:ao de verdade, bondade e beleza; eles possuem consciencia sensorial e desejo sen- sorial e, portanto, satisfazem-se com o que e sensorial e nao po- dem penetrar atraves da ordem espiritual. 0 caso do homem e diferen- te. Ele e a criatura que, inicialmen- te, foi criada a imagem e seme- lhan<;:a de Deus, e essa origem di- vina e essa marca divina nenhum erro pode destruir. Contudo ele perdeu, por causa do pecado, os
  • 18. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista gloriosos atributos de conheci- mento, justi<;a e santidade que es- tavam contidos na imagem de Deus. Todavia, esses atributos ainda estao presentes em "peque- nas reservas" remanescentes da sua cria<;ao; essas reservas sao su- ficientes nao somente para torna- lo culpado, mas tambem para dar testemunho de sua primeira gran- deza e lembra-lo continuamente de seu chamado divino e de seu destino celestial. Em todos os seus pensamen- tos e em todas as suas obras, em toda a vida e atividade do ho- mem, fica claro que ele euma cri- atura que nao pode ser plenamen- te satisfeita com o que o mundo fisico tern para oferecer. De fato ele eurn cidadao de uma ordem fisica, mas ele tambem se ergue acima dessa ordem para uma or- dem sobrenatural. Com seus pes firmemente plantados no chao ele levanta sua cabe<;a e lan<;a seu olhar para cima. Ele tern conheci- mento de coisas que sao visiveis e temporais, mas tambem tern consciencia de coisas que sao in- visiveis e eternas. Seu desejo vai alem do que eterreno, sensorial e transit6rio e alcan<;a tambem os bens celestiais, espirituais e eter- nos. 0 homem compartilha sua consciencia sensorial com os ani- mais, mas alem dessas qualida- des ele foi dotado de entendimen- to e razao, que o tornam capaz de 18 pensar e levantar-se acima do mundo de imagens sensoriais para urn mundo de pensamentos incorp6reos e para urn reino de ideias eternas. 0 pensamento e o conhecimento do homem, apesar de serem extraidos de seu cerebra, sao todavia em sua essencia uma atividade inteiramente espiritual, pois transcendem aquilo que ele pode ver e tocar. Atraves do pen- samento ele estabelece uma cone- xao com urn mundo que ele nao pode ver nem tocar, mas que e real e que possui mais realidades essenciais do que a corporalidade desta terra. 0 que ele realmente esta procurando nao euma reali- dade tangivel, mas a verdade es- piritual, a verdade que eunica, eterna e imperecivel. Seu enten- dimento s6 pode encontrar des- canso na absoluta verdade Divi- na. Como dissemos, o homem compartilha seu desejo sensorial com os animais. Consequente- mente, ele sente necessidade de comida e bebida, luz e ar, traba- lho e descanso, e ecompletamen- te dependente da terra para sua existencia fisica. Porem, acima desse nivel de desejos ele possui a vontade, que, dirigida pela sua razao e pela sua consciencia, pro- cura por bens maiores e mais ele- vados. 0 prazer e a utilidade, ape- sar de terem seu valor e seu lugar em seu tempo, nao podem satisfaze-lo totalmente; ele quer e
  • 19. 0 MAJOR BEM oo HoMEM procura urn bern que nao se torna born por causa das circunstanci- as, mas que e born em e atraves de si e para si mesmo, urn bern imuhivet espiritual e eterno. E novamente essa vontade s6 pode encontrar descanso nas ben<;aos absolutas e elevadas de Deus. Tanto a razao quanto a von- tade possuem, de acordo com o ensino das Sagradas Escrituras, sua raiz no cora<;ao do homem. Com rela<;ao ao cora<;ao o autor de Proverbios diz que deve ser guar- dado com toda a diligencia, pois dele procedem as saidas da vida (Pv 4.23). Assim como o cora<;ao no sentido fisico e 0 ponto de ori- gem e de for<;a propulsora da cir- cula<;ao do sangue, assim tam- bern, espiritual e eticamente ele e a fonte da mais elevada vida do homem, a sede de sua auto cons- ciencia, de seu relacionamento com Deus, de sua subserviencia aSua lei, enfim, de toda a sua na- tureza morale espiritual. Portan- to, toda a sua vida racional e volitiva tern seu ponto de origem no cora<;ao e e governada por ele. Agora n6s veremos, em Eclesiastes 3.11, que Deus colo- cou o mundo no cora<;ao do ho- mem1. Deus fez tudo formoso a seu tempo, e fez tudo acontecer no seu exato momento, no mo- mento que Ele tinha fixado para que acontecesse. Essa hist6ria no seu conjunto ou em suas partes se refere ao conselho de Deus e re- vela a gloria desse conselho. E Deus colocou o homem no meio deste mundo e colocou a eterni- dade no seu cora<;ao, de forma que ele nao encontrasse descanso nas manifesta<;oes visiveis e exter- nas, mas que procurasse conhecer os pensamentos eternos de Deus no curso temporal da natureza e da hist6ria. Esse desideriunr aeternitatis, essa ansia por uma ordem eterna, que Deus plantou no cora<;ao do homem, no mais intimo esconde- rijo do seu ser, no centro de sua personalidade, e a causa do fato indiscutivel de que nem mesmo tudo que pertence aordem tem- poral pode satisfazer o homem. Ele e urn ser sensoriat terreno, li- mitado e mortal, mas ainda e atra- ido para a eternidade e destina- do a ela. Nao ha proveito para o homem que possui uma boa es- posa, filhos, casas e campos, te- souros e propriedades, ou mesmo o mundo todo, se perder a sua alma (Mt 16.26). Nem mesmo o mundo todo pode ter o mesmo valor de urn homem. Ninguem e tao rico que possa por qualquer meio redimir a alma de seu ir- mao, nem dar a Deus uma razao para que fa<;a isso; a reden<;ao da alma e preciosa demais para que seja alcan<;ada por qualquer 7 A edi9ao de Almeida diz que Deus colocou nctemidade 110 cora9ao do lwmem (N doT). 19
  • 20. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista criatura (Sl49.7-9). * * * * * Como geralmente acontece, muitas pessoas estao plenamen- te dispostas a admitir isso logo que os prazeres sensoriais e os tesouros terrenos sao citados. Elas prontamente reconhecem que es- sas coisas nao podem satisfazer o homem e nao correspondem ao seu destino elevado. Mas seu jul- gamento e mudado logo que OS assim chamados valores ideais - ciencia, arte, cultura, o exercicio da fidelidade, a bondade, a bele- za, a dedicac;ao da vida em favor do proximo, e o desejo de servir ahumanidade- sao colocados em cena. Porem, todas essas coisas tambem pertencem ao mundo do qual as Escrituras dizem que e passageiro (1 Jo 2.17). A ciencia, o conhecimento, e o aprendizado certamente sao boas dadivas, que descem do Pai das Luzes, e portanto devem ser levadas em alta estima. Quando Paulo chama a sa- bedoria do mundo de loucura di- ante de Deus (1 Co 3.19), e quan- do ele em outro lugar nos adver- te contra a filosofia (Cl 2.8), ele tern em mente a falsa e inutil su- posta sabedoria que nao reconhe- ce a sabedoria de Deus em sua revelac;ao geral e em sua revela- c;ao especial (1 Co 1.21) e que se tornou nula em seus pr6prios ra- 20 ciocinios (Rm 1.21). Mas no restan- te, Paulo e as Sagradas Escrituras, em sua totalidade, colocam o co- nhecimento e a sabedoria em urn plano de grande importancia. E nao poderia ser de outra forma, pois a Biblia afirma que Deus e sabio, que Ele tern conhecimento perfeito de Si mesmo e de todas as coisas, que pela Sua sabedoria Ele estabeleceu o mundo, que Ele manifesta a Sua multiforme sabe- doria a Igreja, que em Cristo es- tao escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento, e que o Espirito e o Espirito da sabedoria e do conhecimento, que perscruta ate mesmo as profundezas de Deus (Pv 3.19; Rm 11.33; 1 Co 2.10; Ef3.10; Cl2.3). Urn livro do qual procedem mensa- gens como essas nao pode subes- timar o conhecimento nem pode desprezar a filosofia. Pelo contra- rio, nele aprendemos que a sabe- doria e mais preciosa do que pe- rolas, e tudo o que podemos de- sejar nao pode ser comparado a ela (Pv 3.15); ela e urn dom daque- le que e o Deus do conhecimento (Pv 2.6; 1 Sm 2.3). 0 que a Escritura exige e urn conhecimento cuja origem seja o temor do Senhor (Pv 1.7). Quan- do essa conexao com o temor de Deus erompida, o nome de co- nhecimento e mantido, embora sob falsas pretensoes, mas ele vai se degenerando gradualmente ate se transformar em uma sabe-
  • 21. 0 MAJOR BEM DO HOMEM doria mundana, que e loucura diante de Deus. Qualquer ciencia, filosofia ou conhecimento que pense poder se manter sobre suas proprias pressuposic;:oes e que pode tirar Deus de considerac;:ao, transforma-se em seu proprio oposto, e qualquer pessoa que construa suas expectativas sobre isso ficara desiludida. Isso e facil de ser entendido. Em primeiro lugar, a ciencia e a filosofia sempre possuem urn ca- rater especial e podem tornar-se acessiveis a poucas pessoas. Es- sas pessoas privilegiadas, que podem dedicar toda a sua vida a disciplina do aprendizado, po- dem conhecer apenas uma peque- na parte do todo, permanecendo, assim, estranhos ao restante. Qualquer que seja a satisfac;:ao que o conhecimento possa dar, todavia, ele nunca podera, devi- do ao seu carater especial e limi- tado, satisfazer as necessidades profundas que foram plantadas na natureza humana na criac;:ao, e que estao presentes em todas as pessoas. Em segundo lugar, a filoso- fia, que depois de urn periodo de decadencia entra em periodo de fortalecimento, sempre cria uma expectativa extraordinaria e exa- gerada. Nessas epocas ela vive a esperanc;:a de que atraves de uma seria investigac;:ao ela resolvera o enigma do mundo. Mas sempre depois dessa fervente expectativa 21 chega a velha desilusao. Em vez de diminuir, os problemas au- mentam com os estudos. 0 que parece estar resolvido vern a ser urn novo misterio, eo fim de todo o conhecimento e entao novamen- te a triste e as vezes desespera- dora confissao de que o homem caminha sobre a terra em meio a enigmas, e que a vida e o destino sao urn misterio. Em terceiro lugar, e born lembrar que tanto a filosofia quanto a ciencia, mesmo que pu- dessem chegar muito mais longe do que chegam agora, ainda as- sim nao poderiam satisfazer o co- rac;ao do homem, pois o conheci- mento sem a virtude, sem a base moral, torna-se urn instrumento nas maos do pecado para conce- ber e executar grandes males, e assim a cabec;:a que esta cheia de conhecimento passa a trabalhar para urn corac;:ao depravado. Nes- se sentido o apostolo escreve: Ainda que eu tenha o dom de pro- fetizar e conhec;:a todos os miste- rios e toda a ciencia; e ainda que eu tenha tamanha fe a ponto de transportar montes, se nao tiver amor, nada serei (1 Co 13.2). 0 mesmo e verdade com re- lac;:ao a arte. A arte tambern e urn dom de Deus. Como o Senhor nao e apenas verdade e santidade, mas tambern gloria e expande a bele- za de Seu nome sobre todas as Suas obras, entao e Ele, tambem, que, pelo Seu Espirito, equipa os
  • 22. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista artistas com sabedoria e entendi- mento e conhecimento em todo tipo de trabalhos manuais (Ex 31.3; 35.31). A arte e, portanto, em primeiro lugar, uma evidencia da habilidade humana para criar. Essa habilidade e de carater espi- ritual, e da expressao aos seus profundos anseios, aos seus altos ideais, ao seu insaciavel anseio pela harmonia. Alem disso, a arte em todas as suas obras e formas projeta urn mundo ideal diante de nos, no qual as discordias de nossa existencia na terra sao subs- tituidas por uma gratificante har- monia. Desta forma a beleza reve- la o que neste mundo caido tern sido obscurecido asabedoria mas esta descoberto aos olhos do ar- tista. E por pintar diante de nos urn quadro de uma outra e mais elevada realidade, a arte e urn conforto para nossa vida, levanta nossa alma da consterna<;:ao e en- che nosso cora<;:ao de esperan<;:a e alegria. Mas apesar de tudo o que a arte pode realizar, e apenas na imagina<;:ao que nos podemos desfrutar da beleza que ela reve- la. A arte nao pode fechar o abis- mo que existe entre o ideal e o real. Ela nao pode transformar o alem de sua visao no aqui de nos- so mundo presente. Ela nos mos- tra a gloria de Canaa adistancia, mas nao nos introduz nesse pais nem nos faz cidadaos dele. A arte e muito, mas nao e tudo. Ela nao 22 e, como urn homem distinto uma vez a chamou, a coisa mais nobre e mais santa, a (mica religiao e a unica salva<;:ao do homem. A arte nao pode perdoar pecados. Ela nao pode nos limpar de nossa sujeira. E ela nao e capaz de en- xugar nossas lagrimas nos fracas- sos da vida. Quanta a cultura, civiliza- <;ao, humanitarismo, vida social, ou seja la como voce quiser cha- mar/ tambem nao e 0 mais eleva- do bern do homem. Sem duvida nos podemos falar de urn tipo de progresso nas ideias humanitari- as, e de urn desenvolvimento da filantropia. Quando nos compara- mos como o pobre e o doente, o miseravel eo indigente, as viuvas e os orfaos, os loucos e os prisio- neiros eram freqiientemente trata- dos em tempos anteriores e como eles sao tratados agora, nos certa- mente temos motivo de alegria e de gratidao. Urn espirito de afeto e de misericordia tern vindo sa- bre aqueles que procuram os per- didos e demonstram compaixao pelos oprimidos. Mas, ao mesmo tempo em que isso acontece nos presenciamos uma tao medonha suntuosidade de horriveis vicios, de mamonismo, de prostitui<;ao, alcoolismo e abomina<;6es seme- lhantes, que somas constrangidos a perguntar se estamos nos mo- vendo para frente ou para tras. Em urn momenta n6s somas oti- mistas, mas no momenta seguin-
  • 23. 0 MAIOR BEM oo HoMEM te somos mergulhados novamen- te em urn pessimismo profunda. Seja como for, uma coisa e certa: Se a vida de servi<;o ahu- manidade e de amor ao proximo nao for baseada na lei de Deus, ela perde sua for<;a e seu carater. Alem disso, o amor ao proximo nao e uma especie de auto peni- tencia que surge espontilnea e na- turalmente do cora<;ao humano. E urn sentimento, ou melhor, e uma a<;ao, e urn servi<;o que requer uma tremenda for<;a de vontade e que deve ser sempre sustentado contra as imensas fon;as da preo- cupa<;ao por si mesmo e da busca dos proprios interesses. Alem dis- so, o amor ao proximo frequen- temente encontra pouco suporte no proximo. As pessoas geral- mente nao sao tao amaveis a pon- to de nos podermos, naturalmen- te, sem esfor<;o e luta, aprecia-las e ama-las como amamos a nos mesmos. Alem disso, o amor ao proximo so pode ser sustentado se, por urn lado, ele e baseado na lei de Deus e, por outro lado, se Deus nos concede o desejo de vi- ver honradamente de acordo com seus mandamentos. * * * * * A conclusao, portanto, e aquela de Agostinho, que disse que o cora<;ao do homem foi cria- do por Deus e que por isso ele nao pode encontrar descanso a nao ser 23 no corac;ao de Deus. Sendo assim, todos os homens estao procuran- do por Deus, mas eles nao o pro- curam da forma certa nem no lu- gar certo. Eles procuram aqui embaixo, mas Ele esta la em cima. Eles o procuram na terra, mas Ele esta no ceu. Eles o procuram lon- ge, mas Ele esta perto. Eles o pro- curam no dinheiro, na proprieda- de, na fama, no poder e na paixao; e Ele esta no alto e santo lugar, e tambem como contrito eo abati- do de espirito (Is 57.15). Mas eles o procuram como se, tateando, pudessem encontra-lo (At 17.27). Eles o procuram e ao mesmo tern- po fogem dele. Eles nao se inte- ressam em conhecer os seus cami- nhos, e nao podem faze-lo sem Ele. Eles se sentem atraidos a Deus e ao mesmo tempo repeli- dos por Ele. Nisso, como Pascal profun- damente observou, consiste a grandeza e a miseria humana. Ele anseia pela verdade e e falso por natureza. Ele anseia por descan- so e se lanc;a de uma diversao para outra. Ele suspira por uma felicidade permanente e eterna e se agarra a prazeres momentane- os. Ele procura por Deus e se per- dena criatura. Ele e urn filho nas- cido em casa e come as bolotas dos porcos em terra estranha. Ele abandonou a fonte de aguas vivas e cavou cisternas rotas, que nao retem as aguas (Jr 2.13). Ele e urn faminto que sonha que esta co-
  • 24. Fundamenfos Teol6gicos da Fe Crista mendo e quando acorda descobre que sua alma esta vazia; e e como urn homem sedento que sonha que esta bebendo, e quando acor- da descobre que esta fraco e que sua alma esta desfalecida (Is 29.8). A ciencia nao pode explicar essa contradi<;ao no homem. Ela reconhece apenas sua grandeza e nao sua miseria, ou apenas sua miseria e nao sua grandeza. Ela o eleva a grandes alturas ou o aper- - - - - - - - 24 ta em urn abismo, pois ela nao co- nhece a origem divina do homem nem sua queda. Mas as Escritu- ras conhecem tanto urn quanto o outro, e lan<;am sua luz sobre o homem e sobre a ra<;a humana; e as contradi<;6es sao desfeitas, a nevoa se esvai e as coisas ocultas sao reveladas. 0 homem e urn enigma cuja solu<;ao s6 pode ser encontrada em Deus.
  • 25. CAPITULO ~ 0 CONHECIMENTO DE DEUS D eus e 0 mais elevado bern do homem - esse e 0 tes- temunho de toda a Escri- tura. A Biblia come<;:a dizendo que Deus criou o homem asua propria imagem e semelhan<;:a para fazer com que ele soubesse que Deus e o seu Criador eo amasse de todo o seu cora<;:ao e vivesse com Ele em eterna bem-aventuran<;a. E a Bi- blia termina com a descri<;:ao da nova Jerusalem, cujos habitantes verao Deus face a face e terao Seu nome escrito em sua testa. Entre esses dois momentos repousa a revela<;ao de Deus em todo o seu comprimento e ampli- tude. 0 conteudo dessa revela<;:ao e a grande e {mica promessa abrangente do pacto da Gra<;:a: Eu serei o vosso Deus e v6s sereis meu povo. E no centro e no ponto mais elevado dessa revela<;:ao esta o Emanuet o Deus Conosco. A i 25 promessa e o seu cumprimento caminham de maos dadas. A Pa- lavra de Deus eo come<;:o, o prin- cipio, a semente, e eo ato no qual a semente alcan<;:a sua plena reali- za<;:ao. Assim como no come<;:o, Deus criou todas as coisas pela Sua palavra, assim tambem pela Sua palavra Ele criara, no curso das eras, novos ceus e nova terra, na qual o tabernaculo de Deus es- tara entre os homens. Epor isso que de Cristo, que e a Palavra que se fez carne, diz- se que echeio de Gra<;:a e de ver- dade (Jo 1.14). Ele ea Palavra que no come- <;:o estava com Deus e Ele mesmo era Deus, e como tal Ele era a vida e a luz dos homens, pois o Pai compartilha Sua vida com Cristo e da expressao ao Seu pensamen- to em Cristo, portanto a plenitu- de do ser de Deus erevelada nEle. Ele nao apenas nos apresenta o Pai
  • 26. Fzmdamentos Teol6gicos da Fe Crista e nos revela Seu nome, mas Ele nos mostra o Pai em Si mesmo e nos da o Pai. Cristo e a expressao de Deus e a dadiva de Deus. Ele e Deus revelando a Si mesmo e Deus compartilhando a Si mesmo, e portanto Ele e cheio de verdade e tambem cheio de Gra<;:a. A pala- vra da promessa, "Eu serei o vos- so Deus", que estava incluida des- de o momenta em que foi proferi- da, estara em vigor ate o seu cum- primento. Deus se da a Si mesmo ao Seu povo para fazer com que o Seu povo se entregue a Ele. Nas Escrituras n6s encontra- mos Deus constantemente repe- tindo esta declara<;:ao: Eu sou o teu Deus. Desde a promessa-mae em Genesis 3.15 em diante, esse rico testemunho, abrangendo todas as ben<;:aos e a salva<;:ao, e repetido varias vezes, seja na vida dos pa- triarcas, seja na hist6ria do povo de Israel, ou na Igreja do Novo Testamento. E em resposta a essa declara<;:ao a igreja vern usando uma variedade sem fim de expres- soes de fe, dizendo em gratidao e louvor: //Tu es o nosso Deus, en6s somos o Teu povo e ovelhas do Teu pastoreio//. Essa declara<;:ao de fe por parte da igreja nao e uma doutri- na cientifica/ nem uma cerimonia de unidade que esta sendo repeti- da, mas a confissao de uma reali- dade sentida profundamente e de uma convic<;:ao da realidade que tern sido experimentada na vida. 26 Os profetas, os ap6stolos e os san- tos que aparecem diante de nos no Velho e no Novo Testamento e posteriormente, na Igreja de Cris- to, nao se sentaram e filosofaram sobre Cristo em conceitos abstra- tos, mas disseram o que Deus sig- nifica para eles e que eles depen- dem de Deus em todas as circuns- tancias da vida. Deus nao era para eles urn conceito frio, que eles pu- dessem analisar racionalmente, mas era a vida, for<;:a pessoal, uma realidade infinitamente mais real do que o mundo que os cercava. Eles levavam em conta em suas vidas, eles moravam em Sua ten- cia, andavam como se estivessem sempre diante de Sua face, servi- am-no em Sua corte, e cultuavam- no em Seu santuario. A genuinidade e profundi- dade de sua experiencia se expres- sam na linguagem que eles usa- ram para explicar o que Deus sig- nificava para eles. Eles nao tinham que se esfor<;:ar para encontrar palavras/ pois os seus labios fala- vam daquilo de que seu cora<;:ao estava cheio, eo mundo e a natu- reza forneceram-lhes figuras de linguagem. Deus era para eles o Rei, o Senhor, o Valente, o Cabe- <;:a, o Pastor, o Salvador, o Reden- tor, o Ajudador, o Medico, o Ho- mem eo Pai. Toda a sua felicida- de e bern estar, sua verdade e jus- ti<;:a, sua vida e piedade, sua for<;:a e poder, sua paz e seu descanso eles encontraram em Deus. Para
  • 27. 0 CoNHECIMENTo DE DEus eles Deus era o sole escudo, o pro- tetor, a luz e o fogo, a cascata e a nascente, a rocha eo abrigo, ore- ft:igio e a torre, o premio e a som- bra, a cidade eo templo. Todos os be11S que o mundo tern para ofe- recer eram considerados por eles como a imagem e semelhanc;:a das plenitudes insondaveis da salva- c;:ao, disponiveis em Deus, para o Seu povo. Foi por isso que Davi no Salmo 16.2 disse a Jeova o se- guinte: "Tu es o meu Senhor; ou- tro bern nao possuo, senao a ti so- mente1'. Da mesma forma Asafe tambem cantou no Salmo 73: "Quem mais tenho eu no ceu? Nao ha outro em quem eu me compraza na terra. Ainda que a minha carne e o meu corac;:ao des- falec;:am, Deus e a fortaleza do meu corac;:ao e a minha heranc;:a para sempre". 0 santo, coberto com todas essas benc;:aos, seria nulo e sem valor se nao tivesse Deus; e quando vive em comunhao com Deus ele nao se preocupa com o que e terreno, pois o amor de Deus supera todos os outros bens. Tale a experiencia dos filhos de Deus. Eles tiveram essa expe- riencia porque Deus se apresentou a eles, para alegria deles, na pes- soa do Filho de Seu amor. Nesse sentido Cristo disse que a vida eterna, isto e, a totalidade da sal- 'ac;:ao, consiste no conhecimento do unico e verdadeiro Deus e em Jesus Cristo, que foi enviado por Deus. 27 Cristo disse essas palavras em urn momento propicio. Ele es- tava atravessando o ribeiro Cedrom para entrar no jardim do Getsemani e travar ali a ultima batalha. Todavia, antes de chegar ao Getsemani, Ele se prepara como nosso Sumo Sacerdote para Sua paixao e morte e ora ao Pai para que o Pai o glorifique em Seu sofrimento para que depois o Fi- lho glorifique o Pai ao entregar todas as benc;:aos que Ele alcanc;:a- ria pela Sua obediencia ate a mor- te. E quando o Filho ora desta for- ma, Ele nada deseja alem de fazer a vontade do Pai. 0 Pai lhe deu poder sobre toda a carne para que o Filho pudesse dar a vida eterna a todos aqueles que o Pai lhe dera. Essa vida eterna consiste em co- nhecer o unico e verdadeiro Deus e Jesus Cristo, que foi enviado para revela-lo (Jo 17.3). * * * * * 0 conhecimento do qual Je- sus fala aqui tern seu proprio ca- niter peculiar. Ele e diferente de qualquer outro conhecimento que possa ser obtido, e essa diferenc;:a nao e de grau, mas de principio e de essencia. Essa diferenc;:a surge, de forma clara, quando n6s come- c;:amos a comparar os dois tipos de conhecimento. 0 conhecimento de Deus do qual Jesus falou, dife- re do conhecimento das coisas cri- adas com relac;:ao a sua ongem,
  • 28. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista seu objeto, sua essencia e seus efei- tos. Ele difere, antes de mais nada, em sua origem, pois ele e completamente devido a Cristo. De certa forma podemos dizer que obtemos todo o outro conheci- mento pela razao, pelo discerni- mento e julgamento e pelo nosso proprio esfor<;o e estudo. Mas para obter esse conhecimento do unico e verdadeiro Deus, nos, como crian<;as, devemos esperar que Cristo no-lo de. Esse conheci- mento nao eencontrado fora de Cristo, nem em escolas ou em fi- losofos destacados. So Cristo co- nhece o Pai. Ele estava com Deus no inicio, descansou em Seu peito e viu-o face a face. Ele mesmo era Deus, o brilho da gloria de Deus e a imagem expressa de Sua pessoa, o proprio Filho amado e unigenito do Pai, em quem o Pai tinha pra- zer (Mt 3.17; Jo 1.14; Hb 1.3). Nada no ser do Pai esta escondido para o Filho, pois o Filho compartilha da mesma natureza, dos mesmos atributos e do mesmo conheci- mento que o Pai. Ninguem conhe- ce o Pai senao o Filho (Mt 11.27). Esse Filho veio ate nos ere- velou-nos o Pai. Ele revelou o nome de Seu Pai aos homens. Foi para isso que Ele se fez carne e habitou na terra: para nos dar o conhecimento do que e verdadei- ro (1Jo 5.20). N6s nao conheciamos Deus, nem tinhamos interesse em conhecer os Seus caminhos, mas 28 Cristo motivou-nos a conhecer o Pai. Ele nao era urn filosofo, nem urn erudito, nem urn artista. Sua obra era revelar-nos o nome do Pai. Ele o fez, completamente, durante toda a Sua vida. Ele reve- lou Deus em Suas palavras, em Suas obras, em Sua vida, em Sua morte, em Sua pessoa e em tudo o que Ele foi e fez. Ele nunca fez ou disse qualquer coisa exceto aqui- lo que viu Seu Pai fazendo. A Sua comida era fazer a vontade de Seu Pai. Quem quer que o tenha visto, viu tambem o Pai (Jo 4.34; 8.26-28; 12.50; 14.9). A Sua revela<;ao e confiavel porque Ele e Jesus Cristo, o que foi envindo. Ele recebeu do proprio Deus o nome de Jesus porque Ele foi enviado para salvar o Seu povo dos seus pecados (Mt 1.21). E Ele echamado Cristo porque Ele eo Ungido do Pai, escolhido e quali- ficado para o exercicio de todos os Seus oficios pelo proprio Deus (Is 42.1; Mt 3.16). Ele e0 Unico Envi- ado porque, ao contrario de mui- tos falsos profetas, Ele nao veio em Seu proprio nome, nem exaltou a Si mesmo, nem procurou Sua pro- pria honra. Mas Deus amou tanto o mundo que deu Seu Filho unigenito para que todo aquele que nEle ere nao pere<;a, mas te- nha a vida eterna, pois Ele e o en- viado de Deus (Jo 3.16). Aqueles, pois, que o aceitam e creem nEle recebem o direito e sao qualificados para usar o nome
  • 29. 0 CoNHECIMENTO DE DEus de filhos de Deus (Jo 1.12). Eles nasceram de Deus, partilham de Sua natureza, eles conhecem Deus sob as vistas de Cristo, Seu Filho. Ninguem conhece o Filho senao o Pai, e ninguem conhece o Pai se- nao o Filho, e aquele a quem o Fi- lho o quiser revelar (Mt 11.27). Em segundo lugar, o conhe- cimento de Deus difere do outro conhecimento com rela<;ao ao seu objeto. Quanto ao outro conheci- mento, ele pode, especialmente ern nosso tempo, ser rnuito arnplo ern seu alcance, mas ele ainda gira ern torno da criatura, elirnitado, temporal e nunca pode alcan<;ar o que eeterno. De fato, ha a revela- <;ao do poder eterno de Deus e as obras de Deus na natureza. Mas o conhecimento derivado dessa fon- te efraco, obscuro, contarninado pelo erro, e nao tao irnportante. 0 hornern, conhecendo Deus atraves da natureza, nao o glorificou como Deus, e se tornou nulo ern seu proprio raciocinio e mudou a gloria do Deus incorruptivel em semelhanc;:a da imagem da criatu- ra. 0 rnundo e tanto urn oculta- mento quanto uma revelac;:ao de Deus (Rm 1.20-23). Mas aquina orat;:ao sacerdo- tal [Jo 17], o Unico que fica em evi- dencia e Aquele que nos transmi- te outro conhecimento e que nos desafia a falar sobre o conhecinzen- to de Deus! Quem pode compre- ender Deus como objeto do conhe- cimento humano? Como o ho- 29 mern pode conhecer Deus, o Infi- nito e Incompreensivel, que nao pode ser medido pelo tempo, nem pela eternidade, em cuja presen- <;a os anjos cobrem a face com as asas, que vive ern luz inacessivel, e a quem o homem nunca viu nem pode ver? Como pode alguern as- sim ser conhecido pelo homem, cujo f6lego esta em suas narinas e que e menos que nada e rnenos que o vacuo? Como poderia ele conhecer Deus, se seu melhor co- nhecimento eurn trapo remenda- do? Todo o seu conhecimento e sabre, e nao de. 0 que ele sabe so- bre a origem, a essencia e o pro- posito das coisas? Ele nao esta ro- deado de misterios por todos os lados? Ele nao esta sempre beiran- do a fronteira do desconhecido? E n6s poderfamos supor que urn homem pobre, fraco, pecaminoso e carente poderia conhecer Deus, o Sublime, o Santo, o Unico e Todo-Poderoso Deus? Ele esta fora de nossa com- preensao, mas Cristo viu o Pai e 0 revelou a nos. Nos podemos crer que Seu testemunho e verda- deiro e digno de total aceita<;ao. E se voce quer saber quem e Deus, nao pergunte ao sabio, nem ao escriba, nem aos debatedores de nossos dias, mas procure por Cris- to e ou<;:a o que Ele diz. Nao diga em seu cora<;ao: "Quem subiu ao ceu, ou quem desceu ao abismo?". A palavra que Cristo proclama esta perto de voce. Ele mesnw e"
  • 30. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista Palavra, a perfeita revela<;ao do Pai - igualmente justo, santo, cheio de Gra<;a e de verdade. Em Sua cruz todo o conteudo da fe do Velho Testamento foi revelado: "0 Senhor e misericordioso e compassivo; longanimo e assaz benigno. Nao repreende perpetu- amente, nem conserva para sem- pre a sua ira. Nao nos trata segun- do os nossos pecados, nem nos re- tribui consoante as nossas iniqui- dades. Pois quanto o ceu se alteia acima da terra, assim e grande a sua misericordia para com os que o temem. Quanto dista o Oriente do Ocidente, assim afasta de nos as nossas transgressi5es. Como urn pai se compadece de seus filhos, assim o Senhor se compadece dos que o temem." (Sl103.8-13). Even- do a gloria de Deus no espelho de Sua palavra, nos gritamos em ex- tase: Nos o conhecemos porque Ele nos conheceu primeiro. "Nos amamos porque Ele nos amou pri- meiro" (1 Jo 4.19). A origem e o conteudo de- terminam tambem a peculiar es- sencia do conhecimento de Deus. Nos versiculos da ora<;ao sa- cerdotal acima referida, Jesus fala de urn conhecimento que nao e mera informa<;ao, mas urn real co- nhecimento. Ha uma grande dife- ren<;a entre urn e outro. Obter in- forma<;ao em livros a respeito de plantas, animais, pessoas, paises e povos nao significa ter conheci- mento pessoal direto sobre esses 30 assuntos. Essa informa<;ao e sim- plesmente baseada na descri<;ao que outra pessoa fez sobre algum assunto. Nesse sentido, a informa- <;ao e apenas uma transmissao de noticias. 0 conhecimento real in- clui urn elemento de contato, urn envolvimento pessoal e uma ati- vidade do cora<;ao. Everdade que uma descri- <;ao pode ser encontrada na Pala- vra do conhecimento de Deus que Cristo da, e deste modo e possi- vel ter uma informa<;ao sobre Deus que difira essencialmente do real conhecimento de Deus que Cristo transmite. Urn tipo de co- nhecimento da vontade do Senhor desacompanhado de uma prepa- ra<;ao do cora<;ao faz com que isso seja possivel (Lc 12.47,48). 0 ho- mem pode damar "Senhor! Se- nhor!" e nao ter acesso ao Reino dos ceus (Mt 7.21). Ha a fe, como ados demonios, que nao condu- zem ao amor, mas ao ternor e ao tremor (Tg 2.19). Ha ouvintes da palavra que nao querem ser pra- ticantes dela e que portanto serao frustrados (Tg 1.22) Quando Jesus fala nesse tex- to sobre o conhecimento de Deus, Ele tern em mente urn conheci- mento do mesmo tipo do conhe- cimento que Ele mesmo possui. Ele nao era urn teologo, nem urn doutor ou professor de divinda- de. Ele conhecia Deus atraves de urn contato direto e pessoal; Ele via Deus em todos os lugares, na
  • 31. 0 CONHECIMENTO DE DEUS natureza, em Sua palavra, em Seu servic;:o; Ele o amou acima de to- das as coisas e foi obediente a Ele em todas as coisas, ate mesmo na morte de cruz. Seu conhecimento da verdade era completo. 0 co- nhecimento e o amor caminham juntos. Alem disso, conhecer Deus nao consiste em ter uma grande quantidade de conhecimento so- bre Ele, mas em enxerga-lo napes- soa de Cristo, em leva-lo em con- ta nos caminhos de nossa vida, e em sentir na alma Suas virtudes, Sua justic;:a, Sua compaixao e Sua Grac;:a. Epor isso que esse conheci- mento, em distinc;:ao ao outro co- nhecimento/ recebe o nome de co- nhecimento da fe. Ele nao e resul- tado de estudo cientifico nem de reflexao/ mas de uma fe infantile simples. Essa fe e1 nao apenas urn conhecimento seguro, mas uma firme certeza de que, nao somen- te para os outros, mas tambem para mim, a remissao dos peca- dos, a justic;:a e a salvac;:ao eterna foram dadas por Deus/ somente pela Sua Grac;:a, somente em con- siderac;:ao aos meritos de Cristo. Somente aqueles que se tornarem como criancinhas poderao entrar no reino dos ceus (Mt 18.3). 56 os puros de corac;:ao podem vera face de Deus (Mt 5.8). 56 aqueles que nasceram da agua e do Espirito podem entrar no reino (Jo 3.5). Aqueles que conhecem o nome de Deus confiam nEle (519.10). Deus e conhecido na mesma proporc;:ao em que Ele e amado. Se n6s entendemos o conhe- cimento de Deus dessa forma/ nao devemos nos surpreender com o fato de que sua operac;:ao e seu efei- to seja nada menos que a vida eter- na. De fato, parece existir pouca relac;:ao entre o conhecimento e a vida. Nao foi o autor de Eclesiastes que disse que na muita sabedoria ha muito enfado; e quem aumen- ta ciencia aumenta tristeza; e ain- da que nao ha limite para fazer li- vros e o muito estudar e enfado da carne (Ec 1.18; 12.12)? Conhecimento e poder- isso n6s podemos entender/ pelo me- nos ate urn certo limite. Todo co- nhecimento e urn triunfo do espi- rito sobre urn certo assunto, uma sujeic;:ao da terra ao senhorio do homem. Mesmo na ordem natu- rat a profundidade e a riqueza da vida sao aumentadas pelo conhe- cimento. Quanto maior foro co- nhecimento, maior sera a intensi- dade da vida. As criaturas inani- madas nao possuem conhecimen- to/ e elas nao vivem. Quando os sentidos dos animais se desenvol- vem, sua vida tambem se desen- volve em satisfac;:ao e oportunida- de. Entre os homens, a vida mais rica e aquela que mais conhece. Alem disso, como a vida do insano, do imbecit do idiota, do subdesenvolvido? Epobre e limi- tada quando comparada com a de
  • 32. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista urn pensador e poeta. Mas qual- quer diferen<;a que possa ser no- tada aqui e apenas urna diferen<;a de grau. A propria vida nao e rnudada por isso. E a vida, seja a do rnais distinto erudito ou a do rnais simples operario, deve ne- cessariarnente terrninar na rnorte, pois ela se enche apenas corn as fontes lirnitadas deste rnundo. Mas esse conhecimento de que Cristo fala nao se refere a urna criatura, mas ao verdadeiro Deus. Se o conhecimento das coi- sas visiveis podern enriquecer a vida, o que o conhecimento de Deus fara corn ela? Deus nao e urn Deus de rnortos e nern da rnorte, mas de vivos e da vida. Todos aqueles que forarn recriados aSua irnagern e descansarn ern Sua corn- panhia sao elevados acirna do ni- vel da rnorte e da rnortalidade. II Aquele que ere ern rnirn", disse Jesus, II ainda que rnorra, vivera; e todo o que vive e ere em rnirn nao rnorrera eternarnente" (J0 11.25,26). 0 conhecimento de Deus ern Cristo traz consigo a vida eterna, alegria imperturbavel, benc;aos celestiais. Esses nao sao apenas efeitos, pois o conhecimen- to de Deus e, ern si rnesrno, urna vida nova, eterna e aben<;oada. De acordo corn esse ensino das Sagradas Escrituras, a Igreja Crista deterrninou o carater desse 32 corpo de conhecirnentos ou den- cia que desde tempos antigos tern sido charnado de Teologia ou Di- vindade. A Teologia e a ciencia que extrai o conhecimento de Deus de Sua revela<;ao, que estu- da e pensa sobre ela sob a orienta- c;ao do Espirito Santo, e entao ten- ta descreve-la de forma a honrar a Deus. E urn te6logo, urn verda- deiro te6logo, e aquele que fala de Deus, atraves de Deus, sobre Deus e sernpre no intuito de glorificar Seu nome. Entre o estudado e o simples ha apenas urna diferenc;a de grau. Ambos possuern urn s6 Senhor, urna s6 fe, urn s6 batisrno, urn s6 Deus e Pai de todos, o qual e sobre todos, age por meio de to- dos e esta em todos. E a Gra<;a foi concedida a cada urn de n6s se- gundo a propor<;ao do dom de Cristo (Ef 4.5-7). Nesse espirito, Calvino co- mec;ou o catecismo de Genebra com a questao: Quale 0 firn prin- cipal do hornem? E a resposta vern, clara e retumbante: Conhe- cer Deus, por quem ele foi criado. Da mesrna forma o Catecisrno de Westminster corne<;a suas li<;oes com a seguinte pergunta: Qual e o fim supremo e principal do ho- rnem? A resposta e breve e rica: 0 fim supremo e principal do ho- rnern e glorificar a Deus e goza-lo plena e eternarnente.
  • 33. CAPITULO ~ A REVELA<;AO GERAL § e e verdade que 0 homem pode ter conhecimento de Deus, entao esse fato pres- supoe que Deus, de Sua parte, voluntariamente resolveu, de al- guma forma, fazer-se conhecido aohomem. N6s nao podemos creditar o conhecimento de Deus a n6s mes- mos, anossa descoberta, investi- ga<;:ao ou reflexao. Se esse conhe- cimento nao nos fosse dado por urn ato livre e espontaneo de Deus, nao haveria qualquer pos- sibilidade de que n6s o alcan<;:as- semos pelos nossos pr6prios es- for<;:os. Quando nos referimos ao co- nhecimento das coisas criadas, a situa<;:ao e bern diferente. N6s so- mos totalmente dependentes de Deus ate mesmo para adquirir co- nhecimento sobre as coisas cria- 3as, contudo, no momento da cri- a<;:ao Ele encarregou o homem de subjugar e dominar toda a terra, equipou-o para realizar essa tare- fa e deu-lhe interesse para isso. 0 homem esta acima da natureza. Ele pode medir os fenomenos na- turais, pode estuda-los e, ate cer- to ponto, pode artisticamente cri- ar objetos. Ele pode, de certa for- ma, fazer com que a natureza se revele a ele e descobrir seus segre- dos. Contudo, esta habilidade tambem e limitada em todas as formas nas quais esta disponivel. Na medida em que a ciencia pe- netra mais e mais fundo no feno- meno e se aproxima da essencia dele, ela ve que OS misterios au- mentam e sente-se encurralada por todos os lados pelo desconhe- cido. Nao sao poucos os que es- tao convencidos das limita<;:oes do conhecimento humano a ponto de dizer: "N6s nada sabemos", e, em algumas ocasioes: "N6s nunca
  • 34. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista chegaremos a saber". Se tallimita<;ao do conheci- mento humano logo se torna cla- ra no estudo da natureza inanima- da, ela se torna ainda mais nota- vel no estudo das criaturas vivas, animadas e racionais. Isso acontece porque nessa area n6s entramos em contato com realidades que nao podem ser manuseadas arbitrariamente. Elas ficam diante de n6s em sua objeti- vidade e podem ser conhecidas por n6s na medida em que correspondem aquilo que encon- tramos em n6s mesmos. A vida, a consciencia, o sentimento e a per- cep<;ao, o entendimento e a razao, o desejo e a vontade, nao podem ser desmontadas e remontadas. Nao sao de natureza med1nica, mas organica; temos que considera-los em si mesmos e respeita-los em sua natureza mis- teriosa. Desmembrar a vida e o mesmo que mata-la. Isso vale para a maior parte da natureza humana, pois apesar de ser verdade que o homem eurn ser fisico e que essa dimensao nao pode escapar de nossa percep<;ao, e apenas sua manifesta<;ao exter- na que n6s podemos perceber. Por tras dessa manifesta<;ao esta uma vida misteriosa que tern em sua forma externa uma expressao im- perfeita e inadequada. Ate urn cer- to ponto o homem tern a habili- dade de ocultar a outras pessoas o mais intimo de sua natureza. Ele 34 pode controlar sua expressao facial de modo que seus museu- los faciais nao revelem o que esta acontecendo dentro dele; ele pode usar uma linguagem que esconda seus pensamentos; ele pode, com suas a<;6es, assumir uma atitude que esteja em conflito como que ele pensa. E ate mesmo quando n6s estamos tratando com uma pessoa que despreze essas sutile- zas do engano, nosso conhecimen- to sobre ele dependera grande- mente daquilo que, de sua parte, quiser revelar sobre si mesmo. Alias, as vezes isso acontece de forma involuntaria; 0 homem nao tern controle absoluto sobre si mesmo, e ele freqi.ientemente se trai sem que tenha a inten<;ao de faze-lo. Ao mesmo tempo ele pode, atraves de sua vida, de suas palavras e de seus feitos, com ou sem o seu consentimento, revelar o misterio de sua personalidade, e n6s poderemos conhece-lo urn pouco como ele e. 0 conhecimen- to de uma pessoa s6 e possivel quando ela, involuntariamente ou consciente e deliberadamente ore- vela a n6s. Tais considera<;6es nos con- duzem a urn correto entendimen- to das condi<;6es sob as quais urn ser humano pode dizer que tern conhecimento de Deus. Deus e absolutamente independente, per- feitamente soberano. Ele nao de- pende de n6s para coisa alguma, mas n6s, tanto naturalmente
  • 35. A REVELA<;:Ao GERAL quanto racionalmente e moral- mente, somos completamente de- pendentes dEle. Portanto, n6s nao temos controle e nao temos poder sobre Ele, e por isso nao podemos faze-lo o objeto de nosso estudo e reflexao. A nao ser que Ele se per- mita ser encontrado, n6s jamais o encontraremos. A nao ser que Ele se de a n6s, n6s jamais poderemos recebe-lo. Alem do mais, Deus e invisivel. Ele mora em luz inaces- sivel e nenhum homem jamais o viu e nem pode ver. Se Ele se man- tiver oculto n6s nao podemos traze-lo para o alcance de nossa percep<_;:ao fisica ou espiritual; e, e claro, sem qualquer tipo de per- cep<_;:ao1 0 conhecimento nao e pos- sivel. Finalmente, para encerrar- mos o assunto, Deus e Todo-Po- deroso. Ele tern nao apenas Suas criaturas, mas tambem a Si mes- mo sob total controle. Apesar dos seres humanos estarem sempre se revelando, algumas vezes mais outras menos, seja de forma deli- berada ou nao, Deus s6 se revela na medida em Ele deseja faze-lo, e s6 porque Ele o quer. Nao existe algo como uma manifesta<_;:ao involuntaria de Deus, ocorrendo fora da esfera de Sua consciencia e de Sua liberdade. Deus tern to- tal, absoluto e perfeito controle sobre Si mesmo, e Ele s6 se revela na medida em que sente prazer em fazer isso. Portanto, o conhecimento de Deus s6 e possivel atraves da re- 35 vela<_;:ao que Ele faz de Si mesmo. 0 conhecimento de Deus s6 e acessivel ao homem quando, e s6 quando, Deus livremente deseja revelar-se. * * * * * Essa auto apresenta<_;:ao de Deus e geralmente chamada de revela~ao. A Escritura usa varios verbos para expressar essa reve- la<_;:ao de Deus, tais como aparecer, falar, ordenar, trabalhar, fazer co- nhecido, e outros semelhantes. Isso mostra que a revela<_;:ao nem sempre acontece do mesmo modo, mas de varias formas. Na pratica, todas as obras de Deus, sejam pa- lavras ou atos, sao partes consti- tuintes da unica revela<_;:ao de Deus, grande, abrangente, e sem- pre continua. A cria<_;:ao, manuten- <_;:ao e o dominio de todas as coi- sas, o chamado e o destaque de Israel, o envio de Cristo, a desci- da do Espirito Santo, o registro da Palavra de Deus, o sustento e a propaga<_;:ao da Igreja, sao formas pelas quais a revela<_;:ao de Deus vern ate n6s. Cada uma dessas for- mas nos revela algo de Deus. Nes- se sentido, tudo o que existe e tudo o que acontece pode conduzir-nos ao conhecimento de Deus. Essa revela<_;:ao pode ser ge- ral ou especial, de acordo com as suas caracteristicas. Em primeiro lugar, a revela- <_;:ao sempre tern sua origem em
  • 36. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista urn ato livre da parte de Deus. Nesse ato, como em todas as ou- tras coisas, Ele e absolutamente soberano, e age com perfeita liber- dade. De fato, ha alguns que re- pudiam a cren<;a em urn Deus pes- soal e auto consciente, e ainda as- sim falam de uma revela<;ao de Deus. Isso da urn significado a palavra que entra em conflito com seu sentido usual. Do ponto de vista daqueles para os quais a di- vindade e apenas uma for<;a todo- poderosa, impessoal e inconscien- te, e possivel falar em uma mani- festa<;ao involuntaria dessa for<;a, mas nao de uma revela<;ao real, pois essa e uma ideia que pressu- poe a perfeita consciencia e liber- dade de Deus. Toda revela<;ao dig- na desse nome procede da ideia de que Deus existe pessoalmente, que Ele e consciente de Si mesmo e que Ele pode fazer-se conhecido as Suas criaturas. Nosso conheci- mento humano de Deus tern sua base e sua origem no conhecimen- to que Deus tern de Si mesmo. A nao ser que haja auto consciencia e auto conhecimento em Deus, nenhum conhecimento de Deus sera possivel ao homem. Qual- quer pessoa que negue isso che- gara a conclusao irracional de que nenhum conhecimento de Deus e possivel, ou que Deus alcan<;a auto consciencia somente no ho- mem, o que coloca o homem no lugar de Deus. A Escritura ensina algo mui- 56 to diferente disso. Apesar de ser inacessivel, a morada de Deus e luz; Ele conhece a Si mesmo per- feitamente e, portanto, pode reve- lar-se a n6s. Ninguem conhece o Filho senao o Pai; e ninguem co- nhece o Pai senao o Filho, e aque- le a quem o Filho o quiser revelar (Mt 11.27). Em segundo lugar, toda re- vela<;ao que procede de Deus e auto revelar;iio. Deus e a origem e tambem o conteudo de Sua reve- la<;ao. Isso faz com que seja ver- dadeira a rnais elevada revelac;ao, que veio a nos em Cristo, pois o proprio Cristo disse que Ele reve- lou o nome de Deus ao homem (Jo 17.6). 0 Filho unigenito, que esta no seio do Pai, revelou-nos Deus (Jo 1.18). Mas o mesmo e verdade sobre qualquer revelac;ao que Deus tenha dado ao homem sobre Si mesmo. Todas as obras de Deus, em natureza e em Grac;a, na cria- c;ao e na regenerac;ao, no mundo e na historia, mostram-nos algo sa- bre o incompreensivel e adoravel ser de Deus. Elas nao o fazem da mesma forma e nem com o mes- mo alcance; ha infinitas diferenc;as entre elas. Uma obra fala de Sua justic;a, e outra de Sua Grac;a; de uma resplandece Seu poder infi- nito, e de outra Sua divina sabe- doria. Contudo, todas juntas e cada uma delas em seu proprio alcan- ce, declaram-nos as poderosas obras de Deus, e informam-nos
  • 37. A REVELA<;:Ao GERAL sobre Suas virtudes e perfei<;:oes, sobre Seu sere Suas auto diferen- cia<;:oes, sobre Seu pensarnento e sobre Sua palavra, e sobre Sua vontade e seu prazer. Nessa conexao n6s nunca devernos nos esquecer, e claro, que a revela<;:ao de Deus, indepen- denternente da riqueza de seu conteudo, nunca sera identica ao auto conhecimento de Deus. Esse auto conhecimento ou auto cons- ciencia e tao infinito quanto Seu Sere Sua natureza, portanto, nao esta sujeito aapreensao de qual- quer criatura. A revela<;:ao de Deus em Suas criaturas, tanto objetiva- rnente nas obras de Sua mao quan- to subjetivarnente na consciencia de Suas criaturas racionais, pode rnostrar, sernpre, apenas urna pe- quena parte do infinito conheci- mento que Deus tern de Si rnes- rno. E nao sornente n6s, seres hu- rnanos sobre a terra, mas tarnbern os santos e os anjos nos ceus, e tarnbern o Filho de Deus ern Sua natureza hurnana, possuern urn conhecimento de Deus que e dife- rente ern principio e ern essencia do auto conhecimento de Deus. ~-'co rnesrno tempo, o conhecimen- to que Deus tern distribuido ern Sua revela<;:ao, e que pode ser ob- tido pelas criaturas racionais a partir dessa revela<;:ao, lirnitado e iinito como e e sera pelo resto da eternidade, e, contudo, urn conhe- cimento real e cornpleto. Deus se re,·ela ern Suas obras exatamente 37 como Ele e. A partir dessa Sua re- vela<;:ao n6s podernos conhece-lo. Portanto, nao ha repouso para o hornern ate que ele se coloque aci- rna e alern da criatura e chegue ate o proprio Deus. No estudo dare- vela<;:ao nossa preocupa<;:ao deve ser a de conhecer Deus. 0 prop6- sito desse estudo nao e aprender a usar alguns argurnentos e a fa- lar algumas palavras. 0 objetivo prirnario desse estudo e conduzir- nos atraves da criatura ate o Cria- dor, e fazer-nos encontrar descan- so no cora<;:ao do Pai. Ern terceiro lugar, a revela- <;:ao que procede de Deus, e que tern Deus como seu conteudo, tarnbern tern Deus como seu pro- p6sito. Essa revela<;:ao e dEle, e atraves dEle e tarnbern para Ele; Ele fez todas as coisas para Si rnes- mo (Rrn 11.36; Pv 16.4). Apesar do conhecimento de Deus, que e dis- tribuido ern Sua revela<;:ao, ser es- sencialrnente diferente de Seu auto conhecimento, ele e tao rico, tao arnplo e tao profundo, que nunca pode ser totalrnente absor- vido pela consciencia de qualquer criatura racional. Os anjos exce- dern o homern ern conhecimento, e veern incessanternente a face do Pai que esta nos ceus (Mt 18.10), mas eles desejararn perscrutar as coisas que nos forarn anunciadas por aqueles que anunciararn o Evangelho (1Pe 1.12). E na rnedi- da ern que as pessoas pensarn mais e rnais profundarnente sobre
  • 38. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista a revela<;:ao de Deus elas sao mais impelidas a damar como Paulo: "6 profundidade da riqueza, tan- to da sabedoria como do conheci- mento de Deus! Quao insondaveis sao os seus juizos, e quao inescrutaveis, os seus caminhos" (Rm 11.33)! Contudo, a revela<;:ao nao pode ter o seu proposito final no homem; ela o ultrapassa e se levanta alto;m dele. Everdade que o homem tern urn importante lugar na revela<;:ao. Ela e dirigida ara<;:a humana para que o homem possa buscar a Deus, se, porventura, tateando, puder encontra-lo (At 17.27); e o Evangelho deve ser pregado a to- das as criaturas, para que, crendo, tenham vida eterna (Me 16.15,16; Jo 3.16,36). Mas esse nao pode ser o proposito final e mais elevado da revela<;:ao. Deus nao pode des- cansar no homem. Pelo contrario, o homem deve conhecer e servir a Deus, motivo pelo qual deve, jun- tamente com as outras criaturas, e afrente delas, dar a Deus a de- vida honra por todas as Suas obras. Em Sua revela<;:ao, querela passe alem do homem ou ao lado do homem, Deus esta preparan- do Seu proprio louvor, glorifican- do Seu proprio nome, e manifes- tando diante de Seus proprios olhos, no mundo de Suas criatu- ras, Suas excelencias e perfei<;:6es. Pelo fato da revela<;:ao ser de Deus e atraves de Deus, ela tern seu fim e proposito tambem em Sua glo- 38 rifica<;:ao. Toda essa revela<;:ao, que e de Deus e atraves dele, tern seu ponto mais elevado na pessoa de Cristo. Nao e o firmamento relampejante, nem a natureza po- derosa, nem qualquer principe ou genio da terra, nem qualquer filo- sofo ou artista o ponto mais alto da revela<;:ao de Deus, mas sim o Filho do Homem. Cristo eo Ver- ba feito carne, que estava no co- me<;:o com Deus e que era Deus, o Unigenito do Pai, a Imagem de Deus, o brilho de Sua gloria e a exata expressao de Sua pessoa; quem o ve tambern ve o Pai (Jo 14.9). Nessa fe o Cristao permane- ce de pe. Ele aprendeu a conhecer Deus na pessoa de Jesus Cristo, que foi enviado pelo proprio Deus. Deus, que disse que nas tre- vas resplandecera a luz, Ele mes- mo resplandeceu em nosso cora- <;:ao, para ilumina<;:ao do conheci- mento da gloria de Deus, na face de Cristo (2Co 4.6). * * * * * Desse ponto altamente privilegiado o Cristao olha asua volta, para a frente, para tras e para todos os lados. E se, ao fazer isso, a luz do conhecimento de Deus, que recebe de Cristo, ele se detem na natureza e na historia, no ceu ou sobre a terra, entao ele descobre tra<;:os do mesmo Deus que ele aprendeu a conhecer e a
  • 39. A REVELA<;:Ao GERAL cultuar em Cristo como seu Pai. 0 Sol da justi<;a proporciona uma vista maravilhosa que se estende ate as extremidades da terra. Atra- ves dessa luz ele olha para tra.s, para as noites de tempos passa- dos, e atraves dela ele penetra no futuro de todas as coisas. A sua frente e atras de si 0 horizonte e claro, apesar do ceu estar geral- mente encoberto pelas nuvens. 0 Cristao, que ve tudo aluz da Palavra de Deus, pode ser qual- quer coisa, menos estreito em sua perspectiva. Ele tern amplitude de cora<;ao e mente. Ele olha por toda a terrae considera tudo como sen- do seu, pois ele ede Cristo e Cris- to ede Deus (1Co 3.21-23). Ele nao pode desvincular sua cren<;a da re- ·ela<;ao de Deus em Cristo, a quem ele deve sua vida e sua sal- va<;ao, pois essa cren<;a tern urn carater especial. Essa cren<;a nao o exclui do mundo, mas coloca-o em condi<;ao de seguir a pista da revela<;ao de Deus na natureza e na hist6ria, e coloca meios asua disposi<;ao pelos quais ele pode reconhecer a verdade, o bern e a beleza e separa-los das rela<;6es ralsas e pecaminosas dos homens. Dessa forma, ele faz distin- (ao entre uma revela<;ao geral e uma revela<;ao especial de Deus. :a revela<;ao geral Deus faz uso da ocorrencia usual dos fenome- :ws e do curso usual dos eventos; :' :1 re·ela<;ao especial Ele geral- :--:.1:'nte emprega meios nao usuais, 39 tais como apari<;6es, profecias e milagres para fazer-se conhecido ao homem. 0 conteudo da reve- la<;:ao geral sao geralmente Seus atributos de poder, sabedoria e bondade; o conteudo da revela<;ao especial sao especialmente a san- tidade e a justi<;:a, a compaixao e a Gra<;a. A revela<;ao geral edirigida a todos os homens e, por meio da gra<;a comum, serve para restrin- gir a prolifera<;ao do pecado; are- vela<;ao especial edirigida a todos aqueles que vivem sob o Evange- lho e possuem, pela Gra<;a especi- al, o perdao dos pecados e a reno- va<;ao de vida. Apesar desses dois tipos de revela<;ao serem essencialmente distintos, eles estao intimamente ligados urn ao outro. Os dois pos- suem sua origem em Deus, em Sua bondade soberana e em seu favor. A revela<;ao geral e uma dadiva do Verbo que estava com Deus no principia, que fez todas as coisas, que brilhou como a luz nas trevas e iluminou todos os homens que vieram ao mundo (Jo 1.1-9). A revela<;ao especial euma dadiva do mesmo Verbo, que foi feito carne em Cristo, e que agora echeio de Gra<;:a e de verdade (Jo 1.14). A Gra<;:a eo conteudo de ambas as revela<;6es, de tal forma que uma seja indispensavel aou- tra. Ea gra<;:a comum que torna possivel a Gra<;a especiat prepa- ra o caminho para ela, e depois lhe
  • 40. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista da o suporte; e a Grac;a especiat por sua vez, ergue a grac;a comurn ao seu proprio nivel e coloca-a a seu servic;o. Ambas as revelac;oes tern como proposito a conserva- c;ao da rac;a humana; a primeira sustentando-a e a segunda redimindo-a; e desta forma as duas cumprem a sua finalidade, que e glorificar todas as excelen- cias de Deus. * * * * * 0 conteudo de ambas as re- velac;oes, nao apenas o da especi- al, mas tambem o da geral, esta contido na Sagrada Escritura. A revelac;ao geral, apesar de estar contida na natureza, e, contudo, extraida da Sagrada Escritura, pois, sem ela, n6s, seres humanos, por causa da escuridao de nosso entendimento, nunca teriamos sido capazes de encontra-la na natureza. Sendo assim, a Escritu- ra lanc;a luz sobre nosso caminho atraves do mundo, e coloca em nossas maos a verdadeira compre- ensao da natureza e da historia. Ela nos faz ver Deus onde nos de outra forma nao o veriamos. Ilu- minados por ela nos contempla- mos as excelencias de Deus em toda a expansao das obras de Suas maos. A propria criac;ao, ensinada pela Escritura, demonstra a reve- lac;ao de Deus na natureza, pois ela e em si mesma um ato de re- 40 velac;ao, o inicio eo primeiro prin- cipia de toda a revelac;ao posteri- or. Se o mundo tivesse permane- cido eternamente sozinho, ou se tivesse sido eternamente descon- siderado por Deus, ele nao teria sido uma revelac;ao de Deus. Alias, tal mundo teria sido urn obstaculo a Deus e a Sua revela- c;ao de Si mesmo. Mas quem quer que o contemple junto com as Es- crituras, desde a criac;ao do mun- do, ere que Deus se revela em todo o mundo. Toda obra da testemu- nho de seu realizador a tal ponto que em urn certo sentido pode ser chamada de produto de seu reali- zador. Por ser o mundo, em urn sentido absoluto, uma obra de Deus, e por clever, tanto sua natu- reza quanto seu ser, no comec;o e sempre depois, ao seu Criador, toda criatura manifesta algo das excelencias e das perfeic;oes de Deus. Logo que a revelac;ao de Deus na natureza e negada ou li- mitada somente ao corac;ao ou ao sentimento do homem, surge o perigo de que a criac;ao de Deus nao seja reconhecida, que a natu- reza seja governada por outro po- der que aquele que governa o co- rac;ao humano, e que desta forma, quer seja abertamente, quer seja de forma encoberta, o politeismo seja introduzido no pensamento humano. A Escritura, ao ensinar a criac;ao, sustenta a revelac;ao de Deus e ao mesmo tempo a unida-
  • 41. A REVELA<;:Ao GERAL de de Deus e a unidade do mun- do. Ah~m do mais, a Escritura ensina nao apenas que Deus cha- mou o mundo a existencia, mas tambem que esse mundo e, conti- nuamente, momento ap6s mo- mento, sustentado e governado por esse mesmo Deus. Ele e infi- nitamente exaltado nao apenas sobre todo o mundo, mas tambem mora em todas as Suas criaturas por Seu poder infinito e onipre- sente. Ele nao esta longe de quem quer que seja, pois nEle n6s vive- mos, enos movemos, e existimos (At 17.27,28). A revela<;ao que vern ate n6s atraves do mundo, toda- via, nao e apenas urn lembrete de uma obra de Deus que Ele reali- zou ha muito tempo atras: e urn testemunho tambem daquilo que Deus, em nossos tempos, quer e faz. ~ Quando levantamos nossos olhos podemos ver nao apenas quem criou essas coisas e faz sair o seu exercito em grande m:ime- ro, mas tambem que Ele as chama pelos seus nomes, pela grandeza de Seu poder, porque Ele e forte em poder e por isso nenhuma de- las vern a £altar (Is 40.26). Os ceus declaram as obras de Deus e o firmamento anuncia as obras das Suas maos (Sl 19.1). Ele se cobre de luz como de urn manto e esten- de os ceus como uma cortina. Ele poe nas aguas 0 fundamento da Sua morada e toma as nuvens por 41 Seu carro e voa nas asas do vento (Sl 104.2,3). As montanhas e os vales estao estabelecidos no lugar que Deus tinha para eles prepara- do e Ele os rega do alto de Sua morada (Sl 104.8,13). Ele farta a terra com o fruto de Suas obras, faz crescer a relva para os animais e as plantas para o servi<;o do ho- mem, de forma que da terra tire o seu pao e o vinho, que alegra o cora<;ao do homem (Sl104.13-15). Cingido de poder Ele, por Sua for- <;a, consolida os montes e aplaca o rugir dos mares (Sl65.6,7). Ele ali- menta as aves do ceu e veste os lirios do campo (Mt 6.26-30). Ele faz nascer o sol sobre rnause bons e faz vir chuvas sobre justos e in- justos (Mt 5.45). Ele fez o homem urn pouco menor do que os anjos, e coroou-o com gloria e honra, e deu-lhe dominio sobre as obras de Suas maos (Sl 8.5,6). Alem disso Ele cumpre Seu conselho e estabelece Sua obra tanto na natureza quanto na his- t6ria. Ele de urn s6 fez todas as na<;oes para habitar a terra (At 17.26). Ele destruiu a primeira ra<;a humana no dih:ivio e ao mesmo tempo preservou-a na familia de Noe (Gn 6.6-9). Na torre de Babel Ele confunde a linguagem dos ho- mens e os dispersa sobre a face da terra (Gn 11.7-8). E quando o Altissimo dividiu entre as na<;oes a sua heran<;a e separou os filhos de Adao, Ele determinou os tem- pos previamente estabelecidos e
  • 42. Fundamentos Teol6gicos da Fe Cristii os limites da sua habita<;ao, de acordo como numero de tilhos em Israel (Dt 32.8; At 17.26). Apesar de ter escolhido os filhos de Israel para serem os portadores de Sua revela<;ao especial, e permitido que as na<;6es pagas seguissem seu proprio caminho (At 14.16), Ele nao se esqueceu deles nem abandonou-os a sua propria sor- te. Pelo contrario, Ele nao os dei- xou sem urn testemunho de Si mesmo, fazendo o bern, dando- lhes chuvas do ceu e esta<;6es fru- tiferas, enchendo o cora<;ao deles de fartura e de alegria (At 14.17). 0 que de Deus se pode conhecer e manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou (Rm 1.19), para que eles busquem a Deus, se porventura, tateando, possam encontra-lo (At 17.27). Por meio dessa revela<;ao geral Deus preservou os povos e conduziu-os ate a dispensa<;ao da plenitude dos tempos, fazendo com que todas as coisas conver- gissem para Cristo, tanto as do ceu como as da terra (Ef 1.10). De to- das as na<;6es, povos, ra<;as e Hn- guas Ele reuniu Sua igreja (Rm 11.25; Ef 2.14 e ss.; Ap 7.9), e pre- para o fim do mundo, no qual os salvos de todas as na<;:6es andarao na luz da cidade de Deus, e todos os reis e povos da terra darao sua gloria e honra a Ele (Ap 21.24-26). Na ciencia da teologia os ho- mens tern tentado organizar todos esses testemunhos da natureza e 42 da historia sobre a existencia e o ser de Deus e classifica-los em gru- pos. Por isso nos as vezes falamos de seis evidencias da existencia de Deus. Em primeiro lugar, o mun- do, sendo sempre tao poderoso e abrangente, esta, contudo, conti- nuamente dando testemunho de que esta confinado ao espa<;o e ao tempo, testemunhando, assim, que e temporal, acidental e de ca- rater dependente e que requer, portanto, urn Ser eterno, essenci- al e independente como a causa final de todas as coisas. Esse e o argumento cosmologico. Em segundo lugar, o mun- do, em suas leis e ordenan<;as, em sua unidade e harmonia e na or- ganiza<;:ao de todas as suas criatu- ras, exibe urn proposito cuja expli- ca<;:ao seria ridicula na base da ca- sualidade, e que, portanto, apon- ta para urn ser todo abrangente e todo poderoso que com mente in- finita estabeleceu esse proposito, e por seu poder infinito e onipresente age para alcanca-lo. Esse e o argumento teologico. Em terceiro 1ugar, ha na consciencia de todos os homens alguma no<;ao de urn ser supremo, sobre o qual nao se pode conce- ber algo que seja mais elevado, e que e auto existente. Setal ser nao existe, a maior, mais perfeita e mais inevitavel ideia seria uma ilusao, e o homem perderia sua confian<;:a na validade de sua cons-
  • 43. A REVELA<;:Ao GERAL Ciencia. Esse e o argumento ontol6gico. 0 quarto argumento e urn coroL1rio do terceiro: o homem nao e apenas urn ser racionat ele tambem e urn ser moral. Ele sente em sua consciencia que e limita- do por uma lei que esta acima de si mesmo e que requer obedien- cia incondicional de sua parte. Tal lei pressupoe urn santo e justo le- gislador que pode preservar e des- truir. Esse e o argumento moral. Dois outros argumentos sao adicionados a esses quatro, deri- vados da similaridade ou corres- pondencia de povos e da hist6ria da humanidade. Eurn fenomeno notavel que nao existam povos ou na<;oes sem religiao. Alguns eru- ditos tern argumento que nao e bern assim, mas as investiga<;oes hist6ricas tern provado mais e mais que eles estao errados. Nao ha tribos nem povos ateus. Esse fe- nomeno e de grande imporhincia, pois a absoluta universalidade dessa no<;ao de religiao coloca di- ante de nos uma escolha entre duas op<;oes: ou nesse ponto a humanidade esta sofrendo sob uma supersti<;ao estupida, ou esse conhecimento e servi<;o de Deus, que em formas distorcidas apare- ce entre todos os povos, esta ba- seado na existencia de Deus. Da mesma forma a hist6ria da humanidade, quando vista a luz da Escritura, exibe urn plano e urn padrao que aponta para o 43 governo de todas as coisas por urn ser supremo. Everdade que essa ideia encontra todo tipo de obje- <;6es e dificuldades tanto na vida de individuos quanto na de na- <;6es. Todavia e notavel que qual- quer pessoa que fa<;a urn estudo serio da hist6ria supoe que a his- t6ria e algo no qual 0 planejamen- to e a ordem sao evidentes e que faz de sua tarefa a descoberta e a continuidade desse planejamento e dessa ordem. A hist6ria e a fila- sofia da hist6ria estao baseadas na fe, na providencia de Deus. Todas essas assim chamadas evidencias nao sao suficientes para fazer com que o homem creia. A ciencia e a filosofia tern muito poucas evidencias capazes de fazer isso. Pode ser que nas ci- encias formais, como na matema- tica e na 16gica, isso seja possivel, mas no momento em que temos contato como fenomeno real na natureza, e tambem na hist6ria, nossas argumenta<;oes e conclu- soes, via de regra, sao objeto de todo tipo de desconfian<;a e obje- <;6es. Na religiao e na etica, na lei e na estetica, depende ainda mais da atitude do investigador se ele se submete ou nao a essa convic- <;ao. 0 insensato pode, apesar de todo o testemunho contrario, di- zer em seu cora<;ao que Deus nao existe (5114.1), eo pagao, mesmo tendo conhecimento de Deus, nao o glorificou e nem lhe deu gra<;as (Rm 1.21). Os argumentos da exis-
  • 44. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista tencia de Deus acima menciona- dos nao se dirigem ao homem como uma criatura meramente 16gica e capaz de racionar, mas como urn ser racional e moral. 0 apelo desses argumentos nao se refere somente asua mente racio- nal e analitica, mas tambem ao seu corac;:ao e ao seu sentimento, sua razao e sua consciencia. Eles tern seu merito, fortalecendo a fee es- tabelecendo o vinculo de ligac;:ao entre a revelac;:ao de Deus fora do homem e a Sua revelac;:ao dentro dohomem. * * * * * Alem disso, a revelac;:ao de Deus na natureza e na hist6ria nao teria efeito sobre o homem se nao houvesse algo no homem que re- agisse a ela. A beleza da natureza e da arte nao poderiam dar ao homem qualquer prazer a nao ser que ele tivesse urn sentimento de beleza em seu peito. A lei moral nao encontraria resposta nele se ele nao reconhecesse a voz da consciencia dentro de si. Os pen- samentos que Deus, por Sua Pala- vra, expressou no mundo seriam incompreensiveis ao homem se ele nao fosse em si mesmo urn ser pensante. E da mesma forma are- velac;:ao de Deus em todas as obras das suas rnaos seriam totalmente ininteligiveis ao homem se Deus nao tivesse plantado em sua alma urna inextinguivel noc;:ao de Sua 44 existencia e de Seu ser. 0 fato indisputavel, todavia, e que Deus acrescentou a Si mesmo arevela- c;:ao externa na natureza e areve- lac;:ao interna no homem. As inves- tigac;:oes hist6ricas e psicol6gicas da religiao revelam repetidamen- te que a religiao nao pode ser explicada a nao ser sobre a base de uma noc;:ao nao criada pelo ho- rnem. Ao firn de seu estudo os pesquisadores sempre retornam a proposic;:ao que eles repudiavam desde o inicio, a de que o homem e, no fundo, uma criatura religio- sa. A Escritura nao deixa qual- quer duvida sobre isso. Depois de Deus ter feito todas as coisas Ele criou o homem, e criou-o aSua imagern e sernelhanc;:a (Gn 1.26). 0 homem egerac;:ao de Deus (At 17.28). Embora, como o filho per- dido da parabola, o homem tenha fugido de sua casa paternal, rnes- mo em seus mais distantes afasta- rnentos ele acalenta uma memo- ria de sua origem e finalidade. Em sua mais profunda queda ele ain- da conserva certos resquicios da imagem de Deus segundo a qual ele foi feito. Deus se revela fora do homem; Ele se revela tarnbem dentro do homem. Ele nao deixa o corac;:ao e a consciencia humana sem testemunho de si mesmo. Essa revelac;:ao de Deus nao deve ser considerada como uma segunda revela<;ao, suplemen- tando a primeira. Ela nao e urna
  • 45. A REVELA<;:Ao G ERAL fonte de conhecimento indepen- dente da primeira. Ela e uma ca- pacidade, uma sensibilidade, uma direc;:ao para encontrar Deus em Suas obras e entender Sua revela- c;:ao. Euma consciencia do divino em n6s que nos torna capazes de ver o divino fora de n6s mesmos, assim como o olho nos torna ca- pazes de detectar luz e cor, e o ouvido nos habilita a perceber os sons. Trata-se, como disse Calvina, de urn senso de divindade, ou, como Paulo o descreveu, de uma habilidade para ver as coisas invi- siveis de Deus, isto e, Seu eterno poder e dominio, nas coisas visi- veis da criac;:ao. Quando n6s tentamos anali- sar esse senso de divindade nao criado pelo homem, descobrimos que ele consiste de dois elementos. Em primeiro lugar, o senso de de- pendencia absoluta e caracteristi- co dele. Por baixo de nossa mente e vontade, por baixo de nosso pen- samento e ac;:ao, haem n6s uma auto consciencia que e interde- pendente com nossa propria exis- tencia e parece coincidir com ela. Antes de pensarmos, antes de de- sejarmos, n6s somos, n6s existi- mos. N6s existimos de uma forma definida, e em unidade indissoluvel com essa existencia n6s temos uma nor;fio de existencia e uma nor;fio de existirmos como somos. Eo nucleo dessa identificac;:ao de auto exis- tencia e auto consciencia eo senti- menta de dependencia. No mais 45 profunda de nosso ser n6s somos, sem auxilio da razao e anterior a razao, conscientes de n6s mesmos como seres criados, limitados e de- pendentes. N6s somos dependen- tes de tudo ao nosso redor, de tudo no mundo espiritual e mate- rial. 0 homem e urn dependente do universo. Alem disso ele e de- pendente, junto com outras coisas criadas, e de uma forma absoluta, de Deus, que eo unico ser eterno e verdadeiro. Mas esse senso de divinda- de tern mais urn elemento consti- tuinte. Se o ser cujo poder causou esse sentimento permanecer total- mente indefinido, entao esse seria urn sentimento que conduziria o homem a uma revolta impotente ou a uma resignac;:ao est6ica, pas- siva. Mas esse senso de divinda- de tern em si urn senso da nature- za daquele ser de quem o homem se sente dependente. Eurn senso do mais elevado e absoluto poder, mas nao de uma forc;:a cega, irra- cional, imperturbavel e impassiva, equivalente ao destino ou a necessidade. Mais do que isso, e urn senso de uma forc;:a suprema, que e tambem perfeitamente justa, sabia e boa. Eurn senso de urn poder eterno, mas tambern de dominio, ou seja, absoluta perfei- c;:ao de Deus. Portanto, esse senti- menta de dependencia nao impli- ca em desanimo e desespero em nossa fraqueza, mas impele o ho- mem areligiao, a servir e honrar
  • 46. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista a Deus. Em outras palavras, a de- pendencia da qual 0 homem e consciente e urn tipo muito espe- cial de consciencia do ser divino. Ela contem em si o elemento de liberdade. Essa nao e a dependen- 46 cia de urn escravo, mas de urn fi- lho, embora seja de urn filho per- dido. Esse senso de divindade, portanto, como disse Calvino, e a semente da religiao.
  • 47. CAPITULO ~ 0 VALOR DA REVELA<;Ao GERAL A o determinarmos o valor da revelac;ao geral corre- mos o risco tanto de superestima-la quanto de subestima-la. Quando n6s nos concentramos detidamente sobre as riquezas da Grac;a com a qual Deus nos deu Sua revelac;ao espe- cial, n6s costumamos ficar tao en- cantados com ela que a revelac;ao geral acaba perdendo seu signifi- cado e merito para n6s. Por outro lado, quando refletimos sobre a bondade, a verdade e a beleza que ha na revelac;ao geral de Deus na natureza e na hist6ria da humani- dade, pode acontecer que a Gra- c;a especial, manifesta a n6s na pessoa e obra de Cristo, perca sua gloria e apelo aos olhos da alma. Esse perigo de extraviar-se para a esquerda ou para a direita sempre existiu na igreja Crista, e vez por outra a revelac;ao geral e a revelac;ao especial sao ignoradas 47 ou negadas. Cada uma por sua vez tern sido negada na teoria e nao menos fortemente na pratica. No presente a tentac;ao de se fa- zer injustic;a arevelac;ao geral nao etao forte quanto foi no passado. Muito mais forte, contudo, eaten- tac;ao, que se aproxima por todos os lados, de reduzir a revelac;ao especial aos mais estreitos limi- tes, por exemplo, a pessoa de Cristo, ou pior ainda, negar tudo e fazer da pessoa de Cristo uma parte da revelac;ao geral. N6s temos que estar atentos a essas duas tendencias; e n6s se- remos mais prudentes se, aluz da Sagrada Escritura, considerarmos a hist6ria da humanidade e dei- xarmos que ela nos ensine o que OS povos devern a revelac;ao ge- ral. Isso deixara claro para n6s que, possuindo a luz dessa reve- lac;ao, os homens tern realizado grandes empreendimentos, em-
  • 48. Fundamentos Teol6gicos da Fe Crista bora seu conhecimento e habilida- de em outras areas encontre limi- tes intransponiveis. Quando o primeiro homem e a primeira mulher transgredi- ram a ordem de Deus no paraiso sua puni<;ao nao foi imediata e nem foi aplicada com total inten- sidade. Eles nao morreram no mesmo instante em que pecaram, mas permaneceram vivos; eles nao foram enviados para o infer- no, mas receberam uma missao para cumprir na terra; sua linha- gem nao pereceu: eles receberam a promessa da semente da mu- lher. Em resumo, podemos dizer que com o primeiro pecado hou- ve o surgimento de uma condi<;ao que Deus fixou, mas que o homem nao era capaz de prever. Essa con- di<;ao possui urn carater muito especial. Enela que c6lera e Gra- <;:a, puni<;:ao e ben<;:ao, julgamento e longanimidade estao mesclados uns com os outros. Essa e a con- di<;ao que ainda existe na nature- za e entre os homens e que abran- ge os mais bern delineados con- trastes. N6s vivemos em urn mun- do estranho, urn mundo que nos apresenta tremendos contrastes. 0 alto eo baixo, o grandee ope- queno, o sublime e o ridiculo, o bonito eo feio, o tragico eo c6mi- co, o berne o maC a verdade e a mentira; tudo isso e encontrado em urn inter-relacionamento in- sondavel. A seriedade e a vaida- 48 de da vida se agarram a n6s. Em urn momento n6s estamos incli- nados ao otimismo, e no momen- to seguinte ao pessimismo. 0 ho- mem que chora esta constante- mente dando motivos ao homem que ri. 0 mundo todo conserva o born humor, que poderia ser me- lhor descrito como urn sorriso entre lagrimas. A causa mais profunda des- se presente estado do mundo e essa: por causa do pecado do ho- mem Deus esta constantemente manifestando Sua ira e, ao mes- mo tempo, movido pelo Seu pro- prio prazer, revelando tambem Sua Gra<;:a. N6s somos consumi- dos pela Sua ira e saciados com a Sua benignidade (Sl90. 7)4). Nao passa de urn momento a Sua ira; o Seu favor dura a vida inteira. Ao anoitecer, pode vir o choro, mas a alegria vern pela manha (Sl30.5). A maldic,;ao e a benc,;ao sao tao sin- gularmente interdependentes que as vezes uma parece transfor- mar-se em outra. Trabalhar no suor do rosto e maldi<;ao e tam- bern e benc,;ao. Tanto a maldic,;ao quanta a benc,;ao apontam para a cruz, que e ao mesmo tempo 0 mais alto julgamento e a Grac,;a mais rica. Isso acontece porque a cruz e o centro da hist6ria e a re- concilia<;ao de todas as antiteses. Essa condi<;ao teve inicio imediatamente depois da queda e, durante o primeiro periodo, isto e, ate a chamada de Abraao,