O documento discute o conceito de masculinidade tóxica e seus efeitos prejudiciais. A masculinidade tóxica promove normas, crenças e comportamentos que prejudicam mulheres, homens, crianças e a sociedade de forma geral. Dois diálogos ilustram como a masculinidade tóxica pode levar homens a adotarem comportamentos de risco e prejudicar suas saúdes física e emocional. O documento também aborda como a masculinidade tóxica afeta homens negros de forma particular.
3. Geralmente o termo “masculinidade tóxica” é usado para se referir a uma
coleção vagamente interligados de normas, crenças e comportamentos
associados com a masculinidade, que são prejudiciais para as mulheres,
homens, crianças e sociedade em geral, ao qual a própria defesa da
masculinidade é ligada à virilidade tóxica, ou seja, os homens são agressivos
quando tentam defender e propor um conceito de masculinidade, de tal forma
que mostra como o debate sobre o valor normativo de um conceito de
masculinidade está ligada ao caráter agressivo, competitivo, homofóbico,
sexista e misógina da masculinidade tóxica (SCULOS, 2017)
4. "O patriarcado e o machismo
facilitam a vida do homem,
mas geram uma série de
angústias""
Claudio Serva
5.
6. DIÁLOGO I
No churrasco, pergunto a um amigo de vinte e tantos anos que estava
cursando graduação, trabalhando em uma grande construtora e, pra
completar, montou empresa própria:
– Mas como você está? Digo, de verdade, como fica sua saúde emocional
em meio a uma rotina tão pesada?
– Então (ele abaixa a voz, me puxa meio de canto), você não vai acreditar.
Tive um princípio de infarto semana passada. Estava em casa, com meus
pais, comecei a sentir uma dor estranha, foi ficando forte, forte… até que me
levaram correndo no hospital e era um infarto. Sorte que o médico
conseguiu me tratar na hora. Mas não vou esquecer mais do que ele me disse
depois, "se você seguir nesse ritmo, não passa dos trinta".
– Caramba! E você vinha conversando com alguém sobre a carga estar
muito pesada pra você?
– Na verdade não, estava só aguentando o tranco mesmo, sabe como é.
7. DIÁLOGO II
Num bar, na mesa atrás de mim.
– A Silvinha tá na sua, Diogo. Olha essa mini saia dela,
nóssasinhora, lambia até o caroço.
– É, ela tá dando mole, mas não tô bem hoje. Na real tô
sentindo falta da Carla (pelo contexto, parecia ser a ex
dele).
– Deixa de ser bicha. Vai lá, pô.
Silêncio.
– É uma mocinha mesmo esse Diogo. Vai perder uma
foda à toa.
9. TERRY CREWS, O ETERNO JULIUS DA SÉRIE TODO
MUNDO ODEIA O CHRIS, NÃO ESTÁ AQUI PARA ESSA
HISTÓRIA DE MACHÕES.
10. Como é ser um hétero negro que veio a público
contar uma história de ataque sexual?
É muito, muito difícil, porque você enfrenta uma
mentalidade que está enraizada em nossa cultura há
muito, muito tempo. O que descobri é que as pessoas
esperam que um cara como eu seja sempre durão. Mas
a verdade é que, sendo negro, a única ocasião em que
te consideram vítima é quando você está morto. Do
contrário, você não se machuca, não se cansa... as
pessoas acham que você vai ficar pulando no ar, de
uma enterrada para a outra.
11. Num evento recente você disse que a "masculinidade
pode ser um culto". Poderia falar mais sobre isso?
Amo ser homem. Sou pai. Sou marido. Adoro o que é ser
homem. Mas, quando você distorce essa definição, quando
de repente eu tenho de fazer tudo o que você diz para ser
homem – isso é culto. Porque cultos são [mecanismos de]
controle. Se você sair da linha, vamos te matar. É disso que
se trata. Quem se afasta do que eles consideram
masculinidade vira alvo.
12. • Entre os casos de homicídio, 92% das
vítimas são homens e os negros têm 23,5% a
mais de chances de serem assassinados, em
comparação a brasileiros de outras raças.
• Alessandro de Oliveira Campos é
psicólogo e coordena encontros para discutir
masculinidades, em São Paulo. “Há
angustias que impactam na saúde mental.
Homens negros cogitam frequentemente a
possibilidade de suicídio. Esse é um sintoma
assustador ”.
13. Eu durmo pronto pra guerra
E eu não era assim
Eu tenho ódio e sei, que é o mal pra mim
Fazer o que, se é assim, vida loka fabulosa
O cheiro é de pólvora
E eu prefiro rosas
— Racionais Mc’s, 2004
14.
15. O rapper paulistano Rincon Sapiência, 33, parece não querer
corresponder a esses estereótipos. Além das questões sociais e
provocações reflexivas que povoam suas letras, não esconde o
interesse pela moda, que o faz trocar as roupas de cores tediosas
reservadas às vitrines masculinas por peças vibrantes e
questionáveis em relação ao gênero.
O mesmo hip hop que Rincon viu limitado pelo machismo e pela
homofobia também deu a chave para que buscasse
conhecimento e quisesse sair do padrão. “Aceitar a sensibilidade
masculina é uma provocação nova, e é bacana a gente
reconsiderar valores”, avalia. “O rosa é uma cor bonita, usar saia
é confortável, chorar é um alívio... São coisas naturais, mas que,
por conta de conceitos engessados, a gente não se permite
sentir, e isso faz mal para nós mesmos.”
16.
17.
18. “O machismo está enraizado na construção do
imaginário do homem gay, que só é minimamente
útil quando se apropria das características viris do
padrão heteronormativo. Ser um negro, gay e
afeminado, muitas vezes, é sinônimo de solidão. A
não aceitação dos nossos corpos e do nosso
comportamento é incisiva”
19. Questionar os padrões de masculinidade da
perspectiva racial implica em “entender que homens
negros são mais do que corpos, mais do que
performance sexual, mas sim, homens com
multiplicidades, diferenças, receios e vontades
próprias”, sintetiza Caio César. Para Campos é
preciso pensar no plural: “não há masculinidade, mas
masculinidades”. Revista TRIP