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297
Itinerários, Araraquara, n. 25, 297-299, 2007
QUESTÕES DE HISTÓRIA E DE LITERATURA
Emerson Calil ROSSETTI1
LIMA, Luiz Costa. História. Ficção. Literatura. São Paulo: Companhia das
Letras, 2006.
Em História. Ficção. Literatura, o teórico Luiz Costa Lima propõe reflexões
de grande importância sobre questões que, ao longo do tempo, têm ocupado os
estudiosos. Dividido em três seções (“Seção A: A escrita da História”; “Seção B:
A Ficção”; “Seção C: A Literatura”), já no Prefácio o livro apresenta os problemas
que ocupam lugar central no desenvolvimento do trabalho: o discurso poético e
o discurso histórico, tomando como primeiras referências sobretudo as obras de
Homero, Heródoto e Tucídides. O crítico afirma que a escrita da História está
inevitavelmente subordinada ao ponto de vista que precede sua compreensão e
tem por aporia a verdade do que houve, ao passo que no discurso ficcional não se
postula uma verdade. Tais considerações, no entanto, não perdem de vista o fato
de que, em qualquer discurso, é preciso considerar a maneira como a realidade é
verbalmente trabalhada.
Na “Seção A: A escrita da História”, o autor ressalta que Heródoto e
Tucídides não são propriamente o princípio da escrita da História, mas os primeiros
historiadores de quem possuímos os textos integrais. Sobre eles, aliás, fica evidente
no texto de Costa Lima que, se são herdeiros da tradição narrativa épica, também
desenvolvem o projeto histórico presente nos poemas homéricos, cujas bases,
inclusive, eram atacadas por esses historiadores.
O juízo crítico do teórico a respeito da obra de Heródoto ressalta que o
historiador “[...] tinha o cuidado de não confundir o que pensava com o que lhe
haviam dito, ora recusando o que registrava, ora declarando haver outras opiniões,
ora dando seu endosso.” (LIMA, 2006, p.52). E conclui seu julgamento alegando
que uma figura assim deslizante não poderia ser passível de absoluta confiança em
relação ao que se exigia de um historiador.
Costa Lima também considera o modo como se acentua, na obra de Tucídides,
a solidificação da via aporética. Desse modo, enquanto em Heródoto a História é
registro de versões sobre um determinado acontecimento, em Tucídides é rigorosa
acribia, mais legítimo registro do que houve e, de caráter utilitário, como um
1
FIRA – Faculdades Integradas Regionais de Avaré – Departamento de Letras. Avaré – SP – Brasil.
18700-902 – emersonrossetti@ig.com.br.
298 Itinerários, Araraquara, n. 25, 297-299, 2007
Emerson Calil Rossetti
patrimônio, sua perenidade resultaria numa escrita de proveito para as futuras
gerações.
Quanto à completa fidelidade em relação aos eventos, Costa Lima se coloca
de maneira bastante objetiva, afirmando que, por sermos criaturas históricas, é
impossível não sermos parciais. E, colocando-se criticamente contra o pensamento
positivista, afirma: “A exatidão é muitas vezes sinônimo de superficialidade”
(LIMA, 2006, p.95).
E se a querela entre História e Ficção é de longa data, o teórico ilumina a
questão: para ele, um mesmo fenômeno pode dar lugar a diferentes tipos de
tratamento e cada tipo de saber pode transformar a “história crua” segundo critérios
bem diversos. Sendo assim, a História sempre manteria uma face obscura, um lado
não indagado. Quanto à ficção, “suspendendo a indagação da verdade, se isenta
de mentir” (LIMA, 2006, p.156). Em outras palavras, o relato absolutamente
transparente do que houve, pretendido pelo historiador, não é possível, pois a
verdade historiográfica está condicionada à intervenção do julgamento de um
agente que interpreta os fatos e estabelece critérios para a realização de sua tarefa.
Na “Seção B: A Ficção”, a Ilíada é apontada como realização que simboliza
o ápice da tradição épica, ao passo que a Odisséia é relacionada ao início de
sua decadência. Essa transformação que se verifica de uma obra para outra seria
motivada por uma progressiva perda da “[...] dignidade histórica dos feitos dos
heróis e o conseqüente destaque da cena privada.” (LIMA, 2006, p.173). Dito de
outro modo, a decadência do gênero épico assim compreendida é mensurada pelo
grau de interesse da epopéia pela História. E em virtude de tal decadência, a poesia,
cujo estatuto teórico era até então bastante precário, começa a tematizar-se a si
própria.
De acordo com Costa Lima (2006), se a tragédia e a sofística supunham a
falência do mito, a nova organização política grega acaba por conferir outro
papel à palavra: esta, meio de expressão para se contarem histórias (entendidas
como coisas não verdadeiras), reforça a desconfiança a respeito da ficção. Pois a
sofística, desestabilizando a palavra, faz cair por terra a crença de que o lógos era
uma garantia da verdade. Além disso, o poeta, que fora uma espécie de mestre da
verdade no distante período micênico, já havia perdido essa condição no auge da
épica. Recorrendo à preocupação rigorosa com as fontes de pesquisa, o teórico
acrescenta: “À palavra da sabedoria, reservada ao filósofo, há a palavra apenas de
encanto e embuste: a que se realiza pela mímesis.” (LIMA, 2006, p.181).
Dessa maneira, é somente com a Poética de Aristóteles que, conforme o
crítico, confere-se novo alento às discussões sobre o estatuto da palavra poética. E
como não poderia deixar de ser, o ensaísta procede a uma longa reflexão acerca de
conceitos como catarse e mímesis, fundamentais para a compreensão das questões
debatidas no livro, além de elementos centrais nas preocupações do teórico.
299
Itinerários, Araraquara, n. 25, 297-299, 2007
Questões de história e literatura
Costa Lima adverte que fictio, termo de origem latina e não utilizado por
Aristóteles em seu tratado, tinha tanto a acepção negativa de embuste quanto o
significadopositivodeatodecriação.Enemmesmonosentidopositivoéconsiderado
equivalente de mímesis, embora seja também articulado pela imaginação. O autor,
neste ponto, esclarece que a mímesis é “[...] a viga que acolhe e seleciona os valores
da sociedade e os converte em vias de orientação que circulam em suas obras [...]”,
ao passo que a ficção “diz da característica discursiva de tais textos” (LIMA,
2006, p.206). O que quer dizer que a mímesis se realiza ou se concretiza a partir da
vigência social de determinados valores e costumes, nutrindo-se da matéria-prima
da sociedade, explorando-a. Para Costa Lima, então, a ficção é um modo discursivo
ou uma modalidade do uso da linguagem. E a relação da ficção poética com a
verdade não é a proximidade com a realidade, mas a abertura de caminhos para o
que está sob ela: o real. Sendo assim, “O ficcional literário incorpora, ainda que de
maneira velada ou esotérica, parcelas da realidade.” (LIMA, 2006, p.282).
Na “Seção C: A Literatura”, Luiz Costa Lima apresenta importantes
considerações sobre a concepção de belas-letras e a vigência moderna do termo
“literatura”. Para tanto, se vale de escritos de Schlegel, Mme. de Staël, René de
Chateaubriand, Marcel Proust e Paul Valéry.
Posteriormente, o teórico trata das “formas híbridas”, textos que mesclam
documento e literatura, apresentando breve e eficiente análise do romance
Memórias do cárcere como exemplo dessa modalidade. Segundo o ensaísta, esta
obra de Graciliano Ramos pertence à forma híbrida “[...] porque reconhece que o
documento não exaure o que a configuração verbal admite.” (LIMA, 2006, p.364).
Finalmente, empreende-se uma análise de Os sertões, na qual Costa Lima
exercita plenamente e com grande clareza os conceitos apresentados e debatidos ao
longo do livro, fazendo uma leitura crítica da obra de Euclides da Cunha segundo
os parâmetros que presidem os estudos da História e do romance.
História. Ficção. Literatura, obra hermética se submetida a um julgamento
primário, revela-se uma leitura imprescindível aos que se interessam por poesia e
História, sobretudo em virtude da escassez de documentos dessa estatura entre as
produções acadêmicas.
Contra o argumento que pode acusar o excesso de teoria, deve-se ressaltar que
nenhum conceito (ou recorrência a reflexões de outros estudiosos que se dedicaram
ao assunto) é gratuito; ao contrário, todos os debates propostos são acompanhados
de análises de obras de grande expressão no cenário da cultura ocidental. Em toda
a abordagem do livro, a homologia entre teoria e prática se encarrega, portanto, de
tornar mais claras polêmicas que poucos estudiosos seriam capazes de apresentar
de modo tão denso e objetivo.
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  • 1. 297 Itinerários, Araraquara, n. 25, 297-299, 2007 QUESTÕES DE HISTÓRIA E DE LITERATURA Emerson Calil ROSSETTI1 LIMA, Luiz Costa. História. Ficção. Literatura. São Paulo: Companhia das Letras, 2006. Em História. Ficção. Literatura, o teórico Luiz Costa Lima propõe reflexões de grande importância sobre questões que, ao longo do tempo, têm ocupado os estudiosos. Dividido em três seções (“Seção A: A escrita da História”; “Seção B: A Ficção”; “Seção C: A Literatura”), já no Prefácio o livro apresenta os problemas que ocupam lugar central no desenvolvimento do trabalho: o discurso poético e o discurso histórico, tomando como primeiras referências sobretudo as obras de Homero, Heródoto e Tucídides. O crítico afirma que a escrita da História está inevitavelmente subordinada ao ponto de vista que precede sua compreensão e tem por aporia a verdade do que houve, ao passo que no discurso ficcional não se postula uma verdade. Tais considerações, no entanto, não perdem de vista o fato de que, em qualquer discurso, é preciso considerar a maneira como a realidade é verbalmente trabalhada. Na “Seção A: A escrita da História”, o autor ressalta que Heródoto e Tucídides não são propriamente o princípio da escrita da História, mas os primeiros historiadores de quem possuímos os textos integrais. Sobre eles, aliás, fica evidente no texto de Costa Lima que, se são herdeiros da tradição narrativa épica, também desenvolvem o projeto histórico presente nos poemas homéricos, cujas bases, inclusive, eram atacadas por esses historiadores. O juízo crítico do teórico a respeito da obra de Heródoto ressalta que o historiador “[...] tinha o cuidado de não confundir o que pensava com o que lhe haviam dito, ora recusando o que registrava, ora declarando haver outras opiniões, ora dando seu endosso.” (LIMA, 2006, p.52). E conclui seu julgamento alegando que uma figura assim deslizante não poderia ser passível de absoluta confiança em relação ao que se exigia de um historiador. Costa Lima também considera o modo como se acentua, na obra de Tucídides, a solidificação da via aporética. Desse modo, enquanto em Heródoto a História é registro de versões sobre um determinado acontecimento, em Tucídides é rigorosa acribia, mais legítimo registro do que houve e, de caráter utilitário, como um 1 FIRA – Faculdades Integradas Regionais de Avaré – Departamento de Letras. Avaré – SP – Brasil. 18700-902 – emersonrossetti@ig.com.br.
  • 2. 298 Itinerários, Araraquara, n. 25, 297-299, 2007 Emerson Calil Rossetti patrimônio, sua perenidade resultaria numa escrita de proveito para as futuras gerações. Quanto à completa fidelidade em relação aos eventos, Costa Lima se coloca de maneira bastante objetiva, afirmando que, por sermos criaturas históricas, é impossível não sermos parciais. E, colocando-se criticamente contra o pensamento positivista, afirma: “A exatidão é muitas vezes sinônimo de superficialidade” (LIMA, 2006, p.95). E se a querela entre História e Ficção é de longa data, o teórico ilumina a questão: para ele, um mesmo fenômeno pode dar lugar a diferentes tipos de tratamento e cada tipo de saber pode transformar a “história crua” segundo critérios bem diversos. Sendo assim, a História sempre manteria uma face obscura, um lado não indagado. Quanto à ficção, “suspendendo a indagação da verdade, se isenta de mentir” (LIMA, 2006, p.156). Em outras palavras, o relato absolutamente transparente do que houve, pretendido pelo historiador, não é possível, pois a verdade historiográfica está condicionada à intervenção do julgamento de um agente que interpreta os fatos e estabelece critérios para a realização de sua tarefa. Na “Seção B: A Ficção”, a Ilíada é apontada como realização que simboliza o ápice da tradição épica, ao passo que a Odisséia é relacionada ao início de sua decadência. Essa transformação que se verifica de uma obra para outra seria motivada por uma progressiva perda da “[...] dignidade histórica dos feitos dos heróis e o conseqüente destaque da cena privada.” (LIMA, 2006, p.173). Dito de outro modo, a decadência do gênero épico assim compreendida é mensurada pelo grau de interesse da epopéia pela História. E em virtude de tal decadência, a poesia, cujo estatuto teórico era até então bastante precário, começa a tematizar-se a si própria. De acordo com Costa Lima (2006), se a tragédia e a sofística supunham a falência do mito, a nova organização política grega acaba por conferir outro papel à palavra: esta, meio de expressão para se contarem histórias (entendidas como coisas não verdadeiras), reforça a desconfiança a respeito da ficção. Pois a sofística, desestabilizando a palavra, faz cair por terra a crença de que o lógos era uma garantia da verdade. Além disso, o poeta, que fora uma espécie de mestre da verdade no distante período micênico, já havia perdido essa condição no auge da épica. Recorrendo à preocupação rigorosa com as fontes de pesquisa, o teórico acrescenta: “À palavra da sabedoria, reservada ao filósofo, há a palavra apenas de encanto e embuste: a que se realiza pela mímesis.” (LIMA, 2006, p.181). Dessa maneira, é somente com a Poética de Aristóteles que, conforme o crítico, confere-se novo alento às discussões sobre o estatuto da palavra poética. E como não poderia deixar de ser, o ensaísta procede a uma longa reflexão acerca de conceitos como catarse e mímesis, fundamentais para a compreensão das questões debatidas no livro, além de elementos centrais nas preocupações do teórico.
  • 3. 299 Itinerários, Araraquara, n. 25, 297-299, 2007 Questões de história e literatura Costa Lima adverte que fictio, termo de origem latina e não utilizado por Aristóteles em seu tratado, tinha tanto a acepção negativa de embuste quanto o significadopositivodeatodecriação.Enemmesmonosentidopositivoéconsiderado equivalente de mímesis, embora seja também articulado pela imaginação. O autor, neste ponto, esclarece que a mímesis é “[...] a viga que acolhe e seleciona os valores da sociedade e os converte em vias de orientação que circulam em suas obras [...]”, ao passo que a ficção “diz da característica discursiva de tais textos” (LIMA, 2006, p.206). O que quer dizer que a mímesis se realiza ou se concretiza a partir da vigência social de determinados valores e costumes, nutrindo-se da matéria-prima da sociedade, explorando-a. Para Costa Lima, então, a ficção é um modo discursivo ou uma modalidade do uso da linguagem. E a relação da ficção poética com a verdade não é a proximidade com a realidade, mas a abertura de caminhos para o que está sob ela: o real. Sendo assim, “O ficcional literário incorpora, ainda que de maneira velada ou esotérica, parcelas da realidade.” (LIMA, 2006, p.282). Na “Seção C: A Literatura”, Luiz Costa Lima apresenta importantes considerações sobre a concepção de belas-letras e a vigência moderna do termo “literatura”. Para tanto, se vale de escritos de Schlegel, Mme. de Staël, René de Chateaubriand, Marcel Proust e Paul Valéry. Posteriormente, o teórico trata das “formas híbridas”, textos que mesclam documento e literatura, apresentando breve e eficiente análise do romance Memórias do cárcere como exemplo dessa modalidade. Segundo o ensaísta, esta obra de Graciliano Ramos pertence à forma híbrida “[...] porque reconhece que o documento não exaure o que a configuração verbal admite.” (LIMA, 2006, p.364). Finalmente, empreende-se uma análise de Os sertões, na qual Costa Lima exercita plenamente e com grande clareza os conceitos apresentados e debatidos ao longo do livro, fazendo uma leitura crítica da obra de Euclides da Cunha segundo os parâmetros que presidem os estudos da História e do romance. História. Ficção. Literatura, obra hermética se submetida a um julgamento primário, revela-se uma leitura imprescindível aos que se interessam por poesia e História, sobretudo em virtude da escassez de documentos dessa estatura entre as produções acadêmicas. Contra o argumento que pode acusar o excesso de teoria, deve-se ressaltar que nenhum conceito (ou recorrência a reflexões de outros estudiosos que se dedicaram ao assunto) é gratuito; ao contrário, todos os debates propostos são acompanhados de análises de obras de grande expressão no cenário da cultura ocidental. Em toda a abordagem do livro, a homologia entre teoria e prática se encarrega, portanto, de tornar mais claras polêmicas que poucos estudiosos seriam capazes de apresentar de modo tão denso e objetivo.