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Representação Chhing antiga da seleção do local de uma cidade; o geomante
consulta sua bússola magnética.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
1 - INTRODUÇÃO
2 - AS LEIS DA NATUREZA
3 - AS PROPORÇÕES NUMÉRICAS DA NATUREZA
4 - O SOPRO DA NATUREZA
5 - AS FORMAS DA NATUREZA
6 - A HISTÓRIA E A LITERATURA DO FENG-SHUI
7 - CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA SOBRE FENG-SHUI
3
APRESENTAÇAO
O termo 'Feng-shui" (pronuncia-se "Fong-suei") significa, em chinês,
"vento-água". Designa a geomancia tradicional chinesa em sua forma e aplicação
prática de rabdomancia; isto é, a detecção, por regras e sinais e por uma percepção
extra-sensorial do rabdomante, das energias telúricas de um local, ou edifício, e a
utilização vantajosa das boas energias, ou o modo de evitar ou cancelar as energias
telúricas negativas. Esta arte, ou, mais precisamente, ciência esotérica de rabdomancia,
é principalmente transmitida (como tudo que é esotérico) oralmente, de mestre a
discípulo, desde o princípio dos tempos. A codificação e sistematização de regras em
livros (mesmo entre os clássicos chineses, há pouco material direta e explicitamente
referente ao "Feng-shui") é fenômeno secundário. O conhecimento esotérico é uma
ciência sempre viva, e só pode ser adquirida por quem tem, ao menos em estado latente,
a vida espiritual, ou verdadeira vida (daí a necessidade de um mestre, ou guru para
despertá-la em quem a tem só em estado latente, ou embrionário). Esta vida espiritual,
ampliada e intensificada pela transmissão do conhecimento do guru ao discípulo, dá a
intuição que complementa e termina, no caso específico que consideramos, a ciência e a
prática do "Feng-shui".
O livro que o leitor tem em mãos foi o primeiro livro ocidental a tratar deste
assunto. Se na China há poucos livros sobre Feng-shui, o que não dizer do Ocidente? O
Reverendo E. J. Eitel, da "London Míssionary Socíety", ao ser designado como
missionário para a China, estudou e escreveu sobre budismo, mas seu renome continua
até hoje corno a primeira autoridade européia em Feng-sliui.
Sua obra, na época (primeira edição: 1873, pela Trübner & Co.) só teve paralelo
na de J. J. M. de Groot, administrador colonial holandês, em seu monumental "Sistema
Religioso da China".
De fato, as primeiras referências por escrito que o Ocidente recebeu sobre esta
misteriosa arte de interagir com as energias telúricas foram através dos missionários
enviados ao Oriente, e só no séc. XIX. À parte o livro específico do Rev. Eitel, há um
artigo ainda anterior, pioneiro, do Reverendo Yates.(1)
O Reverendo Eitel sem dúvida foi meticuloso na descrição da antiga ciência, e
devemos reconhecer que deve ter penetrado o seu espírito, e reconhecido em seu íntimo,
o valor de ao menos alguns de seus aspectos. Mas enquanto inglês preconceituoso,
fortemente imbuído pela educação européia, na época mais do que nunca fortemente
marcada pelo iluminismo, e em plena era do positivismo, hesitava em adotar
incondicionalmente uma ciência como o Feng-shui, totalmente dirigida pelo misticismo.
Para salvar as aparências, colocava-se como relator crítico de uma curiosa superstição
de um povo bárbaro. É curioso notar a atitude de auto-afirmação do cientificismo
europeu da época, em considerar tosco e bárbaro tudo que não derivasse da tradição
greco-latina, e do último rebento do aristotelismo: o positivismo.
Nos contatos iniciais entre ocidentais e chineses, um tema tão especial quanto o
Feng-shui nem aparecia em meio à perplexidade que uma parte exercia sobre a outra,
mas no século passado, que já apresentava comunidades de ocidentais bem enraizadas
em várias metrópoles chinesas, a convivência com os chineses levou os ocidentais a
observarem mais de perto as "superstições" e estranhos costumes daquela tribo tida
como na infância da civilização. Daí aparecerem referências fugazes, mas nunca
explicadas, à ciência do Feng-shui, até espicaçar a curiosidade dos letrados ocidentais,
4
que por fim começaram a publicar suas doutas conclusões sobre o folclore e as crenças
"anticristãs" dos pagãos a quem pretendiam civilizar.
É bem diferente a atitude de nossos dias. Começa a soprar o vento da Era de
Aquário, a nova forma de eterno sopro do Espírito. E assim o Ocidente vem construindo
a sua ponte para o Oriente, apagando-se o que ainda não faz um século se considerava,
de parte a parte, um abismo intransponível do modo não só de falar, mas de pensar e de
viver. Artistas, arquitetos, e mesmo alguns cientistas da vanguarda aquariana, por vezes
inconscientemente, por vezes com consciência e entusiástica curiosidade, estão se
aproximando da ciência das proporções e da harmonia entre as energias criadas pelas
formas, conceito este que descreve bem o Feng-shui. Estes temas também pertencem ao
folclore e ao esoterismo europeus, sob os nomes de: geomancia, rabdomancia,
radiestesia e, bem recentemente, “energia das formas” (assim como a "energia das
pirâmides", tão em destaque entre nós).
Se não vejamos: em tempos mais recentes que os do Rev. Eitel, encontramos
outra das parcas edições, no mundo ocidental, sobre a ciência telúrica chinesa, a China
pitoresca, do fotógrafo alemão Ertist Börschmann(2), com uma atitude bem diferente,
apresentando impressionantes fotos de "monumentos de Feng-shui", ou seja, cons-
truções (especialmente pagodes) destinadas não a fins estéticos ou utilitários, mas a
harmonizar as energias telúricas de um lugar, exatamente com o mesmo fim dos
menires e cromlechs encontrados no território europeu (França e Inglaterra,
particularmente). Foi dos primeiros ocidentais a expressar publicamente admiração pela
arte rabdomântica que resulta no subtítulo deste livro: um verdadeiro “paisagismos
sagrado”, e assim definiu, por suas próprias palavras, o Feng-shui:
"Esta palavra bem conhecida significa 'vento-água', mas em seu sentido amplo
significa as relações com a natureza ambiente, a influência da paisagem sobre a estética
dos edifícios e na felicidade de seus habitantes".
Notável coerência com todo o conceito ecológico de viver que eclodiu em
nossos dias, e a nosso ver, será uma das vigas-mestras da próxima fase da civilização
em que, em breve, entraremos ...
Logo no primeiro parágrafo desta Apresentação demos a tradução literal do
termo Feng-shui enquanto "vento-água”, mas levamos a discussão para uma
interpretação em termos de energia telúrica, rabdomancia, e alguns aspectos dos
contatos entre as civilizações oriental e ocidental que nos trouxeram o conhecimento
desta arte. Tudo isso para localizar o leitor num assunto demasiado genérico, sutil e
esotérico; é preciso algum rodeio para delimitar um território tão vasto. Mas voltemos
exatamente a "vento-água", pois aqui temos, contrariando todas as aparências, uma
definição precisa (a aparência é tudo o que engana e que é desprovido de importância,
para o esoterista). Ora, o termo designa tudo o que é fluido, quer no estado gasoso, quer
no estado líquido, dando a sensação de dinâmica, de movimento, e da própria energia
(em chinês, ”Ch’i”, termo familiar para nós através da disciplina física do "Tai Ch'i
Chuan”; o domínio do Ch'i dentro de nosso corpo, tal como é objetivo da Ioga, que
chama ao Ch'i de "Prana"). Aqui uma convergencia que não é de surpreender com a
síntese científica que a ciência exotérica, a da Universidade, inconscientemente, e
malgrado ela mesma, vem elaborando para a futura civilização aquariana, outra de suas
vigas-mestras, a nosso ver: a evolução da Termodinâmica em Energética, e esta, dado
mais algum tempo, na Teoria do Campo Unificado, verdadeira busca pela Pedra
Filosofal dos físicos contemporâneos. Essa energia única, fonte de todas as coisas, a ser
descrita pelo Campo Unificado, será a tradução na linguagem lógico-matemática
ocidental, do perene Ch'i.
5
Fundamentando este enfoque do Feng-shui enquanto ciência de um jogo de
energias, ou Energética, recorremos mais uma vez a Borschmann:
"Certos cumes [ ... 1 são coroados com pagodes, pequenos templos ou pequenos
pagodes, para harmonizar as forças mágicas do céu e da terra. Esta ideia assemelha-se,
por exemplo, ao nosso conceito da emanação da força magnética de um condutor
pontiagudo. E o geomante chinês também considera as formas da natureza como um
campo magnético".
Ou ainda, nas palavras de Joseph Needham, autor de nossos dias, em seu
Ciência e civilização na China(3), primeiro a capacitar o ocidental a conhecer todo o
contexto do Feng-shui:
"Cada lugar tinha suas características topográficas especiais, que modificavam a
influência local dos vários Ch’i da natureza. As formas das colinas e direções dos
cursos d'água eram as mais importantes, mas adicionalmente as alturas e formas dos
edifícios, e as direções de estradas e pontes, eram fatores poderosos. A força e a
natureza das correntes invisíveis seriam modificadas de hora em hora pelas posições dos
corpos celestes, de modo que seus aspectos vistos da localidade em questão precisavam
ser considerados. Enquanto que a escolha dos locais era de primordial importância, a má
localização não era irremediável, pois valas e túneis podiam ser escavados, ou outras
medidas tomadas para alterar a situação do Feng-shui ".
Ademais, segundo o mesmo autor, à arte do Feng-shui deve-se atribuir a "grande
beleza da localização de tantas fazendas, casas e aldeias por toda a China".
Na China, até a ascensão do regime comunista, o Feng-shui era uma ciência
reconhecida pelo governo imperial, dirigida pelo Gabinete dos Ritos, supervisionado
diretamente pelo Imperador. Nos tempos em que era praticado pela autoridade pública,
produziu a paisagem clássica chinesa. Visava manter a produção agrícola e si-
multaneamente os fins estéticos e equilíbrio das energias mágicas, ideia absolutamente
de acordo com os ideais de uma sociedade ecologicamente estável, e contrárias à
dilapidação do ecossistema causada pelo industrialismo e imperialismo econômico
materialista.
A definição tradicional chinesa do Feng-shui é: “A arte de adaptar as residências
dos vivos e dos mortos de modo a cooperar e harmonizar com as correntes locais do
sopro cósmico". A mentalidade mágica pressuposta por: "sopro cósmico"; "forças
mágicas", "Ch’i”; “espíritos da natureza"; "espíritos dos mortos" e "correntes invisíveis"
chocou o racionalismo ocidental, num contato inicial, causando forte aversão a essa
"superstição animista” e ao "fatalismo oriental". O leitor achará, ao longo deste livro,
desconcertante a posição de Eitel, que, tido como autoridade e um clássico ocidental do
Feng-shui, aparece mais como um detrator deste aspecto da cultura oriental, e - aos
olhos mais sadios de nosso tempo pré-aquariano - até mesmo um "snob" intelectual.
Especialmente na "Conclusão", o Autor se refere ao Feng-shui como reminiscência da
infância de uma humanidade pré-civilizada. Mesmo que porventura tivesse reconhecido
a sabedoria oriental em seu íntimo, é preciso lembrar que enquanto missionário, seus
compatriotas, seus superiores religiosos e seu editor supunham que ele estivesse na
China para dissuadir os chineses de suas superstições, e não para converter-se a elas.
Devia cristianizar a China, e impor a ela o racionalismo positivista, e não se transformar
em defensor e simpatizante do Taoísmo e do Budismo.
Os autores modernos, no entanto, não se referem mais ao Feng-shui como o fez,
por exemplo, o administrador colonial de Groot, como "quase-ciência", ou como os
últimos defensores do positivismo materialista acusam as ciências alternativas e o esote-
rismo de hoje, como "pseudo-ciência".
6
Nestes últimos anos, com a onda de orientalismo que passa sobre o Ocidente,
especialmente no pós-guerra, e depois da década de 6O, o Feng-shui reapareceu
notavelmente na costa Oeste dos EUA, ponto de concentração de imigrantes chineses.
Oficialmente proscrito na China rnaoísta, faz-nos assistir ao curioso espetáculo da
orientalização do Ocidente e ocidentalização do Oriente. E desse interesse dos países
ocidentais, a ciência tradicional renasce no país de sua origem, contaminado e
dominado por ideias e ideologias européias, em Formosa, Hong Kong e outros lugares
do Extremo Oriente, com influência chinesa, fora da China comunista.
Toda arte e ciência da China é atribuída mitologicamente ao imperador Fo Hi,
que "olhando para cima, contemplou as imagens no céu, e olhando para baixo, observou
os padrões da terra". Isto é uma referência à ciência antediluviana, sendo Fo Hi um
herói civilizador do mundo caótico pós-diluviano. Na verdade, esse episódio é uma
outra expressão do mesmo que acontecia no Antigo Egito, após o mesmo Dilúvio, com
Hermes Trismegisto: "O que está embaixo é como o que está em cima".
A mesma arte paisagística equivalente à dos chineses já foi observada por
historiadores e arqueólogos europeus mais argutos, quanto à paisagem grega, e a
localização dos antigos templos. E ainda hoje se reflete no bom gosto intuitivo de um
arquiteto ou paisagista com sólida formação cultural e artística.
Antes de passarmos a uma exposição sucinta dos principais pontos da filosofia
taoísta e do Feng-shui apresentados neste livro, para que o leitor não-familiarizado
possa referir-se a ela como orientação ao longo de sua leitura, façamos ainda uma crítica
e advertência sobre as falhas do modo de pensar oriental, que não é tampouco a
perfeição que os defensores entusiásticos de hoje em dia pensam. A ciência oriental é
totalmente indutiva: tudo se encaixa, ou é forçado a encaixar-se num molde de
explicações universais pré-existentes. Não há espaço para o novo ou para a
experimentação. Os "bárbaros" europeus não invadiram o Oriente: encontraram a porta
aberta, de uma civilização tão velha que já estava moribunda no séc. XVIII, vivendo
apenas de recordações, e da cuidadosa manutenção do passado. No Ocidente, temos o
oposto: o excesso de experimentação e análise, excesso dedutivo, que perde quaiquer
referencial fixo, esquecendo-nos que exatamente a metade do mundo em que vivemos é
o mundo em que queremos acreditar que vivemos, e a outra exata metade deve ser
deixada à experimentação do novo, para que a alma humana e a civilização não morram.
Os escritos clássicos pré-confucionistas ainda falavam de um deus único e
pessoal, que foi deixado de lado pelo confucionismo, mas a visão viva, animista e
interdependente da natureza nunca deixou de existir na China: uma espécie de
“ecologia" dos espíritos humanos e da natureza.
No princípio, temos o Tao, o Espírito enquanto nada absoluto, o Proteu grego.
Seu primeiro movimento criou a energia Yang, solar, entropizante, que dá o
movimento, que afasta, desagrega, e esta, após ter-se expandido com o máximo de seu
movimento natural, gerou seu oposto, o Yin, o lunar, a neguentropia, a imobilidade, o
frio, a aglutinação. E este movimento de alternância entre as duas energias opostas
tornou-se perpétuo, e característica intrínseca de um universo pulsante para todo o
sempre.
A energia indiferenciada de onde saem os dois princípios é o "Ch'i", o sopro da
natureza, ou o sopro cósmico. O sopro produziu os dois princípios, e estes, todo o
Universo, segundo leis fixas. Estas leis da natureza são chamadas "Li": a ordem anterior
e arquetípica do universo, tal como é igualmente descrita por Platão. Aliás, as verdades
universais e arquetípicas são descritas por igual por todos os Iniciados ou Mestres do
Espírito, é o que salta aos olhos da pessoa que já acumulou alguma leitura ou
experiência em textos esotéricos, especialmente os da Antigüidade. "Li" está de acordo
7
(mas não se identifica) com "So", as proporções numéricas (que não se resumem a uma
ingenua aritmética "teosófica", como os principiantes de ocultismo podem interpretar),
e cuja expressão analítica máxima está mesmo nas medidas tais como são feitas pela
ciência física e cartesiana ocidental. Esta ciência da natureza, tal como conhecemos, era
chamada de "Ying", pelos chineses, expressão que significaria "formas da natureza".
Eitel se refere a um mestre clássico do Feng-shui para dividir a exposição do sistema da
ciência chinesa nestas quatro partes: Chi; Li; So; Ying.
Quanto ao aspecto de "Li", a ordem celestial, arquetípica, é anterior mesmo à
Criação, ainda na "mente de Deus": o "Céu" da filosofia chinesa é o ideal ou mundo
arquetipal, exatamente como formulado por Platão. Ora, o que se vê no Céu, hoje, são
os astros, portanto, a energia criadora que vem do Céu é estudada pela Astrologia.
As forças estudadas pela Astrologia moldam a Terra, e esta, mais cedo ou mais
tarde, torna-se reflexo fiel do céu sob o qual está. O mesmo acontece com o destino
individual, pelo levantamento do horóscopo.
Princípios gerais, para sempre serem tidos em mente:
1 . O que está em cima é como o que está embaixo: o mundo dos arquétipos reflete-se
no mundo dos tipos.
2. Podemos nos colocar nas correntes favoráveis do sopro cósmico dos astros, pela
ciência astrológica, como um barco a vela tira proveito dos ventos.
3. Os espíritos da natureza, dos mortos e outros espíritos também podem ajudar ou
prejudicar, e podemos nos colocar sob a proteção deste ou daquele que nos possa ser
favorável.
Como o Céu é explicitamente representado pelos elementos da Astrologia,
temos: o Sol e a Lua (o Yang e o Yin); os 12 signos, as 28 constelações reconhecidas
pelos chineses; 5 planetas; as 7 estrelas da Ursa Maior e as 9 do Alqueire do Norte,
Assinalamos também a seguinte tabela de correspondência entre os signos da
astrologia chinesa e da ocidental:
Rato – Áries Cavalo - Libra
Búfalo – Touro Cabra - Escorpião
Tigre – Gêmeos Macaco - Sagitário
Gato – Câncer Galo - Capricórnio
Dragão – Leão Cão - Aquário
Serpente - Virgem Porco - Peixes
Os signos orientais, do calendário lunar, referem-se à interioridade dos tipos
Psicológicos que representam; os signos ocidentais, do calendário solar, à exteríoridade
deles.
É de se notar também o simbolismo dos cinco planetas, notavelmente
coincidente com o simbolismo esotérico dos deuses que dão nome a estes planetas, para
nós, segundo a mitologia grega:
Júpiter Leste Primavera Benevolência Madeira
Marte Sul Verão Propriedade Fogo
Vênus Oeste Outono Decoro Metal
Mercúrio Norte Inverno Sabedoria Água
Saturno Meio da Terra Meio do Verão Fidelidade Terra
Sobre a dinâmica dos cinco elementos:
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Madeira Produz Fogo Metal destrói Madeira
Fogo Terra Madeira Terra
Terra Metal Terra Água
Metal Água Água Fogo
Água Madeira Fogo Metal
Sobre “So", ou numerologia chinesa e medidas proporcionais mágicas da
natureza, diz a lenda que o rei Fo Hi, pós-diluviano, descobriu-as meditando sobre os
caracóis da crina de um cavalo-dragão (animal semelhante ao cavalo, assim como o
licorne da mitologia ocidental, de natureza fantástica). Isto é o mito chinês da cabala.
Perfeitamente equivalente ao mito de Posêidon presenteando o cavalo aos humanos,
adotado pelos atenienses e pela deusa Atena, como símbolo de sabedoria. A cabala,
sistema de interpretação esotérica que não é privilégio da hermenêutica judaica, vem do
mar, isto é, da Atlântida ante-diluviana, conservada por tradição, de mestre a discípulo,
até hoje, e de hoje para sempre. A mesma referência à cabala está na Ilíada, que se
refere esotericamente à Guerra da Atlântida, e não à de Tróia. O cavalo de Tróia
assinala existir no poema homérico uma "Cabala de Tróia", que relata as façanhas dos
gregos contra os atlantes como nos fala Platão no Timeu e no Crítias.
O casco da tartaruga, cujas linhas, em outra lenda, foram também observadas
pelo mesmo herói civilizador. Fo Hi, coincide com o simbolismo hindu: a tartaruga
identificada com o oceano no primeiro chacra. Muladhara, ou "Raiz Primordial", o
oceano do Dilúvio, debaixo de cujas águas tudo apareceu. Na mitologia grega, ainda,
esse Oceano do Dilúvio é o Mar Negro, à porta do qual se localizava Tróia, e que é
cenário do mito esotéríco dos Argonautas.
Ainda a observar uma peculiaridade numerológica: a coincidêncía no uso do
sistema sexagesimal pelos sumérios, egípcios (ano de 360 dias, com a eclíptica dividida
em 360º) e chineses. Isso é encontrado no esquema lógico-indutivo do Yi Ching,
também descrito neste livro por Eitel, para fundamentar o Feng-shui. Os oito trigramas
do Yi Ching traçados na Terra, e combinados com os quatro pontos cardeais, formam
12, ou o sistema duodecimal de numeração, que usavam para as coisas da Terra.
No Céu, para os cálculos astrológicos, usavam o sistema decimal, mas
combinavam-no com os seis elementos da natureza (e não 5) que são descritos no Yi
Ching. Ora: 10 x 6 = 12 x 5 = 60, base do sistema sexagesimal, e essas 60 unidades,
repetidas seis vezes (seis elementos) resultavam, para os chineses, na divisão do ano em
360 dias. O que se depreende de mais curioso disto é a tradição esotérica ante diluviana
comum a chineses, sumérios e mesmo egípcios e maias, que remontam não tanto à
Atlântida, mas aos continentes ainda anteriores, afundados no Oceano Pacífico
(Lemúria; Mu), derivados do antigo continente do Sul, a Gonduana, o que nos mostra
como pode ser conservada até hoje a distantíssima tradição dos gigantes ante-diluvianos
da Gonduana.
Norberto de Paula Lima
(1) M. Yates, "Ancestral Worship and Feng-shui", in Chinese Recorder and Missionary
Journal, Vol. 1, 1868.
(2) E. Börschmann, Picturesque China (Londres: T. Fischer Unwín, 1924).
(3) J. Needham, Science and civilization in China (Cambridge University Press:
1956-62).
9
Local legendário das montanhas Wu-tang, adornada com monumentos Feng-shui.
1 - INTRODUÇAO
O que é Feng-shui? Esta é uma pergunta que tem sido feita repetidamente nos
últimos trinta anos. Desde que foi permitido aos estrangeiros estabelecer-se nos confins
deste estranho império da China, essa mesma pergunta tem brotado continuamente aqui
e ali. Ao comprar um terreno, ao construir uma casa, ao derrubar uma parede, ou erguer
um mastro de bandeira - os residentes dos Portos do Tratado encontraram inumeráveis
dificuldades, e tudo por causa do Feng-shui. Quando foi proposto erguer alguns postes
telegráficos, quando a construção de uma ferrovia foi sugerida ao governo chinês,
quando uns poucos trilhos foram projetados para as minas de carvão do interior, os
funcionários chineses invariavelmente faziam uma polida mesura e declaravam que
aquilo era impossível, por causa do Feng-shui. Quando há trinta anos os principais
comerciantes da colônia de Hong Kong procuraram estabelecer o bairro comercial da
cidade no assim chamado Vale Feliz, e fazer aquela parte da ilha o centro da cidade,
fracassaram vergonhosamente por causa do Fengshui. Quando o governo de Hong Kong
abriu uma estrada, agora conhecida como o Abismo, rumo ao Vale Feliz, a comunidade
chinesa foi lançada num estado de abjeto terror e medo, por causa da perturbação que
essa amputação dos membros do dragão causaria ao Feng-shui de Hong Kong; e quando
muitos dos engenheiros empregados na obra morreram com a febre de Hong Kong, e as
casas de estrangeiros já construídas no Vale Feliz tiveram de ser abandonadas por causa
da malária, os chineses triunfalmente declararam ter sido um ato de justiça retributiva
de parte do Feng-shui. Quando o senhor Amaral, governador de Macau, que combinava
uma grande paixão pela construção de estradas e um desprezo ilimitado pelo Feng-shui,
interferiu na situação e aspectos das tumbas chinesas, foi derrubado pelos chineses, sua
cabeça cortada, e os chineses chamaram a esse feito horrível a vinganca do Feng-shui.
Por certo deve haver alguma coisa no Feng-shui, se leva as classes inferiores dos
chineses a cometer um homicídio, e é rapidamente sustentado por Ministros de Estado
10
como uma desculpa satisfatória para sua má vontade em favorecer o progresso do
comércio e da civilização.
O que é Feng-shui? Os sinólogos foram procurar nos clássicos chineses uma
resposta a essa pergunta, consultaram seus dicionários e não acharam nada. Os
comerciantes perguntaram a seus compradores e meninos de entregas: "O que é
Feng-shui?" mas as respostas que obtiveram eram obscuras e confusas, e no máximo
lhes disseram que Feng-shui significa "vento e água", e é chamado assim “porque é uma
coisa como o vento, que não se pode compreender, e como a água, que não se pode
agarrar”.
Mas, por incrível que pareça, os chineses constantemente asseveram que os
estrangeiros sabem tudo sobre o Feng-shui. Quando houve uma assustadora mortandade
entre as tropas de Hong Kong aquarteladas no acampamento Murray, e o médico
colonial propôs que se plantassem bambus na parte posterior dos alojamentos, os
chineses justamente observaram que essa medida estava estritamente de acordo com o
Feng-shui; e quando foi descoberto que a epidemia foi assim de fato interrompida,
viram isso como prova das virtudes do Feng-shui. Quando os estrangeiros residentes em
Hong Kong começaram a construir suas mansões em Pok-fulum (que o Feng-shui indica
ser o melhor local da ilha), quando o governo começou a construir um reservatório ali,
quando tanques foram construídos ao norte de Hong Kong, e a encosta do morro foi
totalmente arborizada, quando os cortes de terra foram proibidos onde houvesse muitas
rochas decompostas, os chineses, em todos esses casos, supuseram que os estrangeiros
conheciam mais sobre Feng-shui do que supunham, e o Agrônomo Geral foi tido como
adepto profundo do Feng-shui. Ora, disseram eles, eis aí a Casa do Governo ocupando o
melhor local do lado norte da ilha, protegida na parte de trás por árvores altas e terraços
de proteção, bordejada à direita e à esquerda por estradas com curvas graciosas, e toda a
situação combinando com tudo o que o Feng-shui prescreveria - como é possível que os
estrangeiros finjam nada saber do Feng-shui?
Bem, se o Feng-shui nada mais fosse que nosso bom senso e o que nossos
instintos naturais nos dizem, o Feng-shui dos chineses não seria nenhuma charada para
nós. Mas o fato é que os chineses transforniaram o Feng-shui numa ciência oculta, e os
peritos nessa ciencia, que ganham a vida com ela, acham vantajoso fazer mistério em
torno dela, assim como os alquimistas e astrólogos europeus faziam com suas
divagações. Toda pessoa que mora na China, porém, adquire, através do relacionamento
de alguns anos com o povo, uma ideia tolerável do que é o Feng-shui, e a maioria de
meus leitores sem dúvida sabe que, na prática, é simplesmente um sistema de su-
perstição que pretende ensinar às pessoas onde e quando construir um túmulo ou erigir
uma casa de modo a garantir aos interessados prosperidade e felicidade duradouras.
Desde minha chegada à China tive muitos entrechoques práticos com o
Feng-shui, e por muitos anos coligi notas sobre o assunto e estudei sua literatura em
todas as suas ramificações, e agora proponho-me apresentar o resultado de meus estudos
perante o público. Feng-shui, pelo que entendi, nada mais é que outro nome para as
ciências naturais, e, portanto, devo pedir a indulgência de meus leitores por introduzir
um esboço das ciências físicas chinesas para tornar inteligível o sistema do Feng-shui.
As ciências naturais nunca foram cultivadas na China daquela maneira técnica,
seca e casual que a nós parece inseparável de toda verdadeira ciência. Os naturalistas
chineses não se deram muito ao trabalho de estudar a natureza e arrancar-lhe seus
segredos por testes e experiências minuciosos e práticos. Não inventaram nenhum
instrumento para ajudá-los na observação dos corpos celestes; nunca se dedicaram a
caçar escaravelhos e embalsamar pássaros, ficam horrorizados com a ideia de dissecar o
corpo dos animais, nem analisaram quimicamente as substâncias inorgânicas, mas com
11
pouquíssimo conhecimento efetivo da natureza desenvolveram todo um sistema de
ciência natural, a partir de sua consciência interior, e expuseram-no de acordo com as
fórmulas dogmáticas da antiga tradição. Por mais deplorável que seja essa ausência de
investigação prática e experimental, que abriu as portas a toda sorte de teoria
conjectural, ela preservou na ciência natural chinesa um espírito de reverência sagrada
pelos poderes divinos da natureza.
Muito embora o moderno confucionismo tenha há muito tempo descartado a
crença num Deus pessoal supremo, do qual seus escritos clássicos ainda preservam uma
memória morta, e muito embora tenham substituído o Deus pessoal, que seus ancestrais
veneraram, por uma entidade abstrata, desprovida de quaisquer atributos, vêem a
natureza não como um tecido morto e inanimado, mas como um organismo vivo e
respirando. Vêem uma corrente de ouro de vida espiritual passando por toda forma de
existência e unindo, como num só corpo vivo, tudo que subsiste lá no céu ou cá na terra.
O que tão frequentemente foi admirado na filosofia natural dos gregos - que eles faziam
a natureza viver, que viam em cada pedra, em cada árvore um espírito vivo; que
povoavam o mar com náiades, as florestas com sátiros -, essa maneira poética, emotiva
e reverente de ver os objetos naturais, é igualmente característica da ciência natural na
China.
Todo o sistema do Feng-shui é baseado nesse conceito emotivo da natureza.
Podemos sorrir para o caráter anticientífico e rudimentar da fisiologia chinesa; podemos
apontar que cada ramo da ciência na China nada mais é que uma tentativa rudimentar
para atingir as verdades que qualquer criança de escola européia conhece bem; podemos
concluir que a China como um todo assemelha-se a uma criança grande, em cujo
intelecto aconteceu uma súbita desgraça, e que chegou à idade adulta e à velhice sem
mais conhecimento que um bebê precoce; e no entanto digo, contemplando essa mesma
China, o mais antigo dos povos da Antiguidade, o maior dentre os grandes impérios, ou
pelo menos o mais populoso de todos os grandes países do mundo, pesado com a idade,
estupidificado, com a ignorância de uma criança no que concerne às coisas do intelecto
- no entanto eu digo que quisera Deus que nossos homens de ciência preservassem em
seus laboratórios, observatórios e salas de aula aquela mesma reverência infantil pelos
poderes vivos da natureza, aquele temor sagrado pelos mistérios do invisível, aquela
firme crença na realidade do mundo invisível e sua constante intercomunicação com o
visível e temporal, que caracterizam as tentativas chinesas de elaborar uma ciência
natural.
O sistema de Feng-shui é relativamente moderno, em sua origem. Seus
diagramas e ideias principais são de fato emprestados dos antigos clássicos, mas seu
método e aplicação prática são quase inteiramente baseados nos ensinamentos de
Chu-hi e outros, que viveram sob a dinastia Sung (1126-1278) e cujos comentários aos
clássicos são lidos em todas as escolas. O modo de pensar de Chu-bi de fato foi adotado
pelo moderno confucionismo, e forma a base filosófica de todo o sistema do Feng-shui.
De acordo com Chu-hi, no começo havia um só princípio abstrato ou mônada,
chamado de "nada absoluto", que evoluiu por si mesmo ao "grande absoluto". Esse
princípio abstrato ou mônada, o grande absoluto, é a causa primordial de toda
existência. Quando se moveu pela primeira vez, seu alento ou energia vital, congelan-
do-se, produziu o grande princípio masculino. Quando se movimentou ao máximo,
descansou, e, ao descansar, produziu o princípio feminino. Depois de ter descansado ao
máximo, moveu-se de novo, e assim passou ao movimento alternado com o repouso,
sem cessar. Quando essa causa suprema assim se dividiu em masculino e feminino, o
que estava em cima constituiu o céu, e o que estava embaixo formou a terra. Assim
foram feitos céu e terra. Mas a causa suprema, tendo produzido pela evolução os
12
princípios masculino e feminino, e através deles o céu e a terra, não cessou suas
permutações constantes, no decurso das quais homens e animais, vegetais e minerais
vieram a ser. A mesma energia vital, além disso, continua a agir e sempre através
daquelas duas causas originais, as forças masculinas e femininas da natureza, que desde
então mútua e alternadamente empurram e agitam uma à outra, sem um momento de
descanso.
Ora, a energia que anima os dois princípios é chamada em chinês Hi, ou o alento
da natureza. Quando esse alento foi pela primeira vez exalado e produziu os princípios
masculino e feminino e, ao fim, todo o universo, não o fez arbitrariamente, ou ao acaso,
mas seguiu leis imutáveis, fixas, inescrutáveis e imutáveis. Essas leis, ou ordem da
natureza, chamadas Li, foram assim abstratamente consideradas anteriores à emissão do
sopro vital, e devem ser consideradas separadamente. Mais uma vez considerando este
Li, ou ordem geral do universo, os antigos sábios observaram que todas as leis da
natureza e todas as operações de seu sopro vital estão em estrito acordo com certos
princípios matemáticos, que podem ser traçados e ilustrados por diagramas, exibindo a
proporção numérica do universo, chamada So, ou números. Mas o sopro da natureza, ou
Hi, a ordem da natureza, chamada Li, e as proporções matemáticas da natureza,
chamadas So, esses três princípios não podem ser reconhecidos diretamente pelos
sentidos; estão ocultos à vista, e só se tornam manifestos através de formas e perfis da
natureza física. Em outras palavras, os fenômenos da natureza, suas formas exteriores
de aparência, constituem um quarto ramo do sistema da ciência natural chamado Ying,
ou forma da natureza. Ora, essas quatro divisões, Li, ou a ordem geral da natureza, So,
suas proporções numéricas, Hi, seu sopro vital ou energias sutis, e Ying, suas formas
aparentes, constituem o que é popularmente chamado o sistema de Feng-shui.
Nenhuma obra chinesa sobre o Feng-shui, porém, ou pelo menos nenhuma que
vi ou de que ouvi dizer - segue essa divisão metodicamente, se bem que todas
mencionem esses quatro princípios e lhes dêem aqui e ali a devida importância. Por
outro lado, essa divisão em quatro ramos do sistema do Feng-shui não é de minha
autoria. Um conhecido erudito cantonês, membro do Colégio Imperial menciona, num
prefácio que escreveu a uma popular obra sobre geomancia, que todo o sistema do
Feng-shui poderia muito vantajosamente ser dividido nas quatro partes mencionadas.
Desse prefácio tomei a sugestão, e proponho agora apresentar a meus leitores o sistema
do Feng-shui, segundo esse plano quádruplo, e elaborando-o de modo a dar-lhes uma
visão de todo o sistema da ciência natural chinesa.
13
A Fortaleza do Terror, Ting-hai, em Chusan, numa paisagem rica em Feng-shui,
com casa rural e Recinto dos Ancestrais.
2 - AS LEIS DA NATUREZA
De acordo com as observações acima, preciso primeiro tratar de Li, ou os
princípios gerais que governam a natureza; com as leis do universo físico. Para entender
isto direito precisamos de saída ter em mente que o chinês vê o céu como o tipo ideal,
de que nossa terra é apenas um grosseiro reflexo material.
Tudo que existe na terra nada mais é do que a forma sensível e transitória de
algum agente celestial. Tudo que é terrestre tem seu protótipo, sua causa primordial, seu
agente governante no céu. O filósofo chinês, contemplando as belezas da natureza, a
variedade de colinas e planícies, rios e oceanos, a maravilhosa harmonia da cor, luz e
sombra, vê nelas nada além do opaco reflexo daquele cenário mais esplêndido no
afresco de beleza etérea do firmamento estrelado do céu. Olha para o sol, aquele
ofuscante regente do dia, e reconhece nele, como seu reflexo terrestre, o princípio
masculino da criação, governando tudo que está debaixo do sol. Ergue os olhos para a
lua, a bela rainha da noite, e vê seu reflexo na terra no princípio feminino, difundindo-se
por todas as formas de existência sublunar. Observa o rápido curso rotatório dos cinco
planetas: Júpiter, Marte, Vênus, Mercúrio e Saturno, e vê sua contraparte na terra no
incessante intercâmbio e permutação dos cinco elementos da natureza: madeira, fogo,
metal, água e terra. Observa o firmamento estrelado à noite, e compara-o com sua
transcrição fracamente refletida na superfície de nossa terra, onde os picos das
montanhas formam as estrelas, os rios e oceanos correspondem à Via Láctea.
Em suma, o firmamento do céu é, para um observador chinês, o livro misterioso
em que as leis da natureza, os destinos das nações, o destino e a sorte de cada indivíduo
estão escritos em caracteres místicos bieroglificos, inteligíveis unicamente para os
iniciados. Ora, decifrar essas tábuas do céu, romper os selos deste livro apocalíptico, é o
14
objetivo primário do Feng-shui, e o primeiro método a ser empregado na decifração
desse horóscopo celestial do futuro, a primeira chave a ser inserida para destravar esse
enigmático cofre, em que as fortunas das gerações presentes e futuras estão trancadas, é
o conhecimento dos princípios ou leis gerais da natureza.
Aprendam pois, suas fortunas, e guardem bem as seguintes licões: 1. Que o céu
governa a terra; 2. Que tanto céu como terra influenciam todos os seres vivos e está em
suas mãos voltar esta influência a seu favor; 3. Que os fados dos vivos também
dependem da boa vontade e influência geral dos mortos.
Quanto ao primeiro ponto, a influência que o céu exerce sobre a terra, os agentes
que entram em consideração aqui são o sol e a lua, com os doze signos do zodíaco e as
vinte e oito constelações, os cinco planetas - pois só cinco são conhecidos dos chineses -
as sete estrelas da Ursa Maior e nove outras estrelas do alqueire do norte.
O sol, como já observamos, influencia todo o universo físico e o curso aparente
do sol, marcado pelos doze signos zodiacais, é portanto um elemento importante no
cálculo da influência do céu sobre a terra.
Os chineses dividem a eclíptica em doze partes iguais, dando a cada uma o nome
de um animal. Assim, à primeira, chamam rato; corresponde a Áries; a seguinte é o
touro, igual ao nosso signo do Touro; a terceira, que chamam tigre, corresponde a
Gêmeos; a quarta, ou a lebre, corresponde a Câncer; a quinta, o dragão, corresponde •
Leão; a sexta, ou a cobra, a Virgem; a sétima, o cavalo, a Libra; a oitava, o carneiro, a
Escorpião; a nona, o macaco, a Sagitário; a décima, o galo, a Capricórnio; a undécima,
o cão, a Aquário; e a duodécima, o javali, a Peixes. Devido à precessão dos equinócios,
ou deslocamento dos pontos equinociais do leste para o oeste, ocorreu uma mudança -
desde que os ancestrais dos chineses fixaram esses doze asterismos - digo que ocorreu
uma mudança nas relações entre os signos do zodíaco e seus respectivos asterismos. Há
dois mil anos atrás os signos zodiacais e os asterismos correspondiam-se, de modo que
quando o sol entrava no primeiro grau do signo de Áries, entrava também na
constelacão do mesmo nome. O efeito da precessão dos equinócios foi separar os
asterismos de seus signos nominais, de modo que a constelação de Peixes está agora no
signo de Áries e o signo de Áries, em Touro. Os chineses, não sabendo da precessão dos
equinócios, ficam perplexos pela discrepância, mas cuidando menos da precisão e mais
da antiga tradição, ignoram a discrepância atual, e ainda representam os doze signos,
não como aparecem agora, mas como apareciam para seus antepassados há dois mil
anos. Usam os doze signos zodiacais especialmente para determinar as vinte e quatro
estações do ano. Quando o sol entra no 15º de Aquário (5 de fevereiro), começa a
primavera. Quando entra em Peixes (19 de fevereiro) começa a estação das chuvas;
quando atinge o 15º de Peixes (5 de março) os insetos ficam excitados; quando entra em
Áries (30 de março) chega o equinócio vernal, seguido (a 5 de abril) pelo termo
chamado “luz e claridade"; entrando em Touro (20 de abril) traz a chuva frutificadora, e
(a 5 de maio) o começo do verão; em Gêmeos (21 de maio) acarreta os dois termos
chamados "o grão crescendo" e (a 6 de junho) "o grão está na espiga”; em Câncer, os
dois termos, solstício de verão (21 de junho) e pequeno calor (7 de julho); quando o sol
está em Leão (23 de julho) o grande calor começa e (a 7 de agosto) tem início o outono;
quando o sol está em Virgem (23 de agosto) o calor é limitado, e (a 8 de setembro) cai o
orvalho branco; quando o sol está em Libra (23 de setembro), ocorre o equinócio de
outono, e (a 8 de outubro) o orvalho frio desce; quando em Escorpião (23 de outubro) o
granizo cai e (a 7 de novembro) vem o inverno; quando em Sagitário (22 de novembro),
pouca neve cairá, e depois (a 7 de dezembro), muita neve; quando o sol está em
Capricórnio (22 de dezembro), ocorre o solstício de inverno e (a 6 de janeiro) pouco
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frio; quando o sol entra em Aquário (20 de janeiro), vem um grande frio, e assim o ciclo
do ano é completado.
A seguir, em importância com relação aos doze signos zodiacais, vêm as 28
constelações, ou casas, através das quais a lua se desloca em seu curso mensal através
da eclíptica. Estas 28 constelações são divididas em 4 seções, uma das quais é chamada
dragão azul, localizada no leste, e compreende as primeiras sete constelações. As sete
constelações seguintes são chamadas de guerreiro negro, cuja casa está no norte; as
terceiras sete recebem o nome de tigre branco, situadas no oeste, e as últimas sete são
designadas de pássaro vermelhão, governando o sul. Mas além dessas quatro
constelações que são vistas como espíritos que influenciam a terra, deve-se também
observar que destas 28 constelações as de número 4; 11; 18 e 25 formam uma
conjunção feliz com o sol; as de números 5; 12; 19 e 26, com a lua; ao passo que dos
cinco planetas, as seguintes conjunções são favoráveis: Júpiter com as de número 1; 8;
15; 22; Vênus com, as de número 2; 9; 16; 23; Saturno com as de número 3; 10; 17 e
24; Marte com as de número 6; 13; 21 e 27; e Mercúrio com as de número 7; 14; 20 e
28.
Além das 28 constelações, os cinco planetas conhecidos pelos chineses e as
virtudes ocultas atribuídas a eles exercem papel muito importante no sistema do
Feng-shui. Diz-se que Júpiter reina no leste, gerando a primavera, e tem o atributo da
benevolência. Marte reside no sul, comanda o verão e favorece a propriedade. Vênus
reside no oeste, governa o outono e sua província é o decoro. Mercúrio está localizado
no norte, governa o inverno e representa a sabedoria. Saturno reina no meio da terra,
governa o meio do verão e é caracterizado pela fidelidade.
Há outros corpos celestes que analogamente exercem uma influência sobre a
terra. Como os 5 planetas formam, além do sol e da lua, os sete regentes das estações,
assim também as 7 estrelas da Ursa Maior contribuem com sua quota para a direção das
estações. Esta esplêndida constelação atraiu a atenção e imaginação poética de quase
todas as nações da terra, mas nunca ouvi de um povo que desse tamanha aplicação
prática a este notável aglomerado de estrelas. Os chineses consideram as sete estrelas da
Ursa Maior como formando um relógio natural. Pois o corpo da Ursa Maior estando em
tempos antigos consideravelmente mais perto do Pólo Norte do que está agora, a cauda
parecia mover-se em torno do pólo um tanto como o ponteiro de um relógio.
Considerando a superfície da terra formando o mostrador e dividindo o horizonte em 24
partes iguais, ao passo que a cauda da Ursa age como ponteiros, temos um método
simples de determinar as mencionadas 24 estações do ano. Quando a cauda aponta, ao
cair da noite, para o leste, é primavera no mundo. Quando aponta para o sul, é verão;
quando aponta o oeste, é outono; e quando aponta, ao cair da noite, para o norte, é
inverno. A luz destas 7 estrelas, supõe-se ainda, exerce grande influência sobre a terra e
todos os seus habitantes, e essas 7 estrelas são, portanto, combinadas com o sol e a lua,
chamados os nove luminares do mundo.
Há um outro conjunto de estrelas, chamadas de nove estrelas do alqueire, que
são igualmente de grande importância para a determinação dos aspectos propícios ou
nefastos de uma localidade dada e sua conseqüente influência nos destinos dos homens.
Essas 9 estrelas são minuciosamente descritas em todo almanaque ou calendário chinês,
mas é difícil determinar sua posição no céu. São chamadas "nove estrelas do alqueire do
norte", mas este termo por vezes é aplicado ao Pólo Norte, por vezes a Ursa Maior, por
vezes a uma das 28 constelações chamadas de alqueire. Mas sua posição no céu é de
pouca importância - algumas autoridades até mesmo dizem que elas não têm nenhuma
posição fixa, mas movem-se pela atmosfera - pois têm todas as suas contrapartes ou
representantes na terra na forma de montanhas, e é o ofício e arte do geomante
16
determinar que pico de montanha ou colina corresponde a uma ou outra dessas estrelas,
cada uma com sua relação permanente com um dos 5 elementos ou um dos 8 diagramas
mencionados.
O ponto seguinte a ser considerado é a influência que o céu e a terra exercem
sobre o ser humano. Os principais agentes, através dos quais o céu e especialmente os
cinco planetas agem sobre todas as criaturas vivas, são os cinco elementos da natureza.
Por esses, porém, não devemos entender cinco substâncias materiais, quimicamente
indissolúveis, mas essencias espirituais, cada uma caracteristicamente diferente da outra
e formando as causas geradoras de todas as substâncias materiais. Estes cinco elementos
são: madeira, fogo, terra, metal e água; o primeiro deles sendo agente de Júpiter; o se-
gundo, de Marte; o terceiro, de Saturno; o quarto, de Vênus; o quinto, de Mercúrio. Mas
é também importante observar a relação mútua dos 5 elementos uns com os outros, pois
cada par produz ou destrói um ao outro, se colocados em certas conjunções. A madeira
produz o fogo, o fogo produz a terra, a terra produz o metal, o metal produz a água, a
água produz a madeira. Por outro lado, o metal destrói a madeira, a madeira destrói (isto
é, absorve) a terra, a terra destrói (isto é, absorve) a água, a água destrói o fogo, o fogo
destrói o metal. De novo deve ser considerado que a madeira é abundante no leste, o
metal no oeste, a água no norte, o fogo no sul, ao passo que a terra predomina no centro,
entre os quatro pontos cardeais. Também deve-se ter em mente que a madeira reina na
primavera, o fogo no verão, o metal no outono, a água no inverno, e a terra durante os
últimos dezoito dias de cada estação. Dessa forma a influência quíntupla dos planetas
penetra e dirige toda a natureza, como por exemplo, os 5 constituintes da estrutura
humana: músculos, veias, carne, ossos, pele e cabelo; as 5 partes interiores das vísceras,
a saber: coracão, fígado, estômago, pulmões e rins; as 5 cores: branco, preto, vermelho,
azul e amarelo; as cinco fortunas: riqueza, honra, longevidade, filhos e morte pacífica;
as cinco relações sociais: príncipe e ministro, pai e filho, marido e mulher, irmãos mais
velhos e mais jovens, e amigos.
Além da influência que, de acordo com as leis da natureza, céu e terra exercem
sobre os destinos dos viventes, é preciso considerar as leis que regulam a influência dos
espíritos dos mortos sobre os vivos. É uma doutrina que nos parece estranha, mas que
nada tem de irrazoável para um chinês acostumado a venerar os espíritos de seus
antepassados, que ele supõe estarem constantemente flutuando por perto, e a quem ele
anuncia formalmente todo evento em sua família, e oferece-lhes sacrifícios de carne e
bebida. "Meus próprios espíritos animais", diz o Comentador dos Analectos de
Confúcio, “são os espíritos animais de meus progenitores. Quando de minha parte levo
ao máximo minha sinceridade e respeito ao venerá-los, então os espíritos de meus
ancestrais estão presentes comigo. Assim como uma baste de trigo, quando a planta
original está morta, novas raízes aparecem dos lados - assim ligando o espírito real e
idêntico das gerações passadas ao tempo presente". Muito embora falemos de céu e
terra, dizia Chu-hi, só existe, em verdade, um sopro (espírito) que os sustenta. Muito
embora falemos de indivíduos, e os distingamos uns dos outros, na verdade há só um
alento que os anima a todos. Meu próprio alento (espírito) é idêntico ao de meus
ancestrais.
Essa ideia da unidade orgânica, ou melhor, identidade, da base espiritual da vida
na natureza e nos indivíduos, foi tema favorito de discussão com Chu-hi e outros
filósofos da dinastia Sung. De acordo com essa escola agora de influência universal, a
alma humana é dotada de natureza dual, e leva, como se fosse uma vida dupla.
Distinguem um animus e anima. O primeiro é a energia da natureza humana
incorporando o princípio masculino da natureza, O alento do animus é o alento do céu.
A anima, por outro lado, é a redundância ou pletoma, por assim dizer, da energia de
17
contração (feminina) da natureza. O alento da anima é o alento da terra. O animus é o
elemento espiritual; a anima, o elemento material, ou animal, da alma. Quando, pela
exalação do sopro vital, o corpo é decomposto, o animus retorna ao céu, a anima à terra;
isto quer dizer: cada um é dissolvido de novo naqueles elementos gerais da natureza de
onde derivou sua origem e incorporação temporária e ingressou na esfera da vida
individual. As almas dos antepassados mortos, portanto, são tão onipresentes quanto os
elementos da natureza, assim como o céu e a terra. Assim os chineses foram ensinados a
se considerarem como constantemente cercados de um mundo espiritual, de fato
invisível e inacessível pelo tato, mas não menos real, nem menos influente.
Ora, as pessoas comuns têm a noção - que, sem dúvida é a aplicação
popularizada das proposições filosóficas dadas acima - de que as almas dos ancestrais
ficam como que acorrentadas por algum tempo, por sua natureza animal, à tumba em
que seus corpos estão enterrados, ao passo que por sua natureza espiritual sentem-se
impelidas a voarem sobre as casas de seus descendentes, donde ser uma inferencia
lógica e natural supor que a fortuna dos vivos dependa da situação favorável do túmulo
de seus antepassados. Se um túmulo for colocado de modo que o espírito animal do
falecido, supostamente residindo ali, fique confortável e livre de elementos
perturbadores e a alma tenha entrada e saída irrestritas, os espíritos ancestrais sentir-
se-ão bem dispostos em relação a seus descendentes e poderão estar sempre à volta
deles, dispostos a fazer chover sobre eles todas as bênçãos do mundo espiritual a seu
alcance. Essa ideia está incrustada tão profundamente neles, a influência dos mortos
sobre os vivos, que os chineses que querem cair nas boas graças dos estrangeiros vão
aos cemitérios de Hong Kong, no Vale Feliz, e rezam ali nos túmulos dos estrangeiros,
supondo que os espíritos dos mortos que ali estão, agradecidos por suas oferendas e
orações, influenciariam os espíritos dos vivos, causando assim um mútuo bom
entendimento entre as partes interessadas.
Naturalmente, pois, todo chinês dá-se ao maior trabalho para situar os túmulos
de seus parentes de tal maneira que nenhuma estrela ou planeta lá no céu, nem qualquer
elemento terrestre cá em baixo, nenhum sopro ou influência sutil da natureza, nenhuma
configuração de colinas e vales de mau agouro perturbem o calmo repouso dos mortos,
pois disso dependerão as fortunas e infortúnios dos vivos. Consequentemente é
importante saber as regras pelas quais o local mais feliz para um túmulo pode ser
encontrado, e como o lugar melhor adaptado para um túmulo depende principalmente
da melhor conjunção de todos os elementos celestiais e terrestres, está claro que o
método pelo qual o melhor lugar para a tumba é encontrado, é também aplicável para a
seleção de um bom lugar para uma residência ou edificação de qualquer espécie. Pois as
mesmas influências que agem sobre os espíritos animais dos mortos têm também sua
ação sobre os vivos.
Aqui abordamos, no entanto, só os princípios gerais, e enunciarei as regras
aplicáveis a esse propósito o mais brevemente possível.
Em primeiro lugar deve ser entendido que há na crosta terrestre duas correntes
diferentes, que eu chamarei de magnéticas: uma masculina, outra feminina; uma
positiva, outra negativa; uma favorável, a outra desfavorável. Uma é alegoricamente
chamada de dragão azul, e a outra, tigre branco. O dragão azul sempre deve ficar à
esquerda, e o tigre branco sempre à direita de qualquer lugar considerado de bom
agouro. Assim sendo, esse é o primeiro afazer do geornante: procurar um local propício,
achar um bom dragão, e seu complemento, o tigre branco, ambos discerníveis por certas
elevações do solo. Dragão e tigre eram constantemente comparados com a porção
inferior e superior do braço de um homem: na dobra do braço está o local favorável. Em
outras palavras, no ângulo formado por dragão e tigre, no ponto em que duas correntes
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(magnéticas) que eles representam individualmente se cruzarem, poderá estar o lugar
favorável. Digo poderá estar, porque, além da conjunção do dragão e do tigre, deve
haver também uma tranquila harmonia de todos os elementos celestes e terrestres que
influenciam aquele local em partícular, e que deve ser determinado pela observação da
bússola e sua indicação de proporções numéricas, e examinando a direção dos cursos
d'água.
À guisa de ilustração, é possível observar que a situação favorável da cidade de
Cantão consiste em estar localizada exatamente no ângulo formado por duas cadeias de
morros formando curvas suaves rumo ao Bogue, onde quase se encontram, em forma de
ferradura. A cadeia de morros conhecida como Nuvens Brancas representa o dragão, ao
passo que o terreno ondulado do outro lado do rio forma o tigre branco. O lugar mais
favorável de Cantão é portanto o terreno perto dos portões do norte, onde tigre e dragão
vão para a direita e esquerda. Pois o lugar mais feliz, dizem os livros de Feng-shui, é
como uma modesta virgem que gosta do retiro, e assim é uma das primeiras regras
procurar, em caso de dúvida, um local num recesso.
Outra regra é que, em terreno perfeitamente monótono, numa planície
perfeitamente nivelada, ou em declives constantes, onde não há sinal de dragão ou tigre,
não será possível encontrar nenhum bom sítio.
Uma terceira regra é observar a diferença entre terreno masculino e feminino. As
fortes elevações são chamadas masculinas, ao passo que o terreno irregular de
ondulação suave é feminino. Em terreno onde as características masculinas prevalecem,
o lugar favorável é no ponto com características femininas, visíveis ao olho ou
indicadas pela bússola, ao passo que num local globalmente classificado como
feminino, o melhor lugar para um túmulo ou casa deve ter indicações de predomínio
masculino. Mas os prognósticos mais favoráveis pertencem ao ponto onde haja uma
transição de masculino para feminino ou de feminino para masculino, e onde as
vizinhanças combinam - como indicado pela bússola - características masculinas e
femininas na proporção certa, que os livros do Feng-shui afirmam ser 3/5 masculino
para 2/5 feminino. Onde porém as indicações femininas excedem as masculinas, há
influências malignas, contrapondo-se a quaisquer outras configurações favoráveis.
Por fim, o lugar a ser escolhido para um túmulo, se todas as regras acima forem
satisfeitas, deve ser invariavelmente seco e livre das formigas brancas, que são o maior
temor tanto para os vivos quanto para os mortos.
Esses são apenas princípios gerais, cuja aplicação passaremos a considerar em
detalhe, quando tratarmos da bússola como indicadora das proporçoes numéricas do
sopro e das formas da natureza.
19
Túmulos e templos nas montanhas de Amoy.
3 - AS PROPORÇÕES NUMÉRICAS DA NATUREZA
Agora passarei a considerar a segunda divisão do sistema do Feng-shui, do
chamado Su, ou proporções numéricas da natureza. Observando o céu, a mudança
constante do dia e da noite, os números e a distribuição dos corpos celestes movendo-se,
multidões deles, cada um num curso rápido, e nunca interferindo uns sobre os outros -
ao observar, digo, esse todo variado e no entanto harmonioso, surpreendeu o observador
chinês que, na base desse grande esquema do céu, houvesse princípios matemáticos;
que todos os corpos celestes existem e se movem em certas proporções numéricas. De
novo, observando a terra, com suas constantes revoluções de verão e inverno, primavera
e outono, crescimento e declínio, vida e morte, os chineses notaram que aqui a mesma
ordem matemática é repetida, que a terra nada mais é senão o reflexo do céu, a
corporificação material grosseira dos problemas matemáticos ideais, eterearnente
delineados no firmamento do céu.
Ora, para ilustrar e compreender esse esquema das proporçes numéricas, que
conecta e consolida céu e terra, os antigos sábios da China inventaram certos diagramas.
Não atribuo qualquer credibilidade à história de Fo Hi ter observado um cavalo-dragão
saindo de um rio, carregando em seu dorso os delineamentos geométricos do grande
esquema do céu e da terra, em diagramas e círculos formados no seu pêlo encaracolado.
Mas o fato, parece incontestável, é que nos mais remotos tempos da antigüidade chinesa
certos diagramas foram usados para ilustrar as proporções numéricas do universo. Não
interessa quem inventou inicialmente o esquema dos diagramas, não importa se o tenha
produzido em seu cérebro, ou fantasiando sobre as confusas linhas existentes nas costas
de uma tartaruga; permanece o fato de que, há mais de 2.000 anos, os chineses pos-
suíam e usavam um esquema de diagramas essencialmente igual ao que até hoje é usado
pelos ignorantes e supersticiosos como um encantamento de inefável eficácia, e
frequentemente suspenso sobre as portas das casas. Como quer que esse conjunto de
20
oito diagramas possa ter sido originalmente construído, quer sintética, quer anali-
ticamente, o modo pelo qual sua origem foi posteriormente explicada é o seguinte.
Representando o princípio superior criativo masculino por uma linha, e o
princípio feminino correspondente por uma linha interrompida, e então multiplicando-as
e combinando-as, são obtidos quatro diagramas, a saber:
1. duas linhas paralelas, representando o grande princípio masculino.
2. duas linhas interrompidas paralelas, representando o grande princípio feminino.
3. uma linha interrompida, com uma paralela embaixo, chamado o pequeno
masculino.
4. uma linha cheia, com uma paralela interrompida embaixo, chamado o pequeno
feminino.
O diagrama do grande masculino foi então tomado como um símbolo do sol, do
calor, do intelecto, dos olhos, etc. O diagrama do grande feminino foi considerado
representando os planetas, a noite, o corpo, a boca, etc.; por outro lado o diagrama do
pequeno masculino significava a lua, o frio, as paixões, as orelhas, etc.; e o diagrama do
pequeno feminino significava as estrelas, a luz do dia, a forma, o nariz, etc.
Indo adiante, e combinando esses quatro diagramas uns com os outros, de todas
as maneiras possíveis, outro conjunto de oito diagramas foi obtido. É geometricamente
composto dos quatro diagramas precedentes, mas sua explicação primitiva era, eu
presumo, baseada numa agora antiquada visão dos elementos que compõem a natureza.
já mencionei mais de uma vez a enumeração dos cinco elementos: metal, madeira, água,
fogo e terra, hoje corrente na China. No tempo em que esse conjunto de oito diagramas
foi inventado, parece ter estado em voga uma enumeração bem diferente dos elementos.
Os chineses deviam então contar seis elementos, e os chamavam da seguinte forma:
trovão, vento, fogo, oceano, água e montanhas. De qualquer modo, um dos mais antigos
clássicos chineses, o I Ching, explica esse conjunto de diagramas como se segue: (1)
três linhas cheias correspondentes ao grande princípio masculino, representando o céu e
designando o Sul; (2) três linhas interrompidas paralelas correspondentes ao grande
princípio feminino, representando a terra e apontando o Norte. Segue-se o que suponho
significar os seis elementos da natureza: (1) no Leste, duas linhas cheias com uma
interrompida no meio significam o fogo, pois, diz o I Ching, para secar a miríade das
coisas não há nada mais ardente que o fogo; (2) no Oeste, duas linhas interrompidas
com uma cheia no meio representam a água, pois para umedecer a miríade das coisas
não há nada como a água; (3) no Sudoeste, duas linhas cheias com uma interrompida no
lado interior representam o vento, pois para revolver a miríade das coisas não há nada
mais eficaz que o vento, (4) no Nordeste, duas linhas interrompidas com uma inteira do
lado interior correspondem ao trovão, pois para agitar a miríade das coisas não há nada
mais rápido que o trovão; (5) no Sudeste, duas linhas cheias com uma interrompida no
lado exterior representam o vapor do oceano, pois para satisfazer à miríade das coisas
não há nada mais satisfatório que o oceano; (6) no Noroeste, duas linhas interrompidas
com uma cheia no lado exterior significam as montanhas, pois para terminar e iniciar a
miríade das coisas não há nada mais perfeito que as montanhas. Assim, acrescenta o 1
Ching, água e fogo atacando e misturando-se um ao outro, trovão e vento não se opondo
um ao outro, e as montanhas e oceano sendo penetrados pelo mesmo sopro, a natureza
pode executar suas transformações, completar e aperfeiçoar a miríade das coisas.
Para dar à imaginação e à engenhosidade um jogo ainda mais amplo, esses oito
diagramas não só, como mostramos, são correlacionados com os oito pontos cardeais,
mas também a oito estações diferentes. Mesmo um conjunto de oito animais diferentes
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são correspondidos com esses oito diagramas; o primeiro, diz-se, representando a força
de um cavalo, o segundo, a docilidade de um boi, o terceiro, agradável como um faisão,
o quarto, degradante como um porco, o quinto, penetrante como o galo, o sexto.
influente como um dragão, o sétimo, dócil como um carneiro, o oitavo, fiel como um
cão.
Para ilustrar todas as inumeráveis mudanças e permutações da natureza, esses
oito diagramas foram de novo multiplicados uns pelos outros, dispostos em todas as
suas possíveis combinações, e assim um outro conjunto de 64 diagramas foi obtido,
cada um tendo analogamente um nome especial, e especiais virtudes ocultas a eles asso-
ciadas. Esse desenvolvimento do sistema original atribuído a Fo-hi baseia-se, no
entanto, numa disposição diferente dos oito diagramas principais. O diagrama do céu,
que o sistema de Fo-hi colocava no Sul agora é consignado ao Noroeste, ao passo que o
diagrama de fogo, que o sistema mais antigo colocava no Leste, agora ocupa o Sul. De
maneira semelhante, o diagrama da terra, anteriormente governando o Norte, agora é
relegado ao Sudoeste e seu lugar consignado ao diagrama da água, que antes reinava no
Oeste. De acordo com isso temos, nessa nova disposição dos oito diagramas de Fo-hi, o
diagrama para água no Norte, o do trovão no Leste, o do fogo no Sul, o do oceano no
Oeste. O Nordeste é ocupado pelo diagrama que corresponde às montanhas, o Sudeste
pelo diagrama do vento, ao passo que o diagrama para a terra é colocado no Sudoeste, e
aquele para o céu, no Noroeste. Essa nova disposição dos oito diagramas originais, e
especialmente o seu desenvolvimento num conjunto de 64 diagramas, diz-se ter
originado com Wen-wang, o célebre fundador da dinastia Chou, que enquanto passava
por um período de retiro, entreteve-se arranjando e rearranjando hastes de palha na base
daqueles oito diagramas, de modo que as diversas combinações de hastes longas e
curtas de palha representassem todo o esquema do céu e da terra penetrados pelos
princípios masculinos e femininos. Podemos prontamente acreditar que os chineses,
procurando descobrir o inventor dessa imaginosa teoria, deram com a ideia de que
ninguém senão um homem isolado do mundo, ninguém senão um homem doente com o
confinamento solitário poderia elaborar um sistema tão engenhoso e maravilhosamente
variado, mas tão completamente desprovido de toda observação prática da natureza.
Essa ausência de conexão direta e aplicação prática dos fatos que se dá pela
observação da natureza foi, é claro, mais e mais sentida, quanto mais os chineses
progrediam em seu conhecimento de astronomia e nos outros ramos da ciência natural.
Aquele antigo sistema de diagramas, baseado na antiquada teoria de seis elementos
terrestres, não dá lugar para a influência dos cinco planetas, que em eras posteriores
foram supostos como fatores de influência capital sobre os destinos da raça humana. Os
cinco planetas parecem ter sido desconhecidos mesmo nos dias de Confúcio, ou ao
menos nunca são mencionados nos clássicos chineses. Consequentemente, os filósofos
da dinastia Sung, achando que o sistema antigo se chocava contra suas populares
opiniões sobre astronomia, mas tendo demasiada reverência pela sagrada ferrugem da
antiguidade para descartá-la totalmente, mantiveram os oito diagramas, mas
elaboraram-nos num sistema baseado na ideia de que os cinco planetas (Vênus, Júpiter,
Mercúrio, Marte e Saturno) e os cinco elementos terrestres correspondentes (metal,
madeira, água, fogo e terra) contêm a principal solução do grande mistério da vida.
Atribuíam aos cinco planetas uma posição central, e pesquisando a partir dessa base as
proporções numéricas do universo, chegaram à conclusão de que todos os corpos
celestes e todas as forças e influências do céu são dispostas de acordo com o sistema
decimal. Aplicando então os antigos seis elementos que entram no plano dos quatro e
oito diagramas, e que na verdade referem-se exclusivamente à terra, e não ao céu - apli-
cando, digo, esses antigos conjuntos de quatro diagramas e de oito diagramas às
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relações terrestres apenas, chegaram à conclusão de que todas as formações da terra,
todas as relações, são baseadas no sistema duodecimal. Assim, inventaram um conjunto
de dez caracteres simbólicos ou números, destinados a explicar os mistérios do céu, e
chamaram-no de os dez troncos celestiais. Então vieram com outra série de doze
caracteres simbólicos ou números, e usaram-nos como a chave matemática para resolver
todos os problemas relacionados à terra, chamando-os de os doze ramos terrestres. Eles,
além disso, distinguiam tanto nos dez troncos celestes quanto nos doze ramos terrestres,
os números pares e ímpares. Todos os números ímpares, declararam, em obediência às
regras determinadas pelo I Ching, referiam-se ao princípio masculino da natureza, e
todos os números pares, ao feminino. Novamente, dividiram, adotando a regra do antigo
sistema, os dez troncos celestes em cinco pares, mas fizeram cada par corresponder não
só aos cinco elementos, mas também a cada um dos cinco planetas. Os doze ramos
terrestres passaram a significar os já mencionados doze signos do zodíaco, os doze
pontos da bússola chinesa e as doze divisões do dia (cada divisão compreendendo duas
horas). E ainda, combinando as duas séries e unindo o primeiro dos doze ramos
terrestres ao primeiro dos dez troncos celestes; depois unindo os segundos caracteres de
cada série e remetendo aos dez troncos seis vezes, através dos doze ramos cinco vezes,
obtiveram um conjunto de sessenta caracteres cíclicos, que usaram para designar
sucessivos dias e anos, e que multiplicados por seis deram os 360º da eclíptica.
Aqui temos uma série de fórmulas logarítmicas, habilmente idealizadas para
englobar todas as proporções numéricas que os chineses atribuem ao universo,
intrincada o bastante para deixar perplexa qualquer mente ordinária e assombrar, por
seus mistérios, a massa ignorante do povo. Uma hábil e engenhosa manipulação de um
tal sistema naturalmente capacita um homem a se impor à multidão supersticiosa, e por
conseguinte descobrimos que todas as diferentes artes da adivinhação na China -
astrologia, geomancia, horoscopia, frenologia, quiromancia e assim por diante - são ba-
seadas nesse sistema de números. Para fins geomânticos, que é só o que nos interessa
aqui, os ditos diagramas e séries de computações foram combinados para uso prático na
forma de uma bússola, com a agulha magnética no centro, e todos os diferentes
diagramas e caracteres cíclicos com todos os elementos que entram no cálculo, inscritos
em círculos concêntricos na prancha à volta da agulha.
O uso da agulha magnética sugeriu-me a possibilidade de que os chineses
tinham algum conhecimento empírico do magnetismo terrestre, e usariam a agulha
magnética para observar a declinação, inclinação e intensidade das correntes magnéticas
que passam pela crosta da terra e que hoje em dia estão sendo cuidadosamente obser-
vadas pelos meteorólogos modernos, na América e na Europa. Mas lamento dizer que
não consegui descobrir o menor conhecimento empírico do fato de que um magneto
suspenso livremente indica por seus movimentos a inclinação, declinação e intensidade
das correntes magnéticas da terra.
Para começar com o mais exterior dos círculos inscrito na prancha da bússola,
achamos este círculo (XVIII) dividido em 28 porções de tamanho desigual, em cada
uma delas o nome de uma das 28 constelações pelas quais passa a lua em seu curso pela
eclíptica, com o número de graus que cada constelação ocupa. Esse círculo, portanto,
representa a órbita da lua, e sua utilidade é determinar não só as influências lunares em
geral, mas também a influência que cada constelação supostamente exerce em um dado
local. Todo calendário chinês dá uma série de 28 tábuas contendo minuciosa
enurneração das afinidades geomânticas associadas a cada constelação, mas bastará
aqui dizer que 15 delas são dadas no calendário como nefastas, e 13 como propícias.
Para permitir ao geomante determinar as influências lunares felizes ou infelizes de
qualquer lugar com perfeita precisão, o círculo seguinte (XVII) representa de novo a
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eclíptica, mas dividida em 360º, dos quais alguns são marcados como felizes, ao passo
que no círculo seguinte (XVI) os números ímpares sucessivos dos 360º são marcados
em 28 porções correspondendo às 28 constelações do círculo XVII, assim permitindo ao
geomante pronunciar, em relação a cada polegada do solo e em relação a cada dia do
ano, se o princípio feminino ou masculino ali prevalece, pois os números ímpares
representam o princípio masculino e os pares (deixados em branco), o feminino.
Prosseguindo rumo ao centro do círculo (XV) dividido em 60 porções, ilustra-se
a influência dos cinco planetas em sua relação com os cinco elementos: metal, madeira,
água, fogo, terra. Estes cinco termos são inscritos em série no círculo em diferentes
combinações, destruindo uns aos outros, indiferentes uns aos outros, produzindo uns aos
outros, e assim por diante. Cada elemento aparece doze vezes, mas o elemento madeira
é interpolado num lugar, onde é colocado com o elemento fogo à direita e à esquerda,
ocupando dois graus que correspondem ao 10º e 11º graus da constelação do "alqueire”
(seis estrelas no ombro e arco do Sagitário). O geomante, referindo-se a qualquer lugar,
fica assim capacitado a dizer não só por que planetas em particular o local é
influenciado, mas também se o elemento terrestre prevalecendo ali está em harmonia
com os elementos que governam os locais adjacentes à direita e à esquerda.
Suponhamos, por exemplo, que a bússola indique que um lugar esteja sob a influência
de Marte. O elemento terrestre correspondente é o fogo. Ora, se a bússola ali indica
madeira à esquerda e água à direita, é um mau agouro, porque água destrói fogo e fogo
destrói madeira. Mas suponhamos que a bússola indicasse o elemento terra à esquerda
do elemento fogo, e à sua direita, madeira; seria uma conjunção favorável, porque
madeira produz fogo e fogo produz terra. Os elementos estão porém arranjados em
alguns lugares de modo que, em série, sejam indiferentes uns aos outros, nem
produzindo nem destruindo uns aos outros, o que, é claro, é considerado como
conjunção favorável.
O círculo seguinte (XIV) é formado por duas linhas concêntricas de caracteres,
divididas em 60 porções. A linha interna de caracteres dá 13 diferentes combinações
dos dez troncos celestes, arranjados de modo que cada caractere signifique ao mesmo
tempo um elemento e um número par (feminino) ou ímpar (masculino). Cada uma
dessas 13 combinações de elementos (ou planetas) começa com o elemento (ou planeta)
madeira (ou lúpiter), e alternadamente com o número um (masculino) e com o número
dois (feminino). Apenas a duodécima combinação, começando com o elemento (ou
planeta) fogo (ou Marte) e o número três (masculino) faz exceção. Das 13 combinações,
8 contêm a série completa dos elementos (ou planetas) na ordem em que produzem uns
aos outros (madeira, fogo, terra, metal, água). As cinco combinações remanescentes dão
os elementos aos pares, de acordo com a ordem de produção. Duas combinações apenas
dão os elementos (ou planetas) aos pares, os elementos (ou planetas) que produzem uns
aos outros num par e destroem uns aos outros no outro par. A linha exterior de
caracteres correspondentes, dividida em 12 espaços, associa a cada 5 caracteres da linha
interna um dos 12 signos zodiacais cinco vezes repetido. Consequentemente, cada uma
das doze divisões desse círculo contém na linha exterior um signo zodiacal colocado em
conjunção com 5 elementos diferentes (ou planetas) na linha interior, mas em todo
signo zodiacal a disposição e relação mútua dos elementos é diferente.
Continuando rumo ao centro, o círculo seguinte (XIII) em 60 divisões, dá 48
caracteres, cada um referindo-se a um símbolo diferente dos célebres 64 diagramas de
Wen-wang, que mencionei antes. Mas desses 48 diferentes diagramas há 6 que formam
o conjunto de 8 diagramas: terra, oceano, fogo, trovão, vento e montanha, e que aqui
são dados duas vezes, em diferentes locais; seis outros, não pertencendo ao conjunto
dos 8 diagramas, são dados duas vezes, lado a lado. Para a explicação desses 48
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diagramas, o geomante recorre à tabela dada em todo calendário, onde cada um dos
diagramas é dado e os dias felizes ou infelizes (para o trabalho geomântico) é apontado.
O círculo seguinte (XII) está dividido em 24 divisões, cada uma subdividida em
5 compartimentos. O segundo e quarto compartimentos em cada uma das 24 divisões
têm uma dupla fileira de caracteres à sua volta. A linha interior de caracteres dá
alternadamente em cada divisão, os dois símbolos do fogo (ping-ting) – que também
significam os números 3 (masculino) e 4 (feminino) – e os dois símbolos do metal
(kang-sin) - ou os números 7 (masculino) e 8 (feminino) - repetidos duas vezes em cada
divisão; a série sendo: ping-ting ping-ting; kang-sin kang-sin. Na linha exterior corres-
pondente, os doze ramos terrestres ou signos do zodíaco são dados sob os já
mencionados símbolos em doze divisões, cada divisão tendo um signo zodiacal repetido
quatro vezes em caracteres idênticos. A função desse círculo, portanto, é conectar
ciclicamente cada um dos doze signos do zodíaco com um dos dois elementos, fogo ou
metal, ou com os planetas Marte ou Vênus, assim como com certos elementos
masculinos ou femininos.
O círculo seguinte (XI) é idêntico ao de número VII a partir do centro, só que os
caracteres inscritos neles estão dispostos de maneira que, por exemplo, o símbolo que
designa o norte está à esquerda, e no outro círculo à direita da linha que corre para o
norte entre eles. Ora, em ambos os círculos, em 24 divisões, estão escritos em série um
ou outro dos 12 ramos, alternando-se com um ou outro dos dez troncos (mas omitindo
os dois troncos que designam a terra), ao passo que após cada 5 desses caracteres, um
dos 4 diagramas seguintes (tomados daquele conjunto de 8 diagramas) é ínserido: os
diagramas para céu, terra, montanhas e vento. Esse círculo portanto combina os doze
pontos da bússola chinesa, com referência simultânea aos elementos: madeira, fogo,
metal e água; e aos planetas: Júpiter, Marte, Vênus, Mercúrio; e aos quatro princípios
geomânticos: céu, terra, montanhas e vento.
O círculo seguinte (X) dá as divisões menores da bússola. É dividido em 60
espaços, onde não só as direções da bússola estão inscritas, mas também as direções dos
10 troncos do céu e dos 4 princípios geomânticos. Lê-se, por exemplo, do leste para o
sul: Direção Leste. 7 (metal); 3 (fogo). 3 (fogo); 7 (metal). Direção dois (madeira). 5
(terra); 5 (terra). Direção E-SE. 3/4 E. 7 (metal); 3 (fogo). 3 (fogo); 7 (metal). Direção
Vento. 5 (terra); 5 (terra). Direção S-SE. 3/4 E. 7 (metal); 3 (fogo). 3 (fogo); 7 (metal).
Direção Fogo. 5 (terra); 5 (terra). Direção Sul. Os números 7; 3; 5 significam, é claro,
frações de 10, ou subdivisões da bússola. As palavras 7 (metal), 3 (fogo), por exemplo,
significam que 7/10 desta subdivisão da bússola são governados pelo elemento metal, e
3/10 do mesmo espaço pelo elemento fogo.
Com esse círculo está em correspondência o seguinte, (IX), que dá 60 divisões
com dois círculos concêntricos de caracteres. Esse círculo com seus caracteres é o
mesmo que o de número XIV e o de número V a partir do centro. Só que as inscrições
dos 3 círculos estão em posições diferentes; assim, o primeiro caractere do círculo XIV
(fileira interior) está quase no leste, a do círculo V quase E-SE, ao passo que o primeiro
do círculo IX está entre eles.
O círculo seguinte (VIII) é o mesmo que o XI, exceto pela posição dos
caracteres, e suplementa aquele círculo ressaltando a linha de influência de cada
símbolo.
O outro círculo (VII) tem as mesmas divisões do VIII e XI, com suas 24
divisões, cada uma representando um dos 24 termos solares ou 24 períodos
correspondentes ao dia em que o sol entra no 1º e no 15º graus dos signos zodiacais.
Esse círculo é, portanto, um calendário-miniatura, e sua utilidade é determinar a estação
durante a qual uma casa pode ser erigida ou um túmulo construído num dado lugar.
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Essas 24 estações não estando, porém, sob a influência apenas do sol, mas também dos
5 elementos e dos 5 planetas, os dois círculos seguintes exibem a influência que esses,
elementos e planetas exercem sobre cada uma das 24 estações do ano.
O primeiro deles (VI) faz corresponder a cada estação um dos doze signos
zodiacais e dois planetas ou elementos, fogo (Marte) e metal (Vênus). O segundo (V)
não traz só dois, mas todos os 5 elementos e planetas, além dos 12 signos do zodíaco,
correspondendo às 24 estações. Esse círculo é dividido em 12 porções distintas, com um
espaço em branco entre cada uma delas, e cada divisão contém na fileira exterior de
caracteres um signo zodiacal 5 vezes repetido, ao passo que na porção exterior
correspondente da fileira interior, inscrevem-se 5 diferentes troncos celestiais. Mas
esses troncos estão dispostos em 12 diferentes combinações, dando alternadamente, em
números pares ou ímpares, os vários elementos ou planetas.
O círculo subsequente (IV) é dividido em 24 partes iguais, nas quais estão
inscritos: (1) os 12 signos zodiacais, os números ímpares sendo marcados em vermelho
como particularmente auspiciosos, assim como Áries, Gêmeos (que representa o tigre
branco), Leão (que representa o dragão azul), Libra, Sagitário e Aquário; (2) oito dos 10
troncos celestiais, a saber: dois caracteres para o elemento água, dois para a madeira,
dois para o fogo, e dois para o metal; (3) quatro símbolos pertencentes aos oito
diagramas, a saber: céu (em vermelho), terra (marcada em vermelho), vento e água.
Esse círculo é essencialmente o mesmo que os de número VIII e XI, e sua identidade é
ainda mais salientada pela igualdade de largura e tamanho dos caracteres. A única
diferença entre esses três círculos é que os caracteres são colocados em posição
diferente, indicando com mais proeminência a linha exata em que se dá a influência de
cada símbolo.
O círculo de número (111) associa aos 12 signos zodiacais aquelas 9 estrelas do
alqueire do norte que mencionamos acima. São dispostas aqui em 24 compartimentos:
um chamado o quebrador da falange, ocorrendo 3 vezes; 3 outras chamadas a estrela
militar, a estrela literária e a estrela da pureza, cada uma 4 vezes; 3 outras chamadas de
lobo avarento, emolumentos oficiais e a porta ampla, ocorrendo cada uma 2 vezes; e as
duas remanescentes, o assistente da mão esquerda, e o assistente da mão direita, cada
uma ocorrendo uma vez.
O círculo de número (11) dá, em 24 divisões, da qual cada uma alternada é
deixada em branco: (1) os diagramas do céu, terra, montanhas e vento; (2) oito troncos
celestiais em pares, cada caractere referindo-se a um número diferente, elemento ou
planeta. A sequência é a seguinte: (1) vento; (2) número dois madeira e três fogo; (3)
vento; (4) terra; (5) 4 fogo e 7 metal; (6) terra; (7) céu; (8) 8 metal e 9 água; (9) céu;
(10) montanhas; (11) 10 água e 1 madeira; (12) montanhas. Note-se aqui que os quatro
pares de elementos (planetas) mencionados são dispostos de modo que cada par contém
um número par (feminino) e um número ímpar (masculino), e os elementos (ou
planetas) a que se referem estão de acordo com a ordem de aparição.
O primeiro e mais interior dos círculos dá em 8 compartimentos os nomes de 8
signos zodiacais: Leão, Gêmeos, Sagitário, Capricórnio, Peixes, Câncer, Virgem e
Libra.
Quando a bússola é consultada com referência a um lugar qualquer, não só um
destes 18 círculos, mas cada um deles contribui com alguma parte para a determinação
dos aspectos propícios ou nefastos do lugar em questão. O resultado, porém, é que para
cada local um grande número de conjunções desconcertantes pode ser enumerado,
causando ao não-iniciado a crença de que essa bússola é um complexo quase misterioso
de sabedoria sobrenatural. E acho que devo reconhecer que seja um dispositivo bastante
engenhoso, sendo no todo um conhecimento rudimentar de astronomia, pois compreen-
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de numa só disposição todos os diferentes princípios da ciência física chinesa, os
princípios masculino e feminino, os 8 diagramas, os 64 diagramas, a órbita solar, a
eclíptica lunar, os 360º da longitude, os dias do ano, os 5 planetas, os 5 elementos, as 28
constelações, os 12 signos zodiacais, as 9 estrelas do alqueire, as 24 estações e os 12
pontos cardeais.
As pessoas incomuns conhecem todos esses termos pelo nome, mas não sabendo
seu significado, vêem os termos em si com um certo temor reverente, supondo que
exerçam alguma influência mágica. Ora, o geomante, tirando vantagem desse
preconceito popular vai ao homem do povo com a bússola na mão, da qual o povo nada
entende, e pronuncia seu julgamento em relação a um local num jargão mistificante, e
suas afirmações apocalípticas são recebidas com temor supersticioso mesmo onde não
há muita fé no sistema. O geomante, ele mesmo sabe muito bem que suas predições são
só adivinhação, baseada na experiência que acumula no decurso de sua prática. Mas ele
também sabe que suas profecias por vezes se cumprem em consequência do temor que
inspiram, e mesmo que suas predições na maioria das vezes sejam desautorizadas pelos
eventos reais, ele pode se confortar pensando que sua bússola, afinal, se não faz o
dinheiro correr para o bolso de seus clientes, certamente o faz correr para o seu.
Retiro de um filósofo na Colina de Fu-chung, província de Sin-kiang. Degraus
cortados na rocha dão acesso aos tanques de pesca.
4 - O SOPRO DA NATUREZA
Agora chegamos à terceira divisão do sistema de Feng-shui, a doutrina do sopro
da natureza. A natureza, como já tive ocasião de apontar antes, é vista pelo observador
chinês como um organismo vivo e que respira, e não podemos nos surpreender,
portanto, ao encontrar os chineses discutindo a inalação e a exalação do alento da
natureza. De fato, com a distinção destes dois sopros, o de expansão, como o chamam, e
o de reversão, explicam quase todo tipo de fenômeno da natureza. Entre o céu e a terra,
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não há nada tão importante, tão poderoso e onipresente quanto esse sopro da natureza.
Penetra cada tronco, cada fibra, e através dele o céu, a terra e toda criatura vive, se
move e tem seu ser. O sopro da natureza, nada mais é senão a energia espiritual dos
princípios masculino e feminino. Assim, no começo da condensação do sopro
transformador da natureza, há a mudança do nada para o ser do princípio masculino: a
exaustão do sopro transformador da natureza é a mudança da existência para a
não-existência do princípio feminino da natureza. Quando no início esses dois
princípios saíram do "grande absoluto", foi então que o primeiro sopro da natureza foi
exalado. Mas no princípio, o sopro da natureza era confuso e caótico, de modo que por
algum tempo o céu e a terra não estiveram separados, mas quando o sopro da natureza
reverteu, e a exalação e a inalação regularmente se sucederam, céu e terra, os princípios
masculino e feminino, foram separados e tudo na natureza foi produzido em sua ordem
apropriada. Mesmo agora, quando o primeiro sopro da natureza se adianta ou expande,
algo como um feto disforme é criado, constituindo o germe de um futuro
desenvolvimento. Essa origem incipiente e disforme das coisas, sendo leve e pura, ainda
não possuindo qualquer forma determinada, pertence ao masculino, e pode ser chamada
princípio superior da natureza: mas quando uma forma bem determinada foi assumida,
manifestamente apresenta-se à vista e constitui a forma exata das coisas, possuindo
corpo, cor, forma e modo. Isso, sendo pesado, material e cognoscível pelo sentido
humano, pertence ao princípio feminino, ou inferior, ou em outras palavras: um sopro
que se adianta e outro que reverte, regularmente se sucedendo um ao outro, são a
condição da constante sucessão de crescimento e declínio da vida e da morte no mundo
físico.
Os dois sopros da natureza são, porém, essencialmente um só. Os princípios
masculino e feminino, unindo-se, constituem o começo das coisas; quando se
dispersam, causam declínio, dissolução e morte. Por vezes dispersam-se, e de novo se
unem. Assim, depois de terminarem, de novo começam o que constitui o princípio da
reprodução, difundindo-se sem cessar por toda a natureza. Quanto ao sopro que penetra
os seres humanos, as energias da natureza também aqui devem eventualmente se
esgotar, e a morte é o que nenhum homem pode evitar. Com a morte, as partes mais
grosseiras da alma animal do homem descem e voltam à terra, mas as partes mais finas
da natureza espiritual difundem-se e se expandem pelo mundo, tornando-se uma nuvem
ou uma luz que aparece ocasionalmente, à semelhança de um fogo-fátuo ou um vapor
que, ninguém sabe como, afeta os sentidos humanos e pode torná-los entorpecidos,
tristes e deprimidos.
Esse sopro da natureza, com suas constantes pulsações, com suas incessantes
permutações de expansão e contração, mostra-se nas condições variadas da atmosfera
sob seis modos, sendo a causa original de frio, calor, secura, umidade, vento e fogo.
Esses são por vezes chamados de seis sopros da natureza. Esses seis sopros produzem,
sob a influência combinada dos 5 planetas e dos 5 elementos, as 24 estações, que são
geralmente chamadas de 24 sopros da natureza. O sopro da natureza aliado ao elemento
madeira, e guiado por júpiter, produz a chuva; combinado com o elemento metal e
governado por Vênus, o sopro da natureza produz bom tempo; unindo-se ao elemento
fogo e influenciado por Marte, o sopro da natureza produz o calor; suportado pelo
elemento água e governado por Mercúrio, o sopro da natureza produz o frio; e com o
auxílio do elemento terra e influenciado por Saturno, causa o vento. E esse é todo o
sistema da meteorologia chinesa.
Mas agora surge a questão de como nós, à parte o funcionamento geral do sopro
da natureza, podemos determinar, com referência a uma localidade qualquer se há ali
um sopro favorável ou desfavorável, ou se há qualquer sopro?
28
Aqui de novo o sistema do Feng-shui faz uso da alegoria do dragão azul e do
tigre branco. Observamos acima que a superfície da terra nada mais é que o espelho
pálido das configurações, poderes e influências do céu, e que portanto, cada constelação
do céu tem sua contraparte na terra. Já notamos (pág. 33) que um dos 4 quadrantes do
céu estrelado, no leste ou à esquerda do observador, é governado por um espírito
chamado de dragão azul, incorporando as influências de sete constelações. O quadrante
ocidental, ou da direita, compreendendo também 7 constelações, é representado por um
espírito chamado de tigre branco. O dragão azul e o tigre branco são, portanto,
emblemas indicadores das influências sutis, o sopro vital das divisões oriental
(masculina) e ocidental (feminina) do firmamento. Sempre que há uma pulsação do
sopro da natureza, será visível na terra alguma elevação do terreno. Onde o sopro da
natureza estiver correndo pela crosta da terra, as suas veias e artérias, por assim dizer,
serão detectáveis. Mas o sopro da natureza contém um elemento dual, um sopro
masculino e um feminino, um positivo e um negativo, um de expansão e um de
reversão, assemelhando-se ao que nós, num português moderno, diríamos, duas
correntes magnéticas, ou como os chineses as chamam, o dragão azul e o tigre branco.
Onde houver um dragão verdadeiro, haverá também um tigre, e os dois serão
detectáveis no traçado de montanhas ou colinas num curso tortuoso. Além disso, será
discernível o tronco e os membros do dragão, até mesmo as veias e as artérias de seu
corpo, saindo do seu coração, na forma de cadeias de montanhas. Via de regra, haverá
uma acumulação de sopro vital perto da cintura do dragão, ao passo que nas
extremidades de seu corpo a energia do sopro da natureza estará quase esgotada. A uma
distância de 20 li, ou 6 milhas, diz-se que o sopro torna-se fraco e ineficaz. Mas mesmo
perto do coração do dragão, o sopro da natureza, a menos que mantido coeso pelas
colinas e montanhas das imediações, será disperso. Onde um lugar qualquer, aberto e
amplo de todos os lados, admitindo o vento de todas as direções, não terá vantagem
nenhuma do sopro, pois o vento se dispersará antes de causar qualquer benefício.
Suponhamos ainda um terreno com muito sopro vital, e flanqueado por colinas que
tendem a reter o sopro, mas os cursos d'água correm em linha reta, rapidamente; ali
também o sopro será disperso antes de servir a qualquer propósito útil. Só nos lugares
onde o sopro da natureza for mantido coeso, encerrado à direita e à esquerda e tendo um
dreno para levar a água num curso tortuoso, haverá as melhores indicações de um
fornecimento permanente de sopro vital. Construir um túmulo ou uma casa num tal
lugar garantirá a prosperidade, saúde e honras.
Observa-se a regra geral que, sempre que se se deparar com terreno duvidoso
que não dê indicações claras das veias do dragão, é melhor procurar o canto mais
recluso, pois no retiro é que o tigre e o dragão são mais entrelaçados, e ali o sopro se
acumula mais abundantemente. Suponha-se ainda que foi encontrado um terreno onde
ambos, dragão e tigre são completamente delineados: a regra é então procurar pela
junção de tigre e dragão, alguma depressão ou montículo, ou alguma súbita transição de
terreno masculino para feminino. Pois o corpo do dragão e as colinas circunjacentes
sempre devem exibir características masculinas e femininas até o ponto em que o lugar
auspicioso esteja precisamente determinado.
Até aqui só falei do sopro natural e benéfico da natureza. Mas há uma exalação
venenosa e mortal, e é uma das vantagens do Feng-shui, apontar e advertir contra os
locais em que a construção de um túmulo ou uma casa acarretaria a perda da vida e
calamidades sobre as gerações futuras. Muito frequentemente, diz-se, há lugares que
têm todas as aparências de bom terreno de dragão e sem dar sinal de influências
malignas; no entanto, aquele terreno acarretará indescritíveis calamidades e desolação
sobre qualquer família que se aventurar a escolher um local ali para uma tumba ou
29
residência. Em tais casos, só a bússola indicará a presença de um sopro nocivo,
assinalando a desarmonia das influências planetárias e o desacordo dos elementos.
Mas, em geral, a existência de um sopro pernicioso traír-se-à por indicações
exteriores. Sempre que houver uma colina ou montanha elevando-se abruptamente do
solo, e erguendo-se em linhas retas, ou mostrando um aspecto extremamente anguloso,
sem encostas graduais, haverá ali um sopro perigoso. Falando genericamente, todas as
linhas retas são maus sinais, mas mais especialmente quando uma linha reta aponta
diretamente para o ponto em que um local foi escolhido. Suponha ainda que você tenha
escolhido um lugar em que tanto o dragão à esquerda quanto o tigre à direita estão
encurvados como um arco, mas aos lados dos quais serras se estendem em linhas retas,
cada uma como uma flecha num arco - essa seria uma configuração absolutamente
perigosa. Ou suponha que você encontrou um lugar abundante em bons auspícios, mas a
alguma distância à sua frente há uma serra em linha reta ou fonte de água, ou corte de
ferrovia, não apontando na direção do seu terreno, mas correndo de través em linha reta
- essa linha causaria um sopro mortal, afetando toda a sua fortuna e a de seus
descendentes.
Como as linhas retas das serras são causadoras de más influências, o mesmo se
dá com as correntes de água que correm em linha reta. A água, no sistema do Feng-shui
é sempre vista como símbolo da riqueza e da abundância. Sempre que a água correr em
linha reta, fará com que as propriedades das pessoas que moram perto dela se escoem
depressa, da mesma maneira que a água. As linhas tortuosas são indicações de sopros
benéficos e servirão para reter o sopro vital, onde quer que ele exista.
Uma outra indicação da existência de um sopro maligno são as rochas
destacadas, a menos que sejam protegidas por árvores e arbustos. Há muitos casos,
dados nos livros de geomancia, de túmulos situados perto de rochas, mas estando essas
protegidas por vegetação densa; o túmulo em questão exercendo ao longo de várias
gerações a mais benéfica influência, acumulando honrarias, riqueza, longevidade,
progênie e tudo o mais sobre as famílias cujos ancestrais foram enterrados ali. Mas aos
poucos, a descrença no Feng-shui, ou a avidez, ou o ódio de um inimigo malicioso, fez
com que as árvores caíssem e os arbustos que protegiam as rochas fossem cortados,
causando imediatamente a desgraça e a pobreza a essas famílias; foram privadas de suas
honrarias, seus emolumentos, sua riqueza dispersou-se, e seus descendentes foram
lançados às agruras da vida, para passar fome.
Hong Kong, com a sua abundância de rochas e encostas rochosas das
montanhas, é abundante em sopro maligno, e os chineses acham que nosso governo é
muito sábio ao procurar plantar árvores por todos os lugares nas colinas, para obstacular
esses geradores do mal. Mas a mais maligna influência que Hong Kong sofre é causada
por aquela curiosa rocha no sopé do morro perto de Wanchai. É visto claramente da
Queen's Road East, e os estrangeiros vêem nela Caim e Abel, Caim matando seu irmão.
Os chineses acham que a rocha representa um vulto feminino que chamam de a mulher
má, e acreditam seriamente que toda a imoralidade de Hong Kong, todo o vício de
Taip'ingshian são causados pela rocha maligna. Essa crença está tão firmemente
impregnada nas classes inferiores de Hong Kong que aqueles que lucram com práticas
imnorais vão venerar aquela rocha, esparramando a seus pés oferendas e queimando
incenso na sua base. Ninguém se atreve a danificá-la, e já ouvi de pessoas, sob outros
aspectos perfeitamente sensatas, que vários canteiros que tentaram cortar a base da
rocha morreram subitamente após a sua tentativa,
Ora, todas essas más influências, sejam causadas por linhas retas, colinas, cursos
d'água, ou rochas e montanhas rochosas, podem ser defendidas ou contrabalançadas. Os
melhores meios para manter à dístância ou absorver essas exalações más são plantar
30
árvores junto à casa e manter um tanque com fornecimento constante de água fresca na
frente da casa. Um pagode, porém, ou uma colina coberta por floresta serve ao mesmo
fim, e por essa razão a Serra de Cantão. com seus pagodes de cinco andares, protege
contra o mau sopro da natureza, e protege toda a cidade. Outro dispositivo para manter
à distância as más influências, é colocar à frente do portão da casa um escudo ou
prancha octogonal com os emblemas dos princípios masculino e feminino, ou com os
oito diagramas pintados sobre ele, e dando ao caminho que conduz à casa um traçado
tortuoso. Leões talhados em pedra ou dragões de porcelana também servem ao mesmo
fim, e podem ser colocados na frente de um edifício ou no topo do telhado; mas o meio
melhor e mais efetivo, é contratar um geomante, fazer o que ele diz, e pagar-lhe bem.
Uma bússola de geomante.
31
No distrito dos Dois Picos, província de Chen-si. Estas montanhas são ricas em ouro
e outros minerais, mas o Feng-shui da região foi considerado ainda mais precioso e a
mineração foi proibida. Guarda tártaros foram estacionados aqui para impedir os
prospectores.
5 - AS FORMAS DA NATUREZA
Agora chegamos à última divisão do sistema do Feng-shui - a doutrina dos perfis
e formas da natureza. Este capítulo, porém, constitui apenas a aplicação prática das
regras e ideias gerais estabelecidas nos capítulos precedentes, e não precisarei entrar em
detalhes. Já falei das elevações do solo que indicam a presença do sopro da natureza,
com suas duas correntes de energia masculina e feminina, positiva e negativa,
simbolicamente chamadas dragão e tigre. A posição relativa e a configuração destas,
conforme indicada por colinas ou montanhas, é o ponto mais importante, no que
concerne aos perfis e formas da superfície da terra. Não vou entrar numa enumeração de
todas as configurações que tornam a posição relativa, extensão e direção desses dois
elementos simbólicos, favorável ou desfavorável. Basta dizer que são mais
auspiciosamente dispostos quando formam uma ferradura completa, assim como duas
séries de morros começando de um ponto vão para a direita e para a esquerda numa
graciosa curva, suas extremidades suavemente voltam-se uma para a outra. Tal
formação de morros é indício certo da presença de um verdadeiro dragão e, se outras
conjunções não a contrariarem, a influência de um local escolhido num ponto onde o
dragão e o tigre vão para a direita e para a esquerda, é tudo o que se pode desejar.
Outro elemento importante na doutriria das aparências da natureza é a direção
dos cursos d'água. Já tivemos ocasião de aludir a isso mais de uma vez, e o ponto
principal é que a água correndo em linhas retas ou formando ângulos fortes em seu
curso, é absolutamente perigoso. Um curso sinuoso é o melhor presságio da existência
de influências benéficas. Mas a junção de dois cursos d'água é um elemento que não
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  • 1.
  • 2. 2 Representação Chhing antiga da seleção do local de uma cidade; o geomante consulta sua bússola magnética. SUMÁRIO APRESENTAÇÃO 1 - INTRODUÇÃO 2 - AS LEIS DA NATUREZA 3 - AS PROPORÇÕES NUMÉRICAS DA NATUREZA 4 - O SOPRO DA NATUREZA 5 - AS FORMAS DA NATUREZA 6 - A HISTÓRIA E A LITERATURA DO FENG-SHUI 7 - CONCLUSÃO BIBLIOGRAFIA SOBRE FENG-SHUI
  • 3. 3 APRESENTAÇAO O termo 'Feng-shui" (pronuncia-se "Fong-suei") significa, em chinês, "vento-água". Designa a geomancia tradicional chinesa em sua forma e aplicação prática de rabdomancia; isto é, a detecção, por regras e sinais e por uma percepção extra-sensorial do rabdomante, das energias telúricas de um local, ou edifício, e a utilização vantajosa das boas energias, ou o modo de evitar ou cancelar as energias telúricas negativas. Esta arte, ou, mais precisamente, ciência esotérica de rabdomancia, é principalmente transmitida (como tudo que é esotérico) oralmente, de mestre a discípulo, desde o princípio dos tempos. A codificação e sistematização de regras em livros (mesmo entre os clássicos chineses, há pouco material direta e explicitamente referente ao "Feng-shui") é fenômeno secundário. O conhecimento esotérico é uma ciência sempre viva, e só pode ser adquirida por quem tem, ao menos em estado latente, a vida espiritual, ou verdadeira vida (daí a necessidade de um mestre, ou guru para despertá-la em quem a tem só em estado latente, ou embrionário). Esta vida espiritual, ampliada e intensificada pela transmissão do conhecimento do guru ao discípulo, dá a intuição que complementa e termina, no caso específico que consideramos, a ciência e a prática do "Feng-shui". O livro que o leitor tem em mãos foi o primeiro livro ocidental a tratar deste assunto. Se na China há poucos livros sobre Feng-shui, o que não dizer do Ocidente? O Reverendo E. J. Eitel, da "London Míssionary Socíety", ao ser designado como missionário para a China, estudou e escreveu sobre budismo, mas seu renome continua até hoje corno a primeira autoridade européia em Feng-sliui. Sua obra, na época (primeira edição: 1873, pela Trübner & Co.) só teve paralelo na de J. J. M. de Groot, administrador colonial holandês, em seu monumental "Sistema Religioso da China". De fato, as primeiras referências por escrito que o Ocidente recebeu sobre esta misteriosa arte de interagir com as energias telúricas foram através dos missionários enviados ao Oriente, e só no séc. XIX. À parte o livro específico do Rev. Eitel, há um artigo ainda anterior, pioneiro, do Reverendo Yates.(1) O Reverendo Eitel sem dúvida foi meticuloso na descrição da antiga ciência, e devemos reconhecer que deve ter penetrado o seu espírito, e reconhecido em seu íntimo, o valor de ao menos alguns de seus aspectos. Mas enquanto inglês preconceituoso, fortemente imbuído pela educação européia, na época mais do que nunca fortemente marcada pelo iluminismo, e em plena era do positivismo, hesitava em adotar incondicionalmente uma ciência como o Feng-shui, totalmente dirigida pelo misticismo. Para salvar as aparências, colocava-se como relator crítico de uma curiosa superstição de um povo bárbaro. É curioso notar a atitude de auto-afirmação do cientificismo europeu da época, em considerar tosco e bárbaro tudo que não derivasse da tradição greco-latina, e do último rebento do aristotelismo: o positivismo. Nos contatos iniciais entre ocidentais e chineses, um tema tão especial quanto o Feng-shui nem aparecia em meio à perplexidade que uma parte exercia sobre a outra, mas no século passado, que já apresentava comunidades de ocidentais bem enraizadas em várias metrópoles chinesas, a convivência com os chineses levou os ocidentais a observarem mais de perto as "superstições" e estranhos costumes daquela tribo tida como na infância da civilização. Daí aparecerem referências fugazes, mas nunca explicadas, à ciência do Feng-shui, até espicaçar a curiosidade dos letrados ocidentais,
  • 4. 4 que por fim começaram a publicar suas doutas conclusões sobre o folclore e as crenças "anticristãs" dos pagãos a quem pretendiam civilizar. É bem diferente a atitude de nossos dias. Começa a soprar o vento da Era de Aquário, a nova forma de eterno sopro do Espírito. E assim o Ocidente vem construindo a sua ponte para o Oriente, apagando-se o que ainda não faz um século se considerava, de parte a parte, um abismo intransponível do modo não só de falar, mas de pensar e de viver. Artistas, arquitetos, e mesmo alguns cientistas da vanguarda aquariana, por vezes inconscientemente, por vezes com consciência e entusiástica curiosidade, estão se aproximando da ciência das proporções e da harmonia entre as energias criadas pelas formas, conceito este que descreve bem o Feng-shui. Estes temas também pertencem ao folclore e ao esoterismo europeus, sob os nomes de: geomancia, rabdomancia, radiestesia e, bem recentemente, “energia das formas” (assim como a "energia das pirâmides", tão em destaque entre nós). Se não vejamos: em tempos mais recentes que os do Rev. Eitel, encontramos outra das parcas edições, no mundo ocidental, sobre a ciência telúrica chinesa, a China pitoresca, do fotógrafo alemão Ertist Börschmann(2), com uma atitude bem diferente, apresentando impressionantes fotos de "monumentos de Feng-shui", ou seja, cons- truções (especialmente pagodes) destinadas não a fins estéticos ou utilitários, mas a harmonizar as energias telúricas de um lugar, exatamente com o mesmo fim dos menires e cromlechs encontrados no território europeu (França e Inglaterra, particularmente). Foi dos primeiros ocidentais a expressar publicamente admiração pela arte rabdomântica que resulta no subtítulo deste livro: um verdadeiro “paisagismos sagrado”, e assim definiu, por suas próprias palavras, o Feng-shui: "Esta palavra bem conhecida significa 'vento-água', mas em seu sentido amplo significa as relações com a natureza ambiente, a influência da paisagem sobre a estética dos edifícios e na felicidade de seus habitantes". Notável coerência com todo o conceito ecológico de viver que eclodiu em nossos dias, e a nosso ver, será uma das vigas-mestras da próxima fase da civilização em que, em breve, entraremos ... Logo no primeiro parágrafo desta Apresentação demos a tradução literal do termo Feng-shui enquanto "vento-água”, mas levamos a discussão para uma interpretação em termos de energia telúrica, rabdomancia, e alguns aspectos dos contatos entre as civilizações oriental e ocidental que nos trouxeram o conhecimento desta arte. Tudo isso para localizar o leitor num assunto demasiado genérico, sutil e esotérico; é preciso algum rodeio para delimitar um território tão vasto. Mas voltemos exatamente a "vento-água", pois aqui temos, contrariando todas as aparências, uma definição precisa (a aparência é tudo o que engana e que é desprovido de importância, para o esoterista). Ora, o termo designa tudo o que é fluido, quer no estado gasoso, quer no estado líquido, dando a sensação de dinâmica, de movimento, e da própria energia (em chinês, ”Ch’i”, termo familiar para nós através da disciplina física do "Tai Ch'i Chuan”; o domínio do Ch'i dentro de nosso corpo, tal como é objetivo da Ioga, que chama ao Ch'i de "Prana"). Aqui uma convergencia que não é de surpreender com a síntese científica que a ciência exotérica, a da Universidade, inconscientemente, e malgrado ela mesma, vem elaborando para a futura civilização aquariana, outra de suas vigas-mestras, a nosso ver: a evolução da Termodinâmica em Energética, e esta, dado mais algum tempo, na Teoria do Campo Unificado, verdadeira busca pela Pedra Filosofal dos físicos contemporâneos. Essa energia única, fonte de todas as coisas, a ser descrita pelo Campo Unificado, será a tradução na linguagem lógico-matemática ocidental, do perene Ch'i.
  • 5. 5 Fundamentando este enfoque do Feng-shui enquanto ciência de um jogo de energias, ou Energética, recorremos mais uma vez a Borschmann: "Certos cumes [ ... 1 são coroados com pagodes, pequenos templos ou pequenos pagodes, para harmonizar as forças mágicas do céu e da terra. Esta ideia assemelha-se, por exemplo, ao nosso conceito da emanação da força magnética de um condutor pontiagudo. E o geomante chinês também considera as formas da natureza como um campo magnético". Ou ainda, nas palavras de Joseph Needham, autor de nossos dias, em seu Ciência e civilização na China(3), primeiro a capacitar o ocidental a conhecer todo o contexto do Feng-shui: "Cada lugar tinha suas características topográficas especiais, que modificavam a influência local dos vários Ch’i da natureza. As formas das colinas e direções dos cursos d'água eram as mais importantes, mas adicionalmente as alturas e formas dos edifícios, e as direções de estradas e pontes, eram fatores poderosos. A força e a natureza das correntes invisíveis seriam modificadas de hora em hora pelas posições dos corpos celestes, de modo que seus aspectos vistos da localidade em questão precisavam ser considerados. Enquanto que a escolha dos locais era de primordial importância, a má localização não era irremediável, pois valas e túneis podiam ser escavados, ou outras medidas tomadas para alterar a situação do Feng-shui ". Ademais, segundo o mesmo autor, à arte do Feng-shui deve-se atribuir a "grande beleza da localização de tantas fazendas, casas e aldeias por toda a China". Na China, até a ascensão do regime comunista, o Feng-shui era uma ciência reconhecida pelo governo imperial, dirigida pelo Gabinete dos Ritos, supervisionado diretamente pelo Imperador. Nos tempos em que era praticado pela autoridade pública, produziu a paisagem clássica chinesa. Visava manter a produção agrícola e si- multaneamente os fins estéticos e equilíbrio das energias mágicas, ideia absolutamente de acordo com os ideais de uma sociedade ecologicamente estável, e contrárias à dilapidação do ecossistema causada pelo industrialismo e imperialismo econômico materialista. A definição tradicional chinesa do Feng-shui é: “A arte de adaptar as residências dos vivos e dos mortos de modo a cooperar e harmonizar com as correntes locais do sopro cósmico". A mentalidade mágica pressuposta por: "sopro cósmico"; "forças mágicas", "Ch’i”; “espíritos da natureza"; "espíritos dos mortos" e "correntes invisíveis" chocou o racionalismo ocidental, num contato inicial, causando forte aversão a essa "superstição animista” e ao "fatalismo oriental". O leitor achará, ao longo deste livro, desconcertante a posição de Eitel, que, tido como autoridade e um clássico ocidental do Feng-shui, aparece mais como um detrator deste aspecto da cultura oriental, e - aos olhos mais sadios de nosso tempo pré-aquariano - até mesmo um "snob" intelectual. Especialmente na "Conclusão", o Autor se refere ao Feng-shui como reminiscência da infância de uma humanidade pré-civilizada. Mesmo que porventura tivesse reconhecido a sabedoria oriental em seu íntimo, é preciso lembrar que enquanto missionário, seus compatriotas, seus superiores religiosos e seu editor supunham que ele estivesse na China para dissuadir os chineses de suas superstições, e não para converter-se a elas. Devia cristianizar a China, e impor a ela o racionalismo positivista, e não se transformar em defensor e simpatizante do Taoísmo e do Budismo. Os autores modernos, no entanto, não se referem mais ao Feng-shui como o fez, por exemplo, o administrador colonial de Groot, como "quase-ciência", ou como os últimos defensores do positivismo materialista acusam as ciências alternativas e o esote- rismo de hoje, como "pseudo-ciência".
  • 6. 6 Nestes últimos anos, com a onda de orientalismo que passa sobre o Ocidente, especialmente no pós-guerra, e depois da década de 6O, o Feng-shui reapareceu notavelmente na costa Oeste dos EUA, ponto de concentração de imigrantes chineses. Oficialmente proscrito na China rnaoísta, faz-nos assistir ao curioso espetáculo da orientalização do Ocidente e ocidentalização do Oriente. E desse interesse dos países ocidentais, a ciência tradicional renasce no país de sua origem, contaminado e dominado por ideias e ideologias européias, em Formosa, Hong Kong e outros lugares do Extremo Oriente, com influência chinesa, fora da China comunista. Toda arte e ciência da China é atribuída mitologicamente ao imperador Fo Hi, que "olhando para cima, contemplou as imagens no céu, e olhando para baixo, observou os padrões da terra". Isto é uma referência à ciência antediluviana, sendo Fo Hi um herói civilizador do mundo caótico pós-diluviano. Na verdade, esse episódio é uma outra expressão do mesmo que acontecia no Antigo Egito, após o mesmo Dilúvio, com Hermes Trismegisto: "O que está embaixo é como o que está em cima". A mesma arte paisagística equivalente à dos chineses já foi observada por historiadores e arqueólogos europeus mais argutos, quanto à paisagem grega, e a localização dos antigos templos. E ainda hoje se reflete no bom gosto intuitivo de um arquiteto ou paisagista com sólida formação cultural e artística. Antes de passarmos a uma exposição sucinta dos principais pontos da filosofia taoísta e do Feng-shui apresentados neste livro, para que o leitor não-familiarizado possa referir-se a ela como orientação ao longo de sua leitura, façamos ainda uma crítica e advertência sobre as falhas do modo de pensar oriental, que não é tampouco a perfeição que os defensores entusiásticos de hoje em dia pensam. A ciência oriental é totalmente indutiva: tudo se encaixa, ou é forçado a encaixar-se num molde de explicações universais pré-existentes. Não há espaço para o novo ou para a experimentação. Os "bárbaros" europeus não invadiram o Oriente: encontraram a porta aberta, de uma civilização tão velha que já estava moribunda no séc. XVIII, vivendo apenas de recordações, e da cuidadosa manutenção do passado. No Ocidente, temos o oposto: o excesso de experimentação e análise, excesso dedutivo, que perde quaiquer referencial fixo, esquecendo-nos que exatamente a metade do mundo em que vivemos é o mundo em que queremos acreditar que vivemos, e a outra exata metade deve ser deixada à experimentação do novo, para que a alma humana e a civilização não morram. Os escritos clássicos pré-confucionistas ainda falavam de um deus único e pessoal, que foi deixado de lado pelo confucionismo, mas a visão viva, animista e interdependente da natureza nunca deixou de existir na China: uma espécie de “ecologia" dos espíritos humanos e da natureza. No princípio, temos o Tao, o Espírito enquanto nada absoluto, o Proteu grego. Seu primeiro movimento criou a energia Yang, solar, entropizante, que dá o movimento, que afasta, desagrega, e esta, após ter-se expandido com o máximo de seu movimento natural, gerou seu oposto, o Yin, o lunar, a neguentropia, a imobilidade, o frio, a aglutinação. E este movimento de alternância entre as duas energias opostas tornou-se perpétuo, e característica intrínseca de um universo pulsante para todo o sempre. A energia indiferenciada de onde saem os dois princípios é o "Ch'i", o sopro da natureza, ou o sopro cósmico. O sopro produziu os dois princípios, e estes, todo o Universo, segundo leis fixas. Estas leis da natureza são chamadas "Li": a ordem anterior e arquetípica do universo, tal como é igualmente descrita por Platão. Aliás, as verdades universais e arquetípicas são descritas por igual por todos os Iniciados ou Mestres do Espírito, é o que salta aos olhos da pessoa que já acumulou alguma leitura ou experiência em textos esotéricos, especialmente os da Antigüidade. "Li" está de acordo
  • 7. 7 (mas não se identifica) com "So", as proporções numéricas (que não se resumem a uma ingenua aritmética "teosófica", como os principiantes de ocultismo podem interpretar), e cuja expressão analítica máxima está mesmo nas medidas tais como são feitas pela ciência física e cartesiana ocidental. Esta ciência da natureza, tal como conhecemos, era chamada de "Ying", pelos chineses, expressão que significaria "formas da natureza". Eitel se refere a um mestre clássico do Feng-shui para dividir a exposição do sistema da ciência chinesa nestas quatro partes: Chi; Li; So; Ying. Quanto ao aspecto de "Li", a ordem celestial, arquetípica, é anterior mesmo à Criação, ainda na "mente de Deus": o "Céu" da filosofia chinesa é o ideal ou mundo arquetipal, exatamente como formulado por Platão. Ora, o que se vê no Céu, hoje, são os astros, portanto, a energia criadora que vem do Céu é estudada pela Astrologia. As forças estudadas pela Astrologia moldam a Terra, e esta, mais cedo ou mais tarde, torna-se reflexo fiel do céu sob o qual está. O mesmo acontece com o destino individual, pelo levantamento do horóscopo. Princípios gerais, para sempre serem tidos em mente: 1 . O que está em cima é como o que está embaixo: o mundo dos arquétipos reflete-se no mundo dos tipos. 2. Podemos nos colocar nas correntes favoráveis do sopro cósmico dos astros, pela ciência astrológica, como um barco a vela tira proveito dos ventos. 3. Os espíritos da natureza, dos mortos e outros espíritos também podem ajudar ou prejudicar, e podemos nos colocar sob a proteção deste ou daquele que nos possa ser favorável. Como o Céu é explicitamente representado pelos elementos da Astrologia, temos: o Sol e a Lua (o Yang e o Yin); os 12 signos, as 28 constelações reconhecidas pelos chineses; 5 planetas; as 7 estrelas da Ursa Maior e as 9 do Alqueire do Norte, Assinalamos também a seguinte tabela de correspondência entre os signos da astrologia chinesa e da ocidental: Rato – Áries Cavalo - Libra Búfalo – Touro Cabra - Escorpião Tigre – Gêmeos Macaco - Sagitário Gato – Câncer Galo - Capricórnio Dragão – Leão Cão - Aquário Serpente - Virgem Porco - Peixes Os signos orientais, do calendário lunar, referem-se à interioridade dos tipos Psicológicos que representam; os signos ocidentais, do calendário solar, à exteríoridade deles. É de se notar também o simbolismo dos cinco planetas, notavelmente coincidente com o simbolismo esotérico dos deuses que dão nome a estes planetas, para nós, segundo a mitologia grega: Júpiter Leste Primavera Benevolência Madeira Marte Sul Verão Propriedade Fogo Vênus Oeste Outono Decoro Metal Mercúrio Norte Inverno Sabedoria Água Saturno Meio da Terra Meio do Verão Fidelidade Terra Sobre a dinâmica dos cinco elementos:
  • 8. 8 Madeira Produz Fogo Metal destrói Madeira Fogo Terra Madeira Terra Terra Metal Terra Água Metal Água Água Fogo Água Madeira Fogo Metal Sobre “So", ou numerologia chinesa e medidas proporcionais mágicas da natureza, diz a lenda que o rei Fo Hi, pós-diluviano, descobriu-as meditando sobre os caracóis da crina de um cavalo-dragão (animal semelhante ao cavalo, assim como o licorne da mitologia ocidental, de natureza fantástica). Isto é o mito chinês da cabala. Perfeitamente equivalente ao mito de Posêidon presenteando o cavalo aos humanos, adotado pelos atenienses e pela deusa Atena, como símbolo de sabedoria. A cabala, sistema de interpretação esotérica que não é privilégio da hermenêutica judaica, vem do mar, isto é, da Atlântida ante-diluviana, conservada por tradição, de mestre a discípulo, até hoje, e de hoje para sempre. A mesma referência à cabala está na Ilíada, que se refere esotericamente à Guerra da Atlântida, e não à de Tróia. O cavalo de Tróia assinala existir no poema homérico uma "Cabala de Tróia", que relata as façanhas dos gregos contra os atlantes como nos fala Platão no Timeu e no Crítias. O casco da tartaruga, cujas linhas, em outra lenda, foram também observadas pelo mesmo herói civilizador. Fo Hi, coincide com o simbolismo hindu: a tartaruga identificada com o oceano no primeiro chacra. Muladhara, ou "Raiz Primordial", o oceano do Dilúvio, debaixo de cujas águas tudo apareceu. Na mitologia grega, ainda, esse Oceano do Dilúvio é o Mar Negro, à porta do qual se localizava Tróia, e que é cenário do mito esotéríco dos Argonautas. Ainda a observar uma peculiaridade numerológica: a coincidêncía no uso do sistema sexagesimal pelos sumérios, egípcios (ano de 360 dias, com a eclíptica dividida em 360º) e chineses. Isso é encontrado no esquema lógico-indutivo do Yi Ching, também descrito neste livro por Eitel, para fundamentar o Feng-shui. Os oito trigramas do Yi Ching traçados na Terra, e combinados com os quatro pontos cardeais, formam 12, ou o sistema duodecimal de numeração, que usavam para as coisas da Terra. No Céu, para os cálculos astrológicos, usavam o sistema decimal, mas combinavam-no com os seis elementos da natureza (e não 5) que são descritos no Yi Ching. Ora: 10 x 6 = 12 x 5 = 60, base do sistema sexagesimal, e essas 60 unidades, repetidas seis vezes (seis elementos) resultavam, para os chineses, na divisão do ano em 360 dias. O que se depreende de mais curioso disto é a tradição esotérica ante diluviana comum a chineses, sumérios e mesmo egípcios e maias, que remontam não tanto à Atlântida, mas aos continentes ainda anteriores, afundados no Oceano Pacífico (Lemúria; Mu), derivados do antigo continente do Sul, a Gonduana, o que nos mostra como pode ser conservada até hoje a distantíssima tradição dos gigantes ante-diluvianos da Gonduana. Norberto de Paula Lima (1) M. Yates, "Ancestral Worship and Feng-shui", in Chinese Recorder and Missionary Journal, Vol. 1, 1868. (2) E. Börschmann, Picturesque China (Londres: T. Fischer Unwín, 1924). (3) J. Needham, Science and civilization in China (Cambridge University Press: 1956-62).
  • 9. 9 Local legendário das montanhas Wu-tang, adornada com monumentos Feng-shui. 1 - INTRODUÇAO O que é Feng-shui? Esta é uma pergunta que tem sido feita repetidamente nos últimos trinta anos. Desde que foi permitido aos estrangeiros estabelecer-se nos confins deste estranho império da China, essa mesma pergunta tem brotado continuamente aqui e ali. Ao comprar um terreno, ao construir uma casa, ao derrubar uma parede, ou erguer um mastro de bandeira - os residentes dos Portos do Tratado encontraram inumeráveis dificuldades, e tudo por causa do Feng-shui. Quando foi proposto erguer alguns postes telegráficos, quando a construção de uma ferrovia foi sugerida ao governo chinês, quando uns poucos trilhos foram projetados para as minas de carvão do interior, os funcionários chineses invariavelmente faziam uma polida mesura e declaravam que aquilo era impossível, por causa do Feng-shui. Quando há trinta anos os principais comerciantes da colônia de Hong Kong procuraram estabelecer o bairro comercial da cidade no assim chamado Vale Feliz, e fazer aquela parte da ilha o centro da cidade, fracassaram vergonhosamente por causa do Fengshui. Quando o governo de Hong Kong abriu uma estrada, agora conhecida como o Abismo, rumo ao Vale Feliz, a comunidade chinesa foi lançada num estado de abjeto terror e medo, por causa da perturbação que essa amputação dos membros do dragão causaria ao Feng-shui de Hong Kong; e quando muitos dos engenheiros empregados na obra morreram com a febre de Hong Kong, e as casas de estrangeiros já construídas no Vale Feliz tiveram de ser abandonadas por causa da malária, os chineses triunfalmente declararam ter sido um ato de justiça retributiva de parte do Feng-shui. Quando o senhor Amaral, governador de Macau, que combinava uma grande paixão pela construção de estradas e um desprezo ilimitado pelo Feng-shui, interferiu na situação e aspectos das tumbas chinesas, foi derrubado pelos chineses, sua cabeça cortada, e os chineses chamaram a esse feito horrível a vinganca do Feng-shui. Por certo deve haver alguma coisa no Feng-shui, se leva as classes inferiores dos chineses a cometer um homicídio, e é rapidamente sustentado por Ministros de Estado
  • 10. 10 como uma desculpa satisfatória para sua má vontade em favorecer o progresso do comércio e da civilização. O que é Feng-shui? Os sinólogos foram procurar nos clássicos chineses uma resposta a essa pergunta, consultaram seus dicionários e não acharam nada. Os comerciantes perguntaram a seus compradores e meninos de entregas: "O que é Feng-shui?" mas as respostas que obtiveram eram obscuras e confusas, e no máximo lhes disseram que Feng-shui significa "vento e água", e é chamado assim “porque é uma coisa como o vento, que não se pode compreender, e como a água, que não se pode agarrar”. Mas, por incrível que pareça, os chineses constantemente asseveram que os estrangeiros sabem tudo sobre o Feng-shui. Quando houve uma assustadora mortandade entre as tropas de Hong Kong aquarteladas no acampamento Murray, e o médico colonial propôs que se plantassem bambus na parte posterior dos alojamentos, os chineses justamente observaram que essa medida estava estritamente de acordo com o Feng-shui; e quando foi descoberto que a epidemia foi assim de fato interrompida, viram isso como prova das virtudes do Feng-shui. Quando os estrangeiros residentes em Hong Kong começaram a construir suas mansões em Pok-fulum (que o Feng-shui indica ser o melhor local da ilha), quando o governo começou a construir um reservatório ali, quando tanques foram construídos ao norte de Hong Kong, e a encosta do morro foi totalmente arborizada, quando os cortes de terra foram proibidos onde houvesse muitas rochas decompostas, os chineses, em todos esses casos, supuseram que os estrangeiros conheciam mais sobre Feng-shui do que supunham, e o Agrônomo Geral foi tido como adepto profundo do Feng-shui. Ora, disseram eles, eis aí a Casa do Governo ocupando o melhor local do lado norte da ilha, protegida na parte de trás por árvores altas e terraços de proteção, bordejada à direita e à esquerda por estradas com curvas graciosas, e toda a situação combinando com tudo o que o Feng-shui prescreveria - como é possível que os estrangeiros finjam nada saber do Feng-shui? Bem, se o Feng-shui nada mais fosse que nosso bom senso e o que nossos instintos naturais nos dizem, o Feng-shui dos chineses não seria nenhuma charada para nós. Mas o fato é que os chineses transforniaram o Feng-shui numa ciência oculta, e os peritos nessa ciencia, que ganham a vida com ela, acham vantajoso fazer mistério em torno dela, assim como os alquimistas e astrólogos europeus faziam com suas divagações. Toda pessoa que mora na China, porém, adquire, através do relacionamento de alguns anos com o povo, uma ideia tolerável do que é o Feng-shui, e a maioria de meus leitores sem dúvida sabe que, na prática, é simplesmente um sistema de su- perstição que pretende ensinar às pessoas onde e quando construir um túmulo ou erigir uma casa de modo a garantir aos interessados prosperidade e felicidade duradouras. Desde minha chegada à China tive muitos entrechoques práticos com o Feng-shui, e por muitos anos coligi notas sobre o assunto e estudei sua literatura em todas as suas ramificações, e agora proponho-me apresentar o resultado de meus estudos perante o público. Feng-shui, pelo que entendi, nada mais é que outro nome para as ciências naturais, e, portanto, devo pedir a indulgência de meus leitores por introduzir um esboço das ciências físicas chinesas para tornar inteligível o sistema do Feng-shui. As ciências naturais nunca foram cultivadas na China daquela maneira técnica, seca e casual que a nós parece inseparável de toda verdadeira ciência. Os naturalistas chineses não se deram muito ao trabalho de estudar a natureza e arrancar-lhe seus segredos por testes e experiências minuciosos e práticos. Não inventaram nenhum instrumento para ajudá-los na observação dos corpos celestes; nunca se dedicaram a caçar escaravelhos e embalsamar pássaros, ficam horrorizados com a ideia de dissecar o corpo dos animais, nem analisaram quimicamente as substâncias inorgânicas, mas com
  • 11. 11 pouquíssimo conhecimento efetivo da natureza desenvolveram todo um sistema de ciência natural, a partir de sua consciência interior, e expuseram-no de acordo com as fórmulas dogmáticas da antiga tradição. Por mais deplorável que seja essa ausência de investigação prática e experimental, que abriu as portas a toda sorte de teoria conjectural, ela preservou na ciência natural chinesa um espírito de reverência sagrada pelos poderes divinos da natureza. Muito embora o moderno confucionismo tenha há muito tempo descartado a crença num Deus pessoal supremo, do qual seus escritos clássicos ainda preservam uma memória morta, e muito embora tenham substituído o Deus pessoal, que seus ancestrais veneraram, por uma entidade abstrata, desprovida de quaisquer atributos, vêem a natureza não como um tecido morto e inanimado, mas como um organismo vivo e respirando. Vêem uma corrente de ouro de vida espiritual passando por toda forma de existência e unindo, como num só corpo vivo, tudo que subsiste lá no céu ou cá na terra. O que tão frequentemente foi admirado na filosofia natural dos gregos - que eles faziam a natureza viver, que viam em cada pedra, em cada árvore um espírito vivo; que povoavam o mar com náiades, as florestas com sátiros -, essa maneira poética, emotiva e reverente de ver os objetos naturais, é igualmente característica da ciência natural na China. Todo o sistema do Feng-shui é baseado nesse conceito emotivo da natureza. Podemos sorrir para o caráter anticientífico e rudimentar da fisiologia chinesa; podemos apontar que cada ramo da ciência na China nada mais é que uma tentativa rudimentar para atingir as verdades que qualquer criança de escola européia conhece bem; podemos concluir que a China como um todo assemelha-se a uma criança grande, em cujo intelecto aconteceu uma súbita desgraça, e que chegou à idade adulta e à velhice sem mais conhecimento que um bebê precoce; e no entanto digo, contemplando essa mesma China, o mais antigo dos povos da Antiguidade, o maior dentre os grandes impérios, ou pelo menos o mais populoso de todos os grandes países do mundo, pesado com a idade, estupidificado, com a ignorância de uma criança no que concerne às coisas do intelecto - no entanto eu digo que quisera Deus que nossos homens de ciência preservassem em seus laboratórios, observatórios e salas de aula aquela mesma reverência infantil pelos poderes vivos da natureza, aquele temor sagrado pelos mistérios do invisível, aquela firme crença na realidade do mundo invisível e sua constante intercomunicação com o visível e temporal, que caracterizam as tentativas chinesas de elaborar uma ciência natural. O sistema de Feng-shui é relativamente moderno, em sua origem. Seus diagramas e ideias principais são de fato emprestados dos antigos clássicos, mas seu método e aplicação prática são quase inteiramente baseados nos ensinamentos de Chu-hi e outros, que viveram sob a dinastia Sung (1126-1278) e cujos comentários aos clássicos são lidos em todas as escolas. O modo de pensar de Chu-bi de fato foi adotado pelo moderno confucionismo, e forma a base filosófica de todo o sistema do Feng-shui. De acordo com Chu-hi, no começo havia um só princípio abstrato ou mônada, chamado de "nada absoluto", que evoluiu por si mesmo ao "grande absoluto". Esse princípio abstrato ou mônada, o grande absoluto, é a causa primordial de toda existência. Quando se moveu pela primeira vez, seu alento ou energia vital, congelan- do-se, produziu o grande princípio masculino. Quando se movimentou ao máximo, descansou, e, ao descansar, produziu o princípio feminino. Depois de ter descansado ao máximo, moveu-se de novo, e assim passou ao movimento alternado com o repouso, sem cessar. Quando essa causa suprema assim se dividiu em masculino e feminino, o que estava em cima constituiu o céu, e o que estava embaixo formou a terra. Assim foram feitos céu e terra. Mas a causa suprema, tendo produzido pela evolução os
  • 12. 12 princípios masculino e feminino, e através deles o céu e a terra, não cessou suas permutações constantes, no decurso das quais homens e animais, vegetais e minerais vieram a ser. A mesma energia vital, além disso, continua a agir e sempre através daquelas duas causas originais, as forças masculinas e femininas da natureza, que desde então mútua e alternadamente empurram e agitam uma à outra, sem um momento de descanso. Ora, a energia que anima os dois princípios é chamada em chinês Hi, ou o alento da natureza. Quando esse alento foi pela primeira vez exalado e produziu os princípios masculino e feminino e, ao fim, todo o universo, não o fez arbitrariamente, ou ao acaso, mas seguiu leis imutáveis, fixas, inescrutáveis e imutáveis. Essas leis, ou ordem da natureza, chamadas Li, foram assim abstratamente consideradas anteriores à emissão do sopro vital, e devem ser consideradas separadamente. Mais uma vez considerando este Li, ou ordem geral do universo, os antigos sábios observaram que todas as leis da natureza e todas as operações de seu sopro vital estão em estrito acordo com certos princípios matemáticos, que podem ser traçados e ilustrados por diagramas, exibindo a proporção numérica do universo, chamada So, ou números. Mas o sopro da natureza, ou Hi, a ordem da natureza, chamada Li, e as proporções matemáticas da natureza, chamadas So, esses três princípios não podem ser reconhecidos diretamente pelos sentidos; estão ocultos à vista, e só se tornam manifestos através de formas e perfis da natureza física. Em outras palavras, os fenômenos da natureza, suas formas exteriores de aparência, constituem um quarto ramo do sistema da ciência natural chamado Ying, ou forma da natureza. Ora, essas quatro divisões, Li, ou a ordem geral da natureza, So, suas proporções numéricas, Hi, seu sopro vital ou energias sutis, e Ying, suas formas aparentes, constituem o que é popularmente chamado o sistema de Feng-shui. Nenhuma obra chinesa sobre o Feng-shui, porém, ou pelo menos nenhuma que vi ou de que ouvi dizer - segue essa divisão metodicamente, se bem que todas mencionem esses quatro princípios e lhes dêem aqui e ali a devida importância. Por outro lado, essa divisão em quatro ramos do sistema do Feng-shui não é de minha autoria. Um conhecido erudito cantonês, membro do Colégio Imperial menciona, num prefácio que escreveu a uma popular obra sobre geomancia, que todo o sistema do Feng-shui poderia muito vantajosamente ser dividido nas quatro partes mencionadas. Desse prefácio tomei a sugestão, e proponho agora apresentar a meus leitores o sistema do Feng-shui, segundo esse plano quádruplo, e elaborando-o de modo a dar-lhes uma visão de todo o sistema da ciência natural chinesa.
  • 13. 13 A Fortaleza do Terror, Ting-hai, em Chusan, numa paisagem rica em Feng-shui, com casa rural e Recinto dos Ancestrais. 2 - AS LEIS DA NATUREZA De acordo com as observações acima, preciso primeiro tratar de Li, ou os princípios gerais que governam a natureza; com as leis do universo físico. Para entender isto direito precisamos de saída ter em mente que o chinês vê o céu como o tipo ideal, de que nossa terra é apenas um grosseiro reflexo material. Tudo que existe na terra nada mais é do que a forma sensível e transitória de algum agente celestial. Tudo que é terrestre tem seu protótipo, sua causa primordial, seu agente governante no céu. O filósofo chinês, contemplando as belezas da natureza, a variedade de colinas e planícies, rios e oceanos, a maravilhosa harmonia da cor, luz e sombra, vê nelas nada além do opaco reflexo daquele cenário mais esplêndido no afresco de beleza etérea do firmamento estrelado do céu. Olha para o sol, aquele ofuscante regente do dia, e reconhece nele, como seu reflexo terrestre, o princípio masculino da criação, governando tudo que está debaixo do sol. Ergue os olhos para a lua, a bela rainha da noite, e vê seu reflexo na terra no princípio feminino, difundindo-se por todas as formas de existência sublunar. Observa o rápido curso rotatório dos cinco planetas: Júpiter, Marte, Vênus, Mercúrio e Saturno, e vê sua contraparte na terra no incessante intercâmbio e permutação dos cinco elementos da natureza: madeira, fogo, metal, água e terra. Observa o firmamento estrelado à noite, e compara-o com sua transcrição fracamente refletida na superfície de nossa terra, onde os picos das montanhas formam as estrelas, os rios e oceanos correspondem à Via Láctea. Em suma, o firmamento do céu é, para um observador chinês, o livro misterioso em que as leis da natureza, os destinos das nações, o destino e a sorte de cada indivíduo estão escritos em caracteres místicos bieroglificos, inteligíveis unicamente para os iniciados. Ora, decifrar essas tábuas do céu, romper os selos deste livro apocalíptico, é o
  • 14. 14 objetivo primário do Feng-shui, e o primeiro método a ser empregado na decifração desse horóscopo celestial do futuro, a primeira chave a ser inserida para destravar esse enigmático cofre, em que as fortunas das gerações presentes e futuras estão trancadas, é o conhecimento dos princípios ou leis gerais da natureza. Aprendam pois, suas fortunas, e guardem bem as seguintes licões: 1. Que o céu governa a terra; 2. Que tanto céu como terra influenciam todos os seres vivos e está em suas mãos voltar esta influência a seu favor; 3. Que os fados dos vivos também dependem da boa vontade e influência geral dos mortos. Quanto ao primeiro ponto, a influência que o céu exerce sobre a terra, os agentes que entram em consideração aqui são o sol e a lua, com os doze signos do zodíaco e as vinte e oito constelações, os cinco planetas - pois só cinco são conhecidos dos chineses - as sete estrelas da Ursa Maior e nove outras estrelas do alqueire do norte. O sol, como já observamos, influencia todo o universo físico e o curso aparente do sol, marcado pelos doze signos zodiacais, é portanto um elemento importante no cálculo da influência do céu sobre a terra. Os chineses dividem a eclíptica em doze partes iguais, dando a cada uma o nome de um animal. Assim, à primeira, chamam rato; corresponde a Áries; a seguinte é o touro, igual ao nosso signo do Touro; a terceira, que chamam tigre, corresponde a Gêmeos; a quarta, ou a lebre, corresponde a Câncer; a quinta, o dragão, corresponde • Leão; a sexta, ou a cobra, a Virgem; a sétima, o cavalo, a Libra; a oitava, o carneiro, a Escorpião; a nona, o macaco, a Sagitário; a décima, o galo, a Capricórnio; a undécima, o cão, a Aquário; e a duodécima, o javali, a Peixes. Devido à precessão dos equinócios, ou deslocamento dos pontos equinociais do leste para o oeste, ocorreu uma mudança - desde que os ancestrais dos chineses fixaram esses doze asterismos - digo que ocorreu uma mudança nas relações entre os signos do zodíaco e seus respectivos asterismos. Há dois mil anos atrás os signos zodiacais e os asterismos correspondiam-se, de modo que quando o sol entrava no primeiro grau do signo de Áries, entrava também na constelacão do mesmo nome. O efeito da precessão dos equinócios foi separar os asterismos de seus signos nominais, de modo que a constelação de Peixes está agora no signo de Áries e o signo de Áries, em Touro. Os chineses, não sabendo da precessão dos equinócios, ficam perplexos pela discrepância, mas cuidando menos da precisão e mais da antiga tradição, ignoram a discrepância atual, e ainda representam os doze signos, não como aparecem agora, mas como apareciam para seus antepassados há dois mil anos. Usam os doze signos zodiacais especialmente para determinar as vinte e quatro estações do ano. Quando o sol entra no 15º de Aquário (5 de fevereiro), começa a primavera. Quando entra em Peixes (19 de fevereiro) começa a estação das chuvas; quando atinge o 15º de Peixes (5 de março) os insetos ficam excitados; quando entra em Áries (30 de março) chega o equinócio vernal, seguido (a 5 de abril) pelo termo chamado “luz e claridade"; entrando em Touro (20 de abril) traz a chuva frutificadora, e (a 5 de maio) o começo do verão; em Gêmeos (21 de maio) acarreta os dois termos chamados "o grão crescendo" e (a 6 de junho) "o grão está na espiga”; em Câncer, os dois termos, solstício de verão (21 de junho) e pequeno calor (7 de julho); quando o sol está em Leão (23 de julho) o grande calor começa e (a 7 de agosto) tem início o outono; quando o sol está em Virgem (23 de agosto) o calor é limitado, e (a 8 de setembro) cai o orvalho branco; quando o sol está em Libra (23 de setembro), ocorre o equinócio de outono, e (a 8 de outubro) o orvalho frio desce; quando em Escorpião (23 de outubro) o granizo cai e (a 7 de novembro) vem o inverno; quando em Sagitário (22 de novembro), pouca neve cairá, e depois (a 7 de dezembro), muita neve; quando o sol está em Capricórnio (22 de dezembro), ocorre o solstício de inverno e (a 6 de janeiro) pouco
  • 15. 15 frio; quando o sol entra em Aquário (20 de janeiro), vem um grande frio, e assim o ciclo do ano é completado. A seguir, em importância com relação aos doze signos zodiacais, vêm as 28 constelações, ou casas, através das quais a lua se desloca em seu curso mensal através da eclíptica. Estas 28 constelações são divididas em 4 seções, uma das quais é chamada dragão azul, localizada no leste, e compreende as primeiras sete constelações. As sete constelações seguintes são chamadas de guerreiro negro, cuja casa está no norte; as terceiras sete recebem o nome de tigre branco, situadas no oeste, e as últimas sete são designadas de pássaro vermelhão, governando o sul. Mas além dessas quatro constelações que são vistas como espíritos que influenciam a terra, deve-se também observar que destas 28 constelações as de número 4; 11; 18 e 25 formam uma conjunção feliz com o sol; as de números 5; 12; 19 e 26, com a lua; ao passo que dos cinco planetas, as seguintes conjunções são favoráveis: Júpiter com as de número 1; 8; 15; 22; Vênus com, as de número 2; 9; 16; 23; Saturno com as de número 3; 10; 17 e 24; Marte com as de número 6; 13; 21 e 27; e Mercúrio com as de número 7; 14; 20 e 28. Além das 28 constelações, os cinco planetas conhecidos pelos chineses e as virtudes ocultas atribuídas a eles exercem papel muito importante no sistema do Feng-shui. Diz-se que Júpiter reina no leste, gerando a primavera, e tem o atributo da benevolência. Marte reside no sul, comanda o verão e favorece a propriedade. Vênus reside no oeste, governa o outono e sua província é o decoro. Mercúrio está localizado no norte, governa o inverno e representa a sabedoria. Saturno reina no meio da terra, governa o meio do verão e é caracterizado pela fidelidade. Há outros corpos celestes que analogamente exercem uma influência sobre a terra. Como os 5 planetas formam, além do sol e da lua, os sete regentes das estações, assim também as 7 estrelas da Ursa Maior contribuem com sua quota para a direção das estações. Esta esplêndida constelação atraiu a atenção e imaginação poética de quase todas as nações da terra, mas nunca ouvi de um povo que desse tamanha aplicação prática a este notável aglomerado de estrelas. Os chineses consideram as sete estrelas da Ursa Maior como formando um relógio natural. Pois o corpo da Ursa Maior estando em tempos antigos consideravelmente mais perto do Pólo Norte do que está agora, a cauda parecia mover-se em torno do pólo um tanto como o ponteiro de um relógio. Considerando a superfície da terra formando o mostrador e dividindo o horizonte em 24 partes iguais, ao passo que a cauda da Ursa age como ponteiros, temos um método simples de determinar as mencionadas 24 estações do ano. Quando a cauda aponta, ao cair da noite, para o leste, é primavera no mundo. Quando aponta para o sul, é verão; quando aponta o oeste, é outono; e quando aponta, ao cair da noite, para o norte, é inverno. A luz destas 7 estrelas, supõe-se ainda, exerce grande influência sobre a terra e todos os seus habitantes, e essas 7 estrelas são, portanto, combinadas com o sol e a lua, chamados os nove luminares do mundo. Há um outro conjunto de estrelas, chamadas de nove estrelas do alqueire, que são igualmente de grande importância para a determinação dos aspectos propícios ou nefastos de uma localidade dada e sua conseqüente influência nos destinos dos homens. Essas 9 estrelas são minuciosamente descritas em todo almanaque ou calendário chinês, mas é difícil determinar sua posição no céu. São chamadas "nove estrelas do alqueire do norte", mas este termo por vezes é aplicado ao Pólo Norte, por vezes a Ursa Maior, por vezes a uma das 28 constelações chamadas de alqueire. Mas sua posição no céu é de pouca importância - algumas autoridades até mesmo dizem que elas não têm nenhuma posição fixa, mas movem-se pela atmosfera - pois têm todas as suas contrapartes ou representantes na terra na forma de montanhas, e é o ofício e arte do geomante
  • 16. 16 determinar que pico de montanha ou colina corresponde a uma ou outra dessas estrelas, cada uma com sua relação permanente com um dos 5 elementos ou um dos 8 diagramas mencionados. O ponto seguinte a ser considerado é a influência que o céu e a terra exercem sobre o ser humano. Os principais agentes, através dos quais o céu e especialmente os cinco planetas agem sobre todas as criaturas vivas, são os cinco elementos da natureza. Por esses, porém, não devemos entender cinco substâncias materiais, quimicamente indissolúveis, mas essencias espirituais, cada uma caracteristicamente diferente da outra e formando as causas geradoras de todas as substâncias materiais. Estes cinco elementos são: madeira, fogo, terra, metal e água; o primeiro deles sendo agente de Júpiter; o se- gundo, de Marte; o terceiro, de Saturno; o quarto, de Vênus; o quinto, de Mercúrio. Mas é também importante observar a relação mútua dos 5 elementos uns com os outros, pois cada par produz ou destrói um ao outro, se colocados em certas conjunções. A madeira produz o fogo, o fogo produz a terra, a terra produz o metal, o metal produz a água, a água produz a madeira. Por outro lado, o metal destrói a madeira, a madeira destrói (isto é, absorve) a terra, a terra destrói (isto é, absorve) a água, a água destrói o fogo, o fogo destrói o metal. De novo deve ser considerado que a madeira é abundante no leste, o metal no oeste, a água no norte, o fogo no sul, ao passo que a terra predomina no centro, entre os quatro pontos cardeais. Também deve-se ter em mente que a madeira reina na primavera, o fogo no verão, o metal no outono, a água no inverno, e a terra durante os últimos dezoito dias de cada estação. Dessa forma a influência quíntupla dos planetas penetra e dirige toda a natureza, como por exemplo, os 5 constituintes da estrutura humana: músculos, veias, carne, ossos, pele e cabelo; as 5 partes interiores das vísceras, a saber: coracão, fígado, estômago, pulmões e rins; as 5 cores: branco, preto, vermelho, azul e amarelo; as cinco fortunas: riqueza, honra, longevidade, filhos e morte pacífica; as cinco relações sociais: príncipe e ministro, pai e filho, marido e mulher, irmãos mais velhos e mais jovens, e amigos. Além da influência que, de acordo com as leis da natureza, céu e terra exercem sobre os destinos dos viventes, é preciso considerar as leis que regulam a influência dos espíritos dos mortos sobre os vivos. É uma doutrina que nos parece estranha, mas que nada tem de irrazoável para um chinês acostumado a venerar os espíritos de seus antepassados, que ele supõe estarem constantemente flutuando por perto, e a quem ele anuncia formalmente todo evento em sua família, e oferece-lhes sacrifícios de carne e bebida. "Meus próprios espíritos animais", diz o Comentador dos Analectos de Confúcio, “são os espíritos animais de meus progenitores. Quando de minha parte levo ao máximo minha sinceridade e respeito ao venerá-los, então os espíritos de meus ancestrais estão presentes comigo. Assim como uma baste de trigo, quando a planta original está morta, novas raízes aparecem dos lados - assim ligando o espírito real e idêntico das gerações passadas ao tempo presente". Muito embora falemos de céu e terra, dizia Chu-hi, só existe, em verdade, um sopro (espírito) que os sustenta. Muito embora falemos de indivíduos, e os distingamos uns dos outros, na verdade há só um alento que os anima a todos. Meu próprio alento (espírito) é idêntico ao de meus ancestrais. Essa ideia da unidade orgânica, ou melhor, identidade, da base espiritual da vida na natureza e nos indivíduos, foi tema favorito de discussão com Chu-hi e outros filósofos da dinastia Sung. De acordo com essa escola agora de influência universal, a alma humana é dotada de natureza dual, e leva, como se fosse uma vida dupla. Distinguem um animus e anima. O primeiro é a energia da natureza humana incorporando o princípio masculino da natureza, O alento do animus é o alento do céu. A anima, por outro lado, é a redundância ou pletoma, por assim dizer, da energia de
  • 17. 17 contração (feminina) da natureza. O alento da anima é o alento da terra. O animus é o elemento espiritual; a anima, o elemento material, ou animal, da alma. Quando, pela exalação do sopro vital, o corpo é decomposto, o animus retorna ao céu, a anima à terra; isto quer dizer: cada um é dissolvido de novo naqueles elementos gerais da natureza de onde derivou sua origem e incorporação temporária e ingressou na esfera da vida individual. As almas dos antepassados mortos, portanto, são tão onipresentes quanto os elementos da natureza, assim como o céu e a terra. Assim os chineses foram ensinados a se considerarem como constantemente cercados de um mundo espiritual, de fato invisível e inacessível pelo tato, mas não menos real, nem menos influente. Ora, as pessoas comuns têm a noção - que, sem dúvida é a aplicação popularizada das proposições filosóficas dadas acima - de que as almas dos ancestrais ficam como que acorrentadas por algum tempo, por sua natureza animal, à tumba em que seus corpos estão enterrados, ao passo que por sua natureza espiritual sentem-se impelidas a voarem sobre as casas de seus descendentes, donde ser uma inferencia lógica e natural supor que a fortuna dos vivos dependa da situação favorável do túmulo de seus antepassados. Se um túmulo for colocado de modo que o espírito animal do falecido, supostamente residindo ali, fique confortável e livre de elementos perturbadores e a alma tenha entrada e saída irrestritas, os espíritos ancestrais sentir- se-ão bem dispostos em relação a seus descendentes e poderão estar sempre à volta deles, dispostos a fazer chover sobre eles todas as bênçãos do mundo espiritual a seu alcance. Essa ideia está incrustada tão profundamente neles, a influência dos mortos sobre os vivos, que os chineses que querem cair nas boas graças dos estrangeiros vão aos cemitérios de Hong Kong, no Vale Feliz, e rezam ali nos túmulos dos estrangeiros, supondo que os espíritos dos mortos que ali estão, agradecidos por suas oferendas e orações, influenciariam os espíritos dos vivos, causando assim um mútuo bom entendimento entre as partes interessadas. Naturalmente, pois, todo chinês dá-se ao maior trabalho para situar os túmulos de seus parentes de tal maneira que nenhuma estrela ou planeta lá no céu, nem qualquer elemento terrestre cá em baixo, nenhum sopro ou influência sutil da natureza, nenhuma configuração de colinas e vales de mau agouro perturbem o calmo repouso dos mortos, pois disso dependerão as fortunas e infortúnios dos vivos. Consequentemente é importante saber as regras pelas quais o local mais feliz para um túmulo pode ser encontrado, e como o lugar melhor adaptado para um túmulo depende principalmente da melhor conjunção de todos os elementos celestiais e terrestres, está claro que o método pelo qual o melhor lugar para a tumba é encontrado, é também aplicável para a seleção de um bom lugar para uma residência ou edificação de qualquer espécie. Pois as mesmas influências que agem sobre os espíritos animais dos mortos têm também sua ação sobre os vivos. Aqui abordamos, no entanto, só os princípios gerais, e enunciarei as regras aplicáveis a esse propósito o mais brevemente possível. Em primeiro lugar deve ser entendido que há na crosta terrestre duas correntes diferentes, que eu chamarei de magnéticas: uma masculina, outra feminina; uma positiva, outra negativa; uma favorável, a outra desfavorável. Uma é alegoricamente chamada de dragão azul, e a outra, tigre branco. O dragão azul sempre deve ficar à esquerda, e o tigre branco sempre à direita de qualquer lugar considerado de bom agouro. Assim sendo, esse é o primeiro afazer do geornante: procurar um local propício, achar um bom dragão, e seu complemento, o tigre branco, ambos discerníveis por certas elevações do solo. Dragão e tigre eram constantemente comparados com a porção inferior e superior do braço de um homem: na dobra do braço está o local favorável. Em outras palavras, no ângulo formado por dragão e tigre, no ponto em que duas correntes
  • 18. 18 (magnéticas) que eles representam individualmente se cruzarem, poderá estar o lugar favorável. Digo poderá estar, porque, além da conjunção do dragão e do tigre, deve haver também uma tranquila harmonia de todos os elementos celestes e terrestres que influenciam aquele local em partícular, e que deve ser determinado pela observação da bússola e sua indicação de proporções numéricas, e examinando a direção dos cursos d'água. À guisa de ilustração, é possível observar que a situação favorável da cidade de Cantão consiste em estar localizada exatamente no ângulo formado por duas cadeias de morros formando curvas suaves rumo ao Bogue, onde quase se encontram, em forma de ferradura. A cadeia de morros conhecida como Nuvens Brancas representa o dragão, ao passo que o terreno ondulado do outro lado do rio forma o tigre branco. O lugar mais favorável de Cantão é portanto o terreno perto dos portões do norte, onde tigre e dragão vão para a direita e esquerda. Pois o lugar mais feliz, dizem os livros de Feng-shui, é como uma modesta virgem que gosta do retiro, e assim é uma das primeiras regras procurar, em caso de dúvida, um local num recesso. Outra regra é que, em terreno perfeitamente monótono, numa planície perfeitamente nivelada, ou em declives constantes, onde não há sinal de dragão ou tigre, não será possível encontrar nenhum bom sítio. Uma terceira regra é observar a diferença entre terreno masculino e feminino. As fortes elevações são chamadas masculinas, ao passo que o terreno irregular de ondulação suave é feminino. Em terreno onde as características masculinas prevalecem, o lugar favorável é no ponto com características femininas, visíveis ao olho ou indicadas pela bússola, ao passo que num local globalmente classificado como feminino, o melhor lugar para um túmulo ou casa deve ter indicações de predomínio masculino. Mas os prognósticos mais favoráveis pertencem ao ponto onde haja uma transição de masculino para feminino ou de feminino para masculino, e onde as vizinhanças combinam - como indicado pela bússola - características masculinas e femininas na proporção certa, que os livros do Feng-shui afirmam ser 3/5 masculino para 2/5 feminino. Onde porém as indicações femininas excedem as masculinas, há influências malignas, contrapondo-se a quaisquer outras configurações favoráveis. Por fim, o lugar a ser escolhido para um túmulo, se todas as regras acima forem satisfeitas, deve ser invariavelmente seco e livre das formigas brancas, que são o maior temor tanto para os vivos quanto para os mortos. Esses são apenas princípios gerais, cuja aplicação passaremos a considerar em detalhe, quando tratarmos da bússola como indicadora das proporçoes numéricas do sopro e das formas da natureza.
  • 19. 19 Túmulos e templos nas montanhas de Amoy. 3 - AS PROPORÇÕES NUMÉRICAS DA NATUREZA Agora passarei a considerar a segunda divisão do sistema do Feng-shui, do chamado Su, ou proporções numéricas da natureza. Observando o céu, a mudança constante do dia e da noite, os números e a distribuição dos corpos celestes movendo-se, multidões deles, cada um num curso rápido, e nunca interferindo uns sobre os outros - ao observar, digo, esse todo variado e no entanto harmonioso, surpreendeu o observador chinês que, na base desse grande esquema do céu, houvesse princípios matemáticos; que todos os corpos celestes existem e se movem em certas proporções numéricas. De novo, observando a terra, com suas constantes revoluções de verão e inverno, primavera e outono, crescimento e declínio, vida e morte, os chineses notaram que aqui a mesma ordem matemática é repetida, que a terra nada mais é senão o reflexo do céu, a corporificação material grosseira dos problemas matemáticos ideais, eterearnente delineados no firmamento do céu. Ora, para ilustrar e compreender esse esquema das proporçes numéricas, que conecta e consolida céu e terra, os antigos sábios da China inventaram certos diagramas. Não atribuo qualquer credibilidade à história de Fo Hi ter observado um cavalo-dragão saindo de um rio, carregando em seu dorso os delineamentos geométricos do grande esquema do céu e da terra, em diagramas e círculos formados no seu pêlo encaracolado. Mas o fato, parece incontestável, é que nos mais remotos tempos da antigüidade chinesa certos diagramas foram usados para ilustrar as proporções numéricas do universo. Não interessa quem inventou inicialmente o esquema dos diagramas, não importa se o tenha produzido em seu cérebro, ou fantasiando sobre as confusas linhas existentes nas costas de uma tartaruga; permanece o fato de que, há mais de 2.000 anos, os chineses pos- suíam e usavam um esquema de diagramas essencialmente igual ao que até hoje é usado pelos ignorantes e supersticiosos como um encantamento de inefável eficácia, e frequentemente suspenso sobre as portas das casas. Como quer que esse conjunto de
  • 20. 20 oito diagramas possa ter sido originalmente construído, quer sintética, quer anali- ticamente, o modo pelo qual sua origem foi posteriormente explicada é o seguinte. Representando o princípio superior criativo masculino por uma linha, e o princípio feminino correspondente por uma linha interrompida, e então multiplicando-as e combinando-as, são obtidos quatro diagramas, a saber: 1. duas linhas paralelas, representando o grande princípio masculino. 2. duas linhas interrompidas paralelas, representando o grande princípio feminino. 3. uma linha interrompida, com uma paralela embaixo, chamado o pequeno masculino. 4. uma linha cheia, com uma paralela interrompida embaixo, chamado o pequeno feminino. O diagrama do grande masculino foi então tomado como um símbolo do sol, do calor, do intelecto, dos olhos, etc. O diagrama do grande feminino foi considerado representando os planetas, a noite, o corpo, a boca, etc.; por outro lado o diagrama do pequeno masculino significava a lua, o frio, as paixões, as orelhas, etc.; e o diagrama do pequeno feminino significava as estrelas, a luz do dia, a forma, o nariz, etc. Indo adiante, e combinando esses quatro diagramas uns com os outros, de todas as maneiras possíveis, outro conjunto de oito diagramas foi obtido. É geometricamente composto dos quatro diagramas precedentes, mas sua explicação primitiva era, eu presumo, baseada numa agora antiquada visão dos elementos que compõem a natureza. já mencionei mais de uma vez a enumeração dos cinco elementos: metal, madeira, água, fogo e terra, hoje corrente na China. No tempo em que esse conjunto de oito diagramas foi inventado, parece ter estado em voga uma enumeração bem diferente dos elementos. Os chineses deviam então contar seis elementos, e os chamavam da seguinte forma: trovão, vento, fogo, oceano, água e montanhas. De qualquer modo, um dos mais antigos clássicos chineses, o I Ching, explica esse conjunto de diagramas como se segue: (1) três linhas cheias correspondentes ao grande princípio masculino, representando o céu e designando o Sul; (2) três linhas interrompidas paralelas correspondentes ao grande princípio feminino, representando a terra e apontando o Norte. Segue-se o que suponho significar os seis elementos da natureza: (1) no Leste, duas linhas cheias com uma interrompida no meio significam o fogo, pois, diz o I Ching, para secar a miríade das coisas não há nada mais ardente que o fogo; (2) no Oeste, duas linhas interrompidas com uma cheia no meio representam a água, pois para umedecer a miríade das coisas não há nada como a água; (3) no Sudoeste, duas linhas cheias com uma interrompida no lado interior representam o vento, pois para revolver a miríade das coisas não há nada mais eficaz que o vento, (4) no Nordeste, duas linhas interrompidas com uma inteira do lado interior correspondem ao trovão, pois para agitar a miríade das coisas não há nada mais rápido que o trovão; (5) no Sudeste, duas linhas cheias com uma interrompida no lado exterior representam o vapor do oceano, pois para satisfazer à miríade das coisas não há nada mais satisfatório que o oceano; (6) no Noroeste, duas linhas interrompidas com uma cheia no lado exterior significam as montanhas, pois para terminar e iniciar a miríade das coisas não há nada mais perfeito que as montanhas. Assim, acrescenta o 1 Ching, água e fogo atacando e misturando-se um ao outro, trovão e vento não se opondo um ao outro, e as montanhas e oceano sendo penetrados pelo mesmo sopro, a natureza pode executar suas transformações, completar e aperfeiçoar a miríade das coisas. Para dar à imaginação e à engenhosidade um jogo ainda mais amplo, esses oito diagramas não só, como mostramos, são correlacionados com os oito pontos cardeais, mas também a oito estações diferentes. Mesmo um conjunto de oito animais diferentes
  • 21. 21 são correspondidos com esses oito diagramas; o primeiro, diz-se, representando a força de um cavalo, o segundo, a docilidade de um boi, o terceiro, agradável como um faisão, o quarto, degradante como um porco, o quinto, penetrante como o galo, o sexto. influente como um dragão, o sétimo, dócil como um carneiro, o oitavo, fiel como um cão. Para ilustrar todas as inumeráveis mudanças e permutações da natureza, esses oito diagramas foram de novo multiplicados uns pelos outros, dispostos em todas as suas possíveis combinações, e assim um outro conjunto de 64 diagramas foi obtido, cada um tendo analogamente um nome especial, e especiais virtudes ocultas a eles asso- ciadas. Esse desenvolvimento do sistema original atribuído a Fo-hi baseia-se, no entanto, numa disposição diferente dos oito diagramas principais. O diagrama do céu, que o sistema de Fo-hi colocava no Sul agora é consignado ao Noroeste, ao passo que o diagrama de fogo, que o sistema mais antigo colocava no Leste, agora ocupa o Sul. De maneira semelhante, o diagrama da terra, anteriormente governando o Norte, agora é relegado ao Sudoeste e seu lugar consignado ao diagrama da água, que antes reinava no Oeste. De acordo com isso temos, nessa nova disposição dos oito diagramas de Fo-hi, o diagrama para água no Norte, o do trovão no Leste, o do fogo no Sul, o do oceano no Oeste. O Nordeste é ocupado pelo diagrama que corresponde às montanhas, o Sudeste pelo diagrama do vento, ao passo que o diagrama para a terra é colocado no Sudoeste, e aquele para o céu, no Noroeste. Essa nova disposição dos oito diagramas originais, e especialmente o seu desenvolvimento num conjunto de 64 diagramas, diz-se ter originado com Wen-wang, o célebre fundador da dinastia Chou, que enquanto passava por um período de retiro, entreteve-se arranjando e rearranjando hastes de palha na base daqueles oito diagramas, de modo que as diversas combinações de hastes longas e curtas de palha representassem todo o esquema do céu e da terra penetrados pelos princípios masculinos e femininos. Podemos prontamente acreditar que os chineses, procurando descobrir o inventor dessa imaginosa teoria, deram com a ideia de que ninguém senão um homem isolado do mundo, ninguém senão um homem doente com o confinamento solitário poderia elaborar um sistema tão engenhoso e maravilhosamente variado, mas tão completamente desprovido de toda observação prática da natureza. Essa ausência de conexão direta e aplicação prática dos fatos que se dá pela observação da natureza foi, é claro, mais e mais sentida, quanto mais os chineses progrediam em seu conhecimento de astronomia e nos outros ramos da ciência natural. Aquele antigo sistema de diagramas, baseado na antiquada teoria de seis elementos terrestres, não dá lugar para a influência dos cinco planetas, que em eras posteriores foram supostos como fatores de influência capital sobre os destinos da raça humana. Os cinco planetas parecem ter sido desconhecidos mesmo nos dias de Confúcio, ou ao menos nunca são mencionados nos clássicos chineses. Consequentemente, os filósofos da dinastia Sung, achando que o sistema antigo se chocava contra suas populares opiniões sobre astronomia, mas tendo demasiada reverência pela sagrada ferrugem da antiguidade para descartá-la totalmente, mantiveram os oito diagramas, mas elaboraram-nos num sistema baseado na ideia de que os cinco planetas (Vênus, Júpiter, Mercúrio, Marte e Saturno) e os cinco elementos terrestres correspondentes (metal, madeira, água, fogo e terra) contêm a principal solução do grande mistério da vida. Atribuíam aos cinco planetas uma posição central, e pesquisando a partir dessa base as proporções numéricas do universo, chegaram à conclusão de que todos os corpos celestes e todas as forças e influências do céu são dispostas de acordo com o sistema decimal. Aplicando então os antigos seis elementos que entram no plano dos quatro e oito diagramas, e que na verdade referem-se exclusivamente à terra, e não ao céu - apli- cando, digo, esses antigos conjuntos de quatro diagramas e de oito diagramas às
  • 22. 22 relações terrestres apenas, chegaram à conclusão de que todas as formações da terra, todas as relações, são baseadas no sistema duodecimal. Assim, inventaram um conjunto de dez caracteres simbólicos ou números, destinados a explicar os mistérios do céu, e chamaram-no de os dez troncos celestiais. Então vieram com outra série de doze caracteres simbólicos ou números, e usaram-nos como a chave matemática para resolver todos os problemas relacionados à terra, chamando-os de os doze ramos terrestres. Eles, além disso, distinguiam tanto nos dez troncos celestes quanto nos doze ramos terrestres, os números pares e ímpares. Todos os números ímpares, declararam, em obediência às regras determinadas pelo I Ching, referiam-se ao princípio masculino da natureza, e todos os números pares, ao feminino. Novamente, dividiram, adotando a regra do antigo sistema, os dez troncos celestes em cinco pares, mas fizeram cada par corresponder não só aos cinco elementos, mas também a cada um dos cinco planetas. Os doze ramos terrestres passaram a significar os já mencionados doze signos do zodíaco, os doze pontos da bússola chinesa e as doze divisões do dia (cada divisão compreendendo duas horas). E ainda, combinando as duas séries e unindo o primeiro dos doze ramos terrestres ao primeiro dos dez troncos celestes; depois unindo os segundos caracteres de cada série e remetendo aos dez troncos seis vezes, através dos doze ramos cinco vezes, obtiveram um conjunto de sessenta caracteres cíclicos, que usaram para designar sucessivos dias e anos, e que multiplicados por seis deram os 360º da eclíptica. Aqui temos uma série de fórmulas logarítmicas, habilmente idealizadas para englobar todas as proporções numéricas que os chineses atribuem ao universo, intrincada o bastante para deixar perplexa qualquer mente ordinária e assombrar, por seus mistérios, a massa ignorante do povo. Uma hábil e engenhosa manipulação de um tal sistema naturalmente capacita um homem a se impor à multidão supersticiosa, e por conseguinte descobrimos que todas as diferentes artes da adivinhação na China - astrologia, geomancia, horoscopia, frenologia, quiromancia e assim por diante - são ba- seadas nesse sistema de números. Para fins geomânticos, que é só o que nos interessa aqui, os ditos diagramas e séries de computações foram combinados para uso prático na forma de uma bússola, com a agulha magnética no centro, e todos os diferentes diagramas e caracteres cíclicos com todos os elementos que entram no cálculo, inscritos em círculos concêntricos na prancha à volta da agulha. O uso da agulha magnética sugeriu-me a possibilidade de que os chineses tinham algum conhecimento empírico do magnetismo terrestre, e usariam a agulha magnética para observar a declinação, inclinação e intensidade das correntes magnéticas que passam pela crosta da terra e que hoje em dia estão sendo cuidadosamente obser- vadas pelos meteorólogos modernos, na América e na Europa. Mas lamento dizer que não consegui descobrir o menor conhecimento empírico do fato de que um magneto suspenso livremente indica por seus movimentos a inclinação, declinação e intensidade das correntes magnéticas da terra. Para começar com o mais exterior dos círculos inscrito na prancha da bússola, achamos este círculo (XVIII) dividido em 28 porções de tamanho desigual, em cada uma delas o nome de uma das 28 constelações pelas quais passa a lua em seu curso pela eclíptica, com o número de graus que cada constelação ocupa. Esse círculo, portanto, representa a órbita da lua, e sua utilidade é determinar não só as influências lunares em geral, mas também a influência que cada constelação supostamente exerce em um dado local. Todo calendário chinês dá uma série de 28 tábuas contendo minuciosa enurneração das afinidades geomânticas associadas a cada constelação, mas bastará aqui dizer que 15 delas são dadas no calendário como nefastas, e 13 como propícias. Para permitir ao geomante determinar as influências lunares felizes ou infelizes de qualquer lugar com perfeita precisão, o círculo seguinte (XVII) representa de novo a
  • 23. 23 eclíptica, mas dividida em 360º, dos quais alguns são marcados como felizes, ao passo que no círculo seguinte (XVI) os números ímpares sucessivos dos 360º são marcados em 28 porções correspondendo às 28 constelações do círculo XVII, assim permitindo ao geomante pronunciar, em relação a cada polegada do solo e em relação a cada dia do ano, se o princípio feminino ou masculino ali prevalece, pois os números ímpares representam o princípio masculino e os pares (deixados em branco), o feminino. Prosseguindo rumo ao centro do círculo (XV) dividido em 60 porções, ilustra-se a influência dos cinco planetas em sua relação com os cinco elementos: metal, madeira, água, fogo, terra. Estes cinco termos são inscritos em série no círculo em diferentes combinações, destruindo uns aos outros, indiferentes uns aos outros, produzindo uns aos outros, e assim por diante. Cada elemento aparece doze vezes, mas o elemento madeira é interpolado num lugar, onde é colocado com o elemento fogo à direita e à esquerda, ocupando dois graus que correspondem ao 10º e 11º graus da constelação do "alqueire” (seis estrelas no ombro e arco do Sagitário). O geomante, referindo-se a qualquer lugar, fica assim capacitado a dizer não só por que planetas em particular o local é influenciado, mas também se o elemento terrestre prevalecendo ali está em harmonia com os elementos que governam os locais adjacentes à direita e à esquerda. Suponhamos, por exemplo, que a bússola indique que um lugar esteja sob a influência de Marte. O elemento terrestre correspondente é o fogo. Ora, se a bússola ali indica madeira à esquerda e água à direita, é um mau agouro, porque água destrói fogo e fogo destrói madeira. Mas suponhamos que a bússola indicasse o elemento terra à esquerda do elemento fogo, e à sua direita, madeira; seria uma conjunção favorável, porque madeira produz fogo e fogo produz terra. Os elementos estão porém arranjados em alguns lugares de modo que, em série, sejam indiferentes uns aos outros, nem produzindo nem destruindo uns aos outros, o que, é claro, é considerado como conjunção favorável. O círculo seguinte (XIV) é formado por duas linhas concêntricas de caracteres, divididas em 60 porções. A linha interna de caracteres dá 13 diferentes combinações dos dez troncos celestes, arranjados de modo que cada caractere signifique ao mesmo tempo um elemento e um número par (feminino) ou ímpar (masculino). Cada uma dessas 13 combinações de elementos (ou planetas) começa com o elemento (ou planeta) madeira (ou lúpiter), e alternadamente com o número um (masculino) e com o número dois (feminino). Apenas a duodécima combinação, começando com o elemento (ou planeta) fogo (ou Marte) e o número três (masculino) faz exceção. Das 13 combinações, 8 contêm a série completa dos elementos (ou planetas) na ordem em que produzem uns aos outros (madeira, fogo, terra, metal, água). As cinco combinações remanescentes dão os elementos aos pares, de acordo com a ordem de produção. Duas combinações apenas dão os elementos (ou planetas) aos pares, os elementos (ou planetas) que produzem uns aos outros num par e destroem uns aos outros no outro par. A linha exterior de caracteres correspondentes, dividida em 12 espaços, associa a cada 5 caracteres da linha interna um dos 12 signos zodiacais cinco vezes repetido. Consequentemente, cada uma das doze divisões desse círculo contém na linha exterior um signo zodiacal colocado em conjunção com 5 elementos diferentes (ou planetas) na linha interior, mas em todo signo zodiacal a disposição e relação mútua dos elementos é diferente. Continuando rumo ao centro, o círculo seguinte (XIII) em 60 divisões, dá 48 caracteres, cada um referindo-se a um símbolo diferente dos célebres 64 diagramas de Wen-wang, que mencionei antes. Mas desses 48 diferentes diagramas há 6 que formam o conjunto de 8 diagramas: terra, oceano, fogo, trovão, vento e montanha, e que aqui são dados duas vezes, em diferentes locais; seis outros, não pertencendo ao conjunto dos 8 diagramas, são dados duas vezes, lado a lado. Para a explicação desses 48
  • 24. 24 diagramas, o geomante recorre à tabela dada em todo calendário, onde cada um dos diagramas é dado e os dias felizes ou infelizes (para o trabalho geomântico) é apontado. O círculo seguinte (XII) está dividido em 24 divisões, cada uma subdividida em 5 compartimentos. O segundo e quarto compartimentos em cada uma das 24 divisões têm uma dupla fileira de caracteres à sua volta. A linha interior de caracteres dá alternadamente em cada divisão, os dois símbolos do fogo (ping-ting) – que também significam os números 3 (masculino) e 4 (feminino) – e os dois símbolos do metal (kang-sin) - ou os números 7 (masculino) e 8 (feminino) - repetidos duas vezes em cada divisão; a série sendo: ping-ting ping-ting; kang-sin kang-sin. Na linha exterior corres- pondente, os doze ramos terrestres ou signos do zodíaco são dados sob os já mencionados símbolos em doze divisões, cada divisão tendo um signo zodiacal repetido quatro vezes em caracteres idênticos. A função desse círculo, portanto, é conectar ciclicamente cada um dos doze signos do zodíaco com um dos dois elementos, fogo ou metal, ou com os planetas Marte ou Vênus, assim como com certos elementos masculinos ou femininos. O círculo seguinte (XI) é idêntico ao de número VII a partir do centro, só que os caracteres inscritos neles estão dispostos de maneira que, por exemplo, o símbolo que designa o norte está à esquerda, e no outro círculo à direita da linha que corre para o norte entre eles. Ora, em ambos os círculos, em 24 divisões, estão escritos em série um ou outro dos 12 ramos, alternando-se com um ou outro dos dez troncos (mas omitindo os dois troncos que designam a terra), ao passo que após cada 5 desses caracteres, um dos 4 diagramas seguintes (tomados daquele conjunto de 8 diagramas) é ínserido: os diagramas para céu, terra, montanhas e vento. Esse círculo portanto combina os doze pontos da bússola chinesa, com referência simultânea aos elementos: madeira, fogo, metal e água; e aos planetas: Júpiter, Marte, Vênus, Mercúrio; e aos quatro princípios geomânticos: céu, terra, montanhas e vento. O círculo seguinte (X) dá as divisões menores da bússola. É dividido em 60 espaços, onde não só as direções da bússola estão inscritas, mas também as direções dos 10 troncos do céu e dos 4 princípios geomânticos. Lê-se, por exemplo, do leste para o sul: Direção Leste. 7 (metal); 3 (fogo). 3 (fogo); 7 (metal). Direção dois (madeira). 5 (terra); 5 (terra). Direção E-SE. 3/4 E. 7 (metal); 3 (fogo). 3 (fogo); 7 (metal). Direção Vento. 5 (terra); 5 (terra). Direção S-SE. 3/4 E. 7 (metal); 3 (fogo). 3 (fogo); 7 (metal). Direção Fogo. 5 (terra); 5 (terra). Direção Sul. Os números 7; 3; 5 significam, é claro, frações de 10, ou subdivisões da bússola. As palavras 7 (metal), 3 (fogo), por exemplo, significam que 7/10 desta subdivisão da bússola são governados pelo elemento metal, e 3/10 do mesmo espaço pelo elemento fogo. Com esse círculo está em correspondência o seguinte, (IX), que dá 60 divisões com dois círculos concêntricos de caracteres. Esse círculo com seus caracteres é o mesmo que o de número XIV e o de número V a partir do centro. Só que as inscrições dos 3 círculos estão em posições diferentes; assim, o primeiro caractere do círculo XIV (fileira interior) está quase no leste, a do círculo V quase E-SE, ao passo que o primeiro do círculo IX está entre eles. O círculo seguinte (VIII) é o mesmo que o XI, exceto pela posição dos caracteres, e suplementa aquele círculo ressaltando a linha de influência de cada símbolo. O outro círculo (VII) tem as mesmas divisões do VIII e XI, com suas 24 divisões, cada uma representando um dos 24 termos solares ou 24 períodos correspondentes ao dia em que o sol entra no 1º e no 15º graus dos signos zodiacais. Esse círculo é, portanto, um calendário-miniatura, e sua utilidade é determinar a estação durante a qual uma casa pode ser erigida ou um túmulo construído num dado lugar.
  • 25. 25 Essas 24 estações não estando, porém, sob a influência apenas do sol, mas também dos 5 elementos e dos 5 planetas, os dois círculos seguintes exibem a influência que esses, elementos e planetas exercem sobre cada uma das 24 estações do ano. O primeiro deles (VI) faz corresponder a cada estação um dos doze signos zodiacais e dois planetas ou elementos, fogo (Marte) e metal (Vênus). O segundo (V) não traz só dois, mas todos os 5 elementos e planetas, além dos 12 signos do zodíaco, correspondendo às 24 estações. Esse círculo é dividido em 12 porções distintas, com um espaço em branco entre cada uma delas, e cada divisão contém na fileira exterior de caracteres um signo zodiacal 5 vezes repetido, ao passo que na porção exterior correspondente da fileira interior, inscrevem-se 5 diferentes troncos celestiais. Mas esses troncos estão dispostos em 12 diferentes combinações, dando alternadamente, em números pares ou ímpares, os vários elementos ou planetas. O círculo subsequente (IV) é dividido em 24 partes iguais, nas quais estão inscritos: (1) os 12 signos zodiacais, os números ímpares sendo marcados em vermelho como particularmente auspiciosos, assim como Áries, Gêmeos (que representa o tigre branco), Leão (que representa o dragão azul), Libra, Sagitário e Aquário; (2) oito dos 10 troncos celestiais, a saber: dois caracteres para o elemento água, dois para a madeira, dois para o fogo, e dois para o metal; (3) quatro símbolos pertencentes aos oito diagramas, a saber: céu (em vermelho), terra (marcada em vermelho), vento e água. Esse círculo é essencialmente o mesmo que os de número VIII e XI, e sua identidade é ainda mais salientada pela igualdade de largura e tamanho dos caracteres. A única diferença entre esses três círculos é que os caracteres são colocados em posição diferente, indicando com mais proeminência a linha exata em que se dá a influência de cada símbolo. O círculo de número (111) associa aos 12 signos zodiacais aquelas 9 estrelas do alqueire do norte que mencionamos acima. São dispostas aqui em 24 compartimentos: um chamado o quebrador da falange, ocorrendo 3 vezes; 3 outras chamadas a estrela militar, a estrela literária e a estrela da pureza, cada uma 4 vezes; 3 outras chamadas de lobo avarento, emolumentos oficiais e a porta ampla, ocorrendo cada uma 2 vezes; e as duas remanescentes, o assistente da mão esquerda, e o assistente da mão direita, cada uma ocorrendo uma vez. O círculo de número (11) dá, em 24 divisões, da qual cada uma alternada é deixada em branco: (1) os diagramas do céu, terra, montanhas e vento; (2) oito troncos celestiais em pares, cada caractere referindo-se a um número diferente, elemento ou planeta. A sequência é a seguinte: (1) vento; (2) número dois madeira e três fogo; (3) vento; (4) terra; (5) 4 fogo e 7 metal; (6) terra; (7) céu; (8) 8 metal e 9 água; (9) céu; (10) montanhas; (11) 10 água e 1 madeira; (12) montanhas. Note-se aqui que os quatro pares de elementos (planetas) mencionados são dispostos de modo que cada par contém um número par (feminino) e um número ímpar (masculino), e os elementos (ou planetas) a que se referem estão de acordo com a ordem de aparição. O primeiro e mais interior dos círculos dá em 8 compartimentos os nomes de 8 signos zodiacais: Leão, Gêmeos, Sagitário, Capricórnio, Peixes, Câncer, Virgem e Libra. Quando a bússola é consultada com referência a um lugar qualquer, não só um destes 18 círculos, mas cada um deles contribui com alguma parte para a determinação dos aspectos propícios ou nefastos do lugar em questão. O resultado, porém, é que para cada local um grande número de conjunções desconcertantes pode ser enumerado, causando ao não-iniciado a crença de que essa bússola é um complexo quase misterioso de sabedoria sobrenatural. E acho que devo reconhecer que seja um dispositivo bastante engenhoso, sendo no todo um conhecimento rudimentar de astronomia, pois compreen-
  • 26. 26 de numa só disposição todos os diferentes princípios da ciência física chinesa, os princípios masculino e feminino, os 8 diagramas, os 64 diagramas, a órbita solar, a eclíptica lunar, os 360º da longitude, os dias do ano, os 5 planetas, os 5 elementos, as 28 constelações, os 12 signos zodiacais, as 9 estrelas do alqueire, as 24 estações e os 12 pontos cardeais. As pessoas incomuns conhecem todos esses termos pelo nome, mas não sabendo seu significado, vêem os termos em si com um certo temor reverente, supondo que exerçam alguma influência mágica. Ora, o geomante, tirando vantagem desse preconceito popular vai ao homem do povo com a bússola na mão, da qual o povo nada entende, e pronuncia seu julgamento em relação a um local num jargão mistificante, e suas afirmações apocalípticas são recebidas com temor supersticioso mesmo onde não há muita fé no sistema. O geomante, ele mesmo sabe muito bem que suas predições são só adivinhação, baseada na experiência que acumula no decurso de sua prática. Mas ele também sabe que suas profecias por vezes se cumprem em consequência do temor que inspiram, e mesmo que suas predições na maioria das vezes sejam desautorizadas pelos eventos reais, ele pode se confortar pensando que sua bússola, afinal, se não faz o dinheiro correr para o bolso de seus clientes, certamente o faz correr para o seu. Retiro de um filósofo na Colina de Fu-chung, província de Sin-kiang. Degraus cortados na rocha dão acesso aos tanques de pesca. 4 - O SOPRO DA NATUREZA Agora chegamos à terceira divisão do sistema de Feng-shui, a doutrina do sopro da natureza. A natureza, como já tive ocasião de apontar antes, é vista pelo observador chinês como um organismo vivo e que respira, e não podemos nos surpreender, portanto, ao encontrar os chineses discutindo a inalação e a exalação do alento da natureza. De fato, com a distinção destes dois sopros, o de expansão, como o chamam, e o de reversão, explicam quase todo tipo de fenômeno da natureza. Entre o céu e a terra,
  • 27. 27 não há nada tão importante, tão poderoso e onipresente quanto esse sopro da natureza. Penetra cada tronco, cada fibra, e através dele o céu, a terra e toda criatura vive, se move e tem seu ser. O sopro da natureza, nada mais é senão a energia espiritual dos princípios masculino e feminino. Assim, no começo da condensação do sopro transformador da natureza, há a mudança do nada para o ser do princípio masculino: a exaustão do sopro transformador da natureza é a mudança da existência para a não-existência do princípio feminino da natureza. Quando no início esses dois princípios saíram do "grande absoluto", foi então que o primeiro sopro da natureza foi exalado. Mas no princípio, o sopro da natureza era confuso e caótico, de modo que por algum tempo o céu e a terra não estiveram separados, mas quando o sopro da natureza reverteu, e a exalação e a inalação regularmente se sucederam, céu e terra, os princípios masculino e feminino, foram separados e tudo na natureza foi produzido em sua ordem apropriada. Mesmo agora, quando o primeiro sopro da natureza se adianta ou expande, algo como um feto disforme é criado, constituindo o germe de um futuro desenvolvimento. Essa origem incipiente e disforme das coisas, sendo leve e pura, ainda não possuindo qualquer forma determinada, pertence ao masculino, e pode ser chamada princípio superior da natureza: mas quando uma forma bem determinada foi assumida, manifestamente apresenta-se à vista e constitui a forma exata das coisas, possuindo corpo, cor, forma e modo. Isso, sendo pesado, material e cognoscível pelo sentido humano, pertence ao princípio feminino, ou inferior, ou em outras palavras: um sopro que se adianta e outro que reverte, regularmente se sucedendo um ao outro, são a condição da constante sucessão de crescimento e declínio da vida e da morte no mundo físico. Os dois sopros da natureza são, porém, essencialmente um só. Os princípios masculino e feminino, unindo-se, constituem o começo das coisas; quando se dispersam, causam declínio, dissolução e morte. Por vezes dispersam-se, e de novo se unem. Assim, depois de terminarem, de novo começam o que constitui o princípio da reprodução, difundindo-se sem cessar por toda a natureza. Quanto ao sopro que penetra os seres humanos, as energias da natureza também aqui devem eventualmente se esgotar, e a morte é o que nenhum homem pode evitar. Com a morte, as partes mais grosseiras da alma animal do homem descem e voltam à terra, mas as partes mais finas da natureza espiritual difundem-se e se expandem pelo mundo, tornando-se uma nuvem ou uma luz que aparece ocasionalmente, à semelhança de um fogo-fátuo ou um vapor que, ninguém sabe como, afeta os sentidos humanos e pode torná-los entorpecidos, tristes e deprimidos. Esse sopro da natureza, com suas constantes pulsações, com suas incessantes permutações de expansão e contração, mostra-se nas condições variadas da atmosfera sob seis modos, sendo a causa original de frio, calor, secura, umidade, vento e fogo. Esses são por vezes chamados de seis sopros da natureza. Esses seis sopros produzem, sob a influência combinada dos 5 planetas e dos 5 elementos, as 24 estações, que são geralmente chamadas de 24 sopros da natureza. O sopro da natureza aliado ao elemento madeira, e guiado por júpiter, produz a chuva; combinado com o elemento metal e governado por Vênus, o sopro da natureza produz bom tempo; unindo-se ao elemento fogo e influenciado por Marte, o sopro da natureza produz o calor; suportado pelo elemento água e governado por Mercúrio, o sopro da natureza produz o frio; e com o auxílio do elemento terra e influenciado por Saturno, causa o vento. E esse é todo o sistema da meteorologia chinesa. Mas agora surge a questão de como nós, à parte o funcionamento geral do sopro da natureza, podemos determinar, com referência a uma localidade qualquer se há ali um sopro favorável ou desfavorável, ou se há qualquer sopro?
  • 28. 28 Aqui de novo o sistema do Feng-shui faz uso da alegoria do dragão azul e do tigre branco. Observamos acima que a superfície da terra nada mais é que o espelho pálido das configurações, poderes e influências do céu, e que portanto, cada constelação do céu tem sua contraparte na terra. Já notamos (pág. 33) que um dos 4 quadrantes do céu estrelado, no leste ou à esquerda do observador, é governado por um espírito chamado de dragão azul, incorporando as influências de sete constelações. O quadrante ocidental, ou da direita, compreendendo também 7 constelações, é representado por um espírito chamado de tigre branco. O dragão azul e o tigre branco são, portanto, emblemas indicadores das influências sutis, o sopro vital das divisões oriental (masculina) e ocidental (feminina) do firmamento. Sempre que há uma pulsação do sopro da natureza, será visível na terra alguma elevação do terreno. Onde o sopro da natureza estiver correndo pela crosta da terra, as suas veias e artérias, por assim dizer, serão detectáveis. Mas o sopro da natureza contém um elemento dual, um sopro masculino e um feminino, um positivo e um negativo, um de expansão e um de reversão, assemelhando-se ao que nós, num português moderno, diríamos, duas correntes magnéticas, ou como os chineses as chamam, o dragão azul e o tigre branco. Onde houver um dragão verdadeiro, haverá também um tigre, e os dois serão detectáveis no traçado de montanhas ou colinas num curso tortuoso. Além disso, será discernível o tronco e os membros do dragão, até mesmo as veias e as artérias de seu corpo, saindo do seu coração, na forma de cadeias de montanhas. Via de regra, haverá uma acumulação de sopro vital perto da cintura do dragão, ao passo que nas extremidades de seu corpo a energia do sopro da natureza estará quase esgotada. A uma distância de 20 li, ou 6 milhas, diz-se que o sopro torna-se fraco e ineficaz. Mas mesmo perto do coração do dragão, o sopro da natureza, a menos que mantido coeso pelas colinas e montanhas das imediações, será disperso. Onde um lugar qualquer, aberto e amplo de todos os lados, admitindo o vento de todas as direções, não terá vantagem nenhuma do sopro, pois o vento se dispersará antes de causar qualquer benefício. Suponhamos ainda um terreno com muito sopro vital, e flanqueado por colinas que tendem a reter o sopro, mas os cursos d'água correm em linha reta, rapidamente; ali também o sopro será disperso antes de servir a qualquer propósito útil. Só nos lugares onde o sopro da natureza for mantido coeso, encerrado à direita e à esquerda e tendo um dreno para levar a água num curso tortuoso, haverá as melhores indicações de um fornecimento permanente de sopro vital. Construir um túmulo ou uma casa num tal lugar garantirá a prosperidade, saúde e honras. Observa-se a regra geral que, sempre que se se deparar com terreno duvidoso que não dê indicações claras das veias do dragão, é melhor procurar o canto mais recluso, pois no retiro é que o tigre e o dragão são mais entrelaçados, e ali o sopro se acumula mais abundantemente. Suponha-se ainda que foi encontrado um terreno onde ambos, dragão e tigre são completamente delineados: a regra é então procurar pela junção de tigre e dragão, alguma depressão ou montículo, ou alguma súbita transição de terreno masculino para feminino. Pois o corpo do dragão e as colinas circunjacentes sempre devem exibir características masculinas e femininas até o ponto em que o lugar auspicioso esteja precisamente determinado. Até aqui só falei do sopro natural e benéfico da natureza. Mas há uma exalação venenosa e mortal, e é uma das vantagens do Feng-shui, apontar e advertir contra os locais em que a construção de um túmulo ou uma casa acarretaria a perda da vida e calamidades sobre as gerações futuras. Muito frequentemente, diz-se, há lugares que têm todas as aparências de bom terreno de dragão e sem dar sinal de influências malignas; no entanto, aquele terreno acarretará indescritíveis calamidades e desolação sobre qualquer família que se aventurar a escolher um local ali para uma tumba ou
  • 29. 29 residência. Em tais casos, só a bússola indicará a presença de um sopro nocivo, assinalando a desarmonia das influências planetárias e o desacordo dos elementos. Mas, em geral, a existência de um sopro pernicioso traír-se-à por indicações exteriores. Sempre que houver uma colina ou montanha elevando-se abruptamente do solo, e erguendo-se em linhas retas, ou mostrando um aspecto extremamente anguloso, sem encostas graduais, haverá ali um sopro perigoso. Falando genericamente, todas as linhas retas são maus sinais, mas mais especialmente quando uma linha reta aponta diretamente para o ponto em que um local foi escolhido. Suponha ainda que você tenha escolhido um lugar em que tanto o dragão à esquerda quanto o tigre à direita estão encurvados como um arco, mas aos lados dos quais serras se estendem em linhas retas, cada uma como uma flecha num arco - essa seria uma configuração absolutamente perigosa. Ou suponha que você encontrou um lugar abundante em bons auspícios, mas a alguma distância à sua frente há uma serra em linha reta ou fonte de água, ou corte de ferrovia, não apontando na direção do seu terreno, mas correndo de través em linha reta - essa linha causaria um sopro mortal, afetando toda a sua fortuna e a de seus descendentes. Como as linhas retas das serras são causadoras de más influências, o mesmo se dá com as correntes de água que correm em linha reta. A água, no sistema do Feng-shui é sempre vista como símbolo da riqueza e da abundância. Sempre que a água correr em linha reta, fará com que as propriedades das pessoas que moram perto dela se escoem depressa, da mesma maneira que a água. As linhas tortuosas são indicações de sopros benéficos e servirão para reter o sopro vital, onde quer que ele exista. Uma outra indicação da existência de um sopro maligno são as rochas destacadas, a menos que sejam protegidas por árvores e arbustos. Há muitos casos, dados nos livros de geomancia, de túmulos situados perto de rochas, mas estando essas protegidas por vegetação densa; o túmulo em questão exercendo ao longo de várias gerações a mais benéfica influência, acumulando honrarias, riqueza, longevidade, progênie e tudo o mais sobre as famílias cujos ancestrais foram enterrados ali. Mas aos poucos, a descrença no Feng-shui, ou a avidez, ou o ódio de um inimigo malicioso, fez com que as árvores caíssem e os arbustos que protegiam as rochas fossem cortados, causando imediatamente a desgraça e a pobreza a essas famílias; foram privadas de suas honrarias, seus emolumentos, sua riqueza dispersou-se, e seus descendentes foram lançados às agruras da vida, para passar fome. Hong Kong, com a sua abundância de rochas e encostas rochosas das montanhas, é abundante em sopro maligno, e os chineses acham que nosso governo é muito sábio ao procurar plantar árvores por todos os lugares nas colinas, para obstacular esses geradores do mal. Mas a mais maligna influência que Hong Kong sofre é causada por aquela curiosa rocha no sopé do morro perto de Wanchai. É visto claramente da Queen's Road East, e os estrangeiros vêem nela Caim e Abel, Caim matando seu irmão. Os chineses acham que a rocha representa um vulto feminino que chamam de a mulher má, e acreditam seriamente que toda a imoralidade de Hong Kong, todo o vício de Taip'ingshian são causados pela rocha maligna. Essa crença está tão firmemente impregnada nas classes inferiores de Hong Kong que aqueles que lucram com práticas imnorais vão venerar aquela rocha, esparramando a seus pés oferendas e queimando incenso na sua base. Ninguém se atreve a danificá-la, e já ouvi de pessoas, sob outros aspectos perfeitamente sensatas, que vários canteiros que tentaram cortar a base da rocha morreram subitamente após a sua tentativa, Ora, todas essas más influências, sejam causadas por linhas retas, colinas, cursos d'água, ou rochas e montanhas rochosas, podem ser defendidas ou contrabalançadas. Os melhores meios para manter à dístância ou absorver essas exalações más são plantar
  • 30. 30 árvores junto à casa e manter um tanque com fornecimento constante de água fresca na frente da casa. Um pagode, porém, ou uma colina coberta por floresta serve ao mesmo fim, e por essa razão a Serra de Cantão. com seus pagodes de cinco andares, protege contra o mau sopro da natureza, e protege toda a cidade. Outro dispositivo para manter à distância as más influências, é colocar à frente do portão da casa um escudo ou prancha octogonal com os emblemas dos princípios masculino e feminino, ou com os oito diagramas pintados sobre ele, e dando ao caminho que conduz à casa um traçado tortuoso. Leões talhados em pedra ou dragões de porcelana também servem ao mesmo fim, e podem ser colocados na frente de um edifício ou no topo do telhado; mas o meio melhor e mais efetivo, é contratar um geomante, fazer o que ele diz, e pagar-lhe bem. Uma bússola de geomante.
  • 31. 31 No distrito dos Dois Picos, província de Chen-si. Estas montanhas são ricas em ouro e outros minerais, mas o Feng-shui da região foi considerado ainda mais precioso e a mineração foi proibida. Guarda tártaros foram estacionados aqui para impedir os prospectores. 5 - AS FORMAS DA NATUREZA Agora chegamos à última divisão do sistema do Feng-shui - a doutrina dos perfis e formas da natureza. Este capítulo, porém, constitui apenas a aplicação prática das regras e ideias gerais estabelecidas nos capítulos precedentes, e não precisarei entrar em detalhes. Já falei das elevações do solo que indicam a presença do sopro da natureza, com suas duas correntes de energia masculina e feminina, positiva e negativa, simbolicamente chamadas dragão e tigre. A posição relativa e a configuração destas, conforme indicada por colinas ou montanhas, é o ponto mais importante, no que concerne aos perfis e formas da superfície da terra. Não vou entrar numa enumeração de todas as configurações que tornam a posição relativa, extensão e direção desses dois elementos simbólicos, favorável ou desfavorável. Basta dizer que são mais auspiciosamente dispostos quando formam uma ferradura completa, assim como duas séries de morros começando de um ponto vão para a direita e para a esquerda numa graciosa curva, suas extremidades suavemente voltam-se uma para a outra. Tal formação de morros é indício certo da presença de um verdadeiro dragão e, se outras conjunções não a contrariarem, a influência de um local escolhido num ponto onde o dragão e o tigre vão para a direita e para a esquerda, é tudo o que se pode desejar. Outro elemento importante na doutriria das aparências da natureza é a direção dos cursos d'água. Já tivemos ocasião de aludir a isso mais de uma vez, e o ponto principal é que a água correndo em linhas retas ou formando ângulos fortes em seu curso, é absolutamente perigoso. Um curso sinuoso é o melhor presságio da existência de influências benéficas. Mas a junção de dois cursos d'água é um elemento que não