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no site, comunicando que havia sido feita uma revisão em
dois importantes documentos, a "Declaração de Direitos e
Responsabilidades" e a "Política de Uso de Dados". Segundo
ela, a revisão foi necessária para dar melhor explicação sobre
como o nome do usuário, sua foto do perfil e outros dados
pessoais podem ser usados em conexão com anúncios ou
conteúdo comercial, para ficar claro que "está dando permissão ao Facebook para esse uso".17 Logo surgiram pressões
para que o Facebook desistisse das alterações propostas.
Várias entidades de proteção da privacidade, lideradas pela
EletronicPrivacy lnformation Genter(EPIC), enviaram carta 18
à Federal Trade Comission (FfC), que vem a ser uma espécie
de agência reguladora do Governo dos Estados Unidos, encarregada da proteção de direitos dos consumidores. Na carta,
grupos de defesa da privacidade digital argumentam que
as alterações possibilitarão que o Facebook utilize as fotos
e 'homes de seus usuários para fins comerciais, sem que
eles, quando se registraram no site, tivessem dado consentimento para tal. Argumenta-se, também, que as alterações
são especialmente perniciosas para os menores de idade,
pois a nova redação do documento propõe a seguinte representação fictícia:
Sevocêtivermenos de 18(dezoito)anos,ou tivermenos de
qualquer idade aplicávelà maioridade,você declara que pelo
menos um de seus pais ou responsáveislegaistambém concordou com os termos desta seção (e com o uso do seu nome,
imagem do perfil,conteúdo e informações)em seu nome.

Ou seja, através dessa enunciação o Facebook considera ter obtido uma autorização parental com o simples
ingresso do menor no site, o que se afigura representação
meramente fictícia, despida de valor jurídico, pois não exige
o consentimento expresso dos pais ou responsáveis legais.
Para utilizar dados de menores, o Facebook teria que ter se
utilizado de uma ferramenta que mantivesse os pedidos
de registro pendentes até que os pais manifestassem sua
concordância com a política de uso.
O envolvimento de crianças e adolescentes na questão
é realmente elemento fundamental quando se trata de
examinar a legalidade da publicidade na forma de histórias patrocinadas no Facebook. Existem muitas páginas e
comunidades fazendo publicidade ou apologia do consumo
de cigarros e bebidas, outras com orientação política, ideológica e sexual. Permitir que menores de idade possam não
só ter acesso a esse tipo de material informacional como
também vincular sua imagem a determinados conteúdos
inadequados viola as leis e princípios de proteção a esse
grupo de pessoas mais vulnerável.
Nos Estados Unidos, a FIC já anunciou que vai abrir
investigação contra o Facebook.19 No Canadá, também
foi proposta ação coletiva contra o sUe, incitada por uma
mulher que se sentiu lesada ao ver sua imagem e nome
sendo utilizados para fins comerciais sem seu consentimento específico.20 Com isso, não é difícil imaginar que a
questão da legalidade das histórias patrocinadas do Facebook, em breve, assome também nos tribunais brasileiros. 11

NOTAS
1 Cf. Faceboolc mostra o raio-x de 1 bilhão de usuários. Folha de S. Paulo. de 4 de outubro de 2012.
2 Cf. Faceboolc divulga número de usudrios diários dos EUA e Reino Unido. Disponível em: <http://tecnologia.terra.com.brlfacebook-diwlga-numero-de-usuarios-diarios-dos-eua-e-reino-unido.625c7a5568870410VgnCLD2000000dc6ebOaRCRD.html>.
3 Cf. Faceboolc passa Orlcut e vira maior rede sociol do Brasil. Disponível em: <http://gl.globo.comltecnologialnoticial2012101Ifacebook-passa-orkut-e-vira-maior-rede-social-do-brasil-diz-pesquisa.html>.
4

CF.Faceboolc alcança marca de 76 milhões de usudrios no Brasil. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/noticialvida-digitaVfacebook-alcanca-marca-de-76-milhoes-de-usuarios-no-brasil>
.

5

Cf. Faceboolc libera publicidode nas feeds e chama de "destaques~ Disponível em: <http://tecnologia.terra.com.brlintemetlfacebook-Iibera-publicidade-nos-feeds-e-chama-de-destaques,2668fe32cdbda31
OVgnCLD200000bbccebOaRCRD.html>. Acesso em: 19.04.12.
O feed de notícias é a coluna central da página inicial do usuário do Facebook. " uma lista em constante atualização de publicações das outras pessoas
e páginas que um determinado usuário segue no Faceboolc. As publicações no feed de notícias incluem atualizações de status. fotos, vfdeos, links.
atividade de aplicativos e opções "curtir~

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11
12
13
14

Informações contidas na "Central de Ajuda" do Faceboolc. Disponível em: <https:l/www.facebook.comlhelp/294671953976994>.
Cf. Como funcionam os anúncios e as histórias patrocinadas.
Disponível em: <https:l/www.facebook.comlaboutlprivacy/advertising>.
Para tanto. basta utilizar a configuração de Editar anúncios sociais.
Isso está expressamente consignado na política de uso de dados pessoais do Faceboolc. na parte que informa sobre "Como funcionam os anúncios e as
histórias patrocinadas":"Sua configuração Mostrar minhas ações sociais em Anúncios do Faceboolc controla somente os anúncios com contexto social.
Ela não controla Histórias patrocinadas. anúncios nem informações sobre os serviços e recursos do Faceboolc ou outros conteúdos do Fac~
Cf. Ferramentas para pais e educadores. Disponível em: <https:l/www.facebook.comlhelp/parents>.
Cf. Fíve million Faceboolc users are 10 or younger. ConsumerReparts.or9.
10 de maio de 2011.
US. District Court. Northem District of califomia.
Fraley. et ai. v. Faceboolc.lnc. et aI.. case nOCV-ll'()1726 RS.

15 Disponível em: <http://www.pcworld.com/article/2047520/judge-approves-2o-million-facebook-fund-to-settle-advertising-suithtml>.
16 Disponível em: <https:l/www.facebook.comllegaVterms>.
17 Inteiro teor do texto divulgado a respeito da revisão das políticas de uso de dados pessoais e declaração de direitos e responsabilidade
em: <https:l/www.facebook.comlnoteslfacebook-síte-governance/atualiza%C3%A7%C3%85es-propostas-para-os-documentos-de-goveman%C3%
A7a110153197317185301 >.
18 Disponível em: <http://epic.orgtprivacy/ftcIPrivacy-Grps-FTC-tr-9-13.pdf>.

disponível

19 Cf. jomal The New York Times. de 11 de setembro de 2013. Disponível em: <http://www.nytimes.coml2013/09/12/technology/personaltechlftc-looking-into-facebook-privacy-policy.html?_r=l&>.
20 Disponivel em: <http://www.cbc.ca/newslcanadalbritish-columbialb-c-woman-sues-facebook-for-using-her-photo-l.1192457>.

DEMÓCRITO REINALDO FILHO é Juiz de Direito da 32" Vara Cível do Recife (PEj.

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REVISTA JURíDICA CONSULEX

- ANO XVII - N' 404 - 15 DE NOVEMBRO/20B

HERNANI ZANIN JUNIOR E ROGÉRIO DONNINI
et

A EXTENSÃO DO ART. 940 DO CÓDIGO CIVIL
ERROS INESCUSÁVEIS E DíVIDAS INEXISTENTES

2:

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••••
:::J

O
C

Judiciário nacional tem sido unânime em aplicar
a penalidade do art. 940 do Código Civil apenas
quando o devedor conseguir provar má-fé do
credor na sua cobrança judicial por dívida já
paga, total ou parcialmente.
Entretanto, julgado recente do Superior Tribunal de
Justiça nos fez refletir acerca do alcance do art. 940 do
Código Civil. Assim dispõe excerto da ementa: "Agravo
regimental. Agravo em recurso especial. Sanção prevista
no art. 940 do Código Civil em caso de erro inescusável.
Inaplicabilidade. Súmulas STJ nOS e 83 [...1." (AgRg no
7
AREsp nO 302.306-Sp, Terceira Turma, ReI. Min. Sidnei
Beneti, DJe 04.06.13).
Acaso esse dispositivo legal não tutelaria também os
casos de cobranças judiciais por dívidas inexistentes ou
naquelas em que ocorreu erro inescusável do credor ao
postular sua cobrança indevida? Esses dois pontos, da
maior importância, merecem nota.
O art. 1.531 do Código Civil de 1916, cujo teor foi mantido no art. 940 do atual Código Civil, era claro em prever
penalidade aos que demandassem por dívida já paga ou
em valor maior do que era devido, silenciando sobre qual
seria o elemento subjetivo desse tipo civil.
A vétusta jurisprudência
do STJ pacificou que, no
caso do art. 1.531 do Código Civil de 1916, era indispensável a prova pelo devedor de que o credor estaria
com má-fé na sua demanda por dívida já paga ou
em excesso, apesar de a Lei não exigir a prova pela
vítima da má-fé do seu algoz como requisito justificador para aplicação da penalidade.
Confira-se
o excerto do julgamento datado de 1990, proferido sob
o escólio doutrinário do saudoso Professor Washington
de Barros Monteiro:

O

PROCESSUALIVIL. ITIGANTE EMA-F~.BUSCAE APREC
L
D
ENSÃO.
I - Sem a prova inconcussa e irrefragável do dolo. não há
como se impor ao litigante a condenação de que trata o
disposto nos arts. 1.531 e 1.532 do Código Civil,quando
promove lide dita temerária.
11- Razoabilidade da propositura da busca e apreensão de
veículo vendido sob a modalidade de alienação fiduciária
para garantir-se contra eventual inadimplência da parte
em relação a qual foi celebrada a transação.
111- Negativa de vigência dos arts. 1.531 e 1.532 do Código Civilnão caracterizada. Dissídio jurisprudencial não
comprovado. Recurso não conhecido.

(REsp nO1.964-RN,Terceira Turma, ReI. Min. WALDEMAR
ZVEITER,
DJ02.04.90.)
Ainda que a jurisprudência pudesse e devesse integrar o conteúdo do prefalado art. 1.531, de acordo com
os princípios e ideologia da sua época, é evidente que,
com o nascimento, em 1988, do nosso novo Estado de
Direito, os valores da legislação civil de 1916 passaram a
ser outros, tanto é que toda essa nova carga principiológica
foi acolhida no edito do Código Civil de 2002, movimento
conhecido como "civilização do Direito Constitucional"
ou "constitucionalização do Direito Civil".
É certo, portanto, que a responsabilidade
civill vem
se transformando sobremaneira nas últimas décadas no
Brasil e em vários outros países. A razão principal dessa
mudança sucedeu, inegavelmente, entre nós, a partir da
Constituição Federal de 1988, com o advento do Código
de Defesa do Consumidor e com o Código Civil de 2002,
que enalteceram a pessoa humana, sua dignidade e proteção. De uma posição eminentemente patrirnonialista do
Código Civil de 1916, preocupada fundamentalmente com
a circulação de riquezas e o desenvolvimento econômico,
o ordenamento jurídico, sem se esquecer da noção desenvolvimentista, passou a privilegiar um comportamento
honesto, ético, correto, protetivo da pessoa, baseado no
aspecto humanístico, na chamada justiça protetiva (iustitia proctetiva), que privilegia uma vida digna, centrada
no princípio neminem laedere, na ideia, portanto, de não
lesar a outrem e na prevenção de danos.
Aliás, já Clóvis Beviláqua, escrevendo sobre o Código
Civilde sua lavra, esclareceu que "ao aplicador da lei cumpre
recorrer aos princípios gerais do Direito, com os quais o
jurista penetra em um campo mais dilatado, procura apanhar as correntes diretoras do pensamento jurídico e canalizá-la para onde a necessidade social mostra a insuficiência do direito positivo. É, então, que o Direito melhor se
lhe deve afigurar como a ars boni et aequi. Supor que, em
qualquer desses momentos, o juiz deve procurar a vontade do legislador, é de todo injustificável, pois que ele
vem, iluminado pela doutrina e estimulado pelas necessidades da vida, justamente fazer o que o legislador não
soube ou não pôde querer".2
Por essa razão, depois de 1988 há que se fazer uma
releitura do instituto do art. 1.531 (anterior) e do art.
940 do (atual) Código Civil, este último notadamente
informado pelos princípios hoje em voga no Estado de
Direito brasileiro, entre eles a dignidade humana. E isso

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63
é emblemático porque, não sem razão, o constituinte
originário estabeleceu como fundamento do Estado de
Direito aquilo que a sociedade tinha e tem em mais alto
grau, a saber, "a dignidade da pessoa humana". Destacada
no art. 1°, inciso m, da Constituição Federal, trata-se de
um sobreprincípio, cujo conteúdo abrange os subprincípios da vida, propriedade, liberdade, solidariedade,
segurança/proteção e igualdade, que no texto constitucional recebem o status de direito fundamentaJ.3
Como já tivemos a oportunidade
de escrever4, o
art. 940 do Código Civil versa sobre a cobrança judicial indevida perpetrada com má-fé ou erro inescusável. A cobrança indevida prevê três modalidades: (i)
dívidas inexistentes; (ii) dívidas quitadas totalmente; e
(iH)dívidas quitadas parcialmente. Apesar de o verbete
tratar expressamente de demandas por dívidas quitadas
ou em valor maior, entendemos que também se integra
à hipótese deste artigo a cobrança indevida de dívidas
inexistentes (e não somente as quitadas), devendo o
pretenso credor incauto ser apenado na dobra do que
cobrou indevidamente.
Aresponsabilidade é subjetiva, mas com uma particularidade, pois compete ao credor a demonstração de que
a sua cobrança colocada em dúvida pelo devedor não
é de má-fé ou que seu erro seria escusável. Há, desse
modo, uma presunção juris tantum contra o pretenso
credor, que deverá demonstrar a ausência de má-fé ou
erro justificável para que se desvie da penalidade do art.
940. O devedor deverá fazer prova apenas de eventual
pagamento ou de que a cobrança é excessiva, mas não
é possível lhe imputar o dever de provar má-fé da parte
adversa. Isso porque a exigência de prova por parte do
devedor das motivações ou circunstâncias próprias do
credor, o que aliás é recorrente na nossa prática forense,
inviabiliza a aplicação da penalidade na quase totalidade dos casos. Assim, contestada a cobrança pelo
devedor por desconhecê-la, já estar quitada ou ser a
maior, passa ao suposto credor o ônus de provar que a
sua postulação não estava inquinada de má-fé ou que
seu erro seria justificável.
Do mesmo modo, o fato de uma ação de cobrança
ser julgada improcedente não significa que tenha aplicação esse artigo, assim como meros erros de cálculo
não determinam a sua incidência. A finalidade desse
artigo é evitar a cobrança, seja ela excessiva ou abusiva
(replus petitur), de dívida inexistente, já solvida em parte
ou na sua totalidade. Portanto, se o credor demanda por
dívida inexistente ou já paga, sem observar as importâncias recebidas, ou pedir mais do que for, efetivamente,
devido, deverá pagar em dobro no primeiro caso e, no
segundo, o equivalente do que exigir a mais do devedor,
exceto se houver prescrição.
Ressalte-se que, mesmo logrando o credor demonstrar sua boa-fé e a escusabilidade do seu erro, não se
furtará ao pagamento das verbas sucumbenciais, bem
como no pagamento dos gastos que o devedor incorreu
extrajudicialmente para manejar a demanda (inclusive

e:t
:2

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I::J

o
C

com honorários contratuais de advogado), já que será
vencido na demanda e o único que a ela deu causa, nos
termos do art. 20 do Código de Processo Civil combinado
com o art. 404 do Código Civil.
No tocante às hipóteses de incidência da penalidade
do art. 940 em comento, embora a maior parte da doutrina e a integralidade da jurisprudência mantenham o
entendimento antigoS, constante da Súmula nO159 do
Supremo Tribunal Federal, de que a boa-fé eximiria o
cobrador que agiu sem a devida cautela da penalidade,
passando-se, a partir daí, a exigir que o devedor provasse a má-fé desse suposto credor, não é essa a nossa
posição. A nosso ver, essa situação enseja a aplicação
das penas do art. 940, a cobrança indevida realizada
sem justificação plausível e que decorra da in cúria do
pretenso credor.
Atualmente, em razão do amplo acesso e exposição
da informação, o manejo de processo judicial é extremamente sério e abala fortemente a vida de qualquer
pessoa a ele vinculada, na condição de réu, principalmente aqueles que nada devem e que terão que contratar advogado, perder precioso tempo de trabalho e
lazer, sob pressão e angústia, para reunir documentos
ou concatenar fatos, assim como aguardar considerável
período com evidente ansiedade até que a demanda
termine com o reconhecimento da inexistência total ou
parcial da dívida. Para se notar a gravidade, basta lembrar que o suposto devedor não poderá ter suas certidões negativas cíveis nem crédito nas Instituições financeiras ou comércio em geral, para destacar o menos. Se
o processo for executivo, estará diuturnamente apreensivo, com receio de mais dia ou menos dia ser atingido
por constrições indevidas de valores em contas bancárias ou bens diversos.
Dessarte, há que se imputar a penalidade ao demandante de má-fé ou que agiu sem as cautelas de praxe
e incorreu em erro inescusável, atingindo drástica e
injustamente a esfera jurídica alheia. Não se pode fazer
letra-morta do art. 940 do Código Civil, que determina
claramente exemplar punição contra quem maneja processo judicial pleiteando o que não tem direito a receber.
Ademais, no dispositivo em comento, não se pune
apenas quem propõe uma nova demanda de forma
injusta, mas também aquele que, sabendo ou devendo
saber que o devedor pagou extrajudicialmente o que
devia, prossegue indevidamente com a ação judicial.
E isso pareceria absurdo se os exemplos práticos não
fossem vários: (i) quando a parte recebe o preço devido
extrajudicialmente
diretamente
do devedor e não
informa o seu advogado, com o intuito de não pagar os
honorários convencionais, o que faz com que a ação continue; (H)quando há pluralidade de credores, podendo
cada um deles receber em nome de todos, por convenção ou porque a obrigação era indivisível, mas, um
deles recebendo e nada informando aos demais, estes
continuam com a demanda mesmo depois de serem
informados do pagamento; (iii) quando o inventariante

primitivo recebe valores devidos ao espólio e não leva o
produto ao inventário, fazendo com que o novo inventariante prossiga indevidamente com a ação judicial de
cobrança já quitada, mesmo depois de informado do pagamento ao inventariante anterior, entre outros exemplos.

CONCLUSÃO
Dessa forma, é necessária a releitura constitucional da
NOTAS

1 Responsabilidade,do latim respondere, de spondeo, é resultado da obrigação no DireitoRomano arcaico,direito quiritário, na
época da Realeza,período compreendido entre as origens de Romae 510a.c.,em que o devedor, nos contratos verbais,se vinculavaao credor por meio de uma indagação e resposta: Spondesne mihi dare Centum? Spondeo (Prometes dar-me um cento?
Prometo).(Cf.AZEVEDO,
ÁlvaroVillaça. eoria geral das obrigações. Responsabilidade civil. 10.ed. São Paulo:Atlas,2004,p.276.)
T
2 BEVILÁQUA,
Clóvis.Teoria geral do Direito Civil. Riode Janeiro: Paulo Azevedo, 1955, p. 35-36; 46.
3 Vide nesse sentido FERRAZ
JÚNIOR,
Tércio Sampaio. Estudos de Filosofia do Direito. São Paulo: Atlas,2009, p. 306-307.
4 Nesse sentido: DONNINI, ogério. In: Comentários ao Código Civil brasileiro. WIII.ALVIM,
R
Arruda; ALVIM,
Thereza (Coord.).
Riode Janeiro: Forense, p. 431-434.
5 Vide nesse sentido: "Agravoregimental. Recurso especial. Art. 1.531 do Código Civilde 1916. Prova da má-fé. Exigência.
Súmula nO159-STF. úmula nO7-STJ.1.Aaplicação da sanção prevista no art. 1.531do Código Civilde 1916 (mantida pelo
S
art. 940 do CC/02)- pagamento em dobro por dívida já paga - depende da demonstração de má-fé, dolo ou malícia,
por parte do credor. Precedentes. 2. A reversão do entendimento exposto pelo Tribunal de origem, com a verificação da
eventual má-fé da parte credora, exigiria, necessariamente, o reexame de matéria fático-probatória, o que é vedado em
sede de recurso especial, nos termos da Súmula n° 7-Sn 3. Agravo regimental a que se nega provimento:' (AgRgno REsp
nO601.004-SP,Quarta Turma, ReI."Min."Maria Isabel Gallotti, DJe 14.09.12.)
HERNANI ZANIN JUNIOR sócio e diretor do contencioso do escritório Donnini, Gail e Zanin Advogados.
ROG~RIO DONNINI é sócio etitulardo

escritório Donnini,Gail e Zanin Advogados. Professor do Mestradoe Doutorado da PUC/SPeda Universidade de Nápoles/Itália.

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64

previsão atualmente contida no art. 940 do Código Civil
para se abarcar nas hipóteses de cabimento de aplicação
da penalidade também as hipóteses de cobrança indevida
mediante erros inescusáveis ou de dívidas inexistentes,
sob pena de se negar vigência ao indigitado dispositivo
legal, estimulando assim o manejo de cobranças judiciais
despropositadas, quando a sua aplicação integral poderia
ser eficazmente inibidora dessas nefastas práticas.
1

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Cobrança judicial indevida: o alcance do art. 940 do Código Civil

  • 1. no site, comunicando que havia sido feita uma revisão em dois importantes documentos, a "Declaração de Direitos e Responsabilidades" e a "Política de Uso de Dados". Segundo ela, a revisão foi necessária para dar melhor explicação sobre como o nome do usuário, sua foto do perfil e outros dados pessoais podem ser usados em conexão com anúncios ou conteúdo comercial, para ficar claro que "está dando permissão ao Facebook para esse uso".17 Logo surgiram pressões para que o Facebook desistisse das alterações propostas. Várias entidades de proteção da privacidade, lideradas pela EletronicPrivacy lnformation Genter(EPIC), enviaram carta 18 à Federal Trade Comission (FfC), que vem a ser uma espécie de agência reguladora do Governo dos Estados Unidos, encarregada da proteção de direitos dos consumidores. Na carta, grupos de defesa da privacidade digital argumentam que as alterações possibilitarão que o Facebook utilize as fotos e 'homes de seus usuários para fins comerciais, sem que eles, quando se registraram no site, tivessem dado consentimento para tal. Argumenta-se, também, que as alterações são especialmente perniciosas para os menores de idade, pois a nova redação do documento propõe a seguinte representação fictícia: Sevocêtivermenos de 18(dezoito)anos,ou tivermenos de qualquer idade aplicávelà maioridade,você declara que pelo menos um de seus pais ou responsáveislegaistambém concordou com os termos desta seção (e com o uso do seu nome, imagem do perfil,conteúdo e informações)em seu nome. Ou seja, através dessa enunciação o Facebook considera ter obtido uma autorização parental com o simples ingresso do menor no site, o que se afigura representação meramente fictícia, despida de valor jurídico, pois não exige o consentimento expresso dos pais ou responsáveis legais. Para utilizar dados de menores, o Facebook teria que ter se utilizado de uma ferramenta que mantivesse os pedidos de registro pendentes até que os pais manifestassem sua concordância com a política de uso. O envolvimento de crianças e adolescentes na questão é realmente elemento fundamental quando se trata de examinar a legalidade da publicidade na forma de histórias patrocinadas no Facebook. Existem muitas páginas e comunidades fazendo publicidade ou apologia do consumo de cigarros e bebidas, outras com orientação política, ideológica e sexual. Permitir que menores de idade possam não só ter acesso a esse tipo de material informacional como também vincular sua imagem a determinados conteúdos inadequados viola as leis e princípios de proteção a esse grupo de pessoas mais vulnerável. Nos Estados Unidos, a FIC já anunciou que vai abrir investigação contra o Facebook.19 No Canadá, também foi proposta ação coletiva contra o sUe, incitada por uma mulher que se sentiu lesada ao ver sua imagem e nome sendo utilizados para fins comerciais sem seu consentimento específico.20 Com isso, não é difícil imaginar que a questão da legalidade das histórias patrocinadas do Facebook, em breve, assome também nos tribunais brasileiros. 11 NOTAS 1 Cf. Faceboolc mostra o raio-x de 1 bilhão de usuários. Folha de S. Paulo. de 4 de outubro de 2012. 2 Cf. Faceboolc divulga número de usudrios diários dos EUA e Reino Unido. Disponível em: <http://tecnologia.terra.com.brlfacebook-diwlga-numero-de-usuarios-diarios-dos-eua-e-reino-unido.625c7a5568870410VgnCLD2000000dc6ebOaRCRD.html>. 3 Cf. Faceboolc passa Orlcut e vira maior rede sociol do Brasil. Disponível em: <http://gl.globo.comltecnologialnoticial2012101Ifacebook-passa-orkut-e-vira-maior-rede-social-do-brasil-diz-pesquisa.html>. 4 CF.Faceboolc alcança marca de 76 milhões de usudrios no Brasil. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/noticialvida-digitaVfacebook-alcanca-marca-de-76-milhoes-de-usuarios-no-brasil> . 5 Cf. Faceboolc libera publicidode nas feeds e chama de "destaques~ Disponível em: <http://tecnologia.terra.com.brlintemetlfacebook-Iibera-publicidade-nos-feeds-e-chama-de-destaques,2668fe32cdbda31 OVgnCLD200000bbccebOaRCRD.html>. Acesso em: 19.04.12. O feed de notícias é a coluna central da página inicial do usuário do Facebook. " uma lista em constante atualização de publicações das outras pessoas e páginas que um determinado usuário segue no Faceboolc. As publicações no feed de notícias incluem atualizações de status. fotos, vfdeos, links. atividade de aplicativos e opções "curtir~ 6 7 8 9 10 11 12 13 14 Informações contidas na "Central de Ajuda" do Faceboolc. Disponível em: <https:l/www.facebook.comlhelp/294671953976994>. Cf. Como funcionam os anúncios e as histórias patrocinadas. Disponível em: <https:l/www.facebook.comlaboutlprivacy/advertising>. Para tanto. basta utilizar a configuração de Editar anúncios sociais. Isso está expressamente consignado na política de uso de dados pessoais do Faceboolc. na parte que informa sobre "Como funcionam os anúncios e as histórias patrocinadas":"Sua configuração Mostrar minhas ações sociais em Anúncios do Faceboolc controla somente os anúncios com contexto social. Ela não controla Histórias patrocinadas. anúncios nem informações sobre os serviços e recursos do Faceboolc ou outros conteúdos do Fac~ Cf. Ferramentas para pais e educadores. Disponível em: <https:l/www.facebook.comlhelp/parents>. Cf. Fíve million Faceboolc users are 10 or younger. ConsumerReparts.or9. 10 de maio de 2011. US. District Court. Northem District of califomia. Fraley. et ai. v. Faceboolc.lnc. et aI.. case nOCV-ll'()1726 RS. 15 Disponível em: <http://www.pcworld.com/article/2047520/judge-approves-2o-million-facebook-fund-to-settle-advertising-suithtml>. 16 Disponível em: <https:l/www.facebook.comllegaVterms>. 17 Inteiro teor do texto divulgado a respeito da revisão das políticas de uso de dados pessoais e declaração de direitos e responsabilidade em: <https:l/www.facebook.comlnoteslfacebook-síte-governance/atualiza%C3%A7%C3%85es-propostas-para-os-documentos-de-goveman%C3% A7a110153197317185301 >. 18 Disponível em: <http://epic.orgtprivacy/ftcIPrivacy-Grps-FTC-tr-9-13.pdf>. disponível 19 Cf. jomal The New York Times. de 11 de setembro de 2013. Disponível em: <http://www.nytimes.coml2013/09/12/technology/personaltechlftc-looking-into-facebook-privacy-policy.html?_r=l&>. 20 Disponivel em: <http://www.cbc.ca/newslcanadalbritish-columbialb-c-woman-sues-facebook-for-using-her-photo-l.1192457>. DEMÓCRITO REINALDO FILHO é Juiz de Direito da 32" Vara Cível do Recife (PEj. 62 REVISTA JURíDICA CONSULEX - ANO XVII - N' 404 - 15 DE NOVEMBRO/20B HERNANI ZANIN JUNIOR E ROGÉRIO DONNINI et A EXTENSÃO DO ART. 940 DO CÓDIGO CIVIL ERROS INESCUSÁVEIS E DíVIDAS INEXISTENTES 2: c: •••• :::J O C Judiciário nacional tem sido unânime em aplicar a penalidade do art. 940 do Código Civil apenas quando o devedor conseguir provar má-fé do credor na sua cobrança judicial por dívida já paga, total ou parcialmente. Entretanto, julgado recente do Superior Tribunal de Justiça nos fez refletir acerca do alcance do art. 940 do Código Civil. Assim dispõe excerto da ementa: "Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Sanção prevista no art. 940 do Código Civil em caso de erro inescusável. Inaplicabilidade. Súmulas STJ nOS e 83 [...1." (AgRg no 7 AREsp nO 302.306-Sp, Terceira Turma, ReI. Min. Sidnei Beneti, DJe 04.06.13). Acaso esse dispositivo legal não tutelaria também os casos de cobranças judiciais por dívidas inexistentes ou naquelas em que ocorreu erro inescusável do credor ao postular sua cobrança indevida? Esses dois pontos, da maior importância, merecem nota. O art. 1.531 do Código Civil de 1916, cujo teor foi mantido no art. 940 do atual Código Civil, era claro em prever penalidade aos que demandassem por dívida já paga ou em valor maior do que era devido, silenciando sobre qual seria o elemento subjetivo desse tipo civil. A vétusta jurisprudência do STJ pacificou que, no caso do art. 1.531 do Código Civil de 1916, era indispensável a prova pelo devedor de que o credor estaria com má-fé na sua demanda por dívida já paga ou em excesso, apesar de a Lei não exigir a prova pela vítima da má-fé do seu algoz como requisito justificador para aplicação da penalidade. Confira-se o excerto do julgamento datado de 1990, proferido sob o escólio doutrinário do saudoso Professor Washington de Barros Monteiro: O PROCESSUALIVIL. ITIGANTE EMA-F~.BUSCAE APREC L D ENSÃO. I - Sem a prova inconcussa e irrefragável do dolo. não há como se impor ao litigante a condenação de que trata o disposto nos arts. 1.531 e 1.532 do Código Civil,quando promove lide dita temerária. 11- Razoabilidade da propositura da busca e apreensão de veículo vendido sob a modalidade de alienação fiduciária para garantir-se contra eventual inadimplência da parte em relação a qual foi celebrada a transação. 111- Negativa de vigência dos arts. 1.531 e 1.532 do Código Civilnão caracterizada. Dissídio jurisprudencial não comprovado. Recurso não conhecido. (REsp nO1.964-RN,Terceira Turma, ReI. Min. WALDEMAR ZVEITER, DJ02.04.90.) Ainda que a jurisprudência pudesse e devesse integrar o conteúdo do prefalado art. 1.531, de acordo com os princípios e ideologia da sua época, é evidente que, com o nascimento, em 1988, do nosso novo Estado de Direito, os valores da legislação civil de 1916 passaram a ser outros, tanto é que toda essa nova carga principiológica foi acolhida no edito do Código Civil de 2002, movimento conhecido como "civilização do Direito Constitucional" ou "constitucionalização do Direito Civil". É certo, portanto, que a responsabilidade civill vem se transformando sobremaneira nas últimas décadas no Brasil e em vários outros países. A razão principal dessa mudança sucedeu, inegavelmente, entre nós, a partir da Constituição Federal de 1988, com o advento do Código de Defesa do Consumidor e com o Código Civil de 2002, que enalteceram a pessoa humana, sua dignidade e proteção. De uma posição eminentemente patrirnonialista do Código Civil de 1916, preocupada fundamentalmente com a circulação de riquezas e o desenvolvimento econômico, o ordenamento jurídico, sem se esquecer da noção desenvolvimentista, passou a privilegiar um comportamento honesto, ético, correto, protetivo da pessoa, baseado no aspecto humanístico, na chamada justiça protetiva (iustitia proctetiva), que privilegia uma vida digna, centrada no princípio neminem laedere, na ideia, portanto, de não lesar a outrem e na prevenção de danos. Aliás, já Clóvis Beviláqua, escrevendo sobre o Código Civilde sua lavra, esclareceu que "ao aplicador da lei cumpre recorrer aos princípios gerais do Direito, com os quais o jurista penetra em um campo mais dilatado, procura apanhar as correntes diretoras do pensamento jurídico e canalizá-la para onde a necessidade social mostra a insuficiência do direito positivo. É, então, que o Direito melhor se lhe deve afigurar como a ars boni et aequi. Supor que, em qualquer desses momentos, o juiz deve procurar a vontade do legislador, é de todo injustificável, pois que ele vem, iluminado pela doutrina e estimulado pelas necessidades da vida, justamente fazer o que o legislador não soube ou não pôde querer".2 Por essa razão, depois de 1988 há que se fazer uma releitura do instituto do art. 1.531 (anterior) e do art. 940 do (atual) Código Civil, este último notadamente informado pelos princípios hoje em voga no Estado de Direito brasileiro, entre eles a dignidade humana. E isso REVISTA JURíDICA CONSULEX - WWW.CONSULEX.COM.BR 63
  • 2. é emblemático porque, não sem razão, o constituinte originário estabeleceu como fundamento do Estado de Direito aquilo que a sociedade tinha e tem em mais alto grau, a saber, "a dignidade da pessoa humana". Destacada no art. 1°, inciso m, da Constituição Federal, trata-se de um sobreprincípio, cujo conteúdo abrange os subprincípios da vida, propriedade, liberdade, solidariedade, segurança/proteção e igualdade, que no texto constitucional recebem o status de direito fundamentaJ.3 Como já tivemos a oportunidade de escrever4, o art. 940 do Código Civil versa sobre a cobrança judicial indevida perpetrada com má-fé ou erro inescusável. A cobrança indevida prevê três modalidades: (i) dívidas inexistentes; (ii) dívidas quitadas totalmente; e (iH)dívidas quitadas parcialmente. Apesar de o verbete tratar expressamente de demandas por dívidas quitadas ou em valor maior, entendemos que também se integra à hipótese deste artigo a cobrança indevida de dívidas inexistentes (e não somente as quitadas), devendo o pretenso credor incauto ser apenado na dobra do que cobrou indevidamente. Aresponsabilidade é subjetiva, mas com uma particularidade, pois compete ao credor a demonstração de que a sua cobrança colocada em dúvida pelo devedor não é de má-fé ou que seu erro seria escusável. Há, desse modo, uma presunção juris tantum contra o pretenso credor, que deverá demonstrar a ausência de má-fé ou erro justificável para que se desvie da penalidade do art. 940. O devedor deverá fazer prova apenas de eventual pagamento ou de que a cobrança é excessiva, mas não é possível lhe imputar o dever de provar má-fé da parte adversa. Isso porque a exigência de prova por parte do devedor das motivações ou circunstâncias próprias do credor, o que aliás é recorrente na nossa prática forense, inviabiliza a aplicação da penalidade na quase totalidade dos casos. Assim, contestada a cobrança pelo devedor por desconhecê-la, já estar quitada ou ser a maior, passa ao suposto credor o ônus de provar que a sua postulação não estava inquinada de má-fé ou que seu erro seria justificável. Do mesmo modo, o fato de uma ação de cobrança ser julgada improcedente não significa que tenha aplicação esse artigo, assim como meros erros de cálculo não determinam a sua incidência. A finalidade desse artigo é evitar a cobrança, seja ela excessiva ou abusiva (replus petitur), de dívida inexistente, já solvida em parte ou na sua totalidade. Portanto, se o credor demanda por dívida inexistente ou já paga, sem observar as importâncias recebidas, ou pedir mais do que for, efetivamente, devido, deverá pagar em dobro no primeiro caso e, no segundo, o equivalente do que exigir a mais do devedor, exceto se houver prescrição. Ressalte-se que, mesmo logrando o credor demonstrar sua boa-fé e a escusabilidade do seu erro, não se furtará ao pagamento das verbas sucumbenciais, bem como no pagamento dos gastos que o devedor incorreu extrajudicialmente para manejar a demanda (inclusive e:t :2 c:: I::J o C com honorários contratuais de advogado), já que será vencido na demanda e o único que a ela deu causa, nos termos do art. 20 do Código de Processo Civil combinado com o art. 404 do Código Civil. No tocante às hipóteses de incidência da penalidade do art. 940 em comento, embora a maior parte da doutrina e a integralidade da jurisprudência mantenham o entendimento antigoS, constante da Súmula nO159 do Supremo Tribunal Federal, de que a boa-fé eximiria o cobrador que agiu sem a devida cautela da penalidade, passando-se, a partir daí, a exigir que o devedor provasse a má-fé desse suposto credor, não é essa a nossa posição. A nosso ver, essa situação enseja a aplicação das penas do art. 940, a cobrança indevida realizada sem justificação plausível e que decorra da in cúria do pretenso credor. Atualmente, em razão do amplo acesso e exposição da informação, o manejo de processo judicial é extremamente sério e abala fortemente a vida de qualquer pessoa a ele vinculada, na condição de réu, principalmente aqueles que nada devem e que terão que contratar advogado, perder precioso tempo de trabalho e lazer, sob pressão e angústia, para reunir documentos ou concatenar fatos, assim como aguardar considerável período com evidente ansiedade até que a demanda termine com o reconhecimento da inexistência total ou parcial da dívida. Para se notar a gravidade, basta lembrar que o suposto devedor não poderá ter suas certidões negativas cíveis nem crédito nas Instituições financeiras ou comércio em geral, para destacar o menos. Se o processo for executivo, estará diuturnamente apreensivo, com receio de mais dia ou menos dia ser atingido por constrições indevidas de valores em contas bancárias ou bens diversos. Dessarte, há que se imputar a penalidade ao demandante de má-fé ou que agiu sem as cautelas de praxe e incorreu em erro inescusável, atingindo drástica e injustamente a esfera jurídica alheia. Não se pode fazer letra-morta do art. 940 do Código Civil, que determina claramente exemplar punição contra quem maneja processo judicial pleiteando o que não tem direito a receber. Ademais, no dispositivo em comento, não se pune apenas quem propõe uma nova demanda de forma injusta, mas também aquele que, sabendo ou devendo saber que o devedor pagou extrajudicialmente o que devia, prossegue indevidamente com a ação judicial. E isso pareceria absurdo se os exemplos práticos não fossem vários: (i) quando a parte recebe o preço devido extrajudicialmente diretamente do devedor e não informa o seu advogado, com o intuito de não pagar os honorários convencionais, o que faz com que a ação continue; (H)quando há pluralidade de credores, podendo cada um deles receber em nome de todos, por convenção ou porque a obrigação era indivisível, mas, um deles recebendo e nada informando aos demais, estes continuam com a demanda mesmo depois de serem informados do pagamento; (iii) quando o inventariante primitivo recebe valores devidos ao espólio e não leva o produto ao inventário, fazendo com que o novo inventariante prossiga indevidamente com a ação judicial de cobrança já quitada, mesmo depois de informado do pagamento ao inventariante anterior, entre outros exemplos. CONCLUSÃO Dessa forma, é necessária a releitura constitucional da NOTAS 1 Responsabilidade,do latim respondere, de spondeo, é resultado da obrigação no DireitoRomano arcaico,direito quiritário, na época da Realeza,período compreendido entre as origens de Romae 510a.c.,em que o devedor, nos contratos verbais,se vinculavaao credor por meio de uma indagação e resposta: Spondesne mihi dare Centum? Spondeo (Prometes dar-me um cento? Prometo).(Cf.AZEVEDO, ÁlvaroVillaça. eoria geral das obrigações. Responsabilidade civil. 10.ed. São Paulo:Atlas,2004,p.276.) T 2 BEVILÁQUA, Clóvis.Teoria geral do Direito Civil. Riode Janeiro: Paulo Azevedo, 1955, p. 35-36; 46. 3 Vide nesse sentido FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Estudos de Filosofia do Direito. São Paulo: Atlas,2009, p. 306-307. 4 Nesse sentido: DONNINI, ogério. In: Comentários ao Código Civil brasileiro. WIII.ALVIM, R Arruda; ALVIM, Thereza (Coord.). Riode Janeiro: Forense, p. 431-434. 5 Vide nesse sentido: "Agravoregimental. Recurso especial. Art. 1.531 do Código Civilde 1916. Prova da má-fé. Exigência. Súmula nO159-STF. úmula nO7-STJ.1.Aaplicação da sanção prevista no art. 1.531do Código Civilde 1916 (mantida pelo S art. 940 do CC/02)- pagamento em dobro por dívida já paga - depende da demonstração de má-fé, dolo ou malícia, por parte do credor. Precedentes. 2. A reversão do entendimento exposto pelo Tribunal de origem, com a verificação da eventual má-fé da parte credora, exigiria, necessariamente, o reexame de matéria fático-probatória, o que é vedado em sede de recurso especial, nos termos da Súmula n° 7-Sn 3. Agravo regimental a que se nega provimento:' (AgRgno REsp nO601.004-SP,Quarta Turma, ReI."Min."Maria Isabel Gallotti, DJe 14.09.12.) HERNANI ZANIN JUNIOR sócio e diretor do contencioso do escritório Donnini, Gail e Zanin Advogados. ROG~RIO DONNINI é sócio etitulardo escritório Donnini,Gail e Zanin Advogados. Professor do Mestradoe Doutorado da PUC/SPeda Universidade de Nápoles/Itália. RENOVE SUA ASSINATURA REVISTA JURíDICA CDNSULEX - ANO XVII - N' 404 - 15 DE NOVEMBRO/20B ANUAL DA REVISTA JURíDICA CO SULEX, RECEBA PRESENTES MUITO ÚTEIS AO SEU DIA A DIA E GARANTA SEU DIÁRIO JURíDICO 2014. LIGUE 0800 708 1008 OU ACESSE WWW.CON5ULEX.COM.BR. 64 previsão atualmente contida no art. 940 do Código Civil para se abarcar nas hipóteses de cabimento de aplicação da penalidade também as hipóteses de cobrança indevida mediante erros inescusáveis ou de dívidas inexistentes, sob pena de se negar vigência ao indigitado dispositivo legal, estimulando assim o manejo de cobranças judiciais despropositadas, quando a sua aplicação integral poderia ser eficazmente inibidora dessas nefastas práticas. 1