A entrevista discute o desenvolvimento territorial endógeno e o papel da globalização. A especialista Tânia Zapata defende que o desenvolvimento só ocorre quando liderado pelas pessoas do território e que a globalização fragiliza os estados-nação, fazendo com que a competitividade ocorra a nível regional. Ela também comenta sobre os desafios da descentralização no Brasil devido às desigualdades regionais.
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Tânia Zapata, diretora técnica do IADH
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Foto: IADH
30/09/2009 - Especialista em Desenvolvimento Econômico Regional pelo
Instituto de Pesquisas e Formação para o Desenvolvimento e diretora
técnica do Instituto de Assessoria para o Desenvolvimento Humano
(IADH), a socióloga Tânia Zapata é umas das principais especialistas
em desenvolvimento local do Brasil. Em entrevista ao Portal da RTS, ela
Tecnologia Social defende o desenvolvimento territorial endógeno, comenta o papel da
A RTS globalização para este desafio e alerta: “As novas tecnologias do
conhecimento trazem uma série de aprendizagens para a sociedade e
Quem Somos para o novo espaço público”.
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RTS - Por que incluir o term o endógeno ao falar de
Links desenvolvim ento territorial?
Notícias
Tânia - Porque o desenvolvimento do território só acontece quando ele
Eventos se dá a partir das pessoas daquele território. A experiência
internacional já comprova que projetos liderados por atores externos,
Artigos
sejam órgãos públicos, ONGs e organismos internacionais, tendem ao
Entrevistas fracasso e à insustentabilidade se não formarem equipes locais
capazes de assumir essa liderança. A partir destes ativos endógenos, baseados no potencial do local,
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é que você constrói a estratégia e as instâncias de governança e pactuação.
Imprensa
RTS - Qual a distinção entre desenvolvim ento territorial e desenvolvim ento local?
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Tânia - Não faço essa distinção, até porque os autores que trabalham essa temática compreendem
Publicações
que o local é um território, um espaço organizado que tem uma identidade e um projeto coletivo
próprios. Esse território pode ser um bairro, um município, uma bacia hidrográfica. Geralmente, a melhor
Informativo escala para trabalhar o desenvolvimento territorial é uma microrregião. Isso porque você tem mais
Eletrônico densidade econômica para trabalhar cadeias e arranjos produtivos, redes e estratégias de
comercialização para os pequenos negócios. A microrregião também pode permitir outros arranjos
institucionais, como os consórcios públicos para a saúde e o meio ambiente, por exemplo.
E-
mail* RTS - Com o a globalização interfere nessa dinâm ica?
Nome Tânia - Como a globalização, de certa forma, fragiliza o Estado Nação, alguns autores dizem que o
desenvolvimento não compete mais aos países, mas às regiões. Quando você fala do Brasil, por
enviar exemplo, há diversos brasis distribuídos em regiões com capacidades próprias de inovar e competir.
Antes se dizia que essa capacidade de competir vinha da dotação de recursos naturais e infra-
estruturas, de forma centralizada. Hoje, a idéia é de que isso é importante, mas que não adianta sem a
formação de capital humano e social no território.
É como num computador. Você tem hardw are, softw are, e orgw are. O hardw are são as infra-
estruturas econômicas e sociais. O softw are é o planejamento e a estratégia de desenvolvimento,
enquanto o orgw are é o capital social. Sem a articulação entre estes três fatores, aliada a uma
capacidade de pactuação para construir consensos e gerir conflitos, a tendência é que o território
tenha mais dificuldades de se inserir nos processos de competitividade da globalização.
RTS - Com o construir então este capital social?
Tânia - A partir do território. Por isso é que o local ressurge na globalização como elemento
dinamizador da cultura da inovação, principal fator de competitividade na sociedade do conhecimento.
É no território que estão as universidades, as pessoas, a competência local. O território, nesse
sentido, ressurge impulsionado pelas contradições da própria globalização e da sociedade do
conhecimento.
Geralmente quando falamos em inovação, nos referimos a um produto. Prefiro falar da inovação em
processos de produção, em gestão social e institucional. A nova governança, por exemplo, é uma
inovação de gestão. Num arranjo produtivo, o avanço não está só na melhoria do processo de
produção, mas também em uma forma de governança que fomente redes de cooperação e
aprendizagem. Nesse sentido, estou convencida de que o grande desafio do brasileiro ainda é a
cultura política.
RTS - E com o a arquitetura institucional do Estado brasileiro dificulta essa transform ação?
2. Tânia - A gente convive no mesmo campo de avanços e retrocessos. Hoje ainda há a cultura dos
coronéis, do clientelismo e do assistencialismo, mas também há a cultura da nova governança e a
emergência da sociedade civil trazendo novas iniciativas, idéias e projetos. E isso convive no mesmo
campo de historicidade. Ao mesmo tempo, as novas tecnologias do conhecimento trazem uma série de
aprendizagens para a sociedade e para o novo espaço público, onde se discutem os interesses
coletivos sem haver, necessariamente, a interferência do Estado. Então, a cultura política com mais
transparência, controle social e accountability é o grande desafio. Não se trata de ter mais ou menos
Estado, mas de se ter o Estado necessário para o momento atual.
Na Europa, existe a necessidade de um determinado tipo de Estado. No Brasil, há outra. O fato é que a
sociedade é de mercado, e isso exige a regulação do Estado. O próprio mercado está reconhecendo
isso com a crise. Nesse sentido, esta nova presença do Estado precisa se dar de outra forma. Não
como um Estado patrimonialista, que tutela a sociedade e troca favores por voto. Esse Estado a gente
não quer. A gente quer o Estado que traga políticas públicas mais articuladas com as demandas dos
agentes produtivos, da sociedade. Queremos o Estado eficiente e efetivo naquilo que é da sua
competência, como nas questões da universalidade da saúde, da educação, das grandes questões
ambientais, da garantia dos direitos humanos e do pluralismo democrático, cultural e religioso.
RTS - Com o pensar num a descentralização dessa envergadura diante das m arcantes
desigualdades brasileiras?
Tânia - É um grande desafio. Ainda não temos todas as respostas, mas acredito que nos avanços e
experimentações a gente vai encontrando algumas saídas. E também com as lições aprendidas com
outros países. É difícil encontrar um país com a complexidade do Brasil, com uma extensão continental
tamanha, com a diversidade de população que nós temos.
Para dar um exemplo: não existe mais uma região Nordeste. Existem vários Nordestes: existe sul do
Nordeste e nordeste do Sul. Eu não sou favorável a se pensar políticas de desenvolvimento para uma
determinada grande região. Há que se pensar, no mínimo, em recortes de meso ou microrregiões. O
que tem a ver o Maranhão com Pernambuco? O nível de capital social e de desenvolvimento
institucional são diferentes. Os ativos são diferentes.
RTS - Ainda assim , cada entidade de governo trabalha com políticas territoriais distintas.
Com o avançar?
Tânia - Essa abordagem da nova governança marcou um avanço. Antes, nos períodos autoritários do
Brasil, as coisas eram feitas a partir dos gabinetes e chegavam goela abaixo para a população. Mas
os países que têm uma cidadania mais evoluída e maior qualidade de vida são justamente os países
onde a participação cidadã sempre foi muito presente. Não existe participação cidadã sem
descentralização. Então, para um país como o Brasil, que é maior do que a Europa e que centraliza
70% dos seus recursos no governo federal, é muito difícil que se desenvolva com equidade,
organizado da maneira que está.
Não é verdade, por exemplo, que a centralização de recursos inibe a corrupção. O que faz não existir
corrupção é a evolução da cidadania, do capital social e do controle social. É o fato de existirem
instâncias de pactuação onde haja informação, comunicação social e transparência. Eu acredito no
princípio da subsidiariedade, ou seja, aquilo pode ser feito junto do cidadão, que seja feito com o
controle do próprio cidadão.
Por Vinícius Carvalho, jornalista do Portal da RTS
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