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A CIDADE DE CAMPOS DO JORDÃO.
3.1 Processo de Urbanização
influenciado pelos ciclos da
tuberculose e do Turismo.
Como o objetivo deste trabalho é analisar o processo
de formação do espaço urbano, torna-se importante
compreender a influência da atividade da cura em
contraposição com a atividade turística. Um lugar em que, o
espaço urbano era composto de sanatórios e pensões
voltadas para tísicos, e ao mesmo tempo, por hotéis e
pousadas, formando uma imagem oposta, de uma cidade
saudável voltada para o descanso e o repouso de turistas.
Esta situação acabou por criar duas cidades que por muitos
anos conviveu lado a lado.
Assim, pretende-se neste capítulo, destacar as fases
marcantes da implantação da atividade turística no
município, partindo da análise do processo de transição da
imagem de uma cidade “enferma” para uma estância
turística. E, deste modo, procura-se entender quais foram os
papéis desempenhados pela cidade durante os dois ciclos
(tuberculose e turismo), dentro de sua área de influência, ou
seja, a região da serra da Mantiqueira e o Estado de São
Paulo.
Em seguida, focalizando os planos diretores da
cidade (1960, 1978 e 2003), procura-se analisar frente a
suas proposições o que foi implantado e quais os efeitos
provocados no ambiente urbano que influenciam nas
atividades turísticas.
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
85
1800 a 1930 – A cura da tuberculose como fator de
formação do espaço urbano.
Segundo ANTUNES (2000), a consolidação dos
grandes centros urbanos em todas as regiões do país,
reforçou a preocupação com a proliferação da tuberculose,
devido às precárias condições das habitações decorrentes
do movimento migratório. Numa época em que eram poucos
os programas de assistência e controle da doença, algumas
medidas passaram a serem tomadas pelo poder público.
Diversas leis e resoluções normativas foram promulgadas
entre 1899 a 1904, determinando várias obrigações relativas
ao controle da tuberculose, como a desinfecção domiciliar; a
retirada dos enfermos dos cortiços; o isolamento dos
doentes nos hospitais; e proibições quanto ao exercício
profissional, se não apresentar uma abreugrafia, como prova
de saúde.
Nas grandes cidades, as populações de precária
condição socioeconômica eram as mais vulneráveis ao
contágio da doença. Esta população, em sua maioria
composta de migrantes, vivia em pensões e cortiços em
espaços exíguos, sem nenhum cuidado com a higiene. A
aglomeração de pessoas vivendo nestas condições era
muito favorável à transmissão e disseminação da
tuberculose, que é transmitida via oral (ANTUNES, 2000)1
.
Assim, o medo de contágio pela população provocou
alguns procedimentos regulamentados por lei, como a
obrigação de apresentar uma abreugrafia. Conforme
ANTUNES (2000, p. 374), o cidadão, ao solicitar a emissão
da carteira de trabalho, ou ao se candidatar a uma vaga de
1
Esta doença consiste na infecção produzida por uma bactéria
(mycobacterium tuberculosis) que se inicia nos pulmões podendo atingir
outras áreas do corpo. Assim alguns preceitos eram recomendados pelos
médicos sanitaristas para evitar o contagio, como o uso de lenço ao
bocejar, espirrar ou tossir; e manter constante distância ao rir e falar
outros (ANTUNES, 2000).
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
86
emprego, ou ao se matricular na escola, devia ser
submetido a uma abreugrafia, método este que consistia em
fotografar a imagem observada pela radioscopia, do pulmão.
Da posse do registro fotográfico dos pulmões, o cidadão
comprava um selo médico em bancas de jornal, juntava o
certificado de vacinação contra a varíola e levava toda essa
documentação para a apreciação do médico que emitiria
um atestado de saúde (ANTUNES, 2000, p. 374)
Quando a doença era comprovada, o enfermo perdia
o direito de ocupar uma vaga de emprego e de ir a eventos
públicos e coletivos como teatro, cinemas e estádios, além
de não conseguir moradia. Portanto, este documento
(atestado de saúde) era um requisito importante, para obter
o direito de conviver em sociedade e de fazer parte das
atividades coletivas da cidade.
Deste modo, pode-se dizer que, ao mesmo tempo
em que, a abreugrafia detectava quem era tuberculoso com
a finalidade de dar toda a assistência médica necessária
para sua cura, por outro lado, causava um grande efeito de
exclusão do enfermo da cidade.
Neste contexto, ao descobrir a climatoterapia,
Campos do Jordão começa a atuar como um lugar de
refúgio dos excluídos da vida citadina, que buscavam cura.
As pessoas que, por causa da doença viviam à margem da
sociedade, passam a ver Campos do Jordão, como um lugar
em que o enfermo é “bem vindo”. Assim, a cidade foi se
adaptando a essa atividade, até que os tuberculosos
puderam contar com uma cidade estruturada para o
atendimento dos doentes com casas de saúde, sanatórios e
pensões.
Assim, estabeleceu-se uma dinâmica de prestação
de serviços, em função do tratamento da tuberculose, entre
as grandes cidades, Rio de Janeiro e São Paulo, e a cidade
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
87
serrana de Campos do Jordão. Nas capitais, o paciente
submetia-se aos exames fazendo uma abreugrafia nas
Santas Casas, onde não havia ainda um atendimento
específico para os infectados. Depois, eram encaminhados
para os dispensários, lugares onde se faziam o diagnóstico
e encaminhamento para consultórios médicos e serviço de
enfermagem2
; nestes locais fazia-se também o ensino de
noções básicas de higiene e assistência médica e social aos
pacientes inscritos. Nesta etapa, se a doença não
regredisse, partia-se para o tratamento intensivo, através do
isolamento total do tuberculoso nos sanatórios. Nesses
sanatórios o isolamento servia também como forma de
evitar a disseminação da enfermidade. (ANTUNES, 2000)
Nota-se deste modo que, os sanatórios eram o
último recurso utilizado pelo paciente em busca da cura e,
como a maioria desses pacientes já se encontrava excluída
das atividades coletivas das cidades, não era difícil sair da
capital em direção a cidade serrana. E, devido a todas as
etapas, pelas quais, o doente passava nas cidades mais
desenvolvidas, os sanatórios de Campos do Jordão eram a
“última parada”, ou seja, a última chance para se alcançar à
cura.
Dentro deste contexto, Campos do Jordão funciona
com um lugar acolhedor de enfermos de todo o Brasil3
.
Pessoas de várias cidades do país, com tuberculose
migravam para a serra, em busca de abrigo e de cura.
Segundo ANTUNES (2000), a região da serra da
2
Também, nos dispensários, dava-se assistência social aos mais pobres,
como a distribuição gratuita de medicamentos, roupas e alimentos,
através do apoio das instituições filantrópicas (ANTUNES, 2000).
3
Nas décadas de 1930 e 1940, mais de 10% dos óbitos no Estado de
São Paulo eram devidos à tuberculose e não havia leitos para esses
doentes. Mas o governador do estado, Dr. Adhemar de Barros (1947-
1951), deixou o Estado com cerca de 800 leitos para este fim e, no
segundo governo, acrescentou mais 9 mil. Fonte:
http://www.adhemar.debarros.nom.br/inicio.htm.
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
88
Mantiqueira era chamada pelos doentes de “montanha
mágica” (como fala Thomas Mann de 1984, no livro com
esse título), em que todos os tísicos almejavam ir para esse
lugar.
Assim alguns médicos sanitaristas começam a se
interessar pela região, realizando pesquisas sobre o clima e
adquirindo terras para a construção de empreendimentos
voltados para atender os tuberculosos. Um exemplo a ser
lembrado é o projeto do Dr. Emílio Ribas referente à
construção de uma vila sanatorial que se tornou a Vila
Capivari em Campos do Jordão. O médico projeta essa vila
com toda a infra-estrutura de uma cidade, com a instalação
de transporte ferroviário (E.E.F. Campos do Jordão)
totalmente voltado para receber e tratar os doentes.
Mas, mesmo antes das idéias desse médico
sanitarista, a cidade inteira já havia praticamente se
convertida em um imenso sanatório. Havia, além dos asilos
e hospitais ali instalados, diversas pensões que recebiam os
doentes mais abastados do Rio de Janeiro e de São Paulo,
e até residências que eram alugadas para os tísicos
(ANTUNES, 2000).
Contudo, por ser uma “cidade” para muitos pacientes
“a última parada” do trem, como era conhecida. Segundo
GOFFMAN (apud ANTUNES, 2000, p.371), esses
sanatórios serviam muitas vezes de “antecâmera da morte,
na qual a cura, embora possível, parecia distanciar-se com
insistência”.
Os primeiros povoados
Antes da cidade se voltar para o atendimento dos
tuberculosos, a região era ocupada por grandes fazendas de
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
89
criação de gado4
, e o clima já se mostrava favorável
também a esta atividade econômica. A primeira fazenda foi
a do Sr. Inácio Caetano de Vieira Carvalho5
, a Fazenda
Bom Sucesso, conhecida pela qualidade do gado visto que
o clima contribuía na cura de doenças como carrapato e
vermes (PAULO FILHO, 1986).
Inácio Caetano de Vieira Carvalho ao falecer, teve
sua propriedade vendida por seus filhos em 1825, para o
Brigadeiro Manoel Rodrigues Jordão que jamais a visitou.
Os filhos do Brigadeiro também não deram muita
importância às propriedades herdadas, e com o falecimento
dos pais, dividiram e venderam entre si a fazenda (PAULO
FILHO, 1986, p.53-57). Destacam-se entre os compradores
das terras antes pertencentes ao Brigadeiro Jordão o Sr.
Matheus da Costa Pinto, Dr. Domingos José Nogueira
Jaguaribe Filho e Dr. Emílio Ribas que mais tarde vieram a
se empenhar na luta contra a tuberculose. Estes
proprietários acabaram sendo responsáveis pela formação
dos três principais núcleos urbanos que caracterizou a
cidade de Campos do Jordão: Vila Albernéssia, Vila
Jaguaribe e Vila Capivari.
Assim o primeiro povoado começou a se formar por
volta de 1874 já com a tendência de ser um lugar de
repouso para se tratar da saúde, principalmente de
“doenças do peito”. Mesmo sendo a região ocupada
somente por fazendas, outras atividades nelas empregadas,
também se voltavam para os benefícios do clima. Conforme
PAULO FILHO (1986) há o relato do fazendeiro Francisco
4
A região onde se encontra a cidade foi primeiramente ocupada por
Manoel Antônio Francisco Pimentel que abandonou as terras, por não
resistir ao rigoroso frio e voltou a Portugal.
5
A região, na década de 1880 passou por problemas de divisas de terra
entre a capitania de Minas Gerais e São Paulo, havendo um encontro
entre paulistas e mineiros para fixar uma linha divisória entre ambas as
capitanias (PAULO FILHO, 1986).
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
90
de Paula Vicente de Azevedo, que por volta de 1800
costumava comprar escravos tísicos que ao mandar para
sua fazenda situada nos Campos da Mantiqueira ficavam
curados; também em 1894, criou-se na sede das 36
propriedades do Barão de Bocaina, o Sr. Francisco Vicente
de Paula de Azevedo, a primeira estância “climato-turística”
do Brasil, nos moldes europeus. Na sua propriedade,
freqüentada pela elite da época havia “pitorescos chalés
esparramados pelos jardins” o que acabou chamando a
atenção da imprensa da época. O jornal “O Estado de São
Paulo” de 27/10/1895 denominou a fazenda São Francisco
de “hygienópolis situada quasi na raia de São Paulo e
Minas” (apud PAULO FILHO, 1986, p. 581).
Nesta fase, por volta de 1870 eram poucas as
pessoas que conheciam a eficiência terapêutica do clima na
atividade da cura. A região continuava sendo habitada por
grandes proprietários como o Barão de Bocaína, o que
dificultava a comunicação entre os habitantes da região.
Além disso, quem tivesse a coragem de subir a serra pelas
trilhas íngremes eram surpreendidos pelo frio intenso
(PAULO FILHO, 1986) 6
.
Matheus da Costa Pinto ao comprar as duas
fazendas (Humaitá, Baú e Imbiri) estava consciente da
eficiência do clima na cura da doença. Então, em parte de
sua fazenda, instalou atividades de comércio e ergueu uma
pensão destinada primeiramente a “pousadas dos
negociantes de gado, campeiros e forasteiros” (PAULO
FILHO, 1986, p.58,65). Mas, segundo PAULO FILHO,
(1986, p.67), “as pensões não objetivavam somente acolher
os comerciantes, mas a afluência de uma nova categoria de
6
Os primeiros povoamentos do Vale do Paraíba entre as décadas de
1700 e 1800, se concentravam nas vizinhanças da São Paulo e das Vilas
de Sorocaba, Itu, Jundiaí, Mogi das Cruzes e ao longo do rio Paraíba até
Guaratinguetá (PAULO FILHO, 1986).
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
91
pessoas, os doentes”. Segundo o anúncio da época no
jornal A Província de São Paulo, de 27/04/1879 (apud
PAULO FILHO, 1986):
O hotel tem o arranjo de decência precisa á recepção de
famílias. Cuida-se da admissão de maior pessoal para o
dito hotel, atendendo a que, produzindo os referidos
Campos à cura de pessoas afectadas de Thysica, está
sendo grande à afluência de pessoas enfermas.
Assim, foi o fazendeiro Sr. Matheus da Costa Pinto
quem deu início ao primeiro núcleo, destinado aos viajantes
atraídos pela excelência do clima em função do tratamento
da tuberculose (MASAKAZU, 2002). Dado o aumento do
fluxo de tísicos, Matheus construiu a Pensão São Matheus e
mais tarde a transformou no Hotel de São Matheus do
Imbiri, destinado aos doentes. Outros hotéis também foram
construídos, mas a principal clientela eram os enfermos.
Havia uma mobilização da sociedade, do governo e
dos proprietários para ajudar os enfermos e melhorar a
hospitalidade da cidade. Campos do Jordão, mesmo não
estando preparada para receber tantos doentes, foi ajudada
pelos proprietários de terras, como Matheus da Costa Pinto,
facilitando a estadia, condução e hospedagem, divulgando
essa oportunidade pela imprensa. Também, fez uma doação
de terrenos para que o governo pudesse instalar
logradouros públicos e mais casas para abrigar os tísicos.
Conforme o jornal “A Província de São Paulo” de 24 de maio
de 1882 (apud PAULO FILHO 1986, p.69):
Actualmente, existem ahí dous bons hotéis, devendo abrir-
se em breve, mais um, além da Casa de Saúde dos Drs.
Romeiro e Godoy; existem duas casas de negócios e
dentro em pouco tempo, abrir-se-lhão mais duas; tem os
Campos uma bonita e ellegante capella, cujo custo depois
d’ella concluída, não será inferior a dez contos de reis; tem
mais vinte e tantas casas habitadas, algumas
permanentemente; uma linha de correio particular;
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
92
açougues constantes e regulares, devendo em breve abrir-
se uma padaria e, inicia-se e prossegue-se na construção
de muitas casas.
Assim, em 1891, na atividade de combater a doença,
o Dr. Domingos José Nogueira Jaguaribe Filho também deu
sua contribuição. Ele adquire terras de vários proprietários,
entre eles, as terras do Sr. Matheus Costa Pinto, visando
transformar a região em estação de repouso e cura.
Portanto o núcleo urbano denominado Vila de Matheus do
Imbiri, passa a se chamar Vila Jaguaribe, tornando-se
conhecida pela população como Vila Velha.
Outro núcleo urbano, Albernéssia7
, foi formado por
volta de 1900, pelas propriedades do Dr. Robert John Reid,
que tinha recebido essas terras como pagamento de dívida.
A empresa para o qual trabalhava (Casa Nathan), o havia
contratado para medir a propriedade localizada na Fazenda
Natal em Campos do Jordão e, ao entrar em falência,
propôs a Reid que recebesse as terras em pagamento dos
serviços prestados. Então o Dr. Robert John Reid se muda
para a cidade e passa a doar vários lotes para quem se
interessasse. Doou terras para a construção do Sanatório
Ebeneser; para a Sociedade Mackenzie, no Umuarama; e
para a Sociedade de Educação e Assistência “Frei Orestes”.
Além dos esforços do Dr. Domingos Jaguaribe em
1912 por iniciativa do Dr. Emílio Ribas tem-se a inauguração
da Estrada de Ferro, bem como sua eletrificação dez anos
depois (PLANO DIRETOR, 1962). Com a estrada de ferro
em funcionamento, o ritmo do desenvolvimento urbano
acelerou, porém de forma desordenada e ligada à atividade
de cura. Também, no mesmo ano, o Dr Emílio Ribas, na
tentativa de estabelecer uma área exclusiva para os
7
Nome dado pelo proprietário, o Dr. Robert John Reid, derivado dos
nomes das cidades de Aberdeen e Inverness, na Escócia (PAULO FILHO
1986).
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
93
sanatórios, projeta uma vila sanitária. O projeto previa além
dos sanatórios, um hotel, um teatro, a residência de
veraneio do Presidente do Estado, uma igreja, parques e
praças. Ocorreu, porém, que quando descobriram outras
formas de tratamento da tuberculose, a vila, ao invés de ser
uma vila sanitária, acabou sendo vendida para o embaixador
José Carlos de Macedo Soares que fundou a Companhia de
Melhoramentos Capivari, dando um novo rumo ao processo
de urbanização, que passou então a se relacionar com o
loteamento e venda de lotes para turistas (PLANO
DIRETOR DE 1962).
Desse modo, já em 1915 haviam sido formadas as
três vilas que se caracterizaram como Distritos: a Vila de
São Matheus do Imbiri, também conhecida como Vila Velha,
que mais tarde passou a se chamada de Vila Jaguaribe; a
Vila Emílio Ribas, que foi planejada como uma vila sanitária
passou a se denominar Vila Capivary; e a Vila Nova que
posteriormente veio a se denominar Vila Albernessia.
A presença de turistas
Na década seguinte, a imagem da cidade, ainda não
era favorável para o turismo. Mesmo assim, os relatos feitos
nos livros, de romance, como “A cidade enferma” escrito em
1922 por Paulo Dantas, mostra que já havia a presença de
turistas, tanto na área rural (fazendas), como na área urbana
(casas particulares). Também se nota em trechos desse
livro, a presença de turistas nos vagões da E.E.F. Campos
do Jordão. DANTAS (1922), ao descrever a primeira viagem
de trem, realizada pelo seu personagem principal, o jovem
Léo Além, rumo a Campos do Jordão, focaliza os
passageiros que estavam a sua volta, dizendo:
Há doentes abatidos que viajam calados e esperançosos;
camponeses simples e calmos; turistas bem vestidos e
enfatuados. O olhar dos camponeses, nascidos e criados
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
94
nas rampas da serra, é manso e pouca sem cerimônia
sobre os passageiros. Mas os passageiros não ligam para o
olhar manso e sem cerimônia dos camponeses. Os doentes
estão fechados dentro de suas própria tragédia. E os
turistas mergulhados nas suas vaidades exibicionistas e
nos seus roteiros de férias. (DANTAS, 1922).
Com este relato podem-se determinar três tipos de
viajantes. Os doentes, os camponeses e os turistas. Cada
um possuía expectativas diferentes com relação à cidade,
de acordo com a finalidade de sua viagem. Para os doentes
é uma questão de vida ou de morte; para os camponeses é
mais uma viagem de rotina, a caminho de casa; e para os
turistas é um momento de expectativa, de lazer e descanso.
Nesta década (1920), as condições urbanas para
estimular o desenvolvimento do turismo ainda eram
precárias. A subprefeitura em 1926 possuía 3.200
habitantes que se concentravam nas áreas da vila Nova,
como era chamada a Vila Albernéssia, e, a região era
caracterizada por um brejo de terra preta, onde só a linha
férrea era firme, dificultando a circulação da população.
(PAULO FILHO, 1986, p.199).
A cidade ainda se constituía de pensões e
sanatórios. Alguns considerados “oficiais“ com corretos
padrões de higiene e os demais sem as mínimas condições
de higiene, além de pensões improvisadas e casas
particulares que eram alugadas por alto preço. Com a
excessiva divulgação da inauguração de sanatórios, a
qualidade dos serviços caiu e, a cidade não conseguia mais
“suportar a grande demanda de internações” (PAULO
FILHO, 1986, p.258).
Alguns atos de solidariedade por parte de pessoas
importantes da sociedade procuravam sanar tais
dificuldades. Por volta de 1930, Dona Leonor Mendes de
Barros, por exemplo, freqüentadora habitual da cidade por
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
95
possuir residência em Vila Capivai, todo ano, no dia do seu
aniversário (21 de junho), distribuía presentes na estância,
“mobilizando toda a população pobre que receberia
alimentos e agasalhos”, atraindo também levas de pessoas
de áreas vizinhas que também vinham receber os presentes
de Dna Leonor (PAULO FILHO, 1986). Mas a cada ano,
mais sanatórios foram construídos por iniciativa particular,
transformando a cidade no “maior centro social do Brasil,
talvez da América do Sul, ultrapassando fronteiras a sua
fama” (PAULO FILHO, 1986, p.259)8
.
Nesta década já se pensava em transformar a cidade
em estância turística, porém praticamente ainda não havia
hospedagem só para turistas, pois as que existiam
abrigavam doentes. Os prédios eram velhos, o saneamento
básico era deficiente, os caminhos existentes para se
chegar à cidade eram precários e não existia uma via de
ligação entre as vilas (Vila Nova, Jaguaribe e Capivari).
Assim, a prefeitura sanitária, além do objetivo de construir
um sanatório modelo, também pretendia construir um hotel
destinado somente para pessoas saudáveis, além de
algumas melhorias urbanas como a construção de redes de
água e esgoto sanitário e uma avenida ligando as três vilas
(Jaguaribe, Albernéssia e Capivari) (PAULO FILHO, 1986).
Na década de 1930, a população da cidade
continuava a ser formada basicamente por doentes, devido
ao número elevado de pacientes hospedados nas pensões e
sanatórios existentes. Algumas tentativas foram feitas para
mudar esta imagem de “cidade enferma”, entre elas tem-se
o decreto estadual nº 5.944 de 1933 que institui medidas de
8
Enquanto a área urbana se desenvolvia em função da moléstia, na área
rural a região começa a se desenvolver através da agricultura, com a
chegada dos primeiros imigrantes. Os japoneses em 1929 constituíram as
primeiras regiões frutícolas do Estado de clima temperado. A produção de
maça e pêra d´agua, se tornou mais tarde, motivo para eventos como à
festa da maça e a festa do pinhão (PAULO FILHO, 1986).
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
96
incentivo fiscal a empresas que construíssem na região um
hotel exclusivamente para turistas com jardins, parques
esportivos e até cassinos.
Mesmo com tais iniciativas, Campos do Jordão
continuava sendo conhecida pela climatoterapia, alcançando
reconhecimento internacional pelos tisiólogos de fama
universal, como “Jacquerod, diretor do sanatório de Leysin e
Voigt e Mayer, de Davos-Platz”, ambos na Suíça (PAULO
FILHO, 1986, p.273). A repercussão de “cidade dos
tuberculosos” era de conhecimento nacional. Sua fama
provocou preconceito aos jordanenses que, ao visitar outras
cidades, escondiam sua procedência, pois bastava dizer sua
origem para sentirem uma reação de desprezo e medo de
contágio. Muitos, ao visitarem a cidade, andavam com o
vidro do carro fechado para evitar o contato direto (PAULO
FILHO, 1986, p.269). Assim, apesar da atividade de cura ser
lucrativa, esta impedia que o turismo se desenvolvesse,
devido ao medo do contágio. Era preciso, portanto, vencer
esse estigma (SANTOS, 2005).
Contudo esta situação começa a mudar, quando
cientistas especializados na tuberculose, começam a
reformular seus conceitos sobre a climatoterapia, buscando
novas alternativas de tratamento. Então, nas décadas
seguintes, surgem novos tratamentos como a
colapsoterapia9
; a quimioterapia10
; e métodos preventivos
como a vacina BCG11
. Deste modo, a climatoterapia deixa
9
Processo cirúrgico cuja finalidade é reduzir o volume do pulmão
(ANTUNES, 2000).
10
Consiste na administração intensiva de alguns medicamentos
(ANTUNES, 2000).
11
A BCG – Bacilo de Calmette-Guerin é uma vacina que imuniza o
paciente contra a tuberculose, capaz de reduzir em 70% a 80% o risco de
contágio. Tem por finalidade substituir a infecção natural e patogênica por
uma infecção artificial e inofensiva , ocasionada por um bacilo não
virulento. Este bacilo provocara o aumento da resistência imunológica do
paciente combatendo a infecção causada pelo bacilo de Kock, bacilo
responsável pela tuberculose pulmonar.
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
97
de ser um tratamento importante e o internamento em
hospitais ou sanatórios passa a ser adotados somente em
casos especiais (ANTUNES, 2000).
Nesta mesma década, grandes hotéis foram
construídos nas capitais e nas estâncias minerais, apoiadas
pelos cassinos (ANDRADE, 2000). Enquanto isso, em
Campos do Jordão, já elevada à categoria de município, aos
poucos a atividade da cura da tuberculose vai diminuindo,
dando mais espaço ao turismo, com a construção de hotéis,
e algumas melhorias urbanas (PLANO DIRETOR, 1962). E,
para estimular o crescimento da atividade turística, o
governador do estado, Dr Adhemar de Barros toma a
iniciativa de implantar um zoneamento na Estância, que
divide legalmente a cidade em duas zonas: as vilas
Jaguaribe e Capivari para os turistas e a vila Albernéssia
com sua zona sanatorial para os enfermos.
Nessa época a legislação obrigava as autoridades
locais a regulamentar a hospedagem no município, baixando
normas para evitar a permanência de doentes nos hotéis,
obrigando clientes a apresentarem atestado médico
confirmando a saúde dos pulmões, nos estabelecimentos
voltados para os turistas (PAULO FILHO, 1986, p.262).
§ § §
Observa-se assim que o ciclo da tuberculose se
iniciou praticamente junto com o ciclo do turismo, porém
com menor intensidade de turismo, pois ao mesmo tempo
em que se procurava a região para tratamentos de saúde,
também se procurava para lazer e descanso; a formação
dos primeiros núcleos urbanos de Campos do Jordão está
por vezes associada aos atos de caridade e solidariedade
Fonte:http://boasaude.uol.com.br/lib/ShowDoc.cfm?LibDocID=3517&Retur
nCatID=1765.
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
98
dos fazendeiros da região, que começaram a doar suas
terras para a construção de sanatórios, pensões e casas
para os doentes12
, mantidas pelo apoio financeiro das
instituições de combate a tuberculose (PAULO FILHO, 1986,
p.140); os primeiros serviços voltados exclusivamente para
os tísicos aconteceram primeiro no Rio de Janeiro e São
Paulo13
e mais tarde começaram a migrar para Campos do
Jordão, com a descoberta da climatoterapia; a cidade por
atrair tanto turistas como enfermos, acabou, desde o início
do povoado, se dividindo em duas áreas com populações
distintas: uma área voltada para os tuberculosos e outra
para os turistas.
Este cenário, formado pela realização simultânea
dessas duas atividades, porém, começa a mudar. Pode-se
dizer que a partir de 1940 começa o grande surto turístico
na estância de Campos do Jordão e, na década de 1950, o
turismo de inverno passa a ser a principal fonte de renda do
município. Este, sendo um tipo de turismo sazonal ainda
hoje, influencia a qualidade urbana, não tendo mais
condições de atender as necessidades locais, devido ao
acelerado crescimento da população.
1940 a 1970 – Da cidade enferma ao turismo de Inverno
Em 1940 a atividade sanatorial é de forma gradativa,
substituída pela atividade turística e grandes
empreendimentos hoteleiros são construídos. O Hotel
Toriba, em 1943; o Grande Hotel em 1944 onde funcionou
um cassino durante dois anos, o Hotel Rancho alegre em
12
Também muitos desses fazendeiros eram pessoas influentes na política
e, portanto fazer atos de solidariedade no combate à tuberculose era uma
forma de demonstrar sua empatia para com o povo e conquistar
admiradores (PAULO FILHO, 1986).
13
As atividades filantrópicas mais significativas ocorreram através da Liga
Brasileira contra a Tuberculose, no Rio de Janeiro. Em São Paulo, havia a
Associação Paulista de Sanatórios Populares para Tuberculosos, depois
a Liga Paulista contra a Tuberculose, além de associações criadas pela
elite médica e intelectual (ANTUNES, 2000).
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
99
1946; e o Hotel Vila Inglesa em 1947 (LANCI DA SILVA,
2004).
Entre os hotéis citados, destaca-se o Grande Hotel,
devido ter resultado de iniciativa do governo do estado.
Segundo SANTOS (2005), o governador do estado, Dr.
Adhemar de Barros, idealizara transformar Campos numa
estação turística, com uma clientela refinada. Sabia que
para tanto era necessário construir hotéis e cassinos de alto
nível. Decidiu assim pela construção do Grande Hotel com
verbas públicas14
.
O hotel, construído pela firma Bratke e Botti de São
Paulo, foi inaugurado em 1944 e acabou determinando o
alto padrão da hotelaria em Campos do Jordão, sendo
assim considerado um marco no desenvolvimento do
turismo na cidade (BARBOSA, 1998).
Vale destacar nesta década, a dificuldade de
contratar mão-de-obra especializada, para hotéis deste
nível. Mas alguns acontecimentos históricos favoreceram a
qualidade dos serviços prestados na época da abertura do
Grande Hotel. Segundo SANTOS (2005), o grande mérito da
eficiência e do funcionamento operacional do Grande Hotel
ficou nas mãos de um homem nascido em Hannover, que
acabou chegando ao Brasil, para fugir da inflação que
atingia a Alemanha. O alemão, Henrique Hillebrecht havia
sido proprietário de dois restaurantes em Hamburgo e um
deles era considerado o melhor da cidade. Mas, devido às
dificuldades financeiras, acabou vindo para o Brasil em
1925, vivendo primeiro no Rio de Janeiro, depois em São
Paulo, comprando e administrando alguns restaurantes15
,
até que sua experiência profissional o capacitou para vencer
14
A construção do edifício foi realizada através do Governo Federal, pelo
Departamento de Obras Públicas do Estado.
15
Comprou em 1937, em São Paulo, o restaurante Pinguin . Depois teve
a Caverna Paulista e o Bhrama, na Av. São João (SANTOS, 2005).
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
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100
a concorrência pública para o arrendamento do Grande
Hotel, em Campos do Jordão. Assim sendo, seu modo
germânico baseado no rigor e na eficiência, fazia com que
todos os serviços do hotel fossem impecáveis.
Outro acontecimento que elevou a qualidade da
hotelaria e da gastronomia em Campos do Jordão ocorreu
durante a segunda guerra mundial. Segundo SANTOS
(2005) um navio alemão, o Windhuk, teria aportado em
Santos, em 1939, fugindo do bloqueio naval inglês. O navio
era considerado, na época, um dos mais modernos tendo a
função de carga e de turismo, e estava ancorado na cidade
do Cabo, na África do Sul quando a guerra foi declarada.
Também, considerado de categoria cinco estrelas, o
Windhuk realizava cruzeiros para as colônias européias da
África, atendendo turistas da alta sociedade européia. Seus
250 tripulantes eram profissionais com conhecimento
técnico de serviços de bar e restaurante. A tripulação e os
passageiros que não desembarcaram em terras africanas,
quando o Brasil rompeu as relações diplomáticas com
Alemanha, foram levados para campos de concentração,
localizados nas cidades de Pindamonhangaba e
Guaratinguetá, no vale do Paraíba, estado de São Paulo
(SANTOS, 2005). No final da guerra ao serem libertados
muitos desses ex-tripulantes foram trabalhar no Grande
Hotel, colaborando como músicos, pessoal da cozinha,
confeiteiro, garçom, aumentando a qualidade dos serviços e
colaborando no treinando dos demais funcionários.
Com relação à ocupação dos hotéis localizados nas
estâncias, a grande procura era promovida pelos cassinos.
Assim, em 1945 começa a funcionar o Cassino do Grande
Hotel, explorado pela Empresa Paulista de Diversões Ltda,
que através de parcerias com empresas do Vale do Paraíba,
contratava a E.F. Campos do Jordão, fretando vagões para
trazer os jogadores até o cassino (BARBOSA, 1998).
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
101
Segundo SANTOS (2005), a circulação de dinheiro em
função dos jogos acontecia com facilidade, e as fichas do
cassino se tornaram a moeda corrente na cidade. Deste
modo, durante as décadas de 1930 e 40, a hotelaria se
apoiava na prática dos jogos e outros serviços de
entretenimento como shows de orquestras, mágicos e
artistas.
Mas a situação muda em 1946, quando o Presidente
Eurico Gaspar Dutra proibiu a prática de jogos, em todo o
território nacional. Deste modo, o fechamento dos cassinos
causou grande impacto no perfil dos turistas e na economia
local, prejudicando tanto os funcionários do hotel, como todo
o comércio da estância (BARBOSA, 1998). Muitos hotéis,
por se manterem através dos jogos, faliram e foram parar
nas mãos do governo (SANTOS, 2005).
O cassino do Grande Hotel foi fechado em 1946.
Mas outras instalações disponíveis fizeram com que toda a
vida social da cidade continuasse convergindo para o hotel,
que viveu sua fase áurea em 1960. Equipado com bar,
restaurante e boate, o hotel proporcionou uma nova vida
noturna à cidade. Ali era o ponto de encontro de políticos
como Getulio Vargas e sobrenomes importantes da nata da
sociedade paulista. Artistas nacionais e internacionais eram
convidados a se apresentarem na boate do hotel. Também
devido à eficiência de seus serviços, o hotel atraia “famílias
tradicionais, com boa situação financeira, que reservavam o
mês todo e tinham outro padrão de exigência” (SANTOS,
2005, p.65). Portanto o hotel funcionava como um ponto de
atração de um turismo de glamour em que toda
personalidade de destaque precisava estar presente. Um
lugar “para ver e ser visto”, um comportamento que ocorre
ainda hoje, durante a temporada de inverno (SANTOS,
2005, p.69). Do hotel para as vias públicas de vila Capivari,
surgiu vários restaurantes, bares, boates que antes
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
102
aconteciam dentro do Hotel. Na fase áurea do Grande Hotel
nos anos de 1960, os eventos temporários se tornaram
importantes pontos de atração turística, como a instalação
da primeira concessionária Wolkswagen com serviços
exclusivos de mecânica para os hospedes. Também havia
um salão de cabeleireiro comandado por um dos ex-
tripulantes do navio Windhuk que, pela suas experiências
com tinturas, caiu na preferência das mulheres da elite
paulistana e carioca, atraindo até as clientes que não eram
hospedes do hotel (SANTOS, 2005, p.69).
Assim outros hotéis foram construídos, e a cidade,
em 1960, passa a apresentar um importante parque
hoteleiro para a região da serra da Mantiqueira: Grande
Hotel (250 pessoas); Hotel Vila Inglesa (120 pessoas); Hotel
Umuarama (60 pessoas); Hotel Toriba (80 pessoas); Hotel
Refúgio Alpino (50 pessoas); Hotel Rancho Alegre (150
pessoas); Hotel Bologna (80 pessoas) e o Hotel Augusta (25
pessoas) (PLANO DIRETOR DE 1962).
Nesta mesma década, a cidade continuava tendo
seu papel, dentro da região, de estação de tratamento da
tuberculose, mas com o aumento da qualidade dos serviços
hoteleiros, passa a ser vista muito mais do que um simples
lugar de descanso, mas sim, como uma “estação de
inverno”. E, para prolongar a permanência dos turistas na
cidade, alguns atrativos naturais e culturais passam a ser
divulgados. Os de maior destaque são os atrativos naturais:
Pico do Itapeva, situado a 2.030 metros de altitude, com
uma vista panorâmica de todas as cidades do Vale do
Paraíba; o Pico do Imbiri, situado a 1.950 metros de altitude;
Gruta do Crioulo, uma enorme pedra, com diâmetro de
aproximado de 30 metros, em meio à natureza; Umuarama,
um local com belíssimos panoramas e um hotel com o
mesmo nome; Horto Florestal, antiga Fazenda da Guarda
situada numa área preservada com várias fontes minerais;
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
103
Pedra do Baú a 2.000 metros de altitude com vista para o
vale e inúmeras cidades do vale; e as fontes Marisa, Simão,
Renato, Nossa Senhora das Graças. O Palácio do Governo
do estado veio a se tornar um importante atrativo cultural da
década de 1970 (PLANO DIRETOR, 1962).
Nota-se que, apesar da cidade possuir inúmeros
atrativos naturais, os jogos no cassino eram a principal
alavanca de crescimento do turismo. Tanto que a proibição
do jogo na década de 1940 esvaziou os hotéis das estâncias
hidrominerais brasileiras, ocasionando o surgimento de
outras localidades turísticas, na região do litoral, como
Guarujá e Santos.
Este acontecimento forçou as autoridades municipais
e estaduais, a criarem eventos na tentativa de salvar o
turismo nas estâncias. Em Campos do Jordão, a maioria dos
eventos promovidos eram voltados para a produção
agrícola: a Festa da Maça; a Festa do Pinhão; a Festa da
Cerejeira em Flor; e o Torneio de Pesca à Truta. Isto se deu
devido ao desenvolvimento da produção agrícola na cidade
com a chegada dos japoneses, que começam a produzir
maçã, cereja e pera d´agua16
. Também a cidade abrigava
uma empresa que fabricava sucos e geléia de frutas, a
Belfruta Ltda, de Paul Ludwig Gustavo Edward Bockmann e
Adhemar de Barros Filho (PAULO FILHO, 1986).
Quanto ao Grande Hotel, em 1970, termina o
contrato de arrendamento que o estado firmara com a Cia.
de Hotéis de Campos do Jordão, empresa criada pelo
administrador alemão Hans Hillebrecht. O hotel passou por
um processo de decadência por não modernizar as
instalações que estavam obsoletas e, a freqüência ficava em
torno de “meia dúzia” de hóspedes. Deste modo, a falência
16
Horti-fruti-granjeiros de Renópolis, cenouras do Lageado, as batatas do
Baú, e os ovos e hortaliças dos Mellos.
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
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104
foi inevitável criando um grande problema social na cidade
(SANTOS, 2005).
Para atrair a permanência de turistas por mais
tempo, alguns eventos turísticos começaram a ser
organizados e passaram a ter repercussão internacional,
fornecendo uma identidade definitiva para a cidade, que
assim se consolida na região e no Brasil, como uma estação
de inverno. O governador Abreu Sodré declara o Palácio
Bom Vista, casa de veraneio do governador do estado, um
monumento público sendo reaberto para visitação em 1969,
depois de dois anos de trabalhos para sua organização. E,
em 1970, o secretário da Fazenda e o Grupo Executivo de
Aproveitamento do Palácio de Campos do Jordão –
GEAPAC, na tentativa de inserir o edifício no roteiro cultural
da cidade, formam a Comissão de Concertos de Inverno de
Campos do Jordão. Houve várias tentativas de integração
de alguns eventos na cidade, para atrair um número maior
de turistas, até que a idéia da realização de concertos de
música clássica, por parte do grupo executivo, tornou-se o
fator de solidificação da imagem da cidade como estação de
inverno (PAULO FILHO, 1986).
Os primeiros concertos foram realizados em 24 de
julho e 01 de agosto de 1970. Posteriormente foram
denominados Festivais de Inverno que tiveram um
extraordinário sucesso, sendo realizados sempre nos meses
de julho de cada ano. Os organizadores procuravam superar
os festivais anteriores, ao mesmo tempo em que sua
qualidade cultural acabou sendo reconhecida em todo o país
e entrou para o calendário Musical do Brasil. A partir de
então os espetáculos da cidade aconteciam em vários
espaços culturais espalhado na cidade: Auditório de
Campos do Jordão, na Sociedade de Educação e
Assistência Frei Orestes; na Igreja São Benedito na Vila
Capivari e nas praças públicas. Pela dimensão e
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
105
importância do evento, o Festival hoje é coordenado pela
Secretaria da Cultura do Governo de São Paulo (PAULO
FILHO, 1986).
Além das apresentações, outras atividades surgiram
em função do festival. O curso de Cultura Musical iniciado
em 1973, teve na época como coordenador Ricardo
Cavalcante, da Secretaria do Esporte e da Cultura do
estado, sendo realizado no Centro da Cultura Musical. Com
o tempo, o curso passou a atrair bolsistas de todo o país e
do exterior pela qualidade do corpo docente.
Assim, tais acontecimentos históricos, confirmam as
palavras de SILVA (2004, p.135) de que “a transição entre a
cidade da cura e a cidade do turismo completa-se entre as
décadas de 1950 e 1970”. Mesmo com a proibição do jogo,
a transformação do Grande Hotel Campos do Jordão em
hotel-escola junto com a continuidade do elevado nível do
serviço hoteleiro e gastronômico, fez com que a cidade
voltasse a ser procurada pelos turistas e se sobressaísse
por seu papel de ponto de encontro da alta sociedade
paulistana.
§ § §
Como se observa, foi importante o papel do estado,
de tomar a iniciativa em construir um hotel com padrões ao
nível das exigências da sociedade paulistana; estimulou
desde então, num turismo mais sofisticado, diferenciando a
cidade das demais estâncias da serra da Mantiqueira;
também a cidade acabou sendo “beneficiada” pelas
fatalidades provocadas pela segunda guerra mundial, que
acabou atraindo uma leva de profissionais estrangeiros da
hotelaria e gastronomia (os tripulantes do navio Windhuk)
que supriram as necessidades da cidade que se tornava
turística; apesar dos inúmeros atrativos naturais, nesse
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
106
período os jogos de azar e o requinte das instalações
hoteleiras era o principal motivo de atração de turistas; nos
anos de 1970 e 1980, o turismo de inverno motiva a fase de
consolidação da atividade turística que é completada com o
sucesso dos festivais de inverno.
1980 a 2005 – Do turismo de inverno á diversificação
turística.
Em 1982, o Grande Hotel é reaberto. O governador
do estado de São Paulo, José Maria Marin assina um
convênio com o SENAC para transformar o Grande Hotel
em hotel-escola. Assim, com sua reabertura, Campos do
Jordão sofre novamente a influência da boa qualidade de
seus serviços. O hotel passa a receber professores vindos
de universidades estrangeiras, como a Cornell University,
em Itahaca, nos Estados Unidos, e são firmados acordos de
cooperação com as tradicionais escolas, The Ecole
Hoteliere de Lausanne e Glion Hotel School17
, ambas na
Suíça (SANTOS, 2005). Suas instalações foram
completamente renovadas, tornando-se mais moderno e
mais luxuoso (BARBOSA, 1998).
Além da gastronomia, a arquitetura utilizada nas
residências, no comércio e nos hotéis começou a chamar a
atenção dos turistas. O hotel Toriba e Vila Inglesa
construídos nos anos 40 haviam adotado uma arquitetura
típica do Suiça. Depois, em 1985, o Boulevard Geneve, na
Vila Capivari, teve seu projeto inspirado num prédio na
cidade de Hotemburgo, Alemanha, utilizando a técnica de
Chaiméll18
. Assim a cidade foi estabelecendo uma
17
A Suíça é considerado um país que reúne as melhores escolas de
hotelaria do mundo. Em 2001 estavam matriculados 4 mil estudantes,
dentre eles, 21 portugueses e 96 brasileiros. Fonte:
www.swissinfo.org/spt/swissinfo.html.
18
Técnica que consiste no travamento das madeiras sem a presença de
materiais metálicos, também presentes no estado de Santa Catarina, com
telhado no estilo Alpes suíço (FRANKLIN, 2006).
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
107
arquitetura diferenciada em relação às demais e os turistas
eram atraídos não só pela qualidade dos serviços dos
principais hotéis, mas também pelo cenário que esta
arquitetura européia proporcionou para a paisagem urbana.
Foto 22: O Hotel Toriba, construído em 1943. Fonte:
www.toriba.com.br.
Segundo o arquiteto José Roberto Damas Cintra
(apud FRANKLIN, 2002), a cidade começou primeiro com a
influência da arquitetura portuguesa, trazida pelos tropeiros
vindos do Vale do Paraíba. Depois, começou-se a sentir
também a influência de estilos arquitetônicos trazidos por
famílias acostumadas a viver em climas frios, como a
Finlândia e Alemanha. Muitos desses estrangeiros que já
viviam no Brasil se radicaram na cidade ao buscarem
tratamentos nos sanatórios, ao trabalharem na construção
da estrada de ferro e na implantação da Rodovia SP-50. Na
fase de formação dos sanatórios, a arquitetura se
assemelhava àquela das cidades do vale do Paraíba, como
Pindamonhangaba e Taubaté, com somente algumas
edificações que fugiam do padrão (Pensão Báltica). Deste
modo, a cidade sofre uma mistura de influências européias
em sua arquitetura, criando um estilo próprio.
Foto 23: O Grande Hotel, construído em 1944. Um projeto da
firma Bratke e Botti de São Paulo. Fonte: Adriana Silva
Barbosa.
Foto 24: O hotel Vila Inglesa, construído em 1947. Fonte:
www.vilainglesa.com.br.
Como se observa, a arquitetura de Campos do
Jordão agradou os turistas e também aos comerciantes.
Para os turistas, a casa de campo é a concretização de um
sonho. Para o comerciante é um cenário lucrativo. Depois
do Boulevard Geneve, outros espaços comerciais foram
construídos. Assim, a arquitetura promoveu a cidade para o
turismo, estimulando construções que empregava técnicas
modernas, porém nesse “estilo europeu”.
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
108
Foto 25: O Boulevard Geneve, 1985.
Foto 26: Pensão Báltica localizada na Rua Eduardo Moreira da
Cruz, Vila Jaguaribe. Primeira pensão sanatório com técnicas
construtivas da Letônia na década de 1920.
Também, muitos turistas preferiram comprar sua
casa de campo e as empreendedoras imobiliárias
procuraram atender a esta procura. Em 1986, a cidade
passa receber edifícios residenciais de três pavimentos.
Esta foi uma década marcada pelas ofertas imobiliárias,
como condomínios de casas e prédios de apartamentos,
semelhantes aos condomínios fechados das grandes
capitais (LANCE DA SILVA, 2004).
Foto 27: Aspecto arquitetônico da pensão sanatório localizado
em Vila Albernéssia, 1930. Fonte: REZENDE, 2004.
Até os últimos anos da década de 1980, a cidade
recebeu cerca de 3.000 novos apartamentos composto por
empreendimentos de alto nível. (VIANA, 1988). Todo esse
crescimento ocorreu formando uma estrutura urbana similar
à de São Paulo, com seus condomínios fechados e
seguranças privativas. Muitos desses condomínios possuem
baias para cavalos, piscinas aquecidas e casas com
lareiras. Esses empreendimentos procurando referencias
européias como “vila suiça”, ou “estação de inverno”
adotaram nomes como: “Switzerland Village”, “Ski Village”,
“Vila Holandesa” (VIANA, 1988).
. Foto 28: Residência localizada em Vila Capivari, 1940
. Foto 29: Residência localizada em Vila Capivari, 1940.
O perfil dos compradores, em sua maioria é formado
por paulistas que estão acostumados a viver em sistemas
de condomínios, numa forma de procurar segurança contra
o aumento da violência em São Paulo e que procuram
possuir uma casa de campo, principalmente na famosa
“estação de inverno”. E, por ser uma residência que terá
uma freqüência sazonal (durante a temporada de inverno), o
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
109
serviço de segurança e manutenção do condomínio, se
torna um requisito vantajoso e imperativo para o comprador
(OLIVEIRA, 1991; VIANA, 1988).
Segundo OLIVEIRA (1991) ter uma residência em
Campos do Jordão significa possuir uma mercadoria
arquitetônica que simboliza ascensão social. A casa de
campo passou a ser o símbolo máximo dessa ascensão,
pois se cria assim, uma imagem de “estilo alpino”, que
agrega “valores” ao proprietário, representado seu maior
status social. Muito provavelmente a maioria desses
proprietários, já tem um imóvel em São Paulo, (sua
residência), outro no litoral, e busca ainda, outro na serra.
Assim, a do litoral é para o lazer da família, enquanto que a
casa na serra representa seu orgulho e mais alta
movimentação na escala social (LANCE DA SILVA, 2004).
A casa de campo, associada às qualidades
terapêuticas do ar e da água, incorpora a idéia de saúde e
de um momento para recuperar energia antes de voltar à
vida urbana. As palavras de Adhemar de Barros, (ex-
governador do Estado de São Paulo) sobre Campos do
Jordão expressam esta intenção:
Pode-se readquirir forças necessárias e livrar-se do
contágio das grandes cidades (...).Isto é uma fonte de
saúde (...) [para] (...)retemperar a saúde dos homens que,
lá em baixo trabalham na indústria, no comércio e mesmo
na política. (...)Antes de ser eficiente na cura da peste
branca, é a estação para retemperar a saúde, o físico, a fim
de termos força para a vida cotidiana (PAULO FILHO,
1986).
Todas essas qualidades tornaram os imóveis de
Campos do Jordão, um produto de grande valor no
mercado.
Por sua vez, o turista, ao mesmo tempo em que
procura o frio da serra, também busca o conforto urbano e
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
110
variedade de serviços. Assim é que os condomínios
atendem a estas necessidades, oferecendo imóvel, infra-
estrutura urbana, equipamentos de lazer e segurança, tendo
como “pano de fundo”, as áreas verdes. Quanto aos
serviços, na vila Capivari, há restaurantes, bares e lojas
além de eventos programados para a temporada de inverno.
Esta disponibilidade neste local pode-se dizer, é o motivo
que leva à escolha de localização, por parte das
construtoras, em seus novos empreendimentos.
Foto 30: Residências de alto padrão, no condomínio Alto do
Capivari, 1980. Fonte: Adriana Silva Barbosa.
. Foto 31: Flat residencial Quatre Season, 1988. Fonte:
Adriana Silva Barbosa.
Esse turismo gerou na década de 1990, mudança na
paisagem local que deixou de ser aquela imagem de cidade
pequena, passando a apresentar problemas de uma
urbanização acelerada e adensamento de favelas. Esse
crescimento desordenado e falta de infra-estrutura urbana
não é recente. Na fase de funcionamento dos sanatórios, o
processo de favelização de algumas áreas próximas à “vila
velha”, atual Vila Jaguaribe, já era uma realidade. Mas,
naquela época, as associações filantrópicas mantinham
aquela estrutura urbana, somando-se à verba proveniente
do governo para a manutenção dos sanatórios públicos,
que também acabavam por se responsabilizar por muitas
benfeitorias urbanas. Na fase turística, a dinâmica é outra.
. Foto 32: Edifício Residencial, Vila Capivari, 1990
Na procura de lotes e imóveis para a construção da
“terceira residência”, a construção civil precisava de mão-de-
obra local, e destacam-se os empreendedores locais, que
construíam casas isoladas, com essa mão-de-obra local e,
depois da obra concluída, havia sempre uma vaga de
emprego para caseiro. Com o aumento da demanda as
obras passaram a serem promovidas por grandes
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
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111
incorporações, que trabalhavam com condomínios
residenciais (residências ou prédios de apartamentos)
atraindo mais trabalhadores e os caseiros passaram a ser
substituídos pela segurança das residências, realizadas por
empresas especializadas.
Segundo OLIVEIRA, (1991) a construção de um
apartamento necessitava de pelo menos 4 trabalhadores.
Portanto, os cerca de 3.000 novos apartamentos
construídos nos anos próximos a 1986, demandariam um
mínimo de aproximadamente 12.000 homens atuando no
setor da construção civil. Daí a “realidade” da favelização
ocorrida na cidade, pois consta que 53 condomínios tinham
sido aprovados, dos quais 46 estavam em construção
(VIANA, 1988).
Nos anos da “economia tuberculose”, a mão-de-obra
vivia, ou nos próprios sanatórios, ou no centro urbano que
naquela época não era tão valorizado. Os trabalhadores
eram mantidos, ou pelos salários recebidos, das instituições
de caridade ou do governo. Nos anos da “economia do
turismo”, onde praticamente todos os lotes de terra ficam
valorizados, a mão-de-obra da construção civil acaba
optando, ou por morar nos canteiros de obras, ou em
favelas, principalmente depois de estarem desempregados,
ao término das obras e não terem condições de comprar ou
alugar um imóvel na cidade, localizadas nas áreas menos
favoráveis à construção civil, ou seja, as encostas.
Esta situação é vista no artigo publicado em outubro
de 1988 pela “A Gazeta Jordanense” (apud OLIVEIRA,
1991), quando, com o sucesso do Plano Cruzado19
, a
19
O plano cruzado consistia no corte dos três zeros e, no Plano Cruzado
I, os preços foram congelados por um ano. Deste modo a inflação foi
contida, o salário aumentou e o poder aquisitivo também, aumentando o
consumo. Assim, o forte consumo abalou o congelamento dos preços
levando o plano ao fracasso (RUIZ, 2006).
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
112
procura por imóveis aumentou em Campos do Jordão e as
construtoras foram obrigadas a contratarem mão-de-obra
das cidades vizinhas. Mas, depois que ocorreu o fracasso
do Plano Cruzado, muitas obras foram paralisadas e muitos
dos peões ficaram desempregados, sem moradias e a
opção encontrada foi invadir áreas verdes das encostas da
cidade.
Como ocorre, a construção civil é sempre um serviço
temporário e ao término das obras, o trabalhador é obrigado
a procurar outro serviço. Ora, com essa instabilidade
financeira, ter um barraco na favela parece ser uma opção
“razoável”. Daí esse “mecanismo” da década de 1980 em
que a construção civil acaba estimulando o processo de
favelamento das áreas invadidas.
Foto 33: Vila Santo Antonio. Fonte: IPT, 2001.
Outra visão desse processo de crescimento urbano é
contada pelo prefeito João Paulo Ismael em entrevista
(VIANA, 1988), contando que há na cidade cerca de 4.500
barracos onde vivem aproximadamente 22.500 pessoas. Por
sua vez, dados do SEADE – Sistema Estadual de Análise de
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
113
Dados do Estado de São Paulo, mostram que em 1980 a
população era de 33.605 habitantes, levando a se estimar
que somente umas 11.105 pessoas vivam fora das favelas,
além da população flutuante (turística). Atualmente,
conforme dados do relatório do IPT – Instituto de pesquisas
Tecnológicas (2001), a cidade possui cinco áreas de risco
ocupadas por favelas, situadas próximas à vila Albernessia
e Vila Jaguaribe: Vila Santo Antônio, Vila Anadir, Vila
Sodipe, Vila Albertina e morro do Britador.
Foto 34: Vista das encostas de Vila Santo Antonio. Fonte:
Adriana Silva Barbosa, 2005.
Há quem observe, porém que a forma de fazer
turismo em Campos do Jordão mudou (OLIVEIRA, 1991).
Esta já não é mais a cidade de férias prolongadas, pois ficar
o mês de julho inteiro na cidade poderia ser “tedioso”, frente
a uma relação de outras possíveis opções de
entretenimento e lazer, e assim, Campos do Jordão teria se
tornado mais um produto no meio de tantos outros, ainda
que melhor estruturado entre todos. Será que as relações
afetivas com a cidade mudaram? Será que os vínculos
afetivos com a cidade, as raízes familiares e a relação com
a população local podem ser eliminadas em prol de um
consumo rápido e impessoal do espaço urbano? Conforme
ARANTES, VAINER e MARICATO (2000), para muitos dos
atuais administradores públicos, a cidade passou a ser
tratada como uma “mercadoria” adaptada de acordo com as
características do comprador. Desta forma, pensando no
mercado turístico, Campos do Jordão parece ter se tornado
numa mercadoria que, ao longo do desenvolvimento da
exploração turística, adaptou-se ao perfil do consumidor.
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
114
Foto 35: Vila Albertina. Fonte: IPT, 2001.
Foto 36: Vista das encostas de Vila Albertina. Fonte: Adriana
Silva Barbosa, 2005.
Este comportamento dos gestores públicos se reflete
na mudança trazida pela segmentação do turismo.
Encontram-se disponíveis no mercado, roteiros ecológicos,
culturais e rurais, para jovens, ou específico para a terceira
idade, para solteiros ou casais, e de acordo com as
condições financeiras de cada classe social. E, assim, o
turismo passa a ser organizado por roteiros específicos, em
que se visita 4 ou 5 cidades num mesmo período de férias.
E, ainda que o turista possa não comprar um pacote turístico
usufruindo os serviços das operadoras, pode sim, ter a sua
disposição serviços acessíveis por telefone ou via Internet,
além de contarem com revistas especializadas em turismo
que estimulam o leitor a organizar seu próprio roteiro de
cidades.
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
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Imagem 5: publicação com uma seleção das estâncias
localizada na serra. Fonte: VEJA SP, 28/06/95.
Desse modo, tanto Campos do Jordão, como outras
localidades passam a se integrar em vários roteiros,
conforme o segmento escolhido pelo turista. Pode se
enquadrar no turismo ecológico, devido a suas reservas
florestais, como o Horto Florestal com suas trilhas e
cachoeiras; no turismo de negócios, devido á qualidade de
seu complexo hoteleiro, com salas para congressos e feiras;
no turismo cultural, pelo sucesso dos festivais de inverno e
apresentações de artistas nacionais e internacionais.
Imagem 6: Publicação com roteiro de cidades turísticas para a
temporada de inverno. Fonte: VEJA SP, 07/06/2000.
Nesta fase de segmentação do turismo nota-se que
há maior divulgação das cidades vizinhas, mesmo que não
tenham tanta estrutura de serviços, mas estão ou próximas
a Campos do Jordão, ou na Serra Mantiqueira com seu
cenário bucólico e pitoresco. Em seu artigo “O paulistano vai
à montanha”, Mário VIANA (1990), ressalta:
Localizada entre a divisa dos Estados de São Paulo, Rio de
Janeiro e Minas Gerais, a Serra da Mantiqueira é, cada vez
mais, o lugar preferido dos paulistanos para as férias de
inverno, com cidades pequenas e agradáveis, como
Penedo, Itatiaia e Visconde de Mauá.
Imagem 7: Publicação com uma seleção de cidades serranas
para as férias de inverno. Fonte: VEJA SP, 19/06/2002.
Observa-se nessa citação, o perfil de cidades
rústicas, tranqüilas, sem o agito de São Paulo, sendo
oferecidas por suas qualidades favoráveis ao descanso,
principalmente em contraposição, Paulo VIEIRA (1994)
mostra que “A temperatura Sobe” quando o agito é
prestigiado em detrimento do descanso de algumas cidades
serranas:
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
116
Num dos invernos mais movimentados dos últimos anos em
Campos do Jordão, há uma febre de inaugurações, festivais
e lançamentos imobiliários. (...)Em julho, Campos do Jordão
é uma festa sem hora para acabar.
O exagero do turismo, porém, pode ser exarcebado
com o aumento do número de lojas de grife com nomes
estrangeiros e serviços especializados: o Lucky Strike
Center, ou mesmo com estabelecimentos da moda global
como videobar, shows de blues; o hotel cinco estrelas Mont
Blant e flats Quatre-Saisons e Home Green Home. E, desse
modo, pode-se descaracterizar uma região, que por muito
tempo buscou um cenário europeu. O que se tem notado é
que os festivais de inverno que antes convidavam os
melhores da música clássica passaram a promover eventos
populares; o centro de Capivari passou a ter trânsito; o rio
que corta a cidade ficou mais poluído; a cidade ficou repleta
de ônibus “farofeiros”, causando mais congestionamento; os
preços aumentaram para compensar os meses de
ociosidade; e para atender rapidamente, uma demanda
crescente, não são todos os restaurantes que oferecem
serviços de qualidade (NOGUEIRA, 1996; LORENÇATO,
1999).
Essa dinamização turística modifica a rotina na
região, pois, por exemplo, quando chega a temporada de
inverno, as cidades vizinhas de Campos do Jordão agem
em apoio, oferecendo seus serviços ao complexo hoteleiro.
É que a falta de vaga na “estância motriz” que fica
praticamente com seus hotéis e pousada 100% ocupados
na temporada de inverno, pode ser compensada com o
aluguel de casas ou estadas nas pousadas das cidades
vizinhas, como Santo Antônio do Pinhal, que fica a 40
quilômetros do centro de Capivari (VIEIRA, 1995). Nessas
ocasiões alguns restaurantes, lojas e danceterias das
grandes cidades (São Paulo e Rio de Janeiro) se instalam
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
117
temporariamente na cidade, para “aproveitar” clientes que lá
estão em férias. VIEIRA (1988) relata casos de sucesso em
que paulistanos deixavam a capital para abrir negócios na
cidade, o que serviu de incentivo para que outros subissem
a serra em busca de novas oportunidades. Em muitos casos
esses estabelecimentos utilizam uma arquitetura, também
temporária. Como os “tijolinhos aparentes”, que na realidade
são de plástico, da danceteria Limelight, em vila Capivari.
Outros alugam espaços em hotéis ou pousadas, para
promover “o espetáculo” da temporada (VIEIRA, 1995).
Nota-se que, que o turismo na cidade passou a ser
sazonal, e por isso, muitos dos serviços de lazer e
entretenimento também se tornaram de tempo limitado. Se
na temporada de inverno a cidade precisa do apoio das
demais vizinhas, fora da temporada a ocupação se reduz a
praticamente a 20%, muito diferente do que acontecia na
década de 60 em que os jogos de azar garantiam um fluxo
permanente de turistas de alto poder aquisitivo (OLIVEIRA,
1991).
No auge do sucesso desse turismo é que as
construtoras passam a promover novos empreendimentos
voltados não só para os de alto poder aquisitivo, mas
também para a classe média. Assim a cidade passa a fazer
parte do roteiro dessas famílias, que também desejam
possuir sua casa de campo, mesmo que este sonho se veja
reduzido a um pequeno apartamento localizado um pouco
mais longe de vila Capivari. Os excursionistas também são
atraídos nos finais de semana; são grandes consumidores
das apresentações dos festivais de inverno e de atrativos
naturais como o Morro do Elefante e o Pico do Itapeva
(OLIVEIRA, 1991).
Em 2001 o número de turistas começa a ultrapassar
a faixa de um milhão de pessoas que entram na cidade
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
118
como população flutuante, enquanto a população residente
fica ao redor de 44.164 habitantes em 2000 e 46.710, em
2003. E, no decorrer das décadas seguintes, segundo
REZENDE (2004, p.11,19), a procura dos turistas por
grandes eventos e pela vida noturna de vila Capivari,
acabou por anunciar um abandono dos espaços histórico-
culturais, por parte dos munícipes e autoridades, buscando
somente a valorização do comércio” e “o grande desafio
agora é o de continuar a ser a Suíça Brasileira, inicialmente
valorizada por ser hospitaleira e por possuir uma natureza
exuberante.
Locais importantes na historia de Campos do Jordão
deixaram de ser o centro das atenções diante de um turismo
onde a busca de consumo imediato “apagou” os atrativos
históricos da cidade. Houve também um retrocesso na
manutenção e valorização da arte e da história, evidenciado
pelo abandono do Museu de História, Imagem e Som de
Campos do Jordão, o Museu da Tuberculose, a Casa da
Xilogravura (REZENDE, 2004); o cinema que necessita de
reformas e a biblioteca infantil que sofreu um incêndio em
2005. Esses equipamentos culturais que são importantes na
preservação da identidade da cidade se mostraram “sem
importância” diante dos mega-eventos promovidos por
empresas de cigarros, bebidas e telefones celulares.
Os gestores públicos vêm tentando reduzir essa
sazonalidade do turismo, com iniciativas públicas e privadas;
e também com tentativas de associação com eventos que
não tenham relação com o inverno, buscando assim o
turismo de negócios, por exemplo, (Congresso de
Cardiologia, o Congresso de Administração Pública);
atividades voltadas para a gastronomia (Roteiros
Gastronômicos, Festival do Fondue, Festa da Cerejeira,
Festa do Pinhão); festividades religiosas (Natal na
Montanha), por interesses culturais (Mapa Cultural); e
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
119
encontros de associações (Encontro dos Fordinhos) e o
Ecoturismo.
Foto 37: Condomínio residencial Chateau Renoir, Vila
Capivari, 2004. Fonte: www.camposdojordaoimoveis.com.br.
Observa-se que, assim a cidade foi deixando de ser
um local de descanso nos meses de inverno, passando a
ser conhecida por seu potencial para a realização de
atividades, conforme o segmento turístico escolhido. A
gastronomia se diversificou, oferecendo restaurantes de
comida japonesa, italiana e mineira; as pousadas não se
restringiram ao perfil de típico chalé nas montanhas, mas
passaram a oferecer serviços de SPA, comida vegetariana,
academia e hidroginástica; as apresentações dos festivais
de inverno, não se limitaram à musica clássica, mas
passaram a trazer também música popular como o MPB,
jazz e apresentações de bandas de rock; os passeios nas
montanhas deixaram de ser uma simples caminhada,
transformando-se em esportes, muitos dos quais radicais
como o cascading (em cachoeira), rappel, arvorismo e
trilhas ecológicas acompanhadas por guias especiais; e os
novos condomínios possuem uma miscelânea de estilos
arquitetônicos, seguindo a temática “casa de campo”.
Foto 38: Condomínio residencial Petit Palais, Vila Capivari,
2004. Fonte: www.camposdojordaoimoveis.com.br.
Foto 39: Centro de eventos em Vila Capivari. Fonte: Adriana
Silva Barbosa, 2005.
Por essas qualidades de um mercado turístico
diversificado, Campos do Jordão tem desempenhado nos
últimos anos, o papel de uma cidade estruturadora dessas
atividades na região da Serra da Mantiqueira. Pode-ser
notar nos meios de comunicação que a cidade conta com os
melhores hotéis e restaurantes da região serrana, devido à
grande variedade de serviços e eventos oferecidos
(MONTEIRO, 2000 e 2002; DUARTE, 2001; AZEVEDO,
2003). Nesse sentido, ao mesmo tempo em que mostra as
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
120
vantagens de uma cidade estruturada, mostra também as
desvantagens da aglomeração de turistas, como nas
temporadas de inverno. A alternativa, nesses casos é fugir
deste desconforto, para as cidades vizinhas como Santo
Antônio do Pinhal, São Bento do Sapucaí em São Paulo, ou
para São Francisco de Xavier e Monte Verde em Minas
Gerais (MONTEIRO, 2002).
Foto 40: Danceteria e espaço para eventos em Vila Capivari.
Fonte: Adriana Silva Barbosa, 2005.
Mas em 2005 essa paisagem dinâmica de cidade
turística tende a se modificar. É que, devido à baixa cotação
do dólar em relação ao real, muitos paulistanos procuram
passar as férias no exterior, nas montanhas com neve.
Assim, Bariloche na Argentina, ganhou cerca de, 15 mil
turistas brasileiros em 2004 e em 2005, previam-se 21 mil
turistas. Esses dados mostram que o turismo em Campos
de Jordão pode ser afetado.
Foto 41: Centro de eventos em Vila Capivari. Fonte: Adriana
Silva Barbosa, 2005.
Foto 42: Restaurante em Vila Capivari. Fonte: Adriana Silva
Barbosa, 2005.
A competição entre cidades turísticas pode delinear
uma outra realidade (DUARTE, 2005).
§ § §
No processo de mudança de atividade econômica
para o turismo, a cidade começou a sofrer os efeitos do
turismo de massa. Segundo Ignarra (2003:36,37) uma
destinação turística começa a se tornar conhecida pelo
relato de alguns aventureiros, e com o tempo atrai novos
visitantes, aumentando a procura, até que a qualidade do
lugar começa a sofrer algumas interferências. Entre elas, “o
excesso da demanda provoca elevação dos preços, falta de
água, poluição das águas, má qualidade dos serviços”,
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
121
resultando na diminuição da qualidade do produto (a
cidade), da demanda turística e da renda do turista. Portanto
a cidade passa pela fase de descoberta, depois pelo
desenvolvimento e exploração do atrativo; e, finalmente,
ocorre uma saturação do destino turístico, resultando na
diminuição da qualidade do espaço urbano. Este processo
Ignarra (2003) denomina de “ciclo de vida de uma
destinação turística”, no qual um lugar ou cidade passa por
fases de investimento, exploração, desenvolvimento,
consolidação e estagnação, como ocorre hoje em Campos
de Jordão que caminha para uma fase de estagnação.
Também, pode-se perceber que não é somente a
sazonalidade que provoca a degradação da cidade, mas a
quantidade de pessoas em relação a sua capacidade de
infra-estrutura urbana. Segundo Ignarra (2003) há estudos
para determinar a capacidade de carga de uma destinação
turística, ou seja, determinar qual seria o número máximo de
visitantes por período de tempo que uma determinada área
pode suportar, sem que ocorram alterações no meio natural
e cultural. Nota-se que esta capacidade de carga está
relacionada com a infra-estrutura urbana básica. Assim, o
turismo praticamente obriga as cidades a terem uma infra-
estrutura extra, para que a degradação não ocorra, o que
não é possível na maioria dos casos.
Então, ocorre muito freqüentemente a estruturação
urbana somente das áreas de maior interesse turístico, pela
iniciativa privada que se volta para explorar o local. Tais
melhorias acabam valorizando os terrenos à sua volta e
essa valorização atua como um estímulo para que os
proprietários acabem vendendo suas terras, provocando
assim tanto o afastamento da população local das áreas de
interesse turístico, como uma atração de população
flutuante (FONTELES, 2004).
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
122
Portanto, a exemplo de Campos do Jordão, conclui-
se que o turismo pode trazer, por um lado, benefícios
econômicos à cidade e, por outro lado, problemas
ambientais e sociais, caso não esteja preparada para o
aumento dessa demanda turística.
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
123
3.2 Turismo e os Planos Diretores
Municipais
Pode-se dizer que os planos diretores de Campos do
Jordão agiram desde o início, como uma ferramenta de
viabilidade dos espaços turísticos. E, como tal atividade era
do interesse das elites locais possuidoras de grandes
propriedades, os planos aprovados, acabaram por criar um
zoneamento, que favorecia, em parte, o espaço urbano do
residente, mas principalmente, do turista (OLIVEIRA, 1991).
Inicialmente a proposta de planejamento urbano da
cidade se baseava pela sua atuação dentro da região como
“centro de tratamento de saúde da tuberculose” em área de
topografia elevada e de clima temperado de altitude. Mas
mesmo nessa ocasião, os gestores públicos já se voltavam
para o turismo, evidenciando nessa atividade um grande
potencial de desenvolvimento econômico. Assim, conforme
as idéias de médicos sanitaristas como os Drs. Domingos
Jaguaribe e Emílio Ribas, nas décadas de 1920 e 1930, as
possibilidades de tratamento terapêutico-turístico se
tornaram os principais fatores de ordenação territorial,
formando um espaço que correspondia às expectativas
tanto das atividades de lazer, como das atividades de
saúde.
Mas esta não era uma tarefa fácil visto que, um
requisito importante a uma Estância Turística segundo
OLIVEIRA (1991), é a criação de espaços associados ao
ócio e ao sossego, negando tudo o que lembre trabalho,
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
124
problemas sociais ou econômicos. Neste cenário lúdico, as
cidades devem estar bem apresentadas com um espaço
urbano “impecável”, vegetação exuberante, ruas limpas e
arborizadas.
Muitas cidades, talvez consigam apresentar tais
aspectos e, portanto comecem a ser visitadas. Mas uma vez
encontradas e exageradamente divulgadas por parte dos
próprios turistas, tem sua população “inchada”, interferindo,
portanto na qualidade de vida de seus moradores
(IGNARRA 2003, p.37).
Este foi o efeito negativo que uma demanda
excessiva de turistas provocou em Campos do Jordão. Tais
conseqüências, com o tempo, foram se tornando cada vez
mais visíveis na paisagem urbana e, segundo Almeida
(1999, p.88), o espaço do morador jordanense se tornou
muito aquém daquela imagem divulgada de um ambiente de
sossego e lazer. As condições de pobreza nos bairros
populares criaram um cenário completamente oposto ao dos
espaços destinados ao turismo. Portanto, a presença destes
dois cenários distintos, muito provavelmente não foi fruto do
acaso, mas sim o resultado de uma situação configurada
conforme as leis de organização e ordenamento do território.
O interesse de transformar a cidade em estância
turística não era somente dos proprietários locais, mas
também do governo estadual e federal, responsáveis pelas
construções de algumas edificações de maior importância,
na década de 1930 a 1940, como o Palácio de Veraneio
Oficial, Grande Hotel, o Auditório e o Horto Florestal. Foi
com essa preocupação construtiva e de ocupação territorial
que o Governador de São Paulo Armando de Salles Oliveira,
em 1935, nomeou uma comissão técnica presidida pelo
engenheiro Francisco Prestes Maia, para estabelecer um
plano de urbanização da cidade.
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
125
Após estudos das características geográficas,
geológicas, climáticas e ambientais da cidade, foram
apresentados alguns diagnósticos. Nestes, constatou-se
que, devido às condições topográficas, o desenvolvimento
urbano acontecia sempre de forma linear, ao longo do rio
Capivari, expandindo-se de forma transversal ao vale, em
direção às montanhas. Constatou-se também a necessidade
de encontrar meios de evitar a ocupação excessiva do solo,
principalmente em áreas de encostas, restringindo as
atividades industriais, de cura da tuberculose (saúde),
repouso e recreio (CPEU-FAUUSP, 1960)
Assim, a comissão estabeleceu algumas diretrizes
principais, entre elas pode-se citar o tratamento da artéria
viária principal e a limitação do desenvolvimento transversal,
estimulando a expansão urbana para as áreas próximas do
eixo principal. Também, decidiu separar a cidade por
atividades, direcionando-as para uma das principais vilas.
Desse modo, a administração pública e comércio principal
diversificado se localizaram na Vila Albernéssia; o comércio
local, ao longo da ferrovia e próximo das paradas de trem
(zona comercial); os sanatórios se encontravam a oeste de
Vila Albernéssia (zona sanatorial); as residências de
primeira classe na Vila Capivari (zona residencial turística);
e as residências operárias nos vales afluentes (zona
residencial popular).
Estas diretrizes influenciaram no plano da cidade e
no zoneamento proposto em 1937, pelo Eng. Prestes Maia,
no qual se configurou de forma transversal, com comércio
no eixo viário principal, seguindo-se residência na faixa
imediata, chácaras na seguinte e agricultura ou floresta mais
na periferia. As indústrias não poluentes poderiam se
instalar, porém em determinados pontos da cidade. A
estrada de ferro foi considerada parte essencial dessa
estratégia de zoneamento, devendo ser modernizada e
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
126
prolongada até Itajubá, fato esse que não ocorreu; o plano
contava com a implantação do comércio próximo às
estações ferroviárias, com tratamento urbanístico nas
laterais entre ferrovia e as ruas, com gramados, construção
de abrigos para paradas de trem, plataformas e sinalização
pertinente. Quanto aos acessos viários, esse plano
propunha a construção de uma avenida principal que
acompanhasse a via férrea, dos dois lados e a melhoria das
estradas que ligam Campos do Jordão á Pindamonhangaba
e á São José dos Campos (CPEU-FAUUSP, 1960).
Mapa 12: esquemático: Plano Diretor de Prestes Maia de 1937.
Fonte: modificado de DA SILVA, 2001.
Como a paisagem é um dos elementos que
fortemente exercem atração sobre os turistas, foram
propostas algumas intervenções urbanas, que valorizassem
certos locais turísticos, com a instalação de “pavilhões”
equipados com sanitário, telefone e água encanada em
alguns pontos turísticos com seus mirantes, como no pico
Itapeva, na Fazenda Gavião Gonsaga, com vista para o
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
127
Ribeirão do Lageado, no Morro do Elefante, no Pico do
Imbiri e na Pedra do Baú.
Também, a fim de preservar o meio ambiente, o
plano propunha a criação de incentivos fiscais para que os
proprietários preservassem suas áreas verdes; propunha a
delimitação e proteção de uma faixa marginal ao rio
Capivari, que existe ainda hoje; a instalação de serviços de
tratamento de esgotos sanitários para as três vilas; e a
coleta do lixo que seria feita através de containers que
seriam levados por caminhões e depois transferidos aos
vagões da E. F. Campos do Jordão; (PAULO FILHO, 1986,
p.629-30).
Com relação ao turismo, os técnicos da comissão
enfrentavam uma divergência entre si, sobre quantos
turistas poderiam atrair, ou restringir essa população
flutuante, para que as famílias dos grandes proprietários de
terras pudessem usufruir o sossego de seus imóveis. Alguns
argumentavam que não se justificaria a aplicação de
grandes investimentos nessa estância turística de Campos
do Jordão, unicamente para o usufruto de poucos, pois se
localizava próxima dos dois maiores centros urbanos, Rio de
Janeiro e São Paulo. E, diziam, caso houvesse problemas
com o aumento de turistas, estes poderiam ser atenuados
através do planejamento urbano (PAULO FILHO, 1986,
p.629).
Tais propostas foram aprovadas em 1937, pelo
governo federal e a cidade passa a ser ordenada pelo
primeiro Plano Diretor, com o seguinte zoneamento: zona
residencial, zona sanatorial, zona turística e um núcleo de
comércio e serviços nos principais núcleos urbanos.
Depois, entre 1951 e 1952, novos estudos foram
realizados e um novo Plano Diretor foi aprovado sob a
direção do arquiteto Zenon Lotufo e com o apoio do Centro
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
128
de Planejamento de Campos do Jordão, uma organização
liderada por representantes da sociedade civil, empresários
do setor hoteleiro, mobiliário e comercial.
Em 1958, um novo plano diretor começou a ser
estudado a mando do governo estadual, sendo formada a
Comissão Técnica do Plano Diretor em parceria com a
Secretaria de Viação e Obras Públicas a CPEU USP -
Centro de Pesquisa e Estudos Urbanísticos da Universidade
de São Paulo, sob a supervisão do arquiteto Zenon Lotufo20
,
nomeado a diretor geral.
Essa comissão criou o “Relatório e Pranchas do
Planejamento Territorial” (1960), contendo levantamentos
aerofotogramétricos do município, além de entrevistas com
os moradores. A pesquisa então efetuada permitiu a
elaboração de propostas para um novo plano, que ao serem
adotadas, provocaram mudanças importantes na paisagem
urbana de Campos do Jordão. Dentre elas esta a
autorização para a construção de edifícios habitacionais
multifamiliares, dentro de uma faixa situada ao longo do rio
Capivari; a divisão das áreas residenciais, de acordo com
propostas de densidade; e a concentração das áreas
comerciais em unidades de vizinhanças nos núcleos de
Albernessia, Jaguaribe e Capivari.
Em seguida aos diagnósticos levantados pelo Plano
Piloto (CPEU-FAUUSP), deu-se continuidade ao trabalho e
em 1962 foi oficialmente aprovado, conforme Lei nº 430 de
12 de Julho, pelo Prefeito José Antonio Padovan um novo
Plano Diretor.
20
Em 1958, o Governador Jânio Quadros determina a realização do
planejamento das Estâncias de São Paulo, mediante convênio com as
Prefeituras Municipais, o Departamento de Obras Sanitárias da Secretaria
de Viação e Obras Públicas e a Reitoria da Universidade de São Paulo
(PLANO DIRETOR 1960).
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
129
Posteriormente, com o apoio financeiro da FUMEST
- Fomento de Urbanização e Melhoria das Estâncias
Turísticas do Estado de São Paulo - contratou-se o escritório
Jorge Wilheim Arquitetos Associados para a elaboração de
trabalhos relacionados com a preservação da paisagem, uso
do solo, sistema viário e revisão do código de edificação21
.
Verifica-se que até 1970 uma considerável produção
de estudos e planos foi realizada, sendo uma produção um
pouco incomum para uma cidade deste porte. Conforme a
Fundação SEADE22
, o plano diretor é um instrumento básico
da política de desenvolvimento das cidades, que se tornou
obrigatório para os municípios com mais de 20 mil
habitantes, na década de 1980, com a Constituição Federal
de 1988. E a lei nº 10.257/01 do Estatuto da Cidade ampliou
esta obrigatoriedade para os municípios integrantes de
áreas de especial interesse turístico23
.
Portanto, muito antes de o plano diretor se tornar
uma política obrigatória, Campos do Jordão já possuía uma
considerável produção de estudos, planos e leis que, o que
não era comumente encontrado. Por sua vez, pelo seu
processo histórico pode-se presumir que, devido à grande
procura por parte dos visitantes, a necessidade de organizar
e regulamentar o espaço para comportar as atividades
necessárias, começou muito mais cedo do que nas outras
cidades.
Com tantos estudos, observa-se que o espaço
urbano poderia ter obtido resultados bem diferentes da
situação encontrada atualmente. Analisando as
21
Tais estudos chamaram a atenção, tanto do SEMA – Secretaria do
Meio Ambiente como do Programa do Meio Ambiente da ONU, colocando
a estância em destaque na busca da preservação ambiental.
22
www.seade.gov.br/produtos/plandiretor.
23
Também a Constituição Paulista de 1989, também tornou obrigatório
para todos os municípios do estado, conforme Artigo 181, Parágrafo 1º,
do Capitulo II.
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
130
características de ocupação e de legislação urbana
(políticas urbanas) em que se encontrava a cidade ao longo
do tempo não houve praticamente muitas mudanças no
aspecto estrutural da cidade. Apenas preservou-se a divisão
inicial entre bairros dos “doentes” e dos “sãos”. E, como
conseqüência desta divisão, a cidade passou a conviver
com dois cenários bem divergentes, respectivamente as
áreas de população de baixa renda e as áreas de população
flutuante.
Portanto, os planos diretores, com seu zoneamento
segregado, desde o primeiro momento agiram como uma
ferramenta de viabilização de espaços turísticos. O Plano
Diretor de 1962, elaborado numa fase de promoção da
cidade em função da economia da tuberculose e da
economia do turismo, criou a Zona Sanatorial longe das
áreas de Interesse Turístico. As leis de 1978 constituídas de
Código de Diretrizes do Sistema Viário, Parcelamento do
Solo, Uso do solo, Proteção da Paisagem e Código de
Edificações reforçam tal divisão, criando mais restrições de
uso e ocupação do solo para o Parque Sanatorial e para as
áreas preservação ambiental e de interesse turísticos. E, o
plano diretor de 2003 localiza as zonas especiais de
interesse social em áreas da extinta zona sanatorial.
Assim, para compreender melhor a influência do
turismo nos Planos Diretores, passa-se a sistematizar e
discutir as transformações decorrentes, no espaço urbano e
rural da cidade. Destaca-se, portanto, para análise, o Plano
Diretor de 1962, elaborado pelo CPEU-FAUUSP, que foi
feito com base no Plano Piloto de Campos do Jordão de
1959, que se preocupou mais com o zoneamento da cidade;
o Plano Diretor de 1978, elaborado pelo arquiteto Jorge
Wilheim, constituído de Código de Uso do Solo, Código de
Edificações, Código de Diretrizes do Sistema Viário e
Parcelamento do Solo; e o Plano Diretor de 2003, elaborado
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
131
pelo ETEPLA - Escritório Técnico de Planejamento da
Prefeitura e pelo escritório Jorge Wilheim Consultores
Associados, já em consonância com as exigências do
Estatuto da Cidade24
, constituindo-se de objetivos gerais e
estratégicos, ações estratégicas e políticas setoriais.
O quadro 03 a seguir sistematiza os principais
instrumentos de planejamento urbano elaborados para
Campos do Jordão.
24
A Lei nº 10.257/200, conhecida pelo Estatuto da Cidade, regulamenta os
capítulos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988, os quais tratam da
política urbana federal.
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
Adriana Silva Barbosa
132
Quadro 03 – Relação de planos e lei de zoneamento em
Campos do Jordão
Período Lei/Decreto
1935 -
1937
_______________ Plano e Lei de Zoneamento
proposto por Prestes Maia.
1951 -
1959
Lei nº 280 de
16/10/1959
Plano Piloto de Zenon Lotufo.
1960 Lei nº 359 de
19/12/1960
Definição das zonas urbana e rural
do município.
1958 -
1962
Lei nº 430 de
12/07/1962
Plano Diretor elaborado pela CPEU
– Centro de Pesquisa de Estudos
Urbanísticos/ FAUUSP.
1968 Lei nº 731 de
10/04/1968
Criação da ETEPLA – Escritório
Técnico de Planejamento e do
Conselho de Desenvolvimento de
Campos do Jordão.
1975 -
1978
Lei nº 1094 de
04/01/1978
Lei nº 1095 de
04/01/1978
Lei nº 1096 de
04/01/1978
Lei nº 1097 de
04/01/1978
Plano de Jorge Wilhein composto
pelo Código de Diretrizes do Viário,
Código de Uso do Solo e Proteção
à paisagem, Código de
Parcelamento do Solo, e Código de
Edificações.
1985 Lei nº 1538 de
13/12/85
Lei de Zoneamento – ETEPLA
2000 -
2003
Lei nº 2.737 de
02/05/03
Plano Diretor Estratégico –
ETEPLA e Jorge Wilheim (em
andamento)
Fonte: Prefeitura de Campos do Jordão, www.camaracamposdojordao.sp.gov.br
Plano Diretor de 1962
O Plano Diretor do Município de Campos do Jordão,
instituído através da Lei nº 430 no dia 16 de Outubro de
1962, foi elaborado num momento em que os gestores
públicos apostavam na transformação de Campos do Jordão
no mais importante centro turístico do Brasil. Uma cidade
que se conectaria com as demais estâncias de São Paulo,
sul-mineiras e do Rio de Janeiro. Portanto o plano coloca a
Espaço Urbano e Turismo:
o caso de Campos do Jordão, SP
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133
cidade dentro de um papel de centro polarizador das
estâncias turísticas vizinhas.
Observa-se que esta década foi marcada pelas
ações do governo Estadual, que investiu boa parte de seus
recursos financeiros para a construção de equipamentos
hoteleiros, tanto em Campos do Jordão, como também nas
outras estâncias climáticas, turísticas e hidrominerais do
estado.
Visto que o plano de 1962 foi elaborado a pedido do
governo Federal, o caderno de diagnóstico elaborado pela
equipe da CPEU – FAUUSP, em 1960, no item
“Fundamentos do Plano”, coloca a verdadeira intenção do
planejamento territorial de agir como uma ferramenta de
viabilização do desenvolvimento do turismo através da
ordenação territorial (CEPEU-FAUUSP, 1960).
Esta ordenação também era necessária visto que,
pela grande crise econômica em que o país atravessava
com uma inflação anual 25,4% a 89% entre 1960 a 1964,
muitos proprietários aproveitavam para retalhar suas terras
e as vender de forma indiscriminada (CPEU-FAUUSP,
1960). Depois do golpe militar em 1964, o governo iniciou
um programa de estabilização econômica reduzindo a
inflação para 28% em 1967, o que resultou no aumento da
procura por estes loteamentos para a construção de sua
residência (SKIDMORE, 2003).
Assim como reflexo de tais orientações, a zona
urbana ficou constituída por: zonas residenciais de acordo
com as densidades 50, 140 ou 200 pessoas por hectare;
zonas comerciais divididas em Central e de Unidades de
Vizinhança; zona sanatorial para abrigar todos os
equipamentos de saúde e zona para indústrias leves.
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A definição destas zonas limitou as áreas
sanatoriais, em áreas bastante distantes das zonas
residenciais de menor densidade, voltadas para a terceira
residência. E, também limitou as atividades comerciais, ao
longo de eixo viário principal nas unidades de vizinhanças.
Esta ordenação territorial veio a ser instituída numa fase em
que, segundo a equipe da CPEU-FAUUSP já se notava o
aumento de loteamentos clandestinos.
O plano permite a formação de quadras com áreas
máximas de 450 metros de comprimento por 80 metros de
largura, em qualquer uma das categorias de zoneamento,
devendo ter a cada 150 metros, uma passagem de 3 metros
de largura. O loteamento de quadras, em áreas urbanas
deveria ter no mínimo 10 metros de frente por 25 metros de
fundo. Nas áreas rurais, o plano permite a formação de lote
com área mínima de 5.000 m2 e a formação de unidades
residenciais em “super-quadra” com áreas máximas de 600
m de comprimento por 300m de largura. Cada loteamento
deveria reservar uma parcela de áreas livres equivalente a
16 metros por habitante e todo plano de loteamento deveria
ter uma área reservada para recreação e de uso
institucional, podendo-se associá-los ao turismo. O plano
proibia o loteamento de terrenos impróprios para a
edificação, inconvenientes para a habitação ou que
prejudicasse as reservas florestais, outra área de
importância turística que provavelmente, estaria relacionada
ao ecoturismo. Também, já nessa época, essas áreas não
poderiam acolher qualquer atividade que fosse incompatível
com o turismo.
Com relação à habitação o plano estabelece zonas
residenciais divididas em residências isoladas unifamiliar
com densidade de até 50 pessoas e área mínima de
1.000m2; densidade de 140 pessoas com área mínima de
360 m2; densidade de 200 pessoas com área mínima de
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250 m2; residência multifamiliar destinadas à construção de
edifícios residenciais e de uso comercial; edifícios
residenciais com área não inferior a 50m2 e 01 vaga de
estacionamento; uma edificação secundária isolada da
edificação principal, muito utilizada pelos “caseiros”. As
áreas residenciais foram divididas em 20 setores ou
Unidades de Vizinhança, para facilitar a organização de
projetos de redes de água de esgoto, energia elétrica,
escolas, parques e outros equipamentos sociais. Observa-
se assim que essas densidades definiram praticamente o
espaço turístico, pois as de menor densidade puderam se
tornar bairros turísticos, como Vila Capivari.
Para estimular a ocupação ao longo na avenida
principal, o zoneamento permitiu a construção de edifícios
de habitação multifamiliar, de qualquer número de
pavimentos, respeitando-se, porém, os coeficientes de
utilização e de ocupação dos lotes. Também permitiu no
pavimento térreo dos edifícios, a instalação de lojas como
confeitarias, salões de chá, instituto de beleza, bancos,
agências de turismo entre outros serviços, desde que não
prejudicasse as atividades turísticas. Tal zoneamento
modificou a paisagem urbana e acabou despertando os
interesses das incorporadoras, para a construção de
edifícios de apartamentos em sistema de condomínios
verticais.
Também estabeleceu uma zona comercial do tipo
linear, ao longo do rio Capivari, que poderia se localizar nas
unidades de vizinhança, permitindo a construção de edifícios
destinados ao comércio, serviços, cinemas, confeitarias,
postos de abastecimento de automóveis, escolas, igrejas
entre outros. Esse comércio precisava estimular o turismo e,
portanto, deveria se ater a segmentos como estes, trazendo
qualidade ao local.
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136
A criação da zona sanatorial foi delimitada de modo
a não somente acolher os sanatórios mas a todas as
atividades que permitissem seu funcionamento, como
edifícios e equipamentos para tratamento de saúde, serviços
de suporte como lavanderia, laboratórios de análises e
casas de empregados. Para os sanatórios que já existiam e
que com a delimitação do zoneamento se encontravam fora
de área permitida, não poderiam aumentar suas instalações.
Quanto ao turismo, foi criado a ZT - Zona de
Interesse Turístico, uma zona localizada no entorno dos
pontos turísticos, destinadas à preservação da paisagem,
proibindo a construção de qualquer tipo de edificação. Esta
lei se aplicava às áreas próximas aos mirantes como o pico
do Itapeva e o Morro do Elefante. Ainda referente ao
turismo, nas zonas rurais o plano considerava Unidades
Turísticas, tanto em áreas existentes, como em outras a
serem criadas, desde que possuíssem alguma atração
turística, hospedagem, balneários ou qualquer outro
estabelecimento destinado à recreação.
Com relação à organização da estrutura viária, o
Plano Diretor de 1962, dividia as vias de acessos viários em
vias principais, secundárias, principais e secundárias. As
vias de acesso situadas nas zonas urbanas deveriam ter 9
metros de largura, 6 metros de leito e 1,5 de passeio em
ambos os lados; as situadas nas zonas rurais deverão ter 6
metros de largura e recuo de 10 metros da construção.
Nesta década, a cidade já apresentava tráfego intenso, nos
meses de junho e julho, nas estradas municipais que fazia
ligação com os núcleos rurais, os hotéis e os pontos de
atração turística. Portanto já se tornava necessário o
estabelecimento de normas quanto a largura das vias,
conforme sua categoria (CPEU-FAUUSP, 1960).
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137
A zona rural foi dividida em três usos: a zona
industrial, destinada às atividades que não fossem nocivas
ao meio ambiente; a zona de Interesse Turístico com as
mesmas recomendações das ZT da área urbana; e a zona
rural propriamente dita. Dentro destes núcleos rurais
permitia-se a construção de edifícios destinados a escolas,
oficina, comércio, indústria rural, clubes, igrejas ou capelas,
residências e outros que tenham a finalidade de atender a
população rural; vedava a instalação de qualquer atividade
que fosse incompatível com o turismo.
Com relação a estas áreas a equipe da CPEU-
FAUUSP notou que a procura turística também provocou o
loteamento desordenado das terras, fazendo com que seus
proprietários abandonassem suas atividades agrícolas e
dessem características urbanas, a fim de serem vendidas.
Para impedir esta situação, a equipe propunha a criação de
clubes agrícolas, constituídos por fazendas onde os turistas
seriam convidados a participar das atividades rurais; a
Pisicultura, com a construção de viveiros que pudessem ser
visitados por turistas; e a floricultura também aberta à
visitação. Também estimulam a criação de Unidades
Turísticas nas áreas rurais, contendo em cada uma delas,
um Centro de Atração Turística que poderia ser constituído
de hotel, clube esportivo ou algum outro atrativo turístico
desde que respeitado as áreas mínimas determinadas pelo
plano. Dentro das unidades turísticas ficou permitido a
construção de hotéis, balneários, clubes esportivos, igrejas,
escolas, restaurantes, bares e qualquer outro
estabelecimento destinado à recreação e repouso. Destaca-
se que neste Plano Diretor as áreas de interesse turístico
estão mais situadas nas áreas rurais.
Nas questões de preservação ambiental, o
zoneamento proposto pelo Plano Diretor de 1962, divide as
áreas verdes situadas no território urbano em: Reservas
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138
Florestais, Recreio Ativo (áreas projetada para praça de
esporte) e, Recreio Contemplativo (áreas projetadas com
arborização, ajardinamento, retificação dos respectivos rios
e formação de alguns lagos). Também são colocados sobre
a proteção do município, todos os acidentes geográficos
(morro, gruta, pedra, lagos e matas naturais) considerados
de atração turística.
As plantas a seguir apresentam a situação do
espaço de Campos do Jordão em 1960, conforme
levantamento elaborado pela CPEU – FAUUSP, para o
desenvolvimento do Plano Diretor de 1962.
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(os mapas estão anexado na impressão final)
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Ciclos da tuberculose e turismo influenciaram formação de Campos do Jordão
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Ciclos da tuberculose e turismo influenciaram formação de Campos do Jordão

  • 1. A CIDADE DE CAMPOS DO JORDÃO.
  • 2. 3.1 Processo de Urbanização influenciado pelos ciclos da tuberculose e do Turismo. Como o objetivo deste trabalho é analisar o processo de formação do espaço urbano, torna-se importante compreender a influência da atividade da cura em contraposição com a atividade turística. Um lugar em que, o espaço urbano era composto de sanatórios e pensões voltadas para tísicos, e ao mesmo tempo, por hotéis e pousadas, formando uma imagem oposta, de uma cidade saudável voltada para o descanso e o repouso de turistas. Esta situação acabou por criar duas cidades que por muitos anos conviveu lado a lado. Assim, pretende-se neste capítulo, destacar as fases marcantes da implantação da atividade turística no município, partindo da análise do processo de transição da imagem de uma cidade “enferma” para uma estância turística. E, deste modo, procura-se entender quais foram os papéis desempenhados pela cidade durante os dois ciclos (tuberculose e turismo), dentro de sua área de influência, ou seja, a região da serra da Mantiqueira e o Estado de São Paulo. Em seguida, focalizando os planos diretores da cidade (1960, 1978 e 2003), procura-se analisar frente a suas proposições o que foi implantado e quais os efeitos provocados no ambiente urbano que influenciam nas atividades turísticas.
  • 3. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 85 1800 a 1930 – A cura da tuberculose como fator de formação do espaço urbano. Segundo ANTUNES (2000), a consolidação dos grandes centros urbanos em todas as regiões do país, reforçou a preocupação com a proliferação da tuberculose, devido às precárias condições das habitações decorrentes do movimento migratório. Numa época em que eram poucos os programas de assistência e controle da doença, algumas medidas passaram a serem tomadas pelo poder público. Diversas leis e resoluções normativas foram promulgadas entre 1899 a 1904, determinando várias obrigações relativas ao controle da tuberculose, como a desinfecção domiciliar; a retirada dos enfermos dos cortiços; o isolamento dos doentes nos hospitais; e proibições quanto ao exercício profissional, se não apresentar uma abreugrafia, como prova de saúde. Nas grandes cidades, as populações de precária condição socioeconômica eram as mais vulneráveis ao contágio da doença. Esta população, em sua maioria composta de migrantes, vivia em pensões e cortiços em espaços exíguos, sem nenhum cuidado com a higiene. A aglomeração de pessoas vivendo nestas condições era muito favorável à transmissão e disseminação da tuberculose, que é transmitida via oral (ANTUNES, 2000)1 . Assim, o medo de contágio pela população provocou alguns procedimentos regulamentados por lei, como a obrigação de apresentar uma abreugrafia. Conforme ANTUNES (2000, p. 374), o cidadão, ao solicitar a emissão da carteira de trabalho, ou ao se candidatar a uma vaga de 1 Esta doença consiste na infecção produzida por uma bactéria (mycobacterium tuberculosis) que se inicia nos pulmões podendo atingir outras áreas do corpo. Assim alguns preceitos eram recomendados pelos médicos sanitaristas para evitar o contagio, como o uso de lenço ao bocejar, espirrar ou tossir; e manter constante distância ao rir e falar outros (ANTUNES, 2000).
  • 4. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 86 emprego, ou ao se matricular na escola, devia ser submetido a uma abreugrafia, método este que consistia em fotografar a imagem observada pela radioscopia, do pulmão. Da posse do registro fotográfico dos pulmões, o cidadão comprava um selo médico em bancas de jornal, juntava o certificado de vacinação contra a varíola e levava toda essa documentação para a apreciação do médico que emitiria um atestado de saúde (ANTUNES, 2000, p. 374) Quando a doença era comprovada, o enfermo perdia o direito de ocupar uma vaga de emprego e de ir a eventos públicos e coletivos como teatro, cinemas e estádios, além de não conseguir moradia. Portanto, este documento (atestado de saúde) era um requisito importante, para obter o direito de conviver em sociedade e de fazer parte das atividades coletivas da cidade. Deste modo, pode-se dizer que, ao mesmo tempo em que, a abreugrafia detectava quem era tuberculoso com a finalidade de dar toda a assistência médica necessária para sua cura, por outro lado, causava um grande efeito de exclusão do enfermo da cidade. Neste contexto, ao descobrir a climatoterapia, Campos do Jordão começa a atuar como um lugar de refúgio dos excluídos da vida citadina, que buscavam cura. As pessoas que, por causa da doença viviam à margem da sociedade, passam a ver Campos do Jordão, como um lugar em que o enfermo é “bem vindo”. Assim, a cidade foi se adaptando a essa atividade, até que os tuberculosos puderam contar com uma cidade estruturada para o atendimento dos doentes com casas de saúde, sanatórios e pensões. Assim, estabeleceu-se uma dinâmica de prestação de serviços, em função do tratamento da tuberculose, entre as grandes cidades, Rio de Janeiro e São Paulo, e a cidade
  • 5. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 87 serrana de Campos do Jordão. Nas capitais, o paciente submetia-se aos exames fazendo uma abreugrafia nas Santas Casas, onde não havia ainda um atendimento específico para os infectados. Depois, eram encaminhados para os dispensários, lugares onde se faziam o diagnóstico e encaminhamento para consultórios médicos e serviço de enfermagem2 ; nestes locais fazia-se também o ensino de noções básicas de higiene e assistência médica e social aos pacientes inscritos. Nesta etapa, se a doença não regredisse, partia-se para o tratamento intensivo, através do isolamento total do tuberculoso nos sanatórios. Nesses sanatórios o isolamento servia também como forma de evitar a disseminação da enfermidade. (ANTUNES, 2000) Nota-se deste modo que, os sanatórios eram o último recurso utilizado pelo paciente em busca da cura e, como a maioria desses pacientes já se encontrava excluída das atividades coletivas das cidades, não era difícil sair da capital em direção a cidade serrana. E, devido a todas as etapas, pelas quais, o doente passava nas cidades mais desenvolvidas, os sanatórios de Campos do Jordão eram a “última parada”, ou seja, a última chance para se alcançar à cura. Dentro deste contexto, Campos do Jordão funciona com um lugar acolhedor de enfermos de todo o Brasil3 . Pessoas de várias cidades do país, com tuberculose migravam para a serra, em busca de abrigo e de cura. Segundo ANTUNES (2000), a região da serra da 2 Também, nos dispensários, dava-se assistência social aos mais pobres, como a distribuição gratuita de medicamentos, roupas e alimentos, através do apoio das instituições filantrópicas (ANTUNES, 2000). 3 Nas décadas de 1930 e 1940, mais de 10% dos óbitos no Estado de São Paulo eram devidos à tuberculose e não havia leitos para esses doentes. Mas o governador do estado, Dr. Adhemar de Barros (1947- 1951), deixou o Estado com cerca de 800 leitos para este fim e, no segundo governo, acrescentou mais 9 mil. Fonte: http://www.adhemar.debarros.nom.br/inicio.htm.
  • 6. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 88 Mantiqueira era chamada pelos doentes de “montanha mágica” (como fala Thomas Mann de 1984, no livro com esse título), em que todos os tísicos almejavam ir para esse lugar. Assim alguns médicos sanitaristas começam a se interessar pela região, realizando pesquisas sobre o clima e adquirindo terras para a construção de empreendimentos voltados para atender os tuberculosos. Um exemplo a ser lembrado é o projeto do Dr. Emílio Ribas referente à construção de uma vila sanatorial que se tornou a Vila Capivari em Campos do Jordão. O médico projeta essa vila com toda a infra-estrutura de uma cidade, com a instalação de transporte ferroviário (E.E.F. Campos do Jordão) totalmente voltado para receber e tratar os doentes. Mas, mesmo antes das idéias desse médico sanitarista, a cidade inteira já havia praticamente se convertida em um imenso sanatório. Havia, além dos asilos e hospitais ali instalados, diversas pensões que recebiam os doentes mais abastados do Rio de Janeiro e de São Paulo, e até residências que eram alugadas para os tísicos (ANTUNES, 2000). Contudo, por ser uma “cidade” para muitos pacientes “a última parada” do trem, como era conhecida. Segundo GOFFMAN (apud ANTUNES, 2000, p.371), esses sanatórios serviam muitas vezes de “antecâmera da morte, na qual a cura, embora possível, parecia distanciar-se com insistência”. Os primeiros povoados Antes da cidade se voltar para o atendimento dos tuberculosos, a região era ocupada por grandes fazendas de
  • 7. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 89 criação de gado4 , e o clima já se mostrava favorável também a esta atividade econômica. A primeira fazenda foi a do Sr. Inácio Caetano de Vieira Carvalho5 , a Fazenda Bom Sucesso, conhecida pela qualidade do gado visto que o clima contribuía na cura de doenças como carrapato e vermes (PAULO FILHO, 1986). Inácio Caetano de Vieira Carvalho ao falecer, teve sua propriedade vendida por seus filhos em 1825, para o Brigadeiro Manoel Rodrigues Jordão que jamais a visitou. Os filhos do Brigadeiro também não deram muita importância às propriedades herdadas, e com o falecimento dos pais, dividiram e venderam entre si a fazenda (PAULO FILHO, 1986, p.53-57). Destacam-se entre os compradores das terras antes pertencentes ao Brigadeiro Jordão o Sr. Matheus da Costa Pinto, Dr. Domingos José Nogueira Jaguaribe Filho e Dr. Emílio Ribas que mais tarde vieram a se empenhar na luta contra a tuberculose. Estes proprietários acabaram sendo responsáveis pela formação dos três principais núcleos urbanos que caracterizou a cidade de Campos do Jordão: Vila Albernéssia, Vila Jaguaribe e Vila Capivari. Assim o primeiro povoado começou a se formar por volta de 1874 já com a tendência de ser um lugar de repouso para se tratar da saúde, principalmente de “doenças do peito”. Mesmo sendo a região ocupada somente por fazendas, outras atividades nelas empregadas, também se voltavam para os benefícios do clima. Conforme PAULO FILHO (1986) há o relato do fazendeiro Francisco 4 A região onde se encontra a cidade foi primeiramente ocupada por Manoel Antônio Francisco Pimentel que abandonou as terras, por não resistir ao rigoroso frio e voltou a Portugal. 5 A região, na década de 1880 passou por problemas de divisas de terra entre a capitania de Minas Gerais e São Paulo, havendo um encontro entre paulistas e mineiros para fixar uma linha divisória entre ambas as capitanias (PAULO FILHO, 1986).
  • 8. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 90 de Paula Vicente de Azevedo, que por volta de 1800 costumava comprar escravos tísicos que ao mandar para sua fazenda situada nos Campos da Mantiqueira ficavam curados; também em 1894, criou-se na sede das 36 propriedades do Barão de Bocaina, o Sr. Francisco Vicente de Paula de Azevedo, a primeira estância “climato-turística” do Brasil, nos moldes europeus. Na sua propriedade, freqüentada pela elite da época havia “pitorescos chalés esparramados pelos jardins” o que acabou chamando a atenção da imprensa da época. O jornal “O Estado de São Paulo” de 27/10/1895 denominou a fazenda São Francisco de “hygienópolis situada quasi na raia de São Paulo e Minas” (apud PAULO FILHO, 1986, p. 581). Nesta fase, por volta de 1870 eram poucas as pessoas que conheciam a eficiência terapêutica do clima na atividade da cura. A região continuava sendo habitada por grandes proprietários como o Barão de Bocaína, o que dificultava a comunicação entre os habitantes da região. Além disso, quem tivesse a coragem de subir a serra pelas trilhas íngremes eram surpreendidos pelo frio intenso (PAULO FILHO, 1986) 6 . Matheus da Costa Pinto ao comprar as duas fazendas (Humaitá, Baú e Imbiri) estava consciente da eficiência do clima na cura da doença. Então, em parte de sua fazenda, instalou atividades de comércio e ergueu uma pensão destinada primeiramente a “pousadas dos negociantes de gado, campeiros e forasteiros” (PAULO FILHO, 1986, p.58,65). Mas, segundo PAULO FILHO, (1986, p.67), “as pensões não objetivavam somente acolher os comerciantes, mas a afluência de uma nova categoria de 6 Os primeiros povoamentos do Vale do Paraíba entre as décadas de 1700 e 1800, se concentravam nas vizinhanças da São Paulo e das Vilas de Sorocaba, Itu, Jundiaí, Mogi das Cruzes e ao longo do rio Paraíba até Guaratinguetá (PAULO FILHO, 1986).
  • 9. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 91 pessoas, os doentes”. Segundo o anúncio da época no jornal A Província de São Paulo, de 27/04/1879 (apud PAULO FILHO, 1986): O hotel tem o arranjo de decência precisa á recepção de famílias. Cuida-se da admissão de maior pessoal para o dito hotel, atendendo a que, produzindo os referidos Campos à cura de pessoas afectadas de Thysica, está sendo grande à afluência de pessoas enfermas. Assim, foi o fazendeiro Sr. Matheus da Costa Pinto quem deu início ao primeiro núcleo, destinado aos viajantes atraídos pela excelência do clima em função do tratamento da tuberculose (MASAKAZU, 2002). Dado o aumento do fluxo de tísicos, Matheus construiu a Pensão São Matheus e mais tarde a transformou no Hotel de São Matheus do Imbiri, destinado aos doentes. Outros hotéis também foram construídos, mas a principal clientela eram os enfermos. Havia uma mobilização da sociedade, do governo e dos proprietários para ajudar os enfermos e melhorar a hospitalidade da cidade. Campos do Jordão, mesmo não estando preparada para receber tantos doentes, foi ajudada pelos proprietários de terras, como Matheus da Costa Pinto, facilitando a estadia, condução e hospedagem, divulgando essa oportunidade pela imprensa. Também, fez uma doação de terrenos para que o governo pudesse instalar logradouros públicos e mais casas para abrigar os tísicos. Conforme o jornal “A Província de São Paulo” de 24 de maio de 1882 (apud PAULO FILHO 1986, p.69): Actualmente, existem ahí dous bons hotéis, devendo abrir- se em breve, mais um, além da Casa de Saúde dos Drs. Romeiro e Godoy; existem duas casas de negócios e dentro em pouco tempo, abrir-se-lhão mais duas; tem os Campos uma bonita e ellegante capella, cujo custo depois d’ella concluída, não será inferior a dez contos de reis; tem mais vinte e tantas casas habitadas, algumas permanentemente; uma linha de correio particular;
  • 10. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 92 açougues constantes e regulares, devendo em breve abrir- se uma padaria e, inicia-se e prossegue-se na construção de muitas casas. Assim, em 1891, na atividade de combater a doença, o Dr. Domingos José Nogueira Jaguaribe Filho também deu sua contribuição. Ele adquire terras de vários proprietários, entre eles, as terras do Sr. Matheus Costa Pinto, visando transformar a região em estação de repouso e cura. Portanto o núcleo urbano denominado Vila de Matheus do Imbiri, passa a se chamar Vila Jaguaribe, tornando-se conhecida pela população como Vila Velha. Outro núcleo urbano, Albernéssia7 , foi formado por volta de 1900, pelas propriedades do Dr. Robert John Reid, que tinha recebido essas terras como pagamento de dívida. A empresa para o qual trabalhava (Casa Nathan), o havia contratado para medir a propriedade localizada na Fazenda Natal em Campos do Jordão e, ao entrar em falência, propôs a Reid que recebesse as terras em pagamento dos serviços prestados. Então o Dr. Robert John Reid se muda para a cidade e passa a doar vários lotes para quem se interessasse. Doou terras para a construção do Sanatório Ebeneser; para a Sociedade Mackenzie, no Umuarama; e para a Sociedade de Educação e Assistência “Frei Orestes”. Além dos esforços do Dr. Domingos Jaguaribe em 1912 por iniciativa do Dr. Emílio Ribas tem-se a inauguração da Estrada de Ferro, bem como sua eletrificação dez anos depois (PLANO DIRETOR, 1962). Com a estrada de ferro em funcionamento, o ritmo do desenvolvimento urbano acelerou, porém de forma desordenada e ligada à atividade de cura. Também, no mesmo ano, o Dr Emílio Ribas, na tentativa de estabelecer uma área exclusiva para os 7 Nome dado pelo proprietário, o Dr. Robert John Reid, derivado dos nomes das cidades de Aberdeen e Inverness, na Escócia (PAULO FILHO 1986).
  • 11. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 93 sanatórios, projeta uma vila sanitária. O projeto previa além dos sanatórios, um hotel, um teatro, a residência de veraneio do Presidente do Estado, uma igreja, parques e praças. Ocorreu, porém, que quando descobriram outras formas de tratamento da tuberculose, a vila, ao invés de ser uma vila sanitária, acabou sendo vendida para o embaixador José Carlos de Macedo Soares que fundou a Companhia de Melhoramentos Capivari, dando um novo rumo ao processo de urbanização, que passou então a se relacionar com o loteamento e venda de lotes para turistas (PLANO DIRETOR DE 1962). Desse modo, já em 1915 haviam sido formadas as três vilas que se caracterizaram como Distritos: a Vila de São Matheus do Imbiri, também conhecida como Vila Velha, que mais tarde passou a se chamada de Vila Jaguaribe; a Vila Emílio Ribas, que foi planejada como uma vila sanitária passou a se denominar Vila Capivary; e a Vila Nova que posteriormente veio a se denominar Vila Albernessia. A presença de turistas Na década seguinte, a imagem da cidade, ainda não era favorável para o turismo. Mesmo assim, os relatos feitos nos livros, de romance, como “A cidade enferma” escrito em 1922 por Paulo Dantas, mostra que já havia a presença de turistas, tanto na área rural (fazendas), como na área urbana (casas particulares). Também se nota em trechos desse livro, a presença de turistas nos vagões da E.E.F. Campos do Jordão. DANTAS (1922), ao descrever a primeira viagem de trem, realizada pelo seu personagem principal, o jovem Léo Além, rumo a Campos do Jordão, focaliza os passageiros que estavam a sua volta, dizendo: Há doentes abatidos que viajam calados e esperançosos; camponeses simples e calmos; turistas bem vestidos e enfatuados. O olhar dos camponeses, nascidos e criados
  • 12. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 94 nas rampas da serra, é manso e pouca sem cerimônia sobre os passageiros. Mas os passageiros não ligam para o olhar manso e sem cerimônia dos camponeses. Os doentes estão fechados dentro de suas própria tragédia. E os turistas mergulhados nas suas vaidades exibicionistas e nos seus roteiros de férias. (DANTAS, 1922). Com este relato podem-se determinar três tipos de viajantes. Os doentes, os camponeses e os turistas. Cada um possuía expectativas diferentes com relação à cidade, de acordo com a finalidade de sua viagem. Para os doentes é uma questão de vida ou de morte; para os camponeses é mais uma viagem de rotina, a caminho de casa; e para os turistas é um momento de expectativa, de lazer e descanso. Nesta década (1920), as condições urbanas para estimular o desenvolvimento do turismo ainda eram precárias. A subprefeitura em 1926 possuía 3.200 habitantes que se concentravam nas áreas da vila Nova, como era chamada a Vila Albernéssia, e, a região era caracterizada por um brejo de terra preta, onde só a linha férrea era firme, dificultando a circulação da população. (PAULO FILHO, 1986, p.199). A cidade ainda se constituía de pensões e sanatórios. Alguns considerados “oficiais“ com corretos padrões de higiene e os demais sem as mínimas condições de higiene, além de pensões improvisadas e casas particulares que eram alugadas por alto preço. Com a excessiva divulgação da inauguração de sanatórios, a qualidade dos serviços caiu e, a cidade não conseguia mais “suportar a grande demanda de internações” (PAULO FILHO, 1986, p.258). Alguns atos de solidariedade por parte de pessoas importantes da sociedade procuravam sanar tais dificuldades. Por volta de 1930, Dona Leonor Mendes de Barros, por exemplo, freqüentadora habitual da cidade por
  • 13. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 95 possuir residência em Vila Capivai, todo ano, no dia do seu aniversário (21 de junho), distribuía presentes na estância, “mobilizando toda a população pobre que receberia alimentos e agasalhos”, atraindo também levas de pessoas de áreas vizinhas que também vinham receber os presentes de Dna Leonor (PAULO FILHO, 1986). Mas a cada ano, mais sanatórios foram construídos por iniciativa particular, transformando a cidade no “maior centro social do Brasil, talvez da América do Sul, ultrapassando fronteiras a sua fama” (PAULO FILHO, 1986, p.259)8 . Nesta década já se pensava em transformar a cidade em estância turística, porém praticamente ainda não havia hospedagem só para turistas, pois as que existiam abrigavam doentes. Os prédios eram velhos, o saneamento básico era deficiente, os caminhos existentes para se chegar à cidade eram precários e não existia uma via de ligação entre as vilas (Vila Nova, Jaguaribe e Capivari). Assim, a prefeitura sanitária, além do objetivo de construir um sanatório modelo, também pretendia construir um hotel destinado somente para pessoas saudáveis, além de algumas melhorias urbanas como a construção de redes de água e esgoto sanitário e uma avenida ligando as três vilas (Jaguaribe, Albernéssia e Capivari) (PAULO FILHO, 1986). Na década de 1930, a população da cidade continuava a ser formada basicamente por doentes, devido ao número elevado de pacientes hospedados nas pensões e sanatórios existentes. Algumas tentativas foram feitas para mudar esta imagem de “cidade enferma”, entre elas tem-se o decreto estadual nº 5.944 de 1933 que institui medidas de 8 Enquanto a área urbana se desenvolvia em função da moléstia, na área rural a região começa a se desenvolver através da agricultura, com a chegada dos primeiros imigrantes. Os japoneses em 1929 constituíram as primeiras regiões frutícolas do Estado de clima temperado. A produção de maça e pêra d´agua, se tornou mais tarde, motivo para eventos como à festa da maça e a festa do pinhão (PAULO FILHO, 1986).
  • 14. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 96 incentivo fiscal a empresas que construíssem na região um hotel exclusivamente para turistas com jardins, parques esportivos e até cassinos. Mesmo com tais iniciativas, Campos do Jordão continuava sendo conhecida pela climatoterapia, alcançando reconhecimento internacional pelos tisiólogos de fama universal, como “Jacquerod, diretor do sanatório de Leysin e Voigt e Mayer, de Davos-Platz”, ambos na Suíça (PAULO FILHO, 1986, p.273). A repercussão de “cidade dos tuberculosos” era de conhecimento nacional. Sua fama provocou preconceito aos jordanenses que, ao visitar outras cidades, escondiam sua procedência, pois bastava dizer sua origem para sentirem uma reação de desprezo e medo de contágio. Muitos, ao visitarem a cidade, andavam com o vidro do carro fechado para evitar o contato direto (PAULO FILHO, 1986, p.269). Assim, apesar da atividade de cura ser lucrativa, esta impedia que o turismo se desenvolvesse, devido ao medo do contágio. Era preciso, portanto, vencer esse estigma (SANTOS, 2005). Contudo esta situação começa a mudar, quando cientistas especializados na tuberculose, começam a reformular seus conceitos sobre a climatoterapia, buscando novas alternativas de tratamento. Então, nas décadas seguintes, surgem novos tratamentos como a colapsoterapia9 ; a quimioterapia10 ; e métodos preventivos como a vacina BCG11 . Deste modo, a climatoterapia deixa 9 Processo cirúrgico cuja finalidade é reduzir o volume do pulmão (ANTUNES, 2000). 10 Consiste na administração intensiva de alguns medicamentos (ANTUNES, 2000). 11 A BCG – Bacilo de Calmette-Guerin é uma vacina que imuniza o paciente contra a tuberculose, capaz de reduzir em 70% a 80% o risco de contágio. Tem por finalidade substituir a infecção natural e patogênica por uma infecção artificial e inofensiva , ocasionada por um bacilo não virulento. Este bacilo provocara o aumento da resistência imunológica do paciente combatendo a infecção causada pelo bacilo de Kock, bacilo responsável pela tuberculose pulmonar.
  • 15. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 97 de ser um tratamento importante e o internamento em hospitais ou sanatórios passa a ser adotados somente em casos especiais (ANTUNES, 2000). Nesta mesma década, grandes hotéis foram construídos nas capitais e nas estâncias minerais, apoiadas pelos cassinos (ANDRADE, 2000). Enquanto isso, em Campos do Jordão, já elevada à categoria de município, aos poucos a atividade da cura da tuberculose vai diminuindo, dando mais espaço ao turismo, com a construção de hotéis, e algumas melhorias urbanas (PLANO DIRETOR, 1962). E, para estimular o crescimento da atividade turística, o governador do estado, Dr Adhemar de Barros toma a iniciativa de implantar um zoneamento na Estância, que divide legalmente a cidade em duas zonas: as vilas Jaguaribe e Capivari para os turistas e a vila Albernéssia com sua zona sanatorial para os enfermos. Nessa época a legislação obrigava as autoridades locais a regulamentar a hospedagem no município, baixando normas para evitar a permanência de doentes nos hotéis, obrigando clientes a apresentarem atestado médico confirmando a saúde dos pulmões, nos estabelecimentos voltados para os turistas (PAULO FILHO, 1986, p.262). § § § Observa-se assim que o ciclo da tuberculose se iniciou praticamente junto com o ciclo do turismo, porém com menor intensidade de turismo, pois ao mesmo tempo em que se procurava a região para tratamentos de saúde, também se procurava para lazer e descanso; a formação dos primeiros núcleos urbanos de Campos do Jordão está por vezes associada aos atos de caridade e solidariedade Fonte:http://boasaude.uol.com.br/lib/ShowDoc.cfm?LibDocID=3517&Retur nCatID=1765.
  • 16. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 98 dos fazendeiros da região, que começaram a doar suas terras para a construção de sanatórios, pensões e casas para os doentes12 , mantidas pelo apoio financeiro das instituições de combate a tuberculose (PAULO FILHO, 1986, p.140); os primeiros serviços voltados exclusivamente para os tísicos aconteceram primeiro no Rio de Janeiro e São Paulo13 e mais tarde começaram a migrar para Campos do Jordão, com a descoberta da climatoterapia; a cidade por atrair tanto turistas como enfermos, acabou, desde o início do povoado, se dividindo em duas áreas com populações distintas: uma área voltada para os tuberculosos e outra para os turistas. Este cenário, formado pela realização simultânea dessas duas atividades, porém, começa a mudar. Pode-se dizer que a partir de 1940 começa o grande surto turístico na estância de Campos do Jordão e, na década de 1950, o turismo de inverno passa a ser a principal fonte de renda do município. Este, sendo um tipo de turismo sazonal ainda hoje, influencia a qualidade urbana, não tendo mais condições de atender as necessidades locais, devido ao acelerado crescimento da população. 1940 a 1970 – Da cidade enferma ao turismo de Inverno Em 1940 a atividade sanatorial é de forma gradativa, substituída pela atividade turística e grandes empreendimentos hoteleiros são construídos. O Hotel Toriba, em 1943; o Grande Hotel em 1944 onde funcionou um cassino durante dois anos, o Hotel Rancho alegre em 12 Também muitos desses fazendeiros eram pessoas influentes na política e, portanto fazer atos de solidariedade no combate à tuberculose era uma forma de demonstrar sua empatia para com o povo e conquistar admiradores (PAULO FILHO, 1986). 13 As atividades filantrópicas mais significativas ocorreram através da Liga Brasileira contra a Tuberculose, no Rio de Janeiro. Em São Paulo, havia a Associação Paulista de Sanatórios Populares para Tuberculosos, depois a Liga Paulista contra a Tuberculose, além de associações criadas pela elite médica e intelectual (ANTUNES, 2000).
  • 17. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 99 1946; e o Hotel Vila Inglesa em 1947 (LANCI DA SILVA, 2004). Entre os hotéis citados, destaca-se o Grande Hotel, devido ter resultado de iniciativa do governo do estado. Segundo SANTOS (2005), o governador do estado, Dr. Adhemar de Barros, idealizara transformar Campos numa estação turística, com uma clientela refinada. Sabia que para tanto era necessário construir hotéis e cassinos de alto nível. Decidiu assim pela construção do Grande Hotel com verbas públicas14 . O hotel, construído pela firma Bratke e Botti de São Paulo, foi inaugurado em 1944 e acabou determinando o alto padrão da hotelaria em Campos do Jordão, sendo assim considerado um marco no desenvolvimento do turismo na cidade (BARBOSA, 1998). Vale destacar nesta década, a dificuldade de contratar mão-de-obra especializada, para hotéis deste nível. Mas alguns acontecimentos históricos favoreceram a qualidade dos serviços prestados na época da abertura do Grande Hotel. Segundo SANTOS (2005), o grande mérito da eficiência e do funcionamento operacional do Grande Hotel ficou nas mãos de um homem nascido em Hannover, que acabou chegando ao Brasil, para fugir da inflação que atingia a Alemanha. O alemão, Henrique Hillebrecht havia sido proprietário de dois restaurantes em Hamburgo e um deles era considerado o melhor da cidade. Mas, devido às dificuldades financeiras, acabou vindo para o Brasil em 1925, vivendo primeiro no Rio de Janeiro, depois em São Paulo, comprando e administrando alguns restaurantes15 , até que sua experiência profissional o capacitou para vencer 14 A construção do edifício foi realizada através do Governo Federal, pelo Departamento de Obras Públicas do Estado. 15 Comprou em 1937, em São Paulo, o restaurante Pinguin . Depois teve a Caverna Paulista e o Bhrama, na Av. São João (SANTOS, 2005).
  • 18. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 100 a concorrência pública para o arrendamento do Grande Hotel, em Campos do Jordão. Assim sendo, seu modo germânico baseado no rigor e na eficiência, fazia com que todos os serviços do hotel fossem impecáveis. Outro acontecimento que elevou a qualidade da hotelaria e da gastronomia em Campos do Jordão ocorreu durante a segunda guerra mundial. Segundo SANTOS (2005) um navio alemão, o Windhuk, teria aportado em Santos, em 1939, fugindo do bloqueio naval inglês. O navio era considerado, na época, um dos mais modernos tendo a função de carga e de turismo, e estava ancorado na cidade do Cabo, na África do Sul quando a guerra foi declarada. Também, considerado de categoria cinco estrelas, o Windhuk realizava cruzeiros para as colônias européias da África, atendendo turistas da alta sociedade européia. Seus 250 tripulantes eram profissionais com conhecimento técnico de serviços de bar e restaurante. A tripulação e os passageiros que não desembarcaram em terras africanas, quando o Brasil rompeu as relações diplomáticas com Alemanha, foram levados para campos de concentração, localizados nas cidades de Pindamonhangaba e Guaratinguetá, no vale do Paraíba, estado de São Paulo (SANTOS, 2005). No final da guerra ao serem libertados muitos desses ex-tripulantes foram trabalhar no Grande Hotel, colaborando como músicos, pessoal da cozinha, confeiteiro, garçom, aumentando a qualidade dos serviços e colaborando no treinando dos demais funcionários. Com relação à ocupação dos hotéis localizados nas estâncias, a grande procura era promovida pelos cassinos. Assim, em 1945 começa a funcionar o Cassino do Grande Hotel, explorado pela Empresa Paulista de Diversões Ltda, que através de parcerias com empresas do Vale do Paraíba, contratava a E.F. Campos do Jordão, fretando vagões para trazer os jogadores até o cassino (BARBOSA, 1998).
  • 19. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 101 Segundo SANTOS (2005), a circulação de dinheiro em função dos jogos acontecia com facilidade, e as fichas do cassino se tornaram a moeda corrente na cidade. Deste modo, durante as décadas de 1930 e 40, a hotelaria se apoiava na prática dos jogos e outros serviços de entretenimento como shows de orquestras, mágicos e artistas. Mas a situação muda em 1946, quando o Presidente Eurico Gaspar Dutra proibiu a prática de jogos, em todo o território nacional. Deste modo, o fechamento dos cassinos causou grande impacto no perfil dos turistas e na economia local, prejudicando tanto os funcionários do hotel, como todo o comércio da estância (BARBOSA, 1998). Muitos hotéis, por se manterem através dos jogos, faliram e foram parar nas mãos do governo (SANTOS, 2005). O cassino do Grande Hotel foi fechado em 1946. Mas outras instalações disponíveis fizeram com que toda a vida social da cidade continuasse convergindo para o hotel, que viveu sua fase áurea em 1960. Equipado com bar, restaurante e boate, o hotel proporcionou uma nova vida noturna à cidade. Ali era o ponto de encontro de políticos como Getulio Vargas e sobrenomes importantes da nata da sociedade paulista. Artistas nacionais e internacionais eram convidados a se apresentarem na boate do hotel. Também devido à eficiência de seus serviços, o hotel atraia “famílias tradicionais, com boa situação financeira, que reservavam o mês todo e tinham outro padrão de exigência” (SANTOS, 2005, p.65). Portanto o hotel funcionava como um ponto de atração de um turismo de glamour em que toda personalidade de destaque precisava estar presente. Um lugar “para ver e ser visto”, um comportamento que ocorre ainda hoje, durante a temporada de inverno (SANTOS, 2005, p.69). Do hotel para as vias públicas de vila Capivari, surgiu vários restaurantes, bares, boates que antes
  • 20. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 102 aconteciam dentro do Hotel. Na fase áurea do Grande Hotel nos anos de 1960, os eventos temporários se tornaram importantes pontos de atração turística, como a instalação da primeira concessionária Wolkswagen com serviços exclusivos de mecânica para os hospedes. Também havia um salão de cabeleireiro comandado por um dos ex- tripulantes do navio Windhuk que, pela suas experiências com tinturas, caiu na preferência das mulheres da elite paulistana e carioca, atraindo até as clientes que não eram hospedes do hotel (SANTOS, 2005, p.69). Assim outros hotéis foram construídos, e a cidade, em 1960, passa a apresentar um importante parque hoteleiro para a região da serra da Mantiqueira: Grande Hotel (250 pessoas); Hotel Vila Inglesa (120 pessoas); Hotel Umuarama (60 pessoas); Hotel Toriba (80 pessoas); Hotel Refúgio Alpino (50 pessoas); Hotel Rancho Alegre (150 pessoas); Hotel Bologna (80 pessoas) e o Hotel Augusta (25 pessoas) (PLANO DIRETOR DE 1962). Nesta mesma década, a cidade continuava tendo seu papel, dentro da região, de estação de tratamento da tuberculose, mas com o aumento da qualidade dos serviços hoteleiros, passa a ser vista muito mais do que um simples lugar de descanso, mas sim, como uma “estação de inverno”. E, para prolongar a permanência dos turistas na cidade, alguns atrativos naturais e culturais passam a ser divulgados. Os de maior destaque são os atrativos naturais: Pico do Itapeva, situado a 2.030 metros de altitude, com uma vista panorâmica de todas as cidades do Vale do Paraíba; o Pico do Imbiri, situado a 1.950 metros de altitude; Gruta do Crioulo, uma enorme pedra, com diâmetro de aproximado de 30 metros, em meio à natureza; Umuarama, um local com belíssimos panoramas e um hotel com o mesmo nome; Horto Florestal, antiga Fazenda da Guarda situada numa área preservada com várias fontes minerais;
  • 21. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 103 Pedra do Baú a 2.000 metros de altitude com vista para o vale e inúmeras cidades do vale; e as fontes Marisa, Simão, Renato, Nossa Senhora das Graças. O Palácio do Governo do estado veio a se tornar um importante atrativo cultural da década de 1970 (PLANO DIRETOR, 1962). Nota-se que, apesar da cidade possuir inúmeros atrativos naturais, os jogos no cassino eram a principal alavanca de crescimento do turismo. Tanto que a proibição do jogo na década de 1940 esvaziou os hotéis das estâncias hidrominerais brasileiras, ocasionando o surgimento de outras localidades turísticas, na região do litoral, como Guarujá e Santos. Este acontecimento forçou as autoridades municipais e estaduais, a criarem eventos na tentativa de salvar o turismo nas estâncias. Em Campos do Jordão, a maioria dos eventos promovidos eram voltados para a produção agrícola: a Festa da Maça; a Festa do Pinhão; a Festa da Cerejeira em Flor; e o Torneio de Pesca à Truta. Isto se deu devido ao desenvolvimento da produção agrícola na cidade com a chegada dos japoneses, que começam a produzir maçã, cereja e pera d´agua16 . Também a cidade abrigava uma empresa que fabricava sucos e geléia de frutas, a Belfruta Ltda, de Paul Ludwig Gustavo Edward Bockmann e Adhemar de Barros Filho (PAULO FILHO, 1986). Quanto ao Grande Hotel, em 1970, termina o contrato de arrendamento que o estado firmara com a Cia. de Hotéis de Campos do Jordão, empresa criada pelo administrador alemão Hans Hillebrecht. O hotel passou por um processo de decadência por não modernizar as instalações que estavam obsoletas e, a freqüência ficava em torno de “meia dúzia” de hóspedes. Deste modo, a falência 16 Horti-fruti-granjeiros de Renópolis, cenouras do Lageado, as batatas do Baú, e os ovos e hortaliças dos Mellos.
  • 22. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 104 foi inevitável criando um grande problema social na cidade (SANTOS, 2005). Para atrair a permanência de turistas por mais tempo, alguns eventos turísticos começaram a ser organizados e passaram a ter repercussão internacional, fornecendo uma identidade definitiva para a cidade, que assim se consolida na região e no Brasil, como uma estação de inverno. O governador Abreu Sodré declara o Palácio Bom Vista, casa de veraneio do governador do estado, um monumento público sendo reaberto para visitação em 1969, depois de dois anos de trabalhos para sua organização. E, em 1970, o secretário da Fazenda e o Grupo Executivo de Aproveitamento do Palácio de Campos do Jordão – GEAPAC, na tentativa de inserir o edifício no roteiro cultural da cidade, formam a Comissão de Concertos de Inverno de Campos do Jordão. Houve várias tentativas de integração de alguns eventos na cidade, para atrair um número maior de turistas, até que a idéia da realização de concertos de música clássica, por parte do grupo executivo, tornou-se o fator de solidificação da imagem da cidade como estação de inverno (PAULO FILHO, 1986). Os primeiros concertos foram realizados em 24 de julho e 01 de agosto de 1970. Posteriormente foram denominados Festivais de Inverno que tiveram um extraordinário sucesso, sendo realizados sempre nos meses de julho de cada ano. Os organizadores procuravam superar os festivais anteriores, ao mesmo tempo em que sua qualidade cultural acabou sendo reconhecida em todo o país e entrou para o calendário Musical do Brasil. A partir de então os espetáculos da cidade aconteciam em vários espaços culturais espalhado na cidade: Auditório de Campos do Jordão, na Sociedade de Educação e Assistência Frei Orestes; na Igreja São Benedito na Vila Capivari e nas praças públicas. Pela dimensão e
  • 23. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 105 importância do evento, o Festival hoje é coordenado pela Secretaria da Cultura do Governo de São Paulo (PAULO FILHO, 1986). Além das apresentações, outras atividades surgiram em função do festival. O curso de Cultura Musical iniciado em 1973, teve na época como coordenador Ricardo Cavalcante, da Secretaria do Esporte e da Cultura do estado, sendo realizado no Centro da Cultura Musical. Com o tempo, o curso passou a atrair bolsistas de todo o país e do exterior pela qualidade do corpo docente. Assim, tais acontecimentos históricos, confirmam as palavras de SILVA (2004, p.135) de que “a transição entre a cidade da cura e a cidade do turismo completa-se entre as décadas de 1950 e 1970”. Mesmo com a proibição do jogo, a transformação do Grande Hotel Campos do Jordão em hotel-escola junto com a continuidade do elevado nível do serviço hoteleiro e gastronômico, fez com que a cidade voltasse a ser procurada pelos turistas e se sobressaísse por seu papel de ponto de encontro da alta sociedade paulistana. § § § Como se observa, foi importante o papel do estado, de tomar a iniciativa em construir um hotel com padrões ao nível das exigências da sociedade paulistana; estimulou desde então, num turismo mais sofisticado, diferenciando a cidade das demais estâncias da serra da Mantiqueira; também a cidade acabou sendo “beneficiada” pelas fatalidades provocadas pela segunda guerra mundial, que acabou atraindo uma leva de profissionais estrangeiros da hotelaria e gastronomia (os tripulantes do navio Windhuk) que supriram as necessidades da cidade que se tornava turística; apesar dos inúmeros atrativos naturais, nesse
  • 24. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 106 período os jogos de azar e o requinte das instalações hoteleiras era o principal motivo de atração de turistas; nos anos de 1970 e 1980, o turismo de inverno motiva a fase de consolidação da atividade turística que é completada com o sucesso dos festivais de inverno. 1980 a 2005 – Do turismo de inverno á diversificação turística. Em 1982, o Grande Hotel é reaberto. O governador do estado de São Paulo, José Maria Marin assina um convênio com o SENAC para transformar o Grande Hotel em hotel-escola. Assim, com sua reabertura, Campos do Jordão sofre novamente a influência da boa qualidade de seus serviços. O hotel passa a receber professores vindos de universidades estrangeiras, como a Cornell University, em Itahaca, nos Estados Unidos, e são firmados acordos de cooperação com as tradicionais escolas, The Ecole Hoteliere de Lausanne e Glion Hotel School17 , ambas na Suíça (SANTOS, 2005). Suas instalações foram completamente renovadas, tornando-se mais moderno e mais luxuoso (BARBOSA, 1998). Além da gastronomia, a arquitetura utilizada nas residências, no comércio e nos hotéis começou a chamar a atenção dos turistas. O hotel Toriba e Vila Inglesa construídos nos anos 40 haviam adotado uma arquitetura típica do Suiça. Depois, em 1985, o Boulevard Geneve, na Vila Capivari, teve seu projeto inspirado num prédio na cidade de Hotemburgo, Alemanha, utilizando a técnica de Chaiméll18 . Assim a cidade foi estabelecendo uma 17 A Suíça é considerado um país que reúne as melhores escolas de hotelaria do mundo. Em 2001 estavam matriculados 4 mil estudantes, dentre eles, 21 portugueses e 96 brasileiros. Fonte: www.swissinfo.org/spt/swissinfo.html. 18 Técnica que consiste no travamento das madeiras sem a presença de materiais metálicos, também presentes no estado de Santa Catarina, com telhado no estilo Alpes suíço (FRANKLIN, 2006).
  • 25. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 107 arquitetura diferenciada em relação às demais e os turistas eram atraídos não só pela qualidade dos serviços dos principais hotéis, mas também pelo cenário que esta arquitetura européia proporcionou para a paisagem urbana. Foto 22: O Hotel Toriba, construído em 1943. Fonte: www.toriba.com.br. Segundo o arquiteto José Roberto Damas Cintra (apud FRANKLIN, 2002), a cidade começou primeiro com a influência da arquitetura portuguesa, trazida pelos tropeiros vindos do Vale do Paraíba. Depois, começou-se a sentir também a influência de estilos arquitetônicos trazidos por famílias acostumadas a viver em climas frios, como a Finlândia e Alemanha. Muitos desses estrangeiros que já viviam no Brasil se radicaram na cidade ao buscarem tratamentos nos sanatórios, ao trabalharem na construção da estrada de ferro e na implantação da Rodovia SP-50. Na fase de formação dos sanatórios, a arquitetura se assemelhava àquela das cidades do vale do Paraíba, como Pindamonhangaba e Taubaté, com somente algumas edificações que fugiam do padrão (Pensão Báltica). Deste modo, a cidade sofre uma mistura de influências européias em sua arquitetura, criando um estilo próprio. Foto 23: O Grande Hotel, construído em 1944. Um projeto da firma Bratke e Botti de São Paulo. Fonte: Adriana Silva Barbosa. Foto 24: O hotel Vila Inglesa, construído em 1947. Fonte: www.vilainglesa.com.br. Como se observa, a arquitetura de Campos do Jordão agradou os turistas e também aos comerciantes. Para os turistas, a casa de campo é a concretização de um sonho. Para o comerciante é um cenário lucrativo. Depois do Boulevard Geneve, outros espaços comerciais foram construídos. Assim, a arquitetura promoveu a cidade para o turismo, estimulando construções que empregava técnicas modernas, porém nesse “estilo europeu”.
  • 26. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 108 Foto 25: O Boulevard Geneve, 1985. Foto 26: Pensão Báltica localizada na Rua Eduardo Moreira da Cruz, Vila Jaguaribe. Primeira pensão sanatório com técnicas construtivas da Letônia na década de 1920. Também, muitos turistas preferiram comprar sua casa de campo e as empreendedoras imobiliárias procuraram atender a esta procura. Em 1986, a cidade passa receber edifícios residenciais de três pavimentos. Esta foi uma década marcada pelas ofertas imobiliárias, como condomínios de casas e prédios de apartamentos, semelhantes aos condomínios fechados das grandes capitais (LANCE DA SILVA, 2004). Foto 27: Aspecto arquitetônico da pensão sanatório localizado em Vila Albernéssia, 1930. Fonte: REZENDE, 2004. Até os últimos anos da década de 1980, a cidade recebeu cerca de 3.000 novos apartamentos composto por empreendimentos de alto nível. (VIANA, 1988). Todo esse crescimento ocorreu formando uma estrutura urbana similar à de São Paulo, com seus condomínios fechados e seguranças privativas. Muitos desses condomínios possuem baias para cavalos, piscinas aquecidas e casas com lareiras. Esses empreendimentos procurando referencias européias como “vila suiça”, ou “estação de inverno” adotaram nomes como: “Switzerland Village”, “Ski Village”, “Vila Holandesa” (VIANA, 1988). . Foto 28: Residência localizada em Vila Capivari, 1940 . Foto 29: Residência localizada em Vila Capivari, 1940. O perfil dos compradores, em sua maioria é formado por paulistas que estão acostumados a viver em sistemas de condomínios, numa forma de procurar segurança contra o aumento da violência em São Paulo e que procuram possuir uma casa de campo, principalmente na famosa “estação de inverno”. E, por ser uma residência que terá uma freqüência sazonal (durante a temporada de inverno), o
  • 27. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 109 serviço de segurança e manutenção do condomínio, se torna um requisito vantajoso e imperativo para o comprador (OLIVEIRA, 1991; VIANA, 1988). Segundo OLIVEIRA (1991) ter uma residência em Campos do Jordão significa possuir uma mercadoria arquitetônica que simboliza ascensão social. A casa de campo passou a ser o símbolo máximo dessa ascensão, pois se cria assim, uma imagem de “estilo alpino”, que agrega “valores” ao proprietário, representado seu maior status social. Muito provavelmente a maioria desses proprietários, já tem um imóvel em São Paulo, (sua residência), outro no litoral, e busca ainda, outro na serra. Assim, a do litoral é para o lazer da família, enquanto que a casa na serra representa seu orgulho e mais alta movimentação na escala social (LANCE DA SILVA, 2004). A casa de campo, associada às qualidades terapêuticas do ar e da água, incorpora a idéia de saúde e de um momento para recuperar energia antes de voltar à vida urbana. As palavras de Adhemar de Barros, (ex- governador do Estado de São Paulo) sobre Campos do Jordão expressam esta intenção: Pode-se readquirir forças necessárias e livrar-se do contágio das grandes cidades (...).Isto é uma fonte de saúde (...) [para] (...)retemperar a saúde dos homens que, lá em baixo trabalham na indústria, no comércio e mesmo na política. (...)Antes de ser eficiente na cura da peste branca, é a estação para retemperar a saúde, o físico, a fim de termos força para a vida cotidiana (PAULO FILHO, 1986). Todas essas qualidades tornaram os imóveis de Campos do Jordão, um produto de grande valor no mercado. Por sua vez, o turista, ao mesmo tempo em que procura o frio da serra, também busca o conforto urbano e
  • 28. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 110 variedade de serviços. Assim é que os condomínios atendem a estas necessidades, oferecendo imóvel, infra- estrutura urbana, equipamentos de lazer e segurança, tendo como “pano de fundo”, as áreas verdes. Quanto aos serviços, na vila Capivari, há restaurantes, bares e lojas além de eventos programados para a temporada de inverno. Esta disponibilidade neste local pode-se dizer, é o motivo que leva à escolha de localização, por parte das construtoras, em seus novos empreendimentos. Foto 30: Residências de alto padrão, no condomínio Alto do Capivari, 1980. Fonte: Adriana Silva Barbosa. . Foto 31: Flat residencial Quatre Season, 1988. Fonte: Adriana Silva Barbosa. Esse turismo gerou na década de 1990, mudança na paisagem local que deixou de ser aquela imagem de cidade pequena, passando a apresentar problemas de uma urbanização acelerada e adensamento de favelas. Esse crescimento desordenado e falta de infra-estrutura urbana não é recente. Na fase de funcionamento dos sanatórios, o processo de favelização de algumas áreas próximas à “vila velha”, atual Vila Jaguaribe, já era uma realidade. Mas, naquela época, as associações filantrópicas mantinham aquela estrutura urbana, somando-se à verba proveniente do governo para a manutenção dos sanatórios públicos, que também acabavam por se responsabilizar por muitas benfeitorias urbanas. Na fase turística, a dinâmica é outra. . Foto 32: Edifício Residencial, Vila Capivari, 1990 Na procura de lotes e imóveis para a construção da “terceira residência”, a construção civil precisava de mão-de- obra local, e destacam-se os empreendedores locais, que construíam casas isoladas, com essa mão-de-obra local e, depois da obra concluída, havia sempre uma vaga de emprego para caseiro. Com o aumento da demanda as obras passaram a serem promovidas por grandes
  • 29. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 111 incorporações, que trabalhavam com condomínios residenciais (residências ou prédios de apartamentos) atraindo mais trabalhadores e os caseiros passaram a ser substituídos pela segurança das residências, realizadas por empresas especializadas. Segundo OLIVEIRA, (1991) a construção de um apartamento necessitava de pelo menos 4 trabalhadores. Portanto, os cerca de 3.000 novos apartamentos construídos nos anos próximos a 1986, demandariam um mínimo de aproximadamente 12.000 homens atuando no setor da construção civil. Daí a “realidade” da favelização ocorrida na cidade, pois consta que 53 condomínios tinham sido aprovados, dos quais 46 estavam em construção (VIANA, 1988). Nos anos da “economia tuberculose”, a mão-de-obra vivia, ou nos próprios sanatórios, ou no centro urbano que naquela época não era tão valorizado. Os trabalhadores eram mantidos, ou pelos salários recebidos, das instituições de caridade ou do governo. Nos anos da “economia do turismo”, onde praticamente todos os lotes de terra ficam valorizados, a mão-de-obra da construção civil acaba optando, ou por morar nos canteiros de obras, ou em favelas, principalmente depois de estarem desempregados, ao término das obras e não terem condições de comprar ou alugar um imóvel na cidade, localizadas nas áreas menos favoráveis à construção civil, ou seja, as encostas. Esta situação é vista no artigo publicado em outubro de 1988 pela “A Gazeta Jordanense” (apud OLIVEIRA, 1991), quando, com o sucesso do Plano Cruzado19 , a 19 O plano cruzado consistia no corte dos três zeros e, no Plano Cruzado I, os preços foram congelados por um ano. Deste modo a inflação foi contida, o salário aumentou e o poder aquisitivo também, aumentando o consumo. Assim, o forte consumo abalou o congelamento dos preços levando o plano ao fracasso (RUIZ, 2006).
  • 30. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 112 procura por imóveis aumentou em Campos do Jordão e as construtoras foram obrigadas a contratarem mão-de-obra das cidades vizinhas. Mas, depois que ocorreu o fracasso do Plano Cruzado, muitas obras foram paralisadas e muitos dos peões ficaram desempregados, sem moradias e a opção encontrada foi invadir áreas verdes das encostas da cidade. Como ocorre, a construção civil é sempre um serviço temporário e ao término das obras, o trabalhador é obrigado a procurar outro serviço. Ora, com essa instabilidade financeira, ter um barraco na favela parece ser uma opção “razoável”. Daí esse “mecanismo” da década de 1980 em que a construção civil acaba estimulando o processo de favelamento das áreas invadidas. Foto 33: Vila Santo Antonio. Fonte: IPT, 2001. Outra visão desse processo de crescimento urbano é contada pelo prefeito João Paulo Ismael em entrevista (VIANA, 1988), contando que há na cidade cerca de 4.500 barracos onde vivem aproximadamente 22.500 pessoas. Por sua vez, dados do SEADE – Sistema Estadual de Análise de
  • 31. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 113 Dados do Estado de São Paulo, mostram que em 1980 a população era de 33.605 habitantes, levando a se estimar que somente umas 11.105 pessoas vivam fora das favelas, além da população flutuante (turística). Atualmente, conforme dados do relatório do IPT – Instituto de pesquisas Tecnológicas (2001), a cidade possui cinco áreas de risco ocupadas por favelas, situadas próximas à vila Albernessia e Vila Jaguaribe: Vila Santo Antônio, Vila Anadir, Vila Sodipe, Vila Albertina e morro do Britador. Foto 34: Vista das encostas de Vila Santo Antonio. Fonte: Adriana Silva Barbosa, 2005. Há quem observe, porém que a forma de fazer turismo em Campos do Jordão mudou (OLIVEIRA, 1991). Esta já não é mais a cidade de férias prolongadas, pois ficar o mês de julho inteiro na cidade poderia ser “tedioso”, frente a uma relação de outras possíveis opções de entretenimento e lazer, e assim, Campos do Jordão teria se tornado mais um produto no meio de tantos outros, ainda que melhor estruturado entre todos. Será que as relações afetivas com a cidade mudaram? Será que os vínculos afetivos com a cidade, as raízes familiares e a relação com a população local podem ser eliminadas em prol de um consumo rápido e impessoal do espaço urbano? Conforme ARANTES, VAINER e MARICATO (2000), para muitos dos atuais administradores públicos, a cidade passou a ser tratada como uma “mercadoria” adaptada de acordo com as características do comprador. Desta forma, pensando no mercado turístico, Campos do Jordão parece ter se tornado numa mercadoria que, ao longo do desenvolvimento da exploração turística, adaptou-se ao perfil do consumidor.
  • 32. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 114 Foto 35: Vila Albertina. Fonte: IPT, 2001. Foto 36: Vista das encostas de Vila Albertina. Fonte: Adriana Silva Barbosa, 2005. Este comportamento dos gestores públicos se reflete na mudança trazida pela segmentação do turismo. Encontram-se disponíveis no mercado, roteiros ecológicos, culturais e rurais, para jovens, ou específico para a terceira idade, para solteiros ou casais, e de acordo com as condições financeiras de cada classe social. E, assim, o turismo passa a ser organizado por roteiros específicos, em que se visita 4 ou 5 cidades num mesmo período de férias. E, ainda que o turista possa não comprar um pacote turístico usufruindo os serviços das operadoras, pode sim, ter a sua disposição serviços acessíveis por telefone ou via Internet, além de contarem com revistas especializadas em turismo que estimulam o leitor a organizar seu próprio roteiro de cidades.
  • 33. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 115 Imagem 5: publicação com uma seleção das estâncias localizada na serra. Fonte: VEJA SP, 28/06/95. Desse modo, tanto Campos do Jordão, como outras localidades passam a se integrar em vários roteiros, conforme o segmento escolhido pelo turista. Pode se enquadrar no turismo ecológico, devido a suas reservas florestais, como o Horto Florestal com suas trilhas e cachoeiras; no turismo de negócios, devido á qualidade de seu complexo hoteleiro, com salas para congressos e feiras; no turismo cultural, pelo sucesso dos festivais de inverno e apresentações de artistas nacionais e internacionais. Imagem 6: Publicação com roteiro de cidades turísticas para a temporada de inverno. Fonte: VEJA SP, 07/06/2000. Nesta fase de segmentação do turismo nota-se que há maior divulgação das cidades vizinhas, mesmo que não tenham tanta estrutura de serviços, mas estão ou próximas a Campos do Jordão, ou na Serra Mantiqueira com seu cenário bucólico e pitoresco. Em seu artigo “O paulistano vai à montanha”, Mário VIANA (1990), ressalta: Localizada entre a divisa dos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, a Serra da Mantiqueira é, cada vez mais, o lugar preferido dos paulistanos para as férias de inverno, com cidades pequenas e agradáveis, como Penedo, Itatiaia e Visconde de Mauá. Imagem 7: Publicação com uma seleção de cidades serranas para as férias de inverno. Fonte: VEJA SP, 19/06/2002. Observa-se nessa citação, o perfil de cidades rústicas, tranqüilas, sem o agito de São Paulo, sendo oferecidas por suas qualidades favoráveis ao descanso, principalmente em contraposição, Paulo VIEIRA (1994) mostra que “A temperatura Sobe” quando o agito é prestigiado em detrimento do descanso de algumas cidades serranas:
  • 34. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 116 Num dos invernos mais movimentados dos últimos anos em Campos do Jordão, há uma febre de inaugurações, festivais e lançamentos imobiliários. (...)Em julho, Campos do Jordão é uma festa sem hora para acabar. O exagero do turismo, porém, pode ser exarcebado com o aumento do número de lojas de grife com nomes estrangeiros e serviços especializados: o Lucky Strike Center, ou mesmo com estabelecimentos da moda global como videobar, shows de blues; o hotel cinco estrelas Mont Blant e flats Quatre-Saisons e Home Green Home. E, desse modo, pode-se descaracterizar uma região, que por muito tempo buscou um cenário europeu. O que se tem notado é que os festivais de inverno que antes convidavam os melhores da música clássica passaram a promover eventos populares; o centro de Capivari passou a ter trânsito; o rio que corta a cidade ficou mais poluído; a cidade ficou repleta de ônibus “farofeiros”, causando mais congestionamento; os preços aumentaram para compensar os meses de ociosidade; e para atender rapidamente, uma demanda crescente, não são todos os restaurantes que oferecem serviços de qualidade (NOGUEIRA, 1996; LORENÇATO, 1999). Essa dinamização turística modifica a rotina na região, pois, por exemplo, quando chega a temporada de inverno, as cidades vizinhas de Campos do Jordão agem em apoio, oferecendo seus serviços ao complexo hoteleiro. É que a falta de vaga na “estância motriz” que fica praticamente com seus hotéis e pousada 100% ocupados na temporada de inverno, pode ser compensada com o aluguel de casas ou estadas nas pousadas das cidades vizinhas, como Santo Antônio do Pinhal, que fica a 40 quilômetros do centro de Capivari (VIEIRA, 1995). Nessas ocasiões alguns restaurantes, lojas e danceterias das grandes cidades (São Paulo e Rio de Janeiro) se instalam
  • 35. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 117 temporariamente na cidade, para “aproveitar” clientes que lá estão em férias. VIEIRA (1988) relata casos de sucesso em que paulistanos deixavam a capital para abrir negócios na cidade, o que serviu de incentivo para que outros subissem a serra em busca de novas oportunidades. Em muitos casos esses estabelecimentos utilizam uma arquitetura, também temporária. Como os “tijolinhos aparentes”, que na realidade são de plástico, da danceteria Limelight, em vila Capivari. Outros alugam espaços em hotéis ou pousadas, para promover “o espetáculo” da temporada (VIEIRA, 1995). Nota-se que, que o turismo na cidade passou a ser sazonal, e por isso, muitos dos serviços de lazer e entretenimento também se tornaram de tempo limitado. Se na temporada de inverno a cidade precisa do apoio das demais vizinhas, fora da temporada a ocupação se reduz a praticamente a 20%, muito diferente do que acontecia na década de 60 em que os jogos de azar garantiam um fluxo permanente de turistas de alto poder aquisitivo (OLIVEIRA, 1991). No auge do sucesso desse turismo é que as construtoras passam a promover novos empreendimentos voltados não só para os de alto poder aquisitivo, mas também para a classe média. Assim a cidade passa a fazer parte do roteiro dessas famílias, que também desejam possuir sua casa de campo, mesmo que este sonho se veja reduzido a um pequeno apartamento localizado um pouco mais longe de vila Capivari. Os excursionistas também são atraídos nos finais de semana; são grandes consumidores das apresentações dos festivais de inverno e de atrativos naturais como o Morro do Elefante e o Pico do Itapeva (OLIVEIRA, 1991). Em 2001 o número de turistas começa a ultrapassar a faixa de um milhão de pessoas que entram na cidade
  • 36. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 118 como população flutuante, enquanto a população residente fica ao redor de 44.164 habitantes em 2000 e 46.710, em 2003. E, no decorrer das décadas seguintes, segundo REZENDE (2004, p.11,19), a procura dos turistas por grandes eventos e pela vida noturna de vila Capivari, acabou por anunciar um abandono dos espaços histórico- culturais, por parte dos munícipes e autoridades, buscando somente a valorização do comércio” e “o grande desafio agora é o de continuar a ser a Suíça Brasileira, inicialmente valorizada por ser hospitaleira e por possuir uma natureza exuberante. Locais importantes na historia de Campos do Jordão deixaram de ser o centro das atenções diante de um turismo onde a busca de consumo imediato “apagou” os atrativos históricos da cidade. Houve também um retrocesso na manutenção e valorização da arte e da história, evidenciado pelo abandono do Museu de História, Imagem e Som de Campos do Jordão, o Museu da Tuberculose, a Casa da Xilogravura (REZENDE, 2004); o cinema que necessita de reformas e a biblioteca infantil que sofreu um incêndio em 2005. Esses equipamentos culturais que são importantes na preservação da identidade da cidade se mostraram “sem importância” diante dos mega-eventos promovidos por empresas de cigarros, bebidas e telefones celulares. Os gestores públicos vêm tentando reduzir essa sazonalidade do turismo, com iniciativas públicas e privadas; e também com tentativas de associação com eventos que não tenham relação com o inverno, buscando assim o turismo de negócios, por exemplo, (Congresso de Cardiologia, o Congresso de Administração Pública); atividades voltadas para a gastronomia (Roteiros Gastronômicos, Festival do Fondue, Festa da Cerejeira, Festa do Pinhão); festividades religiosas (Natal na Montanha), por interesses culturais (Mapa Cultural); e
  • 37. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 119 encontros de associações (Encontro dos Fordinhos) e o Ecoturismo. Foto 37: Condomínio residencial Chateau Renoir, Vila Capivari, 2004. Fonte: www.camposdojordaoimoveis.com.br. Observa-se que, assim a cidade foi deixando de ser um local de descanso nos meses de inverno, passando a ser conhecida por seu potencial para a realização de atividades, conforme o segmento turístico escolhido. A gastronomia se diversificou, oferecendo restaurantes de comida japonesa, italiana e mineira; as pousadas não se restringiram ao perfil de típico chalé nas montanhas, mas passaram a oferecer serviços de SPA, comida vegetariana, academia e hidroginástica; as apresentações dos festivais de inverno, não se limitaram à musica clássica, mas passaram a trazer também música popular como o MPB, jazz e apresentações de bandas de rock; os passeios nas montanhas deixaram de ser uma simples caminhada, transformando-se em esportes, muitos dos quais radicais como o cascading (em cachoeira), rappel, arvorismo e trilhas ecológicas acompanhadas por guias especiais; e os novos condomínios possuem uma miscelânea de estilos arquitetônicos, seguindo a temática “casa de campo”. Foto 38: Condomínio residencial Petit Palais, Vila Capivari, 2004. Fonte: www.camposdojordaoimoveis.com.br. Foto 39: Centro de eventos em Vila Capivari. Fonte: Adriana Silva Barbosa, 2005. Por essas qualidades de um mercado turístico diversificado, Campos do Jordão tem desempenhado nos últimos anos, o papel de uma cidade estruturadora dessas atividades na região da Serra da Mantiqueira. Pode-ser notar nos meios de comunicação que a cidade conta com os melhores hotéis e restaurantes da região serrana, devido à grande variedade de serviços e eventos oferecidos (MONTEIRO, 2000 e 2002; DUARTE, 2001; AZEVEDO, 2003). Nesse sentido, ao mesmo tempo em que mostra as
  • 38. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 120 vantagens de uma cidade estruturada, mostra também as desvantagens da aglomeração de turistas, como nas temporadas de inverno. A alternativa, nesses casos é fugir deste desconforto, para as cidades vizinhas como Santo Antônio do Pinhal, São Bento do Sapucaí em São Paulo, ou para São Francisco de Xavier e Monte Verde em Minas Gerais (MONTEIRO, 2002). Foto 40: Danceteria e espaço para eventos em Vila Capivari. Fonte: Adriana Silva Barbosa, 2005. Mas em 2005 essa paisagem dinâmica de cidade turística tende a se modificar. É que, devido à baixa cotação do dólar em relação ao real, muitos paulistanos procuram passar as férias no exterior, nas montanhas com neve. Assim, Bariloche na Argentina, ganhou cerca de, 15 mil turistas brasileiros em 2004 e em 2005, previam-se 21 mil turistas. Esses dados mostram que o turismo em Campos de Jordão pode ser afetado. Foto 41: Centro de eventos em Vila Capivari. Fonte: Adriana Silva Barbosa, 2005. Foto 42: Restaurante em Vila Capivari. Fonte: Adriana Silva Barbosa, 2005. A competição entre cidades turísticas pode delinear uma outra realidade (DUARTE, 2005). § § § No processo de mudança de atividade econômica para o turismo, a cidade começou a sofrer os efeitos do turismo de massa. Segundo Ignarra (2003:36,37) uma destinação turística começa a se tornar conhecida pelo relato de alguns aventureiros, e com o tempo atrai novos visitantes, aumentando a procura, até que a qualidade do lugar começa a sofrer algumas interferências. Entre elas, “o excesso da demanda provoca elevação dos preços, falta de água, poluição das águas, má qualidade dos serviços”,
  • 39. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 121 resultando na diminuição da qualidade do produto (a cidade), da demanda turística e da renda do turista. Portanto a cidade passa pela fase de descoberta, depois pelo desenvolvimento e exploração do atrativo; e, finalmente, ocorre uma saturação do destino turístico, resultando na diminuição da qualidade do espaço urbano. Este processo Ignarra (2003) denomina de “ciclo de vida de uma destinação turística”, no qual um lugar ou cidade passa por fases de investimento, exploração, desenvolvimento, consolidação e estagnação, como ocorre hoje em Campos de Jordão que caminha para uma fase de estagnação. Também, pode-se perceber que não é somente a sazonalidade que provoca a degradação da cidade, mas a quantidade de pessoas em relação a sua capacidade de infra-estrutura urbana. Segundo Ignarra (2003) há estudos para determinar a capacidade de carga de uma destinação turística, ou seja, determinar qual seria o número máximo de visitantes por período de tempo que uma determinada área pode suportar, sem que ocorram alterações no meio natural e cultural. Nota-se que esta capacidade de carga está relacionada com a infra-estrutura urbana básica. Assim, o turismo praticamente obriga as cidades a terem uma infra- estrutura extra, para que a degradação não ocorra, o que não é possível na maioria dos casos. Então, ocorre muito freqüentemente a estruturação urbana somente das áreas de maior interesse turístico, pela iniciativa privada que se volta para explorar o local. Tais melhorias acabam valorizando os terrenos à sua volta e essa valorização atua como um estímulo para que os proprietários acabem vendendo suas terras, provocando assim tanto o afastamento da população local das áreas de interesse turístico, como uma atração de população flutuante (FONTELES, 2004).
  • 40. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 122 Portanto, a exemplo de Campos do Jordão, conclui- se que o turismo pode trazer, por um lado, benefícios econômicos à cidade e, por outro lado, problemas ambientais e sociais, caso não esteja preparada para o aumento dessa demanda turística.
  • 41. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 123 3.2 Turismo e os Planos Diretores Municipais Pode-se dizer que os planos diretores de Campos do Jordão agiram desde o início, como uma ferramenta de viabilidade dos espaços turísticos. E, como tal atividade era do interesse das elites locais possuidoras de grandes propriedades, os planos aprovados, acabaram por criar um zoneamento, que favorecia, em parte, o espaço urbano do residente, mas principalmente, do turista (OLIVEIRA, 1991). Inicialmente a proposta de planejamento urbano da cidade se baseava pela sua atuação dentro da região como “centro de tratamento de saúde da tuberculose” em área de topografia elevada e de clima temperado de altitude. Mas mesmo nessa ocasião, os gestores públicos já se voltavam para o turismo, evidenciando nessa atividade um grande potencial de desenvolvimento econômico. Assim, conforme as idéias de médicos sanitaristas como os Drs. Domingos Jaguaribe e Emílio Ribas, nas décadas de 1920 e 1930, as possibilidades de tratamento terapêutico-turístico se tornaram os principais fatores de ordenação territorial, formando um espaço que correspondia às expectativas tanto das atividades de lazer, como das atividades de saúde. Mas esta não era uma tarefa fácil visto que, um requisito importante a uma Estância Turística segundo OLIVEIRA (1991), é a criação de espaços associados ao ócio e ao sossego, negando tudo o que lembre trabalho,
  • 42. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 124 problemas sociais ou econômicos. Neste cenário lúdico, as cidades devem estar bem apresentadas com um espaço urbano “impecável”, vegetação exuberante, ruas limpas e arborizadas. Muitas cidades, talvez consigam apresentar tais aspectos e, portanto comecem a ser visitadas. Mas uma vez encontradas e exageradamente divulgadas por parte dos próprios turistas, tem sua população “inchada”, interferindo, portanto na qualidade de vida de seus moradores (IGNARRA 2003, p.37). Este foi o efeito negativo que uma demanda excessiva de turistas provocou em Campos do Jordão. Tais conseqüências, com o tempo, foram se tornando cada vez mais visíveis na paisagem urbana e, segundo Almeida (1999, p.88), o espaço do morador jordanense se tornou muito aquém daquela imagem divulgada de um ambiente de sossego e lazer. As condições de pobreza nos bairros populares criaram um cenário completamente oposto ao dos espaços destinados ao turismo. Portanto, a presença destes dois cenários distintos, muito provavelmente não foi fruto do acaso, mas sim o resultado de uma situação configurada conforme as leis de organização e ordenamento do território. O interesse de transformar a cidade em estância turística não era somente dos proprietários locais, mas também do governo estadual e federal, responsáveis pelas construções de algumas edificações de maior importância, na década de 1930 a 1940, como o Palácio de Veraneio Oficial, Grande Hotel, o Auditório e o Horto Florestal. Foi com essa preocupação construtiva e de ocupação territorial que o Governador de São Paulo Armando de Salles Oliveira, em 1935, nomeou uma comissão técnica presidida pelo engenheiro Francisco Prestes Maia, para estabelecer um plano de urbanização da cidade.
  • 43. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 125 Após estudos das características geográficas, geológicas, climáticas e ambientais da cidade, foram apresentados alguns diagnósticos. Nestes, constatou-se que, devido às condições topográficas, o desenvolvimento urbano acontecia sempre de forma linear, ao longo do rio Capivari, expandindo-se de forma transversal ao vale, em direção às montanhas. Constatou-se também a necessidade de encontrar meios de evitar a ocupação excessiva do solo, principalmente em áreas de encostas, restringindo as atividades industriais, de cura da tuberculose (saúde), repouso e recreio (CPEU-FAUUSP, 1960) Assim, a comissão estabeleceu algumas diretrizes principais, entre elas pode-se citar o tratamento da artéria viária principal e a limitação do desenvolvimento transversal, estimulando a expansão urbana para as áreas próximas do eixo principal. Também, decidiu separar a cidade por atividades, direcionando-as para uma das principais vilas. Desse modo, a administração pública e comércio principal diversificado se localizaram na Vila Albernéssia; o comércio local, ao longo da ferrovia e próximo das paradas de trem (zona comercial); os sanatórios se encontravam a oeste de Vila Albernéssia (zona sanatorial); as residências de primeira classe na Vila Capivari (zona residencial turística); e as residências operárias nos vales afluentes (zona residencial popular). Estas diretrizes influenciaram no plano da cidade e no zoneamento proposto em 1937, pelo Eng. Prestes Maia, no qual se configurou de forma transversal, com comércio no eixo viário principal, seguindo-se residência na faixa imediata, chácaras na seguinte e agricultura ou floresta mais na periferia. As indústrias não poluentes poderiam se instalar, porém em determinados pontos da cidade. A estrada de ferro foi considerada parte essencial dessa estratégia de zoneamento, devendo ser modernizada e
  • 44. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 126 prolongada até Itajubá, fato esse que não ocorreu; o plano contava com a implantação do comércio próximo às estações ferroviárias, com tratamento urbanístico nas laterais entre ferrovia e as ruas, com gramados, construção de abrigos para paradas de trem, plataformas e sinalização pertinente. Quanto aos acessos viários, esse plano propunha a construção de uma avenida principal que acompanhasse a via férrea, dos dois lados e a melhoria das estradas que ligam Campos do Jordão á Pindamonhangaba e á São José dos Campos (CPEU-FAUUSP, 1960). Mapa 12: esquemático: Plano Diretor de Prestes Maia de 1937. Fonte: modificado de DA SILVA, 2001. Como a paisagem é um dos elementos que fortemente exercem atração sobre os turistas, foram propostas algumas intervenções urbanas, que valorizassem certos locais turísticos, com a instalação de “pavilhões” equipados com sanitário, telefone e água encanada em alguns pontos turísticos com seus mirantes, como no pico Itapeva, na Fazenda Gavião Gonsaga, com vista para o
  • 45. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 127 Ribeirão do Lageado, no Morro do Elefante, no Pico do Imbiri e na Pedra do Baú. Também, a fim de preservar o meio ambiente, o plano propunha a criação de incentivos fiscais para que os proprietários preservassem suas áreas verdes; propunha a delimitação e proteção de uma faixa marginal ao rio Capivari, que existe ainda hoje; a instalação de serviços de tratamento de esgotos sanitários para as três vilas; e a coleta do lixo que seria feita através de containers que seriam levados por caminhões e depois transferidos aos vagões da E. F. Campos do Jordão; (PAULO FILHO, 1986, p.629-30). Com relação ao turismo, os técnicos da comissão enfrentavam uma divergência entre si, sobre quantos turistas poderiam atrair, ou restringir essa população flutuante, para que as famílias dos grandes proprietários de terras pudessem usufruir o sossego de seus imóveis. Alguns argumentavam que não se justificaria a aplicação de grandes investimentos nessa estância turística de Campos do Jordão, unicamente para o usufruto de poucos, pois se localizava próxima dos dois maiores centros urbanos, Rio de Janeiro e São Paulo. E, diziam, caso houvesse problemas com o aumento de turistas, estes poderiam ser atenuados através do planejamento urbano (PAULO FILHO, 1986, p.629). Tais propostas foram aprovadas em 1937, pelo governo federal e a cidade passa a ser ordenada pelo primeiro Plano Diretor, com o seguinte zoneamento: zona residencial, zona sanatorial, zona turística e um núcleo de comércio e serviços nos principais núcleos urbanos. Depois, entre 1951 e 1952, novos estudos foram realizados e um novo Plano Diretor foi aprovado sob a direção do arquiteto Zenon Lotufo e com o apoio do Centro
  • 46. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 128 de Planejamento de Campos do Jordão, uma organização liderada por representantes da sociedade civil, empresários do setor hoteleiro, mobiliário e comercial. Em 1958, um novo plano diretor começou a ser estudado a mando do governo estadual, sendo formada a Comissão Técnica do Plano Diretor em parceria com a Secretaria de Viação e Obras Públicas a CPEU USP - Centro de Pesquisa e Estudos Urbanísticos da Universidade de São Paulo, sob a supervisão do arquiteto Zenon Lotufo20 , nomeado a diretor geral. Essa comissão criou o “Relatório e Pranchas do Planejamento Territorial” (1960), contendo levantamentos aerofotogramétricos do município, além de entrevistas com os moradores. A pesquisa então efetuada permitiu a elaboração de propostas para um novo plano, que ao serem adotadas, provocaram mudanças importantes na paisagem urbana de Campos do Jordão. Dentre elas esta a autorização para a construção de edifícios habitacionais multifamiliares, dentro de uma faixa situada ao longo do rio Capivari; a divisão das áreas residenciais, de acordo com propostas de densidade; e a concentração das áreas comerciais em unidades de vizinhanças nos núcleos de Albernessia, Jaguaribe e Capivari. Em seguida aos diagnósticos levantados pelo Plano Piloto (CPEU-FAUUSP), deu-se continuidade ao trabalho e em 1962 foi oficialmente aprovado, conforme Lei nº 430 de 12 de Julho, pelo Prefeito José Antonio Padovan um novo Plano Diretor. 20 Em 1958, o Governador Jânio Quadros determina a realização do planejamento das Estâncias de São Paulo, mediante convênio com as Prefeituras Municipais, o Departamento de Obras Sanitárias da Secretaria de Viação e Obras Públicas e a Reitoria da Universidade de São Paulo (PLANO DIRETOR 1960).
  • 47. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 129 Posteriormente, com o apoio financeiro da FUMEST - Fomento de Urbanização e Melhoria das Estâncias Turísticas do Estado de São Paulo - contratou-se o escritório Jorge Wilheim Arquitetos Associados para a elaboração de trabalhos relacionados com a preservação da paisagem, uso do solo, sistema viário e revisão do código de edificação21 . Verifica-se que até 1970 uma considerável produção de estudos e planos foi realizada, sendo uma produção um pouco incomum para uma cidade deste porte. Conforme a Fundação SEADE22 , o plano diretor é um instrumento básico da política de desenvolvimento das cidades, que se tornou obrigatório para os municípios com mais de 20 mil habitantes, na década de 1980, com a Constituição Federal de 1988. E a lei nº 10.257/01 do Estatuto da Cidade ampliou esta obrigatoriedade para os municípios integrantes de áreas de especial interesse turístico23 . Portanto, muito antes de o plano diretor se tornar uma política obrigatória, Campos do Jordão já possuía uma considerável produção de estudos, planos e leis que, o que não era comumente encontrado. Por sua vez, pelo seu processo histórico pode-se presumir que, devido à grande procura por parte dos visitantes, a necessidade de organizar e regulamentar o espaço para comportar as atividades necessárias, começou muito mais cedo do que nas outras cidades. Com tantos estudos, observa-se que o espaço urbano poderia ter obtido resultados bem diferentes da situação encontrada atualmente. Analisando as 21 Tais estudos chamaram a atenção, tanto do SEMA – Secretaria do Meio Ambiente como do Programa do Meio Ambiente da ONU, colocando a estância em destaque na busca da preservação ambiental. 22 www.seade.gov.br/produtos/plandiretor. 23 Também a Constituição Paulista de 1989, também tornou obrigatório para todos os municípios do estado, conforme Artigo 181, Parágrafo 1º, do Capitulo II.
  • 48. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 130 características de ocupação e de legislação urbana (políticas urbanas) em que se encontrava a cidade ao longo do tempo não houve praticamente muitas mudanças no aspecto estrutural da cidade. Apenas preservou-se a divisão inicial entre bairros dos “doentes” e dos “sãos”. E, como conseqüência desta divisão, a cidade passou a conviver com dois cenários bem divergentes, respectivamente as áreas de população de baixa renda e as áreas de população flutuante. Portanto, os planos diretores, com seu zoneamento segregado, desde o primeiro momento agiram como uma ferramenta de viabilização de espaços turísticos. O Plano Diretor de 1962, elaborado numa fase de promoção da cidade em função da economia da tuberculose e da economia do turismo, criou a Zona Sanatorial longe das áreas de Interesse Turístico. As leis de 1978 constituídas de Código de Diretrizes do Sistema Viário, Parcelamento do Solo, Uso do solo, Proteção da Paisagem e Código de Edificações reforçam tal divisão, criando mais restrições de uso e ocupação do solo para o Parque Sanatorial e para as áreas preservação ambiental e de interesse turísticos. E, o plano diretor de 2003 localiza as zonas especiais de interesse social em áreas da extinta zona sanatorial. Assim, para compreender melhor a influência do turismo nos Planos Diretores, passa-se a sistematizar e discutir as transformações decorrentes, no espaço urbano e rural da cidade. Destaca-se, portanto, para análise, o Plano Diretor de 1962, elaborado pelo CPEU-FAUUSP, que foi feito com base no Plano Piloto de Campos do Jordão de 1959, que se preocupou mais com o zoneamento da cidade; o Plano Diretor de 1978, elaborado pelo arquiteto Jorge Wilheim, constituído de Código de Uso do Solo, Código de Edificações, Código de Diretrizes do Sistema Viário e Parcelamento do Solo; e o Plano Diretor de 2003, elaborado
  • 49. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 131 pelo ETEPLA - Escritório Técnico de Planejamento da Prefeitura e pelo escritório Jorge Wilheim Consultores Associados, já em consonância com as exigências do Estatuto da Cidade24 , constituindo-se de objetivos gerais e estratégicos, ações estratégicas e políticas setoriais. O quadro 03 a seguir sistematiza os principais instrumentos de planejamento urbano elaborados para Campos do Jordão. 24 A Lei nº 10.257/200, conhecida pelo Estatuto da Cidade, regulamenta os capítulos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988, os quais tratam da política urbana federal.
  • 50. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 132 Quadro 03 – Relação de planos e lei de zoneamento em Campos do Jordão Período Lei/Decreto 1935 - 1937 _______________ Plano e Lei de Zoneamento proposto por Prestes Maia. 1951 - 1959 Lei nº 280 de 16/10/1959 Plano Piloto de Zenon Lotufo. 1960 Lei nº 359 de 19/12/1960 Definição das zonas urbana e rural do município. 1958 - 1962 Lei nº 430 de 12/07/1962 Plano Diretor elaborado pela CPEU – Centro de Pesquisa de Estudos Urbanísticos/ FAUUSP. 1968 Lei nº 731 de 10/04/1968 Criação da ETEPLA – Escritório Técnico de Planejamento e do Conselho de Desenvolvimento de Campos do Jordão. 1975 - 1978 Lei nº 1094 de 04/01/1978 Lei nº 1095 de 04/01/1978 Lei nº 1096 de 04/01/1978 Lei nº 1097 de 04/01/1978 Plano de Jorge Wilhein composto pelo Código de Diretrizes do Viário, Código de Uso do Solo e Proteção à paisagem, Código de Parcelamento do Solo, e Código de Edificações. 1985 Lei nº 1538 de 13/12/85 Lei de Zoneamento – ETEPLA 2000 - 2003 Lei nº 2.737 de 02/05/03 Plano Diretor Estratégico – ETEPLA e Jorge Wilheim (em andamento) Fonte: Prefeitura de Campos do Jordão, www.camaracamposdojordao.sp.gov.br Plano Diretor de 1962 O Plano Diretor do Município de Campos do Jordão, instituído através da Lei nº 430 no dia 16 de Outubro de 1962, foi elaborado num momento em que os gestores públicos apostavam na transformação de Campos do Jordão no mais importante centro turístico do Brasil. Uma cidade que se conectaria com as demais estâncias de São Paulo, sul-mineiras e do Rio de Janeiro. Portanto o plano coloca a
  • 51. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 133 cidade dentro de um papel de centro polarizador das estâncias turísticas vizinhas. Observa-se que esta década foi marcada pelas ações do governo Estadual, que investiu boa parte de seus recursos financeiros para a construção de equipamentos hoteleiros, tanto em Campos do Jordão, como também nas outras estâncias climáticas, turísticas e hidrominerais do estado. Visto que o plano de 1962 foi elaborado a pedido do governo Federal, o caderno de diagnóstico elaborado pela equipe da CPEU – FAUUSP, em 1960, no item “Fundamentos do Plano”, coloca a verdadeira intenção do planejamento territorial de agir como uma ferramenta de viabilização do desenvolvimento do turismo através da ordenação territorial (CEPEU-FAUUSP, 1960). Esta ordenação também era necessária visto que, pela grande crise econômica em que o país atravessava com uma inflação anual 25,4% a 89% entre 1960 a 1964, muitos proprietários aproveitavam para retalhar suas terras e as vender de forma indiscriminada (CPEU-FAUUSP, 1960). Depois do golpe militar em 1964, o governo iniciou um programa de estabilização econômica reduzindo a inflação para 28% em 1967, o que resultou no aumento da procura por estes loteamentos para a construção de sua residência (SKIDMORE, 2003). Assim como reflexo de tais orientações, a zona urbana ficou constituída por: zonas residenciais de acordo com as densidades 50, 140 ou 200 pessoas por hectare; zonas comerciais divididas em Central e de Unidades de Vizinhança; zona sanatorial para abrigar todos os equipamentos de saúde e zona para indústrias leves.
  • 52. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 134 A definição destas zonas limitou as áreas sanatoriais, em áreas bastante distantes das zonas residenciais de menor densidade, voltadas para a terceira residência. E, também limitou as atividades comerciais, ao longo de eixo viário principal nas unidades de vizinhanças. Esta ordenação territorial veio a ser instituída numa fase em que, segundo a equipe da CPEU-FAUUSP já se notava o aumento de loteamentos clandestinos. O plano permite a formação de quadras com áreas máximas de 450 metros de comprimento por 80 metros de largura, em qualquer uma das categorias de zoneamento, devendo ter a cada 150 metros, uma passagem de 3 metros de largura. O loteamento de quadras, em áreas urbanas deveria ter no mínimo 10 metros de frente por 25 metros de fundo. Nas áreas rurais, o plano permite a formação de lote com área mínima de 5.000 m2 e a formação de unidades residenciais em “super-quadra” com áreas máximas de 600 m de comprimento por 300m de largura. Cada loteamento deveria reservar uma parcela de áreas livres equivalente a 16 metros por habitante e todo plano de loteamento deveria ter uma área reservada para recreação e de uso institucional, podendo-se associá-los ao turismo. O plano proibia o loteamento de terrenos impróprios para a edificação, inconvenientes para a habitação ou que prejudicasse as reservas florestais, outra área de importância turística que provavelmente, estaria relacionada ao ecoturismo. Também, já nessa época, essas áreas não poderiam acolher qualquer atividade que fosse incompatível com o turismo. Com relação à habitação o plano estabelece zonas residenciais divididas em residências isoladas unifamiliar com densidade de até 50 pessoas e área mínima de 1.000m2; densidade de 140 pessoas com área mínima de 360 m2; densidade de 200 pessoas com área mínima de
  • 53. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 135 250 m2; residência multifamiliar destinadas à construção de edifícios residenciais e de uso comercial; edifícios residenciais com área não inferior a 50m2 e 01 vaga de estacionamento; uma edificação secundária isolada da edificação principal, muito utilizada pelos “caseiros”. As áreas residenciais foram divididas em 20 setores ou Unidades de Vizinhança, para facilitar a organização de projetos de redes de água de esgoto, energia elétrica, escolas, parques e outros equipamentos sociais. Observa- se assim que essas densidades definiram praticamente o espaço turístico, pois as de menor densidade puderam se tornar bairros turísticos, como Vila Capivari. Para estimular a ocupação ao longo na avenida principal, o zoneamento permitiu a construção de edifícios de habitação multifamiliar, de qualquer número de pavimentos, respeitando-se, porém, os coeficientes de utilização e de ocupação dos lotes. Também permitiu no pavimento térreo dos edifícios, a instalação de lojas como confeitarias, salões de chá, instituto de beleza, bancos, agências de turismo entre outros serviços, desde que não prejudicasse as atividades turísticas. Tal zoneamento modificou a paisagem urbana e acabou despertando os interesses das incorporadoras, para a construção de edifícios de apartamentos em sistema de condomínios verticais. Também estabeleceu uma zona comercial do tipo linear, ao longo do rio Capivari, que poderia se localizar nas unidades de vizinhança, permitindo a construção de edifícios destinados ao comércio, serviços, cinemas, confeitarias, postos de abastecimento de automóveis, escolas, igrejas entre outros. Esse comércio precisava estimular o turismo e, portanto, deveria se ater a segmentos como estes, trazendo qualidade ao local.
  • 54. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 136 A criação da zona sanatorial foi delimitada de modo a não somente acolher os sanatórios mas a todas as atividades que permitissem seu funcionamento, como edifícios e equipamentos para tratamento de saúde, serviços de suporte como lavanderia, laboratórios de análises e casas de empregados. Para os sanatórios que já existiam e que com a delimitação do zoneamento se encontravam fora de área permitida, não poderiam aumentar suas instalações. Quanto ao turismo, foi criado a ZT - Zona de Interesse Turístico, uma zona localizada no entorno dos pontos turísticos, destinadas à preservação da paisagem, proibindo a construção de qualquer tipo de edificação. Esta lei se aplicava às áreas próximas aos mirantes como o pico do Itapeva e o Morro do Elefante. Ainda referente ao turismo, nas zonas rurais o plano considerava Unidades Turísticas, tanto em áreas existentes, como em outras a serem criadas, desde que possuíssem alguma atração turística, hospedagem, balneários ou qualquer outro estabelecimento destinado à recreação. Com relação à organização da estrutura viária, o Plano Diretor de 1962, dividia as vias de acessos viários em vias principais, secundárias, principais e secundárias. As vias de acesso situadas nas zonas urbanas deveriam ter 9 metros de largura, 6 metros de leito e 1,5 de passeio em ambos os lados; as situadas nas zonas rurais deverão ter 6 metros de largura e recuo de 10 metros da construção. Nesta década, a cidade já apresentava tráfego intenso, nos meses de junho e julho, nas estradas municipais que fazia ligação com os núcleos rurais, os hotéis e os pontos de atração turística. Portanto já se tornava necessário o estabelecimento de normas quanto a largura das vias, conforme sua categoria (CPEU-FAUUSP, 1960).
  • 55. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 137 A zona rural foi dividida em três usos: a zona industrial, destinada às atividades que não fossem nocivas ao meio ambiente; a zona de Interesse Turístico com as mesmas recomendações das ZT da área urbana; e a zona rural propriamente dita. Dentro destes núcleos rurais permitia-se a construção de edifícios destinados a escolas, oficina, comércio, indústria rural, clubes, igrejas ou capelas, residências e outros que tenham a finalidade de atender a população rural; vedava a instalação de qualquer atividade que fosse incompatível com o turismo. Com relação a estas áreas a equipe da CPEU- FAUUSP notou que a procura turística também provocou o loteamento desordenado das terras, fazendo com que seus proprietários abandonassem suas atividades agrícolas e dessem características urbanas, a fim de serem vendidas. Para impedir esta situação, a equipe propunha a criação de clubes agrícolas, constituídos por fazendas onde os turistas seriam convidados a participar das atividades rurais; a Pisicultura, com a construção de viveiros que pudessem ser visitados por turistas; e a floricultura também aberta à visitação. Também estimulam a criação de Unidades Turísticas nas áreas rurais, contendo em cada uma delas, um Centro de Atração Turística que poderia ser constituído de hotel, clube esportivo ou algum outro atrativo turístico desde que respeitado as áreas mínimas determinadas pelo plano. Dentro das unidades turísticas ficou permitido a construção de hotéis, balneários, clubes esportivos, igrejas, escolas, restaurantes, bares e qualquer outro estabelecimento destinado à recreação e repouso. Destaca- se que neste Plano Diretor as áreas de interesse turístico estão mais situadas nas áreas rurais. Nas questões de preservação ambiental, o zoneamento proposto pelo Plano Diretor de 1962, divide as áreas verdes situadas no território urbano em: Reservas
  • 56. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 138 Florestais, Recreio Ativo (áreas projetada para praça de esporte) e, Recreio Contemplativo (áreas projetadas com arborização, ajardinamento, retificação dos respectivos rios e formação de alguns lagos). Também são colocados sobre a proteção do município, todos os acidentes geográficos (morro, gruta, pedra, lagos e matas naturais) considerados de atração turística. As plantas a seguir apresentam a situação do espaço de Campos do Jordão em 1960, conforme levantamento elaborado pela CPEU – FAUUSP, para o desenvolvimento do Plano Diretor de 1962.
  • 57. Espaço Urbano e Turismo: o caso de Campos do Jordão, SP Adriana Silva Barbosa 139 (os mapas estão anexado na impressão final)
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