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Efeito placebo e falsas promessas tecnológicas
1. As falsas promessas tecnológicas e a força do efeito placebo
Todo antenado que se preze deve ter lido ou ouvido falar na pulseira Power Balance,
conhecida como pulseira do equilíbrio. A pulseira entrou na moda depois de ser utilizada por
vários atletas, incluindo Rubens Barrichello, Cristiano Ronaldo e David Beckham e também
atores como Leonardo Di Caprio e Robert De Niro. Segundo a Power Balance, a pulseira do
equilíbrio traria benefícios para a saúde, sobretudo na resistência física e mental. Mas várias
investigações científicas nunca provaram a veracidade do produto.
Anteontem me deparei com uma notícia de que o fabricante finalmente admitiu publicamente
que a pulseira não tem efetividade comprovada e terá de reembolsar clientes insatisfeitos na
Austrália, onde a troca poderá ser feita até 30 de junho de 2011. Em seu site oficial, a empresa
admitiu que o acessório não aumenta a força, nem a flexibilidade e nem gera equilíbrio. A
empresa já havia sido multada na Espanha e na Itália por fazer propaganda enganosa. No
Brasil, a propaganda dos efeitos terapêuticos da Power Balance e da sua versão brasileira, a
Life Extreme, está suspensa desde setembro do ano passado, por determinação da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). A multa para o caso de infração à norma pode variar
de R$ 2.000 a R$ 1,5 milhão. Acontece que a tal pulseira estava vendendo muito no mundo
inteiro. Aqui no Brasil cada unidade está sendo comercializada por R$ 120. Na Europa, estava
sendo vendida por cerca de 40 euros.
Tudo isso me fez pensar na força do efeito placebo. A ciência médica ainda não o explicou
completamente. Mas parece que ele resultaria da espera do efeito por parte do paciente,
surgindo como um reflexo condicionado involuntário. O efeito placebo tem um lado ruim, pois
as curas a ele devidas favorecem a perpetuação do uso de medicamentos e procedimentos
terapêuticos ineficazes e irracionais, como o que aconteceu com a pulseira Power Balance.
O episódio da pulseira também me fez refletir no que leva o ser humano a acreditar em falsas
promessas tecnológicas. Por que cargas d’água nos deixamos seduzir por essas novidades?
Como é que pessoas inteligentes se deixam fascinar por tecnologias sem qualquer tipo de
comprovação científica?
Na área da Saúde, é fato que a emergência de uma tecnologia gera freqüentemente uma
transformação cultural na população (tanto em profissionais da saúde como em leigos). Isso
cria uma pauta de consumo, expressa na quase exigência da utilização dessa novidade. As
novas tecnologias em saúde são geralmente incorporadas sem uma avaliação rigorosa de sua
eficácia, segurança e principalmente de seus custos. Felizmente, muitas tecnologias
comprovam sua efetividade com o tempo, gerando benefícios incontestáveis. Porém, algumas
são posteriormente retiradas do mercado, após a constatação de danos causados à população,
alguns letais. O problema é que quando um órgão fiscalizador, como o FDA ou a ANVISA
resolve retirar uma tecnologia do mercado, já se pagou um alto preço por isso (em vidas e/ou
em dinheiro)...
Sabemos que o êxito terapêutico não depende somente do embasamento científico da
terapia. Fatores diversos, alguns deles imponderáveis, exercem grande influência no processo
de cura. Entretanto, embora a Ciência não seja algo plenamente acabado e definitivo,
acreditar na verdadeira Ciência é fundamental. Pelo bem da Sociedade, sempre que possível,
devemos pautar nossas práticas, nas mais confiáveis e claras evidências científicas. E enquanto
profissionais e gestores temos obrigação de disseminar a importância da utilização de
evidências científicas por meio da educação em saúde entre nossos pacientes e clientes. E
torcer para que nenhum Juiz mande as operadoras ou o SUS darem cobertura para as tais
pulseirinhas....
Dra. Isabella V. de Oliveira
06/01/2011