2. JESUS AMIGO DA MULHER
Jesus não cessa de se encontrar com mulheres e de pô-las em evidência. Tem até a
capacidade de vê-las quando ninguém lhes presta atenção.
Diante da multidão que seguia Jesus, Pagola diz que grande parte eram mulheres
mais vulneráveis, privadas do apoio de um varão, ou seja, não tinham maridos, e
isso já era motivo de exclusão da sociedade. Uma que, ser mulher daquela época,
onde o contexto social era movido pelo patriarcalismo, significava estar destinada a
viver em um estado constante de inferioridade e submissão aos varões.
3. Desse modo, vemos Jesus agindo totalmente ao contrário da cultura e práticas da
época pertinentes as mulheres, pois o número de mulheres que se aproximava
dele era surpreendente, até vemos nos relatos que Jesus era grande amigo de
várias mulheres, as quais ele tinha tanto carinho e as acolhia com ternura, como
Maria, de Mágdala; as irmãs Marta e Maria, vizinhas de Betânia, que ele tanto
amava; mulheres enfermas como a que sofria a anos de hemorragia, prostitutas
desprezadas por todos, a viúva, miserável, que doa sua única moeda e Jesus a
valoriza e acolhe seu gesto de amor.
O que encontravam estas mulheres em Jesus?
O que as atraía tanto? Como se atreveram a aproximar-se dele para ouvir sua
mensagem?
4. A CONDIÇÃO DA MULHER JUDIA
Ajuda adequada. Deus criou o homem, e no período de Jesus há relatos, que a
mulher foi criada só para proporcionar uma ajuda para o homem(varão). Esse era seu
destino.
Visão negativa. No entanto, foi a mulher que ofereceu o fruto proibido para o
homem, provocando a expulsão de ambos, do paraíso. Assim, esse relato foi se
perpetuando de geração em geração, e desenvolveu no povo judeu uma visão negativa
da mulher, como se a mulher sempre fosse a autora perigosa de tentações e de
pecados. Consideravam uma atitude mais sábia de aproximar delas com cautela e
sempre manter sobre controle. Foi o que ensinaram a Jesus desde criança.
Ao longo dos séculos, esta visão negativa, não perdeu a força, pois no tempo de Jesus,
como podemos observar, era talvez mais negativo e severa. Tinham uma visão muito
perversa da mulher, destacando a sensualidade e o descrédito moral que tinha da
mulher. De acordo com a Torá, a mulher é inferior ao homem em tudo.
5. Ser vulnerável. Por outro lado, a mulher era considerada um ser frágil e
vulnerável, em que os homens devem proteger da agressão sexual de outros varões.
Desta forma eram mantidas reclusas em suas casas e retiradas da convivência pública.
Os homens cuidavam da honra da casa e a defendiam publicamente, as mulheres
tinham que se manter atentas ao seu cuidado também, para não envergonhar a
família com uma atuação indecorosa. Portanto, tinham que preservar-se em casa para
guardar sua honra sexual, para que todos pudessem viver tranquilos nas aldeias.
A mulher judia casada. Era submissa ao marido, ao sair da autoridade de seu
pai, passava para autoridade do marido, onde era considerada mais como uma escrava
do que esposa, pois tinha que considerar o marido como “meu senhor”. Sua função
era de satisfazer o marido, e dar-lhe filhos varões para assegura a subsistência da
família. No entanto, a influência da mulher casada era grande dentro da família,
muitos homens as respeitavam e exaltavam como mães de seus filhos. Elas é que
cuidavam do clima familiar e religioso dentro de casa.
6. A mulher judia fora de casa. Fora do lar, as mulheres não “existiam”, não
podiam estar sem a companhia do marido, e sem ocultar o rosto com um véu. Não
podiam falar em público nem conversar com outros homens, a permanência externa
era sempre calada e retirada. Nos banquetes, a participação só era possível se fosse
momento muito precioso, não tinham voz nem vez, ao menos como a dos varões. Não
tinham lugar na vida social. Se alguma mulher rompesse com essas normas, eram
consideradas de conduta desviada, eram mal faladas pela sociedade. No entanto, Jesus
sabia quando aceitava em sua companhia.
A mulher judia na religião. Como se percebe no contexto onde o referencial de
tudo é o varão, na religião não é nada diferente. O controle prevalece para os homens,
a mulher é colocada em uma condição de inferioridade. O “protagonista”, da religião
judaica era o varão, pois a circuncisão era o rito que constitui alguém como membro do
povo da Aliança. A mulher não tem a mesma dignidade que o varão diante da lei. Só
nas celebrações domésticas ela tinha alguma participação significativa, acender as
velas, pronunciar certas orações e cuidar de alguns detalhes rituais.
7. Assim, portanto, as mulheres judias, sem verdadeira autonomia, servas do próprio
esposo, reclusas no interior da casa, suspeitas de impureza ritual descriminadas
religiosa e juridicamente, constituíam um setor profundamente marginalizado na
sociedade judaica.
A oração que Rabino recomendava para ser recitada diariamente pelos varões:
“Bendito sejas, Senhor, porque não me criastes pagão nem me fizeste mulher
nem ignorante”. Mas, era isto realmente que Deus queria? O que pensava o
profeta que anunciava seu amor compassivo? O que podiam esperar as mulheres
com a chegada do reino de Deus?
8. AMIGO DAS ÚLTIMAS
• As mulheres que se aproximavam de Jesus.
Jesus com sua bondade infinita, o modo admirável de acolhimento, de modo geral,
atraia as mulheres de um estado de vida mais baixo daquela sociedade. Muitas
eram enfermas curadas por Jesus, como Madalena, que foi curada dos demônios.
Sem dúvidas, grade parte dessas mulheres não tinham vínculo com nenhum varão:
viúvas indefesas, esposas repudiadas, mulheres sozinhas, abandonadas, sem
recursos, pouco respeitadas e de fama não muito boa. Havia também algumas
prostitutas, consideradas por todos como a pior fonte de impurezas e
contaminação. A TODAS JESUS ACOLHIA.
9. • A mesa de Jesus que acolhe os últimos.
Estas mulheres estão entre os pecadores e indesejáveis que se sentam a comer
com Jesus. Para Jesus, estas refeições, são precisamente, símbolo e antecipação do
Reino de Deus. Junto a ele já se pode ver como os “últimos” do povo santo e as
“últimas” daquela sociedade patriarcal são os “primeiros” a entrar no Reino de
Deus.
10. • A presença que escandaliza.
Sem dúvidas a presença das mulheres nas refeições de Jesus era motivo de
escândalo. Até mesmo entre os discípulos, pois Jesus acolhia as mulheres
consideradas fácil, porque viviam sem acompanhantes; cobradores de impostos
que tinham fama de viver em contato com o mundo das prostitutas. Alguns ainda
coordenava alguns bordéis. No entanto, Jesus nem se assusta nem condena. Acolhe
todos com amor compassivo de Pai. Jesus ainda os desafiava provocando-os,
dizendo que estes excluídos e abandonados, precederão a eles no Reino de Deus.
11. Portanto, Jesus rompe com todos os paradigmas de preconceitos, acolhe sem
se importar com a impureza ou a sensualidade da mulher, mas a sua pessoa e
a dignifica, da mesma forma que a do varão. Pois o que importa para Jesus é a
capacidade que os homens e mulheres tem de ouvir a mensagem do Reino e
conformar sua vida para entrar na vida eterna.
12. ROMPENDO ESQUEMAS
A partir de sua experiência de Deus ele vai redefinindo o significado da mulher,
derrubando estereótipos vigentes naquela sociedade. Não aceita, por exemplo, que
a mulher seja considerada levianamente como fonte de tentação e ocasião de
pecado para o homem. Numa sociedade em que a luxúria do varão não era
considerada tão grave como a sedução da mulher, Jesus põe o acento na
responsabilidade dos homens. Estes não devem justificar-se lançando sobre as
mulheres a culpa por seu mau comportamento. Jesus corrige também a avaliação
que se faz da mulher atribuindo-lhe como incumbência suprema o ter filhos.
13. Na cultura daquela época a coisa que realmente importava era ter um ventre
fecundo e peitos capazes de amamentar os filhos. Jesus vê as coisas de outra
maneira. Ter filhos não é tudo na vida. Por mais importante que seja para uma
mulher a maternidade, há algo mais decisivo e primordial: “felizes antes aqueles
que ouvem a Palavra de Deus e a cumprem”. Em outra ocasião se nos diz que
Jesus corrige, em casa de suas amigas Marta e Maria, aquela visão generalizada
de que a mulher deve dedicar-se exclusivamente as tarefas do lar. Jesus reage
também com audácia diante do duplo critério da moralidade que se usa para
julgar de maneira desigual o varão e a mulher.
14. A cena é cativante. Trazem a Jesus uma mulher surpreendida enquanto estava
tendo relações sexuais com um homem. Não se diz nada do varão. É o que
ocorre quase sempre naquela sociedade machista. Humilha-se e condena-se a
mulher, porque desonrou sua família. Enquanto isso, ninguém fala do varão,
embora, paradoxalmente, é dele que a Torá exigia não possuir nem desejar uma
mulher que já pertence a outro. Jesus não suporta esta hipocrisia social
constituída pelos varões.
15. UM OLHAR DIFERENTE
Certamente Jesus olha as mulheres de maneira diferente e elas o percebem. Narra a
parábola do “amigo impertinente” que com sua insistência, consegue ser ouvido pelo
vizinho, mas ao mesmo tempo conta a da “viúva importuna” que reclama obstinadamente
seus direitos até conseguir que o juiz lhe faça justiça. Jesus não se fecha numa linguagem
androcêntrica, que considera tudo a partir da perspectiva do varão. Ele se põe no lugar das
mulheres e as faz protagonistas de suas parábolas. Narra a parábola do “semeador” que sai
a semear sua semente, mas conta também a da “mulher que põe o fermento” na massa de
farinha. Jesus não fala só da semeadura, pensa também nesse outro trabalho indispensável
que elas fazem antes do amanhecer, para que todos possam ter pão para comer.
16. Jesus queria que todos compartilhassem uma convicção que lhe era muito cara: Deus sente
os que vivem perdidos como algo tão seu que não descansa até recuperá-los. Fala de um pai
comovedor que sai do povoado para abraçar o filho perdido, fala também de um pastor que
não sossega enquanto não encontra a ovelha perdida; mas fala também de uma mulher
angustiada que varre com cuidado toda a casa até encontrar a moedinha de prata que se
perdera. Para Jesus, essa mulher varrendo sua casa é uma metáfora digna do amor de Deus
pelos perdidos. Jesus aproveita qualquer situação para apresentar as mulheres como modelo
de fé, generosidade ou entrega desinteressada.
17. UM ESPAÇO SEM DOMINAÇÃO MASCULINA
Jesus não pode suprimir o carácter opressivamente patriarcal daquela sociedade. É
simplesmente impossível. No entanto, introduz algumas bases novas e uma atitude
capazes de “despatriarcalizar” a sociedade: ninguém pode em nome de Deus defender ou
justificar a prepotência dos varões, nem a submissão das mulheres ao poder patriarcal
deles. Jesus subverte tudo ao promover relações fundadas no fato de que todas as
pessoas, mulheres e varões, são criadas e amadas por Deus: ele as acolhe em seu reino
como filhos e filhas de igual dignidade. Jesus vê a todos como pessoas igualmente
responsáveis diante de Deus. Nunca fala a ninguém a partir de sua função de varão ou de
mulher.
18. Deus não quer estruturas que criem superioridade do varão e submissão da
mulher. No reino de Deus tais estruturas terão que desaparecer. Nesta nova
família formada por seus seguidores não há pais. Só o pai do céu. Ninguém
deve ocupar o lugar dele. No reino de Deus não é possível reproduzir as
relações patriarcais. Para acolher o reino do Pai é preciso ir criando um
espaço de vida fraterna, sem dominação masculina.
19. DISCÍPULAS DE JESUS
As mulheres seguiram Jesus desde a Galileia, estando com ele até sua morte, em
Jerusalém. Assim como os discípulos, ouviam e aprendiam o que Jesus ensinava, o
que é surpreendente, pois, como já visto, não era permitido às mulheres estudar a
lei com um rabi. Ainda mais surpreendente é o fato de que elas acompanhavam
Jesus em suas andanças, muitas vezes, desacompanhadas. Isso, provavelmente, era
visto com receio.
Quem eram essas mulheres? O que faziam entre aqueles homens? Os serviam?
Eram discípulas de Jesus do mesmo modo que os discípulos?
20. Nunca se diz que Jesus tenha chamado individualmente, como aos Doze, mas em
nenhum momento também, ele as exclui ou afasta em razão de seu sexo ou por
motivos de impureza. São irmãs que pertencem à nova família que Jesus vai
formando, e são levadas em conta da mesma forma que os irmãos.
Maria de Mágdala se destaca entre as seguidoras, assim como Pedro entre os doze.
Há um grupo de mulheres mais próximas assim como de discípulos. Entre estes,
Pedro, Tiago e João, e entre àquelas, Maria de Mágdala, Maria mãe de Tiago menor
e Salomé.
Há cada vez menos dúvida de que tomaram parte na última ceia, visto que
dificilmente estariam ausentes na despedida aquelas que sempre acompanharam o
Mestre. E também após a crucificação, os Atos dos Apóstolos atestam que o
discípulos estavam reunidos em companhia de algumas mulheres, de Maria, a mãe
de Jesus, e dos seus irmãos.
21. Chama a atenção, também, a diferente reação das discípulas de Jesus diante de sua
execução. Enquanto os discípulos fogem, elas permanecem fieis, e mesmo sem
poder se aproximarem, assistem de longe sua morte e sepultamento. Também elas
são as primeiras a anunciarem a Ressurreição. Maria ocupa o primeiro lugar entre
as mulheres, enquanto Pedro ocupa este lugar entre os discípulos, no que tange à
experiência do Ressuscitado.
Cabe dizer ainda que a presença das mulheres no grupo dos discípulos de Jesus não
é secundária, mas elas se apresentam como modelos do verdadeiro seguimento.
Elas não discutem pelo maior lugar, mas ocupam os últimos lugares e servem,
como estavam acostumadas. Jesus, ao servir e lavar os pés dos discípulos, dá a este
serviço um valor inverso ao costumeiro, “pois eu estou no meio de vós como
aquele que serve”. Elas são modelo por sua entrega, atitude de serviço e fidelidade
total a Jesus até o fim, ao contrário dos discípulos que várias vezes não foram fieis.
22. SUA MELHOR AMIGA
Jesus tratou com afeto mulheres muito próximas dele, como já vimos. Salomé,
Maria e Marta, mas sobretudo Maria de Mágdala (ou Madalena). Esta ocupa um
lugar especial entre os discípulos, seja pelo fato de, diferente de outras, nunca
aparecer vinculada a um homem, seja pela sua proximidade com Jesus, inclusive
atestada por ser a primeira a encontrar-se com Ele no Domingo de Páscoa.
Sobre Maria, natural de Mágdala, sabe-se apenas que fora “possuída por espíritos
malignos”, e que Jesus expulsou dela “sete demônios”. Esse fato é importante para
se compreender que encontrar-se com Jesus, foi, para ela, um recomeço de vida.
Em Jesus ela encontra tudo aquilo de que necessita para ser uma mulher sã e viva.
Se outros deixaram tudo para seguir Jesus, ela não tinha nada para deixar. Jesus é o
único que pode fazê-la viver. Se antes fora privada da bênção de Deus, agora sente-
o mais próximo, graças à presença curadora de Jesus.
23. Maria é a primeira a encontrar-se com o Ressuscitado e comunicá-lo aos discípulos
que não lhe dão crédito. Já João narra um cuidadoso encontro entre os dois. A
morte de Jesus fora terrível para Maria, e o encontro com seu Mestre vivo significa
para ela, a certeza de que poderia continuar seguindo o Mestre, que a envia aos
irmãos.
Já nos séculos II e III, Maria era apresentada como aquela que compreendeu
inteiramente o mistério de Jesus.
Posteriormente, há um desvirtuamento da figura de Maria, apresentando-a, muitas
vezes como a companheira sexual de Jesus, sobretudo em obras novelescas. Fato é,
que a partir do IV século, a figura muda. Maria se apresenta como a primeira a
encontrar-se com o Ressuscitado, porque foi a mulher a primeira a introduzir o
pecado no mundo. Outrora é confundida com a pecadora que seria apedrejada,
tornando-se, assim, a prostituta. E assim, a figura profunda de Maria como aquela
que dedicou-se toda a Jesus foi desaparecendo, sobretudo no Ocidente.
24. Por fim, cabe dizer que é clara e importante a figura feminina no seguimento de
Cristo, sobretudo dada a sua condição diante da sociedade de sua época (e hoje?).
Mais que buscar relatos detalhados da relação de Jesus com essas mulheres,
cremos que é mais visceral compreender o acolhimento de Jesus, que é Deus e
Homem pleno, diante daqueles que necessitavam de acolhimento.
Jesus não foi um agitador, mas um sinal de contradição numa sociedade marcada
pela exclusão que levava à morte de várias formas.
A figura de Maria Magdalena pode nos ajudar a compreender este gesto de
intimidade com Jesus, isto é, aproximar-se e sentir-se acolhida por aquele que a
chama pelo seu nome.