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Regime especial de contratações de produtos e sistemas de defesa militares no Brasil: oportunidade para desenvolvimento de uma Indústria Nacional de Defesa e Parcerias Público-Privadas1 
Lucas Navarro Prado2 
Denis Gamell3 
RESUMO: Este artigo trata do novo regime de contratações de produtos e sistemas de defesa. Introdutoriamente, é comentada a inclinação atual do Estado Brasileiro para o incentivo de pesquisa e desenvolvimento ("P&D") por meio de uma política de compras governamentais. Com a Estratégia Nacional de Defesa, essa inclinação torna-se diretiva para Setor de Defesa Nacional. Focando no desenvolvimento de tecnologias sob domínio nacional e no fomento e reestruturação da chamada Base Industrial de Defesa, cria-se uma nova perspectiva de investimentos para as Forças Armadas após anos de desamparo. Na sequência, aborda algumas das novidades do regime especial, como regras especiais de licitação, conceitos como os de Empresa Estratégica de Defesa, Produto de Defesa, Sistema de Defesa, Produto Estratégico de Defesa e Parcerias Público-Privadas militares. O conceito de Empresa Estratégica de Defesa é examinado nos seus elementos essenciais. Um desses elementos, relativo ao controle societário por pessoas naturais brasileiras, não obstante, pode gerar discussão sobre sua constitucionalidade, em face das alterações promovidas na Ordem Econômica pela Emenda Constitucional nº 6 de 1995. Quanto ao âmbito de aplicação do novo regime, reflete-se sobre a redação legal, inclusive, sobre a eventual extensão do regime às polícias militares. Por fim, trata-se das oportunidades de Parcerias Público-Privadas no setor de Defesa e das vantagens contratuais alcançáveis nessa modalidade de contratação, bem como da hipótese de dispensa de licitação em casos potencialmente comprometedores da segurança nacional. 
1 Os autores agradecem os comentários do Coronel Marcelo Meirelles e do advogado Rodrigo Bueno, que gentilmente leram e apontaram críticas relevantes a este artigo. Eventuais equívocos ou opiniões dissonantes que tenham permanecido neste artigo são imputáveis unicamente aos autores, devendo-se afastar qualquer responsabilidade dos revisores a quem ora se agradece. 
2 Advogado especializado em infraestrutura, regulação e contratações governamentais. Sócio de Navarro Prado Advogados (www.navarroprado.com.br). Bacharel em direito pela Universidade de São Paulo (USP). Pós-graduado em Finanças Corporativas e Investment Banking pela Fundação Instituto de Administração da USP. 
3 Acadêmico de direito da Universidade de Brasília (UnB). Colaborador de Navarro Prado Advogados (www.navarroprado.com.br).
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SUMÁRIO 
1 Introdução....................................................................................................................3 
2 Contexto de criação no Brasil de um regime especial de contratação para o Setor de Defesa Nacional ...................................................................................................................4 
3 Entendendo as novidades do novo regime de licitação para contratação de produtos e sistemas de defesa ...............................................................................................................9 
4 O conceito de Empresa Estratégica de Defesa ............................................................... 11 
4.1 Possível discussão em torno da constitucionalidade do conceito de Empresa Estratégica de Defesa...................................................................................................... 17 
5 O que são produtos e sistemas de defesa e produtos estratégicos de defesa para efeito de aplicação do regime especial de licitação ............................................................................. 21 
5.1 Produtos de uso administrativo e sua contratação conjunta com PRODE ................ 25 
6 Alguns comentários sobre a quem se aplica o novo regime............................................ 26 
6.1 Referência a empresas privadas ........................................................................... 27 
6.2 Referência a entidades controladas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios: há possibilidade de extensão do regime especial às polícias militares estaduais e outras forças? ................................................................................................................ 28 
7 Oportunidade para desenvolvimento de PPPs............................................................... 30 
7.1 Regime aplicável em casos de comprometimento da segurança nacional................ 36 
8 Conclusão ................................................................................................................... 39
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1 Introdução 
O Estado Brasileiro tem se mostrado inclinado a incentivar a pesquisa e o desenvolvimento (“P&D”) de tecnologias nacionais de forma geral. Entre outros instrumentos, pretende se utilizar das compras públicas como incentivo nesse sentido4. 
No Setor de Defesa Nacional, criou-se recentemente um regime especial de contratação pública para produtos e sistemas de defesa militares que, em linhas gerais, busca incentivar a pesquisa e o desenvolvimento de tecnologias nacionais e/ou a transferência de tecnologias estrangeiras para o domínio nacional. Esse novo regime está alinhado com a Estratégia Nacional de Defesa (“END”), aprovada pelo Decreto Presidencial nº 6.703/2008, a qual estabelece, como um de seus eixos estruturantes, a “reorganização da indústria nacional de material de defesa, para assegurar que o atendimento das necessidades de equipamento das Forças Armadas apoie-se em tecnologias sob domínio nacional”.5 
4 Chame-se a atenção, por exemplo, para alterações realizadas na Lei Federal nº 8.666/93, a Lei Geral de Licitações e Contratações Públicas do Brasil (“Lei de Licitações”). De fato, a Presidência da República, por meio da Medida Provisória nº 495/2010, posteriormente convertida na Lei Federal nº 12.349/2010, introduziu diversas regras especiais de compras públicas para incentivar a pesquisa e o desenvolvimento de tecnologias nacionais, com destaque para as seguintes alterações: a) passou a figurar como critério de desempate em licitações públicas a produção de bens ou a prestação de serviços por empresas que invistam em pesquisa e desenvolvimento de tecnologia no País; b) passou a ser admitida a previsão no Edital de margem de preferência adicional para os produtos manufaturados e para os serviços nacionais resultantes de desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País. Na prática, significa a possibilidade de a Administração Pública pagar mais por um produto nacional, em relação a um produto estrangeiro, e ainda um pouco mais se o produto for resultante de inovação ou desenvolvimento tecnológico realizado no País. O limite para essa margem de preferência é de até 25% sobre o preço dos produtos manufaturados e serviços estrangeiros; c) passou a ser admitida, nas contratações destinadas à implantação, manutenção e ao aperfeiçoamento dos sistemas de tecnologia de informação e comunicação, considerados estratégicos em ato do Poder Executivo Federal, que a licitação seja restrita a bens e serviços com tecnologia desenvolvida no País. 
5 Até a presente data, aguarda apreciação pelo plenário da Câmara dos Deputados o Projeto de Decreto Legislativo nº 818/2013 que se aprovado tornará vigentes as novas Estratégia Nacional de Defesa e Política Nacional de Defesa (“PND”), assim como o Livro Branco de Defesa Nacional (“LBDN”). O documento da nova END no tocante à Indústria de Defesa segue em linhas gerais as mesmas orientações da END anterior. A apreciação da matéria pelo Congresso Nacional está de acordo com o que prescreve a Lei Complementar nº 136 de 25 de agosto de 2010, segundo a qual o Poder Executivo deve encaminhar na primeira metade da sessão legislativa ordinária, de quatro em quatro anos, a partir de 2012, para apreciação do Congresso os documentos atualizados da END, da PND e do LBDN.
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Além de incentivar P&D de tecnologia nacional e a transferência de tecnologias estrangeiras para o domínio nacional por meio de regras especiais de compras públicas, mormente as relativas à prática de offset6, o Estado Brasileiro também criou um regime tributário diferenciado com o objetivo de tornar a indústria nacional de defesa mais competitiva. 
Tanto o regime especial de contratações públicas de produtos e sistemas de defesa, quanto o regime especial tributário para tais produtos e sistemas, foram introduzidos na legislação brasileira por meio da Medida Provisória nº 544 de 29 de setembro de 2011, posteriormente convertida na Lei nº 12.598 de 22 de março de 2012, sem grandes alterações. 
O regime especial de contratações de produtos e sistemas de defesa militares foi regulamentado por meio do Decreto nº 7.970, de 28 de março de 2013. Já o regime tributário especial para tais produtos e sistemas foi regulamentado pelo Decreto nº 8.122, de 16 de outubro de 2013. 
O presente artigo pretende discutir o que é e a quem se aplica o novo regime de contratações públicas de produtos e sistemas de defesa, tendo em vista o disposto na Lei nº 12.598/12 e no Decreto nº 7.970/13. Não tratará, portanto, do regime tributário especial supra mencionado. 
2 Contexto de criação no Brasil de um regime especial de contratação para o Setor de Defesa Nacional 
6 As práticas de offset surgidas no cenário internacional no âmbito das contratações de defesa se caracterizam como formas de compensação prestadas pelo vendedor em face dos altos custos envolvidos na compra de produtos de defesa. No Brasil, o offset está regulado no setor de defesa pelas Leis nº 12.598, de 22 de março de 2012, pelo Decreto nº 7.970, de 23 de março de 2013, ambos objetos de estudo mais profundo por parte deste artigo, pela Portaria Normativa nº 764, de 27 de dezembro de 2002 do Ministério da Defesa, e por uma série de Portarias e atos normativos específicos de cada Força Armada. A prática, no entanto, já era admitida em nossa legislação geral de licitações e contratos administrativos, desde a publicação da Lei nº 12.349, de 15 de dezembro de 2010, e do seu regulamento, o Decreto nº 7.546, de 02 de agosto de 2011. As práticas de offset tanto no setor de defesa quanto nos contratos administrativos em geral se caracterizam por medidas de compensação tais quais: (i) coprodução; (ii) produção sob licença; (iii) produção subcontratada; (iv) investimentos; (v) transferência de tecnologia; (vi) countertrade; (vii) troca; (viii) counter purchase; e (ix) buy-back. Essas medidas requerem metodologia específica de aplicação que, no entanto, não cabe neste artigo tratar.
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As contratações de produtos de defesa pelo Estado Brasileiro no Setor de Defesa Nacional foram bastante reduzidas desde o início da redemocratização do Brasil em meados dos anos 1980. As Forças Armadas, desgastadas perante a sociedade brasileira após o período de aproximadamente duas décadas em que esteve à frente do governo e diante da grave crise fiscal enfrentada pelo Brasil até o final da década de 1990, receberam diminuta atenção orçamentária do Governo Federal, de maneira que pouco se fez em termos de aquisição de produtos ou sistemas de defesa nesse período. 
Nos anos 2000, dado uma sensível melhora das condições fiscais do Brasil, a pretensão brasileira de ocupar uma nova posição estratégica no cenário geopolítico global (inclusive, pleiteando um assento do Conselho de Segurança da ONU e enviando tropas em missões de paz, destacando-se a missão para o Haiti), e ainda a descoberta de grandes reservas de petróleo na costa brasileira (Pré-sal), o Governo Federal passou a adotar uma postura mais favorável às Forças Armadas e às aquisições de produtos e sistemas de defesa. 
Destaquem-se quatro projetos ilustrativos dessa nova fase: 
a) O PROSUB, Programa de Desenvolvimento de Submarinos, projeto em andamento com custo total da ordem de 6,7 bilhões de euros envolvendo o desenvolvimento e a produção de quatro submarinos convencionais (S-BR), a construção do Submarino de Propulsão Nuclear (SN-BR), compra de torpedos e despistadores, projeto e construção de um estaleiro e uma base naval no município de Itaguaí (RJ), além de transferência de tecnologia e offset.7 
7 PROSUB - Programa de Desenvolvimento de Submarinos, 2011, https://www.mar.mil.br/menu_v/ccsm /temas_relevantes/prosub-completo.pdf, acessado em 10 de julho de 2013.
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b) O SISFRON, Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras, projeto cujo objeto consiste em síntese no serviço de implantação e integração de sistema de sensoriamento, de apoio à decisão e de apoio à atuação operacional integrada de diversos agentes de defesa nas faixas de fronteira terrestre do País, está orçado em um valor global de R$ 839.664.954,32, sendo titular do contrato o consórcio Tepro formado pelas empresas Savis Tecnologia e Sistemas S/A e OrbiSat Indústria e Aerolevantamento S/A, empresas controladas pela Embraer Defesa e Segurança.8 
c) O projeto HX-BR, contrato com o consórcio de empresas Eurocopter e Helibrás de produção e aquisição no Brasil de 50 helicópteros de médio porte de emprego geral para as três Forças Armadas, avaliado em 1,89 bilhão de euros.9 
d) a compra de 36 caças supersônicos do modelo sueco Gripen NG, fabricados pela SAAB, no valor total de US$ 4,5 bilhões, conforme recentemente anunciado pela Presidente Dilma Rousseff, que deverá implicar transferência de tecnologia para empresas brasileiras, as quais participarão do desenvolvimento e da produção das aeronaves no Brasil. 
Os valores envolvidos têm aumentado o interesse de diversas empresas, nacionais e estrangeiras, pelo mercado brasileiro de compras de produtos e sistemas de defesa. 
Mas há uma marca peculiar nessas aquisições: o Governo Federal vem buscando impor contrapartidas de transferência de tecnologia para empresas nacionais ou mesmo a contratação de desenvolvimento integral de novos produtos sob a liderança de empresas brasileiras. 
8 SISFRON, http://www.ccomgex.eb.mil.br, acessado em 10 de julho de 2013. 
9 Reaparelhamento – Brasil garante manutenção dos motores do helicóptero EC-725, 28 de setembro de 2011, http://www.fab.mil.br/portal/capa/index.php?mostra=8575, acessado em 10 de julho de 2013.
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Essa busca reflete o objetivo declarado do Governo Federal de fortalecimento da defesa nacional mediante o desenvolvimento de uma Base Industrial de Defesa – BID nacional capaz de apoiar o país em eventuais momentos de estresse militar com outras nações. Nesse contexto, procura-se efetivamente transferir tecnologia militar ou apoiar o seu desenvolvimento para ou por meio de empresas brasileiras, assim entendidas não apenas aquelas que tenham operações e estejam devidamente autorizadas a funcionar no Brasil, mas particularmente as que sejam controladas, em última instância, por cidadãos brasileiros. Essa intenção fica muito clara com a criação do conceito de “Empresa Estratégica de Defesa”, como se verá mais adiante. 
Outro interesse do Governo Federal — além do desenvolvimento de uma BID e o consequente fortalecimento da defesa nacional — é o desenvolvimento de tecnologias que possam ter também aplicações civis e aumentar a produtividade da indústria brasileira. Historicamente, diversas tecnologias difundidas no dia-a-dia das empresas e pessoas físicas tiveram sua origem em pesquisas para desenvolvimento de tecnologia miliar. Há inúmeros exemplos dessa utilização civil de tecnologia originalmente militar. A título de ilustração, podem ser mencionadas: a tecnologia de micro-ondas desenvolvida durante a guerra fria e adaptada ao uso civil na forma dos fornos de micro- ondas; o GPS desenvolvido em 1973 no âmbito do Departament of Defense dos Estados Unidos e atualmente acessível ao uso civil; e a internet, resultado dos esforços de desenvolvimento tecnológico da Defense Advanced Research Projects Agency durante a Guerra Fria. 
É nesse contexto que o Governo Federal estabeleceu um marco legal específico para as compras de produtos e sistemas de defesa, ao que tudo indica, justamente para fomentar dois objetivos: transferir tecnologia para a indústria nacional e/ou viabilizar economicamente o desenvolvimento de tecnologia por empresas brasileiras (no sentido de empresas controladas por cidadãos brasileiros, em última instância).
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Vale reconhecer a existência de críticas a esse novo modelo. Particularmente, sob a perspectiva econômica, diz-se que o mercado brasileiro não teria dimensão suficiente para incentivar o desenvolvimento de tecnologia por empresas brasileiras, se comparado, por exemplo, ao mercado norte-americano ou europeu. Nesse contexto, a tentativa de desenvolvimento de tecnologia militar própria, na fronteira do conhecimento disponível, acabaria impondo custos elevados para o país sem perspectiva de nos aproximar significativamente do nível tecnológico militar norte-americano ou europeu. Segundo esse argumento, ainda, seria mais vantajoso financeiramente simplesmente adquirir produtos com tecnologia estrangeira de nações amigas, com compromissos de transferência dessa tecnologia, ao invés de investir no seu desenvolvimento próprio. O Brasil conseguiria mais rapidamente tecnologia avançada e a um custo inferior. 
Embora a crítica parta de premissas fáticas verdadeiras — pois, de fato, os mercados norte-americano e europeu para aquisição de produtos e sistemas de defesa são substancialmente maiores que o brasileiro —, vale lembrar que o novo modelo não impõe a opção de desenvolvimento de novas tecnologias nacionais. Ao contrário, uma de suas alternativas é justamente privilegiar as compras que impliquem transferência de tecnologia para o domínio nacional. Nesse contexto, a eventual decisão do Governo Federal de apoiar o desenvolvimento de uma nova tecnologia militar, mediante uma promessa firme de compra do produto ou serviço que venha a contemplar essa tecnologia, é apenas uma alternativa e não necessariamente a solução a ser adotada em cada caso concreto. 
Outra crítica difundida está na avaliação sobre a conveniência de investir no desenvolvimento tecnológico militar, enquanto o país apresenta diversas deficiências crônicas nos seus sistemas de saúde, educação, habitação, transportes públicos etc. 
Ora, novamente, é preciso ter em vista que o novo marco legal em questão apenas incentiva o desenvolvimento ou a transferência de tecnologia por ou para empresas nacionais, na hipótese de aquisição de produtos ou sistemas de defesa, e não interfere na alocação de recursos orçamentários. Dessa perspectiva, não houve, por conta de novo marco para contratações no setor de defesa, qualquer compromisso de aplicação de recursos orçamentários adicionais nesse setor.
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De qualquer forma, vale dizer que a crítica desconsidera a indução ao desenvolvimento econômico por meio dos investimentos no setor de defesa. Conforme já mencionado, diversas das tecnologias de uso civil foram inicialmente desenvolvidas para uso militar. O aumento da produtividade e da competitividade da economia brasileira depende, em larga medida, da sua capacidade de inovação. Nesse contexto, o incentivo à inovação e ao desenvolvimento ou absorção de novas tecnologias se constitui em um objetivo de política pública também do ponto de vista social. Não se trata, pois, da mera busca pelo aumento da capacidade militar de se defender contra agressões externas. Muito mais que isso, os investimentos no setor de defesa funcionam como alavanca para o desenvolvimento e absorção de tecnologias na fronteira do conhecimento humano. 
3 Entendendo as novidades do novo regime de licitação para contratação de produtos e sistemas de defesa 
O regime especial de contratações públicas de produtos e sistemas de defesa militares cria regras especiais em relação à Lei Federal nº 8.666/93. 
Em particular, cria a possibilidade de restringir o acesso às contratações públicas de produtos ou sistemas de defesa, de maneira que possam participar das licitações apenas: 
a. empresas brasileiras credenciadas como “Empresas Estratégicas de Defesa”, cujo conceito será discutido mais adiante, sendo que essa restrição pressupõe que o objeto da licitação se limite à contratação de Produto Estratégico de Defesa (art. 3º, § 1º, inc. I, da Lei Federal nº 12.598/12); ou 
b. fabricantes de Produtos ou Sistemas de Defesa produzidos ou desenvolvidos no País ou que utilizem insumos nacionais ou com inovação desenvolvida no País (art. 3º, § 1º, inc. II, da Lei Federal nº 12.598/12). 
Além disso, permite que:
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c. assegure-se à empresa nacional fabricante de produto de defesa ou a Instituição Científica e Tecnológica (“ICT”)10, a transferência do conhecimento tecnológico empregado ou a participação na cadeia produtiva, no percentual e nos termos fixados no edital e no contrato (art. 3º, § 1º, inc. III, da Lei Federal nº 12.598/12). 
Os itens “b” e “c” acima mencionados são mais simples de se compreender, pois estão alinhados com outras regras já existente no marco geral de licitações e contratações com a Administração Pública. 
A possibilidade de que o Edital restrinja objeto da licitação à contratação de produtos “produzidos ou desenvolvidos no País ou que utilizem insumos nacionais ou com inovação desenvolvida no País” segue a mesma linha de outras alterações promovidas na própria Lei Federal nº 8.666/93 no sentido de incentivar a produção e inovação nacional bem como a geração de empregos no Brasil. A discussão que se pode ter nesse ponto é saber em que medida se deve considerar um bem como produzido no Brasil ou contendo inovação desenvolvida nesse mesmo país. A Lei Federal nº 12.598/12 não explicitou critérios específicos para essa avaliação; tampouco o Decreto nº 7.970/13 tratou desses critérios. Na prática, diante dessa omissão, pode haver alguma celeuma por conta de que boa parte dos produtos de defesa é constituída de peças e tecnologias desenvolvidas e/ou fabricadas em diversas partes do globo terrestre. Destaque-se, nesse contexto, a importância de que o Edital de Licitação preveja, clara e objetivamente, os parâmetros caracterizadores da produção ou desenvolvimento no País. 
10 Órgão ou entidade da Administração Pública orientada para a pesquisa científica ou tecnológica definida conforme a Lei nº 10.973 de 2 de dezembro de 2004.
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A possibilidade de que o Edital exija “a transferência do conhecimento tecnológico empregado ou a participação na cadeia produtiva”, para ou de “empresa nacional fabricante de produto de defesa ou a alguma instituição pertencente à Administração Pública de ciência e tecnologia”, por sua vez, assemelha-se muito a outra regra já introduzida em 2010 no regime geral de licitações e contratos com a Administração Pública, que prevê a possibilidade de exigência de “medidas de compensação comercial, industrial, tecnológica ou acesso a condições vantajosas de financiamento”, tanto em favor da Administração Pública quanto de terceiros por ela indicados de forma isonômica11. Trata-se da figura do offset, que se pretende difundir não apenas no âmbito de contratos no setor de defesa, mas também em outras compras governamentais, a fim de acelerar o processo de capacitação tecnológica da indústria brasileira. 
A grande novidade do regime especial de contratação de produtos e sistemas de defesa, nesse contexto, fica por conta da possibilidade de restrição na licitação para participação apenas de “Empresas Estratégicas de Defesa”, conceito apresentado no próximo tópico. 
4 O conceito de Empresa Estratégica de Defesa 
A restrição à licitação para que participem apenas licitantes classificados como Empresa Estratégica de Defesa (“EED”) se constitui em uma exceção ao regime geral da Lei Federal nº 8.666/93. 
EED pode ser resumidamente definida como toda pessoa jurídica credenciada pelo Ministério da Defesa mediante o atendimento cumulativo de certos requisitos, conforme o inc. III do art. 2º da Lei nº 12.598 de 2012. A Lei estabelece não só um conceito, sobre o que é EED, mas também uma competência, a de o Ministério da Defesa credenciar como EED quem preencher certos requisitos. 
Os requistos para o credenciamento como EED, os quais devem ser atendidos cumulativamente, são apresentados e discutidos brevemente nas linhas abaixo. 
11 O art. 3º, § 11, da Lei Federal nº 8.666/93, prevê: “[o]s editais de licitação para a contratação de bens, serviços e obras poderão, mediante prévia justificativa da autoridade competente, exigir que o contratado promova, em favor de órgão ou entidade integrante da administração pública ou daqueles por ela indicados a partir de processo isonômico, medidas de compensação comercial, industrial, tecnológica ou acesso a condições vantajosas de financiamento, cumulativamente ou não, na forma estabelecida pelo Poder Executivo federal”.
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1. Ter como finalidade, em seu objeto social, atividades específicas relacionadas ao desenvolvimento e produção de Produto Estratégico de Defesa, bem como serviços correlatos 
O texto da Lei implica leitura cuidadosa, pois apresenta redação extensa e que remete inclusive a outro dispositivo legal (art. 10). Na tentativa de consolidar o conceito em uma única redação lógica, sugere-se que o estatuto ou contrato social contemple no objeto da sociedade empresarial algo semelhante à seguinte redação: “prestação de serviços de tecnologia industrial básica, elaboração de projetos, realização de pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica, assistência técnica, transferência de tecnologia, industrialização, produção, reparo, conservação, revisão, conversão, modernização e manutenção de Produto Estratégico de Defesa no País, incluídas a venda e a revenda somente quando integradas às atividades industriais supracitadas”. 
O ponto central desse requisito é que todas essas atividades orbitam em torno do conceito de “Produto Estratégico de Defesa”, apresentado mais adiante neste artigo. 
2. Ter no País a sede, a administração e o estabelecimento industrial, equiparado a industrial ou prestador de serviços 
O dispositivo não parece prescindir de maiores esclarecimentos. Dada a ausência de uma regulamentação específica, sugere-se que sejam tomadas as definições de estabelecimento industrial e equiparado a industrial por analogia do Direito Tributário. Precisamente, são encontradas nos art. 8º e 9º do Decreto nº 7.212 de 2010 que regulamenta o regime do IPI. Da mesma forma, a definição de estabelecimento prestador de serviço pode ser tomada da Lei Complementar nº 116 de 2003, art. 4º, que dispõe sobre o ISS. 
Destaque-se que existe aí uma especificidade em relação à Lei Federal nº 8.666/93, que com algumas exceções, veda “admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, (...) e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes” (itálico acrescentado).
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O critério ora em comento se constitui em mais uma exceção a essa regra geral, mas que não foi estabelecida na própria Lei Federal nº 8.666/93 e, isto sim, na lei específica para contratação no setor de defesa. 
3. Assegurar a continuidade produtiva no País 
A Lei 12.598/12 não explica o que pretendeu com esse critério. O Decreto 7.970/13, que regulamenta a Lei 12.598, lança um pouco de luz sobre o tema, embora permaneçam pontos obscuros sobre esse requisito. 
De fato, o Decreto estabelece, como formas de assegurar a continuidade produtiva no país, a apresentação nas licitações de garantias, a serem executadas no caso de descontinuidade ou encerramento da pessoa jurídica, de: 
i. transferência à União, quando requisitado, da tecnologia relacionada aos PED; 
ii. disponibilização da capacidade tecnológica e produtiva para outras EED; 
iii. autorização da produção, sob licença, por outras EED; 
iv. transferência da propriedade intelectual; 
v. ressarcimento dos investimentos realizados pela União; ou 
vi. garantias reais. 
Aparentemente, esse é um tema destinado a ser construído nos editais de licitação e, particularmente, nos respectivos contratos. 
4. Dispor, no País, de comprovado conhecimento científico ou tecnológico próprio ou que este seja complementado por acordos de parceria com Instituição Científica e Tecnológica para realização de atividades conjuntas de pesquisa científica e tecnológica e desenvolvimento de tecnologia, produto ou processo, relacionado à atividade desenvolvida 
Esse requisito pretende incentivar o desenvolvimento científico e tecnológico no país, o que, aliás, parece ser a tônica do marco legal de contratações no setor de defesa.
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O “conhecimento científico ou tecnológico” em questão deve, em princípio, estar relacionado com o objeto da licitação. Caberá ao Edital definir a forma como esse requisito poderá ser comprovado. 
A “Instituição Científica ou Tecnológica” de que trata o requisito ora sob comento deve ser um “órgão ou entidade da administração pública que tenha por missão institucional, dentre outras, executar atividades de pesquisa básica ou aplicada de caráter científico ou tecnológico” (cf.: art. 2º, inc. X, da Lei Federal nº 12.598/12). Destaque-se, assim, a necessidade de ser pertencente à Administração Pública. 
Embora não haja ilegalidade ou inconstitucionalidade na exclusão de instituições científicas ou tecnológicas privadas, a restrição é inconveniente. Não parece haver razoabilidade na exclusão de instituições privadas. O critério deveria ser, assim como a tônica da Lei, a origem brasileira dessa instituição, e não sua natureza jurídica pública ou privada. 
5. Assegurar, em seu ato constitutivo ou no ato de seu controlador direto ou indireto, que o conjunto de sócios ou acionistas e grupos de sócios ou acionistas estrangeiros não possam exercer em cada assembleia geral número de votos superior a 2/3 (dois terços) do total de votos que puderem ser exercidos pelos acionistas brasileiros presentes 
Esse critério, embora se constitua em novidade legislativa, reflete regra do estatuto social da Empresa Brasileira de Aeronáutica – EMBRAER (art. 4º, III, “b”), sociedade de economia mista privatizada durante o Governo FHC, segundo a qual “o conjunto dos acionistas e grupos de acionistas estrangeiros não poderá exercer votos em número superior a 2/3 do total de votos conferidos ao conjunto de acionistas brasileiros presentes”. 
Dois aspectos merecem ser destacados: (i) a linha de divisão entre acionistas brasileiros e acionistas estrangeiros; e (ii) o fato de que, para efeito de atribuição do número de votos aos acionistas estrangeiros, é preciso considerar o número de acionistas brasileiros presentes, ou seja, é preciso saber e certificar quem de fato participa da reunião de assembleia geral. 
Novamente em linha com o disposto no estatuto da EMBRAER, a Lei Federal nº 12.598/12 considera como sócios ou acionistas brasileiros:
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a. pessoas naturais brasileiras, natas ou naturalizadas, residentes no Brasil ou no exterior; 
b. pessoas jurídicas de direito privado organizadas em conformidade com a lei brasileira que tenham no País a sede e a administração, que não tenham estrangeiros como acionista controlador nem como sociedade controladora e sejam controladas, direta ou indiretamente, por uma ou mais pessoas naturais de que trata a alínea ‘a’; e 
c. os fundos ou clubes de investimentos, organizados em conformidade com a lei brasileira, com sede e administração no País e cujos administradores ou condôminos, detentores da maioria de suas quotas, sejam pessoas que atendam ao disposto nas alíneas ‘a’ e ‘b’. 
Portanto, em última instância, o critério é o controle, direto ou indireto, por pessoas naturais brasileiras, natas ou naturalizadas, residentes no Brasil ou no exterior. Note-se que, na hipótese de controle indireto, a EED deve ser diretamente controlada por meio de pessoas jurídicas com sede e administração no Brasil, mas indiretamente controladas por pessoas naturais brasileiras, natas ou naturalizadas. 
Esse tema levanta uma polêmica em torno da constitucionalidade da regra, tendo em vista que a Emenda Constitucional nº 06/1995 suprimiu do texto constitucional as distinções com fundamento no critério de nacionalidade do controle que separavam as “empresas brasileiras” das “empresas brasileiras de capital nacional”, ponto que será tratado na sequência. 
Por ora, cumpre refletir um pouco sobre a regra que limita os votos dos acionistas estrangeiros a 2/3 dos votos atribuídos aos acionistas brasileiros presentes. 
O teor dessa regra deve fazer com que, do ponto de vista de incentivos envolvidos, acionistas estrangeiros não tenham interesse em adquirir participação maior que 40% no capital votante de Empresas Estratégicas de Defesa12. Eventualmente, podem até adquirir participação maior por conta dos interesses econômicos (distribuição de dividendos, sobretudo), mas isso não refletirá em maior poder na definição dos rumos da sociedade empresarial. 
12 Agradecemos ao advogado e colega Filipe Maldonado que nos chamou a atenção para esse aspecto.
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O quadro a seguir faz algumas simulações supondo que todos os acionistas estejam presentes: 
Tabela 1 - Participação estrangeira em EEDs e número máximo de votos a serem exercidos 
Total de ações ou quotas com direito a voto de propriedade de sócios presentes 
Total de ações ou quotas com direito a voto de propriedade de sócios brasileiros presentes 
Total de ações ou quotas com direito a voto de propriedade de sócios estrangeiros presentes 
Número máximo de votos a serem exercidos por sócios estrangeiros (2/3 dos votos de sócios brasileiros presentes) 
1.000.000 
900.000 
100.000 
100.000 
1.000.000 
800.000 
200.000 
200.000 
1.000.000 
700.000 
300.000 
300.000 
1.000.000 
600.000 
400.000 
400.000 
1.000.000 
500.000 
500.000 
333.333 
1.000.000 
400.000 
600.000 
266.667 
1.000.000 
300.000 
700.000 
200.000 
1.000.000 
200.000 
800.000 
133.333 
1.000.000 
100.000 
900.000 
66.667 
Como se vê, a importância da participação estrangeira cresce até o ponto em que alcança 40% do total de ações ou quotas com direito a voto. A partir desse ponto, ainda que o sócio estrangeiro aumente sua participação, o seu número de votos total acabará reduzido, a fim de impedir que se ultrapasse a proporção de 2/3 do total de votos dos acionistas brasileiros presentes. 
Outro ponto relevante de discussão envolve saber os limites para eventuais acordos de acionistas. A razão é que alguns pactos societários induzem ou mesmo impõem ao sócio com maioria de votos a transferência ou o compartilhamento do controle de uma dada empresa para ou com sócios minoritários.
17 
O conceito de controle trazido pelo art. 116 da Lei das S.A. é bastante mais complexo e amplo que simplesmente a averiguação de quem detém a maioria de votos em assembleias gerais. Daí a possibilidade de que se considere controlador quem, por meio de acordo de acionistas ou de fato, efetivamente dirige as atividades e orienta o funcionamento da companhia. 
Já o requisito da Lei Federal nº 12.598/12 é específico e trata não propriamente do conceito de controle, mas apenas da maioria de votos em uma dada assembleia geral. 
Quais seriam, nesse contexto, os limites para a negociação de acordos de acionistas, particularmente quanto ao estabelecimento de quóruns especiais de aprovação no âmbito de Diretoria e de Conselho de Administração, poderes de veto, e regras de eleição e destituição de administradores? 
Embora a redação da Lei nº 12.598/12 não tenha sido explícita, parece-nos que a melhor hermenêutica induz ao entendimento de que jamais poderá ser transferido o controle para os sócios estrangeiros mediante acordo de acionistas ou instrumentos assemelhados, sob pena de descaracterizar a “Empresa Estratégica de Defesa”. 
A preocupação por trás da criação do conceito de EED está, obviamente, na proteção dos interesses da nação e, daí, a exigência de que o comando da empresa esteja a cargo de pessoas naturais brasileiras. Admitir que o controle seja indiretamente transferido a ou compartilhado com sócios estrangeiros, mediante instrumentos societários ou congêneres, implicaria burla ao espírito da lei, o que não se coaduna com as regras da boa hermenêutica. 
Em suma: as eventuais garantias oferecidas aos sócios estrangeiros, por conseguinte, não podem chegar ao ponto de caracterizar compartilhamento ou transferência de controle. Não pode haver dúvidas de que o comando da empresa esteja nas mãos de pessoas naturais brasileiras. Essa a regra de ouro para se saber sobre os limites para eventuais acordos de acionistas ou instrumentos congêneres. 
4.1 Possível discussão em torno da constitucionalidade do conceito de Empresa Estratégica de Defesa
18 
O conceito de EED pode reacender discussão enfrentada durante a década de 1990 por ocasião da Emenda Constitucional de nº 6 de 1995 sobre empresas de capital nacional e empresas brasileiras, todavia de capital estrangeiro. 
Como foi demonstrado no tópico anterior, a exigência de que, nas assembleias, por meio de disposições no ato constitutivo, o total de votos do conjunto de sócios estrangeiros não possa exceder a 2/3 do total de votos passíveis de serem exercidos por sócios brasileiros, não implica que a maioria do capital social seja composta por brasileiros ou pessoas jurídicas controladas por brasileiros; consequentemente, são possíveis diversas distribuições de capital quanto à origem. Todavia, na prática, a exigência assegura aos brasileiros, entendidos por pessoas naturais, natas ou naturalizadas, o controle efetivo da EED. 
Antes da Emenda Constitucional nº 6 de 1995 ser editada, havia na Constituição de 1988 uma distinção entre Empresas Brasileiras de Capital Nacional (“EBCN”) e Empresas Brasileiras simplesmente. 
O art. 170, que define os princípios gerais da ordem econômica, trazia como um de seus princípios o tratamento favorecido às EBCN. Estas, por sua vez, eram definidas no art. 171 como aquelas cujo controle efetivo estivesse em caráter permanente sob a titularidade direta ou indireta de pessoas físicas domiciliadas e residentes no País ou de entidades de direito público interno, entendendo-se por controle efetivo da empresa a titularidade da maioria de seu capital votante e o exercício, de fato e de direito, do poder decisório para gerir suas atividades. 
Havia também disposição no art. 176, § 1º que deferia somente à EBCN a pesquisa e a lavra de recursos minerais e a exploração dos potenciais hidroenergéticos. 
A Emenda Constitucional nº 6 teve o condão de substituir o princípio do favorecimento das EBCN de pequeno porte pelo do favorecimento das empresas de pequeno porte em geral, revogar todo o art. 171 e alterar a redação do art. 176, § 1º para deferir as atividades que menciona a empresas brasileiras, entendidas por aquelas com sede e administração no País. 
Tabela 2- Antes e depois da Emenda Constitucional nº 06 de 1995 
Antes da EC 06/95 
Após EC 06/95 
Tratamento favorecido para pequenas empresas 
Apenas empresas brasileiras de capital nacional 
Empresas constituídas sob legislação nacional, com sede e
19 
administração no Brasil 
Exclusividade para a pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais de energia hidráulica 
Apenas empresas brasileiras de capital nacional 
Empresas constituídas sob legislação nacional, com sede e administração no Brasil 
Preferência na aquisição de bens e serviços pelo Poder Público 
Apenas empresas brasileiras de capital nacional 
Deixou de existir no plano constitucional. 
Autorização para criação, por lei, de proteções e benefícios especiais temporários para desenvolver atividades consideradas estratégicas para a defesa nacional ou imprescindíveis ao desenvolvimento do País 
Aplicável às empresas brasileiras de capital nacional 
Deixou de existir no plano constitucional. 
Ora a pergunta que aqui se poderia fazer é, se em face das alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 6 de 1995, haveria ainda espaço no ordenamento para uma distinção gerada entre empresas tal qual a que se cria com o conceito de EED. 
Primeiramente, vale notar que o critério de EBCN era de “controle direto ou indireto por pessoas físicas domiciliadas e residentes no País”, enquanto o critério de EDD é, em termos, o controle efetivo, direto ou indireto, por pessoas físicas consideradas brasileiras natas ou naturalizadas, residentes no Brasil ou no exterior, na medida em que se condiciona o total de votos de estrangeiros a 2/3 do total de votos de brasileiros. 
Portanto, o critério de EBCN parecia estar mais associado ao critério de domicílio que ao de nacionalidade propriamente dito. Em princípio, bastaria que a pessoa física controladora fosse domiciliada no Brasil para que a empresa respectiva pudesse ser enquadrara como EBCN. Já o critério de EED é estritamente relacionado com a nacionalidade das pessoas naturais que, em última instância, controlam a empresa. 
Daí, conclui-se que, do ponto de vista formal, a Lei 12.598 não recupera o conceito extinto com a EC nº 06/1995, mas estabelece um critério efetivamente distinto, com foco na nacionalidade da pessoa natural, e não em seu local de domicílio ou residência.
20 
É interessante observar, ainda, a fim de dar resposta a essa questão, que a Exposição de Motivos Interministerial nº 37/MJ/MF/MPOG/MPAS/MARE/MME, de 16 de fevereiro de 1995, que acompanhou o Projeto de Emenda Constitucional, PEC nº 5 de 1995, que resultou na Emenda nº 6, esclarecia: “Note-se que as alterações propostas não impedem que legislação ordinária venha a conferir incentivos e benefícios especiais a setores considerados estratégicos, inexistindo qualquer vedação constitucional nesse sentido”.13 
Concordante com a exposição de motivos foi o parecer da Comissão Especial destinada a proferir parecer sobre a PEC nº 5 de 1995:“Por fim, lembre-se que as mudanças sugeridas não impedem que a legislação ordinária venha a conferir incentivos e benefícios especiais a setores considerados estratégicos, já que inexistiria qualquer vedação constitucional nesse sentido”.14 
De fato, a configuração da Constituição de 1988, após a alteração produzida pela Emenda Constitucional nº 6, não criou amarras à legislação ordinária para a criação de incentivos. É certo que revogou o conceito de EBCN e os incentivos e benefícios a ela associados, mas não estabeleceu proibição em contrário para a legislação ordinária. 
Todavia, seria simplista e equivocada uma interpretação da constituição que simplesmente admitisse que o que fora revogado no âmbito constitucional pudesse voltar da mesma forma nas vestes de lei ordinária. 
Se o propósito da Emenda nº 6 era exatamente a revogação da distinção, em face da necessidade de maiores investimentos de capital estrangeiro e não a mera desconstitucionalização da distinção para que permanecesse em âmbito infraconstitucional, não parece adequado supor que distinções tais quais as das EBCN pudessem retornar ao ordenamento sem uma nova emenda constitucional. 
Conforme a exposição de motivos e o parecer mencionado, o que se admite na forma de lei ordinária diz respeito a setores estratégicos. Faz sentido, portanto, que uma distinção que gere incentivos e benefícios como os que são dispensados no caso das EED só exista motivadamente – e sob motivação de cunho eminentemente estratégico, tal como concorrer para a defesa e a soberania nacionais. 
13 Diário do Congresso Nacional, Seção I, Março de 1995, Quarta feira 15, p. 3246. 
14 Diário do Congresso Nacional, Seção I, Março de 1995, Sábado 20, p. 10607.
21 
Nesse sentido, entende-se ser constitucional, dentro do ordenamento brasileiro, o conceito de EED com os benefícios que lhe são consequentes. Não obstante, embora essa questão apenas possa ser resolvida, em última instância, pelo Supremo Tribunal Federal, por ora, as disposições atinentes ao conceito de EED ficam amparadas pela presunção de constitucionalidade das leis. 
5 O que são produtos e sistemas de defesa e produtos estratégicos de defesa para efeito de aplicação do regime especial de licitação 
O conceito de Produto de Defesa (“PRODE”) foi definido no inc. I do art. 2º da Lei nº 12.598 de 2012 como: 
“todo bem, serviço, obra ou informação, inclusive armamentos, munições, meios de transporte e de comunicações, fardamentos e materiais de uso individual e coletivo utilizados nas atividades finalísticas de defesa, com exceção daqueles de uso administrativo”. 
Por sua vez, o conceito de Sistema de Defesa (“SD”) é definido no inc. III do art. 2º da mesma lei como: “conjunto inter-relacionado ou interativo de Prode que atenda a uma finalidade específica”. Como se pode ver, o conceito de SD é dependente do conceito de PRODE, deste modo, só se pode ter em vista o significado de SD entendendo-se previamente o de PRODE. 
Ora, o conceito de PRODE se estende por realidades bastante amplas: obras, bens e serviços dos mais diversos podem ser abarcados dentro dele. Deste modo o que o diferencia um PRODE de outras obras, produtos e bens, não é tanto a sua natureza, mas a finalidade que lhe é atribuída. Tomando por premissa que a expressão ‘utilizados nas atividades finalísticas de defesa’ se refere a ‘todo bem, serviço, obra ou informação’, teremos que armamentos, munições e fardamentos, meios de transporte e de comunicação, materiais de uso individual e coletivo, assim como quaisquer outros bens, serviços e obras, serão PRODE apenas quando afetados às atividades finalísticas de defesa. 
Cabe compreender, então, o conceito de atividades finalísticas de defesa.
22 
A Exposição de Motivos Interministerial nº 211/MD/MDIC/MCT/MF/MP que acompanhou a Medida Provisória nº 544 de 2012, pode lançar alguma luz a este respeito. A EMI nº 211 de 2012, ao comentar a Estratégia Nacional de Defesa (“END”), lembra que um de seus eixos estruturantes é a reorganização da indústria nacional de defesa, como uma forma de assegurar a autonomia no exercício das competências das Forças Armadas. Além disso, comenta que, conforme a END, o atendimento das necessidades de equipamento das Forças Armadas deve estar atrelado ao desenvolvimento de tecnologias sob domínio nacional e prevê, como um dos objetivos da medida provisória, a garantia da eficácia das contratações das Forças Armadas.15 
A Medida Provisória nº 544 de 2011 foi desde o início vocacionada para assegurar a eficácia das contratações das Forças Armadas para o devido cumprimento de suas competências. Isso não mudou com a sua conversão na Lei nº 12.598 de 2012. Trata-se de uma premissa suficientemente adequada para se concluir que, ao utilizar a expressão atividades finalísticas de defesa, a lei pretendeu se referir justamente àquilo que se atribui às Forças Armadas como sendo de sua alçada precípua, pois não seria outro o objetivo da compra de produtos de defesa pelas Forças Armadas senão o de viabilizar a realização de suas competências. 
Não se quer dizer que há apenas essa forma de pensar o conceito, todavia parece mesmo que o conceito de atividade finalística de defesa poderia ser integrado por aquelas funções essenciais e atribuições subsidiárias das Forças Armadas, definidas na Constituição e na Lei Complementar nº 97 de 1999 e, neste caso, consideradas pelo mesmo diploma como atividade militar.16 
15 “3. A END determina a organização da indústria de defesa para que possa ser assegurada ao País autonomia operacional necessária ao exercício das competências atribuídas às Forças Armadas, sob o pressuposto de que a organização, o preparo e o emprego da Marinha, do Exército e da Aeronáutica devem corresponder ao desenvolvimento econômico e tecnológico nacional. 
4. É nessa ordem de idéias que a END situa a reorganização da indústria de defesa como um de seus eixos estruturantes, assegurando que o atendimento das necessidades de equipamento das Forças Armadas esteja atrelado ao desenvolvimento de tecnologias sob domínio nacional. Para tanto, faz-se necessário capacitar a indústria para que conquiste autonomia em tecnologias indispensáveis à defesa do País. 
5. Com esses propósitos, o presente projeto de Medida Provisória visa a estabelecer regimes jurídico, regulatório e tributário especiais que inibam os riscos do imediatismo mercantil e assegurem a regularidade das compras públicas a partir de um planejamento criterioso, racional e voltado à eficácia das contratações das Forças Armadas.” 
16 Tenha-se em vista que a Constituição Federal definiu algumas das funções das Forças Armadas no seu art. 142, são elas em resumo: (i) a defesa da Pátria; (ii) a garantia dos poderes constitucionais; e (iii) a garantia da lei e da ordem por iniciativa de qualquer dos três poderes. Em seguida, o § 1º do mesmo artigo deixou para lei complementar a regulamentação das normas gerais de organização, preparo e
23 
Portanto, ao tratar das funções e atribuições das Forças Armadas para a definição de atividade finalística de defesa, é central a noção de que atividades finalísticas de defesa são atividades exercidas pelas Forças Armadas ou diretamente relacionadas a elas. Sendo assim, retomando o raciocínio anterior sobre PRODE, os mais diversos produtos seriam PRODE sempre que estivessem afetados a essas funções e atribuições das Forças Armadas. 
Com a regulamentação levada a efeito pelo Decreto nº 7.970 de 2013, no entanto, essas discussões sobre a substância do conceito de PRODE perdem um pouco de sua relevância diante do estabelecimento de um procedimento formal para a classificação de um produto como PRODE. 
A classificação deve se realizar segundo as normas do Sistema Militar de Catalogação das Forças Armadas - SISMICAT.17 Há três caminhos para a classificação de um produto como PRODE: (i) por ação de um órgão do Ministério da Defesa chamado Centro de Catalogação das Forças Armadas – CECAFA; (ii) por ação de entidades de catalogação públicas ou privadas autorizadas pelo Ministério da Defesa, desde que homologadas pelo CECAFA; (iii) ou, se o produto não for abrangido pelo SISMICAT ou estiver em processo de catalogação, por ato do Ministro da Defesa em face de proposta da Comissão Mista da Indústria de Defesa – CMID, órgão criado pelo mesmo decreto para assessorar o Ministério da Defesa nos assuntos das contratações militares. 
emprego das mesmas forças. Por sua vez, a Lei Complementar nº 97 de 1999 que veio a regulamentar o art. 142, § 1º, tratou tanto das atribuições constitucionais das Forças Armadas como de outras subsidiárias. 
São atribuições tais como: (i) o próprio preparo das Forças Armadas que compreende planejamento, organização e articulação, instrução e adestramento, desenvolvimento de doutrina e pesquisas específicas, inteligência e estruturação, além de atividades de inteligência e mobilização; (ii) o emprego das Forças Armadas na defesa da Pátria, na garantia dos poderes constitucionais, na garantia da lei e da ordem intestinas e na participação em operações de paz; (iii) atividades de defesa civil realizadas pelas Forças Armadas; (iv) as atribuições subsidiárias das Forças Armadas de prevenção e repressão de delitos transfronteiriços e ambientais nas faixas de fronteira, no mar e nas águas interiores, além de outras atribuições subsidiárias específicas de cada Força, como a fiscalização do espaço aéreo, combate ao tráfico de drogas e o cumprimento da lei dentro das águas nacionais; (v) a requisição das Forças Armadas pelos órgãos da Justiça Eleitoral na garantia de suas decisões e na garantia de votações e apurações. 
17 Conforme o Manual do Sistema Militar de Catalogação (SISMICAT), Vol. I, 2ª ed. 2003, o SISMICAT consiste em um sistema de normas e parâmetros para catalogação de itens, produtos, e empresas fornecedoras, adotando a uniformidade do NATO Codification System, o sistema de catalogação utilizado pela OTAN do qual o Brasil é signatário. Cada item ou empresa é catalogado de modo que se permita a sua inequívoca identificação, compondo o Catálogo de Itens e Empresas - CAT-BR. Utilizando esse sistema de catalogação, é possível, entre outras coisas, a identificação dos itens pelo conceito a
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Por sua vez, os produtos estratégicos de defesa (“PED”) foram definidos no inc. II do art. 2º como: todo Prode que, pelo conteúdo tecnológico, pela dificuldade de obtenção ou pela imprescindibilidade, seja de interesse estratégico para a defesa nacional, tais como: 
1. recursos bélicos navais, terrestres e aeroespaciais; 
2. serviços técnicos especializados na área de projetos, pesquisas e desenvolvimento científico e tecnológico; 
3. equipamentos e serviços técnicos especializados para as áreas de informação e de inteligência. 
Deste modo, PED é sempre uma espécie de PRODE qualificado por ser de interesse estratégico para a defesa nacional em face de alguma das características que o inciso menciona: conteúdo tecnológico, dificuldade de obtenção ou imprescindibilidade. 
Essas três características não têm um conteúdo muito seguro para que se possa afirmar com precisão o que seja um PED. Da mesma forma, a qualificação de “interesse estratégico para a defesa nacional” não é precisa. 
Todavia, a exemplificação seguinte daqueles PRODE que constituiriam PED nas alíneas do inciso II – recursos bélicos navais, terrestres e aeroespaciais, serviços técnicos especializados na área de projetos, pesquisas e desenvolvimento científico e tecnológico, equipamentos e serviços técnicos especializados para as áreas de informação e de inteligência – permite ter alguma noção sobre que espécie de produtos e que grau de conteúdo tecnológico, dificuldade de obtenção e imprescindibilidade devem possuir.18 
que servem, podendo-se identificar uma série de itens que correspondem a uma mesma finalidade conceitual o que, por sua vez, permite um maior controle de estoques e gerenciamento de aquisições. De outro lado, a adoção de um sistema uniforme de catalogação permite o controle centralizado das compras das três Forças, assim como uma gestão centralizada mais eficiente. 
18 Anote-se que esses produtos de defesa exemplificados nas três alíneas, são, inclusive com a mesma redação, objeto de dispensa de licitação conforme o Regulamento do inc. IX do art. 24 da Lei nº 8.666 de 1993, o Decreto nº 2.295 de 1997. 
O mencionado inciso da Lei de Licitações e Contratos estabelece como hipótese de dispensa de licitação aqueles casos em que houver possibilidade de comprometimento da segurança nacional, nos casos estabelecidos em decreto do Presidente da República, ouvido o Conselho de Defesa Nacional. Por sua vez, o decreto ao regulamentar o inciso estabeleceu em seu art. 1º a dispensa de licitação para as compras e contratações de obras ou serviços quando envolverem: aquisição de recursos bélicos navais, terrestres e aeroespaciais (inc. I); contratação de serviços técnicos especializados na área de projetos, pesquisas e desenvolvimento científico e tecnológico (inc. II); e aquisição de equipamentos e contratação de serviços técnicos especializados para a área de inteligência (inc. III). Desde que,
25 
A classificação de PED, conforme o Decreto nº 7.970/2013, é feita através da reclassificação de produtos já classificados como PRODE, por ato do Ministro da Defesa, precedido por proposta da CMID, desde que considerados de interesse estratégico para a defesa nacional devido ao conteúdo tecnológico, dificuldade de obtenção ou imprescindibilidade. 
Em suma, nesse contexto, o que irá distinguir, na prática, um PRODE ou PED de outros produtos é o critério formal da sua classificação como tal. 
5.1 Produtos de uso administrativo e sua contratação conjunta com PRODE 
A Lei nº 12.598 de 2012 exclui da definição de PRODE os bens, serviços e obras de uso administrativo. É possível que em contratações cujo escopo abrangente envolva alta complexidade e não poucas obrigações — como, por exemplo, ocorre nas concessões administrativas, uma das modalidades de Parceria Público-Privada de que trata a Lei Federal nº 11.079/04 —, surja a dúvida a respeito da possibilidade de, sob um mesmo contrato, incluírem-se PRODE e outros objetos contratuais de finalidade meramente administrativa. 
Pense-se, apenas para ilustrar, em uma concessão administrativa que envolva a construção e manutenção de um complexo militar com infraestrutura para guardar material bélico, combustíveis etc., além de infraestrutura própria para instalações burocráticas de cunho administrativo e a manutenção de ambas. 
Não parece razoável que nesses casos a resposta deva ser uma separação contratual, isto é, um contrato para PRODE e outro para produtos de uso administrativo, ainda que o resultado final esteja interligado, pois, por óbvio, uma tal solução levaria a um aumento da complexidade tanto na elaboração quanto na gestão dos projetos, assim como dos custos e riscos dos projetos como um todo e sem que houvesse uma justificativa plausível para tanto. 
acrescente-se, a revelação de sua localização, necessidade, característica, especificação ou quantidade coloque em risco objetivos da segurança nacional.
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Mais sensato, a princípio, parece ser que a contratação se realizasse de modo conjunto. Os princípios da eficiência e da economicidade poderiam subsidiar de forma muito clara esse entendimento. Portanto, havendo eficiências econômicas, como ganhos com economias de escala ou de escopo, na elaboração de um projeto que envolva a contratação ao mesmo tempo, tanto de PRODE ou SD como objetos de uso tão somente administrativo, parece absolutamente sensato que a contratação ocorra por meio de um único contrato regido pelo novo regime, o que, ao cabo, resulta em benefício da Administração. 
6 Alguns comentários sobre a quem se aplica o novo regime 
As regras para se determinar o âmbito de incidência do novo regime de contratações encontram-se insculpidas no art. 1º da Lei nº 12.598 de 2012.19 Levam em consideração dois critérios: um, de natureza objetiva, porque envolve o objeto da contratação; o outro, de natureza subjetiva, porque envolve o(s) sujeito(s) da contratação. 
O caput do art. 1º contém um critério objetivo para delimitar o alcance do regime, pois estabelece os atos jurídicos sobre os quais este incidirá. São atos jurídicos que ensejam a aplicação do regime: as compras, as contratações e o desenvolvimento de produtos de defesa e sistemas de defesa. A separação entre compras, contratações e desenvolvimento não é precisamente técnica. Compras e desenvolvimento são operações contratuais que qualificam espécies do gênero das contratações, e. g., contratações de compra e venda e de desenvolvimento. Em outras palavras, apenas a expressão contratações, por sua generalidade, incluiria em si contratos de compra e venda, de desenvolvimento, assim como de prestação de serviços e de obras de modo geral. 
19 Art. 1o Esta Lei estabelece normas especiais para as compras, as contratações e o desenvolvimento de produtos e de sistemas de defesa e dispõe sobre regras de incentivo à área estratégica de defesa. 
Parágrafo único. Subordinam-se ao regime especial de compras, de contratações de produtos, de sistemas de defesa, e de desenvolvimento de produtos e de sistemas de defesa, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas e privadas, as sociedades de economia mista, os órgãos e as entidades públicas fabricantes de produtos de defesa e demais entidades controladas, direta ou indiretamente, pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios.
27 
Os conceitos de produto de defesa e sistema de defesa, assim como de PED, já foram tratados no tópico 5, inclusive quanto à possibilidade de contratação simultânea destes com produtos de uso administrativo no tópico 5.1. Portanto, não há mais a acrescentar sobre o entendimento a respeito do critério objetivo para incidência do regime especial de contratação no setor de defesa. 
Já o parágrafo único do art. 1º estabelece um critério subjetivo para delimitar a incidência do regime, pois trata dos sujeitos que se subordinam à sua aplicação. Este critério subjetivo merece alguns reparos. É disso que trata o presente tópico, em especial. 
Segundo a Lei, subordinam-se ao regime especial os órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas e privadas, as sociedades de economia mista, os órgãos e as entidades públicas fabricantes de produtos de defesa e demais entidades controladas, direta ou indiretamente, pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios. 
É de se notar que, além de não haver restrição da incidência do regime aos órgãos e entidades da administração direta e indireta que não sejam da esfera federal, foram incluídas expressamente, no rol das entidades subordinadas, (i) as empresas privadas e (ii) as entidades controladas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios. 
6.1 Referência a empresas privadas 
A referência a “empresas privadas” precisa ser interpretada no âmbito de um contexto mais amplo de licitações e contratações pelo setor público, bem como considerando os objetivos da Lei em questão. 
Claramente, a referência a “empresas privadas” no parágrafo único supracitado não indica simplesmente a natureza jurídica da pessoa jurídica envolvida, até porque tanto as empresas públicas quanto as sociedades de economia mista são tidas por “pessoas jurídicas de direito privado” no âmbito de nossa legislação, embora com algumas peculiaridades quanto ao regime jurídico incidente. Portanto, o legislador parece ter pretendido se referir, efetivamente, a empresas privadas no sentido de oposição a empresas estatais (empresas públicas e sociedades de economia mista, que são também listadas no indigitado parágrafo único).
28 
Ora, naturalmente, as empresas privadas que contratarem com a Administração PRODE ou SD se subordinam ao regime especial, mas se subordinam como empresas que concorrem entre si para contratar com a Administração, participando de uma licitação, ou como empresas que se sujeitam a serem escolhidas para contratar por meio de processos de dispensa ou inexigibilidade de licitação. 
Não é cabível, por certo, qualquer interpretação de que as empresas privadas (em oposição às empresas estatais) do setor de defesa tenham que se subordinar ao regime da mesma forma que a Administração, isto é, sendo obrigadas a licitar ou a promover processos de dispensa ou inexigibilidade para contratar. Nesse sentido, é mais feliz a redação do art. 1º, parágrafo único da Lei nº 8.666 de 1993 que não gerou esse tipo de confusão.20 
A referência a empresas privadas (em oposição às empresas estatais), por conseguinte, apenas pode ser compreendida quando se pensa que a Lei trata não apenas do regime especial de licitação e contratação, como também do regime especial de tributação. Quanto a esse último aspecto, por evidente, o objetivo da Lei era que as empresas privadas pudessem se beneficiar desse regime especial tributário. O problema hermenêutico é gerado pelo fato de que o parágrafo único, na sua literalidade, apenas se refere ao regime especial de licitação e contratação. Todavia, esse problema de interpretação pode ser facilmente contornado mediante uma leitura sistemática da Lei, dado o contexto geral do sistema de licitações e contratações no Brasil. 
6.2 Referência a entidades controladas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios: há possibilidade de extensão do regime especial às polícias militares estaduais e outras forças? 
20Lei nº 8.666 de 1993: 
Art. 1o Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. 
Parágrafo único. Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
29 
Sobre a inclusão de entidades controladas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios e a ausência de uma restrição às entidades que não as da administração direta e indireta federais, a questão a ser destacada tem a ver com o conceito de “atividades finalísticas de defesa” e sobre quem é responsável por executá- las. 
Em princípio, trata-se de competência da União a ser exercida pelas Forças Armadas, i.e., a Aeronáutica, a Marinha e o Exército. Claramente, o legislador parece ter pensado nas Forças Armadas como sujeito primordial do novo regime de contratações no setor de defesa. A exposição de motivos da Medida Provisória nº 544 de 2011 corrobora essa tese. De fato, a EMI nº 211, de 2011, reitera diversas vezes a ideia de contratações voltadas para as Forças Armadas. 
Dessa perspectiva, não faria muito sentido a referência a entidades controladas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, dado que apenas a União possui Forças Armadas. 
Uma forma de dar sentido lógico a esse parte do parágrafo único em questão seria admitir que o regime pudesse ser estendido não apenas às Forças Armadas, mas também às demais forças militares, em especial às polícias militares estaduais. No caso das guardas municipais, a extensão torna-se um pouco mais difícil, dado que são essencialmente civis, e não militares. Existe um interesse econômico relevante nessa extensão, particularmente em face do regime especial tributário envolvido e da possibilidade de restrição à participação de Empresas Estratégicas de Defesa nas respectivas licitações. 
O contra-argumento a essa interpretação é que as polícias militares atuam especialmente em questões de segurança pública, e não propriamente de defesa. A própria Constituição da República tratou de separar o tratamento das Forças Armadas (art. 142) daquelas forças responsáveis por segurança pública (art. 144). 
Deve-se, sopesar, por outro lado, que a Estratégia Nacional de Defesa (orientador geral que ensejou o novo marco de contratações no setor de defesa) considera a questão da defesa nacional sob uma perspectiva muito mais ampla que simplesmente a atuação das Forças Armadas. Daí, não seria descabido buscar também uma interpretação mais extensiva do conceito de “atividades finalísticas de defesa”, quando se pensa no contexto geral da Estratégia Nacional de Defesa.
30 
Essa interpretação mais extensiva teria um efeito muito benéfico sobre a indústria, pois os produtos envolvidos em defesa (no sentido estrito de atuação das Forças Armadas) e em segurança pública são, por vezes, quase idênticos. Dessa perspectiva, seria possível pensar em uma escala muito maior para o mercado de “produtos de defesa” e para as “empresas estratégicas de defesa” se os clientes puderem ser não apenas as Forças Armadas, mas também as polícias militares e a polícia federal, por exemplo. Isso está em linha com o objetivo maior da Estratégia Nacional de Defesa de fomentar a Indústria de Defesa nacional. 
Por evidente, existem outros interesses envolvidos no equacionamento dessa questão, como, por exemplo, as consequências fiscais, dado que essa interpretação extensiva poderia ensejar uma renúncia fiscal indireta, por conta do benefício tributário envolvido (RETID). 
Não é possível antecipar com segurança, nesse contexto, qual será a interpretação dos tribunais de contas, dos demais órgãos de fiscalização e do próprio Judiciário, caso se realize na prática uma interpretação que acabe por estender o novo regime também às polícias militares estaduais e à própria polícia federal. 
7 Oportunidade para desenvolvimento de PPPs 
O novo marco de contratações para o setor de defesa lembrou especificamente da alternativa de contratação por meio de concessões administrativas, uma das modalidades de Parceria Público-Privada, de que trata a Lei Federal nº 11.079/0421. Ficou expressamente admitida, assim, a realização de PPPs no setor de defesa, o que, aliás, está em linha com a prática internacional. 
21 Trata-se do art. 5º da Lei Federal nº 12.598, que assim estabelece: “Art. 5º As contratações de Prode ou SD, e do seu desenvolvimento, poderão ser realizadas sob a forma de concessão administrativa a que se refere a Lei no 11.079, de 30 de dezembro de 2004, observado, quando couber, o regime jurídico aplicável aos casos que possam comprometer a segurança nacional. § 1º O edital definirá, entre outros critérios, aqueles relativos ao valor estimado do contrato, ao período de prestação de serviço e ao objeto. § 2º O edital e o contrato de concessão administrativa disciplinarão a possibilidade e os requisitos para a realização de subcontratações pela concessionária. § 3º Caso as contratações previstas no caput envolvam fornecimento ou desenvolvimento de PED, mesmo que sob a responsabilidade dos concessionários, suas aquisições obedecerão aos critérios e normas definidos por esta Lei”.
31 
Lembre-se que existe um conceito estrito de PPP na legislação brasileira, o qual não se confunde com a expressão “public-private partnership” muito frequentemente utilizada na literatura estrangeira. De fato, internacionalmente, o termo PPP tem sido frequentemente referido para significar qualquer tipo de parceria de longo prazo entre o setor público e o setor privado. Já no Brasil o acrônimo PPP se refere a dois tipos específicos de contrato: concessão patrocinada e concessão administrativa22. 
O tipo contratual aplicável ao setor de defesa é a concessão administrativa, cuja definição, nos termos do art. 2º, § 2º, da Lei Federal nº 11.079/04, apresenta-se a seguir: “contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens”. 
A primeira característica a se destacar é que esse tipo de contrato tem a natureza de “prestação de serviços”. Usualmente, no entanto, é precedido de algum investimento de monta por parte do parceiro privado, seja no desenvolvimento de um ativo específico a ser explorado na prestação dos serviços objeto da PPP, ou ainda na formação de recursos humanos e desenvolvimento de uma tecnologia ou produto. 
De qualquer forma, o contrato de PPP não pode ser reduzido a um simples contrato de construção de obra, ou de fornecimento de equipamento, ou ainda de terceirização de mão-de-obra (cf.: art. 2º, § 4º, inc. III). Trata-se, como regra geral, de um objeto complexo, cujo foco é a prestação de serviços, mas que pode ser precedido de construção de obra e/ou fornecimento de equipamentos e outros produtos. 
Pelas suas características e dado o contexto do setor de defesa, as PPP tendem a se difundir primeiramente para atender aquelas demandas consideradas “atividades- meio” das Forças Armadas, tais como, construção e manutenção de próprios residenciais e prédios administrativos para abrigar pessoal das Forças, ou até mesmo colégios militares. Essa parece ter sido a tendência, ao menos até o momento, considerando-se a maior parte dos projetos de PPP em discussão no Brasil no âmbito das Forças Armadas. Todavia, verificam-se também, embora com menos frequência, projetos de PPP para desenvolvimento, modernização e/ou manutenção de veículos e equipamentos, armamentos, e outros bens com aplicação direta em atividades de combate. 
22 Para uma discussão mais profunda acerca do conceito de PPP, recomenda-se a leitura da obra Comentários à Lei de PPP: fundamentos econômico-jurídicos (Malheiros: 2007), de autoria de Lucas Navarro Prado (ora co-autor deste artigo), juntamente com Maurício Portugal Ribeiro.
32 
O uso de PPPs para fins militares já possui amadurecida experiência no estrangeiro, sendo diversos os países que possuem iniciativas desse jaez a exemplo do Reino Unido e dos Estados Unidos. As possibilidades de estruturação de projetos de PPP para fins militares são inúmeras e adaptáveis às necessidades de suprir ou aperfeiçoar capacidades militares desejadas. Os projetos variam desde desenvolvimento, planejamento, produção, manutenção, renovação e treinamento de pessoal envolvendo determinados produtos como aviões, helicópteros, carros de combate, satélites até a gestão de habitações militares. Tomem-se por exemplos: 
1) Military Flying Training System ("MFTS") no Reino Unido, parceria público-privada cujo contrato — de £ 635 milhões celebrado com a Ascent, joint venture composta por Lockheed Martin e VT Group, e com duração de 25 anos — tem por escopo prover as Forças Armadas inglesas com treinamento avançado de pilotagem de jatos e a infraestrutura adequada para isso.23 
2) Future Strategic Tanker Aircraft ("FSTA") no Reino Unido, parceria público-privada com objetivo de prover a Royal Air Force com aviões- tanque e aviões de transporte para substituir os modelos em serviço VC10 e Lockheed Tristars, contratada com a Air Tanker Ltd., consórcio formado por Rolls Royce, Cobham, EADS e Thales Group, no valor de £ 13 bilhões.24 
23 Welcome to the UK Military Flying Training System Website, 2005,http://webarchive.nationalarchives.gov.uk/ 20050513213031/http://www.ukmfts.mod.uk/pages/faqprogramme.shtml, acessado em 10 de julho de 2013. 
24 Ministry of Defence, Future Strategic Tanker Aircraft (FSTA) http://webarchive.nationalarchives.gov.uk/20121026065214/http://www.mod.uk/DefenceInternet/FactSheets/ProjectFactsheets/FutureStrategicTankerAircraftfsta.htm, acessado em 10 de julho de 2013.
33 
3) Military Housing Privatization Initiative ("MHPI") nos Estados Unidos, programa de parcerias público-privadas estruturadas em que ao parceiro privado, por conta própria, é conferido a responsabilidade de construir, operar, manter, aperfeiçoar e, por vezes, renovar a infraestrutura de habitações familiares para militares. A política pública foi editada pelo Congresso Norte-Americano em 1996 como parte do National Defense Authorization Act para o ano fiscal de 1996. O programa resolveu muitos dos problemas concernentes à habitação militar, principalmente, problemas de restrições orçamentárias ao permitir a participação competitiva da iniciativa privada. Como parte da política do Department of Defense, um projeto de parceria deve gerar um benefício de no mínimo US$ 3 em termos de desenvolvimento habitacional para cada US$ 1 do contribuinte destinados ao projeto. Para o programa como um todo, esse potencial de geração é, em média, de US$ 10 para US$ 1.25 
As concessões administrativas no setor de defesa são instrumentos excelentes para se alcançar o objetivo de fomento à Indústria Nacional de Defesa, pois resolvem dois problemas graves que historicamente têm prejudicado o setor: 
 instabilidade das disponibilidades orçamentárias: o setor de defesa tem sido tradicionalmente assolado por sucessivos cortes orçamentários, havendo baixa previsibilidade de recursos disponíveis, particularmente quando se avalia o médio e longo prazo. Evidentemente, as empresas privadas têm dificuldade em mobilizar capital para o desenvolvimento da Indústria Nacional de Defesa sem a perspectiva de disponibilidade orçamentária das Forças Armadas, dado o mercado ainda incipiente. No âmbito das concessões administrativas, no entanto, é possível afastar a possibilidade de cortes orçamentários, bem como oferecer garantias de adimplemento ao parceiro privado quanto aos pagamentos governamentais que sejam devidos no âmbito da PPP26; 
25 Military Housing Privatizations FAQs, http://www.acq.osd.mil/housing/faqs.htm, acessado em 10 de julho de 2013. 
26 Isso não deve obscurecer o fato de que, ao se proteger a PPP contra cortes orçamentários, criam-se pressões internas, no âmbito de cada Força, contrárias à celebração da PPP por parte dos gestores dos demais contratos. A razão é o temor de que, havendo necessidade de acomodar eventuais
34 
 contratos de curto prazo: como se sabe, no âmbito da Lei Federal nº 8.666/93, os contratos de prestação de serviços estão limitados a 5 anos como regra geral e, no setor de defesa, em alguns casos, podem alcançar vigência de 10 anos27. Já no âmbito das PPPs, o prazo pode ser estabelecido em até 35 anos. Nesse contexto, as concessões administrativas são instrumentos muito mais adequados para oferecer às empresas privadas estabilidade de longo prazo na demanda pelos seus serviços. Esse ponto também é fundamental para estimular as empresas privadas a mobilizarem capital para o desenvolvimento de uma Indústria de Defesa Nacional. 
Recentemente, o Governo Federal tem demonstrado interesse em PPPs militares, havendo projetos, inclusive, na pauta do Comitê Gestor de Parceria Público-Privada federal28 em desenvolvimento: 
contingenciamentos, os cortes serão dirigidos aos demais contratos em andamento, com exceção da(s) PPP(s). Isso implicaria um esforço fiscal maior por determinados departamentos da Força contratante, em comparação com aquele departamento responsável pela PPP (o qual não sofreria a pressão do corte orçamentário). Assim, a celebração de uma PPP pode significar a formação de “perdedores” e “ganhadores”, do ponto de vista orçamentário, o que naturalmente tende a criar resistências ao desenvolvimento de um programa robusto de PPPs militares. Aliás, esse não é um problema exclusivo das PPPs no âmbito das Forças Armadas, mas presente em qualquer burocracia estatal organizada. 
27 A possibilidade de vigência pelo prazo de 10 anos foi prevista no art. 57, inc. V, da Lei Federal nº 8.666/93. Segundo esse dispositivo, as hipóteses previstas nos incisos IX, XIX, XXVIII e XXXI do art. 24, também da Lei Federal nº 8.666/93, admitem contratos com vigência por até 120 meses, caso haja interesse da administração. As hipótese específicas do setor de defesa são as seguintes: (a) quando houver possibilidade de comprometimento da segurança nacional, nos casos estabelecidos em decreto do Presidente da República, ouvido o Conselho de Defesa Nacional; (b) para as compras de material de uso pelas Forças Armadas, com exceção de materiais de uso pessoal e administrativo, quando houver necessidade de manter a padronização requerida pela estrutura de apoio logístico dos meios navais, aéreos e terrestres, mediante parecer de comissão instituída por decreto; e (c) para o fornecimento de bens e serviços, produzidos ou prestados no País, que envolvam, cumulativamente, alta complexidade tecnológica e defesa nacional, mediante parecer de comissão especialmente designada pela autoridade máxima do órgão. 
28 Resolução nº 03 de 14 de dezembro de 2011 do CGPPP federal.
35 
1) AGEFROT, Sistema de Abastecimento e Gerenciamento de Frota do Exército Brasileiro, envolvendo provisão de combustíveis e lubrificantes necessários às operações do Exército Brasileiro, implantação de sistema que permita o monitoramento da frota terrestre e o controle do fornecimento e do consumo de combustíveis utilizados durante os deslocamentos e a construção, modernização, manutenção e operação de postos de abastecimento de propriedade do Exército Brasileiro.29 
2) PNRs (Próprios Nacionais Residenciais) do Complexo Naval em Itaguaí, cujo objeto é a construção e gestão de habitações militares para os militares que estiverem lotados no Complexo Naval de Itaguaí cuja construção é parte do escopo do PROSUB como mencionado no início deste artigo.30 
3) Construção de Polo Tecnológico integrado ao Instituto Militar de Engenharia ("IME") em Guaratiba - RJ, ainda em fase de planejamento com a minuta da proposta de manifestação de interesse já tendo sido enviada ao Ministério do Planejamento pelo Exército, prevendo a construção de 1,5 mil habitações, pistas de voo aéreo não tripulado e centro tecnológico para agregar instalações de diversas empresas ligadas à área de defesa.31 
4) Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro, modernização da infraestrutura e operação dos órgãos destinados ao reparo e à manutenção dos meios navais.32 
29 Planejamento convida iniciativa privada para apresentar projetos de PPP para o Exército Brasileiro e a Marinha do Brasil, 05 de março de 2013, http://www.planejamento.gov.br/hotsites/ppp/conteudo/noticias/2013/130205_plan_convida.html, acessado em 10 de julho de 2013. 
30 Planejamento convida iniciativa privada para apresentar projetos de PPP para o Exército Brasileiro e a Marinha do Brasil, 05 de março de 2013, http://www.planejamento.gov.br/hotsites/ppp/conteudo/noticias/2013/130205_plan_convida.html, acessado em 10 de julho de 2013. 
31 Nicholle Murmel ,Exército estuda PPP para construção de polo tecnológico, 27 de junho de 2013, via Valor Econômico, http://www.forte.jor.br/tag/parceria-publico-privada/, acessado em 10 de julho de 2013. 
32 Comitê Gestor de PPPs federais define projetos prioritários, 27 de agosto de 2012, http://www.pppbrasil.com.br/portal/content/comit%C3%AA-gestor-de-ppps-federais-define-projetos- priorit%C3%A1rios, acessado em 10 de julho de 2013.
36 
5) NCMM, Novo Colégio Militar de Manaus, construção e manutenção de novo Colégio Militar em Manaus, projeto com licitação prevista para setembro de 2014.33 
6) CEFAN, Centro de Educação Física Almirante Adalberto Nunes, implantação de infraestrutura, operação e manutenção de complexo esportivo.34 
7) Novo fuzil, fabricação e manutenção de novo fuzil desenvolvido pela Indústria de Material Bélico do Brasil (“IMBEL”).35 
Alguns desses projetos, como é o caso do NCMM, de CEFAN e dos PNRs do Complexo Naval em Itaguaí, não parecem atinentes ao conceito de PRODE ou SD, pois não estão tão diretamente relacionados ao que em tópico anterior se entendeu por atividade finalística de defesa. Esses projetos estão mais próximos daquilo que foi tratado como produtos de caráter administrativo. Sendo assim, a essas parcerias, em tese, não se aplicam as regras do regime especial. A situação é diferente nas parcerias cujo escopo pode ser claramente identificado como relativo a atividades finalísticas de defesa. 
As concessões administrativas, nesse contexto, estão aptas a revolucionar os contratos com a Administração Pública no setor de defesa, oferecendo maior previsibilidade, estabilidade e garantias às empresas privadas. A utilização desse instrumento facilitará a prestação de serviços caracterizados como “atividades-meio” das Forças Armadas, bem como tem potencial também para apoiar o desenvolvimento, com mais qualidade e agilidade, de uma efetiva Base Industrial de Defesa nacional. 
7.1 Regime aplicável em casos de comprometimento da segurança nacional 
33 Projetos em andamento/prioritário, http://www.epex.eb.mil.br/index.php/ppp/projetos-em- andamento acessado em 10 de julho de 2013. 
34 Comitê Gestor de PPPs federais define projetos prioritários, 27 de agosto de 2012, http://www.pppbrasil.com.br/portal/content/comit%C3%AA-gestor-de-ppps-federais-define-projetos- priorit%C3%A1rios, acessado em 10 de julho de 2013. 
35 Comitê Gestor de PPPs federais define projetos prioritários, 27 de agosto de 2012, http://www.pppbrasil.com.br/portal/content/comit%C3%AA-gestor-de-ppps-federais-define-projetos- priorit%C3%A1rios, acessado em 10 de julho de 2013.
37 
É interessante notar que o final do caput do art. 5º da Lei Federal nº 12.598/12 determina, quando couber, a observância do regime jurídico aplicável aos casos que possam comprometer a segurança nacional. A Lei Federal nº 8.666/93, ao lado disso, menciona uma vez em todo o seu corpo o comprometimento da segurança nacional, não por outra razão, senão para fins de dispensa de licitação, cuja regulamentação se encontra no Decreto nº 2.295/97. 
Conforme o decreto, há duas possibilidades de dispensa de licitação nos casos de comprometimento da segurança nacional. 
Na primeira delas, serão dispensadas de licitação as contratações de obras ou serviços quando a revelação de sua localização, necessidade, característica do objeto, especificação ou quantidade coloque em risco os objetivos da segurança nacional e forem relativos à (i) aquisição de recursos bélicos navais, terrestres e aeroespaciais; (ii) contratação de serviços tecnológicos especializados na área de projetos, pesquisas e desenvolvimento; (iii) aquisição de equipamentos e contratação de serviços técnicos especializados para a área de inteligência. Note-se, por sua vez, que se trata dos mesmos tipos de contratações que exemplificam o conceito de PED na Lei nº 12.598/12. 
Não obstante, esses casos de dispensa de licitação devem ser necessariamente precedidos de justificativa quanto ao preço da contratação e quanto à escolha do contratado, cabendo, ainda, a sua ratificação pela autoridade com a prerrogativa de Ministro de Estado da pasta ou órgão competente. 
A segunda possibilidade abarca as dispensas para os casos em que possa haver comprometimento da segurança nacional não previstos na primeira hipótese de dispensa de licitação. Nessas hipótese, passa a ser necessário para a dispensa que os casos sejam submetidos à apreciação do Conselho de Defesa Nacional.
38 
A grande vantagem da previsão contida na Lei nº 12.598/12 — ao expressamente prever a possibilidade de aplicação da hipótese de dispensa de licitação — é a supressão de uma lacuna jurídica, por vezes discutida no regime geral de PPPs: saber se a estas se aplicam as normas de dispensa e inexigibilidade. Ao menos para fins das PPPs militares que envolvam contratação de PRODE ou SD, portanto, quando possa haver comprometimento da segurança nacional e desde que preenchidos as exigências do Decreto nº 2.295/97, é possível concluir inequivocamente pela possibilidade jurídica de dispensa de licitação36. 
36 Registre-se que um dos coautores deste artigo, aliás, já havia se posicionado pela possibilidade de aplicação das hipóteses de inexigibilidade e de dispensa de licitação, observados os limites do art. 175 da Constituição quando o objeto envolver a prestação de serviços públicos. Cite-se o trecho do livro conjunto de Maurício Portugal Ribeiro e Lucas Navarro Prado, registrando, já em 2007, em seus Comentários à Lei de PPP: fundamentos econômico-jurídicos (Editora Malheiros), a posição desses autores: “Cabe, por fim, indagar se a exigência de realização de licitação contida no caput do art. 10 afasta a possibilidade de aplicação dos dispositivos sobre inexigibilidade e dispensa previstos na Lei 8.666/1993. A resposta a essa questão requer, em primeiro plano, separar as PPPs cujo objeto é a prestação de um serviço público daquelas que tratam de atividade econômica em sentido estrito, pois o art. 175 da CF, ao exigir que a contratação de concessões de serviço público seja realizada ‘sempre através de licitação’, realizou essa separação. Por razões didáticas, tratemos primeiro do caso das PPPs relativas à atividades econômicas em sentido estrito. Nosso entendimento é que, em relação às PPPs cujo objeto é a exploração de atividade econômica em sentido estrito, o art. 10 da Lei de PPP não afasta a aplicação dos casos de inexigibilidade e dispensa previstos na Lei 8.666/1993. O caso da inexigibilidade nos parece óbvio. Uma licitação é inexigível quando não há possibilidade de competição. Ora, a impossibilidade de competição é um fato da natureza; se ele ocorre, mesmo que quiséssemos manter contrafaticamente a exigência do art. 10 acima, ela seria inútil. Resultaria em desperdício de recursos públicos em um procedimento licitatório que restará com apenas um participante, ou que não resultará em contratação, porque o eventual selecionado não será capaz de dar cabo do fim colimado. Já as hipóteses de dispensa de licitação referem-se, em regra, a casos nos quais a licitação seria viável, mas cuja realização contrariaria algum interesse público entendido, na situação, como superior àqueles que exigem a licitação. Se a lei geral de contratos administrativos perfilha entendimento no sentido de que há interesses públicos que devem prevalecer em situações específicas à própria exigência da licitação, não nos parece razoável que o mero silêncio da Lei de PPP sobre esse assunto tenha o condão de afastar a aplicação às PPPs dos dispositivos presentes na Lei 8.666/1993, que é subsidiária à Lei de PPP. Aqui, é importante assinalar que inexigibilidade e dispensa são institutos que desempenham funções importantíssimas para a consecução de interesses públicos. O fato de que sejam muitas vezes usados indevidamente, para favorecer este ou aquele contratante, não é razão para se negar sua utilidade ou restringir sua aplicação. A providência contra o uso indevido da dispensa ou inexigibilidade deve ser a punição dos que as utilizam indevidamente; e não a poda, de forma genérica e preventiva, ou a eliminação, por meio de uma hermenêutica extremamente restritiva, das possibilidades de uso de tais institutos. Já em relação às PPPs que envolvem a exploração de serviço público, elas estão sujeitas ao disposto no art. 175 da CF, o qual diz que as contratações de concessões de serviços públicos serão realizadas “sempre através de licitação”. Temos que o efeito disso é que em relação às PPPs cujo objeto seja a exploração de serviço público não caberá a realização de dispensa de licitação. Parece-nos, entretanto, perfeitamente cabível a aplicação do instituto da inexigibilidade. Como já aludimos acima, o instituto da inexigibilidade trata de uma impossibilidade do mundo fático, do mundo material, que não pode ser contornada. Tentativa de fazê-lo resultaria, como anotamos anteriormente, em prejuízos para a Administração. Já a dispensa de licitação é realizada em vista de interesses públicos que em determinadas situações a lei entende conflitantes e superiores à exigência de licitação. Ora, a valoração sobre a superioridade dos interesses que justificam a dispensa de licitação é realizada pela Lei 8.666/1993, que é a lei que atualmente disciplina o assunto. Como, entretanto, no caso das concessões
39 
8 Conclusão 
O novo regime de contratações de produtos e sistemas de defesa trouxe, na esteira da Estratégia Nacional de Defesa, conceitos novos como os de empresa estratégica de defesa (EED), produto de defesa, sistema de defesa, produto estratégico de defesa e novidades no sistema de licitação e contratos, mormente a possibilidade de realizar licitações: exclusivamente entre EEDs para contratações envolvendo produtos estratégicos de defesa; destinadas a contratação de produtos ou sistemas de defesa somente produzidos e desenvolvidos no país; e que assegure à empresa nacional defesa ou a Instituição Científica e Tecnológica, a transferência de conhecimento tecnológico ou participação na cadeia produtiva, no percentual e nos termos fixados no edital e no contrato. 
Ainda que sem pretensão de esgotar o assunto, tratou-se do conceito de EED e principalmente de uma das exigências da lei para o credenciamento como EED: em seus atos constitutivos deve ser assegurado que os votos de sócios estrangeiros não excedam 2/3 do total de votos de sócios brasileiros presentes. Foram avaliadas as implicações dessa regra. Uma delas foi a conclusão de que não há incentivos para que os sócios estrangeiros detenham mais que 40% do capital votante de uma EED. Sob a perspectiva constitucional, entendeu-se que a diferenciação pelo critério de nacionalidade do controlador (pessoal natural brasileira, nata ou naturalizada, em última instância) não agride a Constituição da República de 1988, mesmo após a Emenda Constitucional nº 6, de 1995. 
O âmbito de incidência do regime especial de contratações é delimitado por dois critérios, um objetivo e outro subjetivo. 
Quanto ao primeiro critério, observou-se que incide sobre contratações versando sobre produtos de defesa e sistemas de defesa. O conceito de sistema de defesa deriva do conceito de produto de defesa, é sempre um conjunto inter-relacionado deste último e que atenda a uma finalidade específica. Produto de defesa, por seu turno, consiste em qualquer bem, serviço ou obra que esteja afetado a uma atividade finalística de defesa e não seja de uso administrativo. 
de serviço público, a Constituição estatui claramente ser sua contratação sempre através de licitação, deve-se entender que o interesse a fundamentar a realização de licitação nesses casos prevalece sobre qualquer outro. Por essa razão, não se aplicariam as hipóteses de dispensa previstas em lei”.
40 
Produto estratégico de defesa é uma espécie de produto de defesa que merece uma classificação especial dado seu conteúdo tecnológico, dificuldade de obtenção ou imprescindibilidade, além de interesse estratégico para a defesa nacional. A lei de contratações de produtos de defesa exemplifica tipos de produto estratégico de defesa. 
Quanto à contratação de produtos de defesa e sistemas de defesa juntamente com produtos de uso administrativo, isto é, em um único contrato, não há motivos para rejeitar essa possibilidade. A lei, apesar de excluir do conceito de produto de defesa os produtos de uso administrativo, não deve excluir, por consequência, a aplicação do regime quando houver benefícios de ordem econômica para Administração em contratar produtos de defesa e de uso administrativo sob um mesmo contrato. Haja vista economias de escala e de escopo, a existência de produto de defesa a ser contratado conjuntamente com produto de uso administrativo deve atrair a aplicação do novo regime, sem prejuízos para a legalidade da contratação. 
Com relação ao critério subjetivo, a redação legal se mostra um pouco confusa. De qualquer forma, parece-nos que a referência a empresas privadas (no sentido de oposição a empresas estatais) deve ser interpretada sistematicamente, para que seus efeitos se restrinjam à possibilidade de submissão ao regime especial tributário, e não ao regime especial de licitações e contratações, a despeito da literalidade do parágrafo único do art. 1º da Lei 12.598/12. Parece ter ocorrido um defeito de técnica legislativa, que passou despercebido durante a tramitação da Medida Provisória na sua conversão em lei. 
A menção à possibilidade de aplicação do regime especial às entidades controladas pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios abre espaço para interpretações extensivas que permitam incluir, como sujeitos do novo regime, também as polícias militares estaduais, sendo mais difícil essa extensão para as guardas municipais, dado o regime essencialmente civil desses últimos agentes públicos. Todavia, isso implica uma interpretação teleológica do novo marco legal, tendo em vista o conceito amplo da Estratégia Nacional de Defesa, que pressupõe um estímulo ao desenvolvimento da Indústria Nacional de Defesa.
41 
A abertura para aplicação do regime especial também às contratações feitas pelas polícias militares e polícia federal tornaria esse mercado muito mais interessante para as empresas e fomentaria o desenvolvimento da Indústria Nacional de Defesa. Não é possível antecipar, neste momento, no entanto, qual será a interpretação dada pelos tribunais de contas, demais órgãos de fiscalização e o próprio Judiciário, caso essa interpretação seja adotada nos editais de licitação. 
Ademais, registre-se que o novo marco para o setor de defesa previu expressamente a possibilidade de contratação de Parcerias Público-Privadas na modalidade de “concessões administrativas”. As concessões administrativas estão aptas a revolucionar os contratos com a Administração Pública no setor de defesa, oferecendo maior previsibilidade, estabilidade e garantias às empresas privadas, particularmente porque resolvem dois problemas históricos do setor: instabilidade das disponibilidades orçamentárias e contratos de curto prazo. A utilização das PPPs poderá facilitar tanto a a contratação de “atividades-meio”, quanto o desenvolvimento, com mais qualidade e agilidade, de uma efetiva Base Industrial de Defesa nacional. 
Por fim, destaque-se ter ficado assegurada a contratação por dispensa de licitação para as PPPs em que haja risco de comprometimento da segurança nacional, observado a regulamentação vigente específica sobre esse ponto. Isso elimina, ao menos para esse tipo de PPP, uma discussão acadêmica que se tem visto, por vezes, em torno da possibilidade de aplicação de hipóteses de dispensa de licitação às PPPs em geral. 
Brasília, 22 de dezembro de 2013.
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Novo Regime de Contratações Militares

  • 1. 1 Regime especial de contratações de produtos e sistemas de defesa militares no Brasil: oportunidade para desenvolvimento de uma Indústria Nacional de Defesa e Parcerias Público-Privadas1 Lucas Navarro Prado2 Denis Gamell3 RESUMO: Este artigo trata do novo regime de contratações de produtos e sistemas de defesa. Introdutoriamente, é comentada a inclinação atual do Estado Brasileiro para o incentivo de pesquisa e desenvolvimento ("P&D") por meio de uma política de compras governamentais. Com a Estratégia Nacional de Defesa, essa inclinação torna-se diretiva para Setor de Defesa Nacional. Focando no desenvolvimento de tecnologias sob domínio nacional e no fomento e reestruturação da chamada Base Industrial de Defesa, cria-se uma nova perspectiva de investimentos para as Forças Armadas após anos de desamparo. Na sequência, aborda algumas das novidades do regime especial, como regras especiais de licitação, conceitos como os de Empresa Estratégica de Defesa, Produto de Defesa, Sistema de Defesa, Produto Estratégico de Defesa e Parcerias Público-Privadas militares. O conceito de Empresa Estratégica de Defesa é examinado nos seus elementos essenciais. Um desses elementos, relativo ao controle societário por pessoas naturais brasileiras, não obstante, pode gerar discussão sobre sua constitucionalidade, em face das alterações promovidas na Ordem Econômica pela Emenda Constitucional nº 6 de 1995. Quanto ao âmbito de aplicação do novo regime, reflete-se sobre a redação legal, inclusive, sobre a eventual extensão do regime às polícias militares. Por fim, trata-se das oportunidades de Parcerias Público-Privadas no setor de Defesa e das vantagens contratuais alcançáveis nessa modalidade de contratação, bem como da hipótese de dispensa de licitação em casos potencialmente comprometedores da segurança nacional. 1 Os autores agradecem os comentários do Coronel Marcelo Meirelles e do advogado Rodrigo Bueno, que gentilmente leram e apontaram críticas relevantes a este artigo. Eventuais equívocos ou opiniões dissonantes que tenham permanecido neste artigo são imputáveis unicamente aos autores, devendo-se afastar qualquer responsabilidade dos revisores a quem ora se agradece. 2 Advogado especializado em infraestrutura, regulação e contratações governamentais. Sócio de Navarro Prado Advogados (www.navarroprado.com.br). Bacharel em direito pela Universidade de São Paulo (USP). Pós-graduado em Finanças Corporativas e Investment Banking pela Fundação Instituto de Administração da USP. 3 Acadêmico de direito da Universidade de Brasília (UnB). Colaborador de Navarro Prado Advogados (www.navarroprado.com.br).
  • 2. 2 SUMÁRIO 1 Introdução....................................................................................................................3 2 Contexto de criação no Brasil de um regime especial de contratação para o Setor de Defesa Nacional ...................................................................................................................4 3 Entendendo as novidades do novo regime de licitação para contratação de produtos e sistemas de defesa ...............................................................................................................9 4 O conceito de Empresa Estratégica de Defesa ............................................................... 11 4.1 Possível discussão em torno da constitucionalidade do conceito de Empresa Estratégica de Defesa...................................................................................................... 17 5 O que são produtos e sistemas de defesa e produtos estratégicos de defesa para efeito de aplicação do regime especial de licitação ............................................................................. 21 5.1 Produtos de uso administrativo e sua contratação conjunta com PRODE ................ 25 6 Alguns comentários sobre a quem se aplica o novo regime............................................ 26 6.1 Referência a empresas privadas ........................................................................... 27 6.2 Referência a entidades controladas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios: há possibilidade de extensão do regime especial às polícias militares estaduais e outras forças? ................................................................................................................ 28 7 Oportunidade para desenvolvimento de PPPs............................................................... 30 7.1 Regime aplicável em casos de comprometimento da segurança nacional................ 36 8 Conclusão ................................................................................................................... 39
  • 3. 3 1 Introdução O Estado Brasileiro tem se mostrado inclinado a incentivar a pesquisa e o desenvolvimento (“P&D”) de tecnologias nacionais de forma geral. Entre outros instrumentos, pretende se utilizar das compras públicas como incentivo nesse sentido4. No Setor de Defesa Nacional, criou-se recentemente um regime especial de contratação pública para produtos e sistemas de defesa militares que, em linhas gerais, busca incentivar a pesquisa e o desenvolvimento de tecnologias nacionais e/ou a transferência de tecnologias estrangeiras para o domínio nacional. Esse novo regime está alinhado com a Estratégia Nacional de Defesa (“END”), aprovada pelo Decreto Presidencial nº 6.703/2008, a qual estabelece, como um de seus eixos estruturantes, a “reorganização da indústria nacional de material de defesa, para assegurar que o atendimento das necessidades de equipamento das Forças Armadas apoie-se em tecnologias sob domínio nacional”.5 4 Chame-se a atenção, por exemplo, para alterações realizadas na Lei Federal nº 8.666/93, a Lei Geral de Licitações e Contratações Públicas do Brasil (“Lei de Licitações”). De fato, a Presidência da República, por meio da Medida Provisória nº 495/2010, posteriormente convertida na Lei Federal nº 12.349/2010, introduziu diversas regras especiais de compras públicas para incentivar a pesquisa e o desenvolvimento de tecnologias nacionais, com destaque para as seguintes alterações: a) passou a figurar como critério de desempate em licitações públicas a produção de bens ou a prestação de serviços por empresas que invistam em pesquisa e desenvolvimento de tecnologia no País; b) passou a ser admitida a previsão no Edital de margem de preferência adicional para os produtos manufaturados e para os serviços nacionais resultantes de desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País. Na prática, significa a possibilidade de a Administração Pública pagar mais por um produto nacional, em relação a um produto estrangeiro, e ainda um pouco mais se o produto for resultante de inovação ou desenvolvimento tecnológico realizado no País. O limite para essa margem de preferência é de até 25% sobre o preço dos produtos manufaturados e serviços estrangeiros; c) passou a ser admitida, nas contratações destinadas à implantação, manutenção e ao aperfeiçoamento dos sistemas de tecnologia de informação e comunicação, considerados estratégicos em ato do Poder Executivo Federal, que a licitação seja restrita a bens e serviços com tecnologia desenvolvida no País. 5 Até a presente data, aguarda apreciação pelo plenário da Câmara dos Deputados o Projeto de Decreto Legislativo nº 818/2013 que se aprovado tornará vigentes as novas Estratégia Nacional de Defesa e Política Nacional de Defesa (“PND”), assim como o Livro Branco de Defesa Nacional (“LBDN”). O documento da nova END no tocante à Indústria de Defesa segue em linhas gerais as mesmas orientações da END anterior. A apreciação da matéria pelo Congresso Nacional está de acordo com o que prescreve a Lei Complementar nº 136 de 25 de agosto de 2010, segundo a qual o Poder Executivo deve encaminhar na primeira metade da sessão legislativa ordinária, de quatro em quatro anos, a partir de 2012, para apreciação do Congresso os documentos atualizados da END, da PND e do LBDN.
  • 4. 4 Além de incentivar P&D de tecnologia nacional e a transferência de tecnologias estrangeiras para o domínio nacional por meio de regras especiais de compras públicas, mormente as relativas à prática de offset6, o Estado Brasileiro também criou um regime tributário diferenciado com o objetivo de tornar a indústria nacional de defesa mais competitiva. Tanto o regime especial de contratações públicas de produtos e sistemas de defesa, quanto o regime especial tributário para tais produtos e sistemas, foram introduzidos na legislação brasileira por meio da Medida Provisória nº 544 de 29 de setembro de 2011, posteriormente convertida na Lei nº 12.598 de 22 de março de 2012, sem grandes alterações. O regime especial de contratações de produtos e sistemas de defesa militares foi regulamentado por meio do Decreto nº 7.970, de 28 de março de 2013. Já o regime tributário especial para tais produtos e sistemas foi regulamentado pelo Decreto nº 8.122, de 16 de outubro de 2013. O presente artigo pretende discutir o que é e a quem se aplica o novo regime de contratações públicas de produtos e sistemas de defesa, tendo em vista o disposto na Lei nº 12.598/12 e no Decreto nº 7.970/13. Não tratará, portanto, do regime tributário especial supra mencionado. 2 Contexto de criação no Brasil de um regime especial de contratação para o Setor de Defesa Nacional 6 As práticas de offset surgidas no cenário internacional no âmbito das contratações de defesa se caracterizam como formas de compensação prestadas pelo vendedor em face dos altos custos envolvidos na compra de produtos de defesa. No Brasil, o offset está regulado no setor de defesa pelas Leis nº 12.598, de 22 de março de 2012, pelo Decreto nº 7.970, de 23 de março de 2013, ambos objetos de estudo mais profundo por parte deste artigo, pela Portaria Normativa nº 764, de 27 de dezembro de 2002 do Ministério da Defesa, e por uma série de Portarias e atos normativos específicos de cada Força Armada. A prática, no entanto, já era admitida em nossa legislação geral de licitações e contratos administrativos, desde a publicação da Lei nº 12.349, de 15 de dezembro de 2010, e do seu regulamento, o Decreto nº 7.546, de 02 de agosto de 2011. As práticas de offset tanto no setor de defesa quanto nos contratos administrativos em geral se caracterizam por medidas de compensação tais quais: (i) coprodução; (ii) produção sob licença; (iii) produção subcontratada; (iv) investimentos; (v) transferência de tecnologia; (vi) countertrade; (vii) troca; (viii) counter purchase; e (ix) buy-back. Essas medidas requerem metodologia específica de aplicação que, no entanto, não cabe neste artigo tratar.
  • 5. 5 As contratações de produtos de defesa pelo Estado Brasileiro no Setor de Defesa Nacional foram bastante reduzidas desde o início da redemocratização do Brasil em meados dos anos 1980. As Forças Armadas, desgastadas perante a sociedade brasileira após o período de aproximadamente duas décadas em que esteve à frente do governo e diante da grave crise fiscal enfrentada pelo Brasil até o final da década de 1990, receberam diminuta atenção orçamentária do Governo Federal, de maneira que pouco se fez em termos de aquisição de produtos ou sistemas de defesa nesse período. Nos anos 2000, dado uma sensível melhora das condições fiscais do Brasil, a pretensão brasileira de ocupar uma nova posição estratégica no cenário geopolítico global (inclusive, pleiteando um assento do Conselho de Segurança da ONU e enviando tropas em missões de paz, destacando-se a missão para o Haiti), e ainda a descoberta de grandes reservas de petróleo na costa brasileira (Pré-sal), o Governo Federal passou a adotar uma postura mais favorável às Forças Armadas e às aquisições de produtos e sistemas de defesa. Destaquem-se quatro projetos ilustrativos dessa nova fase: a) O PROSUB, Programa de Desenvolvimento de Submarinos, projeto em andamento com custo total da ordem de 6,7 bilhões de euros envolvendo o desenvolvimento e a produção de quatro submarinos convencionais (S-BR), a construção do Submarino de Propulsão Nuclear (SN-BR), compra de torpedos e despistadores, projeto e construção de um estaleiro e uma base naval no município de Itaguaí (RJ), além de transferência de tecnologia e offset.7 7 PROSUB - Programa de Desenvolvimento de Submarinos, 2011, https://www.mar.mil.br/menu_v/ccsm /temas_relevantes/prosub-completo.pdf, acessado em 10 de julho de 2013.
  • 6. 6 b) O SISFRON, Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras, projeto cujo objeto consiste em síntese no serviço de implantação e integração de sistema de sensoriamento, de apoio à decisão e de apoio à atuação operacional integrada de diversos agentes de defesa nas faixas de fronteira terrestre do País, está orçado em um valor global de R$ 839.664.954,32, sendo titular do contrato o consórcio Tepro formado pelas empresas Savis Tecnologia e Sistemas S/A e OrbiSat Indústria e Aerolevantamento S/A, empresas controladas pela Embraer Defesa e Segurança.8 c) O projeto HX-BR, contrato com o consórcio de empresas Eurocopter e Helibrás de produção e aquisição no Brasil de 50 helicópteros de médio porte de emprego geral para as três Forças Armadas, avaliado em 1,89 bilhão de euros.9 d) a compra de 36 caças supersônicos do modelo sueco Gripen NG, fabricados pela SAAB, no valor total de US$ 4,5 bilhões, conforme recentemente anunciado pela Presidente Dilma Rousseff, que deverá implicar transferência de tecnologia para empresas brasileiras, as quais participarão do desenvolvimento e da produção das aeronaves no Brasil. Os valores envolvidos têm aumentado o interesse de diversas empresas, nacionais e estrangeiras, pelo mercado brasileiro de compras de produtos e sistemas de defesa. Mas há uma marca peculiar nessas aquisições: o Governo Federal vem buscando impor contrapartidas de transferência de tecnologia para empresas nacionais ou mesmo a contratação de desenvolvimento integral de novos produtos sob a liderança de empresas brasileiras. 8 SISFRON, http://www.ccomgex.eb.mil.br, acessado em 10 de julho de 2013. 9 Reaparelhamento – Brasil garante manutenção dos motores do helicóptero EC-725, 28 de setembro de 2011, http://www.fab.mil.br/portal/capa/index.php?mostra=8575, acessado em 10 de julho de 2013.
  • 7. 7 Essa busca reflete o objetivo declarado do Governo Federal de fortalecimento da defesa nacional mediante o desenvolvimento de uma Base Industrial de Defesa – BID nacional capaz de apoiar o país em eventuais momentos de estresse militar com outras nações. Nesse contexto, procura-se efetivamente transferir tecnologia militar ou apoiar o seu desenvolvimento para ou por meio de empresas brasileiras, assim entendidas não apenas aquelas que tenham operações e estejam devidamente autorizadas a funcionar no Brasil, mas particularmente as que sejam controladas, em última instância, por cidadãos brasileiros. Essa intenção fica muito clara com a criação do conceito de “Empresa Estratégica de Defesa”, como se verá mais adiante. Outro interesse do Governo Federal — além do desenvolvimento de uma BID e o consequente fortalecimento da defesa nacional — é o desenvolvimento de tecnologias que possam ter também aplicações civis e aumentar a produtividade da indústria brasileira. Historicamente, diversas tecnologias difundidas no dia-a-dia das empresas e pessoas físicas tiveram sua origem em pesquisas para desenvolvimento de tecnologia miliar. Há inúmeros exemplos dessa utilização civil de tecnologia originalmente militar. A título de ilustração, podem ser mencionadas: a tecnologia de micro-ondas desenvolvida durante a guerra fria e adaptada ao uso civil na forma dos fornos de micro- ondas; o GPS desenvolvido em 1973 no âmbito do Departament of Defense dos Estados Unidos e atualmente acessível ao uso civil; e a internet, resultado dos esforços de desenvolvimento tecnológico da Defense Advanced Research Projects Agency durante a Guerra Fria. É nesse contexto que o Governo Federal estabeleceu um marco legal específico para as compras de produtos e sistemas de defesa, ao que tudo indica, justamente para fomentar dois objetivos: transferir tecnologia para a indústria nacional e/ou viabilizar economicamente o desenvolvimento de tecnologia por empresas brasileiras (no sentido de empresas controladas por cidadãos brasileiros, em última instância).
  • 8. 8 Vale reconhecer a existência de críticas a esse novo modelo. Particularmente, sob a perspectiva econômica, diz-se que o mercado brasileiro não teria dimensão suficiente para incentivar o desenvolvimento de tecnologia por empresas brasileiras, se comparado, por exemplo, ao mercado norte-americano ou europeu. Nesse contexto, a tentativa de desenvolvimento de tecnologia militar própria, na fronteira do conhecimento disponível, acabaria impondo custos elevados para o país sem perspectiva de nos aproximar significativamente do nível tecnológico militar norte-americano ou europeu. Segundo esse argumento, ainda, seria mais vantajoso financeiramente simplesmente adquirir produtos com tecnologia estrangeira de nações amigas, com compromissos de transferência dessa tecnologia, ao invés de investir no seu desenvolvimento próprio. O Brasil conseguiria mais rapidamente tecnologia avançada e a um custo inferior. Embora a crítica parta de premissas fáticas verdadeiras — pois, de fato, os mercados norte-americano e europeu para aquisição de produtos e sistemas de defesa são substancialmente maiores que o brasileiro —, vale lembrar que o novo modelo não impõe a opção de desenvolvimento de novas tecnologias nacionais. Ao contrário, uma de suas alternativas é justamente privilegiar as compras que impliquem transferência de tecnologia para o domínio nacional. Nesse contexto, a eventual decisão do Governo Federal de apoiar o desenvolvimento de uma nova tecnologia militar, mediante uma promessa firme de compra do produto ou serviço que venha a contemplar essa tecnologia, é apenas uma alternativa e não necessariamente a solução a ser adotada em cada caso concreto. Outra crítica difundida está na avaliação sobre a conveniência de investir no desenvolvimento tecnológico militar, enquanto o país apresenta diversas deficiências crônicas nos seus sistemas de saúde, educação, habitação, transportes públicos etc. Ora, novamente, é preciso ter em vista que o novo marco legal em questão apenas incentiva o desenvolvimento ou a transferência de tecnologia por ou para empresas nacionais, na hipótese de aquisição de produtos ou sistemas de defesa, e não interfere na alocação de recursos orçamentários. Dessa perspectiva, não houve, por conta de novo marco para contratações no setor de defesa, qualquer compromisso de aplicação de recursos orçamentários adicionais nesse setor.
  • 9. 9 De qualquer forma, vale dizer que a crítica desconsidera a indução ao desenvolvimento econômico por meio dos investimentos no setor de defesa. Conforme já mencionado, diversas das tecnologias de uso civil foram inicialmente desenvolvidas para uso militar. O aumento da produtividade e da competitividade da economia brasileira depende, em larga medida, da sua capacidade de inovação. Nesse contexto, o incentivo à inovação e ao desenvolvimento ou absorção de novas tecnologias se constitui em um objetivo de política pública também do ponto de vista social. Não se trata, pois, da mera busca pelo aumento da capacidade militar de se defender contra agressões externas. Muito mais que isso, os investimentos no setor de defesa funcionam como alavanca para o desenvolvimento e absorção de tecnologias na fronteira do conhecimento humano. 3 Entendendo as novidades do novo regime de licitação para contratação de produtos e sistemas de defesa O regime especial de contratações públicas de produtos e sistemas de defesa militares cria regras especiais em relação à Lei Federal nº 8.666/93. Em particular, cria a possibilidade de restringir o acesso às contratações públicas de produtos ou sistemas de defesa, de maneira que possam participar das licitações apenas: a. empresas brasileiras credenciadas como “Empresas Estratégicas de Defesa”, cujo conceito será discutido mais adiante, sendo que essa restrição pressupõe que o objeto da licitação se limite à contratação de Produto Estratégico de Defesa (art. 3º, § 1º, inc. I, da Lei Federal nº 12.598/12); ou b. fabricantes de Produtos ou Sistemas de Defesa produzidos ou desenvolvidos no País ou que utilizem insumos nacionais ou com inovação desenvolvida no País (art. 3º, § 1º, inc. II, da Lei Federal nº 12.598/12). Além disso, permite que:
  • 10. 10 c. assegure-se à empresa nacional fabricante de produto de defesa ou a Instituição Científica e Tecnológica (“ICT”)10, a transferência do conhecimento tecnológico empregado ou a participação na cadeia produtiva, no percentual e nos termos fixados no edital e no contrato (art. 3º, § 1º, inc. III, da Lei Federal nº 12.598/12). Os itens “b” e “c” acima mencionados são mais simples de se compreender, pois estão alinhados com outras regras já existente no marco geral de licitações e contratações com a Administração Pública. A possibilidade de que o Edital restrinja objeto da licitação à contratação de produtos “produzidos ou desenvolvidos no País ou que utilizem insumos nacionais ou com inovação desenvolvida no País” segue a mesma linha de outras alterações promovidas na própria Lei Federal nº 8.666/93 no sentido de incentivar a produção e inovação nacional bem como a geração de empregos no Brasil. A discussão que se pode ter nesse ponto é saber em que medida se deve considerar um bem como produzido no Brasil ou contendo inovação desenvolvida nesse mesmo país. A Lei Federal nº 12.598/12 não explicitou critérios específicos para essa avaliação; tampouco o Decreto nº 7.970/13 tratou desses critérios. Na prática, diante dessa omissão, pode haver alguma celeuma por conta de que boa parte dos produtos de defesa é constituída de peças e tecnologias desenvolvidas e/ou fabricadas em diversas partes do globo terrestre. Destaque-se, nesse contexto, a importância de que o Edital de Licitação preveja, clara e objetivamente, os parâmetros caracterizadores da produção ou desenvolvimento no País. 10 Órgão ou entidade da Administração Pública orientada para a pesquisa científica ou tecnológica definida conforme a Lei nº 10.973 de 2 de dezembro de 2004.
  • 11. 11 A possibilidade de que o Edital exija “a transferência do conhecimento tecnológico empregado ou a participação na cadeia produtiva”, para ou de “empresa nacional fabricante de produto de defesa ou a alguma instituição pertencente à Administração Pública de ciência e tecnologia”, por sua vez, assemelha-se muito a outra regra já introduzida em 2010 no regime geral de licitações e contratos com a Administração Pública, que prevê a possibilidade de exigência de “medidas de compensação comercial, industrial, tecnológica ou acesso a condições vantajosas de financiamento”, tanto em favor da Administração Pública quanto de terceiros por ela indicados de forma isonômica11. Trata-se da figura do offset, que se pretende difundir não apenas no âmbito de contratos no setor de defesa, mas também em outras compras governamentais, a fim de acelerar o processo de capacitação tecnológica da indústria brasileira. A grande novidade do regime especial de contratação de produtos e sistemas de defesa, nesse contexto, fica por conta da possibilidade de restrição na licitação para participação apenas de “Empresas Estratégicas de Defesa”, conceito apresentado no próximo tópico. 4 O conceito de Empresa Estratégica de Defesa A restrição à licitação para que participem apenas licitantes classificados como Empresa Estratégica de Defesa (“EED”) se constitui em uma exceção ao regime geral da Lei Federal nº 8.666/93. EED pode ser resumidamente definida como toda pessoa jurídica credenciada pelo Ministério da Defesa mediante o atendimento cumulativo de certos requisitos, conforme o inc. III do art. 2º da Lei nº 12.598 de 2012. A Lei estabelece não só um conceito, sobre o que é EED, mas também uma competência, a de o Ministério da Defesa credenciar como EED quem preencher certos requisitos. Os requistos para o credenciamento como EED, os quais devem ser atendidos cumulativamente, são apresentados e discutidos brevemente nas linhas abaixo. 11 O art. 3º, § 11, da Lei Federal nº 8.666/93, prevê: “[o]s editais de licitação para a contratação de bens, serviços e obras poderão, mediante prévia justificativa da autoridade competente, exigir que o contratado promova, em favor de órgão ou entidade integrante da administração pública ou daqueles por ela indicados a partir de processo isonômico, medidas de compensação comercial, industrial, tecnológica ou acesso a condições vantajosas de financiamento, cumulativamente ou não, na forma estabelecida pelo Poder Executivo federal”.
  • 12. 12 1. Ter como finalidade, em seu objeto social, atividades específicas relacionadas ao desenvolvimento e produção de Produto Estratégico de Defesa, bem como serviços correlatos O texto da Lei implica leitura cuidadosa, pois apresenta redação extensa e que remete inclusive a outro dispositivo legal (art. 10). Na tentativa de consolidar o conceito em uma única redação lógica, sugere-se que o estatuto ou contrato social contemple no objeto da sociedade empresarial algo semelhante à seguinte redação: “prestação de serviços de tecnologia industrial básica, elaboração de projetos, realização de pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica, assistência técnica, transferência de tecnologia, industrialização, produção, reparo, conservação, revisão, conversão, modernização e manutenção de Produto Estratégico de Defesa no País, incluídas a venda e a revenda somente quando integradas às atividades industriais supracitadas”. O ponto central desse requisito é que todas essas atividades orbitam em torno do conceito de “Produto Estratégico de Defesa”, apresentado mais adiante neste artigo. 2. Ter no País a sede, a administração e o estabelecimento industrial, equiparado a industrial ou prestador de serviços O dispositivo não parece prescindir de maiores esclarecimentos. Dada a ausência de uma regulamentação específica, sugere-se que sejam tomadas as definições de estabelecimento industrial e equiparado a industrial por analogia do Direito Tributário. Precisamente, são encontradas nos art. 8º e 9º do Decreto nº 7.212 de 2010 que regulamenta o regime do IPI. Da mesma forma, a definição de estabelecimento prestador de serviço pode ser tomada da Lei Complementar nº 116 de 2003, art. 4º, que dispõe sobre o ISS. Destaque-se que existe aí uma especificidade em relação à Lei Federal nº 8.666/93, que com algumas exceções, veda “admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, (...) e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes” (itálico acrescentado).
  • 13. 13 O critério ora em comento se constitui em mais uma exceção a essa regra geral, mas que não foi estabelecida na própria Lei Federal nº 8.666/93 e, isto sim, na lei específica para contratação no setor de defesa. 3. Assegurar a continuidade produtiva no País A Lei 12.598/12 não explica o que pretendeu com esse critério. O Decreto 7.970/13, que regulamenta a Lei 12.598, lança um pouco de luz sobre o tema, embora permaneçam pontos obscuros sobre esse requisito. De fato, o Decreto estabelece, como formas de assegurar a continuidade produtiva no país, a apresentação nas licitações de garantias, a serem executadas no caso de descontinuidade ou encerramento da pessoa jurídica, de: i. transferência à União, quando requisitado, da tecnologia relacionada aos PED; ii. disponibilização da capacidade tecnológica e produtiva para outras EED; iii. autorização da produção, sob licença, por outras EED; iv. transferência da propriedade intelectual; v. ressarcimento dos investimentos realizados pela União; ou vi. garantias reais. Aparentemente, esse é um tema destinado a ser construído nos editais de licitação e, particularmente, nos respectivos contratos. 4. Dispor, no País, de comprovado conhecimento científico ou tecnológico próprio ou que este seja complementado por acordos de parceria com Instituição Científica e Tecnológica para realização de atividades conjuntas de pesquisa científica e tecnológica e desenvolvimento de tecnologia, produto ou processo, relacionado à atividade desenvolvida Esse requisito pretende incentivar o desenvolvimento científico e tecnológico no país, o que, aliás, parece ser a tônica do marco legal de contratações no setor de defesa.
  • 14. 14 O “conhecimento científico ou tecnológico” em questão deve, em princípio, estar relacionado com o objeto da licitação. Caberá ao Edital definir a forma como esse requisito poderá ser comprovado. A “Instituição Científica ou Tecnológica” de que trata o requisito ora sob comento deve ser um “órgão ou entidade da administração pública que tenha por missão institucional, dentre outras, executar atividades de pesquisa básica ou aplicada de caráter científico ou tecnológico” (cf.: art. 2º, inc. X, da Lei Federal nº 12.598/12). Destaque-se, assim, a necessidade de ser pertencente à Administração Pública. Embora não haja ilegalidade ou inconstitucionalidade na exclusão de instituições científicas ou tecnológicas privadas, a restrição é inconveniente. Não parece haver razoabilidade na exclusão de instituições privadas. O critério deveria ser, assim como a tônica da Lei, a origem brasileira dessa instituição, e não sua natureza jurídica pública ou privada. 5. Assegurar, em seu ato constitutivo ou no ato de seu controlador direto ou indireto, que o conjunto de sócios ou acionistas e grupos de sócios ou acionistas estrangeiros não possam exercer em cada assembleia geral número de votos superior a 2/3 (dois terços) do total de votos que puderem ser exercidos pelos acionistas brasileiros presentes Esse critério, embora se constitua em novidade legislativa, reflete regra do estatuto social da Empresa Brasileira de Aeronáutica – EMBRAER (art. 4º, III, “b”), sociedade de economia mista privatizada durante o Governo FHC, segundo a qual “o conjunto dos acionistas e grupos de acionistas estrangeiros não poderá exercer votos em número superior a 2/3 do total de votos conferidos ao conjunto de acionistas brasileiros presentes”. Dois aspectos merecem ser destacados: (i) a linha de divisão entre acionistas brasileiros e acionistas estrangeiros; e (ii) o fato de que, para efeito de atribuição do número de votos aos acionistas estrangeiros, é preciso considerar o número de acionistas brasileiros presentes, ou seja, é preciso saber e certificar quem de fato participa da reunião de assembleia geral. Novamente em linha com o disposto no estatuto da EMBRAER, a Lei Federal nº 12.598/12 considera como sócios ou acionistas brasileiros:
  • 15. 15 a. pessoas naturais brasileiras, natas ou naturalizadas, residentes no Brasil ou no exterior; b. pessoas jurídicas de direito privado organizadas em conformidade com a lei brasileira que tenham no País a sede e a administração, que não tenham estrangeiros como acionista controlador nem como sociedade controladora e sejam controladas, direta ou indiretamente, por uma ou mais pessoas naturais de que trata a alínea ‘a’; e c. os fundos ou clubes de investimentos, organizados em conformidade com a lei brasileira, com sede e administração no País e cujos administradores ou condôminos, detentores da maioria de suas quotas, sejam pessoas que atendam ao disposto nas alíneas ‘a’ e ‘b’. Portanto, em última instância, o critério é o controle, direto ou indireto, por pessoas naturais brasileiras, natas ou naturalizadas, residentes no Brasil ou no exterior. Note-se que, na hipótese de controle indireto, a EED deve ser diretamente controlada por meio de pessoas jurídicas com sede e administração no Brasil, mas indiretamente controladas por pessoas naturais brasileiras, natas ou naturalizadas. Esse tema levanta uma polêmica em torno da constitucionalidade da regra, tendo em vista que a Emenda Constitucional nº 06/1995 suprimiu do texto constitucional as distinções com fundamento no critério de nacionalidade do controle que separavam as “empresas brasileiras” das “empresas brasileiras de capital nacional”, ponto que será tratado na sequência. Por ora, cumpre refletir um pouco sobre a regra que limita os votos dos acionistas estrangeiros a 2/3 dos votos atribuídos aos acionistas brasileiros presentes. O teor dessa regra deve fazer com que, do ponto de vista de incentivos envolvidos, acionistas estrangeiros não tenham interesse em adquirir participação maior que 40% no capital votante de Empresas Estratégicas de Defesa12. Eventualmente, podem até adquirir participação maior por conta dos interesses econômicos (distribuição de dividendos, sobretudo), mas isso não refletirá em maior poder na definição dos rumos da sociedade empresarial. 12 Agradecemos ao advogado e colega Filipe Maldonado que nos chamou a atenção para esse aspecto.
  • 16. 16 O quadro a seguir faz algumas simulações supondo que todos os acionistas estejam presentes: Tabela 1 - Participação estrangeira em EEDs e número máximo de votos a serem exercidos Total de ações ou quotas com direito a voto de propriedade de sócios presentes Total de ações ou quotas com direito a voto de propriedade de sócios brasileiros presentes Total de ações ou quotas com direito a voto de propriedade de sócios estrangeiros presentes Número máximo de votos a serem exercidos por sócios estrangeiros (2/3 dos votos de sócios brasileiros presentes) 1.000.000 900.000 100.000 100.000 1.000.000 800.000 200.000 200.000 1.000.000 700.000 300.000 300.000 1.000.000 600.000 400.000 400.000 1.000.000 500.000 500.000 333.333 1.000.000 400.000 600.000 266.667 1.000.000 300.000 700.000 200.000 1.000.000 200.000 800.000 133.333 1.000.000 100.000 900.000 66.667 Como se vê, a importância da participação estrangeira cresce até o ponto em que alcança 40% do total de ações ou quotas com direito a voto. A partir desse ponto, ainda que o sócio estrangeiro aumente sua participação, o seu número de votos total acabará reduzido, a fim de impedir que se ultrapasse a proporção de 2/3 do total de votos dos acionistas brasileiros presentes. Outro ponto relevante de discussão envolve saber os limites para eventuais acordos de acionistas. A razão é que alguns pactos societários induzem ou mesmo impõem ao sócio com maioria de votos a transferência ou o compartilhamento do controle de uma dada empresa para ou com sócios minoritários.
  • 17. 17 O conceito de controle trazido pelo art. 116 da Lei das S.A. é bastante mais complexo e amplo que simplesmente a averiguação de quem detém a maioria de votos em assembleias gerais. Daí a possibilidade de que se considere controlador quem, por meio de acordo de acionistas ou de fato, efetivamente dirige as atividades e orienta o funcionamento da companhia. Já o requisito da Lei Federal nº 12.598/12 é específico e trata não propriamente do conceito de controle, mas apenas da maioria de votos em uma dada assembleia geral. Quais seriam, nesse contexto, os limites para a negociação de acordos de acionistas, particularmente quanto ao estabelecimento de quóruns especiais de aprovação no âmbito de Diretoria e de Conselho de Administração, poderes de veto, e regras de eleição e destituição de administradores? Embora a redação da Lei nº 12.598/12 não tenha sido explícita, parece-nos que a melhor hermenêutica induz ao entendimento de que jamais poderá ser transferido o controle para os sócios estrangeiros mediante acordo de acionistas ou instrumentos assemelhados, sob pena de descaracterizar a “Empresa Estratégica de Defesa”. A preocupação por trás da criação do conceito de EED está, obviamente, na proteção dos interesses da nação e, daí, a exigência de que o comando da empresa esteja a cargo de pessoas naturais brasileiras. Admitir que o controle seja indiretamente transferido a ou compartilhado com sócios estrangeiros, mediante instrumentos societários ou congêneres, implicaria burla ao espírito da lei, o que não se coaduna com as regras da boa hermenêutica. Em suma: as eventuais garantias oferecidas aos sócios estrangeiros, por conseguinte, não podem chegar ao ponto de caracterizar compartilhamento ou transferência de controle. Não pode haver dúvidas de que o comando da empresa esteja nas mãos de pessoas naturais brasileiras. Essa a regra de ouro para se saber sobre os limites para eventuais acordos de acionistas ou instrumentos congêneres. 4.1 Possível discussão em torno da constitucionalidade do conceito de Empresa Estratégica de Defesa
  • 18. 18 O conceito de EED pode reacender discussão enfrentada durante a década de 1990 por ocasião da Emenda Constitucional de nº 6 de 1995 sobre empresas de capital nacional e empresas brasileiras, todavia de capital estrangeiro. Como foi demonstrado no tópico anterior, a exigência de que, nas assembleias, por meio de disposições no ato constitutivo, o total de votos do conjunto de sócios estrangeiros não possa exceder a 2/3 do total de votos passíveis de serem exercidos por sócios brasileiros, não implica que a maioria do capital social seja composta por brasileiros ou pessoas jurídicas controladas por brasileiros; consequentemente, são possíveis diversas distribuições de capital quanto à origem. Todavia, na prática, a exigência assegura aos brasileiros, entendidos por pessoas naturais, natas ou naturalizadas, o controle efetivo da EED. Antes da Emenda Constitucional nº 6 de 1995 ser editada, havia na Constituição de 1988 uma distinção entre Empresas Brasileiras de Capital Nacional (“EBCN”) e Empresas Brasileiras simplesmente. O art. 170, que define os princípios gerais da ordem econômica, trazia como um de seus princípios o tratamento favorecido às EBCN. Estas, por sua vez, eram definidas no art. 171 como aquelas cujo controle efetivo estivesse em caráter permanente sob a titularidade direta ou indireta de pessoas físicas domiciliadas e residentes no País ou de entidades de direito público interno, entendendo-se por controle efetivo da empresa a titularidade da maioria de seu capital votante e o exercício, de fato e de direito, do poder decisório para gerir suas atividades. Havia também disposição no art. 176, § 1º que deferia somente à EBCN a pesquisa e a lavra de recursos minerais e a exploração dos potenciais hidroenergéticos. A Emenda Constitucional nº 6 teve o condão de substituir o princípio do favorecimento das EBCN de pequeno porte pelo do favorecimento das empresas de pequeno porte em geral, revogar todo o art. 171 e alterar a redação do art. 176, § 1º para deferir as atividades que menciona a empresas brasileiras, entendidas por aquelas com sede e administração no País. Tabela 2- Antes e depois da Emenda Constitucional nº 06 de 1995 Antes da EC 06/95 Após EC 06/95 Tratamento favorecido para pequenas empresas Apenas empresas brasileiras de capital nacional Empresas constituídas sob legislação nacional, com sede e
  • 19. 19 administração no Brasil Exclusividade para a pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais de energia hidráulica Apenas empresas brasileiras de capital nacional Empresas constituídas sob legislação nacional, com sede e administração no Brasil Preferência na aquisição de bens e serviços pelo Poder Público Apenas empresas brasileiras de capital nacional Deixou de existir no plano constitucional. Autorização para criação, por lei, de proteções e benefícios especiais temporários para desenvolver atividades consideradas estratégicas para a defesa nacional ou imprescindíveis ao desenvolvimento do País Aplicável às empresas brasileiras de capital nacional Deixou de existir no plano constitucional. Ora a pergunta que aqui se poderia fazer é, se em face das alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 6 de 1995, haveria ainda espaço no ordenamento para uma distinção gerada entre empresas tal qual a que se cria com o conceito de EED. Primeiramente, vale notar que o critério de EBCN era de “controle direto ou indireto por pessoas físicas domiciliadas e residentes no País”, enquanto o critério de EDD é, em termos, o controle efetivo, direto ou indireto, por pessoas físicas consideradas brasileiras natas ou naturalizadas, residentes no Brasil ou no exterior, na medida em que se condiciona o total de votos de estrangeiros a 2/3 do total de votos de brasileiros. Portanto, o critério de EBCN parecia estar mais associado ao critério de domicílio que ao de nacionalidade propriamente dito. Em princípio, bastaria que a pessoa física controladora fosse domiciliada no Brasil para que a empresa respectiva pudesse ser enquadrara como EBCN. Já o critério de EED é estritamente relacionado com a nacionalidade das pessoas naturais que, em última instância, controlam a empresa. Daí, conclui-se que, do ponto de vista formal, a Lei 12.598 não recupera o conceito extinto com a EC nº 06/1995, mas estabelece um critério efetivamente distinto, com foco na nacionalidade da pessoa natural, e não em seu local de domicílio ou residência.
  • 20. 20 É interessante observar, ainda, a fim de dar resposta a essa questão, que a Exposição de Motivos Interministerial nº 37/MJ/MF/MPOG/MPAS/MARE/MME, de 16 de fevereiro de 1995, que acompanhou o Projeto de Emenda Constitucional, PEC nº 5 de 1995, que resultou na Emenda nº 6, esclarecia: “Note-se que as alterações propostas não impedem que legislação ordinária venha a conferir incentivos e benefícios especiais a setores considerados estratégicos, inexistindo qualquer vedação constitucional nesse sentido”.13 Concordante com a exposição de motivos foi o parecer da Comissão Especial destinada a proferir parecer sobre a PEC nº 5 de 1995:“Por fim, lembre-se que as mudanças sugeridas não impedem que a legislação ordinária venha a conferir incentivos e benefícios especiais a setores considerados estratégicos, já que inexistiria qualquer vedação constitucional nesse sentido”.14 De fato, a configuração da Constituição de 1988, após a alteração produzida pela Emenda Constitucional nº 6, não criou amarras à legislação ordinária para a criação de incentivos. É certo que revogou o conceito de EBCN e os incentivos e benefícios a ela associados, mas não estabeleceu proibição em contrário para a legislação ordinária. Todavia, seria simplista e equivocada uma interpretação da constituição que simplesmente admitisse que o que fora revogado no âmbito constitucional pudesse voltar da mesma forma nas vestes de lei ordinária. Se o propósito da Emenda nº 6 era exatamente a revogação da distinção, em face da necessidade de maiores investimentos de capital estrangeiro e não a mera desconstitucionalização da distinção para que permanecesse em âmbito infraconstitucional, não parece adequado supor que distinções tais quais as das EBCN pudessem retornar ao ordenamento sem uma nova emenda constitucional. Conforme a exposição de motivos e o parecer mencionado, o que se admite na forma de lei ordinária diz respeito a setores estratégicos. Faz sentido, portanto, que uma distinção que gere incentivos e benefícios como os que são dispensados no caso das EED só exista motivadamente – e sob motivação de cunho eminentemente estratégico, tal como concorrer para a defesa e a soberania nacionais. 13 Diário do Congresso Nacional, Seção I, Março de 1995, Quarta feira 15, p. 3246. 14 Diário do Congresso Nacional, Seção I, Março de 1995, Sábado 20, p. 10607.
  • 21. 21 Nesse sentido, entende-se ser constitucional, dentro do ordenamento brasileiro, o conceito de EED com os benefícios que lhe são consequentes. Não obstante, embora essa questão apenas possa ser resolvida, em última instância, pelo Supremo Tribunal Federal, por ora, as disposições atinentes ao conceito de EED ficam amparadas pela presunção de constitucionalidade das leis. 5 O que são produtos e sistemas de defesa e produtos estratégicos de defesa para efeito de aplicação do regime especial de licitação O conceito de Produto de Defesa (“PRODE”) foi definido no inc. I do art. 2º da Lei nº 12.598 de 2012 como: “todo bem, serviço, obra ou informação, inclusive armamentos, munições, meios de transporte e de comunicações, fardamentos e materiais de uso individual e coletivo utilizados nas atividades finalísticas de defesa, com exceção daqueles de uso administrativo”. Por sua vez, o conceito de Sistema de Defesa (“SD”) é definido no inc. III do art. 2º da mesma lei como: “conjunto inter-relacionado ou interativo de Prode que atenda a uma finalidade específica”. Como se pode ver, o conceito de SD é dependente do conceito de PRODE, deste modo, só se pode ter em vista o significado de SD entendendo-se previamente o de PRODE. Ora, o conceito de PRODE se estende por realidades bastante amplas: obras, bens e serviços dos mais diversos podem ser abarcados dentro dele. Deste modo o que o diferencia um PRODE de outras obras, produtos e bens, não é tanto a sua natureza, mas a finalidade que lhe é atribuída. Tomando por premissa que a expressão ‘utilizados nas atividades finalísticas de defesa’ se refere a ‘todo bem, serviço, obra ou informação’, teremos que armamentos, munições e fardamentos, meios de transporte e de comunicação, materiais de uso individual e coletivo, assim como quaisquer outros bens, serviços e obras, serão PRODE apenas quando afetados às atividades finalísticas de defesa. Cabe compreender, então, o conceito de atividades finalísticas de defesa.
  • 22. 22 A Exposição de Motivos Interministerial nº 211/MD/MDIC/MCT/MF/MP que acompanhou a Medida Provisória nº 544 de 2012, pode lançar alguma luz a este respeito. A EMI nº 211 de 2012, ao comentar a Estratégia Nacional de Defesa (“END”), lembra que um de seus eixos estruturantes é a reorganização da indústria nacional de defesa, como uma forma de assegurar a autonomia no exercício das competências das Forças Armadas. Além disso, comenta que, conforme a END, o atendimento das necessidades de equipamento das Forças Armadas deve estar atrelado ao desenvolvimento de tecnologias sob domínio nacional e prevê, como um dos objetivos da medida provisória, a garantia da eficácia das contratações das Forças Armadas.15 A Medida Provisória nº 544 de 2011 foi desde o início vocacionada para assegurar a eficácia das contratações das Forças Armadas para o devido cumprimento de suas competências. Isso não mudou com a sua conversão na Lei nº 12.598 de 2012. Trata-se de uma premissa suficientemente adequada para se concluir que, ao utilizar a expressão atividades finalísticas de defesa, a lei pretendeu se referir justamente àquilo que se atribui às Forças Armadas como sendo de sua alçada precípua, pois não seria outro o objetivo da compra de produtos de defesa pelas Forças Armadas senão o de viabilizar a realização de suas competências. Não se quer dizer que há apenas essa forma de pensar o conceito, todavia parece mesmo que o conceito de atividade finalística de defesa poderia ser integrado por aquelas funções essenciais e atribuições subsidiárias das Forças Armadas, definidas na Constituição e na Lei Complementar nº 97 de 1999 e, neste caso, consideradas pelo mesmo diploma como atividade militar.16 15 “3. A END determina a organização da indústria de defesa para que possa ser assegurada ao País autonomia operacional necessária ao exercício das competências atribuídas às Forças Armadas, sob o pressuposto de que a organização, o preparo e o emprego da Marinha, do Exército e da Aeronáutica devem corresponder ao desenvolvimento econômico e tecnológico nacional. 4. É nessa ordem de idéias que a END situa a reorganização da indústria de defesa como um de seus eixos estruturantes, assegurando que o atendimento das necessidades de equipamento das Forças Armadas esteja atrelado ao desenvolvimento de tecnologias sob domínio nacional. Para tanto, faz-se necessário capacitar a indústria para que conquiste autonomia em tecnologias indispensáveis à defesa do País. 5. Com esses propósitos, o presente projeto de Medida Provisória visa a estabelecer regimes jurídico, regulatório e tributário especiais que inibam os riscos do imediatismo mercantil e assegurem a regularidade das compras públicas a partir de um planejamento criterioso, racional e voltado à eficácia das contratações das Forças Armadas.” 16 Tenha-se em vista que a Constituição Federal definiu algumas das funções das Forças Armadas no seu art. 142, são elas em resumo: (i) a defesa da Pátria; (ii) a garantia dos poderes constitucionais; e (iii) a garantia da lei e da ordem por iniciativa de qualquer dos três poderes. Em seguida, o § 1º do mesmo artigo deixou para lei complementar a regulamentação das normas gerais de organização, preparo e
  • 23. 23 Portanto, ao tratar das funções e atribuições das Forças Armadas para a definição de atividade finalística de defesa, é central a noção de que atividades finalísticas de defesa são atividades exercidas pelas Forças Armadas ou diretamente relacionadas a elas. Sendo assim, retomando o raciocínio anterior sobre PRODE, os mais diversos produtos seriam PRODE sempre que estivessem afetados a essas funções e atribuições das Forças Armadas. Com a regulamentação levada a efeito pelo Decreto nº 7.970 de 2013, no entanto, essas discussões sobre a substância do conceito de PRODE perdem um pouco de sua relevância diante do estabelecimento de um procedimento formal para a classificação de um produto como PRODE. A classificação deve se realizar segundo as normas do Sistema Militar de Catalogação das Forças Armadas - SISMICAT.17 Há três caminhos para a classificação de um produto como PRODE: (i) por ação de um órgão do Ministério da Defesa chamado Centro de Catalogação das Forças Armadas – CECAFA; (ii) por ação de entidades de catalogação públicas ou privadas autorizadas pelo Ministério da Defesa, desde que homologadas pelo CECAFA; (iii) ou, se o produto não for abrangido pelo SISMICAT ou estiver em processo de catalogação, por ato do Ministro da Defesa em face de proposta da Comissão Mista da Indústria de Defesa – CMID, órgão criado pelo mesmo decreto para assessorar o Ministério da Defesa nos assuntos das contratações militares. emprego das mesmas forças. Por sua vez, a Lei Complementar nº 97 de 1999 que veio a regulamentar o art. 142, § 1º, tratou tanto das atribuições constitucionais das Forças Armadas como de outras subsidiárias. São atribuições tais como: (i) o próprio preparo das Forças Armadas que compreende planejamento, organização e articulação, instrução e adestramento, desenvolvimento de doutrina e pesquisas específicas, inteligência e estruturação, além de atividades de inteligência e mobilização; (ii) o emprego das Forças Armadas na defesa da Pátria, na garantia dos poderes constitucionais, na garantia da lei e da ordem intestinas e na participação em operações de paz; (iii) atividades de defesa civil realizadas pelas Forças Armadas; (iv) as atribuições subsidiárias das Forças Armadas de prevenção e repressão de delitos transfronteiriços e ambientais nas faixas de fronteira, no mar e nas águas interiores, além de outras atribuições subsidiárias específicas de cada Força, como a fiscalização do espaço aéreo, combate ao tráfico de drogas e o cumprimento da lei dentro das águas nacionais; (v) a requisição das Forças Armadas pelos órgãos da Justiça Eleitoral na garantia de suas decisões e na garantia de votações e apurações. 17 Conforme o Manual do Sistema Militar de Catalogação (SISMICAT), Vol. I, 2ª ed. 2003, o SISMICAT consiste em um sistema de normas e parâmetros para catalogação de itens, produtos, e empresas fornecedoras, adotando a uniformidade do NATO Codification System, o sistema de catalogação utilizado pela OTAN do qual o Brasil é signatário. Cada item ou empresa é catalogado de modo que se permita a sua inequívoca identificação, compondo o Catálogo de Itens e Empresas - CAT-BR. Utilizando esse sistema de catalogação, é possível, entre outras coisas, a identificação dos itens pelo conceito a
  • 24. 24 Por sua vez, os produtos estratégicos de defesa (“PED”) foram definidos no inc. II do art. 2º como: todo Prode que, pelo conteúdo tecnológico, pela dificuldade de obtenção ou pela imprescindibilidade, seja de interesse estratégico para a defesa nacional, tais como: 1. recursos bélicos navais, terrestres e aeroespaciais; 2. serviços técnicos especializados na área de projetos, pesquisas e desenvolvimento científico e tecnológico; 3. equipamentos e serviços técnicos especializados para as áreas de informação e de inteligência. Deste modo, PED é sempre uma espécie de PRODE qualificado por ser de interesse estratégico para a defesa nacional em face de alguma das características que o inciso menciona: conteúdo tecnológico, dificuldade de obtenção ou imprescindibilidade. Essas três características não têm um conteúdo muito seguro para que se possa afirmar com precisão o que seja um PED. Da mesma forma, a qualificação de “interesse estratégico para a defesa nacional” não é precisa. Todavia, a exemplificação seguinte daqueles PRODE que constituiriam PED nas alíneas do inciso II – recursos bélicos navais, terrestres e aeroespaciais, serviços técnicos especializados na área de projetos, pesquisas e desenvolvimento científico e tecnológico, equipamentos e serviços técnicos especializados para as áreas de informação e de inteligência – permite ter alguma noção sobre que espécie de produtos e que grau de conteúdo tecnológico, dificuldade de obtenção e imprescindibilidade devem possuir.18 que servem, podendo-se identificar uma série de itens que correspondem a uma mesma finalidade conceitual o que, por sua vez, permite um maior controle de estoques e gerenciamento de aquisições. De outro lado, a adoção de um sistema uniforme de catalogação permite o controle centralizado das compras das três Forças, assim como uma gestão centralizada mais eficiente. 18 Anote-se que esses produtos de defesa exemplificados nas três alíneas, são, inclusive com a mesma redação, objeto de dispensa de licitação conforme o Regulamento do inc. IX do art. 24 da Lei nº 8.666 de 1993, o Decreto nº 2.295 de 1997. O mencionado inciso da Lei de Licitações e Contratos estabelece como hipótese de dispensa de licitação aqueles casos em que houver possibilidade de comprometimento da segurança nacional, nos casos estabelecidos em decreto do Presidente da República, ouvido o Conselho de Defesa Nacional. Por sua vez, o decreto ao regulamentar o inciso estabeleceu em seu art. 1º a dispensa de licitação para as compras e contratações de obras ou serviços quando envolverem: aquisição de recursos bélicos navais, terrestres e aeroespaciais (inc. I); contratação de serviços técnicos especializados na área de projetos, pesquisas e desenvolvimento científico e tecnológico (inc. II); e aquisição de equipamentos e contratação de serviços técnicos especializados para a área de inteligência (inc. III). Desde que,
  • 25. 25 A classificação de PED, conforme o Decreto nº 7.970/2013, é feita através da reclassificação de produtos já classificados como PRODE, por ato do Ministro da Defesa, precedido por proposta da CMID, desde que considerados de interesse estratégico para a defesa nacional devido ao conteúdo tecnológico, dificuldade de obtenção ou imprescindibilidade. Em suma, nesse contexto, o que irá distinguir, na prática, um PRODE ou PED de outros produtos é o critério formal da sua classificação como tal. 5.1 Produtos de uso administrativo e sua contratação conjunta com PRODE A Lei nº 12.598 de 2012 exclui da definição de PRODE os bens, serviços e obras de uso administrativo. É possível que em contratações cujo escopo abrangente envolva alta complexidade e não poucas obrigações — como, por exemplo, ocorre nas concessões administrativas, uma das modalidades de Parceria Público-Privada de que trata a Lei Federal nº 11.079/04 —, surja a dúvida a respeito da possibilidade de, sob um mesmo contrato, incluírem-se PRODE e outros objetos contratuais de finalidade meramente administrativa. Pense-se, apenas para ilustrar, em uma concessão administrativa que envolva a construção e manutenção de um complexo militar com infraestrutura para guardar material bélico, combustíveis etc., além de infraestrutura própria para instalações burocráticas de cunho administrativo e a manutenção de ambas. Não parece razoável que nesses casos a resposta deva ser uma separação contratual, isto é, um contrato para PRODE e outro para produtos de uso administrativo, ainda que o resultado final esteja interligado, pois, por óbvio, uma tal solução levaria a um aumento da complexidade tanto na elaboração quanto na gestão dos projetos, assim como dos custos e riscos dos projetos como um todo e sem que houvesse uma justificativa plausível para tanto. acrescente-se, a revelação de sua localização, necessidade, característica, especificação ou quantidade coloque em risco objetivos da segurança nacional.
  • 26. 26 Mais sensato, a princípio, parece ser que a contratação se realizasse de modo conjunto. Os princípios da eficiência e da economicidade poderiam subsidiar de forma muito clara esse entendimento. Portanto, havendo eficiências econômicas, como ganhos com economias de escala ou de escopo, na elaboração de um projeto que envolva a contratação ao mesmo tempo, tanto de PRODE ou SD como objetos de uso tão somente administrativo, parece absolutamente sensato que a contratação ocorra por meio de um único contrato regido pelo novo regime, o que, ao cabo, resulta em benefício da Administração. 6 Alguns comentários sobre a quem se aplica o novo regime As regras para se determinar o âmbito de incidência do novo regime de contratações encontram-se insculpidas no art. 1º da Lei nº 12.598 de 2012.19 Levam em consideração dois critérios: um, de natureza objetiva, porque envolve o objeto da contratação; o outro, de natureza subjetiva, porque envolve o(s) sujeito(s) da contratação. O caput do art. 1º contém um critério objetivo para delimitar o alcance do regime, pois estabelece os atos jurídicos sobre os quais este incidirá. São atos jurídicos que ensejam a aplicação do regime: as compras, as contratações e o desenvolvimento de produtos de defesa e sistemas de defesa. A separação entre compras, contratações e desenvolvimento não é precisamente técnica. Compras e desenvolvimento são operações contratuais que qualificam espécies do gênero das contratações, e. g., contratações de compra e venda e de desenvolvimento. Em outras palavras, apenas a expressão contratações, por sua generalidade, incluiria em si contratos de compra e venda, de desenvolvimento, assim como de prestação de serviços e de obras de modo geral. 19 Art. 1o Esta Lei estabelece normas especiais para as compras, as contratações e o desenvolvimento de produtos e de sistemas de defesa e dispõe sobre regras de incentivo à área estratégica de defesa. Parágrafo único. Subordinam-se ao regime especial de compras, de contratações de produtos, de sistemas de defesa, e de desenvolvimento de produtos e de sistemas de defesa, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas e privadas, as sociedades de economia mista, os órgãos e as entidades públicas fabricantes de produtos de defesa e demais entidades controladas, direta ou indiretamente, pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios.
  • 27. 27 Os conceitos de produto de defesa e sistema de defesa, assim como de PED, já foram tratados no tópico 5, inclusive quanto à possibilidade de contratação simultânea destes com produtos de uso administrativo no tópico 5.1. Portanto, não há mais a acrescentar sobre o entendimento a respeito do critério objetivo para incidência do regime especial de contratação no setor de defesa. Já o parágrafo único do art. 1º estabelece um critério subjetivo para delimitar a incidência do regime, pois trata dos sujeitos que se subordinam à sua aplicação. Este critério subjetivo merece alguns reparos. É disso que trata o presente tópico, em especial. Segundo a Lei, subordinam-se ao regime especial os órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas e privadas, as sociedades de economia mista, os órgãos e as entidades públicas fabricantes de produtos de defesa e demais entidades controladas, direta ou indiretamente, pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios. É de se notar que, além de não haver restrição da incidência do regime aos órgãos e entidades da administração direta e indireta que não sejam da esfera federal, foram incluídas expressamente, no rol das entidades subordinadas, (i) as empresas privadas e (ii) as entidades controladas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios. 6.1 Referência a empresas privadas A referência a “empresas privadas” precisa ser interpretada no âmbito de um contexto mais amplo de licitações e contratações pelo setor público, bem como considerando os objetivos da Lei em questão. Claramente, a referência a “empresas privadas” no parágrafo único supracitado não indica simplesmente a natureza jurídica da pessoa jurídica envolvida, até porque tanto as empresas públicas quanto as sociedades de economia mista são tidas por “pessoas jurídicas de direito privado” no âmbito de nossa legislação, embora com algumas peculiaridades quanto ao regime jurídico incidente. Portanto, o legislador parece ter pretendido se referir, efetivamente, a empresas privadas no sentido de oposição a empresas estatais (empresas públicas e sociedades de economia mista, que são também listadas no indigitado parágrafo único).
  • 28. 28 Ora, naturalmente, as empresas privadas que contratarem com a Administração PRODE ou SD se subordinam ao regime especial, mas se subordinam como empresas que concorrem entre si para contratar com a Administração, participando de uma licitação, ou como empresas que se sujeitam a serem escolhidas para contratar por meio de processos de dispensa ou inexigibilidade de licitação. Não é cabível, por certo, qualquer interpretação de que as empresas privadas (em oposição às empresas estatais) do setor de defesa tenham que se subordinar ao regime da mesma forma que a Administração, isto é, sendo obrigadas a licitar ou a promover processos de dispensa ou inexigibilidade para contratar. Nesse sentido, é mais feliz a redação do art. 1º, parágrafo único da Lei nº 8.666 de 1993 que não gerou esse tipo de confusão.20 A referência a empresas privadas (em oposição às empresas estatais), por conseguinte, apenas pode ser compreendida quando se pensa que a Lei trata não apenas do regime especial de licitação e contratação, como também do regime especial de tributação. Quanto a esse último aspecto, por evidente, o objetivo da Lei era que as empresas privadas pudessem se beneficiar desse regime especial tributário. O problema hermenêutico é gerado pelo fato de que o parágrafo único, na sua literalidade, apenas se refere ao regime especial de licitação e contratação. Todavia, esse problema de interpretação pode ser facilmente contornado mediante uma leitura sistemática da Lei, dado o contexto geral do sistema de licitações e contratações no Brasil. 6.2 Referência a entidades controladas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios: há possibilidade de extensão do regime especial às polícias militares estaduais e outras forças? 20Lei nº 8.666 de 1993: Art. 1o Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Parágrafo único. Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
  • 29. 29 Sobre a inclusão de entidades controladas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios e a ausência de uma restrição às entidades que não as da administração direta e indireta federais, a questão a ser destacada tem a ver com o conceito de “atividades finalísticas de defesa” e sobre quem é responsável por executá- las. Em princípio, trata-se de competência da União a ser exercida pelas Forças Armadas, i.e., a Aeronáutica, a Marinha e o Exército. Claramente, o legislador parece ter pensado nas Forças Armadas como sujeito primordial do novo regime de contratações no setor de defesa. A exposição de motivos da Medida Provisória nº 544 de 2011 corrobora essa tese. De fato, a EMI nº 211, de 2011, reitera diversas vezes a ideia de contratações voltadas para as Forças Armadas. Dessa perspectiva, não faria muito sentido a referência a entidades controladas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, dado que apenas a União possui Forças Armadas. Uma forma de dar sentido lógico a esse parte do parágrafo único em questão seria admitir que o regime pudesse ser estendido não apenas às Forças Armadas, mas também às demais forças militares, em especial às polícias militares estaduais. No caso das guardas municipais, a extensão torna-se um pouco mais difícil, dado que são essencialmente civis, e não militares. Existe um interesse econômico relevante nessa extensão, particularmente em face do regime especial tributário envolvido e da possibilidade de restrição à participação de Empresas Estratégicas de Defesa nas respectivas licitações. O contra-argumento a essa interpretação é que as polícias militares atuam especialmente em questões de segurança pública, e não propriamente de defesa. A própria Constituição da República tratou de separar o tratamento das Forças Armadas (art. 142) daquelas forças responsáveis por segurança pública (art. 144). Deve-se, sopesar, por outro lado, que a Estratégia Nacional de Defesa (orientador geral que ensejou o novo marco de contratações no setor de defesa) considera a questão da defesa nacional sob uma perspectiva muito mais ampla que simplesmente a atuação das Forças Armadas. Daí, não seria descabido buscar também uma interpretação mais extensiva do conceito de “atividades finalísticas de defesa”, quando se pensa no contexto geral da Estratégia Nacional de Defesa.
  • 30. 30 Essa interpretação mais extensiva teria um efeito muito benéfico sobre a indústria, pois os produtos envolvidos em defesa (no sentido estrito de atuação das Forças Armadas) e em segurança pública são, por vezes, quase idênticos. Dessa perspectiva, seria possível pensar em uma escala muito maior para o mercado de “produtos de defesa” e para as “empresas estratégicas de defesa” se os clientes puderem ser não apenas as Forças Armadas, mas também as polícias militares e a polícia federal, por exemplo. Isso está em linha com o objetivo maior da Estratégia Nacional de Defesa de fomentar a Indústria de Defesa nacional. Por evidente, existem outros interesses envolvidos no equacionamento dessa questão, como, por exemplo, as consequências fiscais, dado que essa interpretação extensiva poderia ensejar uma renúncia fiscal indireta, por conta do benefício tributário envolvido (RETID). Não é possível antecipar com segurança, nesse contexto, qual será a interpretação dos tribunais de contas, dos demais órgãos de fiscalização e do próprio Judiciário, caso se realize na prática uma interpretação que acabe por estender o novo regime também às polícias militares estaduais e à própria polícia federal. 7 Oportunidade para desenvolvimento de PPPs O novo marco de contratações para o setor de defesa lembrou especificamente da alternativa de contratação por meio de concessões administrativas, uma das modalidades de Parceria Público-Privada, de que trata a Lei Federal nº 11.079/0421. Ficou expressamente admitida, assim, a realização de PPPs no setor de defesa, o que, aliás, está em linha com a prática internacional. 21 Trata-se do art. 5º da Lei Federal nº 12.598, que assim estabelece: “Art. 5º As contratações de Prode ou SD, e do seu desenvolvimento, poderão ser realizadas sob a forma de concessão administrativa a que se refere a Lei no 11.079, de 30 de dezembro de 2004, observado, quando couber, o regime jurídico aplicável aos casos que possam comprometer a segurança nacional. § 1º O edital definirá, entre outros critérios, aqueles relativos ao valor estimado do contrato, ao período de prestação de serviço e ao objeto. § 2º O edital e o contrato de concessão administrativa disciplinarão a possibilidade e os requisitos para a realização de subcontratações pela concessionária. § 3º Caso as contratações previstas no caput envolvam fornecimento ou desenvolvimento de PED, mesmo que sob a responsabilidade dos concessionários, suas aquisições obedecerão aos critérios e normas definidos por esta Lei”.
  • 31. 31 Lembre-se que existe um conceito estrito de PPP na legislação brasileira, o qual não se confunde com a expressão “public-private partnership” muito frequentemente utilizada na literatura estrangeira. De fato, internacionalmente, o termo PPP tem sido frequentemente referido para significar qualquer tipo de parceria de longo prazo entre o setor público e o setor privado. Já no Brasil o acrônimo PPP se refere a dois tipos específicos de contrato: concessão patrocinada e concessão administrativa22. O tipo contratual aplicável ao setor de defesa é a concessão administrativa, cuja definição, nos termos do art. 2º, § 2º, da Lei Federal nº 11.079/04, apresenta-se a seguir: “contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens”. A primeira característica a se destacar é que esse tipo de contrato tem a natureza de “prestação de serviços”. Usualmente, no entanto, é precedido de algum investimento de monta por parte do parceiro privado, seja no desenvolvimento de um ativo específico a ser explorado na prestação dos serviços objeto da PPP, ou ainda na formação de recursos humanos e desenvolvimento de uma tecnologia ou produto. De qualquer forma, o contrato de PPP não pode ser reduzido a um simples contrato de construção de obra, ou de fornecimento de equipamento, ou ainda de terceirização de mão-de-obra (cf.: art. 2º, § 4º, inc. III). Trata-se, como regra geral, de um objeto complexo, cujo foco é a prestação de serviços, mas que pode ser precedido de construção de obra e/ou fornecimento de equipamentos e outros produtos. Pelas suas características e dado o contexto do setor de defesa, as PPP tendem a se difundir primeiramente para atender aquelas demandas consideradas “atividades- meio” das Forças Armadas, tais como, construção e manutenção de próprios residenciais e prédios administrativos para abrigar pessoal das Forças, ou até mesmo colégios militares. Essa parece ter sido a tendência, ao menos até o momento, considerando-se a maior parte dos projetos de PPP em discussão no Brasil no âmbito das Forças Armadas. Todavia, verificam-se também, embora com menos frequência, projetos de PPP para desenvolvimento, modernização e/ou manutenção de veículos e equipamentos, armamentos, e outros bens com aplicação direta em atividades de combate. 22 Para uma discussão mais profunda acerca do conceito de PPP, recomenda-se a leitura da obra Comentários à Lei de PPP: fundamentos econômico-jurídicos (Malheiros: 2007), de autoria de Lucas Navarro Prado (ora co-autor deste artigo), juntamente com Maurício Portugal Ribeiro.
  • 32. 32 O uso de PPPs para fins militares já possui amadurecida experiência no estrangeiro, sendo diversos os países que possuem iniciativas desse jaez a exemplo do Reino Unido e dos Estados Unidos. As possibilidades de estruturação de projetos de PPP para fins militares são inúmeras e adaptáveis às necessidades de suprir ou aperfeiçoar capacidades militares desejadas. Os projetos variam desde desenvolvimento, planejamento, produção, manutenção, renovação e treinamento de pessoal envolvendo determinados produtos como aviões, helicópteros, carros de combate, satélites até a gestão de habitações militares. Tomem-se por exemplos: 1) Military Flying Training System ("MFTS") no Reino Unido, parceria público-privada cujo contrato — de £ 635 milhões celebrado com a Ascent, joint venture composta por Lockheed Martin e VT Group, e com duração de 25 anos — tem por escopo prover as Forças Armadas inglesas com treinamento avançado de pilotagem de jatos e a infraestrutura adequada para isso.23 2) Future Strategic Tanker Aircraft ("FSTA") no Reino Unido, parceria público-privada com objetivo de prover a Royal Air Force com aviões- tanque e aviões de transporte para substituir os modelos em serviço VC10 e Lockheed Tristars, contratada com a Air Tanker Ltd., consórcio formado por Rolls Royce, Cobham, EADS e Thales Group, no valor de £ 13 bilhões.24 23 Welcome to the UK Military Flying Training System Website, 2005,http://webarchive.nationalarchives.gov.uk/ 20050513213031/http://www.ukmfts.mod.uk/pages/faqprogramme.shtml, acessado em 10 de julho de 2013. 24 Ministry of Defence, Future Strategic Tanker Aircraft (FSTA) http://webarchive.nationalarchives.gov.uk/20121026065214/http://www.mod.uk/DefenceInternet/FactSheets/ProjectFactsheets/FutureStrategicTankerAircraftfsta.htm, acessado em 10 de julho de 2013.
  • 33. 33 3) Military Housing Privatization Initiative ("MHPI") nos Estados Unidos, programa de parcerias público-privadas estruturadas em que ao parceiro privado, por conta própria, é conferido a responsabilidade de construir, operar, manter, aperfeiçoar e, por vezes, renovar a infraestrutura de habitações familiares para militares. A política pública foi editada pelo Congresso Norte-Americano em 1996 como parte do National Defense Authorization Act para o ano fiscal de 1996. O programa resolveu muitos dos problemas concernentes à habitação militar, principalmente, problemas de restrições orçamentárias ao permitir a participação competitiva da iniciativa privada. Como parte da política do Department of Defense, um projeto de parceria deve gerar um benefício de no mínimo US$ 3 em termos de desenvolvimento habitacional para cada US$ 1 do contribuinte destinados ao projeto. Para o programa como um todo, esse potencial de geração é, em média, de US$ 10 para US$ 1.25 As concessões administrativas no setor de defesa são instrumentos excelentes para se alcançar o objetivo de fomento à Indústria Nacional de Defesa, pois resolvem dois problemas graves que historicamente têm prejudicado o setor:  instabilidade das disponibilidades orçamentárias: o setor de defesa tem sido tradicionalmente assolado por sucessivos cortes orçamentários, havendo baixa previsibilidade de recursos disponíveis, particularmente quando se avalia o médio e longo prazo. Evidentemente, as empresas privadas têm dificuldade em mobilizar capital para o desenvolvimento da Indústria Nacional de Defesa sem a perspectiva de disponibilidade orçamentária das Forças Armadas, dado o mercado ainda incipiente. No âmbito das concessões administrativas, no entanto, é possível afastar a possibilidade de cortes orçamentários, bem como oferecer garantias de adimplemento ao parceiro privado quanto aos pagamentos governamentais que sejam devidos no âmbito da PPP26; 25 Military Housing Privatizations FAQs, http://www.acq.osd.mil/housing/faqs.htm, acessado em 10 de julho de 2013. 26 Isso não deve obscurecer o fato de que, ao se proteger a PPP contra cortes orçamentários, criam-se pressões internas, no âmbito de cada Força, contrárias à celebração da PPP por parte dos gestores dos demais contratos. A razão é o temor de que, havendo necessidade de acomodar eventuais
  • 34. 34  contratos de curto prazo: como se sabe, no âmbito da Lei Federal nº 8.666/93, os contratos de prestação de serviços estão limitados a 5 anos como regra geral e, no setor de defesa, em alguns casos, podem alcançar vigência de 10 anos27. Já no âmbito das PPPs, o prazo pode ser estabelecido em até 35 anos. Nesse contexto, as concessões administrativas são instrumentos muito mais adequados para oferecer às empresas privadas estabilidade de longo prazo na demanda pelos seus serviços. Esse ponto também é fundamental para estimular as empresas privadas a mobilizarem capital para o desenvolvimento de uma Indústria de Defesa Nacional. Recentemente, o Governo Federal tem demonstrado interesse em PPPs militares, havendo projetos, inclusive, na pauta do Comitê Gestor de Parceria Público-Privada federal28 em desenvolvimento: contingenciamentos, os cortes serão dirigidos aos demais contratos em andamento, com exceção da(s) PPP(s). Isso implicaria um esforço fiscal maior por determinados departamentos da Força contratante, em comparação com aquele departamento responsável pela PPP (o qual não sofreria a pressão do corte orçamentário). Assim, a celebração de uma PPP pode significar a formação de “perdedores” e “ganhadores”, do ponto de vista orçamentário, o que naturalmente tende a criar resistências ao desenvolvimento de um programa robusto de PPPs militares. Aliás, esse não é um problema exclusivo das PPPs no âmbito das Forças Armadas, mas presente em qualquer burocracia estatal organizada. 27 A possibilidade de vigência pelo prazo de 10 anos foi prevista no art. 57, inc. V, da Lei Federal nº 8.666/93. Segundo esse dispositivo, as hipóteses previstas nos incisos IX, XIX, XXVIII e XXXI do art. 24, também da Lei Federal nº 8.666/93, admitem contratos com vigência por até 120 meses, caso haja interesse da administração. As hipótese específicas do setor de defesa são as seguintes: (a) quando houver possibilidade de comprometimento da segurança nacional, nos casos estabelecidos em decreto do Presidente da República, ouvido o Conselho de Defesa Nacional; (b) para as compras de material de uso pelas Forças Armadas, com exceção de materiais de uso pessoal e administrativo, quando houver necessidade de manter a padronização requerida pela estrutura de apoio logístico dos meios navais, aéreos e terrestres, mediante parecer de comissão instituída por decreto; e (c) para o fornecimento de bens e serviços, produzidos ou prestados no País, que envolvam, cumulativamente, alta complexidade tecnológica e defesa nacional, mediante parecer de comissão especialmente designada pela autoridade máxima do órgão. 28 Resolução nº 03 de 14 de dezembro de 2011 do CGPPP federal.
  • 35. 35 1) AGEFROT, Sistema de Abastecimento e Gerenciamento de Frota do Exército Brasileiro, envolvendo provisão de combustíveis e lubrificantes necessários às operações do Exército Brasileiro, implantação de sistema que permita o monitoramento da frota terrestre e o controle do fornecimento e do consumo de combustíveis utilizados durante os deslocamentos e a construção, modernização, manutenção e operação de postos de abastecimento de propriedade do Exército Brasileiro.29 2) PNRs (Próprios Nacionais Residenciais) do Complexo Naval em Itaguaí, cujo objeto é a construção e gestão de habitações militares para os militares que estiverem lotados no Complexo Naval de Itaguaí cuja construção é parte do escopo do PROSUB como mencionado no início deste artigo.30 3) Construção de Polo Tecnológico integrado ao Instituto Militar de Engenharia ("IME") em Guaratiba - RJ, ainda em fase de planejamento com a minuta da proposta de manifestação de interesse já tendo sido enviada ao Ministério do Planejamento pelo Exército, prevendo a construção de 1,5 mil habitações, pistas de voo aéreo não tripulado e centro tecnológico para agregar instalações de diversas empresas ligadas à área de defesa.31 4) Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro, modernização da infraestrutura e operação dos órgãos destinados ao reparo e à manutenção dos meios navais.32 29 Planejamento convida iniciativa privada para apresentar projetos de PPP para o Exército Brasileiro e a Marinha do Brasil, 05 de março de 2013, http://www.planejamento.gov.br/hotsites/ppp/conteudo/noticias/2013/130205_plan_convida.html, acessado em 10 de julho de 2013. 30 Planejamento convida iniciativa privada para apresentar projetos de PPP para o Exército Brasileiro e a Marinha do Brasil, 05 de março de 2013, http://www.planejamento.gov.br/hotsites/ppp/conteudo/noticias/2013/130205_plan_convida.html, acessado em 10 de julho de 2013. 31 Nicholle Murmel ,Exército estuda PPP para construção de polo tecnológico, 27 de junho de 2013, via Valor Econômico, http://www.forte.jor.br/tag/parceria-publico-privada/, acessado em 10 de julho de 2013. 32 Comitê Gestor de PPPs federais define projetos prioritários, 27 de agosto de 2012, http://www.pppbrasil.com.br/portal/content/comit%C3%AA-gestor-de-ppps-federais-define-projetos- priorit%C3%A1rios, acessado em 10 de julho de 2013.
  • 36. 36 5) NCMM, Novo Colégio Militar de Manaus, construção e manutenção de novo Colégio Militar em Manaus, projeto com licitação prevista para setembro de 2014.33 6) CEFAN, Centro de Educação Física Almirante Adalberto Nunes, implantação de infraestrutura, operação e manutenção de complexo esportivo.34 7) Novo fuzil, fabricação e manutenção de novo fuzil desenvolvido pela Indústria de Material Bélico do Brasil (“IMBEL”).35 Alguns desses projetos, como é o caso do NCMM, de CEFAN e dos PNRs do Complexo Naval em Itaguaí, não parecem atinentes ao conceito de PRODE ou SD, pois não estão tão diretamente relacionados ao que em tópico anterior se entendeu por atividade finalística de defesa. Esses projetos estão mais próximos daquilo que foi tratado como produtos de caráter administrativo. Sendo assim, a essas parcerias, em tese, não se aplicam as regras do regime especial. A situação é diferente nas parcerias cujo escopo pode ser claramente identificado como relativo a atividades finalísticas de defesa. As concessões administrativas, nesse contexto, estão aptas a revolucionar os contratos com a Administração Pública no setor de defesa, oferecendo maior previsibilidade, estabilidade e garantias às empresas privadas. A utilização desse instrumento facilitará a prestação de serviços caracterizados como “atividades-meio” das Forças Armadas, bem como tem potencial também para apoiar o desenvolvimento, com mais qualidade e agilidade, de uma efetiva Base Industrial de Defesa nacional. 7.1 Regime aplicável em casos de comprometimento da segurança nacional 33 Projetos em andamento/prioritário, http://www.epex.eb.mil.br/index.php/ppp/projetos-em- andamento acessado em 10 de julho de 2013. 34 Comitê Gestor de PPPs federais define projetos prioritários, 27 de agosto de 2012, http://www.pppbrasil.com.br/portal/content/comit%C3%AA-gestor-de-ppps-federais-define-projetos- priorit%C3%A1rios, acessado em 10 de julho de 2013. 35 Comitê Gestor de PPPs federais define projetos prioritários, 27 de agosto de 2012, http://www.pppbrasil.com.br/portal/content/comit%C3%AA-gestor-de-ppps-federais-define-projetos- priorit%C3%A1rios, acessado em 10 de julho de 2013.
  • 37. 37 É interessante notar que o final do caput do art. 5º da Lei Federal nº 12.598/12 determina, quando couber, a observância do regime jurídico aplicável aos casos que possam comprometer a segurança nacional. A Lei Federal nº 8.666/93, ao lado disso, menciona uma vez em todo o seu corpo o comprometimento da segurança nacional, não por outra razão, senão para fins de dispensa de licitação, cuja regulamentação se encontra no Decreto nº 2.295/97. Conforme o decreto, há duas possibilidades de dispensa de licitação nos casos de comprometimento da segurança nacional. Na primeira delas, serão dispensadas de licitação as contratações de obras ou serviços quando a revelação de sua localização, necessidade, característica do objeto, especificação ou quantidade coloque em risco os objetivos da segurança nacional e forem relativos à (i) aquisição de recursos bélicos navais, terrestres e aeroespaciais; (ii) contratação de serviços tecnológicos especializados na área de projetos, pesquisas e desenvolvimento; (iii) aquisição de equipamentos e contratação de serviços técnicos especializados para a área de inteligência. Note-se, por sua vez, que se trata dos mesmos tipos de contratações que exemplificam o conceito de PED na Lei nº 12.598/12. Não obstante, esses casos de dispensa de licitação devem ser necessariamente precedidos de justificativa quanto ao preço da contratação e quanto à escolha do contratado, cabendo, ainda, a sua ratificação pela autoridade com a prerrogativa de Ministro de Estado da pasta ou órgão competente. A segunda possibilidade abarca as dispensas para os casos em que possa haver comprometimento da segurança nacional não previstos na primeira hipótese de dispensa de licitação. Nessas hipótese, passa a ser necessário para a dispensa que os casos sejam submetidos à apreciação do Conselho de Defesa Nacional.
  • 38. 38 A grande vantagem da previsão contida na Lei nº 12.598/12 — ao expressamente prever a possibilidade de aplicação da hipótese de dispensa de licitação — é a supressão de uma lacuna jurídica, por vezes discutida no regime geral de PPPs: saber se a estas se aplicam as normas de dispensa e inexigibilidade. Ao menos para fins das PPPs militares que envolvam contratação de PRODE ou SD, portanto, quando possa haver comprometimento da segurança nacional e desde que preenchidos as exigências do Decreto nº 2.295/97, é possível concluir inequivocamente pela possibilidade jurídica de dispensa de licitação36. 36 Registre-se que um dos coautores deste artigo, aliás, já havia se posicionado pela possibilidade de aplicação das hipóteses de inexigibilidade e de dispensa de licitação, observados os limites do art. 175 da Constituição quando o objeto envolver a prestação de serviços públicos. Cite-se o trecho do livro conjunto de Maurício Portugal Ribeiro e Lucas Navarro Prado, registrando, já em 2007, em seus Comentários à Lei de PPP: fundamentos econômico-jurídicos (Editora Malheiros), a posição desses autores: “Cabe, por fim, indagar se a exigência de realização de licitação contida no caput do art. 10 afasta a possibilidade de aplicação dos dispositivos sobre inexigibilidade e dispensa previstos na Lei 8.666/1993. A resposta a essa questão requer, em primeiro plano, separar as PPPs cujo objeto é a prestação de um serviço público daquelas que tratam de atividade econômica em sentido estrito, pois o art. 175 da CF, ao exigir que a contratação de concessões de serviço público seja realizada ‘sempre através de licitação’, realizou essa separação. Por razões didáticas, tratemos primeiro do caso das PPPs relativas à atividades econômicas em sentido estrito. Nosso entendimento é que, em relação às PPPs cujo objeto é a exploração de atividade econômica em sentido estrito, o art. 10 da Lei de PPP não afasta a aplicação dos casos de inexigibilidade e dispensa previstos na Lei 8.666/1993. O caso da inexigibilidade nos parece óbvio. Uma licitação é inexigível quando não há possibilidade de competição. Ora, a impossibilidade de competição é um fato da natureza; se ele ocorre, mesmo que quiséssemos manter contrafaticamente a exigência do art. 10 acima, ela seria inútil. Resultaria em desperdício de recursos públicos em um procedimento licitatório que restará com apenas um participante, ou que não resultará em contratação, porque o eventual selecionado não será capaz de dar cabo do fim colimado. Já as hipóteses de dispensa de licitação referem-se, em regra, a casos nos quais a licitação seria viável, mas cuja realização contrariaria algum interesse público entendido, na situação, como superior àqueles que exigem a licitação. Se a lei geral de contratos administrativos perfilha entendimento no sentido de que há interesses públicos que devem prevalecer em situações específicas à própria exigência da licitação, não nos parece razoável que o mero silêncio da Lei de PPP sobre esse assunto tenha o condão de afastar a aplicação às PPPs dos dispositivos presentes na Lei 8.666/1993, que é subsidiária à Lei de PPP. Aqui, é importante assinalar que inexigibilidade e dispensa são institutos que desempenham funções importantíssimas para a consecução de interesses públicos. O fato de que sejam muitas vezes usados indevidamente, para favorecer este ou aquele contratante, não é razão para se negar sua utilidade ou restringir sua aplicação. A providência contra o uso indevido da dispensa ou inexigibilidade deve ser a punição dos que as utilizam indevidamente; e não a poda, de forma genérica e preventiva, ou a eliminação, por meio de uma hermenêutica extremamente restritiva, das possibilidades de uso de tais institutos. Já em relação às PPPs que envolvem a exploração de serviço público, elas estão sujeitas ao disposto no art. 175 da CF, o qual diz que as contratações de concessões de serviços públicos serão realizadas “sempre através de licitação”. Temos que o efeito disso é que em relação às PPPs cujo objeto seja a exploração de serviço público não caberá a realização de dispensa de licitação. Parece-nos, entretanto, perfeitamente cabível a aplicação do instituto da inexigibilidade. Como já aludimos acima, o instituto da inexigibilidade trata de uma impossibilidade do mundo fático, do mundo material, que não pode ser contornada. Tentativa de fazê-lo resultaria, como anotamos anteriormente, em prejuízos para a Administração. Já a dispensa de licitação é realizada em vista de interesses públicos que em determinadas situações a lei entende conflitantes e superiores à exigência de licitação. Ora, a valoração sobre a superioridade dos interesses que justificam a dispensa de licitação é realizada pela Lei 8.666/1993, que é a lei que atualmente disciplina o assunto. Como, entretanto, no caso das concessões
  • 39. 39 8 Conclusão O novo regime de contratações de produtos e sistemas de defesa trouxe, na esteira da Estratégia Nacional de Defesa, conceitos novos como os de empresa estratégica de defesa (EED), produto de defesa, sistema de defesa, produto estratégico de defesa e novidades no sistema de licitação e contratos, mormente a possibilidade de realizar licitações: exclusivamente entre EEDs para contratações envolvendo produtos estratégicos de defesa; destinadas a contratação de produtos ou sistemas de defesa somente produzidos e desenvolvidos no país; e que assegure à empresa nacional defesa ou a Instituição Científica e Tecnológica, a transferência de conhecimento tecnológico ou participação na cadeia produtiva, no percentual e nos termos fixados no edital e no contrato. Ainda que sem pretensão de esgotar o assunto, tratou-se do conceito de EED e principalmente de uma das exigências da lei para o credenciamento como EED: em seus atos constitutivos deve ser assegurado que os votos de sócios estrangeiros não excedam 2/3 do total de votos de sócios brasileiros presentes. Foram avaliadas as implicações dessa regra. Uma delas foi a conclusão de que não há incentivos para que os sócios estrangeiros detenham mais que 40% do capital votante de uma EED. Sob a perspectiva constitucional, entendeu-se que a diferenciação pelo critério de nacionalidade do controlador (pessoal natural brasileira, nata ou naturalizada, em última instância) não agride a Constituição da República de 1988, mesmo após a Emenda Constitucional nº 6, de 1995. O âmbito de incidência do regime especial de contratações é delimitado por dois critérios, um objetivo e outro subjetivo. Quanto ao primeiro critério, observou-se que incide sobre contratações versando sobre produtos de defesa e sistemas de defesa. O conceito de sistema de defesa deriva do conceito de produto de defesa, é sempre um conjunto inter-relacionado deste último e que atenda a uma finalidade específica. Produto de defesa, por seu turno, consiste em qualquer bem, serviço ou obra que esteja afetado a uma atividade finalística de defesa e não seja de uso administrativo. de serviço público, a Constituição estatui claramente ser sua contratação sempre através de licitação, deve-se entender que o interesse a fundamentar a realização de licitação nesses casos prevalece sobre qualquer outro. Por essa razão, não se aplicariam as hipóteses de dispensa previstas em lei”.
  • 40. 40 Produto estratégico de defesa é uma espécie de produto de defesa que merece uma classificação especial dado seu conteúdo tecnológico, dificuldade de obtenção ou imprescindibilidade, além de interesse estratégico para a defesa nacional. A lei de contratações de produtos de defesa exemplifica tipos de produto estratégico de defesa. Quanto à contratação de produtos de defesa e sistemas de defesa juntamente com produtos de uso administrativo, isto é, em um único contrato, não há motivos para rejeitar essa possibilidade. A lei, apesar de excluir do conceito de produto de defesa os produtos de uso administrativo, não deve excluir, por consequência, a aplicação do regime quando houver benefícios de ordem econômica para Administração em contratar produtos de defesa e de uso administrativo sob um mesmo contrato. Haja vista economias de escala e de escopo, a existência de produto de defesa a ser contratado conjuntamente com produto de uso administrativo deve atrair a aplicação do novo regime, sem prejuízos para a legalidade da contratação. Com relação ao critério subjetivo, a redação legal se mostra um pouco confusa. De qualquer forma, parece-nos que a referência a empresas privadas (no sentido de oposição a empresas estatais) deve ser interpretada sistematicamente, para que seus efeitos se restrinjam à possibilidade de submissão ao regime especial tributário, e não ao regime especial de licitações e contratações, a despeito da literalidade do parágrafo único do art. 1º da Lei 12.598/12. Parece ter ocorrido um defeito de técnica legislativa, que passou despercebido durante a tramitação da Medida Provisória na sua conversão em lei. A menção à possibilidade de aplicação do regime especial às entidades controladas pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios abre espaço para interpretações extensivas que permitam incluir, como sujeitos do novo regime, também as polícias militares estaduais, sendo mais difícil essa extensão para as guardas municipais, dado o regime essencialmente civil desses últimos agentes públicos. Todavia, isso implica uma interpretação teleológica do novo marco legal, tendo em vista o conceito amplo da Estratégia Nacional de Defesa, que pressupõe um estímulo ao desenvolvimento da Indústria Nacional de Defesa.
  • 41. 41 A abertura para aplicação do regime especial também às contratações feitas pelas polícias militares e polícia federal tornaria esse mercado muito mais interessante para as empresas e fomentaria o desenvolvimento da Indústria Nacional de Defesa. Não é possível antecipar, neste momento, no entanto, qual será a interpretação dada pelos tribunais de contas, demais órgãos de fiscalização e o próprio Judiciário, caso essa interpretação seja adotada nos editais de licitação. Ademais, registre-se que o novo marco para o setor de defesa previu expressamente a possibilidade de contratação de Parcerias Público-Privadas na modalidade de “concessões administrativas”. As concessões administrativas estão aptas a revolucionar os contratos com a Administração Pública no setor de defesa, oferecendo maior previsibilidade, estabilidade e garantias às empresas privadas, particularmente porque resolvem dois problemas históricos do setor: instabilidade das disponibilidades orçamentárias e contratos de curto prazo. A utilização das PPPs poderá facilitar tanto a a contratação de “atividades-meio”, quanto o desenvolvimento, com mais qualidade e agilidade, de uma efetiva Base Industrial de Defesa nacional. Por fim, destaque-se ter ficado assegurada a contratação por dispensa de licitação para as PPPs em que haja risco de comprometimento da segurança nacional, observado a regulamentação vigente específica sobre esse ponto. Isso elimina, ao menos para esse tipo de PPP, uma discussão acadêmica que se tem visto, por vezes, em torno da possibilidade de aplicação de hipóteses de dispensa de licitação às PPPs em geral. Brasília, 22 de dezembro de 2013.