A baixa qualidade na mobilidade urbana consiste em uma das principais dificuldades enfrentadas nas cidades brasileiras. Em vista desta realidade, a população da cidade de Fortaleza – CE experimenta, diariamente, as consequências negativas do modelo urbano desenvolvido sem o devido planejamento, que limitam seu direito de circulação. Dessa forma, o presente trabalho busca explorar os impactos negativos e positivos da mobilidade urbana, tendo como objeto de estudo o bairro da Parangaba, da cidade de Fortaleza, subsidiando diagnóstico para proposta de reestruturação urbana do bairro. O trabalho se estruturará em fundamentação teórica direcionada à mobilidade, diagnóstico do bairro Parangaba e proposta de intervenção. Mediante o estabelecimento do enfoque da mobilidade voltado essencialmente ao pedestre e ao ciclista, o trabalho propõe alternativas de tráfego seguro e confortável, principalmente no centro de atividades do bairro, além de, paralelamente, prever novos usos para áreas de lazer em estado de degradação e maior visibilidade ao centro histórico do bairro, preservando a identidade histórica da cidade.
Reestruturação da Parangaba: proposta para mobilidade urbana
1. REESTRUTURAÇÃO DA PARANGABA
Uma proposta para mobilidade
urbana do bairro
Aluna: Rochelle Silveira Lima
Orientador: Me. Arquiteto e Urbanista André Araújo Almeida
Fortaleza
2015.2
Fundação Edson Queiroz
Universidade de Fortaleza - Unifor
Centro de Ciências Tecnológicas - CCT
Arquitetura e Urbanismo
2. ROCHELLE SILVEIRA LIMA
REESTRUTURAÇÃO DA PARANGABA:
Uma proposta para mobilidade urbana do Bairro
Trabalho destinado à conclusão de curso para obtenção do título de
graduação em Arquitetura e Urbanismo apresentado à Universidade
de Fortaleza – UNIFOR.
Orientador: Me. Arquiteto e Urbanista André Araújo Almeida
FORTALEZA
2015
3. AGRADECIMENTOS
Agradecer a Deus por ter me dado força e fé para permanecer no meu caminho, ainda que tenham havido momentos difíceis
e intempestivos nessa jornada; também por ser abrigo e porto seguro dos meus maiores temores e inseguranças.
Agradecer a minha família. Meus pais, Stefânia e Claudemir, que nunca mediram esforços para me oferecer o bem mais
precioso que eles poderiam dar, que é o amor. Toda minha gratidão aos meus amabilíssimos pais por todo ensinamento e por todo
carinho dispensado a mim. Minhas irmãs, Isadora e Amanda, sou grata por compartilharem do cotidiano árduo dessa trajetória
comigo.
Agradecer a minha família de coração, aos bons amigos: Lígia, Yasmin, Iully, Rebeca, Bárbara, Lívia, Ivana, Eudeane, Cláudia,
Bruna e Fernanda, que estiveram sempre ao meu lado, apoiando, auxiliando, sendo pulso firme e ombro amigo, nos piores e
melhores momentos; não teria palavras para agradecê-los e expor meu carinho por eles.
Agradecer a meu namorado, Eduardo. Amigo, companheiro e abrigo nos piores momentos de insegurança dessa jornada.
Agradecer a colegas de trabalho, que além de proporcionarem maravilhosa experiência de aprendizagem, fizeram do meu
trabalho um segundo lar e uma segunda família. Obrigada, Samanta, Jean, Mariana, Maria e André.
Agradecer a meu professor-orientador, André Almeida, pelos ensinamentos que levarei para a vida toda, pelas orientações e
por todo o suporte.
Por fim, agradecer a todos que de forma direta ou indireta fizeram parte da minha formação acadêmica.
4. “ A cada dia que vivo, mais me convenço de que o
desperdício da vida está no amor que não damos,
nas forças que não usamos, na prudência egoísta
que nada arrisca e que, esquivando-nos do
sofrimento, perdemos também a felicidade. ”
Carlos Drummond de Andrade
5. RESUMO
A baixa qualidade na mobilidade urbana consiste em uma das principais dificuldades enfrentadas nas cidades brasileiras. Em
vista desta realidade, a população da cidade de Fortaleza – CE experimenta, diariamente, as consequências negativas do modelo
urbano desenvolvido sem o devido planejamento, que limitam seu direito de circulação. Dessa forma, o presente trabalho busca
explorar os impactos negativos e positivos da mobilidade urbana, tendo como objeto de estudo o bairro da Parangaba, da cidade de
Fortaleza, subsidiando diagnóstico para proposta de reestruturação urbana do bairro. O trabalho se estruturará em fundamentação
teórica direcionada à mobilidade, diagnóstico do bairro Parangaba e proposta de intervenção. Mediante o estabelecimento do
enfoque da mobilidade voltado essencialmente ao pedestre e ao ciclista, o trabalho propõe alternativas de tráfego seguro e
confortável, principalmente no centro de atividades do bairro, além de, paralelamente, prever novos usos para áreas de lazer em
estado de degradação e maior visibilidade ao centro histórico do bairro, preservando a identidade histórica da cidade.
Palavras-chave: Mobilidade Urbana. Parangaba. Qualidade de vida. Pedestre. Ciclista.
6. ABSTRACT
The low quality in urban mobility consists one of the main difficulties faced in Brazilian cities. In view of this reality, the population
of the city of Fortaleza - CE experiences daily the negative consequences of urban model developed without proper planning, that
limit their right of movement. Thus, this paper seeks to explore the negative and positive impacts of urban mobility, having as the
subject of the study the neighborhood of Parangaba, in the city of Fortaleza, subsiding a diagnosis for a proposal in the urban
restructure of the neighborhood. The work will be structured in theoretical foundation directed towards mobility, diagnosis of
Parangaba neighborhood and a proposal for intervention. After establishing the focus of mobility essentially on pedestrian and cyclist,
the paper proposes alternatives for a safe and comfortable traffic, especially in the neighborhood activity center, as well as
simultaneously predicting new uses for recreational areas in a state of degradation and greater visibility of the historic center of the
neighborhood, preserving the historical identity of the city.
Keywords: urban mobility. Parangaba. Quality of life. Pedestrian. Cyclist.
7. SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................7
CAPÍTULO I – COMPREENDENDO A MOBILIDADE
URBANA...............................................................................14
1.1. Conceito......................................................................14
1.2. Fatores........................................................................16
1.3. Modos .........................................................................18
1.4. Relações .....................................................................22
1.5. Leis .............................................................................29
1.6. Espaço urbano............................................................32
CAPÍTULO II – COMPREENDENDO A CICLOVIA..............36
2.1. História........................................................................36
2.2. Estrutura......................................................................38
CAPÍTULO III –ESTUDO DE CASO.....................................46
3.1. Amsterdam..................................................................46
3.2. Copenhagen................................................................52
3.3. São Paulo....................................................................58
CAPÍTULO IV –DIAGNÓSTICO DA ÁREA DE ESTUDO ....65
4.1. Aspectos Históricos.....................................................66
4.2. Aspectos Físicos Sociais.............................................70
4.3. Aspectos Legais ......................................................... 78
4.4. Aspectos Urbanísticos ................................................ 82
4.5. Área de Intervenção ................................................... 96
4.6. Síntese do Diagnóstico............................................. 103
CAPÍTULO V – O PARTIDO .............................................. 106
5.1. Diretrizes de Projeto ................................................ 107
5.2. Plano de Ação ......................................................... 108
5.3. Projeto Masterplan ................................................... 122
CAPÍTULO VI – O PROJETO ............................................ 129
6.1. Setor 01 .................................................................... 130
6.2. Setor 02 .................................................................... 132
6.3. Setor 03 .................................................................... 134
6.4. Setor 04 .................................................................... 140
6.5. Síntese do Projeto ................................................... 145
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................ 146
REFERÊNCIAS .................................................................. 147
8. 7
INTRODUÇÃO
Em vista da natural expansão da estrutura física da
cidade ao longo do tempo, diferentes áreas adjacentes aos
núcleos e centros urbanos cresceram e consolidaram-se,
polarizando as mais diversificadas atividades. Contudo, na
maioria das grandes cidades brasileiras, esse processo de
modificação deu-se de forma desordenada e com deficiência
no planejamento ou fiscalização.
Atualmente, a cidade de Fortaleza vivencia as
consequências maléficas desse processo de urbanização
acelerado, quais sejam as carências de infraestrutura e de
políticas sociais, principalmente em seus bairros periféricos.
Nas áreas não-centrais que vivenciaram um certo grau de
desenvolvimento socioeconômico, como o referido Bairro da
Parangaba, são claras as precariedades e os problemas
causados pelo crescimento desordenado da cidade. Dentre as
mazelas decorrentes deste modelo urbano, o
comprometimento da mobilidade urbana é a principal delas.
A Mobilidade é elemento indispensável à vida do
homem, desde os primórdios até a atualidade, em
consequência da maioria das atividades desempenhadas pelo
homem moderno, tais como: trabalho, lazer, comércio, dentre
outras, estão diretamente ligadas à necessidade de
deslocamento.
Além disso, o conjunto de fatores e problemáticas que
envolvem a temática da mobilidade são importantes
determinantes da qualidade da vida do homem na atualidade.
Tal fator tem acentuado a necessidade de se observar a
circulação no contexto urbano, a qual denomina-se “mobilidade
urbana”.
Diante desse contexto, o seguinte trabalho visa explora
a dinâmica moderna da mobilidade, contemplando os seus
fatores determinantes, aplicados sob a realidade do Bairro da
Parangaba, da cidade de Fortaleza – CE.
Dentre as principais adversidades verificadas no
desenvolvimento urbano de Fortaleza, constata-se a
precariedade da mobilidade urbana, a qual tem estado
presente de forma marcante nas discussões da atualidade.
A mescla entre a praticidade e o fator tempo tornou-
se indispensável ao cotidiano das pessoas no século XXI. Os
deslocamentos diários, bem como o excessivo uso de veículos
9. 8
para viagens e demais destinos, estão entre os grandes
ditadores da rotina e determinantes do tempo delegado
à maioria das atividades daqueles que necessitam sair de suas
residências para realizar seus encargos. Tendo em
vista que o cotidiano da maioria da
população ocorre fora das suas residências, a rua consiste
em um prolongamento do lar, tornando-se local de
permanência dinâmica. Além disso, a rua
permite usos múltiplos, comportando não somente função
de trânsito constante, mas de desempenho de variadas
atividades, permitindo assim, novas experimentações do
espaço, tais como o exercício laboral ou cultural.
Vale ainda ressaltar que os sistemas de trânsito e seus
modais de transporte são grandes determinantes do espaço
urbano, dos seus fluxos e dos seus usos, funcionando
como carro-chefe na promoção de intervenções urbanas. Por
esse motivo é necessário que este tempo de deslocamento
seja feito de forma confortável, eficiente, segura e com a maior
liberdade possível.
Visando analisar a influência das condições da
mobilidade urbana sob um contexto real, foi selecionado para
objeto de estudo o bairro da Parangaba na cidade de Fortaleza
(Figura 01), justificando-se pela necessidade de revisão dos
conceitos de mobilidade presentes no bairro, valendo-se da
premissa de que a referida região é componente indispensável
do sistema de mobilidade urbana da cidade de Fortaleza, em
virtude de abrigar importantes equipamentos de tráfego, como
o Terminal Rodoviário da Parangaba e a Estação de metrô
Linha Sul.
Para a melhor compreensão acerca do bairro da
Parangaba, é necessário entender que o mesmo consiste em
um dos povoados mais antigos da capital. A Parangaba teve
sua fundação em 26 de maio de 1758, tendo sida inaugurada
somente em 25 de outubro de 1759. A história da região divide-
se em duas etapas; pois, inicialmente, de 1759 a 1835 o bairro
era vila independente, possuindo Intendente e Câmara.
Posteriormente, entre 1885 a 192, entrou em processo de
anexação à cidade de Fortaleza. Contudo, sua origem remonta
ao século XVI, fundada em vista das missões jesuíticas dos
padres à aldeia Porangaba, logo depois de nomeada “Vila
Nova dos Arroches” e, por fim, “Parangaba”, nome de origem
tupi-guarani, o qual significa beleza, formosura (MAIA, 2012).
10. 9
Dessa forma, o bairro é importante eixo de formação da
cidade no sentido sudoeste, concentrando diversificadas
atividades ao longo dos anos e desempenhando importante
papel no sistema viário da cidade. Essa realidade é verificada
ainda hoje, com a demanda de transporte público exigida no
bairro que alimenta a procura da região na qual é inserido.
Figura 01: Localização do Bairro da Parangaba na cidade de Fortaleza.
Fonte: Mapa produzido pela autora, com base do Google Earth.
A Parangaba é parcela contributiva indispensável
à história e à cultura da cidade de Fortaleza. Em virtude de sua
origem, o bairro abriga inúmeras edificações de valor histórico,
como “Estação Ferroviária da Parangaba”, “Igreja do Bom
Senhor Jesus dos Aflitos”, “Bar do Avião”, “Casa da Câmara da
Villa de Arroches” e “Intendência Municipal da Vila de
Porangaba”, os quais encontram-se hoje em situação precária,
sofrendo com o descaso e com o abandono.
Figura 02: Estação Ferroviária da Parangaba.
Fonte:http://www.estacoesferroviarias.com.br/ce_crato/fotos/parangaba06
1.jpg. Acesso: 10/03/2015
11. 10
Além dos registros históricos físicos presentes no bairro,
também é possível constatar a presença das manifestações da
tradição dessa comunidade, como a “Festa dos Caboclos”, que
consiste em uma das manifestações culturais mais antigas
praticadas na cidade. Assim como o evento informal da “Feira
dos Pássaros”, o qual movimenta intensamente o comércio
local e se apropriou do espaço público, sendo hoje evento do
cotidiano do bairro e da região.
A Parangaba abriga também um dos maiores volumes
hídricos da cidade de Fortaleza, a qual faz parte da bacia
hidrográfica do rio Ceará, a Lagoa da Parangaba. Todavia, a
mesma sofre com falta de manutenção e com a degradação,
decorrentes do despejo de lixo e esgoto de forma irregular.
É importante ressaltar que o bairro continua em
constante expansão, demonstrando ser atrativo para novos
empreendimentos comerciais e alvo de especulação
imobiliária. Conta ainda com a presença de importantes
suportes de transportes públicos, como o Terminal da
Parangaba, que conta com frota operante de 369 ônibus, cerca
de 3.779 viagens programadas por dia e uma demanda
de 188.487 pessoas transportadas por dia (ETUFOR,2015).
O bairro possui uma das estações metroviária de
Fortaleza, “Benfica – Parangaba”, a qual é elo de ligação entre
as linhas Sul e Linha Mucuripe (Figura 03).
Figura 03: Mapa oficial das linhas metroviárias de Fortaleza.
Fonte: http://www.metrofor.ce.gov.br/images/stories/Menu-Servicos/mapa-
oficial-todas-as-linhas.jpg. Acesso: 10/03/2015
12. 11
Entretanto, atualmente o bairro da Parangaba convive
com o dualismo de um bairro em desenvolvimento acelerado,
porém cercado de descaso de planejamento urbano e da
desvalorização dos interesses humano, social e ecológico,
frente aos interesses imobiliários.
Destarte, o seguinte trabalho consiste em promover o
estudo do bairro, permitindo destacar suas
principais potencialidades e vantagens, bem como
as vulnerabilidades e deficiência, de modo a ilustrar as
consequências para a comunidade que nele habita.
E, mediante a análise destes dados, estabelecer um plano de
ação para a melhoria da qualidade de vida do bairro.
Dentre as possibilidades de valorização do espaço
urbano que podem ser propiciadas pela intervenção de
sistema de mobilidade, estão a capacidade de otimizar o
tempo de deslocamento habitual dos moradores do Bairro da
Parangaba, assim como de suas regiões adjacentes,
promovendo a integração dos diversificados meios de
transportes já existentes no bairro (metrô e terminal rodoviário),
com o auxílio de transportes alternativos, como os sistemas
cicloviários, além da qualificação dos passeios permitindo de
forma mais confortável pequenos deslocamentos, permitindo a
renovação do uso do espaço urbano.
É válido ressaltar que as intervenções no espaço urbano
primam o resgate de áreas ambientais e de
patrimônios histórico e cultural degradados, permitindo que os
mesmos passem pelas devidas requalificações, retornando ao
convívio da comunidade e permitindo assim seus novos usos e
consequente conservação.
OBJETIVOS
Objetivo Geral
A partir da análise da mobilidade urbana e compreensão
dos seus conceitos e demais especificações, o presente
trabalho visa desenvolver um estudo no qual se analisa esta
temática em escala de projeto urbano, mormente observar
como a mesma se dá no bairro da Parangaba. Análise esta que
conduzirá o diagnóstico do bairro e a realização da proposta de
intervenção, primando pela melhoria das condições da
mobilidade urbana.
13. 12
Objetivos Específicos
Avaliar os impactos do desenvolvimento e da ineficiência
do planejamento urbano, no que diz respeito à
mobilidade;
Analisar os impactos gerados pelas ciclovias na logística
do tráfego;
Estudar as consequências do sistema de mobilidade
urbana existente no bairro de estudo;
Comparar alternativas e propostas de modelos de
mobilidade urbana;
Compreender a problemática urbana do bairro
correlacionada ao seu perfil social;
Propor projeto de intervenção urbana.
METODOLOGIA
O seguinte trabalho é, essencialmente, uma pesquisa
exploratória dos conceitos urbanos voltados, principalmente,
ao tema da mobilidade urbana, por meio de abordagem direta,
com a implementação das estimativas expostas no estudo de
caso do bairro da Parangaba, na cidade de Fortaleza, estado
do Ceará.
O trabalho é estruturado com fundamentação teórica
direcionada à temática da mobilidade, bem como embasado
em estudos de casos voltados ao assunto e em diagnóstico do
referido bairro Parangaba; apresentando proposta de
intervenção urbana, fazendo uso dos seguintes métodos de
pesquisa:
Pesquisa em base bibliográfica:
Dentre os principais autores presentes no trabalho, é
indispensável destacar Eduardo Alcântara Vasconcelos, com a
publicação “Mobilidade Urbana e Cidadania” (2012), que
funcionou como principal objeto de estudo da pesquisa,
endossando a estrutura básica do presente trabalho. Eduardo
Alcântara de Vasconcellos é engenheiro, sociólogo e doutor em
Ciência Política (Políticas Públicas); também é assessor da
ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos) e diretor
do Instituto Movimento. Seu livro “Mobilidade Urbana e
Cidadania” (Editora Senac) foi indicado para o prêmio Jabuti
2013, sendo importante figura nacional nas discussões acerca
da mobilidade urbana no Brasil.
14. 13
Assim como a obra de Eduardo Vasconcelos, outra
publicação que atuou como principal fonte de inspiração
acadêmica e ponto de partida nas discussões urbanísticas do
presente trabalho foi “Morte e Vida de Grandes Cidades”
(2012), da conceituada autora Jane Jacobs.
Jane Jacobs destacou-se no mundo da literatura como
escritora e ativista política; tem como principal publicação
“Morte e Vida de Grandes Cidades”. A mesma aborda
diferentes perspectivas do espaço urbano, bem como a sua
relação com o homem utilizador e modificador do espaço.
Pesquisa em base de plataforma digital;
A utilização de web sites permitiu uma ampliação da
discussão acerca da mobilidade urbana, em virtude de o tema
encontrar-se em pauta na atualidade.
É relevante destacar algumas plataformas digitais, as
quais permitiram importante avanço na concepção do trabalho,
principalmente no que diz respeito ao acesso a publicações
acadêmicas, como as seguintes:
LOPES, Francisco Clébio Rodrigues. A centralidade da
Parangaba como produto da fragmentação de
Fortaleza. 2006. 161 f. Dissertação (Mestrado) - Curso
de Geografia, Universidade Federal do Ceará,
Fortaleza, 2006.
MENDONÇA, Gabriela; SILVA, Luiz Marcio de Miranda;
SILVA, Renata Ribeiro; HANAGUSKU, Renato Seiji.
PLANEJAMENTO E IMPLANTAÇÃO DE CICLOVIAS:
ESTUDO DE CICLOVIAS EM REGIÕES
METROPOLITANAS. 2011. 90 f. Tese (Doutorado) -
Curso de Engenharia Civil, Universidade Anhembi
Morumbi, São Paulo, 2011.
Além das publicações acadêmicas, o auxílio da
plataforma digital foi de suma importância para manter
atualizada a temática do presente trabalho; fazendo uso de
reportagens de jornais e revistas com portais online. O mesmo
princípio é válido para as atualizações do site da Prefeitura de
Fortaleza, bem como fácil acesso online à Constituição
Federal.
Levantamento de dados em campo;
O levantamento de dados em campo possibilitou
presenciar a dinâmica diária do bairro Parangaba: o registro de
imagens, de dados e do contato com a população que faz uso
do seu espaço público.
15. 14
CAPÍTULO I – COMPREENDENDO A
MOBILIDADE URBANA
1.1. Conceito
O tema central do trabalho trata da mobilidade na escala
urbana. Contudo, este tema possui grande abrangência de
aplicação, estando presente em diferentes níveis na sociedade.
Dessa forma, o presente tópico visa explorar a conceituação da
mobilidade de forma ampla, assim como a sua especificidade
no que tange à sua escala urbana.
O significado mais básico da mobilidade está implícito
no próprio vocábulo da língua portuguesa, remetendo
constantemente ao sentido dinâmico do movimento e do
deslocamento.
Mobilidade. [Dolat.mobilitate] S.f. 1.Qualidade ou
propriedade do que é móvel ou obedece às leis do
movimento. 2. Facilidade de mover-se ou de ser
movido: a mobilidade dos corpos esféricos. 3. Fig.
Facilidade com que se passa de um estado para
o outro; inconstância, volubilidade: mobilidade de
fisionomia, de imaginação_Mobilidade iônica.
Fís-Quím. A velocidade dum íon sob a ação de um
campo elétrico unitário. Mobilidade social.
Social. Circulação ou movimento de ideias, de
valores sociais ou de indivíduos, duma camada
inferior para a superior, e vice-versa, ou dum
grupo para outro no mesmo nível.
(FERREIRA, 1999, p. 1349.)
Observa-se que a mobilidade está implícita em
diferentes áreas do conhecimento. Contudo, podemos
sintetizar a compreensão do termo como a capacidade e/ou
facilidade de realizar deslocamentos.
É definido como “mobilidade urbana”, segundo Lei
Federal Nº 12.587, que institui as diretrizes da Política Nacional
de Mobilidade Urbana, na Seção I, Art.4. “II - Mobilidade
urbana: [grifo nosso] condição em que se realizam os
deslocamentos de pessoas e cargas no espaço urbano”.
Mediante a exposição dessa análise, torna-se
indispensável apresentar os conceitos de acessibilidade, posto
que se relacionam diretamente com a capacidade de
mobilidade de um dado indivíduo.
A acessibilidade é compreendida em suma como:
16. 15
Acessibilidade. [Do lat. Tard.
accessibilitate.]S.f.1. Qualidade de acessível. 2.
Facilidade na aproximação, no trato, ou na
obtenção. 3. Educ. Esp. Condição de acesso aos
serviços de informação, documentação e
comunicação por parte dos portadores de
necessidades especiais (q.v.).
(FERREIRA, 1999, p. 30.)
Ainda dentro deste contexto de acessibilidade, é
possível destacar a importância de dois conceitos: Macro e
Micro acessibilidade (Figura 04).
A macro acessibilidade pode ser definida de forma
similar à mobilidade, sendo ela responsável pela facilidade de
deslocamentos de forma geral. Como, por exemplo, a) o uso
de transporte público para sair da residência em direção ao
trabalho, b) realizar viagens em automóvel particular, c) usar
bicicleta para lazer, ou mesmo d) trafegar a pé.
Por sua vez, a micro acessibilidade está relacionada à
facilidade do percurso para atingir o modal de transporte
utilizado na macro acessibilidade, fazendo alusão aos
exemplos anteriores: a) quanto ao deslocamento para acessar
transporte público, é preciso avaliar a acessibilidade do ponto
de parada deste transporte e a viabilidade da distância do
mesmo em relação à residência do indivíduo; b) e c) em
relação à viagem em automóvel particular, assim como ao uso
da bicicleta, os mesmos devem ser estacionados em um local
definido, por sua vez, o cálculo de deslocamento, bem como a
facilidade de acesso e de estacionamento devem ser
avaliados; d) por fim, o deslocamento a pé, que possui a micro
acessibilidade expressa na qualidade das calçadas , por
exemplo; devendo a facilidade de acesso proceder de forma
igualitária até o seu destino, independente de condicionantes
físicas do indivíduo (CRUZ, 2012).
Figura 4: Esquema da relação da Acessibilidade com a macro e micro
acessibilidade
Fonte: Produzido pela autora.
17. 16
Toma-se como partida tal exposição dos conceitos para
explorar as particularidades as quais permeiam esse tema,
apresentadas ao longo do trabalho.
1.2. Fatores
A mobilidade urbana, como exposto anteriormente, está
diretamente relacionada com os deslocamentos realizados por
um dado indivíduo no decorrer do seu dia. Dessa forma, é
previsível que ao longo do dia ele se depare com diversificadas
variantes que imprimam maior facilidade ou dificuldade nesse
percurso. Assim, é imprescindível para a compreensão dos
impactos desses fatores na mobilidade, a análise dos mesmos
e suas relações interpessoais.
Existem fatores que são importantes componentes da
facilidade ou dificuldade da mobilidade urbana de um indivíduo.
Segundo Vasconcellos (2012, p.49), os fatores que
condicionam o deslocamento são: fatores pessoais, fatores
familiares, fatores externos e a localização do destino. Com
base nisso, o presente trabalho caracteriza esses fatores,
essencialmente, como: fatores individuais, fatores externos
e fatores de localização:
Fatores Individuais:
Estão relacionados às características das pessoas e às
suas limitações, segundo Vasconcellos, (2012, p.49) “Referem-
se unicamente ao indivíduo, seu grau de maturidade e
liberdade, e às suas condições físicas de gênero e renda”.
A idade, por exemplo, condiciona a mobilidade da faixa
etária mais jovem (até os sete anos), limitando o deslocamento
destes, de forma que seja adaptado às situações de
acompanhamento por responsáveis. Semelhante ocorre com a
faixa etária mais idosa, haja vista que a frequência com que
saem de casa já é reduzida, geralmente em virtude de
limitações físicas.
O gênero também é outro fator de ordem pessoal que
pode condicionar o deslocamento, principalmente, no que
tange às concepções culturais da sociedade. Por exemplo, em
relação à liberdade de trafegar das mulheres ocidentais em
comparativo com as do oriente médio.
18. 17
Um terceiro item associado às condições individuais
consiste no fator financeiro, posto que o mesmo determina,
principalmente, qual modal de transporte o indivíduo terá que
utilizar de acordo com seus recursos.
Fatores Externos:
Estão relacionados com a demanda dos modais de
transportes, assim como os fatores de qualidade, de
acessibilidade e de infraestrutura disponível, variando de
condições a depender da escolha do modal de transporte,
ponderando suas vantagens e desvantagens na escolha de um
dado modal de transporte para realizar um deslocamento.
Para os que desejam caminhar, o dado mais
importante é a disponibilidade de calçadas e sua
qualidade, além das condições de travessia das
vias. Para os ciclistas, o que interessa é a
possibilidade de usar as vias com segurança. Já
quem pretende usar transporte público, terá
preocupação com as linhas disponíveis e o valor
da tarifa. Quem quiser usar automóvel ou
motocicleta vai pensar nas vias que estão
disponíveis.
(VASCONCELLOS, 2012, p.54)
Fatores de Localização:
Como o próprio nome sugere, esse fator ressalta a
multiplicidade de opções que essa variante do destino pode
impor ao deslocamento; como por exemplo, a escolha do
modal de transporte, os horários e os trajetos adotados para
alcançar o destino desejado, bem como a disponibilidade do
modal de transporte escolhido e eventuais particularidades que
o mesmo venha a apresentar.
É possível perceber que os fatores que condicionam o
deslocamento estão correlacionados, possuindo
características que se completam, necessitando analisá-los de
forma associada e nunca independente (Figura 5).
Figura 5: Esquema da relação dos Fatores da Mobilidade urbana.
Fonte: Produzido pela autora.
19. 18
1.3. Modos
Além dos fatores anteriormente citados, outro elemento
a se analisar para melhor compreender a dinâmica da
mobilidade urbana é a maneira como o deslocamento será
realizado, pois condiciona a escolha do trajeto e o tempo
delegado em cada modal de transporte, além da facilidade de
acesso a eles, entre outros.
Os modos de deslocamento configuram-se,
essencialmente, pelos meios com que os indivíduos realizam
determinados trajetos. Tais modais podem ser classificados
das mais variadas formas, porém o presente trabalho adota a
classificação de Vasconcellos (2012, p.15), na qual ele agrupa
os modais de transporte em quatro grupos gerais; sintetizados
aqui em três, em vista da similaridade entre Coletivos e
Públicos. Lembrando, também, que cada grupo desse engloba
seus modais de transportes específicos como pode ser
expresso a seguir (Tabela 01).
Tabela 01: Tabela de qualificação dos Modos de Transporte.
Fonte: Tabela confeccionada pela autora com base na publicação
VASCONCELLOS, 2012, p.15.
Individual: O deslocamento é feito pelo indivíduo sozinho,
permitindo maior flexibilidade de tempo e de trajetória para o
seu destino.
Privado: Por ser de natureza privada, assemelha-se ao
transporte de uso individual, ou que seu uso deve ser
controlado pelo proprietário do modal de transporte, e, também,
assim como o individual, permite maior flexibilidade de horários
e de trajetória.
Coletivo e Público: Em suma, os modais de transporte de
caráter coletivo, que permitem o deslocamento de um maior
número de pessoas em conjunto, são geralmente de uso
Modos de transporte
Categoria Modo
Modos Individuais,
não motorizados
A pé Bicicleta
Modos Públicos Ônibus Metrô
Modos Individuais
Motorizados
Carro Motocicleta Táxi
Híbridos Ônibus Fretado Táxi
20. 19
público, como transporte de massa, excetuando-se ônibus e
vans particulares fretadas.
Em contrapartida, os híbridos consistem em modais de
transporte que se adequam a duas categorias diferentes; como
é o caso do táxi, que apesar de ser utilizado no deslocamento
particular, o referido deslocamento não é feito apenas pelo
proprietário do automóvel, mas também por passageiros
desconhecidos, sendo assim um transporte também público.
Além das características expostas anteriormente, os
modos de transporte também são divididos em dois grandes
grupos: motorizados e não motorizados. Como o próprio
nome sugere, essa divisão implica na força motriz do modal, ou
seja, se o mesmo é feito por tração humana ou animal,
caracterizando-se por veículo não motorizado, tais como as
bicicletas e o próprio deslocamento a pé; ou, ainda, se é
realizado com a força motor, estando presente nos automóveis,
ônibus, motocicletas, dentre outros (Figura 6).
Figura 6: Ilustração de modais de transportes
Fonte: 01. www.corpoemdieta.com/andar-de-bicicleta/
02. www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/junho2006/ju328pag8c.html
03. pitstopbrasil.wordpress.com/2010/07/05/nova-geracao-da-volvo-s60-e-
oficialmente-apresentada/
04.iasminguedes.blogspot.com.br/.
Acessados: 20/03/2015. Ilustração produzida pela autora.
Diante da apresentação dos modos de transporte
supra, expõe-se, a seguir, na (Tabela 2), as principais
vantagens e desvantagens desses modais:
21. 20
Tabela 02: Tabela Vantagens e Desvantagens dos Modos de Transporte.
Fonte: Tabela confeccionada pela autora.
22. 21
Como pode ser observado, a partir da análise desta
tabela, cada modal de deslocamento possui suas
particularidades, assim como suas vantagens, dependendo do
destino, do tempo e das restrições do indivíduo que estivesse
se deslocando. Contudo, o presente trabalho pretende ater-se
diretamente aos transportes de características individuais e
não motorizados, em virtude de os mesmos compreenderem
as formas de deslocamento com menor custo, maior facilidade
de acesso, menor agressividade ao meio ambiente e maior
promoção de benefícios à saúde.
O deslocamento a pé é primordial nas atividades diárias.
Consiste na forma mais espontânea de locomoção, sendo
eficiente principalmente em pequenas distâncias. A
caminhada, por sua vez, apesar da simplicidade, necessita de
severas sinalizações de trânsito, pois o número de vítimas em
acidentes que envolvem pedestres é extenso. Em virtude disso,
o deslocamento a pé deve ser sempre associado à importância
do uso de faixa de pedestres, sinais específicos, passagens em
nível – traffic calming, rampas elevadas e até mesmo a
restrição do acesso de carros a determinadas ruas de intenso
fluxo de pedestres (FERRAZ; TORRES, 2001).
Andar não consiste apenas em uma forma
ecologicamente correta de acessar o seu destino, mas é,
também, uma prática de exercício físico e, por isso, deve ser
estimulada, principalmente, entre jovens e idosos, levando em
consideração os benefícios à saúde (Figura 7).
Figura 7: Esquemas de benefícios a saúde para quem anda a pé
Fonte: Produzido pela autora
Reduz risco
de doenças
coronárias
Reduz
pressão
arterial e
colesterol
Melhora
condicionam
ento de
ossos e
articulações
Redução de
peso e
combate ao
estresse
Combate
insonia
23. 22
A bicicleta permite agregar a flexibilidade de horários e
de trajetos com a possibilidade de vencer maiores distâncias
em menor lapso temporal, semelhante ao que ocorre com o
deslocamento a pé. Há ainda o benefício de estacionamento
fácil, possibilitando maior versatilidade de acesso aos espaços.
Além das vantagens de otimização de tempo e trajeto,
pedalar permitiu um investimento financeiro inicial moderado e
uma manutenção a baixo custo, sendo grande atrativo para a
população das mais variadas classes. A bicicleta é grande
aliada das políticas de sustentabilidade ecológicas, sendo de
grande contribuição nos deslocamentos sem emissão de gás
poluente e poluição sonora. Pedalar congrega também a
prática de esporte e o benefício à saúde com a viabilidade de
percorrer destinos necessários ao longo do dia, realizando
exercícios e solucionando afazeres do cotidiano. (ATIVO; BH).
Incentivando o uso da bicicleta, um meio de
transporte energeticamente eficiente, econômico
e não-poluente, buscamos soluções para ajudar a
mobilidade das pessoas e viabilizar cidades mais
humanas e com maior qualidade de vida
(ATIVO; BH).
1.4. Relações
A mobilidade urbana contém uma série de componentes
determinantes, como observado anteriormente. Dentre esses
determinantes, o papel dos indivíduos que necessitam realizar
o deslocamento diariamente para os mais diversificados
destinos é de suma importância.
Comumente, os papéis no trânsito são designados ao
pedestre e ao motorista de forma estática, desprezando-se a
interação entre os mesmos, os conflitos recorrentes e as
diferenças de interesses dos mesmos, nas mais variadas
ocasiões.
Contudo, este trabalho adota a visão proposta por
Vasconcellos (2012), a qual ressalta a importância de avaliar
de forma mais precisa o grau de mecanização no
deslocamento do indivíduo, a fim de dimensionar com mais
clareza as consequências dos impactos, físicos, sociais e
econômicos.
Além da avaliação do grau de mecanização do
deslocamento, é necessária a análise de diferentes fatores,
como o caráter ativo ou passivo em relação à circulação.
24. 23
O papel ativo é caracterizado por um movimento
e, portanto, pela necessidade de consumir o
espaço de circulação. Ao contrário, o papel
passivo é estacionário – ele não consome o
espaço de circulação, mas é afetado por quem o
faz.
(VASCONCELLOS, 2012, p.37)
A partir da avaliação dos itens anteriores, é possível,
também, correlacionar essa mobilidade com o indivíduo e suas
particularidades, promovendo a análise do gênero, da idade e
das condições sociais, criando subgrupos de análises, que
permitem prever as mais variadas situações. Visando ilustrar
de forma simples essas categorias de análises, segue a
(Tabela 03).
Tipo de
transporte
Relação com o
trânsito
Papel
Não mecanizado Ativo Pedestre sozinho;
Pedestre acompanhado.
Não mecanizado Passivo Residente;
Visita/ convidado;
Proprietário do comércio;
Cliente do comércio;
Usuário de equipamento
público.
Mecanizado Ativo (não
motorizado)
Ciclista;
Ativo
(motorizado)
Motociclista;
Motorista de auto;
Motorista de táxi;
Motorista de ônibus;
Motorista de caminhão;
Passageiro de auto;
Passageiro de táxi;
Passageiro de ônibus;
Mecanizado Fiscalização Agente de trânsito
Papéis
Especiais
indiretos
Planejamento Planejador urbano;
Planejador de transporte;
Planejador de trânsito.
Atividade
interessada
Indústria da construção;
Indústria automotiva;
Mercado imobiliário;
Comércio.
Tabela 03: Tabela explicativa dos papéis desempenhados no trânsito.
Fonte: Tabela confeccionada pela autora, adaptada com base na
publicação VASCONCELLOS, 2012.p.38.
25. 24
Como pode ser verificado na tabela 03, as diversidades
de papéis desempenhados no sistema de circulação estão
diretamente relacionadas aos interesses e atividades
realizadas por esses indivíduos no decorrer do dia-a-dia.
Consequentemente em virtude desta distinção de interesses é
natural que existem divergências entre os mesmos gerando
assim conflitos.
Vasconcellos (2012) aborda alguns conflitos usuais do
sistema de trânsito e dentre esses conflitos o presente trabalho
explora a temática de alguns deles e propõe também outro. As
relações destacadas são: Pedestre x Motorista, Morador x
Motorista, Passageiro de Ônibus x Motorista, Ciclista x
Motorista:
Pedestre x Motorista:
O conflito presente entre pedestre e motorista ocorre ao
longo do dia, principalmente no que concerne à travessia das
vias. Nesse ponto que ocorre a maior interação entre eles, já
que, ao longo do percurso, o pedestre deve primordialmente
permanecer na calçada sem contato direto com o carro, assim
como o motorista deve essencialmente se ater ao
deslocamento dentro do espaço das vias.
Apesar da existência da faixa de pedestre, que deve ser
rigorosamente respeitada, existem as exceções de quadras
com distâncias superiores ao indicado, ou com serviços que
sujeitam a necessidade de faixa de pedestre, ou mesmo a
interseção no meio da quadra, como a entrada de escolas ou
hospitais, que compilam nos acidentes de trânsito.
O pedestre deseja cruzar a rua em um determinado
ponto, de forma rápida e segura, porém o motorista também
deseja realizar seu trajeto com rapidez e fluidez, resultando
nesse claro conflito de interesses, como pode ser observado
no esquema da (Figura 8).
Figura 8: Conflito pedestre x motorista
Fonte: Produzido pela autora.
26. 25
Morador x Motorista:
Este quesito aplica-se, principalmente, aos bairros
essencialmente residenciais, que compartilham de
equipamento público, como praças ou parques. O morador
dessa vizinhança, geralmente, deseja usufruir de suas
calçadas, como local para caminhadas, conversas entre
vizinhos e lazer para crianças de forma confortável e segura.
Contudo, há um considerável uso das vias dessa tipologia de
área como forma de esquivar-se dos congestionamentos, fato
este que pode, eventualmente, ocasionar acidentes, além de
poluição sonora (Tabela 4) e atmosférica (Tabela 5).
O ruído produzido numa conversação normal
entre pessoas é de 55 decibéis (dB). A
organização Para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OECD, na sigla em
inglês) recomenda que o ruído do tráfego não
exceda 65 dB, mas em grandes cidades, mais da
metade da população está submetida a calores
superiores a este, rotineiramente.
(Vasconcellos, 2012, p.105)
VEÍCULO/
HORA
NÍVEL DE
RUÍDO LEQ. (1
HORA) DB (A)
FLUXO DIÁRIO
ESTIMADO
(VEÍCULO/DIA)
RAZÃO
(PRIMEIRO
NÍVEL = 1)
6 51 90 1
60 61 900 10
100 63 1.500 17
500 70 7.500 83
1.000 73 15.000 167
2.000 76 30.000 333
Tabela 4: Razão de aumento da quantidade de dB em virtude do aumento
do fluxo de carros
Fonte: (Vasconcellos, 2012, p.105)
No que diz respeito aos acidentes no Brasil, o alto
número de vítimas registrado é ainda inferior ao número real,
em vista do registro limitar-se a vítimas fatais. Segundo
Vasconcellos (2012, p.110), “[...] todas as vítimas são
pedestres e ciclistas os participantes mais vulneráveis do
trânsito”. A fatalidade nos acidentes envolvendo pedestres
permeia 50% a 65% (Tabela 5). Em São Paulo, por exemplo,
uma das maiores metrópoles do Brasil, há um alto índice de
mortes no trânsito, mas também apresenta uma redução entre
os anos de 2008 a 2013 como é possível verificar na Figura 9.
27. 26
ANO MORTOS MORTOS/ CEM MIL
PESSOAS
1961 3.356 4,6
1971 10.692 11,1
1981 19.782 15,9
1991 23.332 15,1
2001 20.039 11,6
2005 36.611 19,3
2010 40.610 20,9
Tabela 5: Fatalidades em acidentes de trânsito no Brasil, 1961 – 2010.
Fonte: (Vasconcellos, 2012, p.109)
Figura 9: Mortes de pedestres em São Paulo
Fonte: http://observasampa.prefeitura.sp.gov.br.Acesso: 07/04/2015
Como pode ser verificado com os dados expostos na
tabela e imagem anteriores, as principais vítimas dos acidentes
de trânsito são também as mais frágeis. No panorama geral
verificado no Brasil entre os anos de 1961 e 2010, o aumento
do número de acidentes é um importante indicador desse
conflito.
Importantes características são presenciadas nos
acidentes de trânsito; segundo Vasconcellos (2012, p.111),
referem-se à relação do gênero, da idade e do horário de
maiores índices de acidentes (Figura 10).
Figura 10: Esquema de características dos acidentes.
Fonte: Produzido pela autora.
28. 27
Diante da realidade apresentada, é evidente a
necessidade de um tratamento diferenciado para locais com
maior deslocamento de pedestres, principalmente, em locais
que abrigam equipamentos de uso público; sendo comum a
utilização de mecanismos que obrigam o carro a imprimir
menor velocidade no deslocamento, ou, em algumas ocasiões,
que impeçam o uso do carro, permitindo maior segurança no
deslocamento do pedestre.
Passageiro de ônibus x Motorista:
O ônibus necessita realizar seu deslocamento de forma
rápida e com o mínimo de obstáculos possíveis, a julgar pelo
fato do mesmo já realizar uma sequência de interrupções do
seu percurso em detrimento das paradas para os passageiros.
Os passageiros, por sua vez, necessitam da maior
acessibilidade possível no percurso entre sua parada de ônibus
e seu destino final. Em contrapartida, o espaço da via ocupado
pelo ônibus é disputado com o automóvel, que também busca
maior fluidez e acessibilidade para o seu destino final,
acarretando as disputas por espaço de circulação e de
acessibilidade.
A previsão dos acessos para os espaços públicos, assim
como o devido tratamento das paradas de ônibus deve ser
rigorosamente estudado, buscando evitar acidentes e
comprometimento da fluidez de deslocamento de ambos.
Algumas alternativas em uso, visando primar pela
acessibilidade do transporte de massa, são os corredores
exclusivos de ônibus, assim como o uso do BRT.
Ciclista x Motorista:
Semelhante aos conflitos presentes entre o pedestre e o
motorista, o ciclista ocupa lugar de desvantagem nessa
relação, haja vista que o mesmo se desloca em disputa de
espaço com os motoristas nas situações em que inexiste
sistema de ciclovia.
O ciclista tem seu deslocamento limitado pelas
extremidades das vias, comumente ocupado por carros
estacionados, vendedores ambulantes, saídas de
estacionamentos e uma série de obstáculos e riscos que
favorecem a ocorrência de acidentes (Figura 11).
29. 28
Figura 11: Conflito ciclista x motorista
Fonte: Produzido pela autora
A necessidade da devida sinalização viária é um dos
pontos primordiais dessa tipologia de risco para os ciclistas.
Contudo, metrópoles brasileiras apresentam grande número de
acidentes envolvendo ciclistas, levando à fatalidade, como
pode ser observado no caso da cidade de São Paulo,
apresentado no seguinte gráfico, o qual expõe a relação do
número de óbitos registrados no intervalo dos anos de 2008 a
2013, além de relacionar esse número por 100 mil habitantes.
No gráfico é presente a redução do número de acidentes ao
longo dos anos. (Figura 12).
Figura 12: Mortes de ciclistas em São Paulo
Fonte: http://observasampa.prefeitura.sp.gov.br.Acesso: 07/04/2015
É importante ressaltar que as variáveis desses conflitos
são inúmeras e que podem ser simuladas das mais
diversificadas formas. Entretanto, é indispensável notar que os
conflitos permeiam a disputa de espaço e acessibilidade da
cidade, os quais muitas vezes não são priorizados de acordo
com o interesse da coletividade, sendo de controle dos
transportes de caráter individuais motorizados.
30. 29
1.5. Leis
De forma geral, as leis que regulamentam a temática da
mobilidade urbana foram, em suma, limitadas e eram quase
restritas aos controles do transporte público e fiscalização dos
transportes de caráter individual motorizado.
Todavia, com o crescimento dos investimentos e formas
de financiamentos dos automóveis, as preocupações dos
impactos ambientais, assim como o crescimento acelerado da
cidade e a demanda de deslocamento para atingir esses
espaços, mostrou-se imperiosa a necessidade de uma revisão
das considerações legais, as quais permeiam a mobilidade
urbana (VASCONCELLOS, 2012, p.125)
É importante compreender que, dentro das esferas
públicas, as competências designadas a cada poder da União
são específicas, apesar de, em sua maioria, as atividades
designadas a eles necessitarem de cooperação mútua. Assim,
o presente item do trabalho busca analisar os responsáveis e
suas atribuições no que diz respeito à situação da mobilidade
urbana.
Desta forma, a seguinte tabela sintetiza de forma breve
as competências e agentes responsáveis do poder público pela
mobilidade das cidades brasileiras (Tabela 5).
As pressões nacionais e internacionais dos impactos
ambientais e sociais do crescimento desordenado das
metrópoles, especialmente no tocante ao transporte, foram os
principais fatores que impulsionaram uma revisão da
mobilidade urbana no poder político.
Assim, em janeiro de 2012, foi aprovada a Lei Federal
de Mobilidade Urbana (Lei nº 12.587, de 3 de janeiro de 2012),
pela Presidência da República, a qual dispõe acerca da
mobilidade na escala urbana, contemplando a acessibilidade,
a infraestrutura, a segurança, a demanda de transporte, dentre
outros aspectos, sendo responsável pelas diretrizes e objetivos
da Política Nacional de Mobilidade Urbana. Destaque para
alguns itens da Seção II, Artigo 5 e Artigo 6:
Art. 5o A Política Nacional de Mobilidade Urbana
está fundamentada nos seguintes princípios:
I acessibilidade universal;
II desenvolvimento sustentável das cidades, nas
dimensões socioeconômicas e ambientais;
31. 30
III equidade no acesso dos cidadãos ao transporte
público coletivo;
IV eficiência, eficácia e efetividade na prestação
dos serviços de transporte urbano;
VI segurança nos deslocamentos das pessoas;
VIII equidade no uso do espaço público de
circulação, vias e logradouros;
Art. 6o A Política Nacional de Mobilidade Urbana
é orientada pelas seguintes diretrizes:
II prioridade dos modos de transportes não
motorizados sobre os motorizados e dos serviços
de transporte público coletivo sobre o transporte
individual motorizado;
(BRASIL. LEI Nº 12.587, DE 3 DE JANEIRO DE
2012.)
Há mudança considerável, também, no tocante ao
deslocamento realizado por bicicleta. A mudança vigora no
CNT - Código Nacional de Trânsito de 1997, o qual não previa
regulamentação alguma acerca do deslocamento neste modal,
para somente em 1998 regulamentar e estabelecer direitos e
deveres do condutor de bicicletas.
No entanto, o reduzido número de condutores e a
reduzida importância deste modal na educação do trânsito
implicam no desconhecimento das leis acerca do referido
elemento (MALATESTA, 2012).
Assim sendo, considerando o exposto, é importante
compreender a importância do poder público em suas
diferentes esferas de atuação, na garantia da qualidade da
mobilidade urbana.
33. 32
1.6 Espaço Urbano
Anteriormente, foram expostos os principais aspectos e
componentes que integram a mobilidade no espaço urbano,
porquanto este tópico pretende esmiuçar as dinâmicas do
espaço urbano e seus impactos na mobilidade.
Primeiramente, é preciso segregar o conceito básico de
espaço público e espaço privado e suas especificidades
(PUIME, 2014).
Espaço público:
São essencialmente os espaços de comum acesso, de
uso coletivo; podendo ser de circulação, como ruas e calçadas,
assim como podem ser de permanência e lazer, como parque
e praças. Contudo, os espaços livres são ainda subdivididos,
de acordo com suas peculiaridades, em: a) Espaço Público
Livre, que garante a livre circulação, sem quaisquer restrições,
e b) Espaço Público Restrito, que, apesar do caráter público e
de direito do uso da comunidade, possue restrições de horário
e de atividades, tais como hospitais, escolas e edificações do
setor público (Figura 13).
Imagem 13: Esquema de espaços públicos.
Fonte: Esquema produzido pela autora. 01: http://clubebatom.com.br. 02:
http://1.bp.blogspot.com. Acessados: 25/03/2015
Em geral, são de competência dos órgãos do governo,
a manutenção e preservação dos Espaços Públicos.
Espaço privado:
São espaços pertencentes a um dado proprietário, o
qual é responsável pelo controle do mesmo, assim como
manutenção. Tais como: casas, lojas, shoppings, bancos, etc.
01. Espaços públicos livres
•Praças, parques, bosques;
•Calçadas, ruas.
02. Espaços Públicos
Restritos
•Edificações de uso público
34. 33
É importante lembrar que mesmo alguns espaços
privados possuem local de acesso pelo público, como no caso
de bancos, lojas e shoppings. Porém, estão sob as condições
de funcionamento do proprietário, o qual pode estabelecer
seus próprios horários de funcionamento, por exemplo.
Mediante o esclarecimento dos conceitos de espaços
públicos e privados, em virtude do presente trabalho se ater à
mobilidade urbana pautada no deslocamento a pé e o uso das
bicicletas, é necessário um breve estudo dos espaços públicos
livres, pois possuem grande relevância para esses modos de
transportes abordados.
Os espaços públicos, principalmente no que se referem
às calçadas, são de suma importância para a garantia da
qualidade de deslocamento de uma dada região. A melhor
qualidade das calçadas, assim como o conforto no
deslocamento, a acessibilidade e a segurança são importantes
fatores para que permitam que esse espaço esteja em
constante uso; “É uma coisa que todos já sabemos: uma rua
movimentada consegue garantir a segurança; uma rua
deserta, não” (Jacobs, 2013, p.35).
Segundo Jane Jacobs (2013), o principal artifício para
assegurar o uso das ruas de forma segura são os contínuos
estranhos que transitam por ela e para isso devem ter,
principalmente, 3 características:
I. Separação entre espaço público e privado, de
forma que as calçadas nunca estejam abrigando
usos privados e permitindo o deslocamento das
pessoas;
II. Vigilantes da rua. A vigilância feita de acordo com
a visibilidade que os moradores têm da sua
própria rua, como os comerciantes e os próprios
pedestres, que inibem a atitude explícita da
prática de furtos e violências.
III. As calçadas devem ter movimento ininterrupto,
com atividades para o dia e para a noite,
permitindo maior segurança nos diferentes
horários.
Por alto, parece que temos algumas metas
simples: tentar dar segurança às ruas em que o
espaço público seja inequivocamente público,
fisicamente distinto do espaço privado e daquilo
35. 34
que nem espaço é, de modo que a área que
necessita de vigilância tenha limites claros e
praticáveis; e assegurar que haja olhos atentos
voltados para esses espaços públicos da rua o
maior tempo possível.
(JABOS, 2013, p.37)
Dessa forma, fica clara a importância do uso do espaço
público para a preservação do mesmo, assim como da
qualidade de vida e de mobilidade dos que usufruem dele.
Para tal, os espaços públicos devem ser convidativos,
bem estruturados, seguros e devem oferecer atividades para
os transeuntes que dele usufruem. Pontos importantes para a
manutenção dessa utilização é a qualidade da iluminação,
segundo Jacobs (2013, p. 43) “O valor da iluminação forte nas
ruas de áreas apagadas e desvitalizadas vem do reconforto
que ela proporciona às pessoas que precisam andar nas
calçadas, [...] as luzes induzem essas pessoas a contribuir com
seus olhos para a manutenção das ruas”. Sendo assim, a
iluminação consiste como importante ferramenta além da
manutenção do espaço público, permitindo que o mesmo seja
utilizado em diversificados horários.
É de suma importância destacar também a necessidade
do espaço público de assegurar acessibilidade universal. A
acessibilidade democratiza a utilização dos espaços públicos,
permitindo que os mesmos sejam utilizados de forma igualitária
por qualquer pessoa, independentemente de suas condições
físicas.
Como exemplo de intervenção urbana, primando pelo
uso do espaço urbano de forma coletiva e assegurando a
qualidade da mobilidade e da acessibilidade, é possível citar a
intervenção como em CHEONGGYCHEON, na cidade de
SEUL, na CORÉIA DO SUL. Cheonggycheon consistiu na
retirada de 5,85 km (Figura 14) de vias para veículos
automotores, visando a revitalização do recurso hídrico do Rio
Cheonggycheon (Figura 15), a melhoria do espaço público
urbano que havia sido completamente deteriorado e segregado
pela existência das vias anteriores e do intenso fluxo de
veículos, assim como a melhoria da mobilidade urbana (ITDP /
EMBARQ).
36. 35
Figura 14: Extensão do Projeto
Fonte: ITDP / EMBARQ. Vida e morte das rodovias urbanas. São Paulo:
Fsc, 2013.
Figura 15: Revitalização do recurso hídrico
Fonte: ITDP / EMBARQ. Vida e morte das rodovias urbanas. São Paulo:
Fsc, 2013.
Além da impactante revitalização do rio, o projeto
buscou a facilidade de acesso para que o pedestre pudesse
livremente cruzar o recurso com a instalação de 22 pontes, de
atrativos, como jardins (Figura 16), fontes, o memorial da
história do rio, ente outros (ITDP / EMBARQ).
Figura 16: Atrativos do espaço público.
Fonte: http://s208.photobucket.com/user/ihcahieh/media/SEOUL%20-
%20Jongno-gu/37-Cheonggyecheon2.jpg.html. Acessado: 25/03/2015.
37. 36
No que diz respeito às propostas de mobilidade, em
vista da severa decisão de retirada das vias anteriores pela
substituição por um parque linear, foi necessária a
implementação de diretrizes da mobilidade que suprissem a
demanda existente. Assim, houve maciço investimento nos
transportes de massa, com o aumento da frota de ônibus para
a região, e a criação de ciclovias ao longo de todo o trajeto e
expansão da malha cicloviária da região (ITDP / EMBARQ).
Como no exemplo do Rio Cheonggycheon, foram
avaliados os impactos da retirada de uma via que possuía
largura entre 20 e 85 metros, que segregava completamente o
espaço da cidade, optando-se pela substituição da mesma por
um espaço público voltado ao lazer, ao pedestre e ao ciclista,
em vista da clara melhoria da qualidade de vida da comunidade
que ali residia e da que hoje frequenta (ITDP / EMBARQ).
Assim, é possível vislumbrar o quão influente é o
sistema de mobilidade e trânsito na ordenação da cidade e o
quanto são impactantes as suas decisões na concepção do
espaço urbano.
CAPÍTULO II – COMPREENDENDO A CICLOVIA
Como foi exposto no capítulo anterior, o presente
trabalho busca ater-se aos modais de transporte não
motorizados individuais, no caso: o deslocamento a pé e o uso
da bicicleta. Em virtude de presenciar nestes modais a
capacidade de contribuir com o melhor desempenho da
mobilidade urbana, fazendo uso de um meio de deslocamento
menos agressivo ao meio ambiente, viáveis financeiramente,
que permitem melhor proveito do espaço urbano de forma
dinâmica, além de configurar-se em uma atividade física,
cooperando com o bem-estar daqueles que os utilizam.
Assim, o presente capítulo busca explorar os aspectos
relevantes aos projetos cicloviários e os seus respectivos
impactos na mobilidade.
2.1 História
A necessidade de realizar deslocamentos e otimizar o
tempo delegado às atividades é estudada pela humanidade
desde os seus primórdios, estando presente desde a
38. 37
concepção da primeira carroça de tração por animais até a
mais engenhosa das tecnologias da atualidade. Assim, com a
bicicleta não foi diferente; em diversas datas da história,
existem relatos da tentativa de desenvolver o que seria o
protótipo da bicicleta que é conhecida hoje.
Data de 1817, desenvolvido pelo engenheiro agrônomo
e florestal, alemão, Barão Karl von Drais, o protótipo mais
similar ao idealizado de bicicleta hoje. Inúmeras alterações
foram feitas e aperfeiçoadas à medida que as necessidades
dos usuários apareciam.
A popularidade deste meio de transporte cresceu
exponencialmente no século XX, em que o hábito de pedalar
se popularizou com a criação de clubes sociais, principalmente
nos países Europeus, para promover passeios coletivos
(BUSTOS, 2006).
Em 1886, surge, então, o automóvel, porém permanece
com um ícone de luxo e de difícil manuseio, sendo ainda
impopular quanto ao uso do carro, estabelecendo uma
proporção de 20 bicicletas para cada 3 carros (FAHRRAD,
1994). Contudo, a disputa por espaço é constante nas vias,
completamente dominadas pelos ciclistas. Assim, é estudada
a necessidade de segregar o fluxo destes diferenciados modos
de transportes.
As primeiras vias especiais construídas para
ciclistas não seguiram diretrizes padronizadas ou
especificações do governo. Em Bremem,
Hamburgo e Lüneburg estas vias eram
inicialmente seções da rua que foram melhoradas
para os ciclistas. Nos arredores de Hanover e
Magdeburg, as ciclovias eram usadas para o
ciclismo recreacional e para fazer excursões.
Estas ciclovias foram construídas graças a
iniciativas próprias de clubes de ciclismo ou como
facilidades providenciadas pelo município.
(FAHRRAD, 1994)
No Brasil, o aparecimento das bicicletas se deu,
inicialmente, entre as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro,
no final do século XIX, como meio recreativo das classes mais
abastadas.
Contudo, o quadro social envolvendo a bicicleta mudou
severamente pós II Guerra Mundial, observado o modelo
capitalista que se afirmou, principalmente, no que se refere aos
39. 38
meios de transporte, e, assim, a bicicleta passou a ser
transporte da classe operária (BUSTOS, 2006).
Especificamente nos anos 50, durante o governo de
Juscelino Kubitschek, o automóvel ganhou forças, tanto
comercial, como nos investimentos de infraestrutura
necessárias para ele, descartando cada vez mais o papel de
importância das bicicletas (BUSTOS, 2006).
Apesar do evidente desprestígio vivenciado pelas
bicicletas nos anos 50, a mesma não entrou em desuso e teve
seu foco de recreação direcionado para o uso de
deslocamentos de trabalhos e atividades cotidianas.
Implicando, em 1977, a cidade de Maceió como pioneira no
estabelecimento de um plano cicloviário, e no ano seguinte na
cidade de Belém (MENDONÇA; SILVA; SILVA; HANAGUSKU,
2011).
Apesar de seguir no caminho contrário dos parâmetros
Europeus, que permaneceram com os investimentos
constantes no modo de transporte cicloviário, atualmente
inúmeras cidades brasileiras têm buscado reaver essa
condição de transporte, investido em ciclovias, parques
urbanos e buscando diversificar o uso dos modos de
transportes. O Brasil conta com uma estimativa de 65 milhões
de unidades, segundo ABRACICLO, em 2007, colocando o
Brasil como quinto colocado na frota de bicicletas, perdendo
apenas China, Estados Unidos, Índia e Japão.
(CHAPADEIROS; ANTUNES, 2012)
2.2 Estrutura
As bicicletas popularizaram-se essencialmente pela sua
simplicidade, e atravessaram a história até os dias de hoje.
Contudo, como foi presenciado, o crescimento de outros
modais de transporte implicou na real necessidade de delegar
espaços segregados aos modais de transporte, restringindo
sempre que possível o contato desses modais.
No seguinte item, por sua vez, será estudado a estrutura
necessária para o modal de transporte da bicicleta, bem como
as suas implicações na infraestrutura.
Segundo Fernando Camargo Chapadeiro e Luiza
Lemos Antunes (2012), o sistema cicloviário é dotado de
componentes interligados: bicicletas, vias e
estacionamentos. Porém, o presente estudo adiciona
40. 39
também a esses componentes o cruzamento, sendo local de
principal interação entre os modais de transportes e,
consequentemente, local de acidentes.
Bicicleta
A bicicleta consiste no modal de deslocamento por
tração humana.
Bicicleta (é). [Do fr. Bicyclette.]S. f. 1. Veículo
constituído por um quadro (20), montado em duas
rodas, ordinariamente grandes, alinhadas uma
atrás da outra e com raios metálicos, e que é
dotada de selim e manobrada por guidom e
pedais. [...]
(FERREIRA, 1999, p. 296)
Vias
A via compreende o espaço destinado à circulação.
Entretanto, a via é essencialmente segregada na pista de
rolamento a qual é destinada aos veículos de transporte
motorizados e aos passeios que são reservados ao pedestre.
Enquanto o ciclista, por vezes, disputa o espaço entre os
automóveis, na pista de rolamento, ou é obrigado a invadir o
espaço do pedestre, primando por maior segurança de
deslocamento. Conforme expresso no Código de Trânsito
Brasileiro - Lei 9503/97 | Lei nº 9.503, de 23 de setembro de
1997, Art. 58, o compartilhamento das vias entre os automóveis
e os ciclistas acontecerão sempre que inexistente espaço
especificamente destinado ao ciclista.
Art. 58. Nas vias urbanas e nas rurais de pista
dupla, a circulação de bicicletas deverá ocorrer,
quando não houver ciclovia, ciclofaixa, ou
acostamento, ou quando não for possível a
utilização destes, nos bordos da pista de
rolamento, no mesmo sentido de circulação
regulamentado para a via, com preferência sobre
os veículos automotores.
(Código de Trânsito Brasileiro, Lei nº 9.503, de 23
de setembro de 1997.)
Assim, é possível caracterizar as tipologias de ruas que
permitem o deslocamento do ciclista (CHAPADEIRO;
ANTUNES, 2012)
41. 40
Via ciclável: Como o próprio nome sugere, são
essencialmente as vias pelas quais é possível o ciclista
deslocar-se. De forma geral, essas vias devem ter caráter local
e serem continuação de ciclovias e/ou ciclo faixas,
entendendo-se que haja uma continuidade de fluxo entre elas.
Ciclo faixa: Não demanda de grandes estruturas físicas, mas
carece de sinalização para reservar um espaço na pista de
rolamento destinado ao pedestre. Geralmente, essa
sinalização é feita com indicação no piso, nas extremidades
laterais da rua. É uma solução viável financeiramente para a
separação das bicicletas dos demais modais de transporte,
porém vale ressaltar que essa medida deve ser avaliada,
considerando se condiz com o fluxo da via na qual a mesma
será implantada, em vista de ser inadequada para vias de fluxo
intenso e grandes cruzamentos, haja vista que favoreceria a
ocorrência de acidentes.
Ciclovia: Configura-se na opção mais viável para vias de fluxo
intenso, pois consiste em um espaço específico, com
demarcação física delegada ao ciclista, sendo a opção mais
segura e organizada (Figura 17).
Figura 17: Esquema de sistema cicloviário.
Fonte: Produzido pela autora.
Cruzamento:
Os cruzamentos são, de forma geral, locais onde
ocorrem o maior número de acidentes, em virtude de o ciclista
estar resguardado durante maior parte do percurso, seja na
ciclovia ou na ciclo faixa. Contudo, é no cruzamento que haverá
uma interseção inevitável dos automóveis com a bicicleta,
gerando conflito de interesses e, ocasionalmente, acidentes
(Figura 18).
42. 41
Figura 18: Esquema de conflito de cruzamento.
Fonte: Produzido pela autora.
O cruzamento das vias que envolve pedestres, ciclistas
e automóveis é amplamente discutido no mundo inteiro e
importantes intervenções estão em vigor principalmente na
Holanda, uma das maiores referências no que diz respeito a
mobilidade urbana (Figura 19).
Figura 19: Esquema de cruzamento holandês.
Fonte: Fonte: bragaciclavel.blogspot.com.br/2012/05/cruzamentos-
seguros-em-ruas-com.html. Acessado: 27/03/2015. Adaptado pela
autora.
As políticas holandesas de trânsito primam pelo
deslocamento dos ciclistas com total segurança, de forma que
foi detectado que os cruzamentos necessitavam de maior
visibilidade dos automóveis em relação aos ciclistas. Assim
43. 42
como foi detectada a necessidade de elementos de proteção,
que impeçam esse evidente confronto de interesse no
deslocamento de ambos os modais (DOMINGOS, 2012).
Embasado na qualidade e segurança dos cruzamentos
holandeses, Nick Falbo, urbanista norte-americano, também
propôs uma intervenção nos cruzamentos das vias
americanas, tendo também como prioridade a segurança e a
visibilidade do cruzamento, partindo do conceito holandês de
cruzamentos seguros (Figura 20). Neste desenho urbano, Nick
Falbo destaca, principalmente, os generosos passeios e o
espaço de estacionamento nas vias, que permitem estender o
elemento de proteção para a circulação do ciclista no
cruzamento. Além da estrutura física necessária para a
garantia de segurança do ciclista, é de suma importância a
utilização de semáforo para ciclistas e pedestres, aumentando
a segurança no deslocamento e permitindo, por exemplo, que
o ciclista realize a manobra descrita na figura 21, possibilitando
ao ciclista alcançar todas as extremidades do cruzamento de
forma rápida e segura (Figura 22).
Figura 20: Percursos do ciclista.
Fonte: http://www.protectedintersection.com/. Acessado: 27/03/2015.
Figura 21: Percursos do ciclista.
Fonte: http://www.protectedintersection.com/. Acessado: 27/03/2015.
44. 43
Figura 22: Modelo de Cruzamento Nick Falbo.01. Vista Geral do
Cruzamento. 02. Evidenciar o elemento de proteção para o ciclista.
Fonte: http://www.protectedintersection.com/. Acessado: 27/03/2015.
O desenho urbano é peça chave nessas intervenções, e
podem assumir as mais variadas propostas, sendo passíveis
de adaptações a diversas realidades.
Estacionamentos
Assim como no caso dos veículos automotivos, também
existe a necessidade de previsão de locais de estacionamentos
específicos para os ciclistas, os quais necessitam de
segurança e fácil acesso.
Os estacionamentos para ciclistas podem ser
compactos e fazerem parte do mobiliário urbano, como são os
casos dos Paraciclos, que atendem um número menor que os
bicicletários, mas são de fácil acesso, proporcionam segurança
e um apoio para o ciclista que pode ser implementado em
diversos locais (Figura 23). Os paraciclos dispensam grandes
estruturas e podem ser adaptados a edificações já existem sem
maiores agressões ao espaço.
Os paraciclos fazem uso de designers diferenciados e,
muitas vezes, promovem a criação da identidade visual do
lugar no qual estão inseridos. O parklet também compartilha
deste conceito, pois configura-se em uma vaga de carro, a
45. 44
sendo a mesma retirada para a promoção de um espaço
destinado ao lazer e ao conforto do pedestre e do ciclista. “Os
“parklets” foram criados em São Francisco, nos Estados
Unidos, e surgiram como forma de converter o espaço de
estacionamento de automóvel na via pública em área
recreativa temporária. ” (LIVRE, 2014), (Figura 24) (Figura 25)
(Figura 26).
Figura 23: Paraciclo do bairro Waterloo, da cidade de Londres.
Fonte:https://pedalasantista.wordpress.com/2012/06/20/paraciclo-
original/. Acessado: 27/03/2015
Figura 24: Parklet de São Francisco.
Fonte: http://pavementtoparks.sfplanning.org//divisadero_parklet.html.
Acessado: 27/03/2015
Figura 25: Parklet no espaço urbano
Fonte:http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/infografico-parklets/.
Acessado: 27/03/2015.
46. 45
Figura 26: Esquema de implantação de Parklet.
Fonte:http://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/infografico-parklets/.
Acessado: 27/03/2015.
Como uma opção mais elaborada para estacionamentos
de bicicletas, com estruturas permanentes, que permitem
melhor apoio estão os Bicicletários, que em sua maioria
abrigam também locais para calibrar os pneus e beber água,
por exemplo.
Como uma das grandes referências de aproveitamento
de espaço para uso de Bicicletário está o BicycleStorage,
localizado em Amsterdam, idealizado pelo escritório holandês
VMX de Don Murphy e Leon Teunissen.
O projeto data de 1998-1999, tendo sido executado
somente em 2000-2001, o Bicicletário é construído sob o Cais
dos Amantes, com capacidade de cerca de 2.500 bicicletas,
ocupando 3 mil metros quadrados (Figura 26).
Figura 27: Bicicletário, BicycleStorage - capacidade e dimensões,
Amsterdam.
Fonte:arquiteturascontemporaneas.wordpress.com/2012/06/12/amsterda
m-bicycle-storage-designed-by-vmx-don-murphy-e-leon-teunissen-lorena-
e-rafael/. Acessado: 27/03/2015.
É importante ressaltar que, no item exposto, são
caracterizados alguns dos importantes elementos que
compõem a ciclovia. Todavia, a implantação de um projeto
cicloviário em um dado local implica em peculiaridades de cada
local, as quais são passíveis de análise específica.
47. 46
CAPÍTULO III – ESTUDO DE CICLOVIAS EM:
AMSTERDAM, COPENHAGEN E SÃO PAULO.
Como pôde ser presenciado anteriormente, cada cidade
é dotada de especificidades que influenciam diretamente sua
mobilidade urbana. Com base nisso, é preciso compreender as
motivações de importantes projetos voltados para a mobilidade
urbana em grandes cidades.
Os casos estudados neste capítulo foram escolhidos por
apresentarem projetos voltados a pedestres e ciclistas. A
análise dos projetos visa expor casos internacionais
desenvolvidos nas cidades Europeias: Amsterdam e
Copenhagen, e como estudo de caso nacional: São Paulo.
Amsterdam e Copenhagen configuram-se como
grandes ícones no que diz respeito a projetos de cidades
sustentáveis e com mobilidade voltada para pedestres e
ciclistas. Enquanto que a cidade de São Paulo apresenta,
atualmente, no cenário nacional, exigências do uso da bicicleta
como meio de transporte fundamental aos deslocamentos
urbanos e uma mudança na concepção urbana das cidades
brasileiras.
3.1. Amsterdam
A capital da Holanda é considerada referência mundial
em planejamento e mobilidade urbana. Contudo, deve-se
compreender o que desencadeou essa preocupação e cautela
com o crescimento da cidade e seus impactos. Assim, será
exposta brevemente a história de Amsterdam e do seu traçado
urbano, bem como os posicionamentos dessa cidade no diz
respeito à mobilidade (MOIÓLI, 2013) (Figura 28).
A cidade de Amsterdam tem seu surgimento
diretamente relacionado aos recursos hídricos que se
encontram no local de fundação e foram peça chave na sua
conformação urbana. A cidade começou a tomar forma
efetivamente no ano 1000, com a iniciativa de colonizadores
que recorreram ao processo de criação de canais, buscando a
drenagem do solo pantanoso, para que viabilizasse a
construção. Segundo, Fred Feddes (Apud MOIÓLI, 2013),
jornalista e especialista em planejamento urbano "A água não
foi nem uma escolha nem uma virtude para os moradores. Ela
estava lá desde o começo”.
49. 48
Em virtude das condições climáticas e da qualidade do
solo, de forma geral, os países baixos tiveram seu
desenvolvimento voltado ao comércio. No caso da cidade de
Amsterdam não foi diferente; o solo alagado impossibilitava o
desenvolvimento agrícola, logo o investimento nos canais
navegáveis no interior da cidade se intensificou permitindo o
constante fluxo de mercadorias.
Assim, por volta de 1585, a cidade iniciou um severo
processo de adensamento, de forma que as singelas estruturas
medievais e as próprias muralhas que limitavam o terreno não
possuíam mais capacidade para abrigar devidamente a
população (Figura 29).
Figura 29: Ilustração da cidade de Amsterdam
Fonte: http://guiadoestudante.abril.com.br/aventuras-historia/conheca-
historia-conjunto-canais-amsterda-748826.shtml. Acessado: 08/04/2015
Em 1585, havia ali 30 mil habitantes. Um século
depois, o número chegaria aos 200 mil. Subúrbios
ilegais brotavam nos entornos da muralha que
cercava a cidade, um perigo para a segurança
local.
(MOIÓLI, 2013)
Diante deste quadro de adensamento populacional, em
1610, foi solicitado ao arquiteto, Hendrick Jacobsz Staets, o
planejamento urbano da cidade, o qual estabeleceu a estrutura
dos canais da cidade como partido principal para a
estruturação da cidade (Figura 30).
Contudo, o processo de urbanização, embasado na
abertura de canais ao longo da cidade, promoveu a
segregação dos espaços e a valorização de determinadas
regiões da cidade em detrimento de outras, criando locais de
intenso adensamento, contrastando com locais vazios, que
findavam em jardins (MOIÓLI, 2013).
Apesar da evidente importância dos canais para
Amsterdam, foram os mesmos que iniciaram um severo
processo de degradação da cidade. A situação urbana da
50. 49
cidade não foi favorável durante períodos entre guerras
mundiais, devido a ineficiência da cidade no aspecto militar.
Figura 30: Ilustração dos canais de Amsterdam
Fonte: http://guiadoestudante.abril.com.br/aventuras-historia/conheca-
historia-conjunto-canais-amsterda-748826.shtml. Acessado: 08/04/2015
Além das guerras, o período pós-guerra, 1945, pintava
um quadro de destruição na cidade holandesa, que
posteriormente teve sua situação agravada durante o início do
século 20, com uma epidemia de cólera (MOIÓLI, 2013).
Diante desta perspectiva, a necessidade de reerguer a
cidade era eminente e, após a Segunda Guerra Mundial,
Amsterdam passou por um processo de crescimento
econômico acelerado, o que permitiu a reconstrução da cidade
e o aumento do poder aquisitivo dos moradores (HOPPEN,
2011).
Como principal consequência deste processo
econômico pós Segunda Guerra Mundial, Amsterdam, assim
como muitas outras cidades do mundo, experimentava um
novo elemento no seu cenário urbano, o automóvel. A cidade
estava em fase de reconstrução e os moradores com mais
recursos financeiros, para novos investimentos.
Assim, em 1957, Amsterdam estava com suas ruas, de
estreitas e com reflexos dos seus tempos medievais,
abarrotadas de automóveis (HOPPEN, 2011).
Essa evidente incompatibilidade da estrutura da cidade
com o uso intenso dos automóveis cominou na destruição de
51. 50
muitos edifícios para aberturas de vias e na utilização de
parques e praças como estacionamentos (HOPPEN, 2011).
O uso dos automóveis permitiu uma reviravolta nas
distâncias realizadas. Contudo, a estrutura viária sufocou os
espaços destinados aos ciclistas e pedestres, resultando em
cerca de 3.300 mortas, somente no ano de 1951, das quais 400
eram crianças de até 14 anos (HOPPEN, 2011).
Logo, a população reivindicou uma revisão dos
caminhos que a mobilidade da cidade trilhava; as ruas haviam
se tornado inacessível para os pedestres. Em consonância
com a pressão popular, em 1973, o mundo enfrentava um
quadro de crise do fornecimento do petróleo. Com base nisso,
nos anos 70, o primeiro ministro holandês, Joopden Uyl,
impulsionou em toda a Holanda políticas de supressão do uso
do carro.
Dentre as medidas tomadas, houve a proibição de
estacionamento ao longo de importantes pontos da cidade, a
proibição do uso dos carros aos domingos, os centros das
cidades foram fechados permanentemente para os carros, e o
incentivo ao uso das bicicletas como principal modo de
deslocamento individual incentivado (HOPPEN, 2011).
Financiado pelo governo federal holandês, a política de
mobilidade urbana das cidades passou a ser completamente
voltada para os ciclistas e pedestres, promovendo severas
revisões nas estruturas urbanas. A criação de ciclovias que
permitisse o conforto e o deslocamento seguro, assim como
ciclofaixas que permitissem a continuidade desse
deslocamento nas ruas de pequeno porte.
A partir dessa iniciativa, o panorama de deslocamento
presenciado em Amsterdam é prioritariamente realizado por
transporte público e bicicleta (HOPPEN, 2011).
Hoje a divisão modal da cidade é: 36% das
viagens são feitas de transporte público, 33% são
de carro, 27% de bicicletas e 4% a pé. “Se
conseguirmos manter o uso do carro nesse nível
já ficaremos bem felizes”, explica FokkoKuik,
secretário de transportes.
(GARCIA, 2011)
No que diz respeito ao projeto cicloviário de Amsterdam,
o mesmo é dotado de peculiaridades. Diferentemente de
inúmeras outras cidades, nas quais este modal está presente,
com ciclovias anexas e paralelas às vias de automóveis, em
52. 51
Amsterdam essa realidade é diferente, as vias cicláveis não
necessariamente seguem um traçado rigidamente paralelo ao
da via do automóvel; ao contrário, são curvilíneas, flexíveis,
variam e permitem maior facilidade de acesso aos serviços das
calçadas. Essa conformação não padrão das vias se dá em
virtude de a prioridade de deslocamento ser completamente
dada ao ciclista, permitindo maior conforto de acesso aos
interesses do mesmo, assim como a sua segurança.
O trânsito nas vias é diferenciado de acordo com suas
atividades de forma que o acesso do carro é restrito em
determinadas situações; assim como o transporte público,
permitindo somente o deslocamento de pedestres (ABRAHÃO,
2014).
Amsterdam inicia o plano de mobilidade urbana da
cidade com previsão de conclusão de suas metas em 2025. A
elaboração do plano local de mobilidade se deu a partir da
integração das secretarias de Transportes, de Habitação e de
Meio Ambiente. Dentre as principais determinações deste
plano, constam o levantamento dos usos das vias urbanas e
quais as melhores alternativas para deslocamento nelas,
restringindo o uso de determinados modais de acordo com a
especificidade desta via (ABRAHÃO, 2014).
A partir dos esforços realizados pela prefeitura, foi
possível constatar que cerca de um terço das viagens é feito
por carro, enquanto 36% são feitos por transporte público, 27%
por bicicletas e 4% a pé. Os esforços do projeto concentram-
se na ampliação da rede cicloviária, de forma que as existentes
não sofreram maiores alterações (Figura 31) (ABRAHÃO,
2014).
Figura 31: Divisão Modal de todas as viagens em Amsterdam.
Fonte: Abrahão, 2014. Gráfico produzido pela Autora.
Acesso: 12/04/2015
36%
33%
27%
4%
Ônibus e Trem Automóvel Bicicleta À pé
53. 52
A prioridade dada ao planejamento urbano na cidade de
Amsterdam foi imprescindível ferramenta para lidar com as
adversidades naturais que o relevo e o clima impuseram ao
longo dos anos na morfologia da cidade. E, diante do breve
estudo realizado neste item, foi possível constatar a
importância dos impactos do sistema de mobilidade urbano
nesse processo de desenvolvimento da cidade, de forma que
o mesmo é fator indispensável à manutenção da prioridade do
homem como grande utilizador do espaço, assim na qualidade
de vida do meio urbano.
Assim, Amsterdam configura seu espaço urbano voltado
às pessoas que usufruem dele; garantindo acessibilidade,
alternativas de deslocamentos que atendam a uma
diversificada faixa da população, promovendo segurança e
acessos igualitários aos espaços urbanos.
3.2. Copenhagen
É interessante compreender o avanço das cidades
europeias no que tange às discussões de mobilidade urbana,
em vistas do adensamento das cidades em proporção à sua
limitada extensão. Essa realidade é presente em inúmeros
países do continente e as mais variadas soluções podem ser
observadas.
Sob essa perspectiva do cenário europeu, o presente
item busca estudar a cidade de Copenhagen, a qual desponta
dentre as demais no quesito sustentabilidade e planejamento.
A cidade de Copenhagen encontra-se na Dinamarca; a
população da cidade é de 559.440 habitantes (ARAÚJO,
2013).
A cidade é referência em qualidade de vida no que se
refere a planejamento urbano, mobilidade, saúde, consciência
ecológica, educação e cultura. É também a maior cidade em
extensão territorial da Dinamarca, ainda que presente no
interior dela uma região de enclave, ou seja, cidade que tem
seus limites no interior de outra cidade, assim como pode ser
observado na situação geográfica do Vaticano (Figura 32).
55. 54
Historicamente, assim como Amsterdam, a cultura da
bicicleta como principal meio de deslocamento já se fazia
presente na cidade dinamarquesa (Figura 33).
Figura 33: Década de 30 e o uso das bicicletas Fonte:
www.youtube.com/watch?v=2g0aghfjxag. Acesso: 13/04/2015
Contudo, em torno de 1950, o traçado da cidade é
reformulado em vista do surgimento do automóvel, o qual
suprimiu o espaço do tráfego que era de uso das bicicletas
(Figura 34).
Todavia, como experimentado por Amsterdam e
exposto anteriormente, o impacto da crise do petróleo de 1973
impulsionou a população, que vivia, e ainda vive, sob grandes
valores de impostos, a exigir uma resposta do poder público,
fato este que movimentou as forças governamentais em
políticas sustentáveis (GARCIA, 2011).
Figura 34: Década de 50 e o uso dos automóveis.
Fonte: www.youtube.com/watch?v=2g0aghfjxag. Acesso: 13/04/2015
O uso em larga escala da bicicleta emergiu como um
plano de redução do uso dos combustíveis fósseis e uma
alternativa ecologicamente viável para o pleno funcionamento
do espaço urbano de Copenhagen.
O forte incentivo a um modelo urbano sustentável
estabeleceu como principal pilar para seu funcionamento a
56. 55
produção de energias renováveis e políticas de mobilidade
urbana voltadas para pedestres e ciclistas.
Copenhagen assumiu como meta tornar-se a cidade
verde do mundo, além de melhor cidade para ciclistas,
ganhando vários prêmios internacionais e conquistando título
de uma das melhores cidades para se viver no mundo
(ARAÚJO, 2013).
Ao longo dos anos, Copenhagen direcionou suas
políticas públicas em torno de manter tal título:
1. No ano de 2004, as primeiras estratégias de
sustentabilidade foram com o Plano Ambiental e o de
Transportes.
2. Em 2009, pelo Plano de Mudanças Climáticas de
Copenhagen e o pelo Plano de Gestão de Resíduos.
3. Posteriormente, em 2011, as medidas são voltadas a
natureza com o plano “Espaço para a Natureza – Uma
Estratégia para a Biodiversidade”, um plano de criação
e revitalização de áreas verdes existente na cidade
(ARAÚJO, 2013).
No que diz respeito ao sistema cicloviário, o foco da
cidade foi direcionado a propor espaços de conforto e de
segurança para as pessoas que optassem pela bicicleta como
meio de deslocamento.
O custo de manutenção do sistema viário voltado aos
automóveis era oneroso ao poder público, nos mais variados
aspectos. Os principais custos que envolvem diretamente o
sistema viário são: reformas e manutenção da qualidade das
vias, acidentes de trânsito e responsabilidades da saúde
pública, expansão da malha viária, indenizações para abertura
de novas vias, demolição e prejuízo ao patrimônio histórico e
cultural da cidade, entre outros (GARCIA, 2011).
Ao longo desses anos de investimento em planejamento
sustentável e políticas de mobilidade urbana concederam à
cidade o título de “Cidade Verde” (Figura 35) e reconhecimento
internacional das suas iniciativas de desenvolvimento
ecologicamente correto, configurando-se em referência para
inúmeros outros países.
57. 56
Figura 35: Premiações da cidade de Copenhagen.
Fonte:http://www.pensamentoverde.com.br/cidades-
sustentaveis/copenhagen-cidade-locomove-rodas/. Acesso: 21/04/2015
Além do reconhecimento e da premiação internacional,
os impactos positivos desse posicionamento de planejamento
estão presentes, principalmente, no tocante a temática da
mobilidade e dos deslocamentos na cidade (Figura 36) (Figura
37):
Figura 36: Sistema Viário Copenhagen.Fonte:
www.cidadessustentaveis.org.br/boas-praticas/copenhagen-capital-verde-
europeia-201.Adaptado pela Autora. Acesso: 13/04/2015
SISTEMA VIÁRIO
• Ciclovias em relação ao número total de habitantes da cidade
(dados computados até outubro de 2010. As pistas de uso
misto não são calculadas pela administração local):
1. 346 km pistas com separação física, ou seja, 0,64 m por
habitante;
2. 23 km sinalizados e só para ciclistas, ou seja, 0,04 m
por habitante;
3. 42 km de ciclovias verdes, ou seja, 0,08 m por
habitante;
• 98% dos Cidadãos de Copenhagen moram a menos de 350m
de transportes públicos (que passa a cada hora ou com mais
frequência);
• Para as linhas de alta-frequência (metrô, trem e ônibus): 78%
mora a menos de 350 m e 94%, a menos de 600 m;
• 58% de todas as viagens de menos de 5 km são realizadas de
bicicleta;
• Só 12% de todas as viagens de menos de 5 km são realizadas
de carro;
58. 57
Figura 37: Divisão Modal de todas as viagens para o trabalho ou
escola/universidade na cidade de Copenhagen (2010).
Fonte: www.cidadessustentaveis.org.br/boas-praticas/copenhagen-
capital-verde-europeia-201.Gráfico produzido pela Autora. Acesso:
13/04/2015
Assim como presenciado na cidade de Amsterdam, a
valorização dos espaços urbanos voltados à qualidade de
deslocamento e realização de atividades dos transeuntes nas
vias é sobreposto, por exemplo, ao deslocamento realizado
com automóvel. Essa importante característica de prioridade
ao indivíduo como principal agente modelador do espaço
urbano é que confere essa conformação diferenciada a estas
cidades.
De forma que, como pode ser observado no breve
estudo dessas duas cidades, o automóvel é condicionado
como uma das possibilidades de deslocamento dentro da
cidade e não como o principal. Sendo assim, a gama de
alternativas e qualidades desses modais configuram peça
chave na concepção desse sistema de mobilidade urbana.
Proporcionar qualidade, segurança e conforto no
deslocamento dos diferentes modais propostos desestimula o
uso do automóvel e permite maior liberdade do uso do espaço
urbano (Figura 38).
Figura 38: Capacidade dos modos de transporte.
Fonte:http://bhemciclo.org/pessoas-onibus-bicicletas-e-carros/. Acesso:
21/04/2015.
26%
32%
35%
7%
Automóvel Ônibus e trem Bicicleta À pé:
59. 58
3.2. São Paulo
Após observar as diversificadas soluções propostas em
importantes potências da temática da mobilidade urbana, como
Amsterdam e Copenhagen é importante analisar a abordagem
da mesma, na escala nacional. Em virtude disso o seguinte
item busca explorar o caso da ciclovia e os impactos da
mobilidade urbana na cidade de São Paulo capital (Figura 39).
60. 59
Diferentemente das cidades europeias, em que a
bicicleta ocupou, historicamente, um importante destaque no
que se refere aos deslocamentos. Em São Paulo, o uso da
bicicleta teve seu uso inicialmente associado ao lazer e à
recreação.
Era inexistente uma via especifica para o uso de
bicicleta e as mesmas disputavam espaço junto às vias para
automóveis. Em virtude disso, o uso das bicicletas era restrito
e limitado a espaços específicos de lazer, como praças e
parques (MALATESTA, 2012).
O seu destaque maior surgiu nos anos 80, com as
dificuldades da crise do petróleo vivenciada pelo mundo todo,
que permitiram uma maior visibilidade do uso da bicicleta como
deslocamento funcional e diário, não tão somente lazer.
Ainda nos anos 80, com os esforços do Ministério dos
Transportes e pelo Grupo Executivo para a Integração da
Política de Transportes - GEIPOT, iniciaram-se os estudos de
viabilização da implantação de um sistema cicloviário na
cidade de São Paulo (MALATESTA, 2012).
O trecho selecionado para intervenção configurava-se
em um importante trecho de deslocamento e lazer que ligaria
o Parque do Ibirapuera à Cidade Universitária, totalizando
7,7km (Figura 40). No projeto estavam previstos três paraciclos
nos canteiros centrais. Porém, o projeto em questão, apesar de
sofrer adaptações em 1994, não foi efetuado (MALATESTA,
2012).
Figura 40: Croqui do estudo piloto da ciclovia Parque do Ibirapuera –
Cidade Universitária.
Fonte: (MALATESTA, 2012) p. 15.
Também na década de 80, mais precisamente em
fevereiro de 1981, deu-se o primeiro plano de sistema
cicloviário em setores da cidade de São Paulo. Esse plano
previa a setorização da cidade, independente do limite dos
bairros. Internamente, cada setor foi articulado viabilizando o
uso da bicicleta. Por fim é estabelecida a relação das
articulações dos setores entre si, permitindo que o
61. 60
deslocamento realizado pelo ciclista exceda inclusive a
distância prevista no projeto de 8 km (MALATESTA, 2012).
Inúmeros fatores foram determinantes na seleção do
percurso ciclístico no interior dos setores, dentre eles:
viabilidade física e topografia do terreno, interesses locais e
atividades adjacentes, demanda de uso, fluidez e tipologia do
tráfego motorizado nas vias, além de conciliar esses percursos
com o Plano de novas vias, o qual permitia adequar o uso do
canteiro central ao espaço da ciclovia (MALATESTA, 2012).
O projeto contava com 14 setores, que se estendiam ao
longo do município, totalizando cerca de 174 km (Figura 41)
(MALATESTA, 2012).
Apesar da abrangência e da busca para atender de
forma geral à população, o plano cicloviário nunca foi
completamente executado, tendo possuído apenas pequenos
trechos executados ao longo dos anos de 1995 e 1996.
Atualmente, alguns desses trechos ainda demandam
infraestrutura para uso de bicicletas e constam no plano da
prefeitura de São Paulo (MALATESTA, 2012).
Figura 41: Setorização do Sistema Cicloviário de São Paulo.
Fonte: (MALATESTA, 2012) p. 18.
Ainda em maio de 1994, mais uma proposta é lançada
ao sistema viário de São Paulo. A proposta era destinada não
aos setores, mas aos trechos da cidade que já eram de uso
constante dos ciclistas, totalizando 110 km (MALATESTA,
2012).
O projeto buscava ao máximo a interação das ciclovias
com os espaços de interesses paisagísticos e de lazer,
promovendo um trajeto mais agradável. Dentre as intervenções
propostas, foram implantadas: Ciclovia do Jd.Luzitânia, junto
ao Parque do Ibirapuera, Ciclovia Sumaré, ao longo da Av.
Sumaré e Ciclovia Faria Lima, em trecho da Av. Brigadeiro
Faria Lima (MALATESTA, 2012).
62. 61
No decorrer dos anos 90, houveram revisões e novas
propostas de projetos cicloviários para a cidade, entretanto em
sua maioria eram tão somente implantados por trechos
(MALATESTA, 2012).
A partir dos anos 2000 sobressaiu a necessidade de
uma resposta aos questionamentos de sustentabilidade e de
preservação do meio ambiente. Esse quadro geral de
preocupações culminou para que em 2005, a Prefeitura do
Município de São Paulo, em parceria com a iniciativa do Ar
Limpo para América Latina, promovesse um plano para a
redução dos gases do efeito estufa (MALATESTA, 2012).
Dentre as principais iniciativas desse plano, a melhoria
do transporte público, assim como a viabilização de sistema
cicloviário, encabeçava o plano. Dentre as principais medidas
do projeto cicloviário, constava, além da implantação de
circuito para ciclistas, a presença da inserção de bicicletários
nos principais pontos de integração de modos de transporte de
massa na cidade, tais como: terminais rodoviários e estações
metroviárias (MALATESTA, 2012).
A proposta buscava abranger diferentes segmentos da
cidade e conciliar trechos de ciclovias, ciclofaixas e áreas de
espaços compartilhados, totalizando 104 km de circuito no
projeto (Figura 42)
Figura 42: Intervenções de projeto cicloviário 2005.
Fonte: (MALATESTA, 2012) p. 40.
Contudo, novamente apenas trechos do projeto foram
efetivamente implantados, contando, inclusive, com uma
proposta que chegou a ser parcialmente implantada no
acostamento da Estrada da Colônia, em Parelheiros, com 1,7
km, que findou por ser desativada por solicitação da população
em 2011, em virtude de incoerências no projeto.
É complexo avaliar os impactos do sistema cicloviário da
cidade de São Paulo, tendo em vista que o mesmo sofreu
rupturas e constantes intervenções desvinculadas ao longo de
suas execuções. Todavia, diante das implantações de
importantes corredores de circulação na cidade, ocorreu o
63. 62
consequente aumento do uso das bicicletas como modal de
transporte (ALCORTA, 2015).
A implantação de um sistema cicloviário em cidades tão
adensadas e motorizadas, como São Paulo, além de configurar
uma longa proposta de intervenção urbana, diverge
diretamente com o padrão econômico que a cidade adotou.
São Paulo encontra-se, desde 2008, ano da iniciativa de
redução do IPI sobre compra de automóveis, com o aumento
gritante das frotas de carros circulando nas vias e contribuindo
prioritariamente para o colapso da mobilidade urbana
Essa postura econômica que marginaliza o uso da
bicicleta e populariza o tráfego do carro é principal fator
desencorajador para a ampliação das ciclo rotas ao longo de
diversificados bairros. Tal posicionamento compromete o
principal ideal de deslocamento pretendido para as bicicletas,
nos grandes centros urbanos, que seriam percorrer distâncias
locais e interligar terminais de transportes de massa,
dispensando o uso do carro em deslocamentos de distância
mínima (ALCORTA, 2015).
Apesar do evidente preconceito presenciado no que diz
respeito aos deslocamentos de bicicletas na cidade, hoje São
Paulo conta com diferentes tipologias de ciclistas (ALCORTA,
2015).
1 - A dos trabalhadores ciclistas de periferia que
são praticamente invisíveis até para as
autoridades, incluindo as de trânsito, por que
entram muito cedo no trabalho, portanto circulam
fora do horário de pico;
2 - A massa dos ciclistas de fim de semana que
pedalam por lazer ou esporte que até pouco eram
os socialmente mais visíveis;
3 - E a novidade dos ciclistas da classe média que
hoje chamam muito a atenção.
(ALCORTA, 2015)
Apesar das aparentes dificuldades do uso das bicicletas,
da marginalização, da dificuldade pública de concretização dos
projetos e da insegurança; assim como o experimentado pelas
duas cidades de estudo de caso anteriores, Amsterdam e
Copenhagen, a situação de mobilidade da cidade de São Paulo
encontra-se insustentável e a população vai de encontro a
todas essas dificuldades.
O uso da bicicleta na cidade de São Paulo tem crescido
ao longo dos anos, atingindo um aumento de 50% na frota de
64. 63
bicicletas que circulam na cidade 2014 (VALLE, 2014). A
pesquisa divulgada pelo Ibope- Instituto Brasileiro de Opinião
e Estatística, revela que a cidade de São Paulo ganhou cerca
de 86,1 mil novas bicicletas trafegando na cidade em
comparação ao ano de 2013, totalizando 261 mil bicicletas
(VALLE, 2014).
O consequente aumento dessa frota de ciclistas
desencadeou uma maior exigência, por parte dos mesmos, por
melhores condições de tráfego na cidade. O poder público
paulista vivencia o ativismo político dos ciclistas e as
necessidades de reformas no planejamento de mobilidade
urbana da cidade.
Como exemplo dessas exigências, em 21 de setembro,
2011, a Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio
Ambiente da Câmara Municipal de São Paulo realizou uma
audiência aberta, com a participação pública para tratar do
projeto de lei 655/2009, do vereador Chico Macena (PT), cujo
objetivo era acrescentar itens relevantes à Lei nº 14.266, de 6
de fevereiro de 2007. A Lei trata da criação do Sistema
Cicloviário do Município de São Paulo.
Dentre as principais considerações levantadas no
evento constam:
- Permissão por lei de transporte de bicicletas
dobráveis em trem, metrô e ônibus;
- Convênios com municípios vizinhos na
implantação de projetos de melhoramentos
cicloviários criando ciclovias intermunicipais;
- Ampliação de locais e estabelecimentos que
devem prever áreas para estacionamentos de
bicicletas;
- Criação do Conselho Municipal de Política
Cicloviária, composto pelos membros do atual
Pró-Ciclista, associações representativas e
sociedade civil organizada, de forma deliberativa;
(REVISTA ÉPOCA, 2011)
Com base no panorama exposto anteriormente, é
possível compreender que a cidade de São Paulo, assim como
muitas cidades brasileiras, enfrenta uma crise na mobilidade
urbana e busca alternativas de deslocamentos, como a
bicicleta.
Contudo, a necessidade de maior amparo por parte do
poder público, assim como de investimento em infraestrutura e
qualidade no deslocamento é imprescindível para efetivar o
65. 64
uso das bicicletas como modo de deslocamento de qualidade.
Como presenciado anteriormente, a população de São Paulo
encontra-se debatendo e articulando junto às esferas políticas
as melhores alternativas para implantação desse sistema de
forma a promover maior satisfação com o mesmo. É
necessário vislumbrar em São Paulo o pioneirismo na
desmistificação da impossibilidade de implantação de um
sistema cicloviário em uma cidade tão adensada e motorizada.
Permitindo, assim, a criação de oportunidade para outros
centros aderirem a tal proposta urbana.
É possível compreender ao longo das diferentes cidades
discutidas neste capítulo o impacto que o sistema de
mobilidade urbana exerce sob o desenvolvimento do espaço
da cidade e a qualidade de vida das pessoas que nela habitam.
Cada cidade apresentada compreendia um espaço urbano
dotado de particularidades e que implicaram em diferentes
propostas para a situação da mobilidade urbana.
No caso de Amsterdam, à medida que a cidade
Holandesa necessitava se expandir, a preocupação com o
espaço urbano e a mobilidade foram consideradas prioridade.
Assim, Amsterdam se destaca entre grandes cidades do
mundo preocupadas com a mobilidade, desenvolvendo
projetos e soluções urbanas de alta qualidade e estratégia. Em
Copenhagen, a preocupação com a mobilidade é similar,
sendo esta referência em projetos para ciclistas e pedestres,
investindo em diferentes formas de uso do espaço público.
Contudo, a cidade Dinamarquesa vivencia uma das maiores
taxas de impostos públicos do mundo, o que inviabiliza a
distribuição igualitária do usufruto dos benefícios. Lidera o
ranking das melhores cidades para se viver, em contrapartida
não possui acesso democrático aos seus serviços, sendo
excessivamente oneroso viver nela (GARCIA, 2011).
Por fim, o caso de São Paulo, o qual representa a luta
nacional por cidades pensadas para uma mobilidade urbana
democrática que permita o crescimento de diferentes modais
de transporte. Estudar a situação de São Paulo exemplifica no
presente trabalho o desejo e a necessidade de mudança do
panorama de mobilidade urbana.
66. 65
CAPÍTULO IV –DIAGNÓSTICO DA ÁREA DE
ESTUDO
Após a apresentação da temática da mobilidade presente no
Capítulo I, em seguida a compreensão do sistema cicloviário e
suas implicações no contexto urbano, presente no Capítulo II,
também foram realizados estudos de casos nas cidades de
Amsterdam, Copenhagen e São Paulo, no Capítulo III. Nessa
presente etapa, do Capítulo IV, será realizado o estudo da área
de intervenção, o Bairro da Parangaba, localizado na cidade de
Fortaleza (Figura 43).