1. ponto-e-virgula
Abril de 2009 / edição 11
edição
comemorativa
2 anos
da
primeir
a
edição
2. Indice CARTA AO LEITOR
20 e 22 de março, os quatro barbudos dos Los Hermanos se
A Veneza de Monet...........................................3 reuniram para um show. É, um show: não era aniversário de
Imagens......................................................4 nada, era só uma reunião – quase insignificante perto da apre-
Senhor & Companhia..........................................................5 sentação do Radiohead.
Perdidos na trilha.............................6 Desde novembro passado, nós, cabeçudos, não nos reunía-
Rocío................................................7 mos com nossos textinhos e crises existenciais. A edição 10
da ponto-e-vírgula foi a única impressa até agora – e também a
As dores de Grazia Deledda............8
única com a supervisão de um professor, o querido artilheiro e
Spanish Phrasebook...............................................9
gremista Mauro Silveira.
Semana passada, alguém lançou no grupo de e-mail a idéia:
vamos celebrar os dois anos de ponto-e-vírgula. Comemora-
tivos, ansiosos e saudosos que somos, aceitamos. Quatro de
nós estão do outro lado do Atlântico, um está em semana de
Expediente provas e gritou, do Pantanal, um ‘mi’ sonoro. Como nem tudo
é extraordinário, alguns estão em Florianópolis entre praia,
mangue, xeroxes e haitianos.
Edição Saiu, taí. E voltando quase muito tarde ao lead: apesar da
Adriana Seguro efeméride, lançamos nossos textos apressados sem o peso de
inovar, recriar, questionar ou fazer o melhor jornalismo do dia.
Luisa Frey
Quer dizer, posso jurar que tem uma inovação ali e um ques-
Marina Almeida
tionamento aqui. Mas a coisa boa – e brega – de tudo isso é
Pedro Santos
que a gente gosta de trabalhar um com o outro e ler um ao
outro. Revendo edições passadas, lembramos da felicidade
Textos da Adri e da Lu sambando jornalisticamente (Outubro), da Má
Carolina Moura Bento indo ao fim do mundo para entrevistar um louco por
Fernanda Dutra sapos (Junho), da Mázinha enlouquecendo no papo com o Má-
Juliana Sakae rio Prata (Julho), da lendária entrevista do Macaco com o Jairo
Luisa Frey Bauer (Abril), da Ju inventando palavras (Outubro), da Carol, do
Marina Almeida Tonetti e da Fê dormindo na rua para entrevistar os migus do
Marina Veshagem Exupéry no Campeche (Junho).
Foi divertido. Levou-nos a São Paulo duas vezes, fez espaço
Matheus Joffre
nos currículos. E, quero acreditar, a ponto-e-vírgula nos deu
Pedro Santos
alguma segurança diante da eterna angústia jornalística. Por
que se sobrevivemos até agora... conseguiremos chegar até o
Diagramação
fim (?).
Juliana Sakae
3. A Veneza de Monet pintava, nos degraus do Palazzo Bárbaro, o Palazzo da Mula.
No fim do dia, Monet proporcionava à esposa e a si mesmo
um passeio de gôndola sob o pôr-do-sol. Às 17h, estavam de
volta.
Peggy Guggenheim, Michelangelo, El Greco, Vivaldi, Lord Byron,
Cole Porter. O que fazem estes indivíduos conhecidos, de
Cheio de entusiasmo e graças ao bom tempo, o pintor come-
diferentes áreas e épocas, em uma mesma frase? Todos mo-
çava novas telas todos os dias. A amiga Mary Hunter teve de
raram em Veneza. E a lista de ilustres que habitaram a Sere-
partir e o casal se acomodou no Grand Hotel Britannia. Monet
níssima fica ainda mais completa com o nome Claude Monet.
se dividia, então, entre pintar à beira do canal ou do quarto do
Em apenas dez semanas, o impressionista deixou registradas
hotel. “A vista de nossa janela é maravilhosa. Você não pode-
37 impressões que impressionam ainda mais nossos olhos tão
ria sonhar com nada mais bonito, e
facilmente impressionáveis pela beleza desta cidade, impres-
é tudo para Monet”, escreveu Alice
sionante por natureza.
à filha.
Na mesma época em que começaram a surgir os problemas de
Somente os dias de chuva e frio
visão, aos 68 anos, Monet descobriu Veneza – cujas paisagens
alteravam o humor do artista, in-
serviriam de estímulo para o bom funcionamento de seus olhos
terrompendo seu trabalho. Mas o
por mais alguns anos. Segundo a jornalista Ariane Cauderlier
sol voltava e Monet seguia com as
– especialista em Monet e na comuna francesa de Giverny –,
pinceladas. Alice estava “conten-
quando deixou essa cidade, o artista não sabia se teria von-
te por ver Monet tão apaixonado,
tade de pintar cenas venezianas, retratadas tantas vezes e tão
pintando coisas tão bonitas e di-
bem por mestres como Canaletto e J. M. W. Turner. Mas a
ferentes das ninféias de sempre”.
ilha – definida pelo escritor inglês Charles Dickens como “um
estranho sonho sobre a água” –, também fascinaria o pintor. Em 3 de dezembro, Monet fez seu
último rascunho, retratando uma
A viagem havia sido um convite da amiga inglesa Mary Hunter. A gôndola de Veneza, 1908, por
gôndola. No dia 7, o casal deixou
Claude Monet. Musée des Beaux-
A idéia encantou a esposa Alice, cansada de Giverny. Alice
Veneza. O pintor esperaria um bom
Arts de Nantes, France
registrou a estadia do casal em Veneza, escrevendo diariamen-
tempo para terminar suas telas.
te para a filha Germaine Salerou, cujo neto publicou as cartas
Retomou as pinceladas quase dois anos depois, em novembro
com o título Monet et Venise (Editora Herscher, 1986).
de 1910. Mas ele nunca retocou o último dos quadros, Gôndola,
o qual presenteou ao amigo Georges Clemenceau. A obra pode
Monet e Alice chegaram à ilha de trem, em 1º de outubro de
ser vista hoje no Museu de Finas Artes de Nantes, França.
1908. O artista foi imediatamente hipnotizado e sentiu neces-
sidade de pintar. O amante da água e de monumentos – como
Monet e sua esposa nunca voltaram à Veneza. A saúde de
o lago das ninféias no quintal em Giverny e a Catedral de Rou-
Alice começou a falhar logo depois de deixarem a Serenísima
en – encontrou um lugar que unia os dois elementos. Oito dias
e, em 1911, ela faleceu. Pelo menos, teve a oportunidade de
depois de pisar na cidade, Monet mergulhou no trabalho.
ver muito mais que as ninféias e a ponte japonesa do jardim de
Giverny.
Sua rotina era regida pelo movimento do sol: às 8h, na ilha de
San Giorgio Maggiore, de frente para a Praça San Marco; às
Texto: Luisa Frey / Edição: Adriana Seguro
10h, em San Marco, de frente para San Giorgio. Após o almoço,
4. Imagens por imagens. É o desajeitado com uma coroa na cabeça, subindo
pelas paredes, a menina com penteado à Hitler, o robozinho que
(ou: partindo do pressuposto de que muito já foi lido e dito sobre ensina a receita da vida que cabe nos padrões – e é mais feliz.
Radiohead no último mês) Não?
Em 2000 (i.e. Kid A), acordar chupando um limão significava que
As ondas se arrastavam até
tudo estava no lugar certo. Em 2001 (i.e.. Amnesiac), as luzes es-
a margem, preguiçosas, num
tavam apagadas, ninguém estava em casa – portanto, as crianças
carinho matinal incomum.
eram serradas ao meio. Em 2003 (i.e. Hail to the Thief), tropeçar
O naufrágio recente deixara
em galhos quebrados fazia com que todos nós fôssemos aciden-
lascas, ripas de madeira. O
tes, em espera, para acontecer.
sol iluminava fracamente, re-
cuperando-se das densas nu-
Chegamos ao ponto. Enquanto as frases do Morrissey inflam – e
vens da chuva que passara.
portanto podem ser estouradas a qualquer momento – as do
De longe, o marrom desbota-
Thom Yorke carregam para o alto, construindo um ambiente em
do da madeira confundia-se
que os poderosos dizeres são inquestionáveis (porque pertencem
com outras cores: vermelho,
a um momento e a um lugar).
laranja, amarelo, verde, azul,
índigo e violeta – sete. Espremida por 29.999 pessoas, dificilmente me mantenho no lugar
obscuro do qual Thom Yorke fala por 2h21. Mas não é como se
Como os restos de um navio,
isso fizesse tanta diferença. Eu estou lá, dia sim dia não, há mais
nós nos separamos numa
de dez anos.
praia pálida. Pálida praia,
surge o arco-íris. A música dos dedos de árvore, “Treefingers” (Kid A), me levava até
Thom York, 2003
aquela caverna de gelo de Clube da Luta. Ali eu via pingüins, via
Por criar imagens como esta – que interpretam o caos –, o Ra-
Marla e saía do quarto cuiabano gelado artificialmente. Ali Thom
diohead me faz chorar. Esse foi o maior nariz de cera que eu já
Yorke calava. Eu também.
escrevi, mas é preciso que seja dito. Se os caracteres vão se mul-
tiplicando ao falar de um show que reuniu 30 mil pessoas no dia Acontece que algumas pessoas conseguem sentir de um jeito bo-
22 de março de 2009 na Chácara do Jóquei em São Paulo, existe nito a dissolução dos laços e dos valores. Há quem veja o arco-íris
um motivo. É preciso que se explique. nas ripas do naufrágio – e aponte os podres a partir de um pincel.
Não que eu vá explicar, mas preciso desse exercício. Essas pessoas sobem num palco iluminado, criam outros laços
– ainda que insistamos em destruí-los – e nos sentimos menos
Em 1997 (i.e. Ok Computer), Thom Yorke tinha alucinações com
solitários. Choramos em “The National Anthem”. Trememos e gri-
cacarejos. E dizia àqueles que o irritavam: quando eu mandar,
tamos e fazemos amigos.
você será o primeiro de costas na parede. Era salvo pela chu-
va, derrotado pelo pânico, pelo vômito. As frases de efeito – no E depois voltamos ao dia-a-dia do ônibus lotado e da comida
sentido: aquelas que cantamos a plenos pulmões e dizem tudo, congelada. Porque é assim. Não existe epifania cotidiana.
em 5 palavras, o que tivemos engasgado por anos –, aprendidas
com um inglês chamado Steven Patrick Morrissey, são apoiadas Texto: Fernanda Dutra / Edição: Pedro Santos
5. Senhor & Companhia berdade total de publicação. A Sr. trouxe tex-
tos de Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Paulo
A revista da década de 60 para senhores (e senhoras) Francis, Rubem Braga, Alex Viany e muitas tra-
duções inéditas no Brasil, como Truman Capote,
Qu’est que ce
Todo começo de mês, o senhor Jean-Paul Sartre, Dorothy Parker e Aldous Huxley.
fait-divers?
sentava à mesa pela manhã para
“Um Sr. 100%”
o ritual. Com a mão esquerda
O estudante de
segurava a xícara cheia de café
Jornalismo Chi- Não é à toa que o nome da Sr. é Senhor. Era feita
e com a direita folheava a revista
co Spagnolo, no pela elite intelectual e para a elite econômica.
que viera verde naquele outubro
blog do curso Para Lucy Niemeyer, doutora em Comunicação e
de 1960. Lia a novela de Aldous
sofia da
de filo Semiótica e autora do artigo “Uma revista para o
Huxley publicada em quinze pá-
Cásper Líbero Senhor”, o periódico era voltado para o público
ginas, com intervalos para as
- Bocejos de Fe- específico da Editora Delta, que já consumia co-
informações: “Homens de bom
ade - define leções e enciclopédias. “Pouco tempo depois de
licid
gôsto combinam comodidade e
ejo
em um boc lançada, a Revista Sr. passou a ser um símbolo
elegância no trajar diário com
o que significa de status social no âmbito em que circulava, em
Ban-tan”, “Não é trocadilho, não:
fait-divers: particular na alta burguesia do Rio de Janeiro”,
Ford é forte no duro”, “Com o re-
í-
“São not escreveu Niemeyer.
quinte do bom-gôsto parisiense:
cias que, sem
Dauphine, o carro que você terá O gasto para se fazer a revista era elevado, assim
mistificações,
Fac-símile da edição de outubro de
orgulho de dirigir”. como seu preço de venda – CR$100. As folhas
transmitem a
1960, Revista Senhor, CR$100
eram grossas e grandes, com oitenta páginas
da
dimensão
O senhor se divertia e a senhora aguardava o cansaço marido
– às vezes mais. Os anúncios eram previamen-
tragicomé-
para terminar de ler o artigo sobre os prováveis sucessores de
te selecionados – só entravam os que tinham
dia que é a
Eisenhower na Presidência dos Estados Unidos. Enquanto isso, o
relação com a linha editorial. Algumas edições
hu-
condição
mundo esperava o resultado da eleição entre John F. Kennedy e
vinham com contos impressos em papel de ou-
mana”. Leia na
Richard Nixon. A senhora gostava de política e cinema, o senhor
tra textura e outro tamanho, colados no meio da
última página
de literatura e música. Divertiam-se à mesa discutindo quem
revista, do jeito que sonha o escritor.
ista um
da rev
eram os melhores músicos brasileiros de jazz, pois nas primeiras
ão
trecho da seç
páginas havia uma pequena brincadeira: o 1º Grande Concurso Os intervalos entre uma edição e outra chega-
“Sr. & Cia”, que
Senhores do Jazz em que o leitor votava e enviava por correio ram a meses no fim da vida. Do desenvolvimen-
por páginas
suas escolhas. Assim era a Sr., entre assuntos sérios e notas de tismo de JK ao Golpe Militar, a Sr. saiu de circu-
trazia pequenas
fait-diver (ler box). lação em janeiro de 1964 sem fôlego. A revista
notas diversas,
é encontrada hoje em sebos de São Paulo por
A revista, desconhecida da geração anos oitenta/noventa, mar- divertidas e
R$72, também cara ao bolso. Porém, embora
não-assinadas.
cou a história dos periódicos brasileiros e revolucionou as ar-
amarela e quase-senhora com seus 45 anos,
tes gráficas da área. Criada para ser autoral, a Sr. nasceu
mantém-se perene, sem embalar peixes.
sob a direção de Nahum Sirotsky em março de 1959. Muitos
escritores começaram ali; outros, veteranos, viram nela a li- Texto: Juliana Sakae / Edição: Luisa Frey
6. Perdidos na trilha outros cinco, com apenas 30 reais juntando a grana de todos e
um espírito aventureiro, decidiram encarar o desafio.
Embalados por cantigas de carnaval entramos no caminho
certo. O primeiro carregava um facão nas mãos; eu, uma pe-
dra. Tentávamos andar o mais rápido possível para aproveitar
a pouca luz do dia que ainda restava, mas não demorou muito
e não agüentamos o pique. Descansamos alguns segundos e
continuamos conforme nosso físico permitia.
A mata era densa e o percurso, apesar de menor que o da ida,
era mais tortuoso. As músicas e o tom de brincadeira cederam
espaço para o silêncio. Sabíamos que as cobras costumam sair
das tocas quando escurece. Aproveitávamos a rara claridade nos
momentos em que a trilha se abria para acelerar a passada. Aos
poucos, a luz ia se esvaindo, até que qualquer vestígio de luz na-
tural sumisse completamente. O perigo de encontrar uma cobra
ou qualquer outro bicho pela frente era cada vez mais iminen-
te. Tentávamos iluminar o caminho com três celulares. Em vão.
Tropeços, escorregões e capotes eram corriqueiros. Por três vezes
nos deparamos com bifurcações. Seguíamos o instinto.
Avistamos a iluminação da cidade. Lá embaixo, a muitos me-
Reprodução de La vague (A onda), 1879, de Pierre Auguste Renoir
tros de altura. Esgotados, nossas expectativas eram suprimidas
à medida que subíamos cada vez mais ao invés de descer. O
receio de ter pegado o caminho errado já nos fazia pensar na
Eram quase seis da tarde. Andamos por uns cinco minutos e
hipótese de ter que passar a noite na mata. Nossas esperanças
a trilha ia desaparecendo cada vez mais na mata fechada. Até
voltaram quando vimos uma cerca rente ao percurso: um sinal
que sumiu de vez. Voltamos à praia e, de fato, estávamos na
de civilização.
direção errada. Um surfista nos indicou a entrada correta da
trilha que ia da Lagoinha do Leste até o Pântano do Sul e nos
Até que quebramos a regra de ouro: não se separar. Paramos
alertou: “Se vocês não têm lanterna é melhor irem rápido. Já
para ajudar um amigo que se machucara mais feio com um corte
está começando a escurecer.”
no pé e os outros dois, sem se darem conta, seguiram em frente.
Logo, os avistamos próximos a uma casa nos esperando. Vozes
A ida tinha sido bem mais tranqüila. Apesar das duas horas de
e risadas indicavam: era o fim da trilha. Saímos os cinco juntos.
caminhada, o trajeto que ia do Matadeiro para a Lagoinha era
Ainda com o receio de sair no quintal de alguém, mas o barulho
mais aberto e sem muitos desníveis. E, principalmente: era dia.
vinha da casa da frente – casais se preparando pra uma noita-
Depois de duas horas levando onda na cabeça e maravilhados da. Uma hora e dez minutos depois, sobrevivemos.
com a paisagem da praia, resolvemos voltar pelo outro lado.
Texto: Matheus Joffre / Edição: Pedro Santos
Metade do grupo pagou 10 reais e voltou de barquinho. Os
7. Rocio louca para conhecer. Ela pega uma camisinha e
entrega a ele, que não aceita o
A aventura (não-sexual) de três pessoas dentro dum táxi na cidade
Ainda mais agora – E piscando: “presente”.
de Córdoba, Argentina
“Você já teve alguma relação
homossexual?” - Ai, vai! Veste aí – pede ela.
Pica grande? Que história
- Não. Ele não faz nada a não ser dar
é essa? Quando a mulher
uma risada nervosa.
se vira para ele, seu sangue - Ai, mas você é virgem?
parece esvair-se do corpo. - Ah, deixa disso! Se liga – diz o
Percebe que não é uma - Ai, para! Você vai envergonhar taxista, salvando-o do sufoco.
mulher. É um travesti, com o menino – diz o taxista. Em
maquiagem bem delineada. seguida, pergunta à ela – Você é Finalmente chegam ao Museu
Mas ele não a encara dire- virgem da parte de trás, não é? da Indústria. O taxímetro marca
tamente, porque os olhos pouco mais de seis pesos. Ele
- Ai...
dela estão voltados para as dá o dinheiro, ansioso para sair
calças dele. do carro. Abre a porta e ouve:
Ele, do banco de trás, não en-
tende o que ela responde. Está
- É verdade isso que ele falou? - Ei, peraí!
Chega à avenida e faz sinal para
surpreso com o caminho deserto
o primeiro táxi que vê. O carro
- Ih, eu não sei! – responde, ten- que atravessam, umas ruas que O travesti loiro chega mais per-
amarelo pára e ele entra sem dar
tando aparentar naturalidade. nunca vira. Mil pensamentos to e lhe entrega um papel:
muita importância à mulher loira,
passam por sua cabeça. “O que
de cabelos bem lisos, sentada ao O travesti vira novamente para - Para qualquer coisa que você
será que esses dois vão fazer?
lado do taxista. frente e diz: “ai, assim eu fico precisar.
Eles podem parar em um mato
loucaaaa!”. e tentar me estuprar. E o que
- Pode me levar ao Museu da Há um número de telefone e
eu faço agora? Merda! Anoto a
Indústria? O taxista começa a contar de um nome, escrito de caneta azul
placa do veículo. Sem dúvida.
uma balada brasileira que fica piscina:
- Sim, claro. Da onde você é? Que droga pegar táxi com gente
justamente no Museu da Indús-
– pergunta o taxista acompanhada. Juro que não 156360322, Rocio
tria. “Você vai gostar de lá”, diz
faço mais isso”.
à acompanhante, dando um tapa
- Do Brasil. - Tá, tá! Pode deixar.
forte no peito dela, que nem liga. O susto vem de novo e o sangue
Volta atrás e continua mirando-
“Ah, olha só”, ele diz, virando- gela pela segunda vez em menos E sai do táxi amarelo sem olhar
o. Ele, sem saber o que fazer, e
se à mulher ao lado. “Você sabe de dez minutos. O travesti, per- para trás. Só se vira quando
tentando não encontrar o olhar
que os brasileiros têm pica gran- guntando se no Brasil existiam ouve o carro arrancar pela rua e
dela, busca mudar de assunto:
de, né?”. Ao que a mulher res- muitos travestis, mexe no porta- pode, então, respirar aliviado.
ponde: “O quêêê? É verdade?”. luvas. O que seria? Uma arma?
- Vocês conhecem o Brasil? Texto: Pedro Santos / Edição:
Seria agora que o obrigariam a
Ele crê estar louco. Só pode. Luisa Frey
tirar a roupa? “Filhos da puta”,
- Não, não conheço. Mas ficaria
Não deve ter entendido direito.
pensa. “Que porra é essa”?
8. Grazia Deledda
As dores de vista L’ultima moda. O conto, intitulado Sangue Sardo, não foi
bem recebido na família, pois tratava de um triângulo amoroso,
As tragédias da vida descritas por uma das principais escritoras e apenas quem já tivesse passado pela experiência poderia
italianas do século XX narrá-la.
Ela passa a escrever
Amor, dor, morte, angústia e a culpa do pecado. Esses são escondido para a re-
temas recorrentes na narrativa de Grazia Deledda. Nascida e vista. Dois anos depois,
criada na Sardenha – ilha do Mar Mediterrâneo –, a autora usa publica o primeiro ro-
histórias, comportamentos e paisagens que observou para es- mance: Stella d’oriente
crever os romances que a fizeram ser a primeira mulher italiana (Estrela do Oriente, em
a ganhar um prêmio Nobel, em 1926. português). Para enten-
der a vida da escritora
Deledda nasceu na cidade de Nu- – e consequentemente
oro, em uma família de seis filhos. suas personagens –, é
Freqüentou a escola até o ano necessário ler primei-
que corresponde à quinta série ro o último livro: Cosima. É uma autobiografia, escrita de forma
do ensino fundamental no Brasil. narrativa, em terceira pessoa e quase sem nenhuma correção.
Depois, teve aulas particulares. Foi publicado em 1937, um ano após a sua morte. Nele, Deledda
Para ela, porém, muito mais pro- conta complexos, paixões e desilusões. Conta como se sentiu
veitoso era sair e conversar com com a morte do pai e da irmã, que a fizeram amadurecer rápido;
as pessoas da cidade. Dotada de como o irmão que se tornou bêbado na busca pelo amor.
grande sensibilidade para perce-
ber o que a rodeava, a autora usa Um dos aspectos mais interessantes na obra deleddiana é a
em seus romances tudo o que viu relação bem x mal. Não existe a culpa do pecado. Mas sim o
e ouviu no período da infância e pecado como uma oportunidade de fazer o bem. É como se
adolescência. Tanto que todos o mal viesse da angústia, como se o pecador não consentisse
Vencedora do prêmio Nobel, a italiana os livros passam-se na Sardenha. o mal, mas buscasse fazer o bem através do pecado. É o que
Em uma entrevista, disse: “Preten- acontece em L’edera (A Hera, em português), onde Annesa
Grazia Deledda escreve sua biografia
Cosima, publicado postumamente do recordar a Sardenha da minha mata um velho para salvar a família de seus patrões e, em vez
infância, mas, sobretudo, a sa- de sentir remorso, acredita que deve se penitenciar e ajudar
bedoria profunda e autêntica, o modo de pensar e viver quase pessoas pobres e à beira da morte, renunciando ao seu amor e
religioso de certos velhos, pastores e camponeses sardos”. Ela à sua felicidade.
conseguiu. Suas narrativas são cheias de descrições de am-
Deledda descrevia a essência da vida em suas tragédias. É
bientes e, principalmente, dos pensamentos das personagens.
como se seus personagens principais não fossem Cosima,
Sua formação autodidata foi irregular, lendo romances e poe- Annesa ou Marianna, mas sim amor, dor, morte, angústia e a
sias que um de seus irmãos trazia para casa. Foi influenciada culpa do pecado.
por Balzac, Leone Tolstoi, Chateaubriand, entre outros. Quando
Texto: Marina Almeida / Edição: Adriana Seguro
tinha 16 anos, Deledda teve a primeira obra publicada na re-
9. ;
Spanish Phrasebook
Duas brasileiras a caminho de Barcelona. Uma fala francês; a
Sr&Cia: Dognapping
outra, inglês. O máximo que sai é um portuñol improvisado.
Solução? Anotar todas as frases em espanhol que conhecem
Em título de primeira página, o Times de
(com a grafia que imaginam). As seguintes são as que
Nova Iorque anunciou ao mundo
pareceram úteis para as mais variadas situações:
e aconselhou aos raptores: “No
- La cucaracha ja no puede caminar. more kidnappings. Dognapping
is so much better!”. E explicou:
- Yo no quiero covardes que me hagan sufrir. só nos oito primeiros meses de
1959 foram raptados 96 cães de
- Es duro ser uma chica em cualquier lugar. estimação de milionários, per-
sonalidades do cinema, teatro e
- Es esa niebla gris que envuelva la ciudad.
televisão, mulheres de políticos
influentes ou dirigentes sin-
- Mira como la prieta la bemba.
dicais. Sendo que os raptores
conseguiram, para devolver 77
- Estoy aqui quierendote
cães, um total de mais de 100
- No soy la clase de idiota que se deja convencer. milhões de cruzeiros. Por outro
lado, os que foram presos (sem
- Apuesto que no es así, no lo puedo creer. a ajuda do FBI que, no entanto,
trabalha sempre que o caso
- Me encantaria robar tu corazón. envolve uma criança) pegaram,
no máximo, um ano de cadeia,
- Si mi cambias por esa bruja, pedaso de cuero, no vuelvas sendo primários. A maior pena
nunca más. Yo no estaré aqui! foi de 4 anos. O raptor em-
pregou violência e já era velho
- Pero yo te seguiré quierendo...
conhecido da Justiça, com duas
condenações de roubo.
- Estoy aqui, boracho y loco.
(Senhor, outubro de 1960)
- El hiero siempre al calor es blando.
- Me muero, pero de la risa.
- Por que bailas como un angel?
- Yo no soy marinero. Soy capitan.
E a mais usada: Yo no puedo vivir así!
Carolina Moura e Marina Veshagem / Edição: Marina Almeida