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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÂS
FACULDADE DE DIREITO / COMISSÃO PASTORAL DA TERRA
A MEDIAÇÃO DA OUVIDORIA AGRÁRIA NACIONAL EM
CONFLITOS AGRÁRIOS DA AMAZÔNIA
JOSEP IBORRA PLANS
Goiania
2017
2
JOSEP IBORRA PLANS
A MEDIAÇÃO DA OUVIDORIA AGRÁRIA NACIONAL EM
CONFLITOS AGRÁRIOS DA AMAZÔNIA
Trabalho monográfico apresentado ao
Programa de Pós-Graduação Lato Senso da
Faculdade de Direito da Universidade Federal de
Goiás, como requisito parcial ao título de especialista
sob a orientação do Professor Doutor Adegmar José
Ferreira.
Goiânia
2017
3
Resumo: Este trabalho apresenta uma pesquisa, limitada a região da
Amazônia Legal do Brasil, sobre a experiência de mediação de
conflitos agrários realizada pela Comissão Nacional de Combate à
Violência, que presidia a Ouvidoria Agrária Nacional, os seus
fundamentos legais e a opinião que trabalhadores rurais, lideranças de
movimentos sociais do campo e agentes pastorais sociais participantes
tinham sobre a mesma, seu funcionamento e seus resultados, logo
antes de ser extinta pelo governo em novembro de 2016.
Palavras chave: conflitos agrários, mediação, violência no campo,
ouvidoria agrária, resolução de conflitos.
Resumen: Este trabajo presenta una investigación, limitada a la
región de la Amazonia Legal del Brasil, sobre la experiencia de
mediación en conflictos agrarios practicada pela Comisión Nacional
de Combate a la Violencia, que presidia la Defensoría Agraria
Nacional, sus fundamentos legales y la opinión que trabajadores
rurales, líderes de movimientos sociales del campo y agentes
pastorales participantes tenían sobre la misma, su funcionamiento y
sus resultados, poco antes de ser extinta por el gobierno en noviembre
de 2016.
Palabras clave: conflictos agrarios, mediación, violencia en el
campo, defensoría agraria, solución de conflictos
4
SUMÁRIO
A MEDIAÇÃO DA OUVIDORIA AGRÁRIA NACIONAL EM CONFLITOS
AGRÁRIOS DA AMAZÔNIA.
1 – INTRODUÇÃO................................................................................................... p. 05
2 - PRINCÍPIOS E METODOLOGIA DAS TÉCNICAS DE MEDIAÇÃO E
ARBITRAGEM APLICADAS PARA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS
AGRÁRIOS................................................................................................................ p. 13
3 - A RESOLUÇÃO Nº 125, DE 29 DE NOVEMBRO DE 2010 DO CONSELHO
NACIONAL DE JUSTIÇA. ........................................................................................p. 19
4 - EMBASAMENTO LEGAL, OBJETIVOS E NORMAS QUE REGULARAM A
ÚLTIMA ETAPA DA OUVIDORIA AGRÁRIA NACIONAL (OAN) E A
COMISSÃO DE COMBATE AOS CONFLITOS NO CAMPO............................... p. 21
5 – PARECER DE TRABALHADORES, ADVOGADOS, LIDERANÇAS E AGENTES
DA CPT DA AMAZÔNIA......................................................................................... p. 24
6 – HISTÓRICO E EXTINÇÃO DA OUVIDORIA AGRÁRIA
NACIONAL................................................................................................................ p.44
7 – CONCLUSÕES...................................................................................................... p.56
8 – BIBLIOGRAFIA................................................................................................... p. 63
9 – ANEXOS.................................................................................................................p.57
5
1 – INTRODUÇÃO
Grande parte dos conflitos do Brasil e o maior número de violência no
campo registradas pela CPT (Comissão Pastoral da Terra) continuam acontecendo na
Amazônia. Em reunião dos coordenadores regionais das CPTs da Amazônia, foia eleita a
preocupação com a violência como uma das prioridades de trabalho de nossa equipe
pastoral de Articulação das CPTs da Amazônia, da qual participo. Uma das poucas
políticas públicas implementadas pelo poder executivo federal para conter a violência
agrária é desenvolvida pela Ouvidoria Agrária Nacional. Trata-se da mediação em
conflitos agrários da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo, que realiza
reuniões presididas pela Ouvidoria Agrária Nacional, com objetivo de mediar entre os
diferentes atores dos conflitos do campo e reduzir a violência. Porém, na prática, as
mediações realizadas têm sido alvo de muitas críticas pelos trabalhadores rurais,
movimentos sociais do campo e inclusive pelos agentes da CPT, que participam delas.
Críticas porém que não têm sido sistematizadas nem comportado reações articuladas.
O principal objetivo deste trabalho foi conhecer melhor esta avaliação dos
pequenos agricultores, movimentos sociais e seus aliados, beneficiários desta prática da
mediação de conflitos aplicada pela Ouvidoria Agrária Nacional nas Reuniões da
Comissão Nacional de Combate à Violência. Limitando a pesquisa aos protagonistas dos
conflitos do campo localizados na Amazônia Legal, seja em ocupações de terras por
camponeses, conflitos com posseiros ou de comunidades tradicionais, dentro da
perspectiva dos camponeses e movimentos sociais e também a partir da percepção dos
agentes da Comissão Pastoral da Terra.
Se pretende conhecer melhor as características e resultados desta pratica
de mediação, valorizar os efeitos, apresentar limites e propor mudanças para outras
experiências semelhantes, a partir do parecer dos camponeses que dela participavam.
Como referência de política pública que foi executada pelo governo federal do Ministério
de Desenvolvimento Agrário, em parceria com outros atores públicos (INCRA, Terra
Legal, MP, MPF, Defensoria Agrária, Secretarias Ambientais, Secretarias de Direitos
Humanos, Delegacias Agrárias, etc.), que incidiu diretamente nos conflitos no campo.
Como resultado se pretende também ajudar a qualificar e articular as posturas das CPTs
da Amazônia junto com os trabalhadores, pastorais e movimentos sociais do campo frente
a este tipo de atuação política do governo federal.
6
Finalmente, este trabalho se situa dentro da missão e identidade da
Comissão Pastoral da Terra, da qual o autor forma parte e onde trabalha como agente de
pastoral, tendo como parte da missão e identidade:
O trabalho de base junto aos povos da terra e das águas, como
convivência, promoção, apoio, acompanhamento e assessoria:
1. nos seus processos coletivos: de conquista dos direitos e da
terra, de resistência na terra,... (Missão da CPT)i
Por tanto é uma pesquisa voltada desde o começo para os camponeses e
pequenos agricultores, do lado deles, que pretende pesquisar a experiência de mediação
da Ouvidoria Agrária desde a ótica deles e dos seus objetivos, no contexto dos conflitos
e da violência sofridos por eles no objetivo da conquista e permanência na terra.
Para esta missão o autor deste trabalho faz um esforço para separar suas
convicções e experiências pessoais do resultado da pesquisa. Porém precisa manifestar
que a mesma foi concebida a partir da experiência, pois já participou de muitas das
Reuniões da Ouvidoria Agrária Nacional, todas elas realizadas em Rondônia em
circunstâncias diversas, seja em reuniões multitudinárias no auditório do MP e no INCRA
de Porto Velho, nas câmaras de vereadores de Vilhena e Ji Paraná, ou em reuniões mais
restritas na Casa Civil e no gabinete da Secretaria de Estado de Segurança do Governo de
Estado. Vamos descrever também estas brevemente. A experiência não difere muito dos
resultados apontados, pelo que se refere as opiniões sobre a mediação exercida pela OAN,
por mais que sempre houve pessoalmente um reconhecimento do trabalho exercido pela
Ouvidoria. Com resultados ou não, as reuniões da Comissão sempre contribuíram para
uma grande aprendizagem pessoal. Com respeito a nossa atitude diante delas, um dos
meus posicionamentos era que si existia esta política pública, ela tinha que ser explorada
em favor dos camponeses. Tínhamos que dar trabalho, já que existiam os conflitos
batendo em nossas portas. Assim, durante alguns anos encaminhei para Ouvidoria
inúmeras denúncias e petições das situações vivenciadas nos conflitos de terra por
camponeses que acudiam à CPT em Rondônia. Isto significou grande exposição pessoal
e institucional, pois todos os pedidos tinham que ser assinados e eram divulgados em
todas as instâncias. Por outro lado, constatamos exíguos resultados, apesar de registrar
sim, alguns avanços. Lembro do primeiro assunto que coloquei em Reunião da Comissão,
arredor do ano 2009, sobre a problemática das comunidades quilombolas. Segue o
processo de titulação estancado na maioria delas. Mesmo assim, graças as Reuniões
houve alguns avanços na realização dos estudos de identificação das áreas quilombolas,
7
e na disponibilização de recursos humanos e pessoais no INCRA de Rondônia para esta
finalidade, com ajuda da Ouvidoria. Os resultados também foram frustrantes em muitos
aspectos, como o encaminhamento de denúncias de delitos da polícia nas corregedorias
correspondentes. Por outro lado, a Ouvidoria disponibilizou de informações relevantes,
por exemplo sobre a atuação de milícias armadas na região, com participação de oficiais
da PM, em dados da própria polícia. Também mostrou em muitos casos “o caminho das
pedras” para o encaminhamento adequado das situações. Ajudou a conseguir importantes
aliados, como a Defensoria Pública Agrária, e algumas atuações da Delegacia Agrária a
favor de camponeses que eram vítimas de violência.
Um imprevisto. Com esta base pessoal e de conversas na equipe de
Articulação da Amazônia, sobre o teor deste trabalho, na fase final de elaboração do
mesmo, a Ouvidoria Agrária Nacional foi extinta pelo governo golpista presidido por
Michel Temer. Em 28 de Novembro de 2016, Gercino José da Silva, até poucos dias
Ouvidor Agrário Nacional, enviava esta carta aberta por e-mail:
Prezados Representantes de Órgãos Agrários e de Movimentos
Sociais Rurais do Estado de Rondônia, Tenho a elevada honra
em dirigir-me a Vossas Excelências visando comunicar-lhes a
extinção da Ouvidoria Agrária Nacional, conforme Decreto nº
8.889, de 26 de outubro de 2016, que aprova a Estrutura
Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão
e das Funções de Confiança da Casa Civil da Presidência da
República, remaneja cargos em comissão e funções de confiança
e substitui cargos em comissão do Grupo Direção e
Assessoramento Superiores por Funções Comissionadas do
Poder Executivo, conforme documento constante de arquivo
anexo. Atenciosamente. Desembargador Gercino José da Silva
Filho (ARQUIVO DO AUTOR)ii
Na semana que foi extinta, o Ouvidor encontrava-se realizando as últimas
Reuniões da Comissão em Porto Velho. O governo de Michel Temer, criado após o
impeachment de Dilma Rousseff, extinguiu o Ministério de Desenvolvimento Agrário
(MDA) dentro do qual se enquadrava a Ouvidoria Agrárias Nacional e entre outras
disposições exonerou o Ouvidor Agrário Nacional (quando estava fora de Brasília,
presidindo as últimas reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência em Porto
Velho), pelo Decreto 8.889 de 26 de Outubro de 2016, após suspender o Ministério de
Desenvolvimento Agrário e agregar a estrutura do INCRA na Casa Civil da Presidência
da República.
8
A Ouvidoria Agrária (OAN) foi extinta apesar de que não tinha sido criada
pelos governos petistas, mas sim pelo seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso em
1999,iii
junto com a criação do Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA), logo após
os episódios do Massacre de Corumbiara (1995) e de Eldorado dos Carajás (1996).
Proposta política louvada por José de Souza Martins, como uma das medidas destinadas
a tentar estabelecer “as bases concretas para o exercício da função social da propriedade,
recuperando o Estado, na prática, o domínio eminente do território do país.” (MARTINS,
J. de S.):
Em suma, o governo Fernando Henrique Cardoso herdou a
desordem de uma demanda fora dos parâmetros da
institucionalidade e de um Estado com orientações
desencontradas e confusas em relação à reforma agrária. Os
episódios de Corumbiara e Eldorado de Carajás foram expressões
dessa herança. (...) Portanto, a política agrária de Fernando
Henrique Cardoso teve por objetivo fazer a reforma e ao mesmo
tempo instituir a normalidade do conflito, isto é, definir as bases
institucionais do conflito agrário, fazendo do Estado o mediador
e gestor das soluções. A Medida Provisória que proíbe vistorias
para reforma agrária em terras invadidas, mantida pelo governo
do PT, propôs-se como o inevitável instrumento do Estado
administrador da ordem. A política agrária de Fernando
Henrique Cardoso foi no sentido de distribuir a terra e distribuir
a paz social, ao mesmo tempo, atenuando e reduzindo a
conflitividade dos confrontos sociais que tem a disputa pela terra
como causa. A criação da Ouvidoria Agrária, entregue a um
reputado e competente desembargador, mantido pelo novo
governo, foi certamente medida das mais acertadas numa linha
política de conciliação e prudência, com reconhecidos resultados
na pacificação do campo. (MARTINS)iv
Durante mais de uma década e meia, em sucessivos governos, se manteve
como Ouvidor Agrário Nacional a mesma figura: Gercino José da Silva Filho, que até a
extinção da OAN, exerceu como Ouvidor Agrário Nacional e personificou a Ouvidoria
Agrária Nacional. Antes disso ele era juiz, e alcançou a função de desembargador no
Estado do Acre (1990-1999),v
sendo atualmente desembargador aposentado. Em todas as
comunicações assinava e continuava apresentando-se como desembargador.
O fato é que com a extinção da OAN encerrou-se (pelo menos
temporariamente) uma etapa de experiência de aplicação extrajudicial da ferramenta de
mediação de conflitos, uma prática considerada inovadora e promissora na administração
9
de justiça, aplicada a uma das causas mais arraigadas de violência da história do Brasil:
os conflitos pelo território, pela posse e propriedade da terra. Um dos principais e mais
conhecidos meios de implementação de programa foi a realização descentralizada de mais
de mil Reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo, que
aconteceram em muitos diversos estados brasileiros, muitas delas na região amazônica.
Estas reuniões congregavam representantes de organismos federais e estaduais da
administração envolvidos nos conflitos no campo, entre eles representantes da Secretaria
de Direitos Humanos, INCRA, Terra Legal, IBAMA e organismos ambientais estaduais,
ministério público federal e estadual, juízes, defensorias públicas, autoridades da polícia
e segurança pública, exército, etc. E representantes dos mais diversos segmentos sociais
envolvidos nos conflitos no campo: Proprietários, posseiros, advogados, sindicatos,
organizações patronais, associações de agricultores, movimentos sociais, organizações
não governamentais, pastorais sociais, etc.
A pedido de qualquer um que solicitar, os conflitos eram debatidos um por
um nas pautas das Reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo
presididas pelo Ouvidor Agrário Nacional, sendo elaborada ao final das mesmas uma Ata
oficial dos acordos ou conclusões alcançadas. Posteriormente a Ouvidoria realizava
acompanhamento do cumprimento destas resoluções e cobrava a aplicação das mesmas
aos diversos organismos, comunicando quando havia resposta os resultados (ou a falta
deles) as partes diretamente implicadas.
Porém a impressão geral de muitos agentes da Comissão Pastoral da Terra
acerca das mediações realizadas pela Comissão Nacional de Combate à Violência era
como mínimo, polêmica. Para alguns, era instrumento de abafamento das demandas e
reivindicações, de relativa ou nula eficácia no enfrentamento aos poderes locais,
dominados pelos latifundiários. Apesar disso a Ouvidoria era muito procurada e tinha a
credibilidade dos trabalhadores, de muitos grupos de pequenos agricultores que na
atuação federal contemplavam a possibilidade de maior isonomia e melhores perspectivas
de ver contempladas suas reivindicações.
Para outros, porém, a atuação era considerada sem efeitos, inclusive
suspeita. O fracasso da qual seria comprovada pelo real aumento da violência, seja devido
à falta de reconhecimento do Judiciário; seja por não chegar a acordos entre as partes;
seja pelo descaso e parcialidade das autoridades competentes (INCRA, policia, etc.); ou
10
pela falta de cumprimento dos compromissos das partes. Ainda, seja por propiciar acordos
especialmente onerosos (considerados “claudicantes”) para os camponeses. Até o ponto
da Ouvidoria ser considerada por alguns movimentos sociais, apenas como mais um
mecanismo de abafamento das demandas de reforma agrária e da luta por justiça na terra
dos camponeses.
Alguns consideravam que a Ouvidoria estava instrumentalizada para a
repressão e criminalização dos camponeses, obtendo assim efeitos contrários aos
pretendidos: Maior rebeldia do povo despossuído e perca de legitimidade do papel de
mediação do Estado no confronto social. Este autor escrevia em Julho de 2013:
Os pequenos agricultores recolhem a impressão que esta
Ouvidoria Agrária Nacional e o governo brasileiro, orienta-se
mais para a repressão dos pequenos agricultores sem terra do que
a defesa dos seus legítimos direitos constitucionais. (Citado por
De PAULA, M. L.)vi
Apesar disso e do descrédito da maioria dos agentes da CPT, (com
honrosas exceções) e da crítica quase unânime entre nós sobre a forma de realizar estas
reuniões e sobre os seus exíguos resultados práticos, a participação nas reuniões era muito
solicitada pelos trabalhadores rurais envolvidos nos conflitos, especialmente pelos grupos
desvinculados de organizações e movimentos sociais do campo, sendo para eles uma das
poucas formas de acesso ao Estado e de cobrança de suas reivindicações e direitos. Tal
vez por isso as críticas não supunham porém da CPT um repúdio geral a participação e
em todos os regionais havia acompanhamento dos grupos que solicitavam uma presença
efetiva nestas reuniões. Também não houve nunca uma avaliação conjunta, nem uma
atitude articulada em relação as mesmas. Este era um dos objetivos deste trabalho,
discutido dentro do espaço do Projeto de Articulação das CPTs da Amazônia.
Metodologia de trabalho. Na base teórica foram pesquisados
bibliograficamente os princípios e a metodologia da mediação. O principal autor de
referência, que o presente trabalho acompanha literalmente é uma obra com finalidade
didática e utilizada pela própria OAN, editada em 2014 pela Universidade de Brasília e o
Ministério de Justiça, que tem por autora Luciana Moessa de Souza e como organizador
Igor Lima Goettenauer de Oliveira: “Resolução consensual de conflitos coletivos
envolvendo políticas públicas” (SOUZA). A obra é utilizada é divulgada pela Escola
Nacional de Mediação e Conciliação – ENAM, que segundo informação da mesma
11
Foi criada no âmbito da Secretaria de Reforma do Judiciário, ao
final de 2012, por ato do Ministro da Justiça, com a finalidade de
oferecer capacitações e cursos presenciais e à distância em
técnicas de mediação, conciliação, negociação e outras formas
consensuais de solução de conflitos. (...) Para tanto, a ENAM
trabalha em parceria com os principais atores do sistema de
justiça: Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública,
Advocacia Pública, Advocacia Privada, Faculdades de Direito
etc. participam da formulação dos cursos e dos materiais
pedagógicos da escola, de tal forma que o processo judicial seja
preterido em favor de uma boa conversa e de um bom acordo.
(ENAM)vii
No segundo momento, foi analisado o embasamento legal, objetivos e
normas que regulam a Ouvidoria Agrária Nacional (OAN) e a Comissão de Combate à
Violência no Campo, e por especial sugestão do orientador deste trabalho, as normas do
Conselho Nacional de Justiça que regem a atuação das magistraturas sobre a prática de
mediação.
Posteriormente, para conhecer a recepção da mediação praticada, foram
elaboradas e aplicadas entrevistas para agentes da Comissão Pastoral da Terra (CPT),
agricultores, advogados populares e dirigentes de movimentos sociais, tendo como base
as propostas da obra de Luciana Moessa de Souza sobre a mediação. O questionário
elaborado foi distribuído pelos nove regionais da CPT da Amazônia procurando
trabalhadores, ativistas de movimentos sociais do campo e agentes de pastoral que
tivessem participado de Reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência. Obteve
catorze respostas, vindas dos estados de Acre, Rondônia, Mato Grosso e Pará.
Pretendíamos também analisar alguns casos de mediação de conflitos
agrários, considerados significativos por estes agentes, acompanhados também pela
Pastoral da Terra, a partir das Atas das Reuniões da Comissão Nacional de Conflitos
Agrários e contrastadas com informações da própria CPT, comprovando os desfechos e
resultados dos mesmos. Não foi possível, assim como as avaliações serem enviadas à
Ouvidoria Agrária Nacional para eventuais análises ou comentários.
Por motivo da extinção da OAN a finais de 2016, em plena elaboração
deste trabalho, as críticas surgidas contra a medida inclusive dentro da própria CPT,
oferecem um elemento precioso que aqui será recolhido de forma sucinta, para compor,
com todos estes elementos, a elaboração das conclusões do trabalho. Por sugestão dos
12
leitores do mesmo, acrescentei alguns apontes históricos sobre a Ouvidoria, assim como
nesta introdução foram ampliadas um pouco as considerações iniciais em base a própria
experiência pessoal do autor sobre o assunto.
Está claro que uma avaliação crítica do trabalho da Ouvidoria perdeu parte do
interesse agora que já foi extinta. Contudo, o governo golpista acabou por recriar uma
Ouvidoria Agrária dentro da estrutura do INCRA. Em todo caso esta pesquisa e as
considerações sobre a mesma vão poder dar algumas dicas sobre a mediação em conflitos
agrários. São apenas um começo de estudo, que deveria ser continuada, sobre uma
experiência prática de mediação aplicada ao espinhoso tema dos conflitos agrários no
campo.
13
2 – PRINCÍPIOS E METODOLOGIA DAS TÉCNICAS DE MEDIAÇÃO E
ARBITRAGEM APLICADAS PARA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS AGRÁRIOS.
A principal obra utilizada neste trabalho é “Resolução consensual de
conflitos coletivos envolvendo políticas públicas” de Luciana M. de Souza. Esta obra
serviu de base para redação dos questionários sobre a prática de mediação utilizada pela
OAN e para interpretação dos resultados da pesquisa. Nesta obra de Souza começa
defendendo a necessidade dos métodos consensuais de resolução de conflitos:
A inegável repercussão social de tais conflitos torna urgente a
utilização de instrumentos capazes de dar conta destes desafios.
Se eles não são os mais numerosos no âmbito do Poder
Judiciário, são sem dúvida os que apresentam maiores impactos
e maior relevância na sociedade civil.” (...) “na esfera do Poder
Executivo, também pode evitar a escalada de conflitos amplos e
a criação de impasses no desempenho das competências da
Administração, aprimorando a eficiência, o relacionamento com
o cidadão e a legitimidade democrática da atuação estatal.
(SPOUZA, p.4)
Apresenta diversas definições de mediação:
A mediação de um conflito pode ser definida como a intervenção
construtiva de um terceiro imparcial junto às partes envolvidas
no conflito, com vistas à busca de uma solução construída
pelas próprias partes.” (...) “Para Maria de Nazareth Serpa,
“mediação é um processo onde e através do qual uma terceira
pessoa age no sentido de encorajar e facilitar a resolução de uma
disputa sem prescrever qual a solução” (1999, p. 147). A
mesma autora deixa claro que a intervenção deste terceiro
imparcial é fundamental para engajar as partes numa discussão
proveitosa. (SOUZA, p.15)
Apresenta conceitos de conflitos, como a do Professor Antônio Rodrigues
de Freitas Júnior:
Situações em que estejam presentes, simultaneamente, 1. no
plano objetivo: um problema alocativo incidente sobre bens tidos
por escassos ou encargos tidos como necessários, sejam os bens
e os encargos de natureza material ou imaterial; 2. no plano
comportamental: consciente ou inconsciente, intencional ou não,
contraposição no vetor de conduta entre dois sujeitos; e 3. no
plano anímico ou motivacional: sujeitos portadores de
percepções diferentes sobre como tratar o problema alocativo,
como função de valores de justiça (2009, p. 518). (SOUZA p. 15)
Discursa sobre o papel dos poderes públicos e da legislação na resolução
dos conflitos:
14
Em outras palavras, o sistema normativo escolhe os interesses
que merecem proteção coercitiva, ou seja, aqueles cuja
legitimidade é tal que se poderá utilizar o aparato de força estatal
para fazê-los valer em caso de ameaça ou violação. Boa parte dos
conflitos, contudo, como lembra Entelman, envolvem mais do
que uma mera situação de proibição, obrigação ou permissão
de conduta (...) “No espaço público, ao contrário do que se
possa pensar, dado o peso de fato maior que a legalidade assume
na definição do espaço de atuação dos agentes, situações
similares também são de fácil verificação, por ser bastante
comum a utilização pelos textos normativos de termos genéricos
e conceitos abstratos, dando margem a um espaço significativo
de discricionariedade no momento da aplicação da norma.
Assim, é comum a ocorrência, em determinado conflito, de duas
ou mais interpretações igualmente aceitáveis em face do quadro
normativo, porém incompatíveis entre si. Mais uma vez se
verifica, então, que a mera referência ao sistema jurídico não é
suficiente para a solução do conflito – daí a utilidade da
mediação5, inclusive para construir uma interpretação do quadro
normativo que seja aceita por todos os envolvidos. (SOUZA, P.
17)
Sobre as formas de mediação e resolução de conflitos:
Cabe referir aqui as lições de Humberto Dalla Bernardina de
Pinho, inspiradas na doutrina estadunidense a respeito: “Há duas
formas básicas de estabelecer a metodologia e as premissas
básicas para a busca da solução. A primeira é denominada
‘rights-based’ e ocorre quando as partes analisam quais são as
perspectivas da questão na hipótese de a causa ser levada à
jurisdição, a fim de delimitar objetivamente a solução prática a
ser alcançada. Esses dados são tomados como ponto de partida
para a negociação. A outra é denominada ‘interest-based’ e se dá
quando a solução for buscada com base nos interesses e
necessidades das próprias partes no que tange aos direitos em
conflito, deixando-se a análise fria do texto legal e das tendências
jurisprudenciais para um segundo momento e apenas como forma
de conferir executoriedade ao termo de acordo.” (2009, p. 244 -
grifei) No caso dos conflitos envolvendo entes públicos,
naturalmente, a abordagem baseada em direitos (“rights-based”)
sempre há de existir, porém defendo que é possível e necessário
incluir também a abordagem baseada em interesses (“interest-
based”), ou seja, as duas abordagens não são mutuamente
excludentes, e sim complementares. (SOUZA p. 17)
Sobre as diferentes estratégias que um negociador pode adotar apresenta
um modelo de classificação de Gladys Stella Álvarez:
1. Estratégia da competição: grande preocupação com as metas
pessoais e pouca preocupação com as relações. Adotada “por
15
quem busca alcançar suas próprias metas a todo custo, sem
preocupar-se com as necessidades ou a aceitação de outras
pessoas (...) Na mente dessa pessoa não há dúvida de que ela tem
razão”;
2. Estratégia de concessão: pouca preocupação com as metas
pessoais e grande preocupação com as relações. Pode ser
“altamente apropriada quando se percebe que se está equivocado,
tendo um efeito muito positivo no momento de reconhecer erros,
postergações, esquecimentos e também quando um assunto não
tem muito interesse para a parte”;
3. Estratégia de evitar o confronto: pouca preocupação com as
metas pessoais e pouca preocupação com as relações; evitar pode
ser adequado quando se trata de questões de menor importância;
4. Busca do “meio-termo”: preocupação moderada tanto com
as metas pessoais quanto com as relações. Pode ser apropriado
“quando os objetivos são apenas medianamente importantes e a
pessoa pode colaborar moderadamente e até certo ponto com a
outra”;
5. Estratégia de colaboração: grande preocupação tanto com as
metas pessoais quanto com as relações. “As pessoas que utilizam
este estilo não consideram como mutuamente excludentes a
satisfação de suas próprias metas e as dos demais (...)
Consideram o conflito como algo natural e útil que, inclusive, se
for manejado de forma apropriada, conduz a uma solução mais
criativa”. Esse estilo é adequado quando os “objetivos são tais
que é necessário contar com uma estreita colaboração para atingi-
los”. Nele, “existe a interdependência entre as pessoas
envolvidas, sem que elas sejam acusadas ou julgadas”. (SOUZA
p 18-19)
O papel do mediador:
Cabe ao mediador, assim, conduzir as partes a esta postura
colaborativa, a única capaz de otimizar resultados, notadamente
nos conflitos de dimensão coletiva, como aqueles que envolvem
políticas públicas. O sucesso do mediador se mede justamente
pela sua capacidade de mobilizar as partes neste sentido, o que
fará emergir naturalmente uma solução que seja a melhor
possível para todos os envolvidos. (SOUZA, p. 19)
Apresenta três diferentes escolas de mediação e os fundamentos básicos
de negociação desenvolvidos nos EUA e que estendem sua influência no Brasil e no
mundo:
a) Mediação voltada para a solução de problemas: Para o
modelo denominado de mediação voltada para a solução de
problemas, esta solução se materializa na realização de um
16
acordo. (...) A mediação nada mais seria, em realidade, que uma
negociação facilitada por um terceiro.
b) Mediação transformativa. Um dos primeiros objetivos do
mediador é trazer à tona as questões subjacentes ao conflito que
influenciam na possibilidade de busca de uma solução. (...) não
reside na simples obtenção de um acordo com relação ao
problema específico que gerou o conflito, mas no
estabelecimento de um novo padrão de relacionamento entre as
partes, no qual estas passem a ter condições de gerar por si
mesmas soluções para os conflitos que naturalmente surgirão ao
longo de seu relacionamento.
c) Mediação narrativa. Neste modelo o objetivo da mediação
pode ser descrito, em apertada síntese, como reinterpretar /
reconstruir a visão das partes em relação ao conflito, sendo que
isso é feito por meio do questionamento de preconceitos
socioculturais das partes, mediante intervenção ativa do
mediador, que não é considerado “neutro” ou “objetivo”, mas
sim deve também questionar seus próprios estereótipos e
condicionamentos socioculturais durante os trabalhos
(ALBERSTEIN, 2007, p. 337). (SOUZA p.24)
Assim conclui:
Apesar de registrar a diferença entre os diversos enfoques,
perceba que eles não se excluem mutuamente. Muito embora a
mediação narrativa e a mediação transformativa não se
restrinjam, como visto, à busca do acordo pelo qual se resolve o
conflito imediato, a obtenção deste é também uma consequência
natural da reinterpretação do conflito, que se utiliza na mediação
narrativa, bem como da alteração no padrão disfuncional de
relacionamento entre as partes, que se busca na mediação
transformativa. (SOUZA p 24)
Apresenta diferentes formas de enquadrar o conflito: “a) o reconhecimento
e o trabalho com o contexto subjacente ao conflito; b) o reconhecimento e o trabalho com
as emoções das partes envolvidas no conflito” (SOUZA, p. 30).
Sobre os tipos de conflitos solucionáveis por mediação cita a opinião que
“a mediação pode se ocupar de qualquer tipo de conflito” (SOUZA p.33) citando uma
importante ressalva:
Há, porém, quem levante dúvidas sobre a
possibilidade/adequação de sua utilização em conflitos nos quais
as partes em litígio estejam em situação de desigualdade, ou que
versem sobre direitos indisponíveis. (SOUZA p. 33)
17
Entre os riscos envolvidos no processo de mediação, Souza insiste sobre o
risco da desigualdade entre as partes e outras que dizem especialmente aos conflitos que
tratamos:
a) a frequente situação de desigualdade de poder entre as
partes, notadamente de poder econômico, que torna mais difícil
o acesso às informações necessárias para se firmar um acordo
esclarecido, bem como torna maior a pressão pelo acordo em uma
situação de dificuldade para fazer face aos custos do processo;
b) a dificuldade de se identificar a pessoa responsável por
firmar o acordo dentro de grandes empresas ou entes
governamentais;
c) a dificuldade de execução do acordo, que pode ser
visto como não tendo o mesmo valor jurídico pelos membros do
Poder Judiciário. (Eventual resistência do Judiciário à execução
de acordos firmados em processos de mediação). (SOUZA, p. 34)
Outro elemento importante são as diretrizes éticas para atuação de
mediadores e conciliadores;
Sobre a mediação, não existe dúvida quanto ao fato de que ela
envolve responsabilidades tanto do ponto de vista positivo, isto
é, deveres de fazer algo durante o processo, quanto do ponto de
vista negativo, ou seja, deveres de não adotar determinadas
condutas. (SOUZA, p. 37)
Assim recolhe as orientações legais existentes:
Os princípios fundamentais que regem a atuação de conciliadores
e mediadores judiciais”, do Código de Ética anexo à Resolução
nº. 125, do Conselho Nacional de Justiça: “confidencialidade,
competência, imparcialidade, neutralidade, independência e
autonomia, respeito à ordem pública e às leis vigentes” (art. 1º do
referido código). Já o projeto de novo Código de Processo Civil
brasileiro dispõe, em seu art. 167, que “A conciliação e a
mediação são informadas pelos princípios da independência, da
imparcialidade, da normalização do conflito, da autonomia da
vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e
da decisão informada.” (SOUZA p. 37)
Informa sobre a existência de Recomendações do Código de Ética do
CONIMA – Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem, apesar de ter
“enfoque predominante nos conflitos da esfera privada”. (SOUZA p. 37) destacando o
dever da imparcialidade (ou neutralidade), dever de respeitar a autonomia das partes,
deveres de competência e diligência; dever de alertar as partes sobre a necessidade de
perícia técnica ou assessoramento de terceiros; dever de zelar pelo equilíbrio de poder
entre as partes, confidencialidade, transparência na condução do processo; dever de zelar
18
pela viabilidade do cumprimento do acordo; dever de zelar pelos interesses de terceiros
afetados
19
3 - A RESOLUÇÃO Nº 125, DE 29 DE NOVEMBRO DE 2010 DO CONSELHO
NACIONAL DE JUSTIÇA.
Esta resolução do CNJ, segundo os “considerando” iniciais, dispõe uma
política nacional de mediação de conflitos, no intento de “zelar pela observância do art.
37 da Constituição da República”; facilitando “a eficiência operacional, o acesso ao
sistema de Justiça e a responsabilidade social” e que “o direito de acesso à Justiça,
previsto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal além da vertente formal perante os
órgãos judiciários, implica acesso à ordem jurídica justa”, focada nos mecanismos
consensuais de resolução de conflitos:
CONSIDERANDO que, por isso, cabe ao Judiciário estabelecer
política pública de tratamento adequado dos problemas jurídicos
e dos conflitos de interesses, que ocorrem em larga e crescente
escala na sociedade, de forma a organizar, em âmbito nacional,
não somente os serviços prestados nos processos judiciais, como
também os que possam sê-lo mediante outros mecanismos de
solução de conflitos, em especial dos consensuais, como a
mediação e a conciliação; (RESOLUÇÃO Nº125 CNJ)
Por este motivo propõe “consolidar uma política pública permanente de
incentivo e aperfeiçoamento dos mecanismos consensuais de solução de litígios;” pois:
CONSIDERANDO que a conciliação e a mediação são
instrumentos efetivos de pacificação social, solução e prevenção
de litígios, e que a sua apropriada disciplina em programas já
implementados no país tem reduzido a excessiva judicialização
dos conflitos de interesses, a quantidade de recursos e de
execução de sentenças; (RESOLUÇÃO Nº125 CNJ)
Com o objetivo de “estimular, apoiar e difundir a sistematização e o
aprimoramento das práticas já adotadas pelos tribunais;”, e
Organizar e uniformizar os serviços de conciliação, mediação e
outros métodos consensuais de solução de conflitos, para lhes
evitar disparidades de orientação e práticas, bem como para
assegurar a boa execução da política pública, respeitadas as
especificidades de cada segmento da Justiça; (RESOLUÇÃO
Nº125 CNJ)
O objetivo pretendido é criar uma alternativa para resolução de conflitos
com base a mediação e aos métodos consensuais de resolução de conflitos:
20
CONSIDERANDO que a organização dos serviços de
conciliação, mediação e outros métodos consensuais de solução
de conflitos deve servir de princípio e base para a criação de
Juízos de resolução alternativa de conflitos, verdadeiros órgãos
judiciais especializados na matéria; (RESOLUÇÃO Nº125 CNJ)
A Resolução Nº 125 do CNJ destaca a competência dos tribunais para
oferecer meios de mediação e conciliação para resolver conflitos “antes da solução
adjudicada mediante sentença”, embasado no art. 334 do Novo Código de Processo Civil
e o art. 27 da Lei de Mediação. Para isso propõe a criação de Centros Judiciários de
Solução de Conflitos e Cidadania (Centros ou Cejuscs), “responsáveis pela realização ou
gestão das sessões e audiências de conciliação e mediação que estejam a cargo de
conciliadores e mediadores, bem como pelo atendimento e orientação ao cidadão”
(RESOLUÇÃO Nº125 CNJ, Art. 8º) a serem implantado nos tribunais onde existam mais
de uma vara, a partir da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil.
O CNJ define seu papel a partir do art. 167, § 3°, do Novo Código de
Processo Civil, e à realização de mediações e conciliações, na forma do art. 334, dessa
lei, com doze ações com objetivo de auxiliar os tribunais a organizar estes serviços com
a criação em rede de um “programa com o objetivo de promover ações de incentivo à
autocomposição de litígios e à pacificação social por meio da conciliação e da mediação”
(RESOLUÇÃO Nº125 CNJ, Art. 4º)
A Resolução dispões, entre outras ações, sobre o Cadastro Nacional de
Mediadores Judiciais e Conciliadores, e os cursos de capacitação, treinamento e
aperfeiçoamento de mediadores e conciliadores. Entre estas ações, uma das que mais
interessa neste trabalho faz referência a redação de um código de ética dos mediadores:
IV – regulamentar, em código de ética, a atuação dos
conciliadores, mediadores e demais facilitadores da solução
consensual de controvérsias; (RESOLUÇÃO Nº125 CNJ, Art.
6º)
Este Código de Ética está recolhido integralmente no Anexo 1 deste
trabalho.
21
4 - EMBASAMENTO LEGAL, OBJETIVOS E NORMAS QUE REGULARAM A
ÚLTIMA ETAPA DA OUVIDORIA AGRÁRIA NACIONAL (OAN) E A COMISSÃO
DE COMBATE AOS CONFLITOS NO CAMPO.
Segundo o Portal da Ouvidoria a missão da Ouvidoria Agrária Nacional
era:
Garantir os direitos humanos e sociais do homem no campo.
Instituída pelo Decreto Federal 5.033, que trata da estrutura
organizacional do Ministério do Desenvolvimento Agrário
(MDA), a Ouvidoria Agrária Nacional foi criada, nos termos do
disposto no artigo 5º, com o objetivo de prevenir e mediar os
conflitos agrários na zona rural. Suas ações são desempenhadas
de forma articulada com órgãos governamentais e não-
governamentais, por meio de parcerias firmadas em todo o País
e que resultaram na estruturação da rede de órgãos especializados
em questões agrárias. A atuação tem por finalidade garantir os
direitos humanos e sociais das pessoas envolvidas em conflitos
agrários no campo. Por meio da Ouvidoria Agrária Nacional, o
Governo Federal contribui, extrajudicialmente, na resolução e
prevenção dos conflitos agrários, de forma simples e sem
burocracia, afastando qualquer barreira que dificulte o
conhecimento das reclamações dos homens do campo.
(PORTAL DA OUVIDORIA)viii
Recriada nos moldes da última etapa pelo Decreto Federal 6.813 de 03 de
abril de 2009 de criação do Ministério de Desenvolvimento Agrário, a OAN dependia
da Secretaria Executiva (Art. 2º) e no artigo 5º definia as suas competências:
I –promover gestões junto a representantes do Poder Judiciário,
do Ministério Público, do Incra e de outras entidades
relacionadas com o tema, visando a resolução de tensões e
conflitos sociais no campo;
II –estabelecer interlocução com os governos estaduais,
municipais, movimentos sociais rurais, produtores rurais
sociedade civil visando prevenir mediar e resolver as tensões e
conflitos agrários para garantir a paz no campo;
III –diagnosticar as tensões e os conflitos sociais no campo, de
forma a propor soluções pacíficas;
IV –consolidar informações sobre tensões e conflitos sociais no
campo, com o objetivo de propiciar ao Ministro de Estado, ao
Presidente do Incra e a Outras autoridades subsídios atualizados
e periódicos para tomada de decisão; e
V –garantir os direitos humanos e sociais das pessoas envolvidas
em tensões e conflitos sociais no campo.” ix
(DECRETO FEDERAL 6.813)
Pelo objetivo definido no Artigo 5º II: “prevenir mediar e resolver as
tensões e conflitos agrários para garantir a paz no campo”, presidia a Comissão Nacional
22
de Combate à Violência no Campo (CNCVC), instituída pela Portaria Interministerial n.º
1.053, de 14 de julho de 2006:
Composta por representantes de órgãos oficiais que lidam com
questões agrárias e de segmentos da sociedade organizada, a
comissão foi criada com o objetivo de sugerir medidas para
prevenir, combater e reduzir as diversas formas de violência
praticadas contra trabalhadores rurais, proprietários rurais,
remanescentes de quilombos, ribeirinhos e atingidos por
barragens. A CNCVC elaborou e vem implementando as ações
do Plano Nacional de Combate à Violência no Campo. (Portal da
Ouvidoria)x
Entre outros foi criado o “Programa Paz no Campo”, coordenado pela
OAN, estabelecendo as seguintes ações:
Prevenção de Tensão Social no Campo: A Ouvidoria Agrária
Nacional promove o monitoramento das situações de tensão e
conflitos no campo, para conhecimento das realidades internas e
externas relacionadas a cada caso, diagnosticando as causas, de
modo a subsidiar as autoridades competentes na tomada de
decisões.
Capacitação de Mediadores de Conflitos Sociais: A Ouvidoria
Agrária Nacional realiza atividades de formação voltadas às
pessoas que atuam diretamente na mediação e prevenção dos
conflitos sociais, para aperfeiçoamento da ação destes agentes,
com o objetivo de alcançar eficiência na resolução dos conflitos
agrários.
Atendimento de Denúncias: A Ouvidoria Agrária recepciona,
apura e busca soluções para resolver as denúncias que envolvem
conflitos agrários pertinentes ao cumprimento das ações do Plano
Nacional de Reforma Agrária.
Mediação de Conflitos Agrários: Com a finalidade de buscar
solução negociada e dirimir pacificamente as desavenças
fundiárias e agrárias, a Ouvidoria intervém nos conflitos agrários
instalados.
Apoio à estruturação de Instituições de Prevenção e Combate
à Violência no Campo: A Ouvidoria Agrária busca apoiar a
estruturação de instituições que atuam no combate à violência no
campo. Por meio desta ação, procura garantir a solidez dos
diagnósticos sobre as situações de conflito agrário e a
consequente realização de atividades de prevenção e combate à
violência no meio. Promove, ainda, o atendimento relacionado às
denúncias que envolvam as questões agrárias, com o objetivo de
contribuir extrajudicialmente na resolução dos conflitos agrários.
Busca soluções pacíficas, de forma desburocratizada e
descentralizada, mediante parcerias com os estados, os
municípios e a sociedade civil organizada, em cumprimento aos
23
direitos humanos e sociais das pessoas envolvidas em conflitos
agrários.
Assistência Social, Técnica e Jurídica às Famílias
Acampadas: Cabe à Ouvidoria Agrária Nacional articular, junto
às diferentes esferas governamentais e não-governamentais, o
atendimento às famílias acampadas, diminuindo o impacto das
dificuldades enfrentadas. Desse modo, busca garantir o
cumprimento dos direitos humanos e o processo de formação
para inclusão social e produtiva dessas famílias. (PORTAL DA
OUVIDORIA)xi
24
5 - PARECER DE TRABALHADORES, ADVOGADOS, LIDERANÇAS E
AGENTES DA CPT DA AMAZÔNIA.
Metodologia utilizada.
Foi elaborado um questionário quantitativo com 96 perguntas fechadas
com quatro opções de resposta: Sim, Não, Mais ou Menos, Não sei. Nesta última opção
foram acrescentadas as perguntas que não obtiveram outras respostas. Apresentamos as
respostas feitas junto com o material extraído da obra de Luciana M. de Souza que
inspiraram e ajudaram a organizar as perguntas.
Sem dúvida a quantidade de perguntas foram excessivas, inclusive com
repetições temáticas, o qual prejudicou o número de respostas. Porém oferecem um
horizonte bem extenso pelo que respeita a temas e conteúdo.
Foram enviados e distribuídos questionários nos nove regionais da
Amazônia Legal da Comissão Pastoral da Terra, tanto de forma digitalizada como
impressa. Em total recebemos 14 respostas aos questionários elaborados. Foi
desconsiderado um questionário enviado com respostas apenas na metade das perguntas.
Enviaram respostas uma advogada popular, oito agricultores (entre eles qualificadas
lideranças de movimentos sociais), e cinco agentes de pastoral da Comissão Pastoral da
Terra. Deles dez (10) eram homens e quatro (04) mulheres. Geograficamente, a maioria
de respostas foram do Estado de Rondônia (08), do Pará (01), do Mato Grosso (03), e do
Acre (02).
A maioria dos que responderam tinham ótima qualificação para responder,
pois dez deles (10) tinham participado de mais de 05 reuniões da Comissão Nacional de
Combate à Violência, representando um bom conhecimento da experiência. Três (03)
respostas de pessoas que tinham participado entre 2 e 5 vezes. Apenas uma (01) resposta
com participação em uma única reunião.
Este universo mereceria uma análise por separado: O que pensam os
homens é o mesmo que as mulheres? Trabalhadores divergem da opinião de agentes de
pastoral e advogados? Os que têm mais experiência divergem daqueles que têm
participado de poucas reuniões? Porém não foi possível este estudo diferenciado.
25
Apresentamos apenas alguns comentários pontuais e sobre o total de
respostas por assuntos. Em resumo, representa um universo reduzido, porém bem
diversificado, qualificado e significativo da opinião dos agricultores, movimentos sociais
e agentes de pastoral. No final do questionário havia um pequeno espaço para respostas
abertas. Apenas duas respostas o utilizaram o espaço aberto com pequenos comentários
que recolheremos na análise de respostas.
Resultados da pesquisa.
1- Classificação de estratégias de um negociador (SOUZA P.18).
A través da classificação de estratégias de um negociador (competição,
concessão, evitar o confronto, busca do “meio-termo”, colaboração), sem relação direta,
foram inspiradas as cinco primeiras perguntas.
Na primeira se desprende, que para os agentes e agricultores consultados
predomina a opinião que não era sentida como maior preocupação da Ouvidoria o tema
as necessidades dos pequenos agricultores (Nº1); nem de melhorar o desempenho das
administrações públicas envolvidas nos conflitos no campo, com moderada atenção para
os assuntos tratados (Nº 2 e 3). É mais maioritária a opinião que se procurava deixar
satisfeitos os dois lados do conflito, a busca do meio termo (Nº 4); sem ter muito sucesso
no envolvimento da colaboração de todos para solucionar os conflitos (Nº 5).
Como vai ser uma constante na resposta aos questionários, a opinião de
alguns dos agricultores tende a ser mais positiva que a das lideranças, advogada popular
e agentes de pastoral.
Extratos do livro de SOUZA Perguntas apresentadas. SIM NÃO +/- ?
Estratégia da competição:
grande preocupação com as
metas pessoais e pouca
preocupação com as relações.
1 - O Ouvidor se preocupa com as
necessidades dos pequenos
agricultores?
3 5 6
Estratégia de concessão: pouca
preocupação com as metas
pessoais e grande preocupação
com as relações
2 - O Ouvidor se preocupa por
melhorar o desempenho do
INCRA e outras administrações?
4 4 4 2
26
Estratégia de evitar o
confronto: pouca preocupação
com as metas pessoais e pouca
preocupação com as relações.
3 - O Ouvidor dá a devida
importância aos assuntos tratados?
4 4 5 1
Busca do “meio-termo”:
preocupação moderada tanto
com as metas pessoais quanto
com as relações.
4 - O Ouvidor procura deixar
satisfeitos os dois lados dos
conflitos?
8 3 2 1
Estratégia de colaboração:
grande preocupação tanto com
as metas pessoais quanto com as
relações.
5 - A atuação da Ouvidoria
contribui para que todos
colaborem para achar soluções aos
conflitos?
5 6 3
2 - Técnicas e enfoques da mediação: modelos de mediação. (SOUZA, p. 20)
Sobre as técnicas e modelos de mediação, destaca o fato que nem sempre
ficava bem esclarecido o carácter de mediação negociadora das reuniões (Nº 6), e poucas
vezes se realizavam inicialmente reuniões privadas por separado (Nº 7), como parece ser
habitual em todos os modelos de mediação. Todas as respostas apresentam com mais
consenso a realização de sessões conjuntas com os dois lados envolvidos nos conflitos
(Nº8).
SIM NÃO +/- ?
Tanto os processos de
mediação como os de
conciliação seguem o mesmo
modelo: Iniciam-se com a
realização de uma sessão de
pré-mediação, onde são
explicados os objetivos e os
métodos do processo;
6 - Nas reuniões são
esclarecidos para todos os
participantes o que se está
tentando a negociação de
acordos para resolver conflitos?
6 6 1 1
Realizam-se sessões
individuais com cada um dos
lados envolvidos no conflito;
7 - Realizam-se reuniões
individuais (privadas)
separadas com os lados
envolvidos no conflito?
5 5 3 1
Realizam-se sessões
conjuntas com todos os lados
envolvidos no conflito
8 - Realizam-se sessões
conjuntas com todos os lados
envolvidos no conflito?
10 2 1 1
27
3 - Modelo de mediação voltada para problemas. (SOUZA p.20)
Em geral, no parece que a necessidade de terra dos pequenos agricultores
e a solução dos seus problemas sejam percebidas nas respostas como a principal
preocupação das Reuniões.
SIM NÃO +/- ?
O modelo de “mediação
voltada para a solução de
problemas”, primeiro tenta
separar as pessoas dos
problemas;
9 - Nas reuniões se foca na
situação legal das terras
disputadas, independente das
pessoas envolvidas?
2 6 3 1
Focar em interesses
(finalidade) e não em posições
(as pretensões das partes);
10 – Os trabalhadores sentem
que há preocupação para
resolver a necessidade deles de
terra para trabalhar?
6 6 2
Gerar propostas de soluções
criativas para o problema
(expandir a “torta” antes de
reparti-la);
11 - Nas reuniões aparecem
soluções novas que podem
ajudar a avançar a reforma
agrária?
4 8 2
Estabelecer parâmetros justos
e adequados para encontrar a
solução final (critérios para
“repartir a torta”).
12- A forma como são focados
os temas são justos e adequados
para os pequenos agricultores?
4 7 3
4 - Mediação facilitadora. (SOUZA, p.20)
Longe da unanimidade, na maioria das respostas predomina uma posição
crítica sobre a tarefa da mediação destinada a facilitar a superação dos conflitos. Ainda,
para a maioria delas, o mediador é mais visto como juiz que decide do que facilitador
intermediário (Nº 17).
SIM NÃO +/- ?
Ajuda a formular questões
(ajudando as partes a focar em
interesses e não em posições);
13 - A Ouvidoria ajuda a
repensar as posições dos dois
lados em conflito?
5 5 3 1
Identificar pontos em comum e
diferenças a serem trabalhadas
(ajudando-as a estabelecer uma
agenda);
14 - Há encaminhamentos
concretos para resolver os
problemas?
3 6 4 1
Ajudar as partes a elencarem
critérios objetivos para solução
do conflito,
15 - Fica mais claro para todo
o mundo quem tem direitos
legais ou não?
3 8 2 1
Pode o mediador apenas
orientá-las quanto ao caminho
de busca do acordo, mas não
quanto ao conteúdo dele.
16 - A Ouvidoria orienta com
respeito sobre as propostas de
acordos?
3 4 4 2
28
Ele não deve julgar os
parâmetros fornecidos pelas
próprias partes, nem o
comportamento passado delas.
17 - O Ouvidor parece mais
um juiz que decide, do que um
intermediário que propõe
acordos?
6 5 2 1
5 - Mediação avaliadora. (SOUZA, p. 21)
As reuniões da Comissão de Combate à Violência no campo parecem
seguir mais este modelo de mediação avaliadora, para o qual o fato do Ouvidor ser juiz
aposentado deveria obter uma boa posição (que não é valorizada o suficiente, pelo que
desprende das respostas à pergunta Nº 21). Obtém maioria a opinião das respostas nos
itens das perguntas Nº 19 e 29, sobre o fato da mediação aconselhar quando necessária
assessoria jurídica ou técnica. Porém a maioria de respostas são críticas sobre a melhoras
de expectativas dos agricultores após as reuniões (Nº 22), e sobre as propostas advindas
das reuniões, pois são consideradas que não melhoram as perspectivas das decisões
judiciais (Nº18), o qual representa uma dura crítica ao desempenho de qualquer mediação
extrajudicial.
SIM NÃO +/- ?
Fornece às partes uma previsão
quanto ao provável teor de uma
decisão proferida pelo juízo
competente, com o objetivo de fazer
com que estas caminhem
naturalmente para um acordo que
estabeleça uma solução que seja mais
confortável para ambas do que a que
decorreria do julgamento baseado em
critérios puramente legais.
18 - As propostas das
Reuniões costumam ser
melhores para os
agricultores do que as
decisões judiciais?
3 9 1 1
A avaliação não deve chegar a ser um
aconselhamento jurídico, Cabe ao
mediador, remeter as partes a esse
aconselhamento jurídico com
advogados sempre que for o caso,
19 - Quando preciso, a
Ouvidoria aconselha aos
agricultores a conseguir
atendimento de
advogados ou da
Defensoria Pública?
7 3 1 2
Assim como a necessidade de
eventual perícia técnica ou
aconselhamento psicológico, quando
necessário.
20 - Quando preciso, a
Ouvidoria cobra
informações ou perícias
técnicas aos órgãos
agrários (Incra, Terra
Legal, ...) ambientais e
outros?
6 3 3 2
Quando os mediadores são
provenientes da área jurídica
(especialmente quando se trata de
21 - O fato do Ouvidor
Agrário ser um
desembargador (juiz)
3 6 3 3
29
juízes aposentados) ... traz diversos
riscos ... (as partes) podem ficar
menos satisfeitas com o resultado.
aposentado, ajuda nas
Reuniões?
Os mediadores apontam, para cada
uma das partes, em sessões privadas,
os pontos fracos de seu caso
(aspectos que apresentam dificuldade
de prova, por exemplo), de modo a
diminuir suas expectativas
normalmente infladas quanto ao
possível ou provável resultado do
processo judicial.
22 - Os pequenos
agricultores têm melhores
expectativas depois das
reuniões?
3 6 4 1
6 - Mediação transformativa. (SOUZA, p. 22)
Os resultados das Reuniões de Combate à Violência são desmentidos na
prática pelo aumento de violência. Nos últimos anos não estavam conseguindo a redução
dos conflitos. É quase unanimidade dos resultados da pesquisa de opinião que não estão
contribuindo (p. 24).
Este é o teor de um dos poucos comentários ao pê de página dos
questionários: “Pra mim essa OAN não cumpre um bom papel, muito pelo contrário, e os
números mostram que os conflitos vêm aumentando.” Outro participante escreveu (sic)
“O Ouvidor Agrário faz oque? O SR está fazendo o que aí? No tó vendo os pequenos
produtores.” (Questionário 1º e 12º).
Apesar de conseguir mais ou menos a realização de acordos, não se
alcançava uma transformação profunda, no sentido de reduzir as injustiças e
desigualdades do campo, um “novo padrão de relacionamento” com relação aos
problemas específicos que geram os conflitos agrários.
SIM NÃO +/- ?
Essa solução, para a “mediação
transformativa” não reside na
simples obtenção de um acordo com
relação ao problema específico que
gerou o conflito, mas no
estabelecimento de um novo padrão
de relacionamento entre as partes, no
qual estas passem a ter condições de
gerar por si mesmas soluções para os
23 - Os resultados das
reuniões da Ouvidoria
oferecem soluções que
podem ser aplicadas para
outros conflitos agrários?
6 9
30
conflitos que naturalmente surgirão
ao longo de seu relacionamento.
Uma “transformação da situação que
gerou o conflito” (...) não se satisfaz
“com uma solução rápida que parece
resolver o problema imediato”, mas
busca “criar uma moldura capaz de
tratar do conteúdo, do contexto e da
estrutura do relacionamento.”
24 – As Reuniões estão
contribuindo para reduzir
a violência agrária?
2 10 1 1
“Al conflicto no se lo asume como un
problema, sino como una oportunidad
para el desarrollo moral, siendo que la
mediación es utilizada para
transformar a las personas,
ayudándolas a luchar con las
circunstancias difíciles y a establecer
un puente entre las diferencias
humanas durante las disputas.”
25 – As Reuniões ajudam
a reduzir as injustiças e
desigualdades do campo?
3 10 1
Quando, porém, o grau de
relacionamento é bastante reduzido, a
mediação focada basicamente na
realização de acordos pode ser
suficiente.
26 - As Reuniões
conseguem chegar a
realização de acordos?
4 3 6 1
7 - Mediação narrativa. (SOUZA, p. 24)
De novo as respostas estão longe da unanimidade sobre a influência das
Reuniões para melhorar a forma de atuar das autoridades e servidores públicos envolvidos
com os conflitos agrários. Cinco opinam que sim e sete que não, com margem de duas
respostas sem definição. Em todo caso, o crédito parcial ao trabalho da mediação em linha
transformativa da administração pública é considerado por alguns, porém negado por uma
maioria não muito grande.
SIM NÃO +/- ?
O objetivo da mediação pode ser
descrito, em apertada síntese, como
reinterpretar / reconstruir a visão das
partes em relação ao conflito, sendo
que isso é feito por meio do
questionamento de preconceitos
socioculturais das partes, mediante
intervenção ativa do mediador, que
não é considerado “neutro” ou
“objetivo”, mas sim deve também
questionar seus próprios estereótipos e
27 – As Reuniões têm
levado a melhorar a
forma de atuar das
autoridades e servidores
públicos envolvidos com
os conflitos agrários?
5 7 1 1
31
condicionamentos socioculturais
durante os trabalhos
8 - Campos de abrangência da mediação – Diferentes formas de enquadrar os
conflitos. (SOUZA, p. 25)
Uma maioria nítida acredita que o número de conflitos atendidos pela
Comissão Nacional de Combate à Violência prejudicou a qualidade do trabalho, ou pelo
menos restringiu as abordagens, levou a acordos pouco vantajosos e duradouros para os
pequenos agricultores, e não fortaleceu a identidade camponesa, nem a “luta pela terra”
dos movimentos sociais do campo (Nº 28, 29, 30). Mesmo assim, de forma significativa,
a maioria acredita que o trabalho da Comissão também não era bem visto por fazendeiros
e ruralistas (Nº31).
SIM NÃO +/- ?
Na prática, a maioria dos mediadores
acaba tendendo a uma abordagem
restrita, o que é encorajado
especialmente em programas que
trabalham com grande número de
conflitos.
28 - O número de
conflitos atendidos
prejudica a qualidade do
trabalho da Comissão de
Combate à Violência?
8 5 1
Uma abordagem restrita poderia
impedir as partes de tratarem de
interesses mútuos e permanentes, não
levando nunca a um acordo
duradouro e mutuamente vantajoso.
29 - Os acordos
alcançados têm sido
vantajosos e duradouros
para os pequenos
agricultores?
4 8 1
As emoções afetam (positiva ou
negativamente) nossa habilidade de
atingir os objetivos da negociação,
além de serem um meio de comunicar
valores que são relevantes para o
sentimento de identidade de cada uma
das partes no relacionamento
30 - O trabalho da
Comissão tem
fortalecido a “luta pela
terra” dos movimentos
sociais do campo?
5 6 2
O reconhecimento e domínio das
próprias emoções e o reconhecimento
e consideração das emoções da outra
parte estão no coração da solução do
conflito.
31 - O trabalho da
Comissão está bem visto
pelos fazendeiros e
ruralistas?
3 7 1 3
32
9 - Tipos de conflitos solucionáveis por mediação. (SOUZA, p. 27)
Este é um dos temas mais delicados e onde abundavam críticas ao trabalho
da Comissão. Sem se referir explicitamente à Comissão, a Subprocuradora da República
Deborah Duprat chegou a afirmar numa reunião que debatia a violência agrária em
Rondônia, (Porto Velho, 04/10/2016): “As mesas de diálogo com partes assimétricas são
um instrumento completamente perverso com os pequenos”. Fazia referência aos litígios
em situação de desigualdade entre as partes, fato habitual nas mesas de negociação sobre
conflitos agrários.
A opinião dos que responderam ao questionário é desencontrada. 04 acham
que a Comissão não sabe lidar com a desigualdade de poder entre camponeses,
autoridades e fazendeiros envolvidos em conflitos agrários. Três maios ou menos. Quatro
acham que sabe lidar sim. Outros três não respondem (Nº 32). Não está claro que este
assunto esteja bem resolvido, por tanto. Nem que a atuação da Ouvidoria nas reuniões da
Comissão contrabalance o desequilíbrio, facilitando o respeito e proteção dos direitos dos
pequenos agricultores (Nº 33).
Mesmo assim, vários defendem que as reuniões ajudam a equalizar o nível
de informação dos camponeses (Nº 34) e uma maioria concorda que pelo menos os
camponeses podem se expressar efetivamente nas reuniões, apesar de que alguns (02)
acham que não, e outros que apenas mais ou menos (05), (Nº 35).
Quase ninguém defende que outras alternativas sejam oferecidas para eles,
e uma clara maioria acredita que existem conflitos muito graves onde não é recomendável
a mediação por falta de diálogo e de boa fé das partes (N. 36 e 37).
SIM NÃO +/- ?
Há quem levante dúvidas sobre a
possibilidade/adequação de sua
utilização em conflitos nos quais as
partes em litígio estejam em situação
de desigualdade.
32 - A mediação da
Comissão sabe lidar
com a desigualdade de
poder entre os
envolvidos em um
conflito agrário
(fazendeiros,
autoridades e
camponeses)?
4 4 3 3
A forma de atuação do mediador deve
buscar contrabalançar este
desequilíbrio, já que ele pode afetar a
33 - A atuação da
Comissão facilita o
respeito e proteção dos
6 7 1
33
capacidade de participação da parte
com menor poder de construção da
solução consensual.
direitos dos pequenos
agricultores?
O processo de mediação pode e deve
ser delineado de forma a garantir - que
o nível de informação e sua respetiva
compreensão seja equalizada.
34 – As Reuniões
ajudam os camponeses a
ter melhor nível de
informações sobre os
conflitos que enfrentam?
6 5 2 1
- que a oportunidade de expressar os
interesses de cada uma das partes seja
efetivamente garantida;
35 - A Comissão ouve e
atende os pequenos
agricultores, que podem
se expressar
efetivamente nas
reuniões?
6 2 5 1
- que o diálogo seja conduzido de
forma a assegurar que todas as partes
envolvidas tenham consciência dos
interesses em jogo e de suas
alternativas para uma solução
consensual.
36 - Os pequenos
agricultores
compreendem as
alternativas possíveis
em jogo?
2 6 5 1
Em realidade, nos casos em que já
diferenças extremas nas relações de
poder entre as partes ou eventualmente
um histórico de conflitos que
inviabilize qualquer diálogo (como se
dá na hipótese da prática de crimes
graves), costuma-se entender que a
mediação não é o caminho mais
adequado, dada a impossibilidade real
de se trabalhar num contexto de
autêntico diálogo, de verdadeira
autonomia das partes.
37 - Existem conflitos
muito graves onde não é
recomendável a
mediação da Comissão
Nacional de Combate à
Violência Agrária?
7 2 5
Também se torna inviável a mediação
se não houver a necessária boa-fé das
partes envolvidas no conflito.
38 - Existe a necessária
boa fé de todas as partes
para procurar a solução
dos conflitos?
4 10
10 - Critérios para a construção de acordo na mediação. (SOUZA, p. 30)
Se os parâmetros legais não podem ser ignorados na construção dos
acordos, isso não parece que seja atendido por todos os casos, a julgar pela falta de
unanimidade nas respostas acerca da legalidade dos acordos alcançados pela Ouvidoria
(Nº39).
SIM NÃO +/- ?
Não é possível porém ignorar o papel
dos parâmetros legais na construção
do acordo.
39 - Os acordos
alcançados pela
Comissão seguem os
parâmetros legais?
4 4 4 2
34
11 - Dinâmica de poder específica ao conflito em questão: Poder procedimental
(SOUZA, p. 35)
Esta série de perguntas faz mais relação a pessoa do mediador, no caso o
Ouvidor Agrário Nacional, que presidia as reuniões. Maioria de participantes da pesquisa
(porém nem a metade das respostas) consideram que o Ouvidor é uma pessoa com
suficiente preparação (informação e expertise) nos assuntos agrários (Nº 40). Muitos se
abstêm em responder se ele é amável, íntegro, paciente, se sabe convencer, se tem
educação, profissionalidade, integridade, etc. (Nº 42, 43, 44, 45, 46, 47)
Há tendência maioritária a considerar que dá impressão de ser não
favorável aos pequenos, é dizer, que os camponeses já entravam com a expectativa que
vai apoiar a parte contrária (Nº 48). Ainda, uma maioria clara (08) opina que ele não se
comprometia suficientemente na resolução dos problemas.
Não há muitos que queiram se pronunciar sobre suas habilidades de
negociador, nem sobre sua utilização dos recursos da Ouvidoria, nem sobre outras
alternativas (Nº49, 51, 52). Ainda, muitos acreditam que apesar de ser apenas Ouvidor,
ele tinha poder para pressionar, punir ou beneficiar os camponeses (Nº 50).
SIM NÃO +/- ?
1. Informações e expertise
no assunto
40 – O Ouvidor Agrário Nacional é
uma pessoa com suficientes
informações e preparação sobre os
assuntos agrários?
5 4 2 3
2. Compromisso (foco no
assunto)
41 - Ele se compromete de forma
suficiente na resolução dos
problemas?
4 8 2
3. Poder pessoal:
a. boa aparência e
amabilidade
42 - Ele tem boa aparência e é
amável?
2 5 1 6
b. integridade 43 - Ele é integro? 1 2 2 9
c. paciência 44 - Ele é paciente? 4 4 6
d. eloquência 45 - Ele sabe convencer? 5 3 6
e. educação 46 - Ele é educado com todo o
mundo?
4 3 2 5
35
f. ocupação profissional 47 - Ele tem dedicação e
profissionalidade?
3 1 3 6
4. Expectativas de
aprovação da parte
contrária
48 - Ele dá impressão de ser
favorável aos pequenos?
2 6 2 4
5. Habilidades de
negociação e estilo
49 - Ele tem estilo e habilidades
para negociação?
3 3 3 5
B. Poder substancial:
1. Poder coercitivo e
retributivo
50 - Ele tem poder para pressionar,
punir ou beneficiar os camponeses?
6 5 3
2. Controle dos recursos
(poder econômico)
51 - Os recursos da Ouvidoria são
usados a favor dos camponeses?
1 5 2 6
3. Alternativa a uma
solução negociada
52 - Se não negociar com a
Ouvidoria a situação fica pior?
3 4 2 5
12 - Contexto do relacionamento (SOUZA, p. 35)
Uma maioria clara afirma desconhecer o seu trabalho anterior ao da Ouvidoria
(Nº 53). Consideram com bastante positiva sua firmeza, estabilidade emocional e trato
equânime de gênero. Porém as quatro mulheres participantes negam que fossem
tratadas da mesma forma homens e mulheres. E uma maioria não considera que já não
era boa a reputação dele entre os movimentos sociais e pequenos agricultores.
A. Precedentes. 53 - Foi bom o trabalho do Ouvidor
Nacional antes de entrar na
Ouvidoria?
3 1 9
B. Poder psicológico:
1. Autoestima
54 - O Ouvidor apresenta autoridade
e firmeza?
5 2 1 6
2. Estabilidade emocional 55 - Ele mostra estabilidade
emocional?
6 2 1 5
3. Dinâmica de gênero 56 – Ele trata homens e mulheres do
mesmo jeito?
6 4 4
C. Legitimidade:
1. Autoridade
57 - Ele tem autoridade para atuação
na Ouvidoria?
6 3 5
2. Reputação 58 - Ele tem boa reputação entre
movimentos sociais e pequenos
agricultores?
3 5 3 3
11 - Os riscos envolvidos no processo de mediação (SOUZA, p. 36)
36
Alguns acreditam que sim, porém a metade (06+01) acham que Incra e
Terra Legal não facilitavam o trabalho da Comissão (n.59). Muitas vezes faltavam
informações necessárias para se firmar acordos esclarecidos. Também a maioria
concordou que a urgência de soluções precipitava o trabalho da Comissão (Nº60).
Um ponto positivo reconhecido era a participação das autoridades da
administração (Nº 61), tal vez depois de bastante insistência por parte da Ouvidoria.
Uma parte crucial é a aceitação do judiciário dos acordos firmados nas atas
das Reuniões. Uma ligeira maioria é negativa (Nº 62). Esta é uma parte que compromete
completamente o trabalho da mesma. Se depois os juízes se negavam aceitar os acordos,
para que servia então à mediação da Comissão?
Ainda uma parte importante dos riscos envolvidos no trabalho de
mediação, diz respeito a “efeitos indesejados” da mesma. Pelo menos metade das
respostas (07) concordam que as reuniões tinham efeitos indesejados (Nº 63). Uma das
piores críticas ao trabalho das Reuniões da Comissão é o fato de que participantes
sofreram repressão posteriormente. Alguns camponeses que se significaram em suas
denúncias e liderança posteriormente foram atacados e vários assassinados logo depois
de ter participado das Reuniões. As reuniões serviram para serem identificados com mais
clareza.
Participar das Reuniões da Comissão era perigoso. Élcio Machado e
Gilson Gonçalves, foram torturados e mortos em 08 dezembro de 2009 poucos dias após
uma Reunião; e a Liga dos Camponeses Pobres (LCP) difundiu que foi na Reunião com
a Ouvidoria Agrária Nacional que as lideranças foram identificadas como lideranças
pelos pistoleiros do fazendeiro Dílson Cadalto.xii
Outras mortes foram registradas após as
Reuniões da Ouvidoria, como um casal de sindicalistas em Guariba, Colniza MT em
2014;xiii
assim como a morte de Paulo Justino Pereira em Rio Pardo, distrito de Porto
Velho, assassinado o dia 01 de maio de 2015, dois dias depois de participar de uma
Reunião da Comissão em Porto Velho, os dias 29 e 30, (na última das quais o autor deste
trabalho estava presente).
Havia quem com ironia perguntava-se quem seria o próximo a morrer
depois das Reuniões da Ouvidoria. Estas mortes foram efeitos não planejados das
Reuniões ou simplesmente violência que não tinha conseguido evitar? Algumas
lideranças, quando mais participavam das reuniões da Ouvidoria, mais recebiam ameaças.
37
Estava claro que a participação nas Reuniões supunha uma exposição que podia
comprometer gravemente a segurança dos participantes.
SIM NÃO +/- ?
Difícil o acesso às
informações necessárias
para se firmar um acordo
esclarecido,
59 - O Incra, Terra Legal ou outros
organismos facilitam o trabalho da
Comissão?
4 6 1 3
Maior a pressão pelo
acordo em uma situação de
dificuldade para fazer face
aos custos do processo
60 - A urgência de soluções precipita
o trabalho da Comissão?
7 1 1 5
A dificuldade de se
identificar a pessoa
responsável por firmar o
acordo dentro de...
entes governamentais;
61 - As autoridades da administração
participam e aceitam as Reuniões?
8 2 2 1
Eventual resistência do
Judiciário à execução de
acordos firmados em
processos de mediação
62 - O Judiciário aceita à execução
de acordos firmados nas atas da
Comissão?
5 6 1 2
63 - As reuniões provocam efeitos
indesejados?
7 3 2 2
12 - Facilitação de processos decisórios participativos. (SOUZA, p. 38)
A opinião majoritária é negativa sobre a obtenção de resultados, e o
objetivo das Reuniões facilitar os processos decisórios participativos sobre o tema da
violência, dos conflitos agrários, da justiça no campo e da reforma agrária. (Nº 64 à 67).
SIM NÃO +/- ?
Utilizados seja quando estão
envolvidos apenas entes
públicos que pretendem atuar
de forma colaborativa, seja
quando estão sendo realizadas
reuniões públicas ou quando
está sendo buscada pelo Poder
Público uma solução negociada
com todos os interessados
64 - As reuniões da Comissão
ajudam a reduzir violência?
3 8 2 2
65 - As reuniões da Comissão
ajudam a resolver conflitos?
3 6 2 2
66 - As reuniões da Comissão
ajudam a conseguir mais justiça
no campo?
6 8 1
67 - As reuniões da Comissão
ajudam a avançar na reforma
agrária?
3 8 1 2
38
13 - Os mediadores (ritmo de trabalho) (SOUZA, p. 40)
Não há tendência muito clara de opinião sobre a pressão por resultados
acima da Comissão (Nº 68). Também não fica claro que fosse atendido todo o mundo que
o solicitava (Nº69). Tal vez porque havia muita demanda (aí concorda a maioria, no Nº
70), o qual também prejudicava os resultados (Nº 71)
SIM NÃO +/- ?
Ritmo de trabalho. O
mediador institucional é
apressado, pelo organismo que
o colocou no lugar, para
encontrar resultados, para
chegar a soluções o mais
rapidamente possível
68 – A Comissão atua apressada
pelo governo para obter
resultados?
5 5 2 2
69 - É atendido todo o mundo que
o solicita?
4 5 2 3
70 - Há muitas demandas de
intervenção da Ouvidoria?
7 3 4
71 - Os resultados são
prejudicados pela demanda?
6 2 2 5
14 - Os mediadores. (Diretrizes éticas) (SOUZA, p. 40)
Um dos últimos blocos de perguntas faz referência as diretrizes éticas da
mediação. O tema da desigualdade ou assimetria das partes é retomada nas diretrizes
éticas, como uma obrigação de ser contrastada pelo mediador. Não é isso que sentem a
maioria dos participantes que expressaram sua opinião (Nº 72). Mas a imparcialidade é
sentida pela maioria (Nº 73), que acredita que o Ouvidor tinha suficientes garantias para
participar com liberdade e segurança das Reuniões da Comissão Nacional de Combate à
Violência.
SIM NÃO +/- ?
1 A imparcialidade
(neutralidade) se desdobra no
dever, do qual trataremos mais
adiante, de buscar um maior
equilíbrio de poder entre as
partes,
quando a assimetria é muito
significativa.
72 - Os mais fracos são
fortalecidos as reuniões da
Comissão?
3 6 1 4
“O mediador deverá conduzir a
mediação de forma imparcial e
evitar conduta que dê a
73 - Há suspeitas de favoritismo
da Comissão, preferência ou
preconceito, atribuição de
4 6 4
39
aparência de parcialidade”
“dever de o mediador recusar a
função quando presentes
conflitos de interesse entre ele e
ao menos uma das partes”
diferente valor as diversas partes
envolvidas nos conflitos?
“Dever de atuar com liberdade,
sem sofrer qualquer pressão
interna ou externa, sendo
permitido recusar, suspender ou
interromper a sessão se
ausentes as condições
necessárias para seu bom
desenvolvimento”
74 - Há suficientes garantias para
o Ouvidor e todos participar com
liberdade e segurança das
Reuniões da Comissão Nacional
de Combate à Violência?
7 6 1
“Tampouco
havendo obrigação de redigir
acordo ilegal ou inexequível”
75 - Às vezes a Comissão aceita
acordos de duvidoso
cumprimento?
7 3 4
15 - Os mediadores. (Diretrizes éticas) (SOUZA, p. 45)
Apenas a pergunta sobre a capacidade e qualificação do Ouvidor para
realizar a mediação das Reuniões recebeu resposta majoritária (Nº 77. Nos itens restantes
a maioria das considerações é ligeiramente negativa (Nº 76, 78, 79, 80, 81, 62, 83).
SIM NÃO +/- ?
Dever de respeitar a autonomia das
partes. O Código do CONIMA
dispõe, em seu subitem IV, 9, caber
ao mediador: “9. Eximir-se de forçar
a aceitação de um acordo e/ou tomar
decisões pelas partes.”
76 - Os camponeses são
forçados a tomar decisões
e acatar acordos contra sua
vontade nas Reuniões da
Comissão?
5 6 2 1
1.8.1.3. Deveres de competência e
diligência: “a capacidade para
efetivamente mediar a controvérsia
existente”. Assim, o mediador
“somente deverá aceitar a tarefa
quando tiver as qualificações
necessárias para satisfazer...
77 - O presidente das
Reuniões tem a
capacidade, suficiente
qualificação e atualização
necessária para mediar nos
conflitos de violência no
campo?
6 4 1 1
... as expectativas razoáveis das
partes”.
78 - As expectativas dos
agricultores são satisfeitas
pelas Reuniões da
Comissão?
4 7 1 2
“O mediador somente deverá aceitar
casos quando possa satisfazer às
razoáveis expectativas das partes no
que diz respeito à duração do
processo de mediação.”
79 - Os assuntos são
encaminhados e resolvidos
em prazo de tempo
razoável?
3 7 3 1
Dever de alertar as partes sobre a
necessidade de perícia técnica ou
80 - Os agricultores
recebem auxilio para
4 5 3 2
40
assessoramento de terceiros. Cabe ao
mediador: “Sugerir a busca e/ou a
participação de especialistas na
medida em que suas presenças se
façam necessárias a esclarecimentos
para manutenção da equanimidade”.
receber as informações
corretas (Incra, etc.) sobre
a situação legal e jurídica
das áreas em conflito?
Uma das regras que regem o
procedimento de
conciliação/mediação, a
“desvinculação da profissão de
origem”, que consiste no dever que
possui o mediador ou conciliador de
“esclarecer aos envolvidos que atua
desvinculado de sua profissão de
origem”
81 - Os agricultores
acreditam as Reuniões da
Comissão estarem
presididas por um
desembargador com poder
de juiz?
4 8 1
5. Dever de zelar pelo equilíbrio de
poder entre as partes. Ética de
Mediadores do CONIMA, em seu no
subitem V, 8, dispõe caber a ele:
“Suspender ou finalizar a mediação
quando concluir que sua continuação
possa prejudicar qualquer dos
mediados ou quando houver
solicitação das partes.”
82 – Eles são alertados se
a Reunião pode prejudicar
aos camponeses?
4 8 3
“Se uma das partes aparentar ter
dificuldades em compreender o
processo, as questões nele envolvidas
ou as possíveis opções de acordo que
se apresentam, ou dificuldades em
participar do processo, o mediador
deverá explorar as circunstâncias e
possibilidades de ajuste ou
modificações que tornem possível a
esta parte compreender, participar e
exercer sua autodeterminação.”
83 - Os camponeses que
tem dificuldades recebem
suficiente auxílio para
compreender, participar e
decidir?
3 9 2
16 - Os mediadores. (Diretrizes éticas) (SOUZA, p. 52)
A lei da transparência da administração pública obriga a divulgar tudo que
é tratado nas Reuniões da Comissão de Combate à Violência? Há maioria clara que
concorda na necessidade de maior sigilo nas Reuniões (Nº 84), ainda que a transparência
na condução do processo é suficiente (Nº 85). De falta de cumprimento dos acordos, o
que compromete sua viabilidade (Nº 86); e também pela necessidade de zelar melhor dos
interesses dos terceiros ausentes (Nº 87).
SIM NÃO +/- ?
41
Confidencialidade, tanto quanto ao que
foi ventilado na sessão conjunta quanto
nas sessões individuais, estipulando
como únicas exceções o consentimento
das partes ou a existência de legislação
em contrário.
84 - O que é tratado e
ventilado nas Reuniões e
pedidos à Ouvidoria
deve ser tratado com
maior sigilo?
9 3 1 1
Transparência na condução do
processo. Transparência do mediador
envolve compartilhar com as partes
aquilo que o mediador acredita ser o
melhor passo a ser dado em seguida,
85 - Há suficiente
transparência nas
providências tomadas
pela Comissão, para que
posteriormente possam
ser acompanhadas pelos
grupos que participam?
7 5 2
Dever de zelar pela viabilidade do
cumprimento do acordo. Deve
estabelecer de forma clara quais são as
obrigações, a quem compete cada uma
delas, onde, quando e de que forma
devem ser cumpridas, quem vai
monitorar este cumprimento e o que
acontece caso ocorra descumprimento.
86 - As obrigações
costumam ser definidas
e cumpridas nos acordos
alcançados nas Reuniões
da Comissão?
3 8 1 1
Dever de zelar pelos interesses de
terceiros afetados. Trata-se da
responsabilidade do mediador perante
“as partes não presentes à mesa”.
87 - Quem não pode
estar presente na
Reunião costuma sair
prejudicado?
6 2 2 4
17 - Fundamentos jurídicos e principais previsões normativas sobre resolução
consensual de conflitos envolvendo o Poder Público no Brasil. Fundamentos
constitucionais. (SOUZA, p. 63)
Ao final, predomina a desalentadora opinião que a mediação exercida pela
Ouvidoria Agrária através das Reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência
não agilizava a resolução dos conflitos (Nº 88); nem representava economia de recursos
econômicos para isso (Nº 89); não conseguia resultados razoáveis (Nº 90); nem fortalecia
a confiança dos agricultores na justiça e no Estado de Direito (Nº 91).
SIM NÃO +/- ?
a) o princípio do acesso à justiça (art.
5º., XXXV, da Const. Federal), que
exige a disponibilização de métodos
adequados
b) o princípio da eficiência (art. 37,
caput), que demanda sejam os
conflitos resolvidos (sob os aspectos
temporal) menos tempo, menos
desgaste para a relação entre as
partes
88 - As Reuniões da
Comissão Nacional de
Combate à Violência
agilizam a resolução de
conflitos?
3 7 3 1
42
(Econômico) da forma que apresente
a melhor relação entre custo e
benefício, ou seja, menores custos,
89 - As Reuniões da
Comissão conseguem
economizar recursos
públicos para resolução
de conflitos?
2 6 1 5
E de resultados) e melhores
resultados para ambas partes,
90 - As Reuniões da
Comissão obtêm
resultados razoáveis
para resolução de
conflitos?
3 5 2 3
c) o princípio democrático, (art. 1º.),
que decorre de o Estado não ser um
fim em si mesmo e reclama portanto
que, quando o Poder Público se veja
envolvido em conflitos com
particulares, ...para encontrar uma
solução adequada para o problema.
91 - As Reuniões da
Comissão fortalecem a
confiança dos
agricultores na justiça e
no Estado de Direito?
5 7 1 2
18 - Peculiaridades da resolução consensual de conflitos envolvendo o Poder
Público. (SOUZA, p. 66)
Algumas destas características insistem em pontos já contemplados:
Princípio de legalidade; Isonomia (cria precedentes); Publicidade como regra,
confidencialidade quando justificada... A opinião que prevalece é que estes princípios não
eram suficientemente cumpridos (Nº 92, 93, 94, 95).
SIM NÃO +/- ?
Princípio da legalidade (ou da
juridicidade) a verificação das
normas jurídicas aplicáveis ao caso é
apenas o ponto de partida da
negociação, a moldura que lhe traça
os limites. Por tal razão, todos os
acordos envolvendo o Poder Público
devem ser devidamente
fundamentados ... e se sujeitam a
controle interno e externo de
juridicidade.
92 - Os acordos
alcançados contemplam
os princípios legais?
2 6 2 4
O princípio da isonomia. O Poder
Público, quando firma um acordo,
...está estabelecendo um precedente –
ou seja, todo aquele que se veja em
conflito com ente público na mesma
situação ou em outra muito similar
terá pleno direito de invocar para si a
mesma solução,
93 - Os acordos
alcançados têm validade e
aplicação para solucionar
outros conflitos
semelhantes?
4 7 3
O princípio da publicidade, quando
se pensa em resolução consensual de
94 - As Reuniões e
acordos obtém a
necessária publicidade?
2 4 2 6
43
conflitos envolvendo o Poder
Público, a publicidade é a regra;
... a confidencialidade é a exceção e
precisa ser juridicamente justificada.
95 - Se aceita respeitar a
confidencialidade quando
necessária?
4 6 4
19 - Os (falsos) argumentos contrários à consensualidade na esfera pública. (SOUZA,
p. 68)
Quando Luciana M. Souza combate alguns argumentos contrários a mediação na
esfera pública, cita elementos interessantes para a realização das Reuniões da Ouvidoria:
Muitas vezes os desdobramentos podem acabar sendo reuniões posteriores do INCRA ou
outra administração com os interessados, que faz uma mediação com terceiros (opinião
polêmica nos resultados da pergunta Nº 96). Ainda, nas respostas há opinião maioritária
de que das decisões das Reuniões, os bens comuns indisponíveis, como meio ambiente
ou terras públicas, muitas acabavam sendo prejudicadas pelos acordos alcançados (Nº
97).
SIM NÃO +/- ?
Quando a desigualdade torna
inadequada a negociação direta entre
as partes, mas torna altamente
recomendável a utilização da
mediação, que é a negociação
facilitada por um terceiro.
96 - As Reuniões
incentivam a realização
de negociações por
separado com as partes
(por ex. do INCRA com
camponeses ou
fazendeiros)?
4 5 5
O nosso legislador já reconheceu
implicitamente inúmeras vezes que
indisponibilidade não se confunde
com intransigibilidade, ao admitir a
utilização da negociação em uma
série de conflitos que envolvem
direitos indisponíveis, de natureza
pública e difusa inclusive
97 – Bens de todos,
como terras públicas e
meio ambiente são
prejudicados pelos
acordos?
7 3 1 3
44
6 – HISTÓRICO E EXTINÇÃO DA OUVIDORIA AGRÁRIA NACIONAL.
Capítulo aparte significativo são as reações publicadas em dezembro de
2016 após a extinção da Ouvidoria Agrária Nacional. Para o pesquisador que a duras
penas consegue umas linhas escritas sobre o tema de seu estudo, as manifestações
aparecidas sobre a Ouvidoria após sua extinção são valiosas contribuições ao seu trabalho.
O Ouvidor Agrário a finais de outubro de 2016, pouco antes da extinção
da Ouvidoria já havia declarado não dispor de recursos orçamentários para realização de
patrulhas rurais em áreas de conflito em Anapu, Pará,xiv
após ataques de jagunços
incendiando acampamentos de sem-terra na região.
No momento não há disponibilidade financeira na ação
orçamentária gerenciada por esta Ouvidoria Agrária Nacional,
impedindo, assim, o repasse de recursos financeiros para apoiar
a realização da patrulha rural em questão, como vinha
acontecendo até agora", declarou Gercino, na mensagem enviada
ao governo paraense. (BORGES, A.)
Os conflitos de Anapu podem ter sido determinantes da extinção da
Ouvidoria, pois o ano anterior já tinham motivado duras críticas dos ruralistas contra o
Ouvidor, após o mesmo ordenar a expulsão da advogada da federação de associações
ruralistas paranaenses, FAEPA, Keila Souza, e fazendeiros da região que constrangiam o
depoimento dos camponeses sobre seis mortes de camponeses na região. Eles foram
recebidos em reunião por separado no dia posterior. Porém isso não evitou que o Ouvidor
fosse acusado de “abuso de autoridade”, de “não cumprir com o direito à liberdade de
expressão e ignorar a legitimidade dos produtores rurais”, de “arrogância” “insegurança
e desequilíbrio emocional”.xv
Em Nota Oficial assinada posteriormente pelo presidente
da FAEPA, Carlos Fernandes Xavier, chega a qualificar de “circo” as Reuniões da
Comissão, abunda em ataques pessoais ao Ouvidor Agrário, e conclui:
Vimos a público denunciar esses desmandos, práticas
antidemocráticas, violência e desrespeito com as prerrogativas
constitucionais garantidas a todos os advogados no exercício de
suas funções. Exigimos da Ordem dos Advogados do Brasil, do
Tribunal de Justiça do Estado, do Comando da Polícia
Rodoviária Federal e do próprio Conselho Nacional de Justiça (a
quem estamos nos dirigindo, denunciando o abuso de um
servidor do Executivo que se faz passar por magistrado) as
providências cabíveis para que se restabeleça o Estado
Democrático de Direito no Pará. (NOTA OFICIAL DA FAEPA
de 01/12/2015)
45
Recolhemos a Nota inteira no Anexo 3 para comprovar o nível de rejeição
do setor ruralista contra a Ouvidoria. Não foi o primeiro enfrentamento com os ruralistas.
Um ano depois o conflito em Anapu continuava, porém a Ouvidoria já não tinha mais
recursos para ajudar as forças policiais a tentar frear a violência na região. Pouco depois
a Ouvidoria seria extinta provocando a reação dos movimentos sociais e personalidades
da esquerda.
Alguns traços históricos da Ouvidoria. Não localizei muitas informações sobre
a história da Ouvidoria, desde a sua criação em tempos do presidente Fernando Henrique
Cardoso, segundo José de Souza Martins, MOTIVADA PELA política agrária de
“Distribuir a terra e distribuir a paz social, ao mesmo tempo, atenuando e reduzindo a
conflitividade dos confrontos sociais que tem a disputa pela terra como causa.” (MARTINS.
2003). Segundo uma matéria de 24 de março de 2002:
Gercino Alves foi convidado por Raul Jungmann para o cargo de ouvidor
depois que o desembargador foi ameaçado de morte por ter determinado
a prisão do ex-deputado Hildebrando Pascoal, acusado de chefiar um
grupo de extermínio no Acre. Sua função no Incra era viajar pelo país e
servir de canal de comunicação entre sem-terra e governo. (FOLHA,
2002)
Diversas fontes citam a origem na criação do próprio Ministério de
Desenvolvimento Agrário pelo decreto nº 1.888, de 29 de abril de 1996. Primeiro foi
criado o cargo de ouvidor agrário. No Decreto no 3.338, de 14 de janeiro de 2000 e no
Decreto nº 4.723, de 6 de junho de 2003 existe apenas a figura de Ouvidor Agrário, ligado
à Secretaria de Reforma Agrária dentro da estrutura do Ministério de Desenvolvimento
Agrário. Já no Decreto nº 5.033, de 5 de abril de 2004, por primeira vez aparece a OAN
denominada como: “Departamento de Ouvidoria Agrária e Mediação de Conflitos”.
Como citado, na última etapa foi definida pelo Decreto Federal 6.813 de 03 de abril de
2009, formando parte do Ministério de Desenvolvimento Agrário, onde a OAN dependia
diretamente da Secretaria Executiva.
- Desautorizada pelo próprio governo federal. Já desde o início parece que a
atuação da Ouvidoria não foi sem polêmica. Um dos episódios críticos aconteceu por
motivo da ocupação Córrego da Ponte, em Buritis, MG, fazenda propriedade dos filhos
do Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, em março de 2002. Segundo
informações de Renata Giraldi e Sandro Lima:
46
Após 14 horas de tensa negociação e da saída dos sem-terra da
fazenda Córrego da Ponte, propriedade dos filhos do presidente
Fernando Henrique Cardoso, em Buritis (MG), a Polícia Federal
deteve ontem 16 líderes da invasão.
A prisão contrariou acordo mediado por agentes do governo, que
se demitiram, em protesto. O trato viabilizou a retirada pacífica
dos invasores. (GIRALDI, 2002)
Tinham negociado o acordo com o MST o ouvidor agrário, Gercino José
da Silva e a ouvidora substituta, Maria de Oliveira, que “Previa a retirada pacífica dos
sem-terra. Em troca, os líderes não seriam presos e seriam recebidos pelo ministro do
Desenvolvimento Agrário, Raul Jungmann.” (GIRALDI, 2002) Traído o acordo com a
prisão de 16 lideranças do MST, eles se declararam indignados:
A ouvidora substituta, Maria de Oliveira, disse que a Ouvidoria
Agrária Nacional foi traída. "Estou indignada, a negociação feita
por mim não foi cumprida. A prisão foi desnecessária". Frustrado
com o resultado da operação, o ouvidor agrário nacional, Gercino
José Alves, acompanhou a colega: "Estamos exonerados",
afirmou. (GIRALDI, 2002).
Não sabemos como se saldou o incidente, porém pelo menos Gercino,
continuou na Ouvidoria. Um dos frutos da colaboração com Jungmann foi a edição da
MP n° 2.027/38 (depois MP n° 2.183):
Essa MP proíbe, por dois anos, as avaliações e vistorias em terras
invadidas e exclui do Programa de Reforma Agrária os que
participarem de ocupações, além de suspender os processos em
tramitação durante as ocupações. Esse dispositivo vinha sendo
apontado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e
pelo presidente do Incra como um empecilho para a Reforma
Agrária. No entanto, os estudos para sua revogação estão, pelo
menos por enquanto, suspensos, a fim de manter sob controle a
desconfiança dos ruralistas em relação ao governo petista. (IPEA,
2003 p. 101)
Efetivamente, a redação da MP n. 2.183 incrementou o §6 do Art. 2º da Lei nº
8.629/1993:
§ 6o
O imóvel rural de domínio público ou particular objeto de
esbulho possessório ou invasão motivada por conflito agrário ou
fundiário de caráter coletivo não será vistoriado, avaliado ou
desapropriado nos dois anos seguintes à sua desocupação, ou no
dobro desse prazo, em caso de reincidência; e deverá ser apurada
a responsabilidade civil e administrativa de quem concorra com
qualquer ato omissivo ou comissivo que propicie o
descumprimento dessas vedações. (LEI 8.629/1993)
Restrição frequentemente utilizado pela Ouvidoria no sentido de coibir ocupações
de terra. Lembro quando no transcurso de uma reunião da Comissão em Porto Velho em
2014, uma ligação ao Ouvidor do superintendente regional do INCRA interrompeu a
reunião, para anunciar que 300 pessoas do Acampamento Hugo Chávez do MST estavam
avançando pela BR-364 para a sede da Fazenda Nova Vida. Gercino mandou recado:
47
“Diga para eles que se ocupar vai ser um tiro no pé”. Referindo-se ao dispositivo citado,
por mais que em determinadas situações, ele foi contornado. Por exemplo, em
Corumbiara, os ocupantes da LCP aceitaram montar seu acampamento para dormir fora
da área, mesmo trabalhando no interior da mesma, para permitir a vistoria do INCRA.
Porém a manutenção deste dispositivo legal acabou emperrando a solução de muitos
conflitos, e em vez de impedir as ocupações, contribuiu para a radicalização dos métodos
de ocupação.
- Criticada e criminalizada pela CMI da Terra. Outro episódio delicado da
Ouvidoria foi registrado no Congresso Nacional, por motivo da Comissão Parlamentar
Mista de Inquérito “da Terra”, que iniciada em 2003, realizou trabalhos até novembro de
2005. Uma matéria de Samir Oliveira, de 2012: “Há sete anos, CPMI da Terra marcava
embate entre ruralistas e movimentos sociais” ajudou-me a entender o que aconteceu
durante esta CMPI. Esta comissão parlamentar de inquérito foi palco de um embate
parlamentar entre defensores da Reforma Agrária e Ruralistas, tendo estes finalmente
conseguido aprovar o que inicialmente era um relatório particular do deputado do DEM,
Abelardo Lupion. Aquele que era o relatório inicial da Comissão, o Deputado João
Alfredo (PT e depois PSOL), finalmente foi aprovado apenas como voto particular. Por
motivos diferentes, os dois criticaram a Ouvidoria Agrária.
No caso de Lupion, a Ouvidoria chegou a ser criminalizada. No “Relatório dos
trabalhos da CPMI “da terra”, do Deputado Abelardo Lupion, de Novembro de 2005, o
trato dedicado à Ouvidoria e ao INCRA compõe o capítulo 6: “Dos órgãos federais
destinados a executar a reforma agrária e garantir a paz no campo”. A Ouvidoria é
duramente atacada por ter pedido diversos “habeas corpus” de camponeses presos, e a
Ouvidoria é acusada de parcialidade a favor dos camponeses e de exceder suas funções
para advogar por camponeses presos. “Configuram nítida função de procurador da parte”
(LUPION, 2005, p.137), concluindo:
A conclusão a que se chega é que houve uma evidente motivação
para favorecer uma das partes envolvidas, o que se distancia
léguas daquilo que se poderia considerar o cumprimento das
funções regimentais de seu cargo. (LUPION, 2005, p 138)
Lupion chega a analisar se os ouvidores cometeram delito de prevaricação,
afastando tal conclusão, porém acusa o Ouvidor de parcialidade, após Gercino ter alegado
cumprir as orientações do novo governo Lula:
Por fim, o sr. Gercino já respondeu à reportagem do jornal O
Estado de São Paulo, publicada no dia 26/04/04 sobre os fatos
aqui narrados, que estava cumprindo seu papel ao buscar
solucionar os conflitos, atuando segundo a ideologia do novo
governo. Ele, que foi nomeado ainda no governo do Exmo. Sr.
Presidente da República Fernando Henrique Cardoso, disse haver
adaptado o exercício de seu cargo às orientações veiculadas pela
equipe de S. Exa. o Presidente Luís Inácio Lula da Silva.
(LUPION, 2005 p.138)
Na citada entrevista do dia 26/04/2004 no Estado de São Paulo, intitulado
“Fazendeiros acusam ouvidor agrário de favorecer o MST”, Gercino se defendia
alegando, segundo a matéria:
A mediação da Ouvidoria Agrária Nacional em conflitos agrários da Amazônia
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A mediação da Ouvidoria Agrária Nacional em conflitos agrários da Amazônia

  • 1. UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÂS FACULDADE DE DIREITO / COMISSÃO PASTORAL DA TERRA A MEDIAÇÃO DA OUVIDORIA AGRÁRIA NACIONAL EM CONFLITOS AGRÁRIOS DA AMAZÔNIA JOSEP IBORRA PLANS Goiania 2017
  • 2. 2 JOSEP IBORRA PLANS A MEDIAÇÃO DA OUVIDORIA AGRÁRIA NACIONAL EM CONFLITOS AGRÁRIOS DA AMAZÔNIA Trabalho monográfico apresentado ao Programa de Pós-Graduação Lato Senso da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Goiás, como requisito parcial ao título de especialista sob a orientação do Professor Doutor Adegmar José Ferreira. Goiânia 2017
  • 3. 3 Resumo: Este trabalho apresenta uma pesquisa, limitada a região da Amazônia Legal do Brasil, sobre a experiência de mediação de conflitos agrários realizada pela Comissão Nacional de Combate à Violência, que presidia a Ouvidoria Agrária Nacional, os seus fundamentos legais e a opinião que trabalhadores rurais, lideranças de movimentos sociais do campo e agentes pastorais sociais participantes tinham sobre a mesma, seu funcionamento e seus resultados, logo antes de ser extinta pelo governo em novembro de 2016. Palavras chave: conflitos agrários, mediação, violência no campo, ouvidoria agrária, resolução de conflitos. Resumen: Este trabajo presenta una investigación, limitada a la región de la Amazonia Legal del Brasil, sobre la experiencia de mediación en conflictos agrarios practicada pela Comisión Nacional de Combate a la Violencia, que presidia la Defensoría Agraria Nacional, sus fundamentos legales y la opinión que trabajadores rurales, líderes de movimientos sociales del campo y agentes pastorales participantes tenían sobre la misma, su funcionamiento y sus resultados, poco antes de ser extinta por el gobierno en noviembre de 2016. Palabras clave: conflictos agrarios, mediación, violencia en el campo, defensoría agraria, solución de conflictos
  • 4. 4 SUMÁRIO A MEDIAÇÃO DA OUVIDORIA AGRÁRIA NACIONAL EM CONFLITOS AGRÁRIOS DA AMAZÔNIA. 1 – INTRODUÇÃO................................................................................................... p. 05 2 - PRINCÍPIOS E METODOLOGIA DAS TÉCNICAS DE MEDIAÇÃO E ARBITRAGEM APLICADAS PARA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS AGRÁRIOS................................................................................................................ p. 13 3 - A RESOLUÇÃO Nº 125, DE 29 DE NOVEMBRO DE 2010 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. ........................................................................................p. 19 4 - EMBASAMENTO LEGAL, OBJETIVOS E NORMAS QUE REGULARAM A ÚLTIMA ETAPA DA OUVIDORIA AGRÁRIA NACIONAL (OAN) E A COMISSÃO DE COMBATE AOS CONFLITOS NO CAMPO............................... p. 21 5 – PARECER DE TRABALHADORES, ADVOGADOS, LIDERANÇAS E AGENTES DA CPT DA AMAZÔNIA......................................................................................... p. 24 6 – HISTÓRICO E EXTINÇÃO DA OUVIDORIA AGRÁRIA NACIONAL................................................................................................................ p.44 7 – CONCLUSÕES...................................................................................................... p.56 8 – BIBLIOGRAFIA................................................................................................... p. 63 9 – ANEXOS.................................................................................................................p.57
  • 5. 5 1 – INTRODUÇÃO Grande parte dos conflitos do Brasil e o maior número de violência no campo registradas pela CPT (Comissão Pastoral da Terra) continuam acontecendo na Amazônia. Em reunião dos coordenadores regionais das CPTs da Amazônia, foia eleita a preocupação com a violência como uma das prioridades de trabalho de nossa equipe pastoral de Articulação das CPTs da Amazônia, da qual participo. Uma das poucas políticas públicas implementadas pelo poder executivo federal para conter a violência agrária é desenvolvida pela Ouvidoria Agrária Nacional. Trata-se da mediação em conflitos agrários da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo, que realiza reuniões presididas pela Ouvidoria Agrária Nacional, com objetivo de mediar entre os diferentes atores dos conflitos do campo e reduzir a violência. Porém, na prática, as mediações realizadas têm sido alvo de muitas críticas pelos trabalhadores rurais, movimentos sociais do campo e inclusive pelos agentes da CPT, que participam delas. Críticas porém que não têm sido sistematizadas nem comportado reações articuladas. O principal objetivo deste trabalho foi conhecer melhor esta avaliação dos pequenos agricultores, movimentos sociais e seus aliados, beneficiários desta prática da mediação de conflitos aplicada pela Ouvidoria Agrária Nacional nas Reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência. Limitando a pesquisa aos protagonistas dos conflitos do campo localizados na Amazônia Legal, seja em ocupações de terras por camponeses, conflitos com posseiros ou de comunidades tradicionais, dentro da perspectiva dos camponeses e movimentos sociais e também a partir da percepção dos agentes da Comissão Pastoral da Terra. Se pretende conhecer melhor as características e resultados desta pratica de mediação, valorizar os efeitos, apresentar limites e propor mudanças para outras experiências semelhantes, a partir do parecer dos camponeses que dela participavam. Como referência de política pública que foi executada pelo governo federal do Ministério de Desenvolvimento Agrário, em parceria com outros atores públicos (INCRA, Terra Legal, MP, MPF, Defensoria Agrária, Secretarias Ambientais, Secretarias de Direitos Humanos, Delegacias Agrárias, etc.), que incidiu diretamente nos conflitos no campo. Como resultado se pretende também ajudar a qualificar e articular as posturas das CPTs da Amazônia junto com os trabalhadores, pastorais e movimentos sociais do campo frente a este tipo de atuação política do governo federal.
  • 6. 6 Finalmente, este trabalho se situa dentro da missão e identidade da Comissão Pastoral da Terra, da qual o autor forma parte e onde trabalha como agente de pastoral, tendo como parte da missão e identidade: O trabalho de base junto aos povos da terra e das águas, como convivência, promoção, apoio, acompanhamento e assessoria: 1. nos seus processos coletivos: de conquista dos direitos e da terra, de resistência na terra,... (Missão da CPT)i Por tanto é uma pesquisa voltada desde o começo para os camponeses e pequenos agricultores, do lado deles, que pretende pesquisar a experiência de mediação da Ouvidoria Agrária desde a ótica deles e dos seus objetivos, no contexto dos conflitos e da violência sofridos por eles no objetivo da conquista e permanência na terra. Para esta missão o autor deste trabalho faz um esforço para separar suas convicções e experiências pessoais do resultado da pesquisa. Porém precisa manifestar que a mesma foi concebida a partir da experiência, pois já participou de muitas das Reuniões da Ouvidoria Agrária Nacional, todas elas realizadas em Rondônia em circunstâncias diversas, seja em reuniões multitudinárias no auditório do MP e no INCRA de Porto Velho, nas câmaras de vereadores de Vilhena e Ji Paraná, ou em reuniões mais restritas na Casa Civil e no gabinete da Secretaria de Estado de Segurança do Governo de Estado. Vamos descrever também estas brevemente. A experiência não difere muito dos resultados apontados, pelo que se refere as opiniões sobre a mediação exercida pela OAN, por mais que sempre houve pessoalmente um reconhecimento do trabalho exercido pela Ouvidoria. Com resultados ou não, as reuniões da Comissão sempre contribuíram para uma grande aprendizagem pessoal. Com respeito a nossa atitude diante delas, um dos meus posicionamentos era que si existia esta política pública, ela tinha que ser explorada em favor dos camponeses. Tínhamos que dar trabalho, já que existiam os conflitos batendo em nossas portas. Assim, durante alguns anos encaminhei para Ouvidoria inúmeras denúncias e petições das situações vivenciadas nos conflitos de terra por camponeses que acudiam à CPT em Rondônia. Isto significou grande exposição pessoal e institucional, pois todos os pedidos tinham que ser assinados e eram divulgados em todas as instâncias. Por outro lado, constatamos exíguos resultados, apesar de registrar sim, alguns avanços. Lembro do primeiro assunto que coloquei em Reunião da Comissão, arredor do ano 2009, sobre a problemática das comunidades quilombolas. Segue o processo de titulação estancado na maioria delas. Mesmo assim, graças as Reuniões houve alguns avanços na realização dos estudos de identificação das áreas quilombolas,
  • 7. 7 e na disponibilização de recursos humanos e pessoais no INCRA de Rondônia para esta finalidade, com ajuda da Ouvidoria. Os resultados também foram frustrantes em muitos aspectos, como o encaminhamento de denúncias de delitos da polícia nas corregedorias correspondentes. Por outro lado, a Ouvidoria disponibilizou de informações relevantes, por exemplo sobre a atuação de milícias armadas na região, com participação de oficiais da PM, em dados da própria polícia. Também mostrou em muitos casos “o caminho das pedras” para o encaminhamento adequado das situações. Ajudou a conseguir importantes aliados, como a Defensoria Pública Agrária, e algumas atuações da Delegacia Agrária a favor de camponeses que eram vítimas de violência. Um imprevisto. Com esta base pessoal e de conversas na equipe de Articulação da Amazônia, sobre o teor deste trabalho, na fase final de elaboração do mesmo, a Ouvidoria Agrária Nacional foi extinta pelo governo golpista presidido por Michel Temer. Em 28 de Novembro de 2016, Gercino José da Silva, até poucos dias Ouvidor Agrário Nacional, enviava esta carta aberta por e-mail: Prezados Representantes de Órgãos Agrários e de Movimentos Sociais Rurais do Estado de Rondônia, Tenho a elevada honra em dirigir-me a Vossas Excelências visando comunicar-lhes a extinção da Ouvidoria Agrária Nacional, conforme Decreto nº 8.889, de 26 de outubro de 2016, que aprova a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções de Confiança da Casa Civil da Presidência da República, remaneja cargos em comissão e funções de confiança e substitui cargos em comissão do Grupo Direção e Assessoramento Superiores por Funções Comissionadas do Poder Executivo, conforme documento constante de arquivo anexo. Atenciosamente. Desembargador Gercino José da Silva Filho (ARQUIVO DO AUTOR)ii Na semana que foi extinta, o Ouvidor encontrava-se realizando as últimas Reuniões da Comissão em Porto Velho. O governo de Michel Temer, criado após o impeachment de Dilma Rousseff, extinguiu o Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA) dentro do qual se enquadrava a Ouvidoria Agrárias Nacional e entre outras disposições exonerou o Ouvidor Agrário Nacional (quando estava fora de Brasília, presidindo as últimas reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência em Porto Velho), pelo Decreto 8.889 de 26 de Outubro de 2016, após suspender o Ministério de Desenvolvimento Agrário e agregar a estrutura do INCRA na Casa Civil da Presidência da República.
  • 8. 8 A Ouvidoria Agrária (OAN) foi extinta apesar de que não tinha sido criada pelos governos petistas, mas sim pelo seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso em 1999,iii junto com a criação do Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA), logo após os episódios do Massacre de Corumbiara (1995) e de Eldorado dos Carajás (1996). Proposta política louvada por José de Souza Martins, como uma das medidas destinadas a tentar estabelecer “as bases concretas para o exercício da função social da propriedade, recuperando o Estado, na prática, o domínio eminente do território do país.” (MARTINS, J. de S.): Em suma, o governo Fernando Henrique Cardoso herdou a desordem de uma demanda fora dos parâmetros da institucionalidade e de um Estado com orientações desencontradas e confusas em relação à reforma agrária. Os episódios de Corumbiara e Eldorado de Carajás foram expressões dessa herança. (...) Portanto, a política agrária de Fernando Henrique Cardoso teve por objetivo fazer a reforma e ao mesmo tempo instituir a normalidade do conflito, isto é, definir as bases institucionais do conflito agrário, fazendo do Estado o mediador e gestor das soluções. A Medida Provisória que proíbe vistorias para reforma agrária em terras invadidas, mantida pelo governo do PT, propôs-se como o inevitável instrumento do Estado administrador da ordem. A política agrária de Fernando Henrique Cardoso foi no sentido de distribuir a terra e distribuir a paz social, ao mesmo tempo, atenuando e reduzindo a conflitividade dos confrontos sociais que tem a disputa pela terra como causa. A criação da Ouvidoria Agrária, entregue a um reputado e competente desembargador, mantido pelo novo governo, foi certamente medida das mais acertadas numa linha política de conciliação e prudência, com reconhecidos resultados na pacificação do campo. (MARTINS)iv Durante mais de uma década e meia, em sucessivos governos, se manteve como Ouvidor Agrário Nacional a mesma figura: Gercino José da Silva Filho, que até a extinção da OAN, exerceu como Ouvidor Agrário Nacional e personificou a Ouvidoria Agrária Nacional. Antes disso ele era juiz, e alcançou a função de desembargador no Estado do Acre (1990-1999),v sendo atualmente desembargador aposentado. Em todas as comunicações assinava e continuava apresentando-se como desembargador. O fato é que com a extinção da OAN encerrou-se (pelo menos temporariamente) uma etapa de experiência de aplicação extrajudicial da ferramenta de mediação de conflitos, uma prática considerada inovadora e promissora na administração
  • 9. 9 de justiça, aplicada a uma das causas mais arraigadas de violência da história do Brasil: os conflitos pelo território, pela posse e propriedade da terra. Um dos principais e mais conhecidos meios de implementação de programa foi a realização descentralizada de mais de mil Reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo, que aconteceram em muitos diversos estados brasileiros, muitas delas na região amazônica. Estas reuniões congregavam representantes de organismos federais e estaduais da administração envolvidos nos conflitos no campo, entre eles representantes da Secretaria de Direitos Humanos, INCRA, Terra Legal, IBAMA e organismos ambientais estaduais, ministério público federal e estadual, juízes, defensorias públicas, autoridades da polícia e segurança pública, exército, etc. E representantes dos mais diversos segmentos sociais envolvidos nos conflitos no campo: Proprietários, posseiros, advogados, sindicatos, organizações patronais, associações de agricultores, movimentos sociais, organizações não governamentais, pastorais sociais, etc. A pedido de qualquer um que solicitar, os conflitos eram debatidos um por um nas pautas das Reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo presididas pelo Ouvidor Agrário Nacional, sendo elaborada ao final das mesmas uma Ata oficial dos acordos ou conclusões alcançadas. Posteriormente a Ouvidoria realizava acompanhamento do cumprimento destas resoluções e cobrava a aplicação das mesmas aos diversos organismos, comunicando quando havia resposta os resultados (ou a falta deles) as partes diretamente implicadas. Porém a impressão geral de muitos agentes da Comissão Pastoral da Terra acerca das mediações realizadas pela Comissão Nacional de Combate à Violência era como mínimo, polêmica. Para alguns, era instrumento de abafamento das demandas e reivindicações, de relativa ou nula eficácia no enfrentamento aos poderes locais, dominados pelos latifundiários. Apesar disso a Ouvidoria era muito procurada e tinha a credibilidade dos trabalhadores, de muitos grupos de pequenos agricultores que na atuação federal contemplavam a possibilidade de maior isonomia e melhores perspectivas de ver contempladas suas reivindicações. Para outros, porém, a atuação era considerada sem efeitos, inclusive suspeita. O fracasso da qual seria comprovada pelo real aumento da violência, seja devido à falta de reconhecimento do Judiciário; seja por não chegar a acordos entre as partes; seja pelo descaso e parcialidade das autoridades competentes (INCRA, policia, etc.); ou
  • 10. 10 pela falta de cumprimento dos compromissos das partes. Ainda, seja por propiciar acordos especialmente onerosos (considerados “claudicantes”) para os camponeses. Até o ponto da Ouvidoria ser considerada por alguns movimentos sociais, apenas como mais um mecanismo de abafamento das demandas de reforma agrária e da luta por justiça na terra dos camponeses. Alguns consideravam que a Ouvidoria estava instrumentalizada para a repressão e criminalização dos camponeses, obtendo assim efeitos contrários aos pretendidos: Maior rebeldia do povo despossuído e perca de legitimidade do papel de mediação do Estado no confronto social. Este autor escrevia em Julho de 2013: Os pequenos agricultores recolhem a impressão que esta Ouvidoria Agrária Nacional e o governo brasileiro, orienta-se mais para a repressão dos pequenos agricultores sem terra do que a defesa dos seus legítimos direitos constitucionais. (Citado por De PAULA, M. L.)vi Apesar disso e do descrédito da maioria dos agentes da CPT, (com honrosas exceções) e da crítica quase unânime entre nós sobre a forma de realizar estas reuniões e sobre os seus exíguos resultados práticos, a participação nas reuniões era muito solicitada pelos trabalhadores rurais envolvidos nos conflitos, especialmente pelos grupos desvinculados de organizações e movimentos sociais do campo, sendo para eles uma das poucas formas de acesso ao Estado e de cobrança de suas reivindicações e direitos. Tal vez por isso as críticas não supunham porém da CPT um repúdio geral a participação e em todos os regionais havia acompanhamento dos grupos que solicitavam uma presença efetiva nestas reuniões. Também não houve nunca uma avaliação conjunta, nem uma atitude articulada em relação as mesmas. Este era um dos objetivos deste trabalho, discutido dentro do espaço do Projeto de Articulação das CPTs da Amazônia. Metodologia de trabalho. Na base teórica foram pesquisados bibliograficamente os princípios e a metodologia da mediação. O principal autor de referência, que o presente trabalho acompanha literalmente é uma obra com finalidade didática e utilizada pela própria OAN, editada em 2014 pela Universidade de Brasília e o Ministério de Justiça, que tem por autora Luciana Moessa de Souza e como organizador Igor Lima Goettenauer de Oliveira: “Resolução consensual de conflitos coletivos envolvendo políticas públicas” (SOUZA). A obra é utilizada é divulgada pela Escola Nacional de Mediação e Conciliação – ENAM, que segundo informação da mesma
  • 11. 11 Foi criada no âmbito da Secretaria de Reforma do Judiciário, ao final de 2012, por ato do Ministro da Justiça, com a finalidade de oferecer capacitações e cursos presenciais e à distância em técnicas de mediação, conciliação, negociação e outras formas consensuais de solução de conflitos. (...) Para tanto, a ENAM trabalha em parceria com os principais atores do sistema de justiça: Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Advocacia Pública, Advocacia Privada, Faculdades de Direito etc. participam da formulação dos cursos e dos materiais pedagógicos da escola, de tal forma que o processo judicial seja preterido em favor de uma boa conversa e de um bom acordo. (ENAM)vii No segundo momento, foi analisado o embasamento legal, objetivos e normas que regulam a Ouvidoria Agrária Nacional (OAN) e a Comissão de Combate à Violência no Campo, e por especial sugestão do orientador deste trabalho, as normas do Conselho Nacional de Justiça que regem a atuação das magistraturas sobre a prática de mediação. Posteriormente, para conhecer a recepção da mediação praticada, foram elaboradas e aplicadas entrevistas para agentes da Comissão Pastoral da Terra (CPT), agricultores, advogados populares e dirigentes de movimentos sociais, tendo como base as propostas da obra de Luciana Moessa de Souza sobre a mediação. O questionário elaborado foi distribuído pelos nove regionais da CPT da Amazônia procurando trabalhadores, ativistas de movimentos sociais do campo e agentes de pastoral que tivessem participado de Reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência. Obteve catorze respostas, vindas dos estados de Acre, Rondônia, Mato Grosso e Pará. Pretendíamos também analisar alguns casos de mediação de conflitos agrários, considerados significativos por estes agentes, acompanhados também pela Pastoral da Terra, a partir das Atas das Reuniões da Comissão Nacional de Conflitos Agrários e contrastadas com informações da própria CPT, comprovando os desfechos e resultados dos mesmos. Não foi possível, assim como as avaliações serem enviadas à Ouvidoria Agrária Nacional para eventuais análises ou comentários. Por motivo da extinção da OAN a finais de 2016, em plena elaboração deste trabalho, as críticas surgidas contra a medida inclusive dentro da própria CPT, oferecem um elemento precioso que aqui será recolhido de forma sucinta, para compor, com todos estes elementos, a elaboração das conclusões do trabalho. Por sugestão dos
  • 12. 12 leitores do mesmo, acrescentei alguns apontes históricos sobre a Ouvidoria, assim como nesta introdução foram ampliadas um pouco as considerações iniciais em base a própria experiência pessoal do autor sobre o assunto. Está claro que uma avaliação crítica do trabalho da Ouvidoria perdeu parte do interesse agora que já foi extinta. Contudo, o governo golpista acabou por recriar uma Ouvidoria Agrária dentro da estrutura do INCRA. Em todo caso esta pesquisa e as considerações sobre a mesma vão poder dar algumas dicas sobre a mediação em conflitos agrários. São apenas um começo de estudo, que deveria ser continuada, sobre uma experiência prática de mediação aplicada ao espinhoso tema dos conflitos agrários no campo.
  • 13. 13 2 – PRINCÍPIOS E METODOLOGIA DAS TÉCNICAS DE MEDIAÇÃO E ARBITRAGEM APLICADAS PARA RESOLUÇÃO DE CONFLITOS AGRÁRIOS. A principal obra utilizada neste trabalho é “Resolução consensual de conflitos coletivos envolvendo políticas públicas” de Luciana M. de Souza. Esta obra serviu de base para redação dos questionários sobre a prática de mediação utilizada pela OAN e para interpretação dos resultados da pesquisa. Nesta obra de Souza começa defendendo a necessidade dos métodos consensuais de resolução de conflitos: A inegável repercussão social de tais conflitos torna urgente a utilização de instrumentos capazes de dar conta destes desafios. Se eles não são os mais numerosos no âmbito do Poder Judiciário, são sem dúvida os que apresentam maiores impactos e maior relevância na sociedade civil.” (...) “na esfera do Poder Executivo, também pode evitar a escalada de conflitos amplos e a criação de impasses no desempenho das competências da Administração, aprimorando a eficiência, o relacionamento com o cidadão e a legitimidade democrática da atuação estatal. (SPOUZA, p.4) Apresenta diversas definições de mediação: A mediação de um conflito pode ser definida como a intervenção construtiva de um terceiro imparcial junto às partes envolvidas no conflito, com vistas à busca de uma solução construída pelas próprias partes.” (...) “Para Maria de Nazareth Serpa, “mediação é um processo onde e através do qual uma terceira pessoa age no sentido de encorajar e facilitar a resolução de uma disputa sem prescrever qual a solução” (1999, p. 147). A mesma autora deixa claro que a intervenção deste terceiro imparcial é fundamental para engajar as partes numa discussão proveitosa. (SOUZA, p.15) Apresenta conceitos de conflitos, como a do Professor Antônio Rodrigues de Freitas Júnior: Situações em que estejam presentes, simultaneamente, 1. no plano objetivo: um problema alocativo incidente sobre bens tidos por escassos ou encargos tidos como necessários, sejam os bens e os encargos de natureza material ou imaterial; 2. no plano comportamental: consciente ou inconsciente, intencional ou não, contraposição no vetor de conduta entre dois sujeitos; e 3. no plano anímico ou motivacional: sujeitos portadores de percepções diferentes sobre como tratar o problema alocativo, como função de valores de justiça (2009, p. 518). (SOUZA p. 15) Discursa sobre o papel dos poderes públicos e da legislação na resolução dos conflitos:
  • 14. 14 Em outras palavras, o sistema normativo escolhe os interesses que merecem proteção coercitiva, ou seja, aqueles cuja legitimidade é tal que se poderá utilizar o aparato de força estatal para fazê-los valer em caso de ameaça ou violação. Boa parte dos conflitos, contudo, como lembra Entelman, envolvem mais do que uma mera situação de proibição, obrigação ou permissão de conduta (...) “No espaço público, ao contrário do que se possa pensar, dado o peso de fato maior que a legalidade assume na definição do espaço de atuação dos agentes, situações similares também são de fácil verificação, por ser bastante comum a utilização pelos textos normativos de termos genéricos e conceitos abstratos, dando margem a um espaço significativo de discricionariedade no momento da aplicação da norma. Assim, é comum a ocorrência, em determinado conflito, de duas ou mais interpretações igualmente aceitáveis em face do quadro normativo, porém incompatíveis entre si. Mais uma vez se verifica, então, que a mera referência ao sistema jurídico não é suficiente para a solução do conflito – daí a utilidade da mediação5, inclusive para construir uma interpretação do quadro normativo que seja aceita por todos os envolvidos. (SOUZA, P. 17) Sobre as formas de mediação e resolução de conflitos: Cabe referir aqui as lições de Humberto Dalla Bernardina de Pinho, inspiradas na doutrina estadunidense a respeito: “Há duas formas básicas de estabelecer a metodologia e as premissas básicas para a busca da solução. A primeira é denominada ‘rights-based’ e ocorre quando as partes analisam quais são as perspectivas da questão na hipótese de a causa ser levada à jurisdição, a fim de delimitar objetivamente a solução prática a ser alcançada. Esses dados são tomados como ponto de partida para a negociação. A outra é denominada ‘interest-based’ e se dá quando a solução for buscada com base nos interesses e necessidades das próprias partes no que tange aos direitos em conflito, deixando-se a análise fria do texto legal e das tendências jurisprudenciais para um segundo momento e apenas como forma de conferir executoriedade ao termo de acordo.” (2009, p. 244 - grifei) No caso dos conflitos envolvendo entes públicos, naturalmente, a abordagem baseada em direitos (“rights-based”) sempre há de existir, porém defendo que é possível e necessário incluir também a abordagem baseada em interesses (“interest- based”), ou seja, as duas abordagens não são mutuamente excludentes, e sim complementares. (SOUZA p. 17) Sobre as diferentes estratégias que um negociador pode adotar apresenta um modelo de classificação de Gladys Stella Álvarez: 1. Estratégia da competição: grande preocupação com as metas pessoais e pouca preocupação com as relações. Adotada “por
  • 15. 15 quem busca alcançar suas próprias metas a todo custo, sem preocupar-se com as necessidades ou a aceitação de outras pessoas (...) Na mente dessa pessoa não há dúvida de que ela tem razão”; 2. Estratégia de concessão: pouca preocupação com as metas pessoais e grande preocupação com as relações. Pode ser “altamente apropriada quando se percebe que se está equivocado, tendo um efeito muito positivo no momento de reconhecer erros, postergações, esquecimentos e também quando um assunto não tem muito interesse para a parte”; 3. Estratégia de evitar o confronto: pouca preocupação com as metas pessoais e pouca preocupação com as relações; evitar pode ser adequado quando se trata de questões de menor importância; 4. Busca do “meio-termo”: preocupação moderada tanto com as metas pessoais quanto com as relações. Pode ser apropriado “quando os objetivos são apenas medianamente importantes e a pessoa pode colaborar moderadamente e até certo ponto com a outra”; 5. Estratégia de colaboração: grande preocupação tanto com as metas pessoais quanto com as relações. “As pessoas que utilizam este estilo não consideram como mutuamente excludentes a satisfação de suas próprias metas e as dos demais (...) Consideram o conflito como algo natural e útil que, inclusive, se for manejado de forma apropriada, conduz a uma solução mais criativa”. Esse estilo é adequado quando os “objetivos são tais que é necessário contar com uma estreita colaboração para atingi- los”. Nele, “existe a interdependência entre as pessoas envolvidas, sem que elas sejam acusadas ou julgadas”. (SOUZA p 18-19) O papel do mediador: Cabe ao mediador, assim, conduzir as partes a esta postura colaborativa, a única capaz de otimizar resultados, notadamente nos conflitos de dimensão coletiva, como aqueles que envolvem políticas públicas. O sucesso do mediador se mede justamente pela sua capacidade de mobilizar as partes neste sentido, o que fará emergir naturalmente uma solução que seja a melhor possível para todos os envolvidos. (SOUZA, p. 19) Apresenta três diferentes escolas de mediação e os fundamentos básicos de negociação desenvolvidos nos EUA e que estendem sua influência no Brasil e no mundo: a) Mediação voltada para a solução de problemas: Para o modelo denominado de mediação voltada para a solução de problemas, esta solução se materializa na realização de um
  • 16. 16 acordo. (...) A mediação nada mais seria, em realidade, que uma negociação facilitada por um terceiro. b) Mediação transformativa. Um dos primeiros objetivos do mediador é trazer à tona as questões subjacentes ao conflito que influenciam na possibilidade de busca de uma solução. (...) não reside na simples obtenção de um acordo com relação ao problema específico que gerou o conflito, mas no estabelecimento de um novo padrão de relacionamento entre as partes, no qual estas passem a ter condições de gerar por si mesmas soluções para os conflitos que naturalmente surgirão ao longo de seu relacionamento. c) Mediação narrativa. Neste modelo o objetivo da mediação pode ser descrito, em apertada síntese, como reinterpretar / reconstruir a visão das partes em relação ao conflito, sendo que isso é feito por meio do questionamento de preconceitos socioculturais das partes, mediante intervenção ativa do mediador, que não é considerado “neutro” ou “objetivo”, mas sim deve também questionar seus próprios estereótipos e condicionamentos socioculturais durante os trabalhos (ALBERSTEIN, 2007, p. 337). (SOUZA p.24) Assim conclui: Apesar de registrar a diferença entre os diversos enfoques, perceba que eles não se excluem mutuamente. Muito embora a mediação narrativa e a mediação transformativa não se restrinjam, como visto, à busca do acordo pelo qual se resolve o conflito imediato, a obtenção deste é também uma consequência natural da reinterpretação do conflito, que se utiliza na mediação narrativa, bem como da alteração no padrão disfuncional de relacionamento entre as partes, que se busca na mediação transformativa. (SOUZA p 24) Apresenta diferentes formas de enquadrar o conflito: “a) o reconhecimento e o trabalho com o contexto subjacente ao conflito; b) o reconhecimento e o trabalho com as emoções das partes envolvidas no conflito” (SOUZA, p. 30). Sobre os tipos de conflitos solucionáveis por mediação cita a opinião que “a mediação pode se ocupar de qualquer tipo de conflito” (SOUZA p.33) citando uma importante ressalva: Há, porém, quem levante dúvidas sobre a possibilidade/adequação de sua utilização em conflitos nos quais as partes em litígio estejam em situação de desigualdade, ou que versem sobre direitos indisponíveis. (SOUZA p. 33)
  • 17. 17 Entre os riscos envolvidos no processo de mediação, Souza insiste sobre o risco da desigualdade entre as partes e outras que dizem especialmente aos conflitos que tratamos: a) a frequente situação de desigualdade de poder entre as partes, notadamente de poder econômico, que torna mais difícil o acesso às informações necessárias para se firmar um acordo esclarecido, bem como torna maior a pressão pelo acordo em uma situação de dificuldade para fazer face aos custos do processo; b) a dificuldade de se identificar a pessoa responsável por firmar o acordo dentro de grandes empresas ou entes governamentais; c) a dificuldade de execução do acordo, que pode ser visto como não tendo o mesmo valor jurídico pelos membros do Poder Judiciário. (Eventual resistência do Judiciário à execução de acordos firmados em processos de mediação). (SOUZA, p. 34) Outro elemento importante são as diretrizes éticas para atuação de mediadores e conciliadores; Sobre a mediação, não existe dúvida quanto ao fato de que ela envolve responsabilidades tanto do ponto de vista positivo, isto é, deveres de fazer algo durante o processo, quanto do ponto de vista negativo, ou seja, deveres de não adotar determinadas condutas. (SOUZA, p. 37) Assim recolhe as orientações legais existentes: Os princípios fundamentais que regem a atuação de conciliadores e mediadores judiciais”, do Código de Ética anexo à Resolução nº. 125, do Conselho Nacional de Justiça: “confidencialidade, competência, imparcialidade, neutralidade, independência e autonomia, respeito à ordem pública e às leis vigentes” (art. 1º do referido código). Já o projeto de novo Código de Processo Civil brasileiro dispõe, em seu art. 167, que “A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da imparcialidade, da normalização do conflito, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada.” (SOUZA p. 37) Informa sobre a existência de Recomendações do Código de Ética do CONIMA – Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem, apesar de ter “enfoque predominante nos conflitos da esfera privada”. (SOUZA p. 37) destacando o dever da imparcialidade (ou neutralidade), dever de respeitar a autonomia das partes, deveres de competência e diligência; dever de alertar as partes sobre a necessidade de perícia técnica ou assessoramento de terceiros; dever de zelar pelo equilíbrio de poder entre as partes, confidencialidade, transparência na condução do processo; dever de zelar
  • 18. 18 pela viabilidade do cumprimento do acordo; dever de zelar pelos interesses de terceiros afetados
  • 19. 19 3 - A RESOLUÇÃO Nº 125, DE 29 DE NOVEMBRO DE 2010 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Esta resolução do CNJ, segundo os “considerando” iniciais, dispõe uma política nacional de mediação de conflitos, no intento de “zelar pela observância do art. 37 da Constituição da República”; facilitando “a eficiência operacional, o acesso ao sistema de Justiça e a responsabilidade social” e que “o direito de acesso à Justiça, previsto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal além da vertente formal perante os órgãos judiciários, implica acesso à ordem jurídica justa”, focada nos mecanismos consensuais de resolução de conflitos: CONSIDERANDO que, por isso, cabe ao Judiciário estabelecer política pública de tratamento adequado dos problemas jurídicos e dos conflitos de interesses, que ocorrem em larga e crescente escala na sociedade, de forma a organizar, em âmbito nacional, não somente os serviços prestados nos processos judiciais, como também os que possam sê-lo mediante outros mecanismos de solução de conflitos, em especial dos consensuais, como a mediação e a conciliação; (RESOLUÇÃO Nº125 CNJ) Por este motivo propõe “consolidar uma política pública permanente de incentivo e aperfeiçoamento dos mecanismos consensuais de solução de litígios;” pois: CONSIDERANDO que a conciliação e a mediação são instrumentos efetivos de pacificação social, solução e prevenção de litígios, e que a sua apropriada disciplina em programas já implementados no país tem reduzido a excessiva judicialização dos conflitos de interesses, a quantidade de recursos e de execução de sentenças; (RESOLUÇÃO Nº125 CNJ) Com o objetivo de “estimular, apoiar e difundir a sistematização e o aprimoramento das práticas já adotadas pelos tribunais;”, e Organizar e uniformizar os serviços de conciliação, mediação e outros métodos consensuais de solução de conflitos, para lhes evitar disparidades de orientação e práticas, bem como para assegurar a boa execução da política pública, respeitadas as especificidades de cada segmento da Justiça; (RESOLUÇÃO Nº125 CNJ) O objetivo pretendido é criar uma alternativa para resolução de conflitos com base a mediação e aos métodos consensuais de resolução de conflitos:
  • 20. 20 CONSIDERANDO que a organização dos serviços de conciliação, mediação e outros métodos consensuais de solução de conflitos deve servir de princípio e base para a criação de Juízos de resolução alternativa de conflitos, verdadeiros órgãos judiciais especializados na matéria; (RESOLUÇÃO Nº125 CNJ) A Resolução Nº 125 do CNJ destaca a competência dos tribunais para oferecer meios de mediação e conciliação para resolver conflitos “antes da solução adjudicada mediante sentença”, embasado no art. 334 do Novo Código de Processo Civil e o art. 27 da Lei de Mediação. Para isso propõe a criação de Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Centros ou Cejuscs), “responsáveis pela realização ou gestão das sessões e audiências de conciliação e mediação que estejam a cargo de conciliadores e mediadores, bem como pelo atendimento e orientação ao cidadão” (RESOLUÇÃO Nº125 CNJ, Art. 8º) a serem implantado nos tribunais onde existam mais de uma vara, a partir da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil. O CNJ define seu papel a partir do art. 167, § 3°, do Novo Código de Processo Civil, e à realização de mediações e conciliações, na forma do art. 334, dessa lei, com doze ações com objetivo de auxiliar os tribunais a organizar estes serviços com a criação em rede de um “programa com o objetivo de promover ações de incentivo à autocomposição de litígios e à pacificação social por meio da conciliação e da mediação” (RESOLUÇÃO Nº125 CNJ, Art. 4º) A Resolução dispões, entre outras ações, sobre o Cadastro Nacional de Mediadores Judiciais e Conciliadores, e os cursos de capacitação, treinamento e aperfeiçoamento de mediadores e conciliadores. Entre estas ações, uma das que mais interessa neste trabalho faz referência a redação de um código de ética dos mediadores: IV – regulamentar, em código de ética, a atuação dos conciliadores, mediadores e demais facilitadores da solução consensual de controvérsias; (RESOLUÇÃO Nº125 CNJ, Art. 6º) Este Código de Ética está recolhido integralmente no Anexo 1 deste trabalho.
  • 21. 21 4 - EMBASAMENTO LEGAL, OBJETIVOS E NORMAS QUE REGULARAM A ÚLTIMA ETAPA DA OUVIDORIA AGRÁRIA NACIONAL (OAN) E A COMISSÃO DE COMBATE AOS CONFLITOS NO CAMPO. Segundo o Portal da Ouvidoria a missão da Ouvidoria Agrária Nacional era: Garantir os direitos humanos e sociais do homem no campo. Instituída pelo Decreto Federal 5.033, que trata da estrutura organizacional do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), a Ouvidoria Agrária Nacional foi criada, nos termos do disposto no artigo 5º, com o objetivo de prevenir e mediar os conflitos agrários na zona rural. Suas ações são desempenhadas de forma articulada com órgãos governamentais e não- governamentais, por meio de parcerias firmadas em todo o País e que resultaram na estruturação da rede de órgãos especializados em questões agrárias. A atuação tem por finalidade garantir os direitos humanos e sociais das pessoas envolvidas em conflitos agrários no campo. Por meio da Ouvidoria Agrária Nacional, o Governo Federal contribui, extrajudicialmente, na resolução e prevenção dos conflitos agrários, de forma simples e sem burocracia, afastando qualquer barreira que dificulte o conhecimento das reclamações dos homens do campo. (PORTAL DA OUVIDORIA)viii Recriada nos moldes da última etapa pelo Decreto Federal 6.813 de 03 de abril de 2009 de criação do Ministério de Desenvolvimento Agrário, a OAN dependia da Secretaria Executiva (Art. 2º) e no artigo 5º definia as suas competências: I –promover gestões junto a representantes do Poder Judiciário, do Ministério Público, do Incra e de outras entidades relacionadas com o tema, visando a resolução de tensões e conflitos sociais no campo; II –estabelecer interlocução com os governos estaduais, municipais, movimentos sociais rurais, produtores rurais sociedade civil visando prevenir mediar e resolver as tensões e conflitos agrários para garantir a paz no campo; III –diagnosticar as tensões e os conflitos sociais no campo, de forma a propor soluções pacíficas; IV –consolidar informações sobre tensões e conflitos sociais no campo, com o objetivo de propiciar ao Ministro de Estado, ao Presidente do Incra e a Outras autoridades subsídios atualizados e periódicos para tomada de decisão; e V –garantir os direitos humanos e sociais das pessoas envolvidas em tensões e conflitos sociais no campo.” ix (DECRETO FEDERAL 6.813) Pelo objetivo definido no Artigo 5º II: “prevenir mediar e resolver as tensões e conflitos agrários para garantir a paz no campo”, presidia a Comissão Nacional
  • 22. 22 de Combate à Violência no Campo (CNCVC), instituída pela Portaria Interministerial n.º 1.053, de 14 de julho de 2006: Composta por representantes de órgãos oficiais que lidam com questões agrárias e de segmentos da sociedade organizada, a comissão foi criada com o objetivo de sugerir medidas para prevenir, combater e reduzir as diversas formas de violência praticadas contra trabalhadores rurais, proprietários rurais, remanescentes de quilombos, ribeirinhos e atingidos por barragens. A CNCVC elaborou e vem implementando as ações do Plano Nacional de Combate à Violência no Campo. (Portal da Ouvidoria)x Entre outros foi criado o “Programa Paz no Campo”, coordenado pela OAN, estabelecendo as seguintes ações: Prevenção de Tensão Social no Campo: A Ouvidoria Agrária Nacional promove o monitoramento das situações de tensão e conflitos no campo, para conhecimento das realidades internas e externas relacionadas a cada caso, diagnosticando as causas, de modo a subsidiar as autoridades competentes na tomada de decisões. Capacitação de Mediadores de Conflitos Sociais: A Ouvidoria Agrária Nacional realiza atividades de formação voltadas às pessoas que atuam diretamente na mediação e prevenção dos conflitos sociais, para aperfeiçoamento da ação destes agentes, com o objetivo de alcançar eficiência na resolução dos conflitos agrários. Atendimento de Denúncias: A Ouvidoria Agrária recepciona, apura e busca soluções para resolver as denúncias que envolvem conflitos agrários pertinentes ao cumprimento das ações do Plano Nacional de Reforma Agrária. Mediação de Conflitos Agrários: Com a finalidade de buscar solução negociada e dirimir pacificamente as desavenças fundiárias e agrárias, a Ouvidoria intervém nos conflitos agrários instalados. Apoio à estruturação de Instituições de Prevenção e Combate à Violência no Campo: A Ouvidoria Agrária busca apoiar a estruturação de instituições que atuam no combate à violência no campo. Por meio desta ação, procura garantir a solidez dos diagnósticos sobre as situações de conflito agrário e a consequente realização de atividades de prevenção e combate à violência no meio. Promove, ainda, o atendimento relacionado às denúncias que envolvam as questões agrárias, com o objetivo de contribuir extrajudicialmente na resolução dos conflitos agrários. Busca soluções pacíficas, de forma desburocratizada e descentralizada, mediante parcerias com os estados, os municípios e a sociedade civil organizada, em cumprimento aos
  • 23. 23 direitos humanos e sociais das pessoas envolvidas em conflitos agrários. Assistência Social, Técnica e Jurídica às Famílias Acampadas: Cabe à Ouvidoria Agrária Nacional articular, junto às diferentes esferas governamentais e não-governamentais, o atendimento às famílias acampadas, diminuindo o impacto das dificuldades enfrentadas. Desse modo, busca garantir o cumprimento dos direitos humanos e o processo de formação para inclusão social e produtiva dessas famílias. (PORTAL DA OUVIDORIA)xi
  • 24. 24 5 - PARECER DE TRABALHADORES, ADVOGADOS, LIDERANÇAS E AGENTES DA CPT DA AMAZÔNIA. Metodologia utilizada. Foi elaborado um questionário quantitativo com 96 perguntas fechadas com quatro opções de resposta: Sim, Não, Mais ou Menos, Não sei. Nesta última opção foram acrescentadas as perguntas que não obtiveram outras respostas. Apresentamos as respostas feitas junto com o material extraído da obra de Luciana M. de Souza que inspiraram e ajudaram a organizar as perguntas. Sem dúvida a quantidade de perguntas foram excessivas, inclusive com repetições temáticas, o qual prejudicou o número de respostas. Porém oferecem um horizonte bem extenso pelo que respeita a temas e conteúdo. Foram enviados e distribuídos questionários nos nove regionais da Amazônia Legal da Comissão Pastoral da Terra, tanto de forma digitalizada como impressa. Em total recebemos 14 respostas aos questionários elaborados. Foi desconsiderado um questionário enviado com respostas apenas na metade das perguntas. Enviaram respostas uma advogada popular, oito agricultores (entre eles qualificadas lideranças de movimentos sociais), e cinco agentes de pastoral da Comissão Pastoral da Terra. Deles dez (10) eram homens e quatro (04) mulheres. Geograficamente, a maioria de respostas foram do Estado de Rondônia (08), do Pará (01), do Mato Grosso (03), e do Acre (02). A maioria dos que responderam tinham ótima qualificação para responder, pois dez deles (10) tinham participado de mais de 05 reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência, representando um bom conhecimento da experiência. Três (03) respostas de pessoas que tinham participado entre 2 e 5 vezes. Apenas uma (01) resposta com participação em uma única reunião. Este universo mereceria uma análise por separado: O que pensam os homens é o mesmo que as mulheres? Trabalhadores divergem da opinião de agentes de pastoral e advogados? Os que têm mais experiência divergem daqueles que têm participado de poucas reuniões? Porém não foi possível este estudo diferenciado.
  • 25. 25 Apresentamos apenas alguns comentários pontuais e sobre o total de respostas por assuntos. Em resumo, representa um universo reduzido, porém bem diversificado, qualificado e significativo da opinião dos agricultores, movimentos sociais e agentes de pastoral. No final do questionário havia um pequeno espaço para respostas abertas. Apenas duas respostas o utilizaram o espaço aberto com pequenos comentários que recolheremos na análise de respostas. Resultados da pesquisa. 1- Classificação de estratégias de um negociador (SOUZA P.18). A través da classificação de estratégias de um negociador (competição, concessão, evitar o confronto, busca do “meio-termo”, colaboração), sem relação direta, foram inspiradas as cinco primeiras perguntas. Na primeira se desprende, que para os agentes e agricultores consultados predomina a opinião que não era sentida como maior preocupação da Ouvidoria o tema as necessidades dos pequenos agricultores (Nº1); nem de melhorar o desempenho das administrações públicas envolvidas nos conflitos no campo, com moderada atenção para os assuntos tratados (Nº 2 e 3). É mais maioritária a opinião que se procurava deixar satisfeitos os dois lados do conflito, a busca do meio termo (Nº 4); sem ter muito sucesso no envolvimento da colaboração de todos para solucionar os conflitos (Nº 5). Como vai ser uma constante na resposta aos questionários, a opinião de alguns dos agricultores tende a ser mais positiva que a das lideranças, advogada popular e agentes de pastoral. Extratos do livro de SOUZA Perguntas apresentadas. SIM NÃO +/- ? Estratégia da competição: grande preocupação com as metas pessoais e pouca preocupação com as relações. 1 - O Ouvidor se preocupa com as necessidades dos pequenos agricultores? 3 5 6 Estratégia de concessão: pouca preocupação com as metas pessoais e grande preocupação com as relações 2 - O Ouvidor se preocupa por melhorar o desempenho do INCRA e outras administrações? 4 4 4 2
  • 26. 26 Estratégia de evitar o confronto: pouca preocupação com as metas pessoais e pouca preocupação com as relações. 3 - O Ouvidor dá a devida importância aos assuntos tratados? 4 4 5 1 Busca do “meio-termo”: preocupação moderada tanto com as metas pessoais quanto com as relações. 4 - O Ouvidor procura deixar satisfeitos os dois lados dos conflitos? 8 3 2 1 Estratégia de colaboração: grande preocupação tanto com as metas pessoais quanto com as relações. 5 - A atuação da Ouvidoria contribui para que todos colaborem para achar soluções aos conflitos? 5 6 3 2 - Técnicas e enfoques da mediação: modelos de mediação. (SOUZA, p. 20) Sobre as técnicas e modelos de mediação, destaca o fato que nem sempre ficava bem esclarecido o carácter de mediação negociadora das reuniões (Nº 6), e poucas vezes se realizavam inicialmente reuniões privadas por separado (Nº 7), como parece ser habitual em todos os modelos de mediação. Todas as respostas apresentam com mais consenso a realização de sessões conjuntas com os dois lados envolvidos nos conflitos (Nº8). SIM NÃO +/- ? Tanto os processos de mediação como os de conciliação seguem o mesmo modelo: Iniciam-se com a realização de uma sessão de pré-mediação, onde são explicados os objetivos e os métodos do processo; 6 - Nas reuniões são esclarecidos para todos os participantes o que se está tentando a negociação de acordos para resolver conflitos? 6 6 1 1 Realizam-se sessões individuais com cada um dos lados envolvidos no conflito; 7 - Realizam-se reuniões individuais (privadas) separadas com os lados envolvidos no conflito? 5 5 3 1 Realizam-se sessões conjuntas com todos os lados envolvidos no conflito 8 - Realizam-se sessões conjuntas com todos os lados envolvidos no conflito? 10 2 1 1
  • 27. 27 3 - Modelo de mediação voltada para problemas. (SOUZA p.20) Em geral, no parece que a necessidade de terra dos pequenos agricultores e a solução dos seus problemas sejam percebidas nas respostas como a principal preocupação das Reuniões. SIM NÃO +/- ? O modelo de “mediação voltada para a solução de problemas”, primeiro tenta separar as pessoas dos problemas; 9 - Nas reuniões se foca na situação legal das terras disputadas, independente das pessoas envolvidas? 2 6 3 1 Focar em interesses (finalidade) e não em posições (as pretensões das partes); 10 – Os trabalhadores sentem que há preocupação para resolver a necessidade deles de terra para trabalhar? 6 6 2 Gerar propostas de soluções criativas para o problema (expandir a “torta” antes de reparti-la); 11 - Nas reuniões aparecem soluções novas que podem ajudar a avançar a reforma agrária? 4 8 2 Estabelecer parâmetros justos e adequados para encontrar a solução final (critérios para “repartir a torta”). 12- A forma como são focados os temas são justos e adequados para os pequenos agricultores? 4 7 3 4 - Mediação facilitadora. (SOUZA, p.20) Longe da unanimidade, na maioria das respostas predomina uma posição crítica sobre a tarefa da mediação destinada a facilitar a superação dos conflitos. Ainda, para a maioria delas, o mediador é mais visto como juiz que decide do que facilitador intermediário (Nº 17). SIM NÃO +/- ? Ajuda a formular questões (ajudando as partes a focar em interesses e não em posições); 13 - A Ouvidoria ajuda a repensar as posições dos dois lados em conflito? 5 5 3 1 Identificar pontos em comum e diferenças a serem trabalhadas (ajudando-as a estabelecer uma agenda); 14 - Há encaminhamentos concretos para resolver os problemas? 3 6 4 1 Ajudar as partes a elencarem critérios objetivos para solução do conflito, 15 - Fica mais claro para todo o mundo quem tem direitos legais ou não? 3 8 2 1 Pode o mediador apenas orientá-las quanto ao caminho de busca do acordo, mas não quanto ao conteúdo dele. 16 - A Ouvidoria orienta com respeito sobre as propostas de acordos? 3 4 4 2
  • 28. 28 Ele não deve julgar os parâmetros fornecidos pelas próprias partes, nem o comportamento passado delas. 17 - O Ouvidor parece mais um juiz que decide, do que um intermediário que propõe acordos? 6 5 2 1 5 - Mediação avaliadora. (SOUZA, p. 21) As reuniões da Comissão de Combate à Violência no campo parecem seguir mais este modelo de mediação avaliadora, para o qual o fato do Ouvidor ser juiz aposentado deveria obter uma boa posição (que não é valorizada o suficiente, pelo que desprende das respostas à pergunta Nº 21). Obtém maioria a opinião das respostas nos itens das perguntas Nº 19 e 29, sobre o fato da mediação aconselhar quando necessária assessoria jurídica ou técnica. Porém a maioria de respostas são críticas sobre a melhoras de expectativas dos agricultores após as reuniões (Nº 22), e sobre as propostas advindas das reuniões, pois são consideradas que não melhoram as perspectivas das decisões judiciais (Nº18), o qual representa uma dura crítica ao desempenho de qualquer mediação extrajudicial. SIM NÃO +/- ? Fornece às partes uma previsão quanto ao provável teor de uma decisão proferida pelo juízo competente, com o objetivo de fazer com que estas caminhem naturalmente para um acordo que estabeleça uma solução que seja mais confortável para ambas do que a que decorreria do julgamento baseado em critérios puramente legais. 18 - As propostas das Reuniões costumam ser melhores para os agricultores do que as decisões judiciais? 3 9 1 1 A avaliação não deve chegar a ser um aconselhamento jurídico, Cabe ao mediador, remeter as partes a esse aconselhamento jurídico com advogados sempre que for o caso, 19 - Quando preciso, a Ouvidoria aconselha aos agricultores a conseguir atendimento de advogados ou da Defensoria Pública? 7 3 1 2 Assim como a necessidade de eventual perícia técnica ou aconselhamento psicológico, quando necessário. 20 - Quando preciso, a Ouvidoria cobra informações ou perícias técnicas aos órgãos agrários (Incra, Terra Legal, ...) ambientais e outros? 6 3 3 2 Quando os mediadores são provenientes da área jurídica (especialmente quando se trata de 21 - O fato do Ouvidor Agrário ser um desembargador (juiz) 3 6 3 3
  • 29. 29 juízes aposentados) ... traz diversos riscos ... (as partes) podem ficar menos satisfeitas com o resultado. aposentado, ajuda nas Reuniões? Os mediadores apontam, para cada uma das partes, em sessões privadas, os pontos fracos de seu caso (aspectos que apresentam dificuldade de prova, por exemplo), de modo a diminuir suas expectativas normalmente infladas quanto ao possível ou provável resultado do processo judicial. 22 - Os pequenos agricultores têm melhores expectativas depois das reuniões? 3 6 4 1 6 - Mediação transformativa. (SOUZA, p. 22) Os resultados das Reuniões de Combate à Violência são desmentidos na prática pelo aumento de violência. Nos últimos anos não estavam conseguindo a redução dos conflitos. É quase unanimidade dos resultados da pesquisa de opinião que não estão contribuindo (p. 24). Este é o teor de um dos poucos comentários ao pê de página dos questionários: “Pra mim essa OAN não cumpre um bom papel, muito pelo contrário, e os números mostram que os conflitos vêm aumentando.” Outro participante escreveu (sic) “O Ouvidor Agrário faz oque? O SR está fazendo o que aí? No tó vendo os pequenos produtores.” (Questionário 1º e 12º). Apesar de conseguir mais ou menos a realização de acordos, não se alcançava uma transformação profunda, no sentido de reduzir as injustiças e desigualdades do campo, um “novo padrão de relacionamento” com relação aos problemas específicos que geram os conflitos agrários. SIM NÃO +/- ? Essa solução, para a “mediação transformativa” não reside na simples obtenção de um acordo com relação ao problema específico que gerou o conflito, mas no estabelecimento de um novo padrão de relacionamento entre as partes, no qual estas passem a ter condições de gerar por si mesmas soluções para os 23 - Os resultados das reuniões da Ouvidoria oferecem soluções que podem ser aplicadas para outros conflitos agrários? 6 9
  • 30. 30 conflitos que naturalmente surgirão ao longo de seu relacionamento. Uma “transformação da situação que gerou o conflito” (...) não se satisfaz “com uma solução rápida que parece resolver o problema imediato”, mas busca “criar uma moldura capaz de tratar do conteúdo, do contexto e da estrutura do relacionamento.” 24 – As Reuniões estão contribuindo para reduzir a violência agrária? 2 10 1 1 “Al conflicto no se lo asume como un problema, sino como una oportunidad para el desarrollo moral, siendo que la mediación es utilizada para transformar a las personas, ayudándolas a luchar con las circunstancias difíciles y a establecer un puente entre las diferencias humanas durante las disputas.” 25 – As Reuniões ajudam a reduzir as injustiças e desigualdades do campo? 3 10 1 Quando, porém, o grau de relacionamento é bastante reduzido, a mediação focada basicamente na realização de acordos pode ser suficiente. 26 - As Reuniões conseguem chegar a realização de acordos? 4 3 6 1 7 - Mediação narrativa. (SOUZA, p. 24) De novo as respostas estão longe da unanimidade sobre a influência das Reuniões para melhorar a forma de atuar das autoridades e servidores públicos envolvidos com os conflitos agrários. Cinco opinam que sim e sete que não, com margem de duas respostas sem definição. Em todo caso, o crédito parcial ao trabalho da mediação em linha transformativa da administração pública é considerado por alguns, porém negado por uma maioria não muito grande. SIM NÃO +/- ? O objetivo da mediação pode ser descrito, em apertada síntese, como reinterpretar / reconstruir a visão das partes em relação ao conflito, sendo que isso é feito por meio do questionamento de preconceitos socioculturais das partes, mediante intervenção ativa do mediador, que não é considerado “neutro” ou “objetivo”, mas sim deve também questionar seus próprios estereótipos e 27 – As Reuniões têm levado a melhorar a forma de atuar das autoridades e servidores públicos envolvidos com os conflitos agrários? 5 7 1 1
  • 31. 31 condicionamentos socioculturais durante os trabalhos 8 - Campos de abrangência da mediação – Diferentes formas de enquadrar os conflitos. (SOUZA, p. 25) Uma maioria nítida acredita que o número de conflitos atendidos pela Comissão Nacional de Combate à Violência prejudicou a qualidade do trabalho, ou pelo menos restringiu as abordagens, levou a acordos pouco vantajosos e duradouros para os pequenos agricultores, e não fortaleceu a identidade camponesa, nem a “luta pela terra” dos movimentos sociais do campo (Nº 28, 29, 30). Mesmo assim, de forma significativa, a maioria acredita que o trabalho da Comissão também não era bem visto por fazendeiros e ruralistas (Nº31). SIM NÃO +/- ? Na prática, a maioria dos mediadores acaba tendendo a uma abordagem restrita, o que é encorajado especialmente em programas que trabalham com grande número de conflitos. 28 - O número de conflitos atendidos prejudica a qualidade do trabalho da Comissão de Combate à Violência? 8 5 1 Uma abordagem restrita poderia impedir as partes de tratarem de interesses mútuos e permanentes, não levando nunca a um acordo duradouro e mutuamente vantajoso. 29 - Os acordos alcançados têm sido vantajosos e duradouros para os pequenos agricultores? 4 8 1 As emoções afetam (positiva ou negativamente) nossa habilidade de atingir os objetivos da negociação, além de serem um meio de comunicar valores que são relevantes para o sentimento de identidade de cada uma das partes no relacionamento 30 - O trabalho da Comissão tem fortalecido a “luta pela terra” dos movimentos sociais do campo? 5 6 2 O reconhecimento e domínio das próprias emoções e o reconhecimento e consideração das emoções da outra parte estão no coração da solução do conflito. 31 - O trabalho da Comissão está bem visto pelos fazendeiros e ruralistas? 3 7 1 3
  • 32. 32 9 - Tipos de conflitos solucionáveis por mediação. (SOUZA, p. 27) Este é um dos temas mais delicados e onde abundavam críticas ao trabalho da Comissão. Sem se referir explicitamente à Comissão, a Subprocuradora da República Deborah Duprat chegou a afirmar numa reunião que debatia a violência agrária em Rondônia, (Porto Velho, 04/10/2016): “As mesas de diálogo com partes assimétricas são um instrumento completamente perverso com os pequenos”. Fazia referência aos litígios em situação de desigualdade entre as partes, fato habitual nas mesas de negociação sobre conflitos agrários. A opinião dos que responderam ao questionário é desencontrada. 04 acham que a Comissão não sabe lidar com a desigualdade de poder entre camponeses, autoridades e fazendeiros envolvidos em conflitos agrários. Três maios ou menos. Quatro acham que sabe lidar sim. Outros três não respondem (Nº 32). Não está claro que este assunto esteja bem resolvido, por tanto. Nem que a atuação da Ouvidoria nas reuniões da Comissão contrabalance o desequilíbrio, facilitando o respeito e proteção dos direitos dos pequenos agricultores (Nº 33). Mesmo assim, vários defendem que as reuniões ajudam a equalizar o nível de informação dos camponeses (Nº 34) e uma maioria concorda que pelo menos os camponeses podem se expressar efetivamente nas reuniões, apesar de que alguns (02) acham que não, e outros que apenas mais ou menos (05), (Nº 35). Quase ninguém defende que outras alternativas sejam oferecidas para eles, e uma clara maioria acredita que existem conflitos muito graves onde não é recomendável a mediação por falta de diálogo e de boa fé das partes (N. 36 e 37). SIM NÃO +/- ? Há quem levante dúvidas sobre a possibilidade/adequação de sua utilização em conflitos nos quais as partes em litígio estejam em situação de desigualdade. 32 - A mediação da Comissão sabe lidar com a desigualdade de poder entre os envolvidos em um conflito agrário (fazendeiros, autoridades e camponeses)? 4 4 3 3 A forma de atuação do mediador deve buscar contrabalançar este desequilíbrio, já que ele pode afetar a 33 - A atuação da Comissão facilita o respeito e proteção dos 6 7 1
  • 33. 33 capacidade de participação da parte com menor poder de construção da solução consensual. direitos dos pequenos agricultores? O processo de mediação pode e deve ser delineado de forma a garantir - que o nível de informação e sua respetiva compreensão seja equalizada. 34 – As Reuniões ajudam os camponeses a ter melhor nível de informações sobre os conflitos que enfrentam? 6 5 2 1 - que a oportunidade de expressar os interesses de cada uma das partes seja efetivamente garantida; 35 - A Comissão ouve e atende os pequenos agricultores, que podem se expressar efetivamente nas reuniões? 6 2 5 1 - que o diálogo seja conduzido de forma a assegurar que todas as partes envolvidas tenham consciência dos interesses em jogo e de suas alternativas para uma solução consensual. 36 - Os pequenos agricultores compreendem as alternativas possíveis em jogo? 2 6 5 1 Em realidade, nos casos em que já diferenças extremas nas relações de poder entre as partes ou eventualmente um histórico de conflitos que inviabilize qualquer diálogo (como se dá na hipótese da prática de crimes graves), costuma-se entender que a mediação não é o caminho mais adequado, dada a impossibilidade real de se trabalhar num contexto de autêntico diálogo, de verdadeira autonomia das partes. 37 - Existem conflitos muito graves onde não é recomendável a mediação da Comissão Nacional de Combate à Violência Agrária? 7 2 5 Também se torna inviável a mediação se não houver a necessária boa-fé das partes envolvidas no conflito. 38 - Existe a necessária boa fé de todas as partes para procurar a solução dos conflitos? 4 10 10 - Critérios para a construção de acordo na mediação. (SOUZA, p. 30) Se os parâmetros legais não podem ser ignorados na construção dos acordos, isso não parece que seja atendido por todos os casos, a julgar pela falta de unanimidade nas respostas acerca da legalidade dos acordos alcançados pela Ouvidoria (Nº39). SIM NÃO +/- ? Não é possível porém ignorar o papel dos parâmetros legais na construção do acordo. 39 - Os acordos alcançados pela Comissão seguem os parâmetros legais? 4 4 4 2
  • 34. 34 11 - Dinâmica de poder específica ao conflito em questão: Poder procedimental (SOUZA, p. 35) Esta série de perguntas faz mais relação a pessoa do mediador, no caso o Ouvidor Agrário Nacional, que presidia as reuniões. Maioria de participantes da pesquisa (porém nem a metade das respostas) consideram que o Ouvidor é uma pessoa com suficiente preparação (informação e expertise) nos assuntos agrários (Nº 40). Muitos se abstêm em responder se ele é amável, íntegro, paciente, se sabe convencer, se tem educação, profissionalidade, integridade, etc. (Nº 42, 43, 44, 45, 46, 47) Há tendência maioritária a considerar que dá impressão de ser não favorável aos pequenos, é dizer, que os camponeses já entravam com a expectativa que vai apoiar a parte contrária (Nº 48). Ainda, uma maioria clara (08) opina que ele não se comprometia suficientemente na resolução dos problemas. Não há muitos que queiram se pronunciar sobre suas habilidades de negociador, nem sobre sua utilização dos recursos da Ouvidoria, nem sobre outras alternativas (Nº49, 51, 52). Ainda, muitos acreditam que apesar de ser apenas Ouvidor, ele tinha poder para pressionar, punir ou beneficiar os camponeses (Nº 50). SIM NÃO +/- ? 1. Informações e expertise no assunto 40 – O Ouvidor Agrário Nacional é uma pessoa com suficientes informações e preparação sobre os assuntos agrários? 5 4 2 3 2. Compromisso (foco no assunto) 41 - Ele se compromete de forma suficiente na resolução dos problemas? 4 8 2 3. Poder pessoal: a. boa aparência e amabilidade 42 - Ele tem boa aparência e é amável? 2 5 1 6 b. integridade 43 - Ele é integro? 1 2 2 9 c. paciência 44 - Ele é paciente? 4 4 6 d. eloquência 45 - Ele sabe convencer? 5 3 6 e. educação 46 - Ele é educado com todo o mundo? 4 3 2 5
  • 35. 35 f. ocupação profissional 47 - Ele tem dedicação e profissionalidade? 3 1 3 6 4. Expectativas de aprovação da parte contrária 48 - Ele dá impressão de ser favorável aos pequenos? 2 6 2 4 5. Habilidades de negociação e estilo 49 - Ele tem estilo e habilidades para negociação? 3 3 3 5 B. Poder substancial: 1. Poder coercitivo e retributivo 50 - Ele tem poder para pressionar, punir ou beneficiar os camponeses? 6 5 3 2. Controle dos recursos (poder econômico) 51 - Os recursos da Ouvidoria são usados a favor dos camponeses? 1 5 2 6 3. Alternativa a uma solução negociada 52 - Se não negociar com a Ouvidoria a situação fica pior? 3 4 2 5 12 - Contexto do relacionamento (SOUZA, p. 35) Uma maioria clara afirma desconhecer o seu trabalho anterior ao da Ouvidoria (Nº 53). Consideram com bastante positiva sua firmeza, estabilidade emocional e trato equânime de gênero. Porém as quatro mulheres participantes negam que fossem tratadas da mesma forma homens e mulheres. E uma maioria não considera que já não era boa a reputação dele entre os movimentos sociais e pequenos agricultores. A. Precedentes. 53 - Foi bom o trabalho do Ouvidor Nacional antes de entrar na Ouvidoria? 3 1 9 B. Poder psicológico: 1. Autoestima 54 - O Ouvidor apresenta autoridade e firmeza? 5 2 1 6 2. Estabilidade emocional 55 - Ele mostra estabilidade emocional? 6 2 1 5 3. Dinâmica de gênero 56 – Ele trata homens e mulheres do mesmo jeito? 6 4 4 C. Legitimidade: 1. Autoridade 57 - Ele tem autoridade para atuação na Ouvidoria? 6 3 5 2. Reputação 58 - Ele tem boa reputação entre movimentos sociais e pequenos agricultores? 3 5 3 3 11 - Os riscos envolvidos no processo de mediação (SOUZA, p. 36)
  • 36. 36 Alguns acreditam que sim, porém a metade (06+01) acham que Incra e Terra Legal não facilitavam o trabalho da Comissão (n.59). Muitas vezes faltavam informações necessárias para se firmar acordos esclarecidos. Também a maioria concordou que a urgência de soluções precipitava o trabalho da Comissão (Nº60). Um ponto positivo reconhecido era a participação das autoridades da administração (Nº 61), tal vez depois de bastante insistência por parte da Ouvidoria. Uma parte crucial é a aceitação do judiciário dos acordos firmados nas atas das Reuniões. Uma ligeira maioria é negativa (Nº 62). Esta é uma parte que compromete completamente o trabalho da mesma. Se depois os juízes se negavam aceitar os acordos, para que servia então à mediação da Comissão? Ainda uma parte importante dos riscos envolvidos no trabalho de mediação, diz respeito a “efeitos indesejados” da mesma. Pelo menos metade das respostas (07) concordam que as reuniões tinham efeitos indesejados (Nº 63). Uma das piores críticas ao trabalho das Reuniões da Comissão é o fato de que participantes sofreram repressão posteriormente. Alguns camponeses que se significaram em suas denúncias e liderança posteriormente foram atacados e vários assassinados logo depois de ter participado das Reuniões. As reuniões serviram para serem identificados com mais clareza. Participar das Reuniões da Comissão era perigoso. Élcio Machado e Gilson Gonçalves, foram torturados e mortos em 08 dezembro de 2009 poucos dias após uma Reunião; e a Liga dos Camponeses Pobres (LCP) difundiu que foi na Reunião com a Ouvidoria Agrária Nacional que as lideranças foram identificadas como lideranças pelos pistoleiros do fazendeiro Dílson Cadalto.xii Outras mortes foram registradas após as Reuniões da Ouvidoria, como um casal de sindicalistas em Guariba, Colniza MT em 2014;xiii assim como a morte de Paulo Justino Pereira em Rio Pardo, distrito de Porto Velho, assassinado o dia 01 de maio de 2015, dois dias depois de participar de uma Reunião da Comissão em Porto Velho, os dias 29 e 30, (na última das quais o autor deste trabalho estava presente). Havia quem com ironia perguntava-se quem seria o próximo a morrer depois das Reuniões da Ouvidoria. Estas mortes foram efeitos não planejados das Reuniões ou simplesmente violência que não tinha conseguido evitar? Algumas lideranças, quando mais participavam das reuniões da Ouvidoria, mais recebiam ameaças.
  • 37. 37 Estava claro que a participação nas Reuniões supunha uma exposição que podia comprometer gravemente a segurança dos participantes. SIM NÃO +/- ? Difícil o acesso às informações necessárias para se firmar um acordo esclarecido, 59 - O Incra, Terra Legal ou outros organismos facilitam o trabalho da Comissão? 4 6 1 3 Maior a pressão pelo acordo em uma situação de dificuldade para fazer face aos custos do processo 60 - A urgência de soluções precipita o trabalho da Comissão? 7 1 1 5 A dificuldade de se identificar a pessoa responsável por firmar o acordo dentro de... entes governamentais; 61 - As autoridades da administração participam e aceitam as Reuniões? 8 2 2 1 Eventual resistência do Judiciário à execução de acordos firmados em processos de mediação 62 - O Judiciário aceita à execução de acordos firmados nas atas da Comissão? 5 6 1 2 63 - As reuniões provocam efeitos indesejados? 7 3 2 2 12 - Facilitação de processos decisórios participativos. (SOUZA, p. 38) A opinião majoritária é negativa sobre a obtenção de resultados, e o objetivo das Reuniões facilitar os processos decisórios participativos sobre o tema da violência, dos conflitos agrários, da justiça no campo e da reforma agrária. (Nº 64 à 67). SIM NÃO +/- ? Utilizados seja quando estão envolvidos apenas entes públicos que pretendem atuar de forma colaborativa, seja quando estão sendo realizadas reuniões públicas ou quando está sendo buscada pelo Poder Público uma solução negociada com todos os interessados 64 - As reuniões da Comissão ajudam a reduzir violência? 3 8 2 2 65 - As reuniões da Comissão ajudam a resolver conflitos? 3 6 2 2 66 - As reuniões da Comissão ajudam a conseguir mais justiça no campo? 6 8 1 67 - As reuniões da Comissão ajudam a avançar na reforma agrária? 3 8 1 2
  • 38. 38 13 - Os mediadores (ritmo de trabalho) (SOUZA, p. 40) Não há tendência muito clara de opinião sobre a pressão por resultados acima da Comissão (Nº 68). Também não fica claro que fosse atendido todo o mundo que o solicitava (Nº69). Tal vez porque havia muita demanda (aí concorda a maioria, no Nº 70), o qual também prejudicava os resultados (Nº 71) SIM NÃO +/- ? Ritmo de trabalho. O mediador institucional é apressado, pelo organismo que o colocou no lugar, para encontrar resultados, para chegar a soluções o mais rapidamente possível 68 – A Comissão atua apressada pelo governo para obter resultados? 5 5 2 2 69 - É atendido todo o mundo que o solicita? 4 5 2 3 70 - Há muitas demandas de intervenção da Ouvidoria? 7 3 4 71 - Os resultados são prejudicados pela demanda? 6 2 2 5 14 - Os mediadores. (Diretrizes éticas) (SOUZA, p. 40) Um dos últimos blocos de perguntas faz referência as diretrizes éticas da mediação. O tema da desigualdade ou assimetria das partes é retomada nas diretrizes éticas, como uma obrigação de ser contrastada pelo mediador. Não é isso que sentem a maioria dos participantes que expressaram sua opinião (Nº 72). Mas a imparcialidade é sentida pela maioria (Nº 73), que acredita que o Ouvidor tinha suficientes garantias para participar com liberdade e segurança das Reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência. SIM NÃO +/- ? 1 A imparcialidade (neutralidade) se desdobra no dever, do qual trataremos mais adiante, de buscar um maior equilíbrio de poder entre as partes, quando a assimetria é muito significativa. 72 - Os mais fracos são fortalecidos as reuniões da Comissão? 3 6 1 4 “O mediador deverá conduzir a mediação de forma imparcial e evitar conduta que dê a 73 - Há suspeitas de favoritismo da Comissão, preferência ou preconceito, atribuição de 4 6 4
  • 39. 39 aparência de parcialidade” “dever de o mediador recusar a função quando presentes conflitos de interesse entre ele e ao menos uma das partes” diferente valor as diversas partes envolvidas nos conflitos? “Dever de atuar com liberdade, sem sofrer qualquer pressão interna ou externa, sendo permitido recusar, suspender ou interromper a sessão se ausentes as condições necessárias para seu bom desenvolvimento” 74 - Há suficientes garantias para o Ouvidor e todos participar com liberdade e segurança das Reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência? 7 6 1 “Tampouco havendo obrigação de redigir acordo ilegal ou inexequível” 75 - Às vezes a Comissão aceita acordos de duvidoso cumprimento? 7 3 4 15 - Os mediadores. (Diretrizes éticas) (SOUZA, p. 45) Apenas a pergunta sobre a capacidade e qualificação do Ouvidor para realizar a mediação das Reuniões recebeu resposta majoritária (Nº 77. Nos itens restantes a maioria das considerações é ligeiramente negativa (Nº 76, 78, 79, 80, 81, 62, 83). SIM NÃO +/- ? Dever de respeitar a autonomia das partes. O Código do CONIMA dispõe, em seu subitem IV, 9, caber ao mediador: “9. Eximir-se de forçar a aceitação de um acordo e/ou tomar decisões pelas partes.” 76 - Os camponeses são forçados a tomar decisões e acatar acordos contra sua vontade nas Reuniões da Comissão? 5 6 2 1 1.8.1.3. Deveres de competência e diligência: “a capacidade para efetivamente mediar a controvérsia existente”. Assim, o mediador “somente deverá aceitar a tarefa quando tiver as qualificações necessárias para satisfazer... 77 - O presidente das Reuniões tem a capacidade, suficiente qualificação e atualização necessária para mediar nos conflitos de violência no campo? 6 4 1 1 ... as expectativas razoáveis das partes”. 78 - As expectativas dos agricultores são satisfeitas pelas Reuniões da Comissão? 4 7 1 2 “O mediador somente deverá aceitar casos quando possa satisfazer às razoáveis expectativas das partes no que diz respeito à duração do processo de mediação.” 79 - Os assuntos são encaminhados e resolvidos em prazo de tempo razoável? 3 7 3 1 Dever de alertar as partes sobre a necessidade de perícia técnica ou 80 - Os agricultores recebem auxilio para 4 5 3 2
  • 40. 40 assessoramento de terceiros. Cabe ao mediador: “Sugerir a busca e/ou a participação de especialistas na medida em que suas presenças se façam necessárias a esclarecimentos para manutenção da equanimidade”. receber as informações corretas (Incra, etc.) sobre a situação legal e jurídica das áreas em conflito? Uma das regras que regem o procedimento de conciliação/mediação, a “desvinculação da profissão de origem”, que consiste no dever que possui o mediador ou conciliador de “esclarecer aos envolvidos que atua desvinculado de sua profissão de origem” 81 - Os agricultores acreditam as Reuniões da Comissão estarem presididas por um desembargador com poder de juiz? 4 8 1 5. Dever de zelar pelo equilíbrio de poder entre as partes. Ética de Mediadores do CONIMA, em seu no subitem V, 8, dispõe caber a ele: “Suspender ou finalizar a mediação quando concluir que sua continuação possa prejudicar qualquer dos mediados ou quando houver solicitação das partes.” 82 – Eles são alertados se a Reunião pode prejudicar aos camponeses? 4 8 3 “Se uma das partes aparentar ter dificuldades em compreender o processo, as questões nele envolvidas ou as possíveis opções de acordo que se apresentam, ou dificuldades em participar do processo, o mediador deverá explorar as circunstâncias e possibilidades de ajuste ou modificações que tornem possível a esta parte compreender, participar e exercer sua autodeterminação.” 83 - Os camponeses que tem dificuldades recebem suficiente auxílio para compreender, participar e decidir? 3 9 2 16 - Os mediadores. (Diretrizes éticas) (SOUZA, p. 52) A lei da transparência da administração pública obriga a divulgar tudo que é tratado nas Reuniões da Comissão de Combate à Violência? Há maioria clara que concorda na necessidade de maior sigilo nas Reuniões (Nº 84), ainda que a transparência na condução do processo é suficiente (Nº 85). De falta de cumprimento dos acordos, o que compromete sua viabilidade (Nº 86); e também pela necessidade de zelar melhor dos interesses dos terceiros ausentes (Nº 87). SIM NÃO +/- ?
  • 41. 41 Confidencialidade, tanto quanto ao que foi ventilado na sessão conjunta quanto nas sessões individuais, estipulando como únicas exceções o consentimento das partes ou a existência de legislação em contrário. 84 - O que é tratado e ventilado nas Reuniões e pedidos à Ouvidoria deve ser tratado com maior sigilo? 9 3 1 1 Transparência na condução do processo. Transparência do mediador envolve compartilhar com as partes aquilo que o mediador acredita ser o melhor passo a ser dado em seguida, 85 - Há suficiente transparência nas providências tomadas pela Comissão, para que posteriormente possam ser acompanhadas pelos grupos que participam? 7 5 2 Dever de zelar pela viabilidade do cumprimento do acordo. Deve estabelecer de forma clara quais são as obrigações, a quem compete cada uma delas, onde, quando e de que forma devem ser cumpridas, quem vai monitorar este cumprimento e o que acontece caso ocorra descumprimento. 86 - As obrigações costumam ser definidas e cumpridas nos acordos alcançados nas Reuniões da Comissão? 3 8 1 1 Dever de zelar pelos interesses de terceiros afetados. Trata-se da responsabilidade do mediador perante “as partes não presentes à mesa”. 87 - Quem não pode estar presente na Reunião costuma sair prejudicado? 6 2 2 4 17 - Fundamentos jurídicos e principais previsões normativas sobre resolução consensual de conflitos envolvendo o Poder Público no Brasil. Fundamentos constitucionais. (SOUZA, p. 63) Ao final, predomina a desalentadora opinião que a mediação exercida pela Ouvidoria Agrária através das Reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência não agilizava a resolução dos conflitos (Nº 88); nem representava economia de recursos econômicos para isso (Nº 89); não conseguia resultados razoáveis (Nº 90); nem fortalecia a confiança dos agricultores na justiça e no Estado de Direito (Nº 91). SIM NÃO +/- ? a) o princípio do acesso à justiça (art. 5º., XXXV, da Const. Federal), que exige a disponibilização de métodos adequados b) o princípio da eficiência (art. 37, caput), que demanda sejam os conflitos resolvidos (sob os aspectos temporal) menos tempo, menos desgaste para a relação entre as partes 88 - As Reuniões da Comissão Nacional de Combate à Violência agilizam a resolução de conflitos? 3 7 3 1
  • 42. 42 (Econômico) da forma que apresente a melhor relação entre custo e benefício, ou seja, menores custos, 89 - As Reuniões da Comissão conseguem economizar recursos públicos para resolução de conflitos? 2 6 1 5 E de resultados) e melhores resultados para ambas partes, 90 - As Reuniões da Comissão obtêm resultados razoáveis para resolução de conflitos? 3 5 2 3 c) o princípio democrático, (art. 1º.), que decorre de o Estado não ser um fim em si mesmo e reclama portanto que, quando o Poder Público se veja envolvido em conflitos com particulares, ...para encontrar uma solução adequada para o problema. 91 - As Reuniões da Comissão fortalecem a confiança dos agricultores na justiça e no Estado de Direito? 5 7 1 2 18 - Peculiaridades da resolução consensual de conflitos envolvendo o Poder Público. (SOUZA, p. 66) Algumas destas características insistem em pontos já contemplados: Princípio de legalidade; Isonomia (cria precedentes); Publicidade como regra, confidencialidade quando justificada... A opinião que prevalece é que estes princípios não eram suficientemente cumpridos (Nº 92, 93, 94, 95). SIM NÃO +/- ? Princípio da legalidade (ou da juridicidade) a verificação das normas jurídicas aplicáveis ao caso é apenas o ponto de partida da negociação, a moldura que lhe traça os limites. Por tal razão, todos os acordos envolvendo o Poder Público devem ser devidamente fundamentados ... e se sujeitam a controle interno e externo de juridicidade. 92 - Os acordos alcançados contemplam os princípios legais? 2 6 2 4 O princípio da isonomia. O Poder Público, quando firma um acordo, ...está estabelecendo um precedente – ou seja, todo aquele que se veja em conflito com ente público na mesma situação ou em outra muito similar terá pleno direito de invocar para si a mesma solução, 93 - Os acordos alcançados têm validade e aplicação para solucionar outros conflitos semelhantes? 4 7 3 O princípio da publicidade, quando se pensa em resolução consensual de 94 - As Reuniões e acordos obtém a necessária publicidade? 2 4 2 6
  • 43. 43 conflitos envolvendo o Poder Público, a publicidade é a regra; ... a confidencialidade é a exceção e precisa ser juridicamente justificada. 95 - Se aceita respeitar a confidencialidade quando necessária? 4 6 4 19 - Os (falsos) argumentos contrários à consensualidade na esfera pública. (SOUZA, p. 68) Quando Luciana M. Souza combate alguns argumentos contrários a mediação na esfera pública, cita elementos interessantes para a realização das Reuniões da Ouvidoria: Muitas vezes os desdobramentos podem acabar sendo reuniões posteriores do INCRA ou outra administração com os interessados, que faz uma mediação com terceiros (opinião polêmica nos resultados da pergunta Nº 96). Ainda, nas respostas há opinião maioritária de que das decisões das Reuniões, os bens comuns indisponíveis, como meio ambiente ou terras públicas, muitas acabavam sendo prejudicadas pelos acordos alcançados (Nº 97). SIM NÃO +/- ? Quando a desigualdade torna inadequada a negociação direta entre as partes, mas torna altamente recomendável a utilização da mediação, que é a negociação facilitada por um terceiro. 96 - As Reuniões incentivam a realização de negociações por separado com as partes (por ex. do INCRA com camponeses ou fazendeiros)? 4 5 5 O nosso legislador já reconheceu implicitamente inúmeras vezes que indisponibilidade não se confunde com intransigibilidade, ao admitir a utilização da negociação em uma série de conflitos que envolvem direitos indisponíveis, de natureza pública e difusa inclusive 97 – Bens de todos, como terras públicas e meio ambiente são prejudicados pelos acordos? 7 3 1 3
  • 44. 44 6 – HISTÓRICO E EXTINÇÃO DA OUVIDORIA AGRÁRIA NACIONAL. Capítulo aparte significativo são as reações publicadas em dezembro de 2016 após a extinção da Ouvidoria Agrária Nacional. Para o pesquisador que a duras penas consegue umas linhas escritas sobre o tema de seu estudo, as manifestações aparecidas sobre a Ouvidoria após sua extinção são valiosas contribuições ao seu trabalho. O Ouvidor Agrário a finais de outubro de 2016, pouco antes da extinção da Ouvidoria já havia declarado não dispor de recursos orçamentários para realização de patrulhas rurais em áreas de conflito em Anapu, Pará,xiv após ataques de jagunços incendiando acampamentos de sem-terra na região. No momento não há disponibilidade financeira na ação orçamentária gerenciada por esta Ouvidoria Agrária Nacional, impedindo, assim, o repasse de recursos financeiros para apoiar a realização da patrulha rural em questão, como vinha acontecendo até agora", declarou Gercino, na mensagem enviada ao governo paraense. (BORGES, A.) Os conflitos de Anapu podem ter sido determinantes da extinção da Ouvidoria, pois o ano anterior já tinham motivado duras críticas dos ruralistas contra o Ouvidor, após o mesmo ordenar a expulsão da advogada da federação de associações ruralistas paranaenses, FAEPA, Keila Souza, e fazendeiros da região que constrangiam o depoimento dos camponeses sobre seis mortes de camponeses na região. Eles foram recebidos em reunião por separado no dia posterior. Porém isso não evitou que o Ouvidor fosse acusado de “abuso de autoridade”, de “não cumprir com o direito à liberdade de expressão e ignorar a legitimidade dos produtores rurais”, de “arrogância” “insegurança e desequilíbrio emocional”.xv Em Nota Oficial assinada posteriormente pelo presidente da FAEPA, Carlos Fernandes Xavier, chega a qualificar de “circo” as Reuniões da Comissão, abunda em ataques pessoais ao Ouvidor Agrário, e conclui: Vimos a público denunciar esses desmandos, práticas antidemocráticas, violência e desrespeito com as prerrogativas constitucionais garantidas a todos os advogados no exercício de suas funções. Exigimos da Ordem dos Advogados do Brasil, do Tribunal de Justiça do Estado, do Comando da Polícia Rodoviária Federal e do próprio Conselho Nacional de Justiça (a quem estamos nos dirigindo, denunciando o abuso de um servidor do Executivo que se faz passar por magistrado) as providências cabíveis para que se restabeleça o Estado Democrático de Direito no Pará. (NOTA OFICIAL DA FAEPA de 01/12/2015)
  • 45. 45 Recolhemos a Nota inteira no Anexo 3 para comprovar o nível de rejeição do setor ruralista contra a Ouvidoria. Não foi o primeiro enfrentamento com os ruralistas. Um ano depois o conflito em Anapu continuava, porém a Ouvidoria já não tinha mais recursos para ajudar as forças policiais a tentar frear a violência na região. Pouco depois a Ouvidoria seria extinta provocando a reação dos movimentos sociais e personalidades da esquerda. Alguns traços históricos da Ouvidoria. Não localizei muitas informações sobre a história da Ouvidoria, desde a sua criação em tempos do presidente Fernando Henrique Cardoso, segundo José de Souza Martins, MOTIVADA PELA política agrária de “Distribuir a terra e distribuir a paz social, ao mesmo tempo, atenuando e reduzindo a conflitividade dos confrontos sociais que tem a disputa pela terra como causa.” (MARTINS. 2003). Segundo uma matéria de 24 de março de 2002: Gercino Alves foi convidado por Raul Jungmann para o cargo de ouvidor depois que o desembargador foi ameaçado de morte por ter determinado a prisão do ex-deputado Hildebrando Pascoal, acusado de chefiar um grupo de extermínio no Acre. Sua função no Incra era viajar pelo país e servir de canal de comunicação entre sem-terra e governo. (FOLHA, 2002) Diversas fontes citam a origem na criação do próprio Ministério de Desenvolvimento Agrário pelo decreto nº 1.888, de 29 de abril de 1996. Primeiro foi criado o cargo de ouvidor agrário. No Decreto no 3.338, de 14 de janeiro de 2000 e no Decreto nº 4.723, de 6 de junho de 2003 existe apenas a figura de Ouvidor Agrário, ligado à Secretaria de Reforma Agrária dentro da estrutura do Ministério de Desenvolvimento Agrário. Já no Decreto nº 5.033, de 5 de abril de 2004, por primeira vez aparece a OAN denominada como: “Departamento de Ouvidoria Agrária e Mediação de Conflitos”. Como citado, na última etapa foi definida pelo Decreto Federal 6.813 de 03 de abril de 2009, formando parte do Ministério de Desenvolvimento Agrário, onde a OAN dependia diretamente da Secretaria Executiva. - Desautorizada pelo próprio governo federal. Já desde o início parece que a atuação da Ouvidoria não foi sem polêmica. Um dos episódios críticos aconteceu por motivo da ocupação Córrego da Ponte, em Buritis, MG, fazenda propriedade dos filhos do Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, em março de 2002. Segundo informações de Renata Giraldi e Sandro Lima:
  • 46. 46 Após 14 horas de tensa negociação e da saída dos sem-terra da fazenda Córrego da Ponte, propriedade dos filhos do presidente Fernando Henrique Cardoso, em Buritis (MG), a Polícia Federal deteve ontem 16 líderes da invasão. A prisão contrariou acordo mediado por agentes do governo, que se demitiram, em protesto. O trato viabilizou a retirada pacífica dos invasores. (GIRALDI, 2002) Tinham negociado o acordo com o MST o ouvidor agrário, Gercino José da Silva e a ouvidora substituta, Maria de Oliveira, que “Previa a retirada pacífica dos sem-terra. Em troca, os líderes não seriam presos e seriam recebidos pelo ministro do Desenvolvimento Agrário, Raul Jungmann.” (GIRALDI, 2002) Traído o acordo com a prisão de 16 lideranças do MST, eles se declararam indignados: A ouvidora substituta, Maria de Oliveira, disse que a Ouvidoria Agrária Nacional foi traída. "Estou indignada, a negociação feita por mim não foi cumprida. A prisão foi desnecessária". Frustrado com o resultado da operação, o ouvidor agrário nacional, Gercino José Alves, acompanhou a colega: "Estamos exonerados", afirmou. (GIRALDI, 2002). Não sabemos como se saldou o incidente, porém pelo menos Gercino, continuou na Ouvidoria. Um dos frutos da colaboração com Jungmann foi a edição da MP n° 2.027/38 (depois MP n° 2.183): Essa MP proíbe, por dois anos, as avaliações e vistorias em terras invadidas e exclui do Programa de Reforma Agrária os que participarem de ocupações, além de suspender os processos em tramitação durante as ocupações. Esse dispositivo vinha sendo apontado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e pelo presidente do Incra como um empecilho para a Reforma Agrária. No entanto, os estudos para sua revogação estão, pelo menos por enquanto, suspensos, a fim de manter sob controle a desconfiança dos ruralistas em relação ao governo petista. (IPEA, 2003 p. 101) Efetivamente, a redação da MP n. 2.183 incrementou o §6 do Art. 2º da Lei nº 8.629/1993: § 6o O imóvel rural de domínio público ou particular objeto de esbulho possessório ou invasão motivada por conflito agrário ou fundiário de caráter coletivo não será vistoriado, avaliado ou desapropriado nos dois anos seguintes à sua desocupação, ou no dobro desse prazo, em caso de reincidência; e deverá ser apurada a responsabilidade civil e administrativa de quem concorra com qualquer ato omissivo ou comissivo que propicie o descumprimento dessas vedações. (LEI 8.629/1993) Restrição frequentemente utilizado pela Ouvidoria no sentido de coibir ocupações de terra. Lembro quando no transcurso de uma reunião da Comissão em Porto Velho em 2014, uma ligação ao Ouvidor do superintendente regional do INCRA interrompeu a reunião, para anunciar que 300 pessoas do Acampamento Hugo Chávez do MST estavam avançando pela BR-364 para a sede da Fazenda Nova Vida. Gercino mandou recado:
  • 47. 47 “Diga para eles que se ocupar vai ser um tiro no pé”. Referindo-se ao dispositivo citado, por mais que em determinadas situações, ele foi contornado. Por exemplo, em Corumbiara, os ocupantes da LCP aceitaram montar seu acampamento para dormir fora da área, mesmo trabalhando no interior da mesma, para permitir a vistoria do INCRA. Porém a manutenção deste dispositivo legal acabou emperrando a solução de muitos conflitos, e em vez de impedir as ocupações, contribuiu para a radicalização dos métodos de ocupação. - Criticada e criminalizada pela CMI da Terra. Outro episódio delicado da Ouvidoria foi registrado no Congresso Nacional, por motivo da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito “da Terra”, que iniciada em 2003, realizou trabalhos até novembro de 2005. Uma matéria de Samir Oliveira, de 2012: “Há sete anos, CPMI da Terra marcava embate entre ruralistas e movimentos sociais” ajudou-me a entender o que aconteceu durante esta CMPI. Esta comissão parlamentar de inquérito foi palco de um embate parlamentar entre defensores da Reforma Agrária e Ruralistas, tendo estes finalmente conseguido aprovar o que inicialmente era um relatório particular do deputado do DEM, Abelardo Lupion. Aquele que era o relatório inicial da Comissão, o Deputado João Alfredo (PT e depois PSOL), finalmente foi aprovado apenas como voto particular. Por motivos diferentes, os dois criticaram a Ouvidoria Agrária. No caso de Lupion, a Ouvidoria chegou a ser criminalizada. No “Relatório dos trabalhos da CPMI “da terra”, do Deputado Abelardo Lupion, de Novembro de 2005, o trato dedicado à Ouvidoria e ao INCRA compõe o capítulo 6: “Dos órgãos federais destinados a executar a reforma agrária e garantir a paz no campo”. A Ouvidoria é duramente atacada por ter pedido diversos “habeas corpus” de camponeses presos, e a Ouvidoria é acusada de parcialidade a favor dos camponeses e de exceder suas funções para advogar por camponeses presos. “Configuram nítida função de procurador da parte” (LUPION, 2005, p.137), concluindo: A conclusão a que se chega é que houve uma evidente motivação para favorecer uma das partes envolvidas, o que se distancia léguas daquilo que se poderia considerar o cumprimento das funções regimentais de seu cargo. (LUPION, 2005, p 138) Lupion chega a analisar se os ouvidores cometeram delito de prevaricação, afastando tal conclusão, porém acusa o Ouvidor de parcialidade, após Gercino ter alegado cumprir as orientações do novo governo Lula: Por fim, o sr. Gercino já respondeu à reportagem do jornal O Estado de São Paulo, publicada no dia 26/04/04 sobre os fatos aqui narrados, que estava cumprindo seu papel ao buscar solucionar os conflitos, atuando segundo a ideologia do novo governo. Ele, que foi nomeado ainda no governo do Exmo. Sr. Presidente da República Fernando Henrique Cardoso, disse haver adaptado o exercício de seu cargo às orientações veiculadas pela equipe de S. Exa. o Presidente Luís Inácio Lula da Silva. (LUPION, 2005 p.138) Na citada entrevista do dia 26/04/2004 no Estado de São Paulo, intitulado “Fazendeiros acusam ouvidor agrário de favorecer o MST”, Gercino se defendia alegando, segundo a matéria: