Apresentação da Comissão Pastoral da Terra "Seminário Movimentos Sociais de Luta pela Terra e o Judiciário", organizado pelo Núcleo de Assessoria Técnica Popular Dom Antônio Possamai em Jaru, Rondônia, Brasil, o dia 14 de setembro de 2013. Mostra como os pequenos agricultores que demandam a reforma agrária tem dificuldade para aceder ao judiciário e ao Estado de Direito, provocando a violência e impedindo a resolução dos conflitos agrários da região.
2. O faroeste
rondoniense
Na ocupação desordenada da
Amazônia, promovida pela ditadura
militar, a iniciativa particular dos
colonos, fazendeiros e empresários, ávidos
por novas terras, rapidamente converteu o
estado de Rondônia no novo faroeste
brasileiro.
3. A colonização de
Rondônia foi
realizada na base
da espingarda
Sem o domínio da lei, quem se apoderava da
terra sempre eram os mais poderosos, os
mais corruptos, violentos ou gananciosos. A
lei do cão.
4. São 35 anos da
Comissão
Pastoral da Terra
em Rondônia.
Faz décadas que a CPT RO está neste contexto,
defendendo e apoiando a organização dos
pequenos agricultores vitimados pela
prepotência dos poderosos.
5. Uma injusta
distribuição
das terras
¾ partes da terra destinadas a agricultura
foram parar nas mãos do latifúndio, e 80% dos
pequenos agricultores ocupam apenas 20% das
terras de lavoura.
Em muitos destes latifúndios, perdura viva na
memória uma história de trabalho escravo, de
impunidade, de assassinatos e de violência
contra as famílias de pequenos agricultores.
6. Os pequenos
somente tinham
vez quando bem
unidos e
organizados
Os pequenos precisavam a coragem dos
desesperados, dispostos a enfrentar a
pistolagem e a violência dos grandes
grileiros de terra e a dobrar o aparelho do
estado, totalmente colocado ao serviço dos
primeiros.
7. Um sistema
extremamente
injusto de
distribuição da terra
Este sistema continuou perpetuando a
violência consagrada pelo aparelho
jurídico e repressivo,
Mantido por episódios como o Massacre de
Corumbiara o dia 09 de agosto de 1995.
8. Avanço da
fronteira agrícola
e novas
ocupações
Rondônia é fruto da ocupação caótica e
desorganizada da terra marcada pela violência,
Que em parte continua nos mesmos moldes.
Junto a retirada ilegal de madeira e o avanço da
frente agrícola devastando as florestas nas regiões
próximas do Mato Grosso e sul do Amazonas.
9. A violência
continua hoje
Após o assassinato de um dos sobreviventes de
Corumbiara, Adelino Ramos, o Dinho, liderança do
MCC em Vista Alegre de Abunâ em maio de
2011, Rondônia tem vivido uma nova etapa de
pistolagem, violência, ameaças de morte e
assassinatos.
Durante 2012 a CPT registrou em Rondônia o maior
número de mortes no campo de todos os estados do
Brasil.
10. Repressão da luta
pela terra
O estado parece continuar ao serviço apenas dos
poderosos.
Quando uma área é ocupada para reforma
agrária, rapidamente surge a repressão violenta, da
mão da polícia do estado ou de jagunços
contratados.
A polícia dificilmente investiga os atos de violência
contra os pequenos agricultores que demandam
reforma agrária.
11. Repressão da
luta pela terra
Ocupações de terra são reprimidas até antes de
acontecerem.
As decisões judiciais de reintegração de posse são
quase imediatas e às vezes antecedem a qualquer
ameaça de ocupação.
A atuação parcial, abusos de poder e violência da
polícia acabam se convertendo numa violência
institucional e verdadeiro terrorismo de estado,
promovida por quem a deveria evitar.
12. As injustiças
registradas são
muitas.
O que tem acontecido com as famílias de posseiros
da Associação Água Viva/Fazenda Caramello, do
município de Chupinguaia, clama céus e terra.
Posseiros antigos duma área
abandonada, acabaram sendo convertidos em
verdadeiros agricultores “sem terra”.
13. Prisão e
criminalização de
lideranças
O presidente do sindicato Udo
Walhbrink, um vereador e a liderança duma
associação vizinha, amargaram oito meses de
cadeia, acusados de formação de quadrilha.
A justiça, bloqueando suas contas e
condenando um total de 18 pessoas a penas
de mais de 150 anos de cadeia!
14. Dois pesos
duas medidas
A prisão deles contrasta com a impunidade
de Hilário Bodanese, o qual foi acusado de
ter armas e pistoleiros, de ter perseguido
lideranças e ter ferido dois dos acampados
do Barro Branco.
Até agora sem punição nem condena.
15. A injustiça
agrária
legalizada
Boa parte de problemas com os títulos
provisório , como as CATPs: contrato de
alienação de terras públicas
A maioria inadimplentes (abandonadas).
Terras que por tanto devem ser retomadas
, voltando ao domínio da União e serem
destinadas para reforma agrária.
16. Travas e
controvérsias
legais
Porém estes processos sofrem todo tipo de
travas legais e burocráticas,
E eternas controvérsias legais.
Sobre a competência da justiça estadual ou da
justiça federal.
Se é competência do INCRA ou do Terra
Legal, etc.
17. Justiça rápida para umas
coisas, lenta para outras
Assim os processos que devem decidir sobre o
domínio, (a propriedade da terra), dormem nas
prateleiras dos fóruns, eternizando os conflitos
na geografia do Estado.
Enquanto as reintegrações de posse são
rapidamente decididas contra os que realmente
ocupam e produzem na terra, os posseiros,
A favor dos donos dos títulos, mesmo sem
jamais ter morado ou plantado nada no local.
18. Não é reconhecida a
função social da
terra.
Domínio e posse é decidido por separado: se
decide quem fica na terra antes de decidir
quem realmente é o dono dela.
Poucas vezes é contemplada a função social
da terra, reconhecida na constituição,
Nem aplicada à necessidade legal de
consultar com o ministério público as
situações de conflito agrário que atingem
conflitos agrários.
19. Juízes agrários
Em Rondônia é muito difícil um processo ir para os
juízes agrários estaduais, decidindo juízes locais
não especializados temas agrários
complicados, onde sequer a competência estadual
dos mesmos é clara.
Para um processo ir para a vara agrária deve decidir
o pleno do Conselho Estadual de Justiça
20. Juízes culpam o
INCRA
Com frequência os juízes culpam o INCRA nas
decisões tomadas contra os pequenos agricultores.
Prazos para recursos e intimações vencem sem a
Procuradoria do INCRA se pronunciar.
Agora com a desculpa que não é mais competência
do Incra, quem deve intervir é o Terra Legal e a
CONJUR de Brasília, dificultando a defesa dos
posseiros.
21. Assentados
tratados como
invasores
Num “festival” de reintegrações de terra.
Até o absurdo da justiça federal tratar de invasores e
famílias assentadas pelo governo e mandar despejar.
Pouca justiça os camponeses podem esperar do
conjunto de instituições que administram a temática
agrária no estado.
22. Impunidade da
violência agrária.
Medidas judiciais acompanhadas de atuação impune
de pistoleiros e de medidas abusivas policiais.
Lideranças duramente perseguidas e reprimidas, sendo
presas e condenadas pela polícia, ao menor indício de
violência,
Pistoleiros protegidos, e
ameaças, agressões, expulsões, intentos de homicídio e
assassinatos permanecendo na impunidade.
Os autores conhecidos e denunciados, porém é muito
difícil que sejam presos, apuradas e condenadas as
violências de autores e mandantes.
23. Desespero e
impotência
Muitos agricultores desesperam ao sentir o peso
dos poderes do governo, da polícia e do judiciário
se abater esmagando qualquer intento de
resistência.
Muitos sequer têm acesso a advogado e resulta
difícil o atendimento da defensoria pública.
A capacidade econômica de grandes proprietários
e grupos empresariais para recorrer e pleitear na
justiça eterniza os conflitos e dificulta qualquer
reação legal dos pequenos.
24. Sem acesso ao
“Estado de
Direito”
O fato é que os pequenos agricultores não tem
acesso real ao necessário “Estado de Direito” para
defender seus direitos.
A frustração, a raiva e a revolta não para de
aumentar e excluir do convívio social os mais
vitimados.
Assim famílias de pacatos agricultores, que
somente queriam terra para trabalhar com
autonomia e dignidade, estão tentados de reagir
com violência, tendo a polícia, os juízes e o estado
como os principais inimigos.
25. A tentação da
violência
Em parte fruto do acesso ao judiciário, a violência
parece ser o único recurso dos pequenos.
Não são poucos os que consideram legítima a
conquista da terra pelas armas e o uso de armas
para se defender da pistolagem.
Porém qualquer porte de armas e reação violenta
dos pequenos agricultores rapidamente é punida e
criminalizada.
26. A armadilha da
violência.
Ao final o uso da violência como método de luta
pela justiça na terra coloca o povo numa luta
desigual onde tem tudo a perder.
E acaba sendo utilizada para colocar a opinião
pública contra as legítimas reivindicações dos sem
terra a necessidade da reforma agrária.
A violência provoca mais violência e se converte
numa armadilha que somente justifica mais
repressão e violência.
27. A violência não se
justifica para fins
bons.
Acabou o tempo que conquista da terra devia ser
feita com espingardas.
Nem que seja uma luta justa.
Violência somente traz mais repressão.
O acesso ao judiciário e o estado de direito para
todos é necessário para superar a espiral da
violência.
28. Legalidade não
significa sempre
justiça
A legalidade, o estado de direito e o judiciário têm
a função de servir de marco para resolução pacífica
dos conflitos, com o respeito ao estado de direito.
Se existe conflito, o lugar de resolução não pode
ser a violência das armas, deve ser na mediação ou
no fórum judicial.
Precisamos recuperar a soberania popular da
função do Estado e do Judiciário ao serviço do bem
comum.
29. A violência é a melhor
desculpa para a
repressão.
O recurso à violência acaba atingindo o interior
dos acampamentos.
A provocação de divisões são a primeira estratégia
utilizada e a melhor desculpa para acabar com os
movimentos.
Muitas vezes a violência se converte em
enfrentamento dos pequenos contra os pequenos.
Um acampamento de sem terra não pode ser um
“morro carioca”, um estado dentro do Estado.
30. “Só por meios
justos pode se
alcançar um fim
justo” Gandhi
“O uso da violência como meio corrompe e impede
a chegada a um fim nobre e justo”.
“Só por meios justos pode-se alcançar um fim
justo”.
31. Precisa unificar
as lutas
As organizações
populares, com
diversas
estratégias, apresent
am muitas vezes por
separado as mesmas
pautas de
reivindicações, que
cada qual defende
pelo seu lado, de seu
jeito.
32. Soberania popular
significa exigir do
Estado a sua vocação.
A violência, a ilegalidade e a injustiça é tanto mais
grave quando parte daqueles que tem a obrigação de a
defender.
As autoridades devem servir para superar a
violência, fundar a paz e a convivência social, e por isso
devem ser respeitadas.
Por isso também as autoridades tem o dever
irrenunciável de estar ao serviço do bem comum.
33. A superação da
violência
A superação da violência de dos conflitos passa
pela mudança das leis injustas.
Pela exigência de responsabilidades das atuações
das autoridades.
Pela mobilização, pela subversão da injustiça e da
“des-órdem” estabelecida, inclusive contra
sentencias judiciais inaceitáveis.
34. Desobediência
civil.
Às vezes pode ser preciso “obedecer primeiro a
Deus do que a os homens” (Atos 5), estar dispostos
a desobedecer leis injustas e a sofrer por isso.
Não podemos obedecer leis injustas e cooperar
com a injustiça.
Não violência não significa renunciar a resistir e a
lutar.
Quando a causa é justa e certa, a luta não violenta
ganha e merece todo tipo de apoio.
35. A não
cooperação e a
desobediência
ativa
Um punhado de pessoas não pode mandar em
milhões de outras se elas se recusarem a obedecer.
A não-violência ensina que o poder de uns
depende da cooperação de muitos outros.
Assim, a não-violência faz desmoronar o poder dos
dirigentes quando consegue extinguir grande parte
desta cooperação com a injustiça.
36. Lutar com a força da
Verdade e da Justiça
A justiça e a verdade não podem ser relegadas na
luta pela terra.
E em último termo, e a moral e a ética devem guiar
as leis e a sua aplicação se submeter a elas, a
procura suprema do Bem e da Justiça.
Mostrar a verdade, a legitimidade e a justiça duma
luta é o primeiro passo para a vitória.