1. "0s vinhos brasileiros se
O proprietário da única importadora européia dedicada aos nossos vinhos ressalta a
qualidade da bebida produzida no Brasil e revela sua paixão pelo país
por Fernando Roveri
-"Nascido em janeiro de 1969,
em Praga, Roman Van ^k ini-
ciou seus estudos em arte
publicitária na Escola Arte Vaclav
Hollar, onde se especializou em foto-
grafia, e depois cursou jornalismo
na Universidade Carolina de Praga.
Começou a carreira de negócios im-
portando calçados brasileiros, polone-
ses e indonésios. Quando soube que
o Brasil produzia vinhos, investigou
o universo vitivinícola brasileiro e se
apaixonou. Substituiu os calçados pelos
vinhos e criou a Cosmpolitan Brazilian
Wines, a única importadora de toda a
Europa dedicada somente à importação
de vinhos 100% brasileiros. Em entre-
vista exclusiva à ADEGA, Roman fala
sobre a crescente importância do vinho
brasileiro no mercado internacional.
Como surgiu seu interesse pelos
vinhos?
A gastronomia e o vinho são as gran-
des paixões da minha vida. Tive a
oportunidade de cozinhar em vários
restaurantes de primeira linha na
República Tcheca e no exterior, in-
clusive com o chef Alex Atala. Um
dia, meus amigos perguntaram se eu
era capaz de trazer vinho do Brasil.Roman Vanek: fascínio pela cultura, gastronomia e vinho brasileiro
2. destacam na Europa"
"Vinho? Será que se produz vinho no
Brasil?", perguntei a mim mesmo. Por
isso parti imediatamente para visitar
lugares que não conhecia até então,
como o Vale dos Vinhedos e Bento
Gonçalves. Fiquei pasmo. Encontrei
vinicultores, pessoas modestas com
um ímpeto e uma empatia imensos e
me deparei com grandes investimentos
feitos nos vinhedos, na viticultura e na
tecnologia. Dois meses depois eu levava
as primeiras 16 mil garrafas de vinho
brasileiro para a República Tcheca.
Por que criar uma importadora
voltada exclusivamente aos vinhos
brasileiros?
É muito simples. A República Tcheca
tem pouco mais de dez milhões de
habitantes, a Eslováquia tem cinco
milhões. O consumo de vinho per
capita na República Tcheca chega
atualmente a uns 16,5 litros anuais.
Tendo em vista que a República
Tcheca fica no coração da Europa, o
mercado de vinho está supersaturado
e a concorrência é enorme. Para
obter sucesso no mercado, tive que
tomar algumas decisões. Fundei uma
sociedade independente com um novo
nome (Cosmopolitan Brazilian Wines)
e lancei um portal de informações na
Internet (www.brazilian-wines.com),
que mais tarde seria prestigiado com
o prêmio de melhor website do ano na
República Tcheca. Foi necessário criar
um perfil distinto voltado ao mercado.
Os vinhos brasileiros tiveram boa
aceitação na República Tcheca?
No começo não foi fácil. O caminho
podia ser aberto somente de uma
maneira, de cima para baixo. Se pessoas
interessantes e famosas começassem a
apreciar o vinho brasileiro, o mercado
comentaria. Nos últimos três anos,
realizei 140 degustações de vinhos
brasileiros e palestras com fotos
mostrando o boom da vitivinicultura
do Brasil. Oferecemos, vendemos e
presenteamos celebridades com os vi-
nhos. Naquela época pude contar com
grande apoio dos próprios vinicultores,
do então criado consórcio Wines from
Brazil e sobretudo da APEX. Graças a
esses apoios foi possível organizar a
primeira grande excursão à vindima no
Brasil de jornalistas tchecos, que escolhi
com muito cuidado. A reação deles me
comoveu. "Roman, por que você não
nos disse nada antes?", perguntavam.
Qual é o mercado consumidor para os
nossos vinhos?
Vendemos ao Congresso Nacional
tcheco, muitos ministros do Governo
também provaram. Entre nossos clien-
tes estão embaixadas, inclusive os
Embaixadores do Brasil e dos Estados
Unidos, senadores, esportistas, atores,
cantores, médicos e juristas famosos,
além dos melhores hotéis e restaurantes
do país. Agora começa a difícil tarefa
de vender para vinotecas, tendo em
vista que vinhos brasileiros têm preços
bem mais altos que os chilenos e os
argentinos.
O que o atrai nos vinhos brasileiros?
Para muitos dos meus clientes, os
vinhos brasileiros continuam sendo
uma grande raridade. Muitas vezes
isso não prejudica os negócios, pelo
contrário. Minhas suposições estão
começando a se realizar na prática. A
cada seis meses tenho oportunidade de
experimentar vinhos cada vez melhores.
Uvas fantásticas amadurecem na região
da Campanha Gaúcha. O Vale dos Vi-
nhedos confirma a sua continuidade e
pureza. A qualidade de muitos vinhos
realmente melhora de uma safra para
outra, com vinhos muito bons de se
apreciar. Conheço vários Merlots da
safra 2004 que são fenomenais.
O que seus clientes dizem ao descobrir
os vinhos brasileiros?
Eles gostam de apreciar vinhos que são
produzidos com a máxima pureza e nos
quais não predomina o aroma e o sabor
da madeira de carvalho do tonel. Hoje
é bem mais fácil escolher os vinhos
certos para o mercado europeu, ainda
que em certos casos os preços sejam
altos. Os vinhos brasileiros se destacam
cada vez mais em toda a Europa. Nas
avaliações internacionais, raramente
voltam sem conquistar uma medalha.
Fico feliz pois é uma grande ajuda aos
negócios. É excepcional ouvir as pessoas
falando, durante as degustações. que
3. não esperavam tamanha qualidade.
Na sua opinião, os vinhos produzidos no
Novo Mundo podem dominar o mercado,
superando as vendas dos vinhos europeus?
Isso é uma bobagem. Todo vinho tem
a sua história. Acho perfeitamente
natural que os vinhos do Novo Mundo
vivam um boom na Europa. A causa
disso é muito simples. São vinhos
absolutamente legíveis, sobretudo para
a geração jovem, para serem apreciados
imediatamente. Claro que devemos
tomar cuidado com a qualidade, mas,
mais cedo ou mais tarde, chega o
momento em que todo amante do
vinho deseja conhecer um "legítimo
Champagne", um grande Bordeaux com
sua história centenária, um Barolo de
uma grande safra. Sei que se trata de
negócio, mas o vinho é uma matéria
fina e um amante legítimo sabe disso.
A Comissão Européia decidiu extrair
400 mil hectares de vinhas na Europa
para reduzir a produção excedente de
vinho na Europa. Foi uma boa idéia?
Entendo as razões econômicas que
levaram a Comissão Européia a
esta decisão. Temo que uma parte
dos vinicultores que não têm obtido
bons resultados econômicos aceite
esta proposta. Trata-se de uma
negação flagrante da continuidade
da vitivinicultura na Europa, que
tradicionalmente não dava somente
prioridade aos melhores, mas era capaz
de satisfazer todas as categorias de
consumidores. Se o projeto for levado
adiante, os consumidores perderão
a tradicional variadade da oferta de
vinho. Seremos testemunhas de uma
certa forma de "coca-colização" do
mercado europeu de vinho.
Além dos vinhos brasileiros, quais
outros vinhos o senhor aprecia?
Aprecio muito os nossos vinhos tchecos,
sobretudo os brancos, que têm obtido
bastante sucesso no exterior nos últimos
tempos. Gosto de desfrutar de uma taça
de um jovem Dolceto ou de um Barbera
d'Alba de Piemonte de uma safra mais
antiga. Este ano descobri uma excelente
variedade chamada Teroldego. Dessa
variedade, o "Teroldego Rotaliano Conti
di Asti 2001" e o "Teroldego Salton
Series 2005" são vinhos excepcionais.
É claro que não desprezo os vinhos
franceses, portugueses etc.
O que mais o fascina no Brasil?
É fascinante observar as diferenças entre
as pessoas, a cultura e a gastronomia nos
diferentes estados brasileiros. Estamos
preparando viagens enoturísticas no
Brasil, partindo do Vale dos Vinhedos,
evidentemente. Estou escrevendo um
livro sobre a gastronomia e os vinhos
brasileiros. Sinto o pouco orgulho e o
desinteresse que os brasileiros têm do
seu vinho. Às vezes sento com meus
amigos do Brasil, abro uma garrafa de
vinho e eles dizem: "Excelente vinho,
de onde é? Itália, Chile, França?". "Esse
vinho foi produzido no país de vocês",
respondo. Assim que o brasileiro mudar
a relação com o próprio vinho, o
mundo ficará sabendo, e será muito
mais fácil fazer negócios com o vinho
de vocês.
"Assim que o brasileiro mudara relação com o próprio vinho, o mundo ficará sabendo", diz Roman