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“Fanzines adopted the DIY, independent approach that punk
musicians had espoused. With the rise of newly formed bands came
the establishment of impromptu clubs, small, independent record
labels and record stores (…). In the same way, fanzines offered
fans a ‘free space for developing ideas and practices’, and
a visual space unencumbered by formal design rules and visual
expectations.” (Triggs, 2006: 70)
Introdução
Os fanzines são objetos caseiros, produzido de forma artesanal,
individual ou coletivamente, e que têm, em geral, uma circulação
limitada. Os primeiros fanzines surgem nas décadas de 1920-30 e
estavam associados a fãs de ficção científica. Contudo, a produ-
ção, distribuição e consumo de fanzines ganhou relevância global
com a emergência do fenómeno do punk no Reino Unido e E.U.A.,
durante os anos de 1970-80, assumindo-se como um espaço de liber-
dade de pensamento e criação Do It Yourself (DIY), e de alterna-
tiva aos media convencionais. Com efeito, desde cedo, os fanzines
assumiram-se como uma parte muito importante da construção das
‘cenas’ punk – a par das bandas, dos discos, dos concertos –,
contribuindo ativamente para a criação e consolidação de um de-
terminado sentido de comunidade (Triggs, 2006). Como refere Julia
Pine (2006), os fanzines são formas materiais de representação
simbólica. São objetos construídos de um modo voluntário que per-
mitem aos indivíduos que participam no processo (de edição, das
contribuições e de distribuição) afirmarem sua existência social,
integrarem (sub)culturas, tribos ou cenas musicais e participarem
culturalmente; simultaneamente, os fanzines materializam-se num
movimento local marcadamente juvenil de dinamização de uma cena
underground, facilitando a divulgação de discos, de bandas, de
concertos e de histórias. São um elemento fundamental de concre-
tização de gostos, de afinidades, de pertenças sociais, políticas,
ideológicas, culturais, estilos de vida e musicais.
4
À semelhança de outras dimensões do movimento punk, a componente
gráfica dos fanzines desempenha um papel tão ou mais importante do
que os textos escritos. É, na verdade, muito frequente as componentes
escritas e visuais dos fanzines estarem tão profundamente misturadas
que se torna praticamente impossível analisar separadamente cada um
destes dois elementos. À semelhança das capas de discos e demo-tapes
punk ou mesmo da própria estética visual das bandas, encontramos em
muitos fanzines uma orientação gráfica declaradamente DIY, assente
numa mistura de técnicas de cut-and-paste, recorte, desenho/ilustra-
ção, textos escritos à mão e datilografados, manipulação de fotogra-
fias, etc. Fanzines como o Panache, Sniffin’ Clue e a Ripped & Tom,
pioneiros na altura em que o movimento punk estava a surgir em Ingla-
terra (segunda metade da década de 1970), contribuíram decisivamente
para criar um verdadeiro “cânone subcultural” – tanto em termos grá-
ficos, como em termos de conteúdo editorial – que se globalizou e está
presente em muitos dos fanzines punk atualmente produzidos (Quintela,
Guerra el al, 2014).
Como Stephen Duncombe (1997) evidenciou, os pensamentos e a
ética pessoal ocupam um lugar central neste tipo de publicações
independentes autoeditadas. As páginas dos fanzines espelham fre-
quentemente a ideologia dos seus autores, patente no seu posicio-
namento político-social ou no apoio a determinadas causas. Vemos
também manifestações de um determinado gosto ou estética, visível,
por exemplo, nas entrevistas realizadas com determinadas bandas
ou nas recensões críticas de discos e demo-tapes, de concertos,
de filmes, de livros ou mesmo de outros fanzines. Finalmente, em
alguns fanzines encontramos artigos com conteúdos muito pessoais,
por vezes com um cariz introspetivo e até íntimo.
Os fanzines são, em suma, suportes comunicacionais riquís-
simos, nos quais encontramos extensa informação que nos permite
compreender um pouco melhor, em cada momento histórico e em cada
contexto sociocultural e territorial específico, como se foi de-
senvolvendo o movimento punk: como emergiu, quais os protagonis-
tas e locais de referências (bandas, editoras, squatters, centros
sociais, bares e salas de concertos, lojas de discos e roupas),
redes de contactos internacionais, etc.
5
Good Save The Portuguese Fanzines
A exposição Good Save The Portuguese Fanzines, integrada na Con-
ferência Internacional Keep It Simple, Make It Fast! Underground
Music Scenes and DIY Cultures, pretende consagrar os fanzines, a
sua estética e ética DIY e o seu papel nas culturas underground
– e, em particular, na cultura punk e no modo como esta foi perce-
bida e apropriada no contexto português. Esta preocupação decorre
ainda do facto desta exposição também se inserir num projeto de
investigação de âmbito mais alargado, que procura analisar as ma-
nifestações punk em Portugal desde 1977 até à atualidade (Guerra,
2014a, 2014b; Guerra, Bennett, 2014).i
Os fanzines desenvolvem-se
normalmente em torno do estabelecimento de relações sociais, isto
é, como operadores de cenas e afetividades locais. Assim também
foi em Portugal, na exata medida em que encerram uma sociabilidade
interna de um conjunto de indivíduos ligados por uma atividade
não-profissional e um ambiente criativo não-estruturado; e uma so-
ciabilidade externa que se traduz na relação da publicação com uma
comunidade pequena e bem definida. Aliás, o fanzine não assenta
num monólogo escrito, é constituído por uma espécie de diálogo com
a comunidade, ou como diz Atton “nos zines, os leitores não comu-
nicam através deles, mas sim neles. (…) O zine dá voz, comunica a
i
Este texto foi realizado com o
financiamento do FEDER através do COMPETE
– Programa Operacional, via Fundação para
a Ciência e Tecnologia, no âmbito do
projeto “Keep it simple, make it fast!
Prolegómenos e cenas punk, um caminho para
a contemporaneidade portuguesa (1977-2012)”
(PTDC/CS-SOC/118830/2010), liderado pelo
Instituto de Sociologia da Faculdade de
Letras da Universidade do Porto (IS-UP) e
desenvolvido em parceria com o Griffith
Centre for Cultural Research (GCCR) da
Universidade de Griffith e a Universitat de
Lleida (UdL). Conta ainda com as seguintes
instituições participantes: Faculdade de
Economia da Universidade do Porto (FEP),
Faculdade de Psicologia e Ciências da
Educação da Universidade do Porto (FPCEUP),
Faculdade de Economia da Universidade
de Coimbra (FEUC), Centro de Estudos
Sociais da Universidade de Coimbra (CES)
e Bibliotecas Municipais de Lisboa (BLX).
Para além dos autores deste texto, integram
a equipa de investigação do projeto os
seguintes investigadores: Ana Oliveira, Ana
Raposo, Andy Bennett, Augusto Santos Silva,
Carles Feixa, Hugo Ferro, João Queirós,
Luís Fernandes, Manuel Loff, Paula Abreu,
Rui Telmo Gomes e Tânia Moreira. Mais
informações em www.punk.pt
6
experiência vivida e permite ao leitor emular as experiências dos
seus pares.” (Atton, 2002: 145). Para além desta intensa socia-
bilidade, os fanzines permitem uma congregação de estéticas e de
músicas (Frith, 2002) dentro de uma abordagem coerente de gostos
e de lifestyles coerentes (Atton, 2010).
Assim, e por encerrarem sociabilidades, afetos e dinâmicas
próprias, no momento em que começámos a organizar esta exposi-
ção, deparámo-nos com o seguinte dilema: abordar, de uma forma
mais transversal e necessariamente genérica, diferentes fanzines
punk feitos em Portugal ao longo de quase quatro décadas ou, pelo
contrário, centrar-nos num caso particular que, por diferentes
motivos, se afigurasse como sendo mais interessante e estimulan-
te para “alimentar” o debate que pretendíamos fomentar a partir
desta exposição. Equacionadas várias possibilidades, optou-se fi-
nalmente pela segunda hipótese, idealizando uma exposição em que,
privilegiando olhar mais detalhado e focado, se desse a conhecer
a um público contemporâneo, nacional e estrangeiro, um dos fanzi-
nes mais emblemáticos do punk em Portugal: o Cadáver Esquisito.
Foram vários os motivos desta nossa escolha. Desde logo, foi
fundamental a generosa abertura e disponibilidade dos dois elemen-
tos que integravam o “núcleo duro” da equipa editorial do fanzi-
ne – David Pontes e Neno Costa – para colaborarem no trabalho de
pesquisa, relatando na primeira pessoa o modo como viveram essa
época. Foi também muito importante termos tido a felicidade de
conseguir recuperar alguns dos originais e maquetas do fanzine,
que nos permitem perceber em detalhe a sobreposição de técnicas
gráficas em que assentava a construção de cada número do Cadáver
Esquisito – um aspeto que, na nossa perspetiva, inequivocamen-
te reforça sobremaneira o interesse desta exposição. Mas outros
motivos – de caráter mais substantivo – levaram-nos a optar por
centrar a exposição no caso do Cadáver Esquisito, designadamente
o ser uma corporização bem conseguida de uma certa radicalização
nos valores de produção e nos valores culturais (Hebdige, 1979:
119), expressando bem uma subcultura assente em elementos gráfi-
cos e tipográficos homólogos do estilo subterrâneo e anárquico do
punk (Atton, 2006).
7
Apesar da sua existência fugaz – apenas dois números editados,
em 1986 – o Cadáver Esquisito traduziu não só uma época singular na
cidade do Porto, onde muito possivelmente foi responsável por inau-
gurar a publicação de fanzines punk na zona do Grande Porto (englo-
bando, no essencial, Espinho, Porto, Vila Nova de Gaia, Matosinhos
e Vila do Conde, mas cujos “ecos” chegaram bastante mais longe na
região), mas constitui igualmente um dos mais relevantes fanzines
para percebermos a histórica das movimentações punk no nosso país.
Recorde-se que os primeiros fanzines punk surgem em Portugal
logo em finais da década de 1970, embora circunscritos à zona
de Lisboa. É o caso do fanzine Desordem Total, editado por Nuno
Esterco, Luís Bosta e Pedro Merda, com seis números publicados
entre 1978 e 1979, e do Estado de Sítio, editado por Paulo Borges
– membro dos Minas e Armadilhas, banda punk pioneira em Portugal –,
que publicou pelo menos seis números ao longo do ano de 1978.
Na década seguinte, que corresponde a uma fase de desenvolvi-
mento das ‘cenas’ punk no nosso país (Guerra, 2013), assiste-se a
uma certa proliferação de fanzines, embora ainda muito claramente
concentradas nas áreas de metropolitanas de Lisboa e Porto. Neste
período, identificam-se como fanzines punk relevantes, para além do
Cadáver Esquisito (1986), o Subversão (1982), o Subúrbios (1985),
o Tosse Convulsa (1985), o Lixo Anarquista (1986-87), o Suicídio
Colectivo (1987), o Anarkozine (1987), o Post Scriptum (1987-88),
o Morte à Censura (1988) ou o Culto Urbano (1988-89), entre outros.
A década de 1980 é, sem dúvida, um período da história portu-
guesa a diversos níveis contraditório. Se, por um lado, é marcado
por uma forte abertura do país ao exterior e até por um certo
cosmopolitismo – nomeadamente, do ponto de vista dos hábitos e
consumos lúdicos e culturais –, ele carateriza-se, simultanea-
mente, por fortes convulsões e perplexidades do ponto de vista
económico e social – num curtíssimo espaço de tempo, Portugal é
objeto de intervenção do Fundo Monetário Internacional (1983) e
adere à Comunidade Económica Europeia (1986). Do ponto de vista
musical, este período é marcado pelo boom do chamado “rock portu-
guês”, ensaiando-se uma rápida atualização da realidade nacional
ao mercado da música pop rock europeu e anglo-saxónica.
8
É justamente neste contexto que se dá uma gradual expansão do
movimento punk em Portugal para fora dos limites da Grande Lisboa,
chegando a cidades como o Porto, Aveiro ou Coimbra, onde começam a
surgir várias bandas e a serem organizados os primeiros concertos
(Guerra, 2014a, 20104b). Os fanzines deste período dão-nos muito
claramente conta do processo de transformação em curso. Contras-
tando com os fanzines de finais da década anterior, em que a
dimensão de crítica político-social satírica era um elemento cen-
tral, na década de 1980 dimensão musical ganha maior relevância.
Tornam-se frequentes artigos sobre bandas punk e hardcore (subgé-
nero que, nestes anos, irrompe em Portugal) e também reportagens
sobre algumas ‘cenas’ internacionais (Austrália, E.U.A., Brasil,
Itália, etc.), numa primeira fase recorrendo essencialmente a
fontes secundárias (artigos de jornais, nacionais e estrangei-
ros, press-releases das bandas, etc.), mas progressivamente in-
corporando materiais originais, em geral através da realização
de entrevistas (Quintela, Guerra el al, 2014). A década de 1980
constitui, em suma, um período fundamental para a compreensão da
história das movimentações punk em Portugal, durante o qual se
começam a afirmar um conjunto de algumas tendências-chave que, ao
longo dos anos seguintes, serão aprofundadas.
O Cadáver Esquisito surge em finais de 1985, por iniciativa
de David Pontes e Neno Costa, dois jovens de Espinho aficionados
por punk que algum tempo antes tinham vindo para o Porto estudar.
David e Neno já tinham trabalho anteriormente em jornais de li-
ceu, tendo naturalmente assumido cada um as funções para as quais
julgava ter maior vocação: David elaborava os textos, enquanto
Neno era responsável pelos desenhos e conteúdos gráficos. A este
“núcleo duro” juntavam-se dois outros amigos e colaboradores:
Óscar Pinho, responsável pelas sugestões musicais e referências a
bandas, e Marta Machado, responsável pelas traduções, secretaria-
do e correspondência.
É importante interpretar a emergência do Cadáver Esquisito num
contexto em que a cidade do Porto era ainda marcada por um grande
“cinzentismo”, por uma certa tristeza e com uma grande predomi-
nância masculina nos espaços públicos urbanos. “O 25 de abril
9
chegou no plano da teoria mas não no plano prático”, recordam a
este propósito David Pontes e Neno Costa. É, pois, nesta atmosfera
descrita como “asfixiante” que irá surgir, em meados da década de
1980, um pequeno grupo de jovens aficionados punk que irão con-
tribuir decisivamente para agitar a cidade do Porto.ii
Neste período, a oferta e consumo cultural de cariz mais al-
ternativo ou underground escasseava. O acesso a discos, revistas
e livros era ainda bastante difícil, embora fossem chegando. Pon-
tualmente chegavam também ao Porto alguns fanzines portugueses
(de Lisboa) e também alguns fanzines feitos no Brasil e E.U.A.
Eram também muito poucos os concertos punk realizados, tal como
era difícil encontrar espaços de encontro que se adequassem a uma
estética mais próxima do punk. Para além dos encontros regulares
nas casas de alguns dos elementos do grupo – momentos fundamentais
para a consolidação dos gostos estéticos e políticos, pois que era
aqui que, em coletivo, se partilhavam, ouviram e discutiam discos,
fanzines, revistas e livros que se tinha conseguido trazer do es-
trangeiro –, os punks do Porto juntavam-se habitualmente no café
Garça Real – sobretudo ao sábados à tarde, após as incursões na
feira da Vandoma –, podendo ser também avistados pela noite fora
nalgumas tascas existente no centro da cidade, como a Tasca do
Anarquista e a Tasca do Tóni, e ainda no Tá-se Bem, na Ribeira.
Finalmente, do ponto de vista da produção, não existiam nesta altu-
ra bandas punk no Porto, com a exceção d’Os Cães a Morte e o Desejo.
Também não temos notícia de que existissem fanzines punk no Porto.
Era, pois, necessário “agitar” a cidade, afirmando mais claramente
as movimentações punk que eram, nesta fase, bastante tímidas.
Em finais de 1985, com Neno Costa e Óscar Pinho, entre outros
elementos do grupo, regressados ao Porto de uma intensa viagem e
estadia em Londres, surge a ideia da criação de um fanzine punk.
ii
Segundo recordam David Pontes e Neno
Costa, este era efetivamente um núcleo
de aficionados punk de dimensão bastante
reduzida, aproximadamente duas dezenas de
pessoas, agregando gente não só do Porto,
mas também de Vila Nova de Gaia, Espinho,
Matosinhos e Vila do Conde.
1 0
É importante salientar que, para além do projeto do fanzine, o
“núcleo duro” responsável pelo Cadáver Esquisito estava já si-
multaneamente a arquitetar outros projetos de cariz semelhante.
Concretamente, a par do Cadáver Esquisito, David Pontes e Neno
Costa estiveram ativamente envolvidos, durante o ano de 1986, na
dinamização do programa de rádio O Minuto de Ódio, dedicado à di-
vulgação das sonoridades punk e hardcore, na Rádio Caosiii
, e também
na organização do Grande Baile, o primeiro festival de bandas punk
portuguesas.iv
A sucessão destes vários acontecimentos, entre ou-
tros, foram certamente cruciais para o desenvolvimento de um movi-
mento punk mais amplo e sólido na área do Grande Porto, o que viria
a acontecer já durante os anos 1990, com o surgimento de bandas
punk emblemáticas como, por exemplo, os Renegados de Boliqueime.
iii
O Minuto de Ódio foi um programa
de rádio criado em 1986 por Neno Costa
e David Pontes, na Rádio Caos. A Caos
foi uma das primeiras rádios “livres”
- também conhecidas por “piratas” - a
operar em Portugal e a primeira no
Porto, nos inícios da década de 1980. Os
“estúdios”, situados no último andar de
um prédio relativamente antigo da Praça
da República portuense, limitavam-se a
duas salas, uma das quais (do tamanho de
uma marquise) servia de cabina para as
longas horas de emissão, na frequência
93.4 MHz. O “autor” – eram todos “autores
de programas” cheios de personalidade,
originalidade, experimentalismo e títulos
impensáveis – sentava-se numa cadeira
giratória de napa e manipulava ele próprio
a mesa de mistura, posta ali mesmo à sua
frente. De manhã até de madrugada, a Caos
era um oásis de música “alternativa”,
comentários curtos e em voz grave e séria,
algum noticiário, alguns entrevistados,
tudo feito com o amadorismo próprio de uma
rádio livre. Os programas emitidos na Caos
obedecerem (pelo menos em princípio...)
a um “projeto” previamente entregue aos
“diretores” da rádio. O Minuto de Ódio
dedicava-se à divulgação das sonoridades
punk/hardcore. Neno Costa e David Pontes
editaram, realizaram e produziram meia
dúzia de programas. Posteriormente, Óscar
Pinho deu continuidade ao programa que
terá durado cerca de um ano.
iv
Ironicamente designado por Grande
Baile, tornou-se mais conhecido como
o Festival Punk no Porto, realizado
em 1986 num edifício da Cruz Vermelha
(Rua D. Manuel II). Participaram neste
concerto as seguintes bandas: Os Cães
a Morte e o Desejo, Cagalhões, Crise
Total e Kú de Judas. Este concerto foi
organizado por David Pontes e Neno Costa,
implicou uma cotização por parte dos
participantes. Apesar do concerto estar
cheio, aproximadamente 70 pessoas, Neno
Costa recorda-se que, ainda assim, deu
um prejuízo de 500 escudos suportados por
Leonel, um amigo.
1 1
O Cadáver Esquisito
Embora não se recorde exatamente o porquê da denominação do fan-
zine, David Pontes reconhece que se tratou de uma brincadeira,
sublinhando que a influência surrealista evidente não foi uma
qualquer citação mas antes uma coincidência – “Sem saber, inscre-
vemo-nos numa larga tradição”, afirma.
Claramente inspirada no imaginário e na estética punk, o
Cadáver Esquisito teve como uma suas influências a Maximum Rockn-
roll, fanzine punk norte-americanav
já com uma qualidade gráfica
assinalável para a época, trazida para o grupo por Óscar Pinho,
como recorda Neno Costa, que refere ainda a importância de outras
fanzines portuguesas publicadas nesta época, que pôde observar e
comprar numa ida a Lisboa em meados da década de 80. À semelhança
da generalidade das fanzines punk portuguesas desta época (Quin-
tela, Guerra et al, 2014), o Cadáver Esquisito assumiu, do ponto
de vista editorial, duas temáticas-chave: a música e a política.
Retrospetivamente, contudo, David Pontes e Neno Costa reconhecem
no Cadáver Esquisito uma qualidade no tratamento dos conteúdos
que o distinguiam doutros fanzines produzidos em Portugal. “Tinha
qualidade gráfica e alguns cuidados de escrita que nós sabíamos
que faziam a diferença”, notam.
Neno Costa reconhece na abordagem gráfico do Cadáver Esquisito,
que qualifica de “áspera”, uma estreita relação com o punk: a
opção pelas técnicas de cut-and-paste, recorte, desenho/ilustra-
ção, textos escritos à mão e datilografados, manipulação de fo-
tografias, etc. Salienta ainda a atitude descomprometida, decla-
v
A Maximum Rocknroll é um mais famosos
fanzines punk do mundo. Fundado em 1982,
em São Francisco (E.U.A.), tornou-se
célebre pela sua capacidade de cobrir as
várias ‘cenas’ punk existentes um pouco
por todo o mundo, através da realização
de entrevistas, reportagens, crónicas e
críticas de música, livros e filmes.
O fanzine conseguiu, ao longo de mais
de duas décadas, reunir colaboradores
provenientes de diversas partes do mundo.
Atualmente a Maximum Rocknroll continua
ativa, sendo não só um fanzine, mas também
uma editora e um programa de rádio. Mais
informações em http://maximumrocknroll.com/
1 2
radamente descomprometida – “não fazeres um grande esforço [para
desenhar e paginar o fanzine] e não fazeres um grande esforço para
disfarçar isso”, resume. Contudo, como se poderá observar no con-
junto de originais e maquetas do fanzine selecionados para esta
exposição, existe bastante cuidado não só na conceção gráfica da
“mancha” das páginas, mas também muito rigor na sua concretização.
Existe ainda no Cadáver Esquisito um cuidado pouco habitual em
fanzines do mesmo período, em tornar a leitura mais dinâmica, sen-
do frequente os vários artigos terem um tratamento gráfico dife-
renciado de modo a ajustar-se aos conteúdos editoriais especifico.
Ainda do ponto de vista gráfico, importa destacar presença de
cartoons e comics da autoria de Neno Costa – nalguns casos assina-
dos, com o pseudónimo “Verme”, e noutros casos não assinados. Aqui
encontramos inúmeras representações de punk rockers – geralmente
numa visão bastante cliché: o punk cadavérico e o punk ratazana
–, mas também de algumas personagens marcantes da década de 1980,
no contexto nacional e internacional, como é o caso de Marco Paulo
ou Ronald Reagan. Como analisou Marcos Farrajota, existe uma longa
tradição de inter-relações entre a banda desenhada, o punk, os
fanzines e a cultura DIY (Farrajota, 2014), estando esta teia de
conexões muito claramente presente no Cadáver Esquisito.
1 4
A música e a política eram, como referido antes, as duas temá-
ticas centrais do Cadáver Esquisito. Existia, porém, uma intenção
declarada de agitar a cidade do Porto (e não só), dando a conhecer
projetos e iniciativas punk nacionais e internacionais, fomen-
tando que novos projetos de cariz semelhante surgissem em Portu-
gal. Estas intenções agit-prop do Cadáver Esquisito encontram-se
declaradas sem quaisquer rodeios logo no editorial do primeiro
número do fanzine (janeiro/fevereiro de 1986):
“Ao estar aqui pretendo criar um novo espaço para todos, punks,
homossexuais, prostitutas, skins, desempregados, desiludidos, re-
voltados, para aqueles que sentem a sua vida agrilhoada pela mi-
séria, apatia, desespero e exploração. Nós existimos porque esta
realidade existe, porque somos marginalizados por uma sociedade
que não aceita outros valores que não os da servidão, competição
e poder. (…) Não vou fazer aqui grandes tratados ideológicos, em
quero que ninguém faça de mim uma bíblia, ler-me nunca bastará…
(…) Acima de tudo o que acontece por aqui, quem e como, tenar dar
a voz a inúmeras bandas desconhecidas, apoiando-as pois elas exis-
tem, a novos espaços e iniciativas (ocupações de casas, comunas,
fanzines), cujo papel é importante e qual é urgente compreender e
mais do que isso AGIR. Estamos aqui não para apresentar um rol de
tragédias mas para dizer que podemos agir e mudar.”.
A panóplia de temas abordados é, apesar de tudo, relativamente
diversificada. Numa linha de comentário político-social, mais ou me-
nos cáustico, encontramos alguns artigos acerca da situação política
da época, nacional e internacional, focando aspetos como a corrupção
político-partidária ou os riscos de uma guerra nuclear. Os temas da
violência policial e da defesa dos cívicos, bem como o da guerra e do
serviço militar obrigatório são igualmente objeto de atenção. Além
dos artigos, existe todo um segundo nível de comentário político-
-social, mais ou menos explícito, através do recurso a cartoons e
ilustrações, que percorre as várias páginas do Cadáver Esquisito.
1 5
A música ocupa um lugar central no fanzine. Nos dois números do
Cadáver Esquisito encontramos vários os artigos com entrevistas
e reportagens sobre bandas, nacionais e internacionais, ligadas
ao espectro punk/hardcore (Cagalhões, Xutos e Pontapés, Cólera,
Dead Kennedys, Zyklome, Virgin Prunes, entre outros) e não só
(caso de Nick Cave). De forma a estabelecer contacto com bandas
do Brasil, Irlanda ou Bélgica os correios representavam um papel
crucial, permitindo a circulação das entrevistas escritas, cujas
questões eram enviadas às bandas, as respostas enviadas por cor-
reio postal e, se necessário, posteriormente traduzidas, conforme
recorda David Pontes. Noutros casos, os artigos eram elaborados
com recurso a informação recolhida de outras fanzines e revistas
de música. Existem ainda vários artigos de comentário crítico
acerca da imprensa musical nacional e também sobre a cena punk
em Portugal, os equívocos, fragilidades e potencialidades que
importa despoletar.
Finalmente, vale a pena observar com cuidado as secções de
“classificados” do Cadáver Esquisito onde encontramos valiosas
referências que nos permitem mapear a cena punk da época. Nomea-
damente, refiram-se os “anúncios” referentes às diversas fanzi-
nes, nacionais e internacionais, como o Cancro Social (Lisboa),
o Lixo Anarquista (Lisboa), o Subúrbios (Amadora), o La Koluna
de la Peste (Madrid, Espanha) e o Alienation (Le Havre, França).
São igualmente disponibilizados os contactos de todas as bandas
entrevistas e mencionadas em cada número do fanzine.
1 6
Como se pode ver nos trabalhos expostos, toda a fanzine era
maquetada em papel, sendo posteriormente fotocopiada. Cada um dos
números do Cadáver Esquisito teve tiragens rondava os 150 a 200
exemplares. Uma vez que o investimento mais significativo eram
as fotocópias, calcorreava-se a cidade do Porto intensamente em
busca da casa de fotocópias com o melhor preço, como recorda Neno
Costa. Relativamente à distribuição do fanzine, esta fazia-se por
diferentes vias: intercâmbio com outros fanzines (Lisboa, Aveiro,
França, Espanha, Brasil); distribuição em concertos; distribuição
pelos amigos em mão. Contudo, as receitas da venda do fanzine
raramente cobriram os custos, acabando por ser a equipa a ter de
absorver esse prejuízo.
Talvez por esse motivo, ao cabo de meio ano de intensa mas
fugaz atividade, o Cadáver Esquisito terminou. Ainda chegou a
ser feito um terceiro número do fanzine, nunca editado. Anos mais
tarde, haveríamos de reencontrar alguns dos protagonistas deste
fanzine noutros contextos ligados ao punk em que também desempe-
nharam papéis relevantes, mas isso já são outras histórias…
A história que vos queríamos contar, através da exposição Good
Save The Portuguese Fanzines, era a do fanzine Cadáver Esqui-
sito, cuja importância do seu legado esperamos que esta mostra
ajude não só a evidenciar e valorizar, mas também, de algum modo,
a perpetuar. Através deste relato, mostramos que o punk continua
a possibilitar a existência de uma comunicação contra-hegemónica,
que faz frente à mercantilização, apropriação e domesticação. São
vários os meios usados nessa resistência: desde as redes sociais
informais e descentralizadas da Internet e das tours que permitem
o fluxo de discos, fanzines, bandas, ideias e estilos; passan-
do pelas gravadoras e lojas independentes; até à ética DIY e às
bandas que gravam e lançam músicas por conta própria. Finalmente,
este relato é mais uma aproximação da história oral como paradigma
possível e desejável da interpretação da contemporaneidade social
e cultural portuguesa.
1 8
Introduction
Fanzines are home-made objects, produced
in an artisanal manner, individual or
collectively, with a generally limited
circulation. The first fanzines appeared
in the 1920-30 decades and were associated
to science fiction fans. However,
production, distribution and consumerism
of fanzine gained a global relevance with
the emergency of the punk phenomena in
the United Kingdom and the U.S.A., during
the seventies and eighties, arising as
a space of freedom of thought and Do It
Yourself (DIY) creation, as well as an
alternative to conventional media. With
effect, from early on, fanzines placed
themselves as a very important part of
punk scenes construction – alongside
bands, records and concerts -, actively
contributing to the creation and
consolidation of a determined sense of
community (Triggs, 2006). As referred by
Julia Pine (2006), fanzines are material
forms of symbolic representation. They
are voluntarily built objects that
allow the participant individuals (from
editing, contribution and distribution)
to affirm their social existence, to
integrate (sub)cultures, tribes and
musical scenes and to participate
culturally; simultaneously, fanzines
materialize in a local movement, marked
in a youthful boost of an underground
scene, facilitating the records, bands,
concerts and stories divulgation. They
are an element of taste, of affinities,
of social, political, ideological and
cultural belongings, and musical and
lifestyle choices.
Similarly to other dimensions of the
punk movement, the graphic component
of fanzines plays a very or more
important part than written text. It is,
truthfully, very frequent for this two
elements to be so entwined with in each
other that it becomes nearly impossible
to analyse separately any of these
elements. As well as record covers and
punk demotapes or even the band’s visual
aesthetics, we often find a graphic DIY
orientation, settled in a mixture of
technics and cut-and-paste, clippings,
drawing/illustration, hand-written
and typewritten texts, photographic
manipulation, etc. Fanzines such as
Panache, Sniffin’ Clue and Ripped & Tom,
pioneers in a time when punk movement was
arising in England (second half of the
1970 decade), contributed decisively to
create a true “subcultural canon” – both
in graphical and editorial content ways
– that became global and can be found in
many of punk fanzines produced now-a-days
(Quintela, Guerra et al, 2014).
As Stephen Duncombe (1997) showed,
thoughts and personal ethics occupy
a central place in this kind of
independently self-edited publications.
Fanzines pages frequently mirror their
author’s ideology, manifested in their
social and political positions or in
“Fanzines adopted the DIY, independent approach that punk musicians had espoused.
With the rise of newly formed bands came the establishment of impromptu clubs,
small, independent record labels and record stores (…). In the same way, fanzines
offered fans a ‘free space for developing ideas and practices’, and a visual space
unencumbered by formal design rules and visual expectations.” (Triggs, 2006: 70)
1 9
the support of determined causes. We
also find manifestations of a determined
taste or aesthetics, found, for example,
in interviews with determined bands
or critical reviews of records and
demotapes, concerts, movies, books or
even other fanzines. Finally, in some
fanzines, we find articles with very
personal contents, sometimes with an
introspective and even intimate nature.
Fanzines are, at the end, very rich
communicational supports, in which we
find extensive information that allows us
to better understand, in each historical
moment and in specific territory and
social and cultural context, how the
punk movement evolved: how it was born,
which protagonists and referential spots
(bands, editors, squatters, social
centres, bars and concert venues,
record stores and clothes), networks of
international contacts, etc.
God Save The Portuguese Fanzines
The exhibition God save The
Portuguese Fanzines, integrated in the
International Conference Keep It Simple,
Make It Fast! Underground Music Scenes
and DIY Cultures, aims to consecrate
fanzines, their aesthetics and DIY ethics
as well as their part in underground
cultures – particularly in punk culture
and in the way this was perceived and
appropriated in the Portuguese context.
This concern comes still from the fact
that this exhibition is also part of
an investigation project of a wider
range, which hopes to analyse punk
manifestations in Portugal, from 1977
to today (Guerra, 2014a, 2014b; Guerra,
Bennett, 2014)i
. Fanzines normally develop
around the establishment of social
relations, namely as agents of scenes
and local affectivities. Portugal was
also like this, in the exact measure in
which they close an internal sociability
of a group of individuals connected by
a non-professional activity and a non-
structured creative environment; and an
external sociability that translates in a
relation between a publishing and a small
and well-defined community. In fact,
fanzine isn’t set in a written monologue,
it is constituted by a species of
dialogue with the community, or as Atton
puts is “in the zines, readers don’t
communicate through them, but in them.
(…) The zine gives voice, communicates
the lived experience and allows the
reader to emulate the experiences of
their peers.” (Atton, 2002: 145). Besides
this intense sociability, fanzines allow
a congregation of aesthetics and music
(Frith, 2002) within a coherent approach
of tastes and lifestyles (Atton, 2010).
So, and by enclosing sociability’s,
affections and proper dynamics, at the
1
This text was made with funding
from FEDER through COMPETE – Programa
Operacional, via Fundação para a
Ciência e Tecnologia, within the
project “Keep it Simple, Make it fast!
Prolegómenos e cenas punk, um caminho
para a contemporaneidade portuguesa
(1977-2012)” (PTDC/CS-SOC/118830/2010),
led by the Institute of Sociology from
the Faculty of Arts of the University
of Porto (IS-UP) and developed in
partnership with the Griffith Centre
for Cultural Research (GCCR) from the
University of the Univesity of Lleida
(UdL). The following institutions also
participated: Faculty of Economics of
the University of Porto (FEP), Faculty
of Psychology and Education Sciences
of the University of Porto (FPCEUP),
Faculty of Economics of the University
of Coimbra (FEUC), Centre of Social
Studies of the University of Coimbra
(CES) e Municipal Libraries of Lisbon
(BLX). Besides the authors of this
text, the following people are on the
investigation team: Ana Oliveira, Ana
Raposo, Andy Bennett, Augusto Santos
Silva, Carles Feixa, Hugo Ferro, João
Queirós, Luís Fernandes, Manuel Loff,
Paula Abreu, Rui Telmo Gomes e Tânia
Moreira. More information at www.punk.pt
2 0
moment when we started organizing this
exhibition, we found ourselves facing
a dilemma: approaching, in the most
transversal and necessarily generic
way, different punk fanzines made in
Portugal in almost four decades or, on
the contrary, focus on a particular
case that, for different reasons, showed
himself up as a more interesting and
debate stimulating for the debate we were
hoping to promote from the exhibition.
Calculated all the possibilities, we
finally choose the second hypotheses,
idealizing an exhibition in which,
privileging a more focused and detailed
look, one of the most emblematic punk
fanzine in Portugal - Cadáver Esquisito
would be exposed to a contemporary,
national and international public.
There were many motives for this
choice. From the beginning, the generous
opening and availability from David
Pontes and Neno Costa – the two elements
that embodied the “hard core” of the
fanzine’s editorial team – was essential
in the research work, accounting, in
first person, the way of life at the
time. It was also very important having
had the luck to manage to recuperate some
of the models and original fanzines,
that allow us to understand in detail
the superposition of graphic technics in
which the construction of each edition
of Cadáver Esquisito sat – a look that,
from our perspective, unequivocally
reinforces heavily this exhibition’s
interest. But other reasons – of a
more substantive character – led us
to focus this exhibition in Cadáver
Esquisito’s case, namely for being such
a well-made embodiment of a determined
radicalization in production and cultural
values (Hebdige, 1979: 119), expressing
successfully a subculture built in
graphic and typographic elements,
equivalent to punk’s anarchic and
underground style (Atton, 2006).
Is spite of its brief existence
– only two edited numbers, in 1986 –
Cadáver Esquisito translated not only a
singular time in the city of Porto, where
it was very possibly the responsible
for the inauguration of punk fanzines
publications in the larger area of Oporto
(which features, essentially, Espinho,
Porto, Vila Nova de Gaia, Matosinhos and
Vila do Conde, but whose echoes travelled
considerably far in the map), but also
one of the most relevant fanzines to
understand the historic punk drives in
our country.
Remember that the first punk fanzines
appeared in Portugal at the end of the
1970 decade, although circumscribed
to the Lisbon area. It’s the case of
Desordem Total fanzine, edited by Nuno
Esterco, Luís Bosta e Pedro Merda, with
six numbers published between 1978
and 1979, and Estado de Sítio, edited
by Paulo Borges – member of Minas &
Armadilhas, a punk band pioneer in
Portugal -, that published at least six
numbers throughout 1978.
The following decade, which
corresponds to a phase of development
of punk ‘scenes’ in our country (Guerra,
2013), we see a certain proliferation
of fanzines, although still very clearly
focused in the metropolitan areas of
Lisbon and Porto. In such period, other
punk fanzines besides Cadáver Esquisito
(1986) are identified as relevant:
Subversão (1982), Subúrbios (1985), Tosse
Convulsa (1985), Lixo Anarquista (1986-
87), Suicídio Coletivo (1987), Anarkozine
(1987), Post Scriptum (1987-88), Morte à
Censura (1988) or Culto Urbano (1988-89),
among others.
The decade of 1980 is, without doubt,
a contradictory period of Portuguese
2 1
history in several levels. If, on the one
hand, it is marked by a strong opening
of the country to exterior and even
by a certain cosmopolitism – namely,
from the point of view of habits and
ludic and cultural consumerism -, he is
characterized, simultaneously, by strong
convulsions and perplexities from a
social and economic point of view – in
a very brief space of time, Portugal
becomes an object of intervention from
FMI (1983) and enters the CEE (1986). From
a musical point of view, such period is
marked by the so called boom of “Portuguese
rock”, in an essay of a quick update of
the reality of international European and
Anglo-Saxon pop rock music market.
It is exactly in this context that a
gradual expansion of the punk movement
begins in Portugal, outside the limits
of Lisbon, reaching cities as Porto,
Aveiro and Coimbra, where many bands were
born and the first concerts organized
(Guerra, 2014a, 2014b). Fanzines of this
period give us very clearly image of the
transformation in course. In contrast
with the fanzines from the end of the
previous decade, in which the satiric
political and social critic were a focus
point, in the 1980 decade, the musical
dimension gains relevance. Articles about
punk and hardcore (subgenre that breaks
through in Portugal at the time) bands, as
well as reports about some international
‘scenes’ (Australia, U.S.A., Brasil,
Italy, etc.) become frequents, firstly
appealing essentially to secondary
sources (newspaper articles, national and
foreign, band’s press releases, etc.),
but progressively incorporating original
materials, generally through interviews
(Quintela, Guerra et al, 2014). The 1980
decade constitutes, in sum, a fundamental
period to the understanding of the
history of punk movements in Portugal,
during which a group of key-tendencies –
that will deepen in the following years –
begin their affirmation.
Cadáver Esquisito appears at the end
of 1985, an initiative of David Pontes
and Neno Costa, two young men from
Espinho, punk fans that, sometime before,
had come to Porto to study. David and
Neno had already worked in high school
newspapers, having naturally assumed each
one the jobs to which they thought to
have greater vocation: David created the
texts, while Neno was responsible for the
drawings and graphic contents. Two friends
and collaborators joined this project:
Óscar Pinho, responsible for the musical
suggestions and band references, and Marta
Machado, responsible for translations,
secretary work and correspondence.
It is important to interpret the
emergency of Cadáver Esquisito in a
context in which the city of Porto was
still marked by a great “grayism”, by
certain sadness and a great masculine
predominance in the urban public spaces.
“April 25th arrived in the theoretical
plan but not in the practical one”,
remember David Pontes and Neno Costa. It
is in this “asphyxiating” atmosphere,
at the beginning of 1980 decade, that
a small group of young punk fans will
contribute decisively to shake the city
of Porto.ii
In this period, the cultural offer
and consume of a more alterative or
underground nature was scarce. The access
to records, magazines and books was
2
According to David Pontes and Neno
Costa, this was effectively a small core
of punk fans, approximately 20 people,
incorporating people from Porto, but
also from Vila Nova de Gaia, Espinho,
Matosinhos and Vila do Conde as well.
2 2
still very difficult, though arriving.
Occasionally, some Portuguese fanzines
(from Lisbon) arrived at Porto, as well
as some Brazilian and American ones. Punk
concerts were seldom organized and it was
hard to find meeting places that fit an
aesthetic closer to punk. Besides regular
meetings at the houses of some group
members – fundamental moments to the
consolidation of aesthetic and political
tastes, where records, fanzines,
magazines and books, brought from other
countries were collectively shared and
discussed -, the punks from Porto joined
at café Garça Real – mostly at Saturdays
in the afternoon, after incursions at
Feira da Vandoma (fair of Vandoma) -,
being seen throughout the night in some
of the existent taverns in the centre of
the city, like Tasca do Anarquista and
Tasca do Tóni, and even Tá-se Bem, at
Ribeira. Finally, from the point of view
of production, there were no punk bands
at Porto, with the exception of Os Cães
a Morte e o Desejo. There’s also no news
of any punk fanzines at Porto. It was
necessary to “shake” the city, stating
more clearly that punk movements were, at
this stage, quite shy.
At the end of 1985, with Neno Costa
and Óscar Pinho, among other elements
of the group, back to Porto from an
intense trip and stay in London, comes
the idea of creating a punk fanzine.
It is important to state that, besides
the fanzine project, the “hard core”
responsible for Cadáver Esquisito was
already thinking up other projects of a
similar nature. Specifically, David Pontes
and Neno Costa were actively involved,
during 1986, with the minimization of the
radio show O Minuto de Ódio, dedicated
to the divulgation of punk and hardcore
sounds, at Rádio Caosiii
, as well as at the
organization of the Grande Baileiv
, the
first festival of Portuguese punk bands.
The succession of events, among others,
were certainly crucial to the development
of a broader and more solid punk movement
at the greater area of Porto, which would
come to happen during the 1990’s, with the
emergence of emblematic punk bands such
as, for example, Renegados de Boliqueime.
iii
O Minuto do Ódio was a radio show
created in 1986 by Neno Costa and David
Pontes, at Radio Chaos. Radio Chaos
was one of the first pirate radios
operating in Portugal, and the first
in Porto, at the beginning of the
1980 decade. The “studios”, located
at the top floor of a relatively old
building at Praça da República in
Porto, were limited to two rooms, one
of which (the size of a marquise) was
the cabin for long hours of emission,
at 93.4 MHz. The “author” – were all
“show’s authors” full of personality,
originality, experimentalism and
unthinkable titles – sat in a rotating
chair and manipulated himself the
mixer, set right in front of him. From
morning ‘till dawn, Caos was an oasis
of “alternative” music, short comments
in a grave and serious voice, some
news, some interviewees, all made with
the amateurism proper of a free radio.
The shows emitted by Chaos obeyed
(at least in principle) a “project”
previously delivered to the radios
“directors”. O Minuto do Ódio was
dedicated to the reveal of punk and
hardcore sounds. Neno Costa and Davis
Pontes edited, directed and produced
half a dozen shows. After that, Óscar
Pinho continued the show, which must
have lasted a year.
iv
Ironically called Grande Baile,
it became known as the Porto Punk
Festival, organized in 1986 at a Red
Cross building (Street D. Manuel
II). In this concert participated the
following bands: Os Cães a Morte e
o Desejo, Cagalhões, Crise Total and
Kú de Judas. This show was organized
by David Pontes and Neno Costa,
implied a quote from the participants.
Even though the concert was full,
approximately 70 people, Neno Costa
remembers that, even so, it meant
a loss of 500 escudos, supported by
Leonel, a friend.core sounds. Neno
Costa and Davis Pontes edited, directed
and produced half a dozen shows. After
that, Óscar Pinho continued the show,
which must have lasted a year.
2 3
Cadáver Esquisito
Although he does not recall exactly why
the name of the fanzine, David Pontes
recognizes that it was a joke, noting
that the evident surrealist influence was
not a quotation but rather a coincidence
- “Without knowing, we inscribed us in a
long tradition,” he states.
Clearly inspired by the imagery and
aesthetics of punk, Cadáver Esquisito
had as one of its influences Maximum
Rocknroll, an American punk fanzinev
already with a remarkable graphic quality
for the time, brought to the group by
Oscar Pinho, how recalls Neno Costa,
who refers also the importance of other
Portuguese fanzines published at the
time, that he could observe and buy on
a trip to Lisbon in the mid 80s. Like
the majority of Portuguese punk fanzines
of this time (Quintela, Guerra et al,
2014), Cadáver Esquisito assumed, from
the editorial point of view, two key
themes: music and politics. However,
retrospectively, David Pontes and Neno
Costa recognize in Cadáver Equisito
the quality in the treatment of content
that distinguish him from other fanzines
produced in Portugal. “It had some
graphical quality and care of writing that
we knew were the difference,” they note.
Neno Costa recognizes in the graphic
approach of Cadáver Esquisito, which
it describes as “rough”, a close
relationship with punk: the option for
cut-and-paste technics, cut, drawing/
illustration, handwritten and typewritten
texts, handling photographs, etc.
He emphasizes the uncompromising
attitude, reportedly unengaged - “do
not make a great effort [to design the
fanzine] and not make a great effort to
disguise it,” he summarizes. However,
as it can be seen in the original set of
the fanzine and models selected for this
exhibition, there is very careful not
only in graphic design from the “stain”
of pages, but also very rigor in its
realization. In Cadáver Esquisito there
is still an unusual care in the fanzines
of the same period, to make the reading
more dynamic, being frequent various
articles with a distinctive graphic
treatment to adjust to specific editorial
content. From the graphical point of
view, it is also worth highlighting the
presence of cartoons and comics written
by Neno Costa - in some cases signed
with the pseudonym “Verme”, and in other
cases not signed. Here we find numerous
representations of punk rockers - usually
a vision quite cliché: the cadaverous
punk and the rat punk - but also some
remarkable characters of the 1980s, in
the national and in the international
context, such as Marco Paulo or Ronald
Reagan. As Marcos Farrajota analyzed,
there is a long tradition of inter-
relationships between the comics, punk,
fanzines and do-it-yourself culture
(Farrajota, 2014), being this net very
clearly present in Cadáver Esquisito.
v
Maximum Rocknroll is one of the most
famous punk fanzines of the world.
Founded in 1982 in San Francisco
(USA), it became famous for its ability
to cover the various punk ‘scenes’
existing all over the world, through
interviews, stories, chronicles and
reviews of music, books and movies.
Over more than two decades, the
fanzine brought together reviewers
from different parts of the world.
Currently Maximum Rocknroll is still
active, being not only a fanzine, but
also a publisher and a radio show. More
information on www.maximumrocknroll.com
2 4
As mentioned before, music and
politics were the two central themes
of Cadáver Esquisito. However, there
was a declared intention to shake the
city of Porto (and not only), providing
information about projects and national
and international punk initiatives
by fostering new projects of similar
nature arose in Portugal. These agit-
prop intentions of Cadáver Esquisito
are declared without any detours in the
editorial of the first number of the
fanzine (January/February 1986):
“Being here I intend to create a new
space for all, punks, gays, prostitutes,
skins, unemployed, disillusioned, angry,
for those who feel their life shackled by
poverty, apathy, despair and exploitation.
We exist because this reality exists,
because we are marginalized by a society
that does not accept ​​other values than
those of servitude, competition and power.
(…) I will not do here great ideological
treated, nor want anyone to make me a
bible, read me will never suffice… (…)
Above all what happens here, who and how,
try to give voice to innumerous unknown
bands, supporting them as they are, the
new spaces and initiatives (occupations of
houses, communes, fanzines), whose role
is important and urgent to understand and
more than that ACT. We are here not to
present a catalog of tragedies but to say
that we can act and change.”.
The range of topics covered is,
after all, relatively diversified.
In a political and social commentary
line, more or less caustic, we find
some articles about the national and
international political situation at
that time, focusing on aspects such as
the political party corruption and the
risks of nuclear war. The issues of
police violence and the defense of civil
rights as well as the war and military
service are also the object of attention.
In addition to the articles, there
is a whole second level of political
and social commentary, more or less
explicit, through the use of cartoons
and illustrations, which runs through the
various pages of Cadáver Esquisito.
Music occupies a central place in the
fanzine. In the two numbers of Cadáver
Esquisito we find several articles with
interviews and reports about national
and international bands related to punk/
hardcore spectrum Cagalhões, Xutos &
Pontapés, Rage, Dead Kennedys, Zyklome,
Virgin Prunes, among others and not
only (case of Nick Cave). In order to
establish contact with bands from Brazil,
Ireland or Belgium, the postal service
represented a crucial role in enabling
the circulation of written interviews,
whose questions were sent to the bands,
the responses were sent by post and, if
necessary, later translated, as recalls
David Pontes. In other cases, the
articles were prepared using information
gathered from other fanzines and music
magazines. There are also several critical
commentary articles about the national
music press and also about the punk scene
in Portugal, the mistakes, weaknesses and
potential that matters to trigger.
Finally, it is worth noting carefully
the sections of “classified” of Cadáver
Esquisito where we find valuable
references that allow us to map the punk
scene of the time. Namely we have to refer
the “ads” of the various national and
international fanzines, such as Cancro
Social (Lisbon, Portugal), Lixo Anarquista
(Lisbon, Portugal), Subúrbios (Amadora,
Portugal), La Koluna de la Peste (Madrid,
2 5
Spain) and Alienation (Le Havre, France).
They also provided the contact details of
all the interviewed and mentioned bands in
each number of the fanzine.
As it can be seen in the work exposed,
the whole fanzine was modeled on paper,
being subsequently photocopied. Each of
the numbers of Cadáver Esquisito had
about 150 to 200 copies. Once the most
significant investment was photocopies,
they intensely travelled through Porto
searching the house of photocopies with
the best price, as Neno Costa recalls.
Regarding the distribution of the
fanzine, this was made through different
ways: exchange with other fanzines
(Lisbon, Aveiro, in Portugal; France,
Spain, Brazil); distribution at concerts;
distribution among friends, hand to hand.
However, revenues from the sale of fanzine
rarely covered the costs and it was the
team that has to absorb this loss.
Perhaps for this reason, after half
a year of intense but fleeting activity,
Cadáver Esquisito finished. It was done
a third number of the fanzine, never
edited. Years later, we would rediscover
some of the protagonists of this fanzine
in other contexts related to punk in
which they also played important roles,
but that are other stories...
The story we wanted to tell you,
through exposure Good Save The Portuguese
Fanzines, was the one about the fanzine
Cadáver Esquisito, which importance of
his legacy we hope that this exhibition
will help not only to identify and value,
but also, somehow, to perpetuate. Through
this report, we show that punk continues
to allow the existence of a counter-
hegemonic communication, which is opposite
to the commodification, appropriation and
domestication. There are several means
used in this resistance: from informal
and decentralized social networking sites
and tours that allow the flow of albums,
fanzines, books, ideas and styles;
passing by record labels and independent
shops; to DIY ethics and bands that
write and release music on their own.
Finally, this report is one more approach
to oral history as a possible and
desirable paradigm of social and cultural
Portuguese contemporary interpretation.
2 6
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CadáverEsquisito#1CadáverEsquisito#2
C at á l o g o / C ata l o g
Título/Title
Good Save The Portuguese Fanzines
Autores/Authors
Paula Guerra, Pedro Quintela
Tradução/Translation
Ana Oliveira
Conceção gráfica/Graphic design
Marta Borges
Todas as imagens/All images
Cadáver Esquisito #1: janeiro e fevereiro de 1986/January
and February 1986
Cadáver Esquisito #2: abril, maio e junho de 1986/April,
May and June 1986
1986 © David Pontes, Neno Costa
Tiragem/Edition
50 exemplares
Editor/Publisher
Projeto de investigação/Research project “Keep it simple,
make it fast! Prolegómenos e cenas punk, um caminho para
a contemporaneidade portuguesa (1977-2012)” (PTDC/CS-
SOC/118830/2010).
ISBN
978-989-8648-26-6
Porto – Portugal, 2014 
Publicação editada no âmbito da exposição Good Save
The Portuguese Fanzines, integrada na Conferência
Internacional Keep It Simple, Make It Fast! Underground
Music Scenes and DIY Cultures, esteve patente na Matéria
Prima, Porto, entre 9 e 20 de julho de 2014.
Publication edited within the exhibition Good Save The
Portuguese Fanzines, part of Keep It Simple, Make It Fast!
Underground Music Scenes and DIY Cultures International
Conference was shown at Matéria Prima, Porto – Portugal,
between July 9 and 20 of 2014.
E x p o si ç ã o / E x h ibiti o n
Curadoria/Curated by
Paula Guerra, Pedro Quintela, Júlio Dolbeth
Produção/Production
Ana Almeida, Tânia Moreira
Poster/Illustration
Júlio Dolbeth
Apoio/Support
Dama Aflita, Matéria Prima
Agradecimentos/Acknowledgement
David Pontes, Neno Costa, Paulo Vinhas
2014©JúlioDolbeth
ISBN XXX-XXX-XX-XXXX-X

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Punk Fanzine Cadáver Esquisito

  • 1.
  • 2.
  • 3. 3 “Fanzines adopted the DIY, independent approach that punk musicians had espoused. With the rise of newly formed bands came the establishment of impromptu clubs, small, independent record labels and record stores (…). In the same way, fanzines offered fans a ‘free space for developing ideas and practices’, and a visual space unencumbered by formal design rules and visual expectations.” (Triggs, 2006: 70) Introdução Os fanzines são objetos caseiros, produzido de forma artesanal, individual ou coletivamente, e que têm, em geral, uma circulação limitada. Os primeiros fanzines surgem nas décadas de 1920-30 e estavam associados a fãs de ficção científica. Contudo, a produ- ção, distribuição e consumo de fanzines ganhou relevância global com a emergência do fenómeno do punk no Reino Unido e E.U.A., durante os anos de 1970-80, assumindo-se como um espaço de liber- dade de pensamento e criação Do It Yourself (DIY), e de alterna- tiva aos media convencionais. Com efeito, desde cedo, os fanzines assumiram-se como uma parte muito importante da construção das ‘cenas’ punk – a par das bandas, dos discos, dos concertos –, contribuindo ativamente para a criação e consolidação de um de- terminado sentido de comunidade (Triggs, 2006). Como refere Julia Pine (2006), os fanzines são formas materiais de representação simbólica. São objetos construídos de um modo voluntário que per- mitem aos indivíduos que participam no processo (de edição, das contribuições e de distribuição) afirmarem sua existência social, integrarem (sub)culturas, tribos ou cenas musicais e participarem culturalmente; simultaneamente, os fanzines materializam-se num movimento local marcadamente juvenil de dinamização de uma cena underground, facilitando a divulgação de discos, de bandas, de concertos e de histórias. São um elemento fundamental de concre- tização de gostos, de afinidades, de pertenças sociais, políticas, ideológicas, culturais, estilos de vida e musicais.
  • 4. 4 À semelhança de outras dimensões do movimento punk, a componente gráfica dos fanzines desempenha um papel tão ou mais importante do que os textos escritos. É, na verdade, muito frequente as componentes escritas e visuais dos fanzines estarem tão profundamente misturadas que se torna praticamente impossível analisar separadamente cada um destes dois elementos. À semelhança das capas de discos e demo-tapes punk ou mesmo da própria estética visual das bandas, encontramos em muitos fanzines uma orientação gráfica declaradamente DIY, assente numa mistura de técnicas de cut-and-paste, recorte, desenho/ilustra- ção, textos escritos à mão e datilografados, manipulação de fotogra- fias, etc. Fanzines como o Panache, Sniffin’ Clue e a Ripped & Tom, pioneiros na altura em que o movimento punk estava a surgir em Ingla- terra (segunda metade da década de 1970), contribuíram decisivamente para criar um verdadeiro “cânone subcultural” – tanto em termos grá- ficos, como em termos de conteúdo editorial – que se globalizou e está presente em muitos dos fanzines punk atualmente produzidos (Quintela, Guerra el al, 2014). Como Stephen Duncombe (1997) evidenciou, os pensamentos e a ética pessoal ocupam um lugar central neste tipo de publicações independentes autoeditadas. As páginas dos fanzines espelham fre- quentemente a ideologia dos seus autores, patente no seu posicio- namento político-social ou no apoio a determinadas causas. Vemos também manifestações de um determinado gosto ou estética, visível, por exemplo, nas entrevistas realizadas com determinadas bandas ou nas recensões críticas de discos e demo-tapes, de concertos, de filmes, de livros ou mesmo de outros fanzines. Finalmente, em alguns fanzines encontramos artigos com conteúdos muito pessoais, por vezes com um cariz introspetivo e até íntimo. Os fanzines são, em suma, suportes comunicacionais riquís- simos, nos quais encontramos extensa informação que nos permite compreender um pouco melhor, em cada momento histórico e em cada contexto sociocultural e territorial específico, como se foi de- senvolvendo o movimento punk: como emergiu, quais os protagonis- tas e locais de referências (bandas, editoras, squatters, centros sociais, bares e salas de concertos, lojas de discos e roupas), redes de contactos internacionais, etc.
  • 5. 5 Good Save The Portuguese Fanzines A exposição Good Save The Portuguese Fanzines, integrada na Con- ferência Internacional Keep It Simple, Make It Fast! Underground Music Scenes and DIY Cultures, pretende consagrar os fanzines, a sua estética e ética DIY e o seu papel nas culturas underground – e, em particular, na cultura punk e no modo como esta foi perce- bida e apropriada no contexto português. Esta preocupação decorre ainda do facto desta exposição também se inserir num projeto de investigação de âmbito mais alargado, que procura analisar as ma- nifestações punk em Portugal desde 1977 até à atualidade (Guerra, 2014a, 2014b; Guerra, Bennett, 2014).i Os fanzines desenvolvem-se normalmente em torno do estabelecimento de relações sociais, isto é, como operadores de cenas e afetividades locais. Assim também foi em Portugal, na exata medida em que encerram uma sociabilidade interna de um conjunto de indivíduos ligados por uma atividade não-profissional e um ambiente criativo não-estruturado; e uma so- ciabilidade externa que se traduz na relação da publicação com uma comunidade pequena e bem definida. Aliás, o fanzine não assenta num monólogo escrito, é constituído por uma espécie de diálogo com a comunidade, ou como diz Atton “nos zines, os leitores não comu- nicam através deles, mas sim neles. (…) O zine dá voz, comunica a i Este texto foi realizado com o financiamento do FEDER através do COMPETE – Programa Operacional, via Fundação para a Ciência e Tecnologia, no âmbito do projeto “Keep it simple, make it fast! Prolegómenos e cenas punk, um caminho para a contemporaneidade portuguesa (1977-2012)” (PTDC/CS-SOC/118830/2010), liderado pelo Instituto de Sociologia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (IS-UP) e desenvolvido em parceria com o Griffith Centre for Cultural Research (GCCR) da Universidade de Griffith e a Universitat de Lleida (UdL). Conta ainda com as seguintes instituições participantes: Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP), Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP), Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC), Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (CES) e Bibliotecas Municipais de Lisboa (BLX). Para além dos autores deste texto, integram a equipa de investigação do projeto os seguintes investigadores: Ana Oliveira, Ana Raposo, Andy Bennett, Augusto Santos Silva, Carles Feixa, Hugo Ferro, João Queirós, Luís Fernandes, Manuel Loff, Paula Abreu, Rui Telmo Gomes e Tânia Moreira. Mais informações em www.punk.pt
  • 6. 6 experiência vivida e permite ao leitor emular as experiências dos seus pares.” (Atton, 2002: 145). Para além desta intensa socia- bilidade, os fanzines permitem uma congregação de estéticas e de músicas (Frith, 2002) dentro de uma abordagem coerente de gostos e de lifestyles coerentes (Atton, 2010). Assim, e por encerrarem sociabilidades, afetos e dinâmicas próprias, no momento em que começámos a organizar esta exposi- ção, deparámo-nos com o seguinte dilema: abordar, de uma forma mais transversal e necessariamente genérica, diferentes fanzines punk feitos em Portugal ao longo de quase quatro décadas ou, pelo contrário, centrar-nos num caso particular que, por diferentes motivos, se afigurasse como sendo mais interessante e estimulan- te para “alimentar” o debate que pretendíamos fomentar a partir desta exposição. Equacionadas várias possibilidades, optou-se fi- nalmente pela segunda hipótese, idealizando uma exposição em que, privilegiando olhar mais detalhado e focado, se desse a conhecer a um público contemporâneo, nacional e estrangeiro, um dos fanzi- nes mais emblemáticos do punk em Portugal: o Cadáver Esquisito. Foram vários os motivos desta nossa escolha. Desde logo, foi fundamental a generosa abertura e disponibilidade dos dois elemen- tos que integravam o “núcleo duro” da equipa editorial do fanzi- ne – David Pontes e Neno Costa – para colaborarem no trabalho de pesquisa, relatando na primeira pessoa o modo como viveram essa época. Foi também muito importante termos tido a felicidade de conseguir recuperar alguns dos originais e maquetas do fanzine, que nos permitem perceber em detalhe a sobreposição de técnicas gráficas em que assentava a construção de cada número do Cadáver Esquisito – um aspeto que, na nossa perspetiva, inequivocamen- te reforça sobremaneira o interesse desta exposição. Mas outros motivos – de caráter mais substantivo – levaram-nos a optar por centrar a exposição no caso do Cadáver Esquisito, designadamente o ser uma corporização bem conseguida de uma certa radicalização nos valores de produção e nos valores culturais (Hebdige, 1979: 119), expressando bem uma subcultura assente em elementos gráfi- cos e tipográficos homólogos do estilo subterrâneo e anárquico do punk (Atton, 2006).
  • 7. 7 Apesar da sua existência fugaz – apenas dois números editados, em 1986 – o Cadáver Esquisito traduziu não só uma época singular na cidade do Porto, onde muito possivelmente foi responsável por inau- gurar a publicação de fanzines punk na zona do Grande Porto (englo- bando, no essencial, Espinho, Porto, Vila Nova de Gaia, Matosinhos e Vila do Conde, mas cujos “ecos” chegaram bastante mais longe na região), mas constitui igualmente um dos mais relevantes fanzines para percebermos a histórica das movimentações punk no nosso país. Recorde-se que os primeiros fanzines punk surgem em Portugal logo em finais da década de 1970, embora circunscritos à zona de Lisboa. É o caso do fanzine Desordem Total, editado por Nuno Esterco, Luís Bosta e Pedro Merda, com seis números publicados entre 1978 e 1979, e do Estado de Sítio, editado por Paulo Borges – membro dos Minas e Armadilhas, banda punk pioneira em Portugal –, que publicou pelo menos seis números ao longo do ano de 1978. Na década seguinte, que corresponde a uma fase de desenvolvi- mento das ‘cenas’ punk no nosso país (Guerra, 2013), assiste-se a uma certa proliferação de fanzines, embora ainda muito claramente concentradas nas áreas de metropolitanas de Lisboa e Porto. Neste período, identificam-se como fanzines punk relevantes, para além do Cadáver Esquisito (1986), o Subversão (1982), o Subúrbios (1985), o Tosse Convulsa (1985), o Lixo Anarquista (1986-87), o Suicídio Colectivo (1987), o Anarkozine (1987), o Post Scriptum (1987-88), o Morte à Censura (1988) ou o Culto Urbano (1988-89), entre outros. A década de 1980 é, sem dúvida, um período da história portu- guesa a diversos níveis contraditório. Se, por um lado, é marcado por uma forte abertura do país ao exterior e até por um certo cosmopolitismo – nomeadamente, do ponto de vista dos hábitos e consumos lúdicos e culturais –, ele carateriza-se, simultanea- mente, por fortes convulsões e perplexidades do ponto de vista económico e social – num curtíssimo espaço de tempo, Portugal é objeto de intervenção do Fundo Monetário Internacional (1983) e adere à Comunidade Económica Europeia (1986). Do ponto de vista musical, este período é marcado pelo boom do chamado “rock portu- guês”, ensaiando-se uma rápida atualização da realidade nacional ao mercado da música pop rock europeu e anglo-saxónica.
  • 8. 8 É justamente neste contexto que se dá uma gradual expansão do movimento punk em Portugal para fora dos limites da Grande Lisboa, chegando a cidades como o Porto, Aveiro ou Coimbra, onde começam a surgir várias bandas e a serem organizados os primeiros concertos (Guerra, 2014a, 20104b). Os fanzines deste período dão-nos muito claramente conta do processo de transformação em curso. Contras- tando com os fanzines de finais da década anterior, em que a dimensão de crítica político-social satírica era um elemento cen- tral, na década de 1980 dimensão musical ganha maior relevância. Tornam-se frequentes artigos sobre bandas punk e hardcore (subgé- nero que, nestes anos, irrompe em Portugal) e também reportagens sobre algumas ‘cenas’ internacionais (Austrália, E.U.A., Brasil, Itália, etc.), numa primeira fase recorrendo essencialmente a fontes secundárias (artigos de jornais, nacionais e estrangei- ros, press-releases das bandas, etc.), mas progressivamente in- corporando materiais originais, em geral através da realização de entrevistas (Quintela, Guerra el al, 2014). A década de 1980 constitui, em suma, um período fundamental para a compreensão da história das movimentações punk em Portugal, durante o qual se começam a afirmar um conjunto de algumas tendências-chave que, ao longo dos anos seguintes, serão aprofundadas. O Cadáver Esquisito surge em finais de 1985, por iniciativa de David Pontes e Neno Costa, dois jovens de Espinho aficionados por punk que algum tempo antes tinham vindo para o Porto estudar. David e Neno já tinham trabalho anteriormente em jornais de li- ceu, tendo naturalmente assumido cada um as funções para as quais julgava ter maior vocação: David elaborava os textos, enquanto Neno era responsável pelos desenhos e conteúdos gráficos. A este “núcleo duro” juntavam-se dois outros amigos e colaboradores: Óscar Pinho, responsável pelas sugestões musicais e referências a bandas, e Marta Machado, responsável pelas traduções, secretaria- do e correspondência. É importante interpretar a emergência do Cadáver Esquisito num contexto em que a cidade do Porto era ainda marcada por um grande “cinzentismo”, por uma certa tristeza e com uma grande predomi- nância masculina nos espaços públicos urbanos. “O 25 de abril
  • 9. 9 chegou no plano da teoria mas não no plano prático”, recordam a este propósito David Pontes e Neno Costa. É, pois, nesta atmosfera descrita como “asfixiante” que irá surgir, em meados da década de 1980, um pequeno grupo de jovens aficionados punk que irão con- tribuir decisivamente para agitar a cidade do Porto.ii Neste período, a oferta e consumo cultural de cariz mais al- ternativo ou underground escasseava. O acesso a discos, revistas e livros era ainda bastante difícil, embora fossem chegando. Pon- tualmente chegavam também ao Porto alguns fanzines portugueses (de Lisboa) e também alguns fanzines feitos no Brasil e E.U.A. Eram também muito poucos os concertos punk realizados, tal como era difícil encontrar espaços de encontro que se adequassem a uma estética mais próxima do punk. Para além dos encontros regulares nas casas de alguns dos elementos do grupo – momentos fundamentais para a consolidação dos gostos estéticos e políticos, pois que era aqui que, em coletivo, se partilhavam, ouviram e discutiam discos, fanzines, revistas e livros que se tinha conseguido trazer do es- trangeiro –, os punks do Porto juntavam-se habitualmente no café Garça Real – sobretudo ao sábados à tarde, após as incursões na feira da Vandoma –, podendo ser também avistados pela noite fora nalgumas tascas existente no centro da cidade, como a Tasca do Anarquista e a Tasca do Tóni, e ainda no Tá-se Bem, na Ribeira. Finalmente, do ponto de vista da produção, não existiam nesta altu- ra bandas punk no Porto, com a exceção d’Os Cães a Morte e o Desejo. Também não temos notícia de que existissem fanzines punk no Porto. Era, pois, necessário “agitar” a cidade, afirmando mais claramente as movimentações punk que eram, nesta fase, bastante tímidas. Em finais de 1985, com Neno Costa e Óscar Pinho, entre outros elementos do grupo, regressados ao Porto de uma intensa viagem e estadia em Londres, surge a ideia da criação de um fanzine punk. ii Segundo recordam David Pontes e Neno Costa, este era efetivamente um núcleo de aficionados punk de dimensão bastante reduzida, aproximadamente duas dezenas de pessoas, agregando gente não só do Porto, mas também de Vila Nova de Gaia, Espinho, Matosinhos e Vila do Conde.
  • 10. 1 0 É importante salientar que, para além do projeto do fanzine, o “núcleo duro” responsável pelo Cadáver Esquisito estava já si- multaneamente a arquitetar outros projetos de cariz semelhante. Concretamente, a par do Cadáver Esquisito, David Pontes e Neno Costa estiveram ativamente envolvidos, durante o ano de 1986, na dinamização do programa de rádio O Minuto de Ódio, dedicado à di- vulgação das sonoridades punk e hardcore, na Rádio Caosiii , e também na organização do Grande Baile, o primeiro festival de bandas punk portuguesas.iv A sucessão destes vários acontecimentos, entre ou- tros, foram certamente cruciais para o desenvolvimento de um movi- mento punk mais amplo e sólido na área do Grande Porto, o que viria a acontecer já durante os anos 1990, com o surgimento de bandas punk emblemáticas como, por exemplo, os Renegados de Boliqueime. iii O Minuto de Ódio foi um programa de rádio criado em 1986 por Neno Costa e David Pontes, na Rádio Caos. A Caos foi uma das primeiras rádios “livres” - também conhecidas por “piratas” - a operar em Portugal e a primeira no Porto, nos inícios da década de 1980. Os “estúdios”, situados no último andar de um prédio relativamente antigo da Praça da República portuense, limitavam-se a duas salas, uma das quais (do tamanho de uma marquise) servia de cabina para as longas horas de emissão, na frequência 93.4 MHz. O “autor” – eram todos “autores de programas” cheios de personalidade, originalidade, experimentalismo e títulos impensáveis – sentava-se numa cadeira giratória de napa e manipulava ele próprio a mesa de mistura, posta ali mesmo à sua frente. De manhã até de madrugada, a Caos era um oásis de música “alternativa”, comentários curtos e em voz grave e séria, algum noticiário, alguns entrevistados, tudo feito com o amadorismo próprio de uma rádio livre. Os programas emitidos na Caos obedecerem (pelo menos em princípio...) a um “projeto” previamente entregue aos “diretores” da rádio. O Minuto de Ódio dedicava-se à divulgação das sonoridades punk/hardcore. Neno Costa e David Pontes editaram, realizaram e produziram meia dúzia de programas. Posteriormente, Óscar Pinho deu continuidade ao programa que terá durado cerca de um ano. iv Ironicamente designado por Grande Baile, tornou-se mais conhecido como o Festival Punk no Porto, realizado em 1986 num edifício da Cruz Vermelha (Rua D. Manuel II). Participaram neste concerto as seguintes bandas: Os Cães a Morte e o Desejo, Cagalhões, Crise Total e Kú de Judas. Este concerto foi organizado por David Pontes e Neno Costa, implicou uma cotização por parte dos participantes. Apesar do concerto estar cheio, aproximadamente 70 pessoas, Neno Costa recorda-se que, ainda assim, deu um prejuízo de 500 escudos suportados por Leonel, um amigo.
  • 11. 1 1 O Cadáver Esquisito Embora não se recorde exatamente o porquê da denominação do fan- zine, David Pontes reconhece que se tratou de uma brincadeira, sublinhando que a influência surrealista evidente não foi uma qualquer citação mas antes uma coincidência – “Sem saber, inscre- vemo-nos numa larga tradição”, afirma. Claramente inspirada no imaginário e na estética punk, o Cadáver Esquisito teve como uma suas influências a Maximum Rockn- roll, fanzine punk norte-americanav já com uma qualidade gráfica assinalável para a época, trazida para o grupo por Óscar Pinho, como recorda Neno Costa, que refere ainda a importância de outras fanzines portuguesas publicadas nesta época, que pôde observar e comprar numa ida a Lisboa em meados da década de 80. À semelhança da generalidade das fanzines punk portuguesas desta época (Quin- tela, Guerra et al, 2014), o Cadáver Esquisito assumiu, do ponto de vista editorial, duas temáticas-chave: a música e a política. Retrospetivamente, contudo, David Pontes e Neno Costa reconhecem no Cadáver Esquisito uma qualidade no tratamento dos conteúdos que o distinguiam doutros fanzines produzidos em Portugal. “Tinha qualidade gráfica e alguns cuidados de escrita que nós sabíamos que faziam a diferença”, notam. Neno Costa reconhece na abordagem gráfico do Cadáver Esquisito, que qualifica de “áspera”, uma estreita relação com o punk: a opção pelas técnicas de cut-and-paste, recorte, desenho/ilustra- ção, textos escritos à mão e datilografados, manipulação de fo- tografias, etc. Salienta ainda a atitude descomprometida, decla- v A Maximum Rocknroll é um mais famosos fanzines punk do mundo. Fundado em 1982, em São Francisco (E.U.A.), tornou-se célebre pela sua capacidade de cobrir as várias ‘cenas’ punk existentes um pouco por todo o mundo, através da realização de entrevistas, reportagens, crónicas e críticas de música, livros e filmes. O fanzine conseguiu, ao longo de mais de duas décadas, reunir colaboradores provenientes de diversas partes do mundo. Atualmente a Maximum Rocknroll continua ativa, sendo não só um fanzine, mas também uma editora e um programa de rádio. Mais informações em http://maximumrocknroll.com/
  • 12. 1 2 radamente descomprometida – “não fazeres um grande esforço [para desenhar e paginar o fanzine] e não fazeres um grande esforço para disfarçar isso”, resume. Contudo, como se poderá observar no con- junto de originais e maquetas do fanzine selecionados para esta exposição, existe bastante cuidado não só na conceção gráfica da “mancha” das páginas, mas também muito rigor na sua concretização. Existe ainda no Cadáver Esquisito um cuidado pouco habitual em fanzines do mesmo período, em tornar a leitura mais dinâmica, sen- do frequente os vários artigos terem um tratamento gráfico dife- renciado de modo a ajustar-se aos conteúdos editoriais especifico. Ainda do ponto de vista gráfico, importa destacar presença de cartoons e comics da autoria de Neno Costa – nalguns casos assina- dos, com o pseudónimo “Verme”, e noutros casos não assinados. Aqui encontramos inúmeras representações de punk rockers – geralmente numa visão bastante cliché: o punk cadavérico e o punk ratazana –, mas também de algumas personagens marcantes da década de 1980, no contexto nacional e internacional, como é o caso de Marco Paulo ou Ronald Reagan. Como analisou Marcos Farrajota, existe uma longa tradição de inter-relações entre a banda desenhada, o punk, os fanzines e a cultura DIY (Farrajota, 2014), estando esta teia de conexões muito claramente presente no Cadáver Esquisito.
  • 13.
  • 14. 1 4 A música e a política eram, como referido antes, as duas temá- ticas centrais do Cadáver Esquisito. Existia, porém, uma intenção declarada de agitar a cidade do Porto (e não só), dando a conhecer projetos e iniciativas punk nacionais e internacionais, fomen- tando que novos projetos de cariz semelhante surgissem em Portu- gal. Estas intenções agit-prop do Cadáver Esquisito encontram-se declaradas sem quaisquer rodeios logo no editorial do primeiro número do fanzine (janeiro/fevereiro de 1986): “Ao estar aqui pretendo criar um novo espaço para todos, punks, homossexuais, prostitutas, skins, desempregados, desiludidos, re- voltados, para aqueles que sentem a sua vida agrilhoada pela mi- séria, apatia, desespero e exploração. Nós existimos porque esta realidade existe, porque somos marginalizados por uma sociedade que não aceita outros valores que não os da servidão, competição e poder. (…) Não vou fazer aqui grandes tratados ideológicos, em quero que ninguém faça de mim uma bíblia, ler-me nunca bastará… (…) Acima de tudo o que acontece por aqui, quem e como, tenar dar a voz a inúmeras bandas desconhecidas, apoiando-as pois elas exis- tem, a novos espaços e iniciativas (ocupações de casas, comunas, fanzines), cujo papel é importante e qual é urgente compreender e mais do que isso AGIR. Estamos aqui não para apresentar um rol de tragédias mas para dizer que podemos agir e mudar.”. A panóplia de temas abordados é, apesar de tudo, relativamente diversificada. Numa linha de comentário político-social, mais ou me- nos cáustico, encontramos alguns artigos acerca da situação política da época, nacional e internacional, focando aspetos como a corrupção político-partidária ou os riscos de uma guerra nuclear. Os temas da violência policial e da defesa dos cívicos, bem como o da guerra e do serviço militar obrigatório são igualmente objeto de atenção. Além dos artigos, existe todo um segundo nível de comentário político- -social, mais ou menos explícito, através do recurso a cartoons e ilustrações, que percorre as várias páginas do Cadáver Esquisito.
  • 15. 1 5 A música ocupa um lugar central no fanzine. Nos dois números do Cadáver Esquisito encontramos vários os artigos com entrevistas e reportagens sobre bandas, nacionais e internacionais, ligadas ao espectro punk/hardcore (Cagalhões, Xutos e Pontapés, Cólera, Dead Kennedys, Zyklome, Virgin Prunes, entre outros) e não só (caso de Nick Cave). De forma a estabelecer contacto com bandas do Brasil, Irlanda ou Bélgica os correios representavam um papel crucial, permitindo a circulação das entrevistas escritas, cujas questões eram enviadas às bandas, as respostas enviadas por cor- reio postal e, se necessário, posteriormente traduzidas, conforme recorda David Pontes. Noutros casos, os artigos eram elaborados com recurso a informação recolhida de outras fanzines e revistas de música. Existem ainda vários artigos de comentário crítico acerca da imprensa musical nacional e também sobre a cena punk em Portugal, os equívocos, fragilidades e potencialidades que importa despoletar. Finalmente, vale a pena observar com cuidado as secções de “classificados” do Cadáver Esquisito onde encontramos valiosas referências que nos permitem mapear a cena punk da época. Nomea- damente, refiram-se os “anúncios” referentes às diversas fanzi- nes, nacionais e internacionais, como o Cancro Social (Lisboa), o Lixo Anarquista (Lisboa), o Subúrbios (Amadora), o La Koluna de la Peste (Madrid, Espanha) e o Alienation (Le Havre, França). São igualmente disponibilizados os contactos de todas as bandas entrevistas e mencionadas em cada número do fanzine.
  • 16. 1 6 Como se pode ver nos trabalhos expostos, toda a fanzine era maquetada em papel, sendo posteriormente fotocopiada. Cada um dos números do Cadáver Esquisito teve tiragens rondava os 150 a 200 exemplares. Uma vez que o investimento mais significativo eram as fotocópias, calcorreava-se a cidade do Porto intensamente em busca da casa de fotocópias com o melhor preço, como recorda Neno Costa. Relativamente à distribuição do fanzine, esta fazia-se por diferentes vias: intercâmbio com outros fanzines (Lisboa, Aveiro, França, Espanha, Brasil); distribuição em concertos; distribuição pelos amigos em mão. Contudo, as receitas da venda do fanzine raramente cobriram os custos, acabando por ser a equipa a ter de absorver esse prejuízo. Talvez por esse motivo, ao cabo de meio ano de intensa mas fugaz atividade, o Cadáver Esquisito terminou. Ainda chegou a ser feito um terceiro número do fanzine, nunca editado. Anos mais tarde, haveríamos de reencontrar alguns dos protagonistas deste fanzine noutros contextos ligados ao punk em que também desempe- nharam papéis relevantes, mas isso já são outras histórias… A história que vos queríamos contar, através da exposição Good Save The Portuguese Fanzines, era a do fanzine Cadáver Esqui- sito, cuja importância do seu legado esperamos que esta mostra ajude não só a evidenciar e valorizar, mas também, de algum modo, a perpetuar. Através deste relato, mostramos que o punk continua a possibilitar a existência de uma comunicação contra-hegemónica, que faz frente à mercantilização, apropriação e domesticação. São vários os meios usados nessa resistência: desde as redes sociais informais e descentralizadas da Internet e das tours que permitem o fluxo de discos, fanzines, bandas, ideias e estilos; passan- do pelas gravadoras e lojas independentes; até à ética DIY e às bandas que gravam e lançam músicas por conta própria. Finalmente, este relato é mais uma aproximação da história oral como paradigma possível e desejável da interpretação da contemporaneidade social e cultural portuguesa.
  • 17.
  • 18. 1 8 Introduction Fanzines are home-made objects, produced in an artisanal manner, individual or collectively, with a generally limited circulation. The first fanzines appeared in the 1920-30 decades and were associated to science fiction fans. However, production, distribution and consumerism of fanzine gained a global relevance with the emergency of the punk phenomena in the United Kingdom and the U.S.A., during the seventies and eighties, arising as a space of freedom of thought and Do It Yourself (DIY) creation, as well as an alternative to conventional media. With effect, from early on, fanzines placed themselves as a very important part of punk scenes construction – alongside bands, records and concerts -, actively contributing to the creation and consolidation of a determined sense of community (Triggs, 2006). As referred by Julia Pine (2006), fanzines are material forms of symbolic representation. They are voluntarily built objects that allow the participant individuals (from editing, contribution and distribution) to affirm their social existence, to integrate (sub)cultures, tribes and musical scenes and to participate culturally; simultaneously, fanzines materialize in a local movement, marked in a youthful boost of an underground scene, facilitating the records, bands, concerts and stories divulgation. They are an element of taste, of affinities, of social, political, ideological and cultural belongings, and musical and lifestyle choices. Similarly to other dimensions of the punk movement, the graphic component of fanzines plays a very or more important part than written text. It is, truthfully, very frequent for this two elements to be so entwined with in each other that it becomes nearly impossible to analyse separately any of these elements. As well as record covers and punk demotapes or even the band’s visual aesthetics, we often find a graphic DIY orientation, settled in a mixture of technics and cut-and-paste, clippings, drawing/illustration, hand-written and typewritten texts, photographic manipulation, etc. Fanzines such as Panache, Sniffin’ Clue and Ripped & Tom, pioneers in a time when punk movement was arising in England (second half of the 1970 decade), contributed decisively to create a true “subcultural canon” – both in graphical and editorial content ways – that became global and can be found in many of punk fanzines produced now-a-days (Quintela, Guerra et al, 2014). As Stephen Duncombe (1997) showed, thoughts and personal ethics occupy a central place in this kind of independently self-edited publications. Fanzines pages frequently mirror their author’s ideology, manifested in their social and political positions or in “Fanzines adopted the DIY, independent approach that punk musicians had espoused. With the rise of newly formed bands came the establishment of impromptu clubs, small, independent record labels and record stores (…). In the same way, fanzines offered fans a ‘free space for developing ideas and practices’, and a visual space unencumbered by formal design rules and visual expectations.” (Triggs, 2006: 70)
  • 19. 1 9 the support of determined causes. We also find manifestations of a determined taste or aesthetics, found, for example, in interviews with determined bands or critical reviews of records and demotapes, concerts, movies, books or even other fanzines. Finally, in some fanzines, we find articles with very personal contents, sometimes with an introspective and even intimate nature. Fanzines are, at the end, very rich communicational supports, in which we find extensive information that allows us to better understand, in each historical moment and in specific territory and social and cultural context, how the punk movement evolved: how it was born, which protagonists and referential spots (bands, editors, squatters, social centres, bars and concert venues, record stores and clothes), networks of international contacts, etc. God Save The Portuguese Fanzines The exhibition God save The Portuguese Fanzines, integrated in the International Conference Keep It Simple, Make It Fast! Underground Music Scenes and DIY Cultures, aims to consecrate fanzines, their aesthetics and DIY ethics as well as their part in underground cultures – particularly in punk culture and in the way this was perceived and appropriated in the Portuguese context. This concern comes still from the fact that this exhibition is also part of an investigation project of a wider range, which hopes to analyse punk manifestations in Portugal, from 1977 to today (Guerra, 2014a, 2014b; Guerra, Bennett, 2014)i . Fanzines normally develop around the establishment of social relations, namely as agents of scenes and local affectivities. Portugal was also like this, in the exact measure in which they close an internal sociability of a group of individuals connected by a non-professional activity and a non- structured creative environment; and an external sociability that translates in a relation between a publishing and a small and well-defined community. In fact, fanzine isn’t set in a written monologue, it is constituted by a species of dialogue with the community, or as Atton puts is “in the zines, readers don’t communicate through them, but in them. (…) The zine gives voice, communicates the lived experience and allows the reader to emulate the experiences of their peers.” (Atton, 2002: 145). Besides this intense sociability, fanzines allow a congregation of aesthetics and music (Frith, 2002) within a coherent approach of tastes and lifestyles (Atton, 2010). So, and by enclosing sociability’s, affections and proper dynamics, at the 1 This text was made with funding from FEDER through COMPETE – Programa Operacional, via Fundação para a Ciência e Tecnologia, within the project “Keep it Simple, Make it fast! Prolegómenos e cenas punk, um caminho para a contemporaneidade portuguesa (1977-2012)” (PTDC/CS-SOC/118830/2010), led by the Institute of Sociology from the Faculty of Arts of the University of Porto (IS-UP) and developed in partnership with the Griffith Centre for Cultural Research (GCCR) from the University of the Univesity of Lleida (UdL). The following institutions also participated: Faculty of Economics of the University of Porto (FEP), Faculty of Psychology and Education Sciences of the University of Porto (FPCEUP), Faculty of Economics of the University of Coimbra (FEUC), Centre of Social Studies of the University of Coimbra (CES) e Municipal Libraries of Lisbon (BLX). Besides the authors of this text, the following people are on the investigation team: Ana Oliveira, Ana Raposo, Andy Bennett, Augusto Santos Silva, Carles Feixa, Hugo Ferro, João Queirós, Luís Fernandes, Manuel Loff, Paula Abreu, Rui Telmo Gomes e Tânia Moreira. More information at www.punk.pt
  • 20. 2 0 moment when we started organizing this exhibition, we found ourselves facing a dilemma: approaching, in the most transversal and necessarily generic way, different punk fanzines made in Portugal in almost four decades or, on the contrary, focus on a particular case that, for different reasons, showed himself up as a more interesting and debate stimulating for the debate we were hoping to promote from the exhibition. Calculated all the possibilities, we finally choose the second hypotheses, idealizing an exhibition in which, privileging a more focused and detailed look, one of the most emblematic punk fanzine in Portugal - Cadáver Esquisito would be exposed to a contemporary, national and international public. There were many motives for this choice. From the beginning, the generous opening and availability from David Pontes and Neno Costa – the two elements that embodied the “hard core” of the fanzine’s editorial team – was essential in the research work, accounting, in first person, the way of life at the time. It was also very important having had the luck to manage to recuperate some of the models and original fanzines, that allow us to understand in detail the superposition of graphic technics in which the construction of each edition of Cadáver Esquisito sat – a look that, from our perspective, unequivocally reinforces heavily this exhibition’s interest. But other reasons – of a more substantive character – led us to focus this exhibition in Cadáver Esquisito’s case, namely for being such a well-made embodiment of a determined radicalization in production and cultural values (Hebdige, 1979: 119), expressing successfully a subculture built in graphic and typographic elements, equivalent to punk’s anarchic and underground style (Atton, 2006). Is spite of its brief existence – only two edited numbers, in 1986 – Cadáver Esquisito translated not only a singular time in the city of Porto, where it was very possibly the responsible for the inauguration of punk fanzines publications in the larger area of Oporto (which features, essentially, Espinho, Porto, Vila Nova de Gaia, Matosinhos and Vila do Conde, but whose echoes travelled considerably far in the map), but also one of the most relevant fanzines to understand the historic punk drives in our country. Remember that the first punk fanzines appeared in Portugal at the end of the 1970 decade, although circumscribed to the Lisbon area. It’s the case of Desordem Total fanzine, edited by Nuno Esterco, Luís Bosta e Pedro Merda, with six numbers published between 1978 and 1979, and Estado de Sítio, edited by Paulo Borges – member of Minas & Armadilhas, a punk band pioneer in Portugal -, that published at least six numbers throughout 1978. The following decade, which corresponds to a phase of development of punk ‘scenes’ in our country (Guerra, 2013), we see a certain proliferation of fanzines, although still very clearly focused in the metropolitan areas of Lisbon and Porto. In such period, other punk fanzines besides Cadáver Esquisito (1986) are identified as relevant: Subversão (1982), Subúrbios (1985), Tosse Convulsa (1985), Lixo Anarquista (1986- 87), Suicídio Coletivo (1987), Anarkozine (1987), Post Scriptum (1987-88), Morte à Censura (1988) or Culto Urbano (1988-89), among others. The decade of 1980 is, without doubt, a contradictory period of Portuguese
  • 21. 2 1 history in several levels. If, on the one hand, it is marked by a strong opening of the country to exterior and even by a certain cosmopolitism – namely, from the point of view of habits and ludic and cultural consumerism -, he is characterized, simultaneously, by strong convulsions and perplexities from a social and economic point of view – in a very brief space of time, Portugal becomes an object of intervention from FMI (1983) and enters the CEE (1986). From a musical point of view, such period is marked by the so called boom of “Portuguese rock”, in an essay of a quick update of the reality of international European and Anglo-Saxon pop rock music market. It is exactly in this context that a gradual expansion of the punk movement begins in Portugal, outside the limits of Lisbon, reaching cities as Porto, Aveiro and Coimbra, where many bands were born and the first concerts organized (Guerra, 2014a, 2014b). Fanzines of this period give us very clearly image of the transformation in course. In contrast with the fanzines from the end of the previous decade, in which the satiric political and social critic were a focus point, in the 1980 decade, the musical dimension gains relevance. Articles about punk and hardcore (subgenre that breaks through in Portugal at the time) bands, as well as reports about some international ‘scenes’ (Australia, U.S.A., Brasil, Italy, etc.) become frequents, firstly appealing essentially to secondary sources (newspaper articles, national and foreign, band’s press releases, etc.), but progressively incorporating original materials, generally through interviews (Quintela, Guerra et al, 2014). The 1980 decade constitutes, in sum, a fundamental period to the understanding of the history of punk movements in Portugal, during which a group of key-tendencies – that will deepen in the following years – begin their affirmation. Cadáver Esquisito appears at the end of 1985, an initiative of David Pontes and Neno Costa, two young men from Espinho, punk fans that, sometime before, had come to Porto to study. David and Neno had already worked in high school newspapers, having naturally assumed each one the jobs to which they thought to have greater vocation: David created the texts, while Neno was responsible for the drawings and graphic contents. Two friends and collaborators joined this project: Óscar Pinho, responsible for the musical suggestions and band references, and Marta Machado, responsible for translations, secretary work and correspondence. It is important to interpret the emergency of Cadáver Esquisito in a context in which the city of Porto was still marked by a great “grayism”, by certain sadness and a great masculine predominance in the urban public spaces. “April 25th arrived in the theoretical plan but not in the practical one”, remember David Pontes and Neno Costa. It is in this “asphyxiating” atmosphere, at the beginning of 1980 decade, that a small group of young punk fans will contribute decisively to shake the city of Porto.ii In this period, the cultural offer and consume of a more alterative or underground nature was scarce. The access to records, magazines and books was 2 According to David Pontes and Neno Costa, this was effectively a small core of punk fans, approximately 20 people, incorporating people from Porto, but also from Vila Nova de Gaia, Espinho, Matosinhos and Vila do Conde as well.
  • 22. 2 2 still very difficult, though arriving. Occasionally, some Portuguese fanzines (from Lisbon) arrived at Porto, as well as some Brazilian and American ones. Punk concerts were seldom organized and it was hard to find meeting places that fit an aesthetic closer to punk. Besides regular meetings at the houses of some group members – fundamental moments to the consolidation of aesthetic and political tastes, where records, fanzines, magazines and books, brought from other countries were collectively shared and discussed -, the punks from Porto joined at café Garça Real – mostly at Saturdays in the afternoon, after incursions at Feira da Vandoma (fair of Vandoma) -, being seen throughout the night in some of the existent taverns in the centre of the city, like Tasca do Anarquista and Tasca do Tóni, and even Tá-se Bem, at Ribeira. Finally, from the point of view of production, there were no punk bands at Porto, with the exception of Os Cães a Morte e o Desejo. There’s also no news of any punk fanzines at Porto. It was necessary to “shake” the city, stating more clearly that punk movements were, at this stage, quite shy. At the end of 1985, with Neno Costa and Óscar Pinho, among other elements of the group, back to Porto from an intense trip and stay in London, comes the idea of creating a punk fanzine. It is important to state that, besides the fanzine project, the “hard core” responsible for Cadáver Esquisito was already thinking up other projects of a similar nature. Specifically, David Pontes and Neno Costa were actively involved, during 1986, with the minimization of the radio show O Minuto de Ódio, dedicated to the divulgation of punk and hardcore sounds, at Rádio Caosiii , as well as at the organization of the Grande Baileiv , the first festival of Portuguese punk bands. The succession of events, among others, were certainly crucial to the development of a broader and more solid punk movement at the greater area of Porto, which would come to happen during the 1990’s, with the emergence of emblematic punk bands such as, for example, Renegados de Boliqueime. iii O Minuto do Ódio was a radio show created in 1986 by Neno Costa and David Pontes, at Radio Chaos. Radio Chaos was one of the first pirate radios operating in Portugal, and the first in Porto, at the beginning of the 1980 decade. The “studios”, located at the top floor of a relatively old building at Praça da República in Porto, were limited to two rooms, one of which (the size of a marquise) was the cabin for long hours of emission, at 93.4 MHz. The “author” – were all “show’s authors” full of personality, originality, experimentalism and unthinkable titles – sat in a rotating chair and manipulated himself the mixer, set right in front of him. From morning ‘till dawn, Caos was an oasis of “alternative” music, short comments in a grave and serious voice, some news, some interviewees, all made with the amateurism proper of a free radio. The shows emitted by Chaos obeyed (at least in principle) a “project” previously delivered to the radios “directors”. O Minuto do Ódio was dedicated to the reveal of punk and hardcore sounds. Neno Costa and Davis Pontes edited, directed and produced half a dozen shows. After that, Óscar Pinho continued the show, which must have lasted a year. iv Ironically called Grande Baile, it became known as the Porto Punk Festival, organized in 1986 at a Red Cross building (Street D. Manuel II). In this concert participated the following bands: Os Cães a Morte e o Desejo, Cagalhões, Crise Total and Kú de Judas. This show was organized by David Pontes and Neno Costa, implied a quote from the participants. Even though the concert was full, approximately 70 people, Neno Costa remembers that, even so, it meant a loss of 500 escudos, supported by Leonel, a friend.core sounds. Neno Costa and Davis Pontes edited, directed and produced half a dozen shows. After that, Óscar Pinho continued the show, which must have lasted a year.
  • 23. 2 3 Cadáver Esquisito Although he does not recall exactly why the name of the fanzine, David Pontes recognizes that it was a joke, noting that the evident surrealist influence was not a quotation but rather a coincidence - “Without knowing, we inscribed us in a long tradition,” he states. Clearly inspired by the imagery and aesthetics of punk, Cadáver Esquisito had as one of its influences Maximum Rocknroll, an American punk fanzinev already with a remarkable graphic quality for the time, brought to the group by Oscar Pinho, how recalls Neno Costa, who refers also the importance of other Portuguese fanzines published at the time, that he could observe and buy on a trip to Lisbon in the mid 80s. Like the majority of Portuguese punk fanzines of this time (Quintela, Guerra et al, 2014), Cadáver Esquisito assumed, from the editorial point of view, two key themes: music and politics. However, retrospectively, David Pontes and Neno Costa recognize in Cadáver Equisito the quality in the treatment of content that distinguish him from other fanzines produced in Portugal. “It had some graphical quality and care of writing that we knew were the difference,” they note. Neno Costa recognizes in the graphic approach of Cadáver Esquisito, which it describes as “rough”, a close relationship with punk: the option for cut-and-paste technics, cut, drawing/ illustration, handwritten and typewritten texts, handling photographs, etc. He emphasizes the uncompromising attitude, reportedly unengaged - “do not make a great effort [to design the fanzine] and not make a great effort to disguise it,” he summarizes. However, as it can be seen in the original set of the fanzine and models selected for this exhibition, there is very careful not only in graphic design from the “stain” of pages, but also very rigor in its realization. In Cadáver Esquisito there is still an unusual care in the fanzines of the same period, to make the reading more dynamic, being frequent various articles with a distinctive graphic treatment to adjust to specific editorial content. From the graphical point of view, it is also worth highlighting the presence of cartoons and comics written by Neno Costa - in some cases signed with the pseudonym “Verme”, and in other cases not signed. Here we find numerous representations of punk rockers - usually a vision quite cliché: the cadaverous punk and the rat punk - but also some remarkable characters of the 1980s, in the national and in the international context, such as Marco Paulo or Ronald Reagan. As Marcos Farrajota analyzed, there is a long tradition of inter- relationships between the comics, punk, fanzines and do-it-yourself culture (Farrajota, 2014), being this net very clearly present in Cadáver Esquisito. v Maximum Rocknroll is one of the most famous punk fanzines of the world. Founded in 1982 in San Francisco (USA), it became famous for its ability to cover the various punk ‘scenes’ existing all over the world, through interviews, stories, chronicles and reviews of music, books and movies. Over more than two decades, the fanzine brought together reviewers from different parts of the world. Currently Maximum Rocknroll is still active, being not only a fanzine, but also a publisher and a radio show. More information on www.maximumrocknroll.com
  • 24. 2 4 As mentioned before, music and politics were the two central themes of Cadáver Esquisito. However, there was a declared intention to shake the city of Porto (and not only), providing information about projects and national and international punk initiatives by fostering new projects of similar nature arose in Portugal. These agit- prop intentions of Cadáver Esquisito are declared without any detours in the editorial of the first number of the fanzine (January/February 1986): “Being here I intend to create a new space for all, punks, gays, prostitutes, skins, unemployed, disillusioned, angry, for those who feel their life shackled by poverty, apathy, despair and exploitation. We exist because this reality exists, because we are marginalized by a society that does not accept ​​other values than those of servitude, competition and power. (…) I will not do here great ideological treated, nor want anyone to make me a bible, read me will never suffice… (…) Above all what happens here, who and how, try to give voice to innumerous unknown bands, supporting them as they are, the new spaces and initiatives (occupations of houses, communes, fanzines), whose role is important and urgent to understand and more than that ACT. We are here not to present a catalog of tragedies but to say that we can act and change.”. The range of topics covered is, after all, relatively diversified. In a political and social commentary line, more or less caustic, we find some articles about the national and international political situation at that time, focusing on aspects such as the political party corruption and the risks of nuclear war. The issues of police violence and the defense of civil rights as well as the war and military service are also the object of attention. In addition to the articles, there is a whole second level of political and social commentary, more or less explicit, through the use of cartoons and illustrations, which runs through the various pages of Cadáver Esquisito. Music occupies a central place in the fanzine. In the two numbers of Cadáver Esquisito we find several articles with interviews and reports about national and international bands related to punk/ hardcore spectrum Cagalhões, Xutos & Pontapés, Rage, Dead Kennedys, Zyklome, Virgin Prunes, among others and not only (case of Nick Cave). In order to establish contact with bands from Brazil, Ireland or Belgium, the postal service represented a crucial role in enabling the circulation of written interviews, whose questions were sent to the bands, the responses were sent by post and, if necessary, later translated, as recalls David Pontes. In other cases, the articles were prepared using information gathered from other fanzines and music magazines. There are also several critical commentary articles about the national music press and also about the punk scene in Portugal, the mistakes, weaknesses and potential that matters to trigger. Finally, it is worth noting carefully the sections of “classified” of Cadáver Esquisito where we find valuable references that allow us to map the punk scene of the time. Namely we have to refer the “ads” of the various national and international fanzines, such as Cancro Social (Lisbon, Portugal), Lixo Anarquista (Lisbon, Portugal), Subúrbios (Amadora, Portugal), La Koluna de la Peste (Madrid,
  • 25. 2 5 Spain) and Alienation (Le Havre, France). They also provided the contact details of all the interviewed and mentioned bands in each number of the fanzine. As it can be seen in the work exposed, the whole fanzine was modeled on paper, being subsequently photocopied. Each of the numbers of Cadáver Esquisito had about 150 to 200 copies. Once the most significant investment was photocopies, they intensely travelled through Porto searching the house of photocopies with the best price, as Neno Costa recalls. Regarding the distribution of the fanzine, this was made through different ways: exchange with other fanzines (Lisbon, Aveiro, in Portugal; France, Spain, Brazil); distribution at concerts; distribution among friends, hand to hand. However, revenues from the sale of fanzine rarely covered the costs and it was the team that has to absorb this loss. Perhaps for this reason, after half a year of intense but fleeting activity, Cadáver Esquisito finished. It was done a third number of the fanzine, never edited. Years later, we would rediscover some of the protagonists of this fanzine in other contexts related to punk in which they also played important roles, but that are other stories... The story we wanted to tell you, through exposure Good Save The Portuguese Fanzines, was the one about the fanzine Cadáver Esquisito, which importance of his legacy we hope that this exhibition will help not only to identify and value, but also, somehow, to perpetuate. Through this report, we show that punk continues to allow the existence of a counter- hegemonic communication, which is opposite to the commodification, appropriation and domestication. There are several means used in this resistance: from informal and decentralized social networking sites and tours that allow the flow of albums, fanzines, books, ideas and styles; passing by record labels and independent shops; to DIY ethics and bands that write and release music on their own. Finally, this report is one more approach to oral history as a possible and desirable paradigm of social and cultural Portuguese contemporary interpretation.
  • 26. 2 6 B ibliografia / B ibliography ATTON, Chris (2002). Alternative Media. London/Thousand Oaks/New Delhi: Sage ATTON, Chris (2010). Popular music fanzines: genre, aesthetics, and the democratic conversation. Popular Music and Society, pp. 517-531. BORGES, Haydée Crystina Felippe (2009). Fanzines e as novas tecnologias: possíveis contribuições da Internet para as publicações alternativas da década de 1980. Tese de Mestrado em Design da Imagem. Porto: Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto DUNCOMBE, Stephen (1997). Notes from underground: Zines and the politics of alternative culture. London & New York: Verso. FARRAJOTA, Marcos (2014a), Punk Comix (1). Online: www.punk.pt/2014/04/03/punk-comix [consultado/consulted: 30/06/2014] FARRAJOTA, Marcos (2014b), Punk Comix (2). Online: http://www.punk.pt/2014/04/28/ punk-comix-parte2/ [consultado/consulted: 30/06/2014] FARRAJOTA, Marcos (2014c), Punk Comix (3). Online: http://www.punk.pt/2014/05/06/a- realidade-portuguesa-da-bd-e-a-realidade-na-bd-portuguesa/ [consultado/consulted: 30/06/2014] FARRAJOTA, Marcos (2014d), Punk Comix (4). Online: http://www.punk.pt/2014/06/28/ punk-comix4/ [consultado/consulted: 30/06/2014] FRITH, Simon (2002). Fragments of Sociology of Rock Criticism. JONES, Steve (ed.) Pop Music and the Press. Philadelphia: Temple UP. GUERRA, Paula (2014a). Punk, expectations, breaches and metamorphoses: Portugal, 1977–2012. Critical Arts, 28(1), pp. 111-122. GUERRA, Paula (2014b). Punk, ação e contradição em Portugal. Uma aproximação às culturas juvenis contemporâneas. Revista Crítica de Ciências Sociais, 102-103, pp. 111-134. GUERRA, Paula; BENNETT, Andy (2014). Punk Portugal, 1977-2012: a genealogy. Poetics. (no prelo/in press). PINE, Julia (2006). Cold Press: Early Punk Fanzines in Canada’s Capital. Volume!, 5:1, pp. 27-44. QUINTELA, Pedro; GUERRA, Paula; FEIXA, Carles; FARRAJOTA, Marcos (2014) As ‘cenas’ punk em Portugal (1977-2012): um olhar sociológico a partir da análise das redes de produção, distribuição e consumo de fanzines e e-zines. Atas do VIII Congresso Português de Sociologia. 40 anos de democracias, progressos, contradições e prospetivas (no prelo/in press) SÁNCHEZ, Ruben Ramirez (2012). From Zines to MySpace: A Case Study of Media Infrastructures and Counter-power in the Puerto Rican Underground Punk Scene. Journal of Latin American Communication Research, 2 (1), pp. 37-60. TRIGGS, Teal (2006). Scissors and Glue: Punk Fanzines and the Creation of a DIY Aesthetic, Journal of Design History, Vol. 19, No. 1, 69-83
  • 27. CadáverEsquisito#1CadáverEsquisito#2 C at á l o g o / C ata l o g Título/Title Good Save The Portuguese Fanzines Autores/Authors Paula Guerra, Pedro Quintela Tradução/Translation Ana Oliveira Conceção gráfica/Graphic design Marta Borges Todas as imagens/All images Cadáver Esquisito #1: janeiro e fevereiro de 1986/January and February 1986 Cadáver Esquisito #2: abril, maio e junho de 1986/April, May and June 1986 1986 © David Pontes, Neno Costa Tiragem/Edition 50 exemplares Editor/Publisher Projeto de investigação/Research project “Keep it simple, make it fast! Prolegómenos e cenas punk, um caminho para a contemporaneidade portuguesa (1977-2012)” (PTDC/CS- SOC/118830/2010). ISBN 978-989-8648-26-6 Porto – Portugal, 2014  Publicação editada no âmbito da exposição Good Save The Portuguese Fanzines, integrada na Conferência Internacional Keep It Simple, Make It Fast! Underground Music Scenes and DIY Cultures, esteve patente na Matéria Prima, Porto, entre 9 e 20 de julho de 2014. Publication edited within the exhibition Good Save The Portuguese Fanzines, part of Keep It Simple, Make It Fast! Underground Music Scenes and DIY Cultures International Conference was shown at Matéria Prima, Porto – Portugal, between July 9 and 20 of 2014. E x p o si ç ã o / E x h ibiti o n Curadoria/Curated by Paula Guerra, Pedro Quintela, Júlio Dolbeth Produção/Production Ana Almeida, Tânia Moreira Poster/Illustration Júlio Dolbeth Apoio/Support Dama Aflita, Matéria Prima Agradecimentos/Acknowledgement David Pontes, Neno Costa, Paulo Vinhas