Aula 1 e 2 - TEÓRICA - Aut. Ind. (PIE) - ENG - 6 NA
História da indústria do plástico em Leiria
1. HISTÓRIAda
INDÚSTRIA
na região de Leiria
plástico
Estarevistafazparteintegrantedaedição1596doJornaldeLeiria,de12.02.2015
JornalDE LEIRIA
EDIÇÃO
PATROCÍNIO
Plano Capa_final_1:Apresentação 1 09-02-2015 12:16 Página 1
3. O projecto História da Indústria na Região de Leiria, que engloba sete fascículos,
não teria sido possível sem o APOIO
APOIO
Este fascículo dedicado ao sector da indústria do plástico, que integra o projecto
História da Indústria na Região de Leiria, tem o
o PATROCÍNIO
Patrocinios_plásticos:Layout 1 09-02-2015 14:50 Página 3
4. [ 4 ] [ P L Á S T I C O ]
ÍNDICE
Bancários de Leiria constituem primeira fábrica
de plástico do País . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .6
Cópia de artigos em plástico atravessa décadas . . . . . .19
Salário mínimo abana estrutura de empresas . . . . . . . .28
Empresas pioneiras seguem percursos diferentes . . . .30
Indústrias partem à conquista do mundo . . . . . . . . . . .33
Sirplaste lidera reciclagem de plástico
contaminado na Europa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .36
Empresas procuram mercados
para escoar sacos plásticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .37
Falta de quadros intermédios prejudica empresas . . . .38
Crise na Europa atinge indústria de plástico . . . . . . . . .40
Procura de engenheiros de polímeros
é superior à oferta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .42
Centros tecnológicos apoiam desenvolvimento
de produtos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .44
Opinião: como vê o futuro da indústria do plástico? . . .46
RICARDO GRAÇA
História da Indústria_PLASTICOS_4_17:Layout 1 09-02-2015 13:51 Página 4
5. Numa sociedade essencialmente agríco-
la, em que a fome e a miséria faziam parte da
vida de muitas famílias,quebrar um ciclo que
se arrastava ao longo de gerações era um pa-
pel destinado aos mais audazes.
Àqueles que não se conformavam com a
vida que tinham e que almejavam ir mais além.
Na altura, a alternativa ao trabalho duro
dos campos limitava-se praticamente ao co-
mércio, actividade associada a um certo esta-
tuto social.
A indústria era uma coisa dasAméricas e
a abertura de fábricas,e consequentemente o
contacto com o progresso, era encarada com
desconfiança pelas autoridades.
Foi precisamente a miséria em que a
maior parte da população vivia, numa socie-
dade fechada ao mundo,que alavancou o nas-
cimento da primeira fábrica de alpercatas em
Leiria,quando dois funcionários bancários vi-
ram na proibição de andar descalço uma
oportunidade de negócio.
Atenta ao mercado, a Nobre & Silva ini-
ciaria, uma década mais tarde,o fabrico de pro-
dutos em baquelite,que trouxeram mais qua-
lidade de vida às pessoas.
A rádio era o principal veículo de contacto
com o exterior,de onde chegavam notícias das
descobertas de novos materiais e de novas
possibilidades.
E é numa dessas tertúlias na casa de um
alfaiate,que contrariou o destino ao procurar
o comércio como alternativa de vida,que nas-
ceu uma das fábricas mais emblemáticas da
região de Leiria: a Baquelite Liz.
Homem arrojado e com visão de negócio,
Francisco Clemente inaugura, assim, uma
nova era, ao contribuir de uma forma decisi-
va para que os produtos em plástico alegrem
a casa de muitas pessoas.
O sucesso desta e de outras indústrias de
plástico no País serve de estímulo para que
outros lhes sigam as passadas,em direcção ao
progresso.
Quase 70 anos passados desde que Fran-
cisco Clemente trocou a confecção de fatos
pelo fabrico de artigos em plástico, dois dos
seus netos mantêm o negócio vivo,igualmente
atentos ao que se passa à sua volta.
A abertura de Portugal ao mundo,que deu
um passo de gigante com a entrada do País na
CEE, em 1986, foi mais um passo marcante
nesta indústria, que está hoje repleta de
exemplos de sucesso, a nível mundial.
Homens que, tal como José Nobre Mar-
ques e José Lúcio da Silva (Nobre & Silva),
Francisco Clemente (Baquelite Liz), Filinto
Fernandes (Map), Vasco e Maria Augusta
Ritto (Plásticos Santo António) ou João Rua-
no (João Ruano),ousaram ir mais além e mos-
tar de que fibra são feitos os descendentes dos
navegadores que partiram à descoberta do
mundo séculos antes.
Alexandra Barata
[ 5 ][ P L Á S T I C O ]
AUDÁCIA DESBRAVA
CAMINHO RUMO
AO PROGRESSO
FICHA TÉCNICA
Edição: Jorlis - Edições e Publicações, Lda.
Director: João Nazário
Coordenação: João Nazário
Redacção: Alexandra Barata
Serviços Comerciais: Sandra Nicolau
Design Gráfico: 386design
Paginação: Isilda Trindade, Rita Carlos
Fotografia: Ricardo Graça e Arquivo
Foto capa: Baquelite Liz
Impressão: Ondagrafe, Lda
Tiragem: 16.000
N.º de Registo: 109980
Depósito Legal n.º: 5628/84
Distribuição: Jornal de Leiria, edição n.º 1596,
de 12 de Fevereiro de 2015
A
História da Indústria_PLASTICOS_4_17:Layout 1 09-02-2015 14:25 Página 5
6. Nobre & Silva,Baquelite Liz,Map e
Plásticos Santo António constituem
o grupo de fábricas pioneiras no
sector dos plásticos na região.
Lideradas por homens sem qualquer
ligação anterior a esta indústria,
foram acompanhando a evolução
dos tempos e ainda hoje se mantêm
no mercado,à excepção
da Nobre & Silva
Bancários
de Leiria
constituem
primeira
fábrica
de plástico
do País
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7. Um dos sócios
da Baquelite Liz
foi empregado
da Nobre & Silva
[ 7 ][ P L Á S T I C O ]
BAQUELITELIZ
Fundada em 1927, em Leiria, a Nobre &
Silva é a fábrica de matérias plásticas mais
antiga em Portugal, embora documentos da
época indiquem que só terá começado a sua
actividade neste sector em 1936. Localiza-
da na Rua Capitão Mouzinho de Albuquer-
que, no espaço ocupado até ao ano passa-
do pela Lubrigaz, a empresa foi fundada por
José Nobre Marques e José Lúcio da Silva,
dois funcionários do Banco Nacional Ul-
tramarino.
Autora do livro Os plásticos em Portugal
– A origem da indústria transformadora, pu-
blicado em 2000, Maria Elvira Callapez ex-
plica que os dois empregados bancários co-
meçaram por fazer alpercatas, nas horas li-
vres, com apenas uma máquina.“Na origem
da indústria transformadora de plásticos
em Portugal, para além da satisfação das ne-
cessidades da indústria eléctrica, esteve
também uma imposição legal que obrigava
a população a andar calçada.”
A investigadora cita os historiadores
José Hermano Saraiva e Jorge Barros, auto-
res de O tempo e a alma: itinerário português,
obra editada em 1986, onde referem que tudo
começou, nos anos 30, em Leiria, região litoral
«com grandes zonas arenosas e pinhais na
areia», onde a população «mantinha no
campo o habitat da praia, e não havia argu-
mentos que os convencessem a calçar-se».
“Não se trataria apenas de uma questão de
argumentos, mas sim de carências econó-
micas precárias e indisfarçáveis”, observa
Maria Elvira Callapez.
«(...) As populações rurais, pobres, sem
terra, sem dinheiro e fugindo da miséria dos
campos, dirigiam-se às Câmaras Municipais
para pedir trabalho e pão», revelam os his-
toriadores. É por esse motivo que surge a
proibição de entrar nas povoações descalço,
>>>
História da Indústria_PLASTICOS_4_17:Layout 1 09-02-2015 13:35 Página 7
8. [ 8 ]
afixada em editais camarários. Em Janeiro de
1928, a Liga Portuguesa de Profilaxia Social
inicia, assim, uma «campanha contra o in-
decoroso, inestético e anti-higiénico hábito
do pé descalço», lê-se em O pé descalço –
Uma vergonha nacional que urge extinguir,
obra de 1956, editada pela Liga Portuguesa
da Profilaxia Social, citada pela autora da
tese de mestrado sobre os plásticos em
Portugal.
“Esta campanha de repressão da mendi-
cidade não era mais do que a ocultação de
uma realidade social,de pobreza e miséria em
que se encontram as populações dos campos,
e que a propaganda oficial do regime pre-
tendia encobrir”, acrescenta Maria Elvira
Callapez.A proibição de andar descalço é en-
carada, assim,como uma oportunidade de ne-
gócio por José Nobre Marques e José Lúcio da
Silva, que começaram por se dedicar ao fa-
brico de alpercatas de pano cinzento.
[ P L Á S T I C O ]
Em 1927, constituem a Nobre & Silva,
com o objectivo de fabricar e comercializar
alpercatas e pantufas, apesar de o objecto so-
cial prever a exploração de qualquer outro
ramo da indústria ou comércio. Segundo a in-
vestigadora, o Boletim da Direcção Geral da
Indústria, onde se publicava uma síntese dos
pedidos para instalação de unidades fabris,
dá a primeira notícia da Nobre & Silva em
1939.“Na rubrica sobre condicionamento das
indústrias, pedidos para instalações, é aí re-
ferido textualmente: «Nobre & Silva, para la-
borar com uma prensa hidráulica para fa-
brico de baquelite, sita na Rua Capitão Mou-
zinho de Albuquerque, Leiria»”.
Maria Elvira Callapez defende que um
indicador que poderá confirmar que a No-
bre & Silva começou a sua actividade no sec-
tor dos plásticos, em 1936, prende-se com o
início da fabricação de moldes para plásti-
cos em Portugal. “Historicamente, essa in-
ARQUIVO IMAGEM DO m|i|mo,CML.
Homenagem das freguesias a José
Lúcio da Silva (Nobre& Silva) por ter
oferecido oTeatro à cidade em 1966
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9. [ 9 ][ P L Á S T I C O ]
dústria nasceu em 1936 quando foi fabrica-
do, nessa data, um molde de tampas de ba-
quelite para frascos de perfume produzidos
pela Nobre & Silva.”
Esta campanha
de repressão da
mendicidade não era
mais do que a ocultação
da miséria das populações
dos campos,e que o
regime pretendia encobrir
A autora de Os plásticos em Portugal – A
origem da indústria transformadora refere que
há outras fontes que atribuem o início da ac-
tividade no sector dos plásticos em Portugal à
Sociedade Industrial de Produtos Eléctricos
(SIPE).Fundada em 1935,no Dafundo,por João
Barbosa Corsino, a SIPE fabricava artigos
eléctricos em baquelite.“A Nobre & Silva terá
sido uma das primeiras empresas portuguesas
a fabricar artefactos de borracha e por conse-
guinte pioneira a trabalhar com polímeros na-
turais. (...)Ao converter a sua indústria de bor-
racha à dos plásticos,poderá ser enquadrada,
a par da SIPE, no grupo das primeiras firmas
a laborar em plásticos em Portugal.” >>>
A tese de dissertação de Maria Elvira
Callapez cita a edição de 1931 da revista In-
dústria Portuguesa, órgão da Associação In-
dustrial Portuguesa, que informa que um dos
maiores industriais de alpercatas em Por-
tugal [José Lúcio da Silva] declarou em pú-
blico: «Em 1925, tivemos conhecimento de
que existia em Espanha um novo processo
de fabrico de alpercatas com piso de borra-
cha e, assim, pensámos logo na introdução
desta indústria no nosso País.»
Em O tempo e a alma: itinerário português,
José Hermano Saraiva e Jorge Barros contam
que, mais tarde, um industrial de alpercatas
[José Lúcio da Silva],em visita a Lisboa,viu um
sistema novo de fechar as garrafas:a rolha de
baquelite preta.Foi a Barcelona,obteve o equi-
pamento e,quase como uma alternativa ao fa-
brico de alpercatas, surgiu a primeira «fabri-
queta» de plásticos em Leiria.
A Nobre & Silva, por volta de 1936, di-
versificava assim a sua gama de produtos e
iniciava a sua actividade na indústria de
plásticos, com a produção de rolhas, tampas
e cinzeiros.“Em meados dos anos 40, toda-
via, começa a observar-se uma resistência
à industrialização do país, protagonizada pe-
los seus governantes”, conta Maria Elvira
Callapez.
Quando a indústria de matérias plásticas
chega a Portugal, nos anos 30, o País ainda es-
tava a discutir os princípios da industriali-
zação, refere Maria Elvira Callapez em Os
plásticos em Portugal – A origem da indústria
transformadora. Sem tradição nesta área ou
na área científica, os industriais portugueses
limitavam-se a copiar o que se fazia nos paí-
ses mais desenvolvidos, como a Alemanha, In-
glaterra ou Estados Unidos, com um desfa-
samento temporal considerável.“Aos níveis in-
dustrial e tecnológico, os contributos nacionais
CONTRIBUTO
NACIONAL FOI NULO
foram praticamente nulos.” A investigadora
alerta ainda para a falta de rigor na adopção
da tecnologia.“Ao nível da transformação, não
se respeitavam os preceitos técnicos estabe-
lecidos para lidar com este tipo de materiais,
o que por vezes tinha consequências graves”,
garante. E dá como exemplo o fabrico de tu-
bos para a construção civil, em que se“mistu-
ravam desperdícios de plásticos incompatíveis,
diminuindo consideravelmente a qualidade”.
“Esta situação era uma consequência do ca-
rácter artesanal da indústria nacional”, justi-
fica Maria Elvira Callapez. “A indústria não
possuía nem um quadro de técnicos nem equi-
pamentos adequados que dessem apoio ao
aperfeiçoamento e desenvolvimento das téc-
nicas de fabrico.”
RICARDO GRAÇA
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10. [ 10 ] [ P L Á S T I C O ]
Resistência que, para a investigadora, es-
pelha a “mentalidade não industrial que ca-
racterizava já Portugal desde os anos 30, re-
duzindo-a à situação de país menor, pobre,
sem possibilidades de se afirmar na cena in-
ternacional”. Esta situação conduz à trans-
ferência da Nobre & Silva, com as suas sec-
ções de alparcatas, de matérias plásticas e
oficinas de moldagem e acabamentos, para
Venda Nova, na Amadora, em 1945.
Em meados dos anos 40,
começa a observar-se
uma resistência à
industrialização do país,
protagonizada pelos seus
governantes
AautoradeOsplásticosemPortugal–Aori-
gemdaindústriatransformadoraexplicaqueesta
mudança foi originada por “desavenças com a
Câmara Municipal de Leiria”,com base na obra
de José Hermano Saraiva,onde se lê que a em-
presa «(...) pensava que,visto destinar-se à in-
dústria, lhe deviam vender o quilovátio de
energia por tarifa reduzida;na Câmara enten-
dia-se que quem quer luxos,paga-os,e ser in-
dustrial era (...) uma coisa das Américas.»
Já José Dias Coelho, autor de Génese e ex-
pansão da indústria de plásticos no concelho de
Leiria,obra editada pela Câmara Municipal de
Leiria,em 2001,em homenagem aos industriais
dosplásticos,avançacomoutraexplicação.ANo-
bre & Silva,“durante o ano de 1944,transferiu-
se parcialmente para aVenda Nova,no conce-
lhodaAmadora,dizemqueporasentidadesofi-
Colaboradores e sócios da
Baquelite Liz. Jaime Clemente,
filho do líder da empresa,está do
lado direito,de fato.Início dos
anos 50
BAQUELITE LIZ
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11. >>>
[ 11 ][ P L Á S T I C O ]
ciais em Leiria não lhe terem dado facilidades
no que respeita à expansão”.
Mestre em História Económica e Social
Contemporânea, Dias Coelho refere, em
nota de rodapé, um anúncio da Nobre & Sil-
va no Mensageiro a comunicar a transfe-
rência da sede e instalações industriais
para a Amadora no “intuito de modernizar
e aperfeiçoar os seus processos de fabrico e
de bem servir”. Ali produzia artigos de mé-
nage e brinquedos e, mais tarde, artigos in-
dustriais, sobretudo embalagens.
A propósito da importância da Nobre &
Silva, Maria Elvira Callapez assegura que an-
tes do termo da Segunda Guerra Mundial,
além das oficinas de moldagem e acaba-
mentos de matérias plásticas, a empresa pos-
suía também uma secção de moldes para
consumo próprio. “A esta unidade fabril se
ficou a dever a primeira licença para insta-
lar, em Portugal, uma das principais técni-
cas da indústria de transformação de maté-
rias plásticas, a extrusão”, afirma.“Também
é possível que pela mão da Nobre & Silva ti-
vesse sido introduzida a moldagem por in-
jecção, em 1946.”
A Nobre & Silva pensava
que lhe «deviam vender
o quilovátio de energia
por tarifa reduzida;
na Câmara entendia-se
que quem quer luxos,
paga-os, e ser industrial
era (...) uma coisa
das Américas»
Na década de 40 surgiram novas fábri-
cas de plásticos.“O desenvolvimento da in-
dústria de transformação de matérias plás-
ticas está intimamente ligada à cidade de
Leiria”, afirma Maria Elvira Callapez. Para
tal, contribuiu a criação da indústria de
moldes na Marinha Grande, inicialmente
para peças de vidro, com Aires Roque, e, a
partir de 1936, para plásticos, com o seu ir-
mão Aníbal H.Abrantes,“motivado pelo êxi-
to desta indústria e pelo aparecimento do ba-
quelite em Portugal”.
Em plena Segunda Guerra Mundial, a
casa de Francisco Clemente, um alfaiate
“muito conceituado” de Leiria, era um pon-
to de encontro de diversas personalidades,
de Leiria e da Marinha Grande, como o prior
e o boticário.“As pessoas juntavam-se na casa
do meu avô, porque trabalhava à noite. Fa-
ziam autênticas tertúlias com o rádio ligado”,
conta Jaime Rezola Clemente, 49 anos, ad-
ministrador e director técnico da Baquelite
Liz, empresa fundada pelo seu avô em 1946.
“A alfaiataria era um local de encontro,
porque, nessa época, não havia cafés nem te-
levisão”, justifica Adelino Carvalho, 76 anos,
fundador da Carvalho & Catarro, empresa
fornecedora de equipamentos para a in-
dústria plástica. João Rezola Clemente, 42
anos, administrador e director comercial e fi-
nanceiro da Baquelite Liz, acrescenta que “foi
numa dessas visitas nocturnas que surgiu a
conversa do plástico”.
Pouco tempo depois, nascia a Baquelite
Liz, na Gândara dos Olivais, onde ainda hoje
se mantém em actividade, depois de suces-
sivas ampliações. Adelino Carvalho explica
Álvaro Pires, Filinto Fernandes
e Francisco Clemente
(Da direita para a esquerda) LEIRIENSE PLÁSTICOS
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12. [ 12 ] [ P L Á S T I C O ]
RICARDO GRAÇA
que, apesar de a empresa ser constituída por
três sócios,“o sr. Francisco Clemente era in-
discutivelmente o líder”. ”Tinha a maioria da
sociedade e como sócios o sr. Luís Gonçal-
ves, que foi empregado da Nobre & Silva, e
o sr. Joaquim Abraúl, que negociava em
madeiras”, recorda Álvaro Pires, 83 anos, fun-
dador da Leiriense Plásticos.
“O desenvolvimento
da indústria de
transformação de
matérias plásticas
está intimamente ligada
à cidade de Leiria”
“O sr. Clemente é que desenvolveu aqui-
lo. Viajava pelas feiras a vender plásticos”,
afirma Álvaro Pires. “Nessa altura, já tinha
um carrito para se poder deslocar, mas lem-
bro-me que, quando era alfaiate, ia vender
fatos à Marinha Grande de bicicleta.”
Adelino Carvalho destaca o fundador da
Baquelite Liz como uma das personalidades
mais relevantes na indústria dos plásticos.
“Teve um engenheiro a fazer cálculos du-
rante anos para definir o diâmetro dos tubos
que fabricava para a agricultura e para a in-
dústria”, sustenta.“E tinha um consultor que
fazia cálculos de resistência.”
“O sr. Francisco Clemente disse-me que
teve um concorrente nos tubos de Lisboa, li-
gado à família Champalimaud, que andou
três ou quatro anos a bater o mercado, a ten-
tar convencer as pessoas que os tubos em
plástico eram bons”, conta Adelino Carvalho.
«Quando conseguiu, apareci em força», con-
tou-lhe o fundador da Baquelite Liz.“Por isso
é que costumava dizer que o bom não era ser
o primeiro, mas o segundo. E tinha razão.”
Embora algumas pessoas digam que o
avô começou por fabricar botões, por ser al-
faiate, Jaime Rezola Clemente assegura que
o molde marcado como nº 1 é de um copo,
que foi feito por Aníbal H. Abrantes, amigo
João e Jaime Rezola Clemente,
constituem a terceira geração
da Baquelite Liz
História da Indústria_PLASTICOS_4_17:Layout 1 09-02-2015 11:59 Página 12
13. [ 13 ][ P L Á S T I C O ]
>>>
de Francisco Clemente. Nos anos 50, pro-
duziam tampas com rosca para frascos
em vidro, e outros artigos domésticos. “A
empresa teve um grande crescimento nos
primeiros cinco anos.”
O fundador da Carvalho & Catarro
confirma que a indústria de plásticos,
sendo nova, tinha margens de crescimen-
to grandes.“O sr. Francisco Clemente con-
tou-me que, com 40 contos de matéria-
prima, tinha facturado 400 contos de rolhas
para a indústria de vidros.” Os vendedores,
como trabalhavam em regime livre, eram
determinantes para o sucesso dos negó-
cios. “Eles próprios procuravam o que se
estava a vender bem e diziam aos indus-
triais.”
A Baquelite Liz teve
um engenheiro a fazer
cálculos durante anos
para definir o diâmetro
dos tubos que fabricava
e tinha um consultor
que fazia cálculos
de resistência
Jaime Rezola Clamente garante que a
Baquelite Liz foi pioneira na introdução de
novos produtos em Portugal, ao importar as
modas que eram lançadas nas feiras inter-
nacionais, a partir do final dos anos 50. “Du-
rante muito tempo,fabricávamos todo o tipo
de produtos e fizemos sempre questão de es-
tar na linha da frente em termos tecnológi-
cos: injecção, compressão, extrusão, sopro,
extrusão de filme (sacos de plástico), ca-
landragem (tela e linóleo) e calçado.”
O administrador da Baquelite Liz
adianta que, com o aumento da concor-
rência, nos anos 60, começaram a fazer
uma gama de produtos de maior dimensão.
Nessa fase, o pai, Jaime Clemente, já tra-
balhava na empresa. Licenciado em En-
genharia Química, tinha uma especializa-
ção na área dos plásticos em Inglaterra. No
final dos anos 60, início dos anos 70, co-
meçaram a especializar-se em plásticos
para a indústria (caixas) e construção ci-
vil e regas (tubos de água).
O meu pai foi o primeiro industrial
do País a fabricar preservativos
em latex. Quando Salazar soube,
mandou selar as máquinas. Mas o
meu pai ainda conseguiu
comercializar alguns. Na altura,
não havia laboratórios para testes.
Eu era um garoto.
Luís Ruano, 67 anos,
filho do fundador da João Ruano
“Dos primeiros moldes que fiz
para plásticos na Edilásio
Carreira da Silva foi para a Bic.
Isto aconteceu há mais de 60 anos.
O sr. Bic e o sr. Laforest eram
companheiros na Segunda Guerra
Mundial. O sr. Laforest propôs ao
sr. Bic, que era rico, investir na
esferográfica para substituir as
canetas de tinteiro. O sr. Bic
aceitou desde que a esferográfica
se passasse a chamar Bic. E assim
foi. As pessoas diziam: «traga-me
aí uma Bic””.
Joaquim Matos, 82 anos, fundador da Plimat
Um dia, fui visitar um cliente
espanhol com o meu agente, em
Madrid. Levava luzes de
emergência para vender. Quando
o cliente perguntou onde é que o
produto tinha sido feito, o meu
agente respondeu na Alemanha.
“Vê-se logo pelo peso”, respondeu
o cliente. Quando soube que,
afinal, tinha sido fabricado em
Portugal, já não quis comprar.
Armando Lopes, 78 anos, fundador
da AL - Fábrica de Material Eléctrico
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14. [ 14 ] [ P L Á S T I C O ]
De regresso a 1946, surge no mercado a
Matérias Plásticas (Map), fundada por Filinto
Fernandes e por João Ruano.“O meu pai tinha
experiência comercial.Era dono de uma loja de
fazendas.Na altura,o comércio era muito im-
portante”, assegura Rui Filinto,66 anos,já que
a indústria despontou sobretudo após a Se-
gunda Guerra Mundial [1939-1945]. Luís
Ruano,67 anos,filho do outro sócio fundador
da Map, explica que o pai foi convidado a en-
trar na sociedade devido aos seus conheci-
mentos técnicos. Filinto Fernandes era o só-
cio capitalista.
Rui Filinto considera queAníbal H.Abran-
tes foi determinante para o desenvolvimento da
indústriadeplásticosemPortugal.“Viajavamui-
to pela Europa e trazia artigos em plástico que
iaofereceraosindustriaisemfunçãodoseuper-
fil”, afirma.“Aníbal H.Abrantes teve um papel
muito importante,ao despertar o interesse pe-
los produtos em plástico.”Aliás, considera que
a indústria de moldes foi crucial para a indús-
tria de plásticos, porque sem bons moldes não
havia bons plásticos. “Eram pessoas determi-
nadas e obsessivas em fazer bem.”
“Além do mercado ser potencialmente
enorme, no pós-guerra havia mais poder eco-
nómico. Deu-se um autêntico boom”, explica o
filho do fundador da Map. Os “frascos e fras-
quinhos”, mais finos e mais baratos, substituí-
ram o vidro.E havia os pentes e os produtos uti-
litáriosdomésticos,comoregadoresebacias,que
“custavammeiadúziadetostões”ecaíamaochão
e não se partiam. “Até à primeira crise do pe-
tróleo, em 1973, a indústria cresceu exponen-
cialmente. Ganhou-se muito dinheiro.”
A autora do livro Os plásticos em Portu-
gal – A origem da indústria transformadora diz
que, na década de 50, quando surgiram as ti-
gelas, baldes e bacias de polietileno, as do-
nas de casa passaram a exibir nas suas co-
zinhas as tigelas de plástico coloridas, ao in-
Rui Filinto sucedeu ao pai,
Filinto Fernandes,à frente
da Map
ARQUIVO/JL
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15. [ 15 ][ P L Á S T I C O ]
vés das velhas canecas de zinco cinzentas.
“Dos quintais desapareceram progressiva-
mente as selhas das lavadeiras, tendo sido
substituídas pelas bacias de plástico leves e de
aparência agradável”,afirma a investigadora.“A
partir daqui,os objectos de plástico foram mar-
cando a sua posição na vida quotidiana dos
portugueses.” De entre esses artigos desta-
cam-se louças, talheres; pentes e travessas
para o cabelo; objectos para toilette; botões;
caixas e recipientes.
“Osvendedores,como
trabalhavamemregime
livre,procuravamoquese
estavaavenderbeme
diziamaosindustriais”
A Map começou por fabricar pratos,copos
e cinzeiros em melanina. “O plástico copiava
tudo: o vidro e a cerâmica”, explica Rui Filinto.
Só a partir de 1974, com a sua entrada na em-
presa é que se especializarem em artigos de
casa-de-banho. ”Deu-se uma explosão tecno-
lógica e a proliferação de materiais.As empre-
sas ou se especializavam ou diversificavam.”
“Entrámos nos artigos de casa-de-banho.
Este era um assunto quase tabu. Vivíamos
numa economia fechada”, justifica Rui Filinto.
“Nãosefalavaembelezanememdecoração.Era
um conceito novo, associado à imagem de hi-
giene e modernidade. Liderámos o mercado.”
A estratégia da Map passou,assim,por tra-
var o investimento nos sectores em que havia
muitaconcorrênciaparainvestirnumsectorpio-
neiro em Portugal.“Desinvestir era como per-
der a honra,não era um acto de gestão”,recor-
da. Mais tarde, com a entrada na Comunidade
Económica Europeia (CEE) e a abertura dos
mercados,como passou a ser possível a impor-
tação de plástico e outros materiais,criou outra
área de negócio:os produtos técnicos.A entra-
da no grupo Key Plastics e a construção de uma
fábrica nova,na Barosa,já faz parte da história
recente.
MariaElviraCallapezrefereque,nofinalda
década de 60,um estudo do Centro Nacional do
Comércio Externo de França sobre a indústria
de plásticos portuguesa incluía a Nobre & Sil-
va, a Baquelite Liz,a Map e ainda a Plásticos de
SantoAntónio,no“grupo das grandes”,pela di-
versidade de produtos fabricados, bom equi-
pamento e dinamismo. Nesta lista constavam
ainda as Fábricas Hércules e Luso Celuloide de
Henriques & Irmão, localizadas em Espinho.
António Ritto, 79 anos, revela que os pais,
Vasco e Maria Augusta Ritto, iniciaram o pro-
cesso de constituição da Plásticos SantoAntó-
nio em 1943, mas só começaram a laborar 12
anos depois, em 1955. Sócio-fundador da Lu-
brigaz,VascoRittoeraumtécnicocomapetência
pelas áreas da mecânica e eléctrica.“Costuma-
vam contactá-lo quando havia avarias nos pro-
jectores do cinema.”
Quando Vasco Ritto se apercebeu que os
plásticoseramumramoquedeviaterfuturoco-
meçou a fazer um curso por correspondência
sobreapartetécnicadaindústria,comumaem-
presa americana. “Correspondia-se também
com a ICI – Imperial Chemical Industries, em
Inglaterra,através da troca de cartas.O meu pai
colocava questões e eles respondiam”, explica
António Ritto.
Paraadquirirastrêsmáquinascomqueini-
ciouaactividade,contoucomocontributodafa-
mília e recorreu ao BNU. Os moldes dos pri-
meiros produtos foram feitos na Marinha
Grandeporumaumafirmaquetrabalhavapara
aindústriadevidros,comaqualopaitinhabom
relacionamento: a Edilásio Carreira da Silva.
Mais tarde,Vasco e Maria Augusta Ritto che-
garam mesmo a acompanhar o empresário de
moldes a feiras e em visitas a clientes,para lhe
dar apoio na língua e tecnicamente.
“Entrámosnosartigos
decasadebanho.
Esteeraumassuntoquase
tabu.Vivíamosnuma
economiafechada”
“O meu pai ia todos os anos a feiras téc-
nicas e de equipamentos para plásticos em
Paris (França), Birmingham (Inglaterra), Mi-
lão (Itália) e Dusserdorf (Alemanha)”, asse-
gura António Ritto. “Aproveitava para visitar
lojas para trazer ideias para produtos”, como
brinquedos. “Antes faziam-se baldes e bar-
quinhos em chapa metálica.Chegavam à água
e afundavam-se logo. O mercado tinha ne-
>>>
História da Indústria_PLASTICOS_4_17:Layout 1 09-02-2015 12:01 Página 15
16. Miguel e António Ritto,
da Plásticos Santo António,
empresa que se especializou
no fabrico de embalagens
RICARDO GRAÇA
[ 16 ] [ P L Á S T I C O ]
cessidade desse tipo de artigos em plástico.”
AntónioRittorecordaqueaossábadosedo-
mingos iam para a empresa fazer algumas pe-
ças.“As pessoas com dificuldades do Bairro das
Almoínhas juntavam-se à porta a pedir
trabalho”, conta. “O encarregado seleccio-
nava as que tinham mais jeito para pintar e
colar e depois pagava-lhes.”
O fabrico de brinquedos foi abando-
nado no início dos anos 70. Miguel Ritto, 53
anos, filho de António Ritto, explica que em
Portugal fabricavam-se brinquedos básicos,
mas no Japão, na China (Hong Kong) e na
Alemanha começaram a surgir brinquedos
com pilhas e motores, que faziam ruído.“O
investimento que representava em moldes
e em tecnologia não se justificava porque
praticamente não exportávamos”, justifica.
“Além disso, os brinquedos também envol-
viam muita mão-de-obra a montar e a
pintar.”APlásticosSantoAntóniomanteve,con-
tudo, o fabrico de utilidades domésticas, cabi-
des e embalagens.Atenta ao mercado,a fábri-
ca de Leiria procurou acompanhar o desen-
volvimento da indústria de confecção em Por-
tugal, através da produção de mais de 35 mo-
delos de cabides, que eram vendidos no País
todo.
Tal como o fundador da Carvalho & Ca-
tarro, António Ritto diz que eram os próprios
vendedores a recomendar aos industriais os
artigos a fabricar, porque se vendiam mui-
to, o que acabava por constituir um incen-
tivo à cópia. ”Nos anos 60, devia haver na
zona algumas 50 ou 60 fábricas de plástico.
Uns iam-se copiando aos outros.”
“Houve uma receptividade muito gran-
de dos consumidores para as utilidades do-
mésticas”, recorda António Ritto.“Em qual-
quer casa havia alguidares de lata ou em bar-
ro. Quando apareceu o plástico, leve, fácil de
lavar e com outras cores, foi um sucesso.”
História da Indústria_PLASTICOS_4_17:Layout 1 09-02-2015 12:01 Página 16
17. PLÁSTICOS SANTO ANTÓNIO
MariaAugustaeVascoRitto(à
esquerda)comEdilásioCarreira
daSilvaeamulherduranteumavisita
àICI,emInglaterra(1955)
“Antesfaziam-sebaldes
ebarquinhosemchapa
metálica.Chegavam
àáguaeafundavam-se
logo.Omercadotinha
necessidadedessetipo
deartigosemplástico”
Face a este entusiasmo,a ideia de ter um ne-
gócio rentável levou muitas pessoas a montar fá-
bricas de plásticos.“Em resposta ao sucesso al-
cançado e generalização do consumo,houve um
aumento significativo do número de estabeleci-
mentos industriais, passando de dois em 1937,
para 34 em 1947,atingindo-se 45 em 1956”,con-
firma Maria Elvira Callapez.Contudo,nem todos
conseguiamsobreviver.MiguelRittodizquecomo
o mercado era muito pequeno e era difícil
amortizar o investimento no molde,houve mui-
tas empresas que abriram e,passados uns anos,
fecharam.
Na tentativa de se diferenciar, em 1971, a
Plásticos SantoAntónio comprou uma máquina
de 900 toneladas de força,para fabricar peças de
grandes dimensões, como embalagens. “Era a
maior que havia em Portugal.Tanto que nos pe-
diam para vir ensaiar moldes para mandarem
para o estrangeiro”, conta António Ritto.“Assim
eramaisdifícilcopiar,porqueerampoucososque
podiam investir em máquinas e moldes dessa di-
mensão.”
Dois anos depois,dá-se o choque petrolífe-
ro, que originou um período de recessão econó-
mica mundial.“O impacte imediato traduziu-se
na subida elevada dos preços das matérias-pri-
maseprodutosfinais.Estaalteração,aliadaapro-
blemas de sobrecapacidade e mercados satura-
dos,originouquebrasdeproduçãoelucroseuma
maior lentidão nos avanços tecnológicos”,expli-
ca Maria Elvira Callapez.
Esta situação obrigou os industriais a adap-
tarrapidamenteospreços,sobpenadeseremar-
rastados para o fundo do poço.António Ritto re-
corda-se bem deste período.“Lembro-me da mi-
nha mãe ligar a um sábado aos agentes para não
venderem nem mais uma peça até receberem a
nova tabela de preços. Se não fosse assim, não
chegava para pagar a matéria- prima.”Adelino
Carvalho acrescenta que,a partir de então,“a in-
dústria passou a ter de olhar mais para a gestão”.
[ 17 ][ P L Á S T I C O ]
História da Indústria_PLASTICOS_4_17:Layout 1 09-02-2015 12:02 Página 17
18. [ 18 ] [ P L Á S T I C O ]
As empresas que
surgiram nas décadas
seguintes também
deixaram as suas marcas
na história pelo arrojo e
determinação, numa fase
ainda experimentalista,
em que a cópia de artigos
em plástico fazia parte
do dia-a-dia. Algumas
consolidaram a sua
posição ao longo dos anos
e estão hoje entre as
melhores do mundo.
RICARDO GRAÇA
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 14:13 Página 18
19. [ 19 ][ P L Á S T I C O ]
CÓPIA DE ARTIGOS
EM PLÁSTICO
ATRAVESSA
DÉCADAS
Apesar de só ter constituído a João Rua-
no, em Leiria, em 1954, a ligação deste em-
presário espanhol à indústria dos plásticos
remonta aos anos 40. Luís Ruano, 67 anos,
conta que o pai veio para Portugal para fu-
gir da Guerra Civil [1936-1939], por suges-
tão do cunhado, Luís Grandela, proprietário
dos antigos armazéns Grandela, no Chiado,
em Lisboa.“Disse-lhe para virem todos para
Portugal e assim foi. O meu pai veio com uma
mão à frente e outra atrás.”
Para evitar ser repatriado por ter fugido
à guerra, João Ruano casa-se com Beatriz e
estabelece-se em Lisboa, onde cria, nos
anos 40, a fábrica de borracha Rubia (Ru de
Ruano e bia de Beatriz) com o cunhado, em-
presa que mais tarde transfere para Leiria
para se aproximar da indústria de moldes.
Em Génese e expansão da indústria de plás-
ticos no concelho de Leiria, o autor refere que
Luís Grandela era o sócio capitalista e João
Ruano o técnico e que produziriam bonecas
em pasta de papel e manequins.
Uma das inovações que
João Ruano introduziu
no mercado português
foi uma galinha que
punha ovos de plástico.
“Ganhou rios de dinheiro.
Chamavam-lhe a galinha
dos ovos de ouro”
Luís Ruano diz que além de ter “uma ha-
bilidade de mãos extraordinária”, o pai tinha
tirado um curso de transformação de plás-
ticos por correspondência nos Estados Uni-
dos. “O meu pai foi o primeiro a transformar
plásticos no País.” Em 1946, aceita o convite
de Filinto Fernandes para constituir a Ma-
térias Plásticas (Map), onde João Ruano as-
segurava a parte técnica.
”O meu pai tinha ideias e gostava de fa-
zer outras coisas e conseguiu que, em 1954,
os sócios [Filinto Fernandes tinha dado par-
te da quota à irmã] o autorizassem a abrir
uma fábrica nova, a João Ruano, que era do
mesmo sector mas não era concorrente”, con-
ta. “Fazia brinquedos e ainda brindes para a
Farinha Amparo.”
“O carro chegava a
viajar inclinado com o
peso dos moldes.Toda a
gente via. O que valia é
que o meu pai tinha
amigos despachantes
emVilar Formoso”
Luís Ruano garante que o pai chegou a
projectar uma máquina de injecção e sopro,
só que, como não tinha dinheiro, não foi para
a frente.“Era um técnico que gostava de su-
jar as mãos.” Uma das inovações que João
Ruano introduziu no mercado português
foi uma galinha que punha ovos de plástico.
“Ganhou rios de dinheiro. Chamavam-lhe a
galinha dos ovos de ouro”, conta.“A João Rua-
no está para os plásticos como a Aníbal H.
Abrantes está para os moldes.”
Com a crise nos plásticos, provocada pelo
choque petrolífero de 1973, João Ruano co-
meçou a fazer concorrência à Map, empre-
sa de onde acabou por sair.Abriu, então, em
Madrid a Plásticos Ruano, fábrica de artigos
sanitários. Os moldes da João Ruano iam a
Espanha, faziam uma produção, e volta-
vam. “Aos 17 anos, fiz 52 viagens a Madrid
>>>
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:21 Página 19
20. [ 20 ] [ P L Á S T I C O ]
sem ter carta de condução, mas apenas li-
cença de aprendizagem”, recorda Luís Rua-
no. “Ia a conduzir para poupar o meu pai.”Ao
fim de dez anos, a empresa era líder no mer-
cado espanhol de artigos sanitários.
“O carro chegava a viajar inclinado com
o peso dos moldes. Toda a gente via. O que
valia é que o meu pai tinha amigos despa-
chantes emVilar Formoso [fronteira]”, con-
ta Luís Ruano. “Os guardas iam lá comer à
mão”, revela.
Além disso, João Ruano ia duas vezes por
ano a outras países da Europa de carro, para
ver o que se estava a fazer na área dos plás-
ticos e trazer artigos que não existiam em
Portugal. “Se lançássemos um produto e ti-
vesse sucesso, três meses depois já nos es-
tavam a copiar.A seguir iam apresentar aos
nossos clientes a um preço mais baixo.” Luís
Ruano assegura que, nos anos 60, também
era prática comum roubar os técnicos uns
aos outros. “Foi quando se deu o boom nos
plásticos. Fazia--se muito dinheiro.”
Localizada nas antigas instalações do
Bingo, na Rua Capitão Mouzinho de Albu-
querque, a João Ruano já não tinha espaço
para crescer e os moradores queixavam-
-se do barulho das máquinas. Mudou-se para
a Barosa em 1980, onde iniciou o fabrico de
embalagem plásticas para o acondiciona-
mento de tintas, que passou a ser o seu ne-
gócio principal. “Abandonámos o tubo para
a construção civil e os sacos e filmes para a
agricultura, mas mantivémos os brinquedos.”
“Se lançássemos um
produto e tivesse
sucesso, três meses
depois já nos estavam
a copiar. A seguir iam
apresentar aos nossos
clientes a um preço
mais baixo”
Após muita insistência de um agente an-
golano, Luís Ruano abriu uma fábrica de
plásticos em Angola, que esteve a funcionar
entre 1971 e 1975. “Foi um sucesso porque
não havia lá a tecnologia que levei. Nunca
ganhei tanto na minha vida”, recorda. Para
tal, contribuiu uma encomenda do Jumbo de
milhares de bolas, que foram oferecidas aos
clientes do supermercado durante a cam-
panha de lançamento, e que foram “pagas a
peso de ouro”.“Mais tarde, o governo de An-
gola chamou-nos para lá irmos pôr aquilo a
funcionar outra vez, mas não garantiam
condições de segurança.”
O desmoronamento das fábricas de João
Ruano dá-se pouco depois.A unidade de Ma-
drid é vendida na sequência da morte do fi-
lho Artur. O outro filho, João, que dirigia a em-
presa, volta para Portugal. Entretanto, a
João Ruano é ultrapassada por uma firma
concorrente, a VDS, nas tintas, apesar de
manter a liderança nas embalagens para pro-
dutos alimentares.“Tentámos arranjar um só-
cio capitalista para adquirir equipamentos.
Quando demos por isso, não tínhamos fá-
Luís Ruano afirma que“a João
Ruano está para os plásticos
como a Aníbal H.Abrantes
está para os moldes”
>>>
RICARDOGRAÇA
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:27 Página 20
21. [ 21 ][ P L Á S T I C O ]
Luís Ruano não esquece o período em que
foi presidente daAssociação Portuguesa da In-
dústria de Plásticos (APIP) na zona centro.
“Quando havia reuniões para acordar preços
para comercializar os produtos,pegavam-se to-
dos”, recorda.“Estávamos horas a serrar pre-
sunto até atingir consenso.” O fillho do funda-
dor da João Ruano conta que, um dia, tinham
acabado de chegas a acordo para preços da ta-
bela de filmes,quando um dos industriais dis-
se que não abdicava de alguns clientes por pre-
ço nenhum.“Demiti-me no dia seguinte.Só se
reuniam para acordar tabelas de mercado e os
contratos colectivos de trabalho,mas não cum-
priam nada.”
Armando Lopes, fundador da AL - Fábri-
ca de Material Eléctrico, confirma que os in-
dustriais se encontravam para acordar preços
e que,numa dessas reuniões,se combinou ven-
der a matéria-prima a 7,5 escudos por kg.
“Cheguei a uma empresa e o senhor disse-
-me que arranjava mais barato.Estranhei e ele
foi buscar uma factura. Em cada 100 kgs ofe-
reciam 10 kgs! Indirectamente,estavam a fazer-
-lhe 10% de desconto.”
Alémdeacordarempreços,ÁlvaroPiresre-
fere que incentivava a ocorrência de reuniões
de fabricantes de filme,a nível nacional,para se
conheceremunsaosoutros.“Comoandavasem-
pre na estrada dava jeito ter alguém a quem re-
REUNIÕES
ATRIBULADAS
correr se tivesse um acidente”, justifica.
Quanto aos acordos relativos a preços por
kg ou quantidade, o fundador da Leiriense
Plásticos diz que era frequente serem desres-
peitados. “Quando os clientes sabiam que não
haviaentendimentoentreconcorrentesjogavam
comisso.Diziamaumqueooutrofaziamaisba-
rato para conseguirem preços mais baixos.Tí-
nhamos de evitar que isso acontecesse.”
Dequalquerforma,voltaemeia,láhaviain-
cidentes.Álvaro Pires conta que a Lever queria
comprar um determinado cesto. “Dei a volta à
Europa à procura de um cesto e levei-o lá para
elesverem.”Aprovadoomodelo,oindustrialpe-
diuaEmídioMariadaSilvaparalhefazeromol-
de. Contudo,face a uma atitude suspeita,disse-
-lhe que tinha mudado de ideias e que,afinal,já
não ia fazer.
“Fui ao Ruivo e pedi-lhe para me fazer o
molde rapidamente, independentemente do
preço.Trabalharam noite e dia”,afirma.“Assim
quetinhaumbocadinhodeinjecçãodocesto,ar-
rancava para Lisboa para o ir mostrar. Depois,
mostravaumbocadinhomaior.Atéterocestofei-
to. Cheguei a ir três vezes a Lisboa num dia”,as-
segura.
As suspeitas confirmaram-se.“O Emídio fi-
couzangadíssimocomigo,porqueoqueeleque-
ria era fazer os dois moldes:para mim e para a
Baquelite Liz,mas o nosso molde é que acabou
por ser aprovado.A primeira encomenda foi de
100 mil cestos.” De qualquer forma, como pre-
tendia garantir regularidade no fornecimento,a
Lever tinha posto como condição que quem ga-
nhasse a encomenda autorizava o concorrente
a copiar o molde. E assim foi.
RICARDO GRAÇA
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:27 Página 21
22. [ 22 ] [ P L Á S T I C O ]
brica, não tínhamos dinheiro, não tínhamos
nada”, lamenta Luís Ruano.“Esse sócio levou
à falência a João Ruano e uma série de ou-
tras empresas. Comprava sempre 51% do ca-
pital e dizia que injectava capital, mas nun-
ca o fazia.”
Tentámos arranjar um
sócio capitalista para
adquirir equipamentos.
Quando demos por isso,
não tínhamos fábrica,não
tínhamos dinheiro,não
tínhamos nada
Álvaro Pires, 83 anos, não sabe precisar
com exactidão se teria 24 ou 25 anos quan-
do criou a Leiriense Plásticos. Mas recorda-
-se bem da conversa que teve com Aníbal H.
Abrantes, com quem se foi aconselhar antes
de dar esse passo.“Disse-me que era um ne-
gócio interessante e que ia ganhar muito di-
nheiro, mas que os primeiros dois anos, até
ter clientes, iam ser difíceis, porque os mol-
des eram caros. Confirmou-se.”
“Lembro-me de ir ao banco e de me di-
zerem que mil contos mal dava para a cova
de um dente. A primeira máquina com que
comecei a trabalhar era usada e custou-me
14 contos. Foi sempre a investir”, assegura Ál-
varo Pires.“Os ordenados aumentavam e eu
comprava mais uma máquina para produzir
mais e cobrir os aumentos. Nunca punha di-
Álvaro Pires aconselhou-se
com Aníbal H. Abrantes
antes de abrir a Leiriense Plásticos
RICARDO GRAÇA
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:27 Página 22
23. [ 23 ][ P L Á S T I C O ]
nheiro de lado”, afirma. “Qualquer indus-
trial se não estiver constantemente a in-
vestir, acaba por morrer.”
“Na altura, não se podia
importar nada, mas
como eu tinha um
amigo na Alfândega,
mandava-lhe um
telegrama a dizer a que
horas chegava ao
aeroporto,e não me
levantavam problemas”
Enquanto outros fabricantes de plás-
ticos sabiam das novidades do que se fa-
zia lá fora através de Aníbal H. Abrantes,
Álvaro Pires preferia ser ele a viajar.
Portador do Passaporte nº 34, apanhava o
avião ao domingo à noite, para rentabili-
zar o tempo, e aproveitava o dia para fa-
zer visitas. “Numa semana, dava a volta à
Europa. Trazia muitos produtos para fa-
zer cópias cá. Raramente inventava al-
guma coisa.”
“Era conhecido pelo dragão da vio-
lência, porque ia sempre à procura de coi-
sas novas e estava sempre a apresentar
novidades”, revela o fundador da Lei-
riense Plásticos.“Na altura, não se podia
importar nada, mas como eu tinha um
amigo na Alfândega, mandava-lhe um
telegrama a dizer a que horas chegava ao
aeroporto, e não me levantavam proble-
mas.” O mais curioso é que não sabia uma
única palavra de Inglês e francês mal fa-
lava. “Com a ajuda de gestos, lá me de-
senrascava.”
Aníbal H.Abrantes foi o primeiro for-
necedor de moldes de Álvaro Pires, porque
se estava sempre a modernizar e tinha bons
equipamentos. Mas como “demorava mui-
to a fazer as entregas”, encomendava tam-
bém a outras empresas, como a Emídio Ma-
ria da Silva, que “demorava menos, mas
também falhava muito”, e ao Ruivo, que ti-
nha uma oficina.
A Leiriense Plásticos fazia utilidades
e brinquedos, mas também fabricava sa-
cos e mangas para a agricultura, para se
tentar diferenciar dos outros.“Comecei do
zero, ultrapassei todas as empresas e che-
guei a ser o número um. Mas também cor-
ria o País todo”, assegura.“O pai do Presi-
dente da República Prof. Cavaco Silva foi
o meu primeiro cliente de sacos para ra-
ções. Arranjei uma lista de empresas de ra-
ções e escrevi a todas. Ele foi um dos que
me respondeu”, recorda. “Fui ao Algarve
expressamente por causa disso. Vendi-
-lhe cinco mil sacos. Era uma encomenda
pequena, mas como estava a começar não
podia recusar negócios.”
Com a “saída amigável” do sócio com o
qual fundou a empresa, “os comentaristas
de café, que não sabiam fazer nada, diziam
que eu não me aguentava, pois o pai dele é
que tinha fortuna”, conta Álvaro Pires.
“Cheguei a ter a fama do homem mais rico
de Leiria como a do homem mais pobre ou
falido. Por isso, disse ao sr. Rebelo, do BNU,
para não acreditar nem no que lhe dizia
nem no que os outros lhe diziam, mas no
que via.”
“O pai do Presidente da
República Prof. Cavaco
Silva foi o meu primeiro
cliente de sacos para
rações. Arranjei uma
lista de empresas e
escrevi a todas.Ele foi um
dos que me respondeu”
Como o fundador da Leiriense Plásti-
cos era conhecedor do mercado e dos clien-
tes de Norte a Sul do País, nunca teve difi-
culdades. O tempo veio dar-lhe razão e pro-
var que o gerente bancário podia confiar
nele. “Procurava sempre qualidade.”
Álvaro Pires acabaria por vender a
empresa há cerca de 20 anos a empresários
do Norte. Nessa altura, fazia mangas para
a agricultura, sacos para adubos, rações e
supermercados, e filme técnico.
Aos 82 anos, Joaquim Matos, fundador
da Plimat, faz questão de passar todos os
dias nas quatro empresas do grupo Matos.
Com uma vasta experiência profissional, o
empresário da Marinha Grande tem no seu
>>>
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:28 Página 23
24. [ 24 ] [ P L Á S T I C O ]
currículo a produção do primeiro molde da
Aníbal H.Abrantes: uma boneca que foi ex-
portada para Inglaterra. “Demorou nove
meses a fazer. Fiz a cabeça, os braços e as
pernas e o José Feliciano, da Somema, fez o
corpo.” Empenhado em que o molde ficas-
se o mais parecido possível com uma crian-
ça, Joaquim Matos diz que estudava anato-
mia e recebia lições de um amigo que andava
a estudar pintura em Lisboa
A sua passagem por diversas empresas
de vidros e de moldes, primeiro como ope-
rário e, mais tarde, como industrial, deram-
-lhe um profundo conhecimento do merca-
do, que o levou a acreditar que “o futuro dos
plásticos era mais promissor do que o futu-
ro dos moldes”. Em 1978, constituiu, assim,
a Plimat, com o irmão Arnaldo Matos.“Como
tínhamos a fábrica de moldes [Molde Matos],
verificámos que enquanto o prazo do mol-
de acabava ali, o artigo produzido pelo mol-
de durava muitos anos, tal como o lucro.”
Joaquim Matos dá como exemplo o pri-
meiro molde que Edilásio Carreira da Silva
fez para a Plásticos Santo António: uma jar-
ra de flores, que custou três ou quatro con-
tos. “Com a venda do produto, a Plásticos
Santo António ganhou dezenas de milhares,
ao ponto de lhe dar para pagar a fábrica”, re-
vela. “O meu tio Edilásio vendia-lhes moldes
por dez contos e eles faziam 100 mil contos
com a venda dos produtos.”
Joaquim Matos fez o primeiro
molde para plásticos do País
RICARDO GRAÇA
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:28 Página 24
25. [ 25 ][ P L Á S T I C O ]
>>>
“Como tínhamos
a fábrica de moldes
[Molde Matos],
verificámos que
enquanto o prazo
do molde acabava ali,
o artigo produzido pelo
molde durava muitos
anos,tal como o lucro”
Apesar disso, os primeiros tempos da
empresa de acessórios de canalização não
foram fáceis. “Arrancámos com um mode-
lo. Corri o País todo e ninguém o comprou”,
conta. Rapidamente percebeu que o pro-
blema era ter apenas uma medida, quan-
do para fazer uma canalização eram ne-
cessários quatro ou cinco. “Não consegui
vender porque não tinha uma gama com-
pleta. Começámos então a fazer mais pe-
ças e mais variedade.”
Entrar num nicho de mercado onde ti-
nha pouco know how obrigava a um con-
tacto próximo com os especialistas no sec-
tor: os canalizadores.Além de os ter de con-
vencer da vantagem de utilizar os seus pro-
dutos, Joaquim Matos procurava saber do
que necessitavam e quais os problemas que
tinham, para lhes poder apresentar solu-
ções.
Outra tarefa habitual para os indus-
triais de plástico passava por se desloca-
rem aos países mais evoluídos e trazerem
produtos que pudessem ser fabricados em
Portugal. Sob o pretexto de que estava a
tentar vender moldes, Joaquim Matos
conta que visitou diversas fábricas ingle-
sas de acessórios para tentar perceber
como faziam uma peça para canalização,
durante uma missão de 'espionagem in-
dustrial'. “Não consegui vender nenhum
molde, mas consegui ver como faziam.”
Encontrar matéria-prima de quali-
dade foi outra dificuldade que a Plimat
sentiu numa fase inicial. “Quando come-
cei a vender em força, a matéria-prima não
era de qualidade e as peças partiam-se. Foi
um autêntico desastre”, lembra Joaquim
Matos. “Devolveram-nos cinco toneladas
de material estragado. Já não tínhamos
muitos clientes e ainda ficámos com me-
nos. Mas, com o passar do tempo, lá fomos
recuperando.” Mesmo assim, ainda de-
moraram alguns anos a substituir as pe-
ças todas.“Havia qualquer problema e éra-
mos chamados. Íamos logo lá. Fizemos de-
zenas de viagens.”
Hoje, a realidade é completamente di-
ferente.“Se um produto não é certificado não
pode entrar numa obra pública. No estran-
geiro é assim há mais anos”,assegura o fun-
dador da Plimat.Refere,contudo,que há paí-
ses que não reconhecem a homologação do
Laboratório Nacional de Engenharia Civil
(LNEC).“Temos certificação de laboratórios
de outros países e de clientes que vêm cá to-
dos os anos fazer auditorias. É uma garan-
tia da qualidade dos nossos produtos.”
Além do investimento permanente
em tecnologia, não só para estar na van-
guarda do conhecimento como para redu-
zir o consumo de energia, estar na linha da
Joaquim Matos começou
por constituir
uma empresa de moldes,
a Molde Matos,em 1968
PLIMAT
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:28 Página 25
26. [ 26 ] [ P L Á S T I C O ]
frente neste sector implica ainda fabricar pro-
duto com um prazo de duração de 50 anos
(60 anos, no caso da Alemanha).“Fazemos a
simulação em fornos de envelhecimento e
testamos os produtos em tanques de reben-
tamento, onde são submetidos a diferenças
de temperatura”, revela.Além disso, de duas
em duas horas as peças são retiradas da má-
quina para serem submetidas ao controle de
qualidade, para que a empresa possa cum-
prir as normas de segurança.
“Sou o melhor de Portugal e um dos me-
lhores da Europa em qualidade”, garante o
fundador da Plimat.“Basta dizer que temos
clientes alemães, belgas, franceses e ingle-
ses”, justifica. “Só não trabalhamos com a
América porque as regras são diferentes,
mas um dia vou para lá. Gosto muito da
América.”
A reacção da filha, então com 5 anos,
quando regressou um dia mais cedo da Ma-
rinha Mercante, foi determinante para Ar-
mando Lopes, 78 anos, fundador da AL – Fá-
brica de Material Eléctrico, na Marinha
Grande, decidir mudar de vida.“Um dia che-
go a casa, à Nazaré, e a minha filha veio
abrir-me a porta e não me conheceu.” «Tu
não és o meu pai. O meu pai anda o barco»,
respondeu-lhe com desconfiança.
“Um dia chego a casa
e a minha filha veio
abrir-me a porta e não
me conheceu.”«Tu não és
o meu pai.O meu pai anda
o barco»,respondeu-lhe
com desconfiança.
Armando Lopes diz que as
primeiros artigos em plástico
que se viam em feiras eram copos
RICARDO GRAÇA
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:29 Página 26
27. [ 27 ][ P L Á S T I C O ]
Responsável pela parte eléctrica das
máquinas, Armando Lopes deixou a Mari-
nha Mercante para trás e decidiu procurar
emprego mais próximo de casa. Após ter
trabalhado em diversas empresas, onde
aprofundou os seus conhecimentos técni-
cos, questionou-se:“Ando a montar fábricas
para os outros, por que não monto uma para
mim?” Tinha então 38 anos.
“Toda a gente copiou o
meu primeiro molde.
Até uma das maiores
empresas do mundo,mas
essa não me preocupava,
porque vendia por preços
superiores aos meus”
A sua formação permitiu-lhe entrar
com facilidade no mercado. Mas quis dife-
renciar-se dos outros. “Como baldes e al-
guidares qualquer um fazia, comecei a fa-
zer caixas para material eléctrico”, explica.
Mandava fazer o molde e depois injectava
numa fábrica de plásticos da Estação.As cai-
xas eram montadas na garagem de sua casa.
Mais tarde, Armando Lopes comprou a
primeira máquina de injecção e desempre-
gou-se da Jerónimo Martins, onde era o res-
ponsável técnico pelo departamento indus-
trial. “Dava-me muito bem com o Alexandre
Soares dos Santos [hoje, presidente do Con-
selho de Administração]. Quando tinha ava-
rias na piscina era a mim que me chamava.”
À medida que o negócio ia crescendo, ia
comprando mais máquinas e mais moldes
e mudando para melhores instalações. Hoje,
a empresa está localizada na zona industrial
e é gerida pelo seu filho, Augusto Lopes.
Armando Lopes recorda a reacção das
pessoas quando começaram a surgir artigos
em plástico no mercado. “A primeira coisa
que apareceu em plástico foi copos, nas fei-
ras. Foi uma revolução. Naquela altura,
qualquer pecinha de plástico causava ad-
miração”, recorda. “Uma vez trouxe um
saleiro e um pimenteiro e uma rolha de
plástico para fechar as garrafas. Eram coi-
sas inovadoras, que não havia cá.”
E tal como os portugueses copiavam os
artigos fabricados noutros países, quando
chegavam a Portugal o processo de cópia
repetia-se, só que desta vez da parte dos
concorrentes. “O meu primeiro molde foi
uma caixa de aparelhagem (onde fica o in-
terruptor e a tomada). Era um molde sim-
ples, porque ficava mais barato.Toda a gen-
te o copiou”, recorda.“Até uma das maiores
empresas do mundo, mas essa não me
preocupava, porque vendia por preços su-
periores aos meus.”
O fundador da AL diz que actualmen-
te esta prática se mantém. “Ainda hoje, só
se podem apresentar os produtos depois de
se ter uma grande produção feita para pôr
no mercado”, sustenta. Fundada em 1984,
a AL é hoje a maior fábrica de material eléc-
trico da Península Ibérica.
Armando Lopes
era técnico de máquinas ARMANDO LOPES
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:29 Página 27
28. [ 28 ] [ P L Á S T I C O ]
RICARDO GRAÇA
Adelino Carvalho diz que,
após o 25 de Abril de 1974,
deixou de haver a cunha do Bispo
ou do presidente da Junta para
admitir mais funcionários
Após a revolução do 25 de Abril de 1974,
foi estabelecido o primeiro salário mínimo
nacional, no valor de 3300 escudos.Apesar
de se ter “falado com as empresas que ha-
via”, Adelino Carvalho, então sócio-geren-
te da Carvalho & Catarro e hoje presiden-
te do Conselho de Administração da Eure-
kaPlast, garante que “as indústrias foram as
que mais sofreram” com esta medida, pois
tinham muitos funcionários. “Havia a cul-
tura de contratar toda a gente: os primos, os
amigos, os vizinhos”, justifica.
Autor do livro Génese e expansão da in-
SALÁRIO MÍNIMO
ABANA ESTRUTURA
DE EMPRESAS
dústria de plásticos no concelho de Leiria, José
Dias Coelho explica que, anteriomente, exis-
tia uma relação paternalista entre os in-
dustriais e os colaboradores.“Nos primeiros
tempos, a situação de pobreza da classe ope-
rária influía no quantitativo de empregados.
Para os familiares dos que já trabalhavam,
havia sempre mais um ou dois empregos.”
Se por um lado a situação económica de
cada agregado melhorava, Dias Coelho aler-
ta que “este procedimento também foi cau-
sador de excesso de operários, o que com-
plicou a vida das empresas quando estas se
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:29 Página 28
29. [ 29 ][ P L Á S T I C O ]
O 25 de Abril
veio revolucionar
também a vida
das empresas
viram na necessidade de introduzir nova tec-
nologia” ou de aumentar os ordenados por
imposição legal.
“Havia a cultura de
contratar toda a gente:
os primos,os amigos,
os vizinhos”
Além disso, o mestre em História Eco-
nómica e Social Contemporânea acrescen-
ta que os proprietários das fábricas “eram
frequentemente convidados para padri-
nhos de casamento dos empregados e bap-
tismo dos seus filhos, o que originava uma
relação de amizade que ultrapassava em
muito a de patrão-empregado”.
Esta mentalidade mudou, contudo, com
o nascimento das grandes empresas, porque
foram constituídas numa realidade com-
pletamente diferente.“Já não havia a cunha
do Bispo ou do presidente da Junta. Só con-
tavam com aqueles de que precisavam”, as-
segura Adelino Carvalho.
Estas indústrias tornaram-se mais ren-
táveis do que as anteriores, algumas das
quais nunca mais recuperaram a partir da
criação do ordenado mínimo. “Foi um cho-
que para muitas indústrias. Algumas che-
garam a ter 300 pessoas, porque o custo com
salários não era grande. Muitas acabaram
por fechar”, acrescenta.
Durante o regime anterior existiam
outros condicionalismos à actividade das
empresas. Adelino Carvalho explica que,
nos anos 60, fez um pedido de importação
de vedante (borracha), através do Boletim
de Registo de Importação, porque queria
comprar uma medida específica. ”Como os
tipos da borracha tinham um lobby pode-
roso, mandaram-nos consultar a indústria
nacional. Esteve a máquina parada três ou
quatro semanas à espera de vedante.”
”Como os tipos da
borracha tinham um
lobby poderoso,
mandaram-nos
consultar a indústria
nacional. Esteve a
máquina parada três ou
quatro semanas à espera
de vedante”
Este procedimento durou até à entrada
de Portugal na Comunidade Económica
Europeia (CEE), em 1986, porque houve
uma imposição nesse sentido, garante o fun-
dador da Carvalho & Catarro. “Isso condi-
cionava de uma maneira brutal os indus-
triais”, que acabavam por perder negócios.
Em alternativa, recorriam à corrupção para
desbloquear este tipo de situações.
“A partir de 1975-1978, o Ministério
das Finanças não deixava ninguém sair de
Portugal com mais de sete contos e tínhamos
de escrever ao Banco de Portugal a explicar
por que é que precisavamos do dinheiro”,
conta.“Tínhamos de dizer que íamos visitar
um cliente, um fornecedor ou feiras e que
precisávamos de levar divisas e o Banco de
Portugal autorizava a vender francos fran-
ceses, por exemplo.” Como sete contos era
um valor insuficiente.Adelino Carvalho diz
que as pessoas contornavam o sistema,
comprando moeda estrangeira, como pese-
tas, por exemplo, num café de Leiria.
ARQUIVO/JL
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:29 Página 29
30. [ 30 ] [ P L Á S T I C O ]
Nuno Romero diz que 100%
da produção da Key Plastics
Portugal é para a indústria
automóvel
Entre as primeiras empresas que surgiram
na área do plástico na região de Leiria, a Ma-
térias Plásticas (Map) distingue-se por ter tido
um percurso diferente das restantes, consti-
tuídas nos anos 40 e 50 do século XX,que ain-
dahojeestãoemactividade.Aproduçãodeaces-
sóriosdecasa-de-banhofoiabandonadaeaem-
presa especializou-se na produção de frontais
de auto-rádio e de controles de automatização
para a indústria automóvel.
Director-geral da Key Plastics Portugal,
Nuno Romero,64 anos,explica que,a partir de
1985,aMapdeixoudesededicarapenasaosfa-
brico de acessórios de casa-de-banho e passou
afabricartambémprodutostécnicos,tirando,as-
sim, partido dos conhecimentos que adquiriu
ao longo de décadas nas áreas da injecção de
plásticosedapintura.Começou,então,afabricar
tambémparaoIkeaepeçastécnicas paraaPor-
tugalTelecom ou a IBM.
“Procurámos oportunidades de negócio,
nummercadocadavezmaisexigente,paracon-
duzir a empresa noutro sentido”,afirma Nuno
Romero.“Evoluímos para produtos mais com-
plexos, para nos podermos posicionar num ni-
cho de mercado.”A entrada da Ford Automo-
tive Components no mercado português,mais
concretamente em Palmela, em 1991, viria a
constituirmaisummarcoimportantenahistória
da Map.
“Onossomercadosão
os14milhõesdecarros
fabricadosnaEuropa”
“Já tínhamos pensado em produzir frontais
de auto-rádios e o nosso objectivo concretizou-
-se, ao termos sido escolhidos como parceiros
para fabricar esses produtos”,revela o director-
-geral da Key Plastics. “Como não tínhamos
EMPRESAS
PIONEIRAS
SEGUEM PERCURSOS
DIFERENTES
know how nessa área,estabelecemos um acor-
dodecolaboraçãotécnicacomaKeyPlastics,nos
EUA,que permitiu à FordAutomotive Compo-
nents nomear-nos como fornecedores.”
Em 1993,a Map constrói novas instalações
na Barosa e, três anos depois, parte do seu ca-
pital é adquirido pela Key Plastics.Passa,então,
a designar-se Map Key.Em 1998,o grupo nor-
te-americanoadquireatotalidadedocapitalso-
cial e as duas áreas de negócio separam-se.A
produção de acessórios de casa-de-banho tor-
na-seindependente,nasinstalaçõesdaGândara
RICARDO GRAÇA
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:30 Página 30
31. [ 31 ][ P L Á S T I C O ]
dos Olivais e no centro da cidade, e vai dimi-
nuindo de importância até cessar em 2008.Cin-
co anos antes, a empresa muda de nome para
Key Plastics Portugal.
Nuno Romero esclarece que o grupo nor-
te-americano, que tinha apenas sete anos de
existência quando entrou no capital da empre-
sa de Leiria,não interferiu na escolha dos pro-
cessos nem dos equipamentos. “Passámos de
dois processos produtivos (injecção e pintura)
para seis processos produtivos de grande com-
plexidade para podermos fazer frontais de
auto-rádios”, explica. “Foi um momento mar-
cantenaempresa.AKeyPlasticsPortugaléhoje
umdosprincipaisfornecedoresanívelmundial.”
“Depoisdeentrarmos
nosmercados
maisdifíceis,
otrabalhoficoufeito”
Ford, Bentley, Audi, Volskwagen, BMW,
Volvo,Fiat,Opel eToyota são as marcas de au-
tomóveis para as quais a empresa de Leiria
produz frontais de auto-rádios, climatização
e sistemas de navegação. “100% da nossa pro-
dução é para a indústria automóvel. O nosso
mercado são os 14 milhões de carros fabri-
cados na Europa.”
Conscientedequeadependênciadestesec-
tor constitui um risco, Nuno Romero sublinha
que a vida da indústria automóvel está intima-
mente ligada aos ciclos da economia global,ra-
zão pela qual entre 2008 e 2011 chegaram a ter
quebrasdeproduçãode30a40%.“Masparater-
mosumaposiçãofortenomercadotemosdees-
tar completamente focados nesta indústria.”
Além de frontais de auto-rádios,climatiza-
ção e sistemas de navegação,a Key Plastics Por-
tugalfabricagrelhasdeentradadearefrisosde-
corativos para portas e tabliers.Dá ainda apoio
aos clientes no desenho dos seus produtos.“Po-
demos ainda produzir outras peças que exigem
os processos produtivos que nós dominamos”,
acrescenta Nuno Romero.
Se compararmos os primeiros anos de ac-
tividade da Plásticos Santo António, em 1955,
com a actualidade, as diferenças também são
substanciais.Sobretudoapartirdomomentoem
queMiguelRitto,53anos,gerente,entrounaem-
presa, em 1997. “Até então exportávamos 3%
paraInglaterra.Hoje,exportamos65%paratoda
a Europa e pontualmente para Angola”, reve-
la.“Fomo-nos especializando no fabrico de em-
balagens para logística, transporte e armaze-
nagem.”
“Em Portugal não havia mercado sufi-
ciente para amortizar os moldes”,justifica Mi-
guel Ritto.A opção passou por crescer na Eu-
ropa porque a empresa queria exportar para
paísesmaisexigentesaoníveldaqualidade.“De-
pois de entrarmos nos mercados mais difíceis,
o trabalho ficou feito.Ficámos com referências
que nos permitem que nos venham procurar.”
Os principais clientes da Plásticos Santo
António são a indústria alimentar (panificação,
pastelaria, queijos, viticultores, pesca) e logís-
tica (transporte de peças da indústria automó-
vel).“Temos sempre procurado diversificar os
nossosclientesealargarmercadosaoutrospaí-
ses”,afirmaogerentedaempresa.“Sealgumen-
trar em recessão, há outros que compensam.”
“Temosdeestarsempre
deolhosabertoseveroque
estáaacontecer”
Nos próximos três anos, a Plásticos Santo
Antóniotemmaisumgrandeprojectoparacon-
cretizar: mudar a fábrica para Monte Redondo,
onde adquiriram um terreno. Miguel Ritto diz
que a unidade onde desenvolvem a actividade
há60anoséconstituídaporpequenospavilhões
e o layout não é o desejável.Com a construção
dasnovasinstalações,pretendeteraindaganhos
de produtividade.
Atenta às movimentações do mercado, a
Baquelite Liz continua a fabricar diferentes ar-
tigos. “Somosumafábricadeplástico.Éissoque
nos vai aguentando. Quando um produto co-
meça a passar, outro começa a mexer”, afirma
João Rezola Clemente, 42 anos, administrador.
“Vamo-nos reinventando”,acrescenta o irmão
Jaime,49anos,administrador.Omercadointerno
sempre foi a prioridade.
“O mercado nacional representa 90% e
a restante produção é exportada indirecta-
mente, através dos clientes”, explica Jaime
Rezola Clemente. “São produtos muito vo-
lumosos [caixas de transporte e tubos para
>>>
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:30 Página 31
32. [ 32 ] [ P L Á S T I C O ]
a indústria], o que dificulta a exportação”,
justifica.
Embora os produtos para o lar tenham dei-
xado de ter expressão, a Baquelite Liz fabrica
desde ponteiros de tacos de snooker até caixas
para máquinas de tabaco.“Procuramos que o
cliente nos contacte sempre que tem uma ne-
cessidade. Conversamos ainda com fabrican-
tes de máquinas e fornecedores de matérias-
primas para recolher informação e encontrar
soluções”, refere João Rezola Clemente.
“Estamos em todo o lado. Desde a peque-
na loja até à grande empresa”, assegura. Entre
os seus clientes encontram-se empresas como
a PortugalTelecom,os CTT ou a Cimenteira de
Pataias.“Temos de estar sempre de olhos aber-
tos e ver o que está a acontecer”,acrescenta Jai-
me Rezola Clemente.“Embora tenhamos clien-
tes muito variados e e em grande número,con-
tinuamos à procura de novos.”
LEIRIA PODERÁ
VIR A TER
MUSEU DOS PLÁSTICOS
MariaElviraCallapez,56anos,investigadora
eautoradolivroOsplásticosemPortugal–Aori-
gemdaindústriatransformadora,apresentouem
Janeiro uma candidatura à Fundação para a
Ciência e aTecnologia (FCT) para obter fundos
para criar um museu dos plásticos em Portugal.
Leiria é a cidade que mais lhe agrada, por es-
tar ligada às origens desta indústria.
“Queremos fazer a história total dos plás-
ticos em Portugal. A investigação vai articular
uma grande quantidade de matérias e envolver
especialistas na história dos plásticos”, revela
Maria Elvira Callapez.“Desde a história social,
às tecnologias, sustentabilidade e impacto no
ambiente.”
O projecto que a investigadora apresentou
à FCT prevê ainda a comparação entre o plás-
tico e outros materiais tradicionais,como a cor-
tiça, por exemplo, para perceber se o plástico
trouxevantagens.Aassociaçãodosplásticoscom
o design e a inovação que daí resultou também
será alvo de estudo, tal como a relação entre a
indústria do plástico com a indústria eléctrica.
PLÁSTICOS SANTO ANTÓNIO
Paraconseguirreunirainformaçãoquepre-
tende, Maria Elvira Callapez quer envolver
neste processo também empresários,trabalha-
dores e outras pessoas ligadas ao sector.“Atra-
vés das memórias,quero tentar perceber o im-
pactoqueestaindústriateve,osprocessosdefa-
brico que foram utilizados, conhecer a menta-
lidade dos industriais e caracterizar as elites.”
A criação do museu pressupõe ainda a pre-
servação de artigos em plástico,pelo seu carác-
ter de inovação e pela vertente ligada à arte.
“Queremos ter equipamentos,memórias,foto-
grafias, brinquedos”,exemplifica,mas também
“fazer coisas novas”.Para tal,o projecto prevê a
criaçãodeumespaçoparaaorganizaçãodecon-
ferênciasedeumespaçodeinvestigaçãonaárea
dos plásticos e de outros materiais,com a cola-
boração da Universidade do Minho e de outras
instituições.
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:30 Página 32
33. Nuno Fróis junto à nova linha
de produção de bag in box
[ 33 ][ P L Á S T I C O ]
Quando Carlos Figueiredo, hoje com 67
anos,recebeuumbonecoemplásticocombom-
bons, oferecido por familiares do Canadá, por
certo estaria longe de imaginar que a sua vida
iria mudar para sempre.Olhou para a embala-
gem e pensou em fazer uma idêntica para ven-
der no mercado português. Contactou a fábri-
ca de chocolates Regina e fechou negócio.
“Hoje,temos de bater a muitas portas para
conseguirmos um 'sim'. Na altura, havia mais
possibilidades de qualquer produto ser consi-
deradoparaconsumo”,afirmaGuidaFigueiredo,
39 anos,filha e administradora do Grupo Car-
fi, com sede na Marinha Grande.
Desde esse dia até hoje, o pai, Carlos Fi-
gueiredo constituiu um grupo de quatro em-
presas, que desenvolvem actividades comple-
mentares. Seis anos depois da constituição da
empresa,deu-se a entrada de Portugal na Co-
munidadeEconómicaEuropeia(CEE)easpor-
tas para o mercado externo abriram-se.AAle-
INDÚSTRIAS PARTEM
À CONQUISTA
DO MUNDO
manha e a França foram os destinos escolhidos,
por serem mercados exigentes. “Entrámos
noutra cadeia de valor:zero erros,zero atrasos.”
“Hoje,quemnãotenha
umpéentreacompraea
venda(comprarmais
baratoevendermaiscaro)
vaiserultrapassadopela
concorrência”
Com a globalização do mercado,deixou de
suficiente ter qualidade,preços competitivos e
cumprir prazos. No final dos anos 90, a Carfi
opta,assim,poroferecerprodutoschavenamão,
ao assegurar também a produção dos moldes.
Entrou no mercado escandinavo e, após a
construção da actuais instalações, expandiu o
negócio para a indústria médica.
Em2000,entranaáreadapuericulturaein-
>>>
RICARDO GRAÇA
História da Indústria_plasticos_18_48_alexandra:Layout 1 09-02-2015 14:19 Página 33
34. [ 34 ] [ P L Á S T I C O ]
troduz a componente da electromecânica no
processo de fabrico. “Termos multinacionais
comoclientes,permite-nosexportarparaomun-
do inteiro,pautando-nos pelo nível máximo de
exigência, porque não sabemos onde é que os
nossos produtos vão parar”, observa.
Em 2003,abriram uma unidade da Polónia,
paraestaremmaispróximodosclientesdoNor-
te da Europa e poderem reduzir custos logísti-
cos. Guida Figueiredo revela que a intenção foi
ainda evitar que os clientes daquela zona en-
contrassem fornecedores mais próximos,assim
como entrar em novos mercados.
Quanto à China, prefere encará-la como
uma aliada no fornecimento de componentes,
e não como uma concorrente.“Quem não tenha
um pé entre a compra e a venda (comprar mais
barato e vender mais caro) vai ser ultrapassa-
do pela concorrência”,assegura Guida Figuei-
redo. “É a Rota das Índias dos dias de hoje.”
De qualquer forma,acredita que o facto de
as empresas que optaram por aquele mercado
terem sido obrigadas a fazer um grande esfor-
ço financeiro,devido à imposição do pagamen-
to antecipado e à compra em grandes quanti-
dades, e a terem ficado com a mercadoria reti-
da em portos, contribuiu para a retoma.
José Monteiro, 57 anos, sócio-gerente da
Simplastic, na Batalha, chegou a fabricar mol-
des na China para diminuir os custos,mas não
ficou agradado nem com a qualidade nem com
aassistência.“Masoqueestáainfluenciaraper-
da de mercado na China é a diferença cambial,
o transporte e o desalfandegamento.”
“Procuramosfazer
produtoscommaisvalor
acrescentadoeinovação.
Combaterpelopreçoestá
foradequestão”
Constituída em 1977, a Simplastic foi ad-
quiridaporJoséMonteiroeporArsénioSilvahá
25 anos.Ligado anteriormente ao sector da me-
talomecânica, José Monteiro estabeleceu como
princípiosaseguirexportareinovar.Nessesen-
tido, hoje o mercado nacional é residual.
A participação em feiras internacionais
foideterminante.Emconsequênciadisso,odes-
tino das poucas exportações passou de Israel
para a Europa.“Só produzimos marcas concei-
tuadasdeelectrodomésticosefornecemosopro-
duto acabado.”Para tal,subcontratam a produ-
çãodosmoldes.“Procuramosfazerprodutoscom
mais valor acrescentado e inovação.Combater
pelo preço está fora de questão.”
“Deixámosdepensar
comoumaindústria
epassámosapensar
comoempresadeserviços”
Jorge Santos,53 anos,director-geral daVi-
pex,naMarinhaGrande,defendequefazercom
qualidade não significa fazer mais caro,mas sim
com menos recursos. Com a entrada da China
no mercado,a empresa redifiniu o seu posicio-
namento e deixou de se concentrar na produ-
ção e passou a focar-se na concepção e enge-
nharia.
“Deixámos de pensar como uma indústria
e passámos a pensar como empresa de servi-
ços,queforneceprodutosebens”,esclareceJor-
ge Santos.“O cliente tem a ideia e nós desen-
volvemo-la.” Fabricante de produtos para con-
sumo–mesa,desporto,electrodomésticos–aVi-
pex está à procura de empresas que actuem no
mercado global e necessitem de parceiros que
lhes possam proporcionar serviços completos.
“Utilizamosaspráticasexigidaspelosclien-
tes da indústria automóvel (apesar de não tra-
balharmoscomestesector),oqueconsideramos
uma boa referência”,afirma.Actualmente,mais
de 90% dos seus clientes são multinacionais.
Já a Iber-Oleff foi constituída,em 1993,pre-
cisamenteparaaproveitarumaoportunidadede
negócio, decorrente da abertura da Autoeuro-
pa, em Palmela. Especialista em design, enge-
nharia e produção de componentes para as in-
dústrias automóvel e electrónica,a empresa de
Pombal veio, assim, possibilitar ao Grupo Ibe-
romoldes ter uma oferta integrada de serviços.
Noventa e cinco por cento dos produtos que a
Iber-Oleff produz são exportados.
“O mercado automóvel foi sempre alta-
mente competitivo, desafiadoramente compe-
titivo, pela inovação, pelas tecnologias e pro-
cessos, pelos custos e preços”, afirma Joaquim
Menezes,presidente do Conselho deAdminis-
tração do Grupo Iberomoldes.“É um mercado
História da Indústria_plasticos_18_48_alexandra:Layout 1 09-02-2015 13:38 Página 34
35. [ 35 ][ P L Á S T I C O ]
muito exigente e 'difícil',que impulsiona as em-
presas e seus quadros a uma permanente ati-
tude de questionamento, mudança e aprendi-
zagem.”
“A monitorização e investimento em tecno-
logia, que mantenha ou aumente a competiti-
vidade e a diferenciação,são uma preocupação
permanente”, garante Joaquim Menezes. Os
investimentos na Divisão de Componentes
Plástico para o Automóvel, nos últimos cinco
anos,rondam,em média,três milhões de euros
anuais.
“Omercadoautomóvelé
muitoexigentee'difícil'.
Impulsionaasempresas
aumapermanenteatitude
dequestionamento”
Especialistanofabricodeembalagens,aSIE
não sente necessidade de fazer investimentos
permanentes em tecnologia,apesar do parque
de máquinas não ser recente.Como tal,vão in-
troduzindo actualizações,explica Nuno Fróis,33
anos, neto do fundador , Emídio Fróis.A preo-
cupaçãodaempresadeLeiriapassasimpelaop-
timização dos produtos, através da redução do
peso, para se tornarem mais baratos, mas com
a mesma resistência.“O que os clientes valori-
zam é o preço.”
Nuno Fróis esclarece que, tendo em conta
que não há muita capacidade de diferenciação,
a SIE concentra-se em garantir que as embala-
gens são estanques e suportam as cargas. Ex-
portarestáforadecausa,porqueasembalagens
ocupam muito volume,o que representaria um
custo de transporte muito elevado.
A SIE foi constituída em 1963, em Lisboa,
por quatro sócios, um dos quais Emídio Fróis.
Quando mudou para Leiria, ficou a funcionar
nas antigas instalações do Roldão & Pires.José
Fróis,60anos,filhodofundador,explicaqueface
ao prejuízo que a empresa dava, devido à fal-
ta de controlo dos sócios, em 1980, pressiona-
ram um deles,JoaquimAndré Jr,madeireiro,a
assumir a liderança.
A SIE começou a recuperar e a desenvol-
ver o mercado e, após a entrada de José Fróis,
muda de instalações para a Urbanização de
Santa Clara.Com a morte de Emídio Fróis,em
1985, o filho José compra a quota de um outro
sócio, tal como Joaquim André Jr, e ficam am-
bos com 50% do capital.JoaquimAndré Jr tam-
bém acabaria por falecer,pelo que o filho ficou
com sua quota.Em Outubro de 2014,José Fróis
adquiriu a totalidade da empresa,onde traba-
lha o seu filho Nuno.
Actualmente,a SIE dedica-se ao fabrico de
embalagens,de sinalização para estradas e vai
arrancar com a produção de bag in box para vi-
nho, sumos e azeite. “Vai ser o futuro da em-
balagem, porque não ocupa volume. Daqui a
cinco ou seis anos irá substituir as embalagens
tradicionais.”
Jorge Santos
e Guida Figueiredo
RICARDO GRAÇA/ARQUIVO ARQUIVO JL
História da Indústria_plasticos_18_48_alexandra:Layout 1 09-02-2015 13:38 Página 35
36. [ 36 ] [ P L Á S T I C O ]
A Sirplaste – Sociedade Industrial de Re-
cuperados Plásticos, em Porto de Mós, é pio-
neira, a nível mundial, na reciclagem de resí-
duos provenientes de compostagem e é a
maior empresa a nível europeu a fazer reci-
clagemdeplásticoscontaminados,asseguraRi-
cardo Pereira, 40 anos, director-executivo.
“Ainda me lembro de ser pequeno e de ir
com o meu pai visitar os clientes.Era quase um
negócio de contrabando”,recorda Ricardo Pe-
reira.“Pediam-nosparadescarregaroscamiões
à noite, porque o plástico recliclado era visto
como um produto de má qualidade.”Aliás, al-
gunsclienteschegaramaacusar-seunsaosou-
tros de utilizarem matéria-prima reciclada,
quando a vendíamos aos dois.
“Háseisanos,seme
dissessemqueiareciclar
plásticosdolixo,diziaque
issoeraumamiragem”
Constituídaem1974,aSirplastesurgiupara
dar resposta a uma necessidade do mercado,
pois as empresas não sabiam o que fazer aos
desperdícios.Estavamadar-seosprimeirospas-
sosnareciclagemaníveleuropeu,peloqueain-
da não havia equipamentos para tratar os re-
síduos. “Adaptavam-se máquinas agrícolas e
funcionava por tentativa/erro.”
Hoje, é especialista na área da desconta-
minação de resíduos de plástico,provenientes
da compostagem.“Os plásticos que são depo-
sitadosnocontentordelixosãoseparadoseen-
viados para nós para os reciclarmos”, explica,
o que representa um ganho ambiental.
Apesar da desconfiança em relação à uti-
lização de plástico reciclado ter diminuído,Ri-
cardo Pereira diz que não faz sentido continuar
SIRPLASTE LIDERA
RECICLAGEM
DE PLÁSTICO
CONTAMINADO
NA EUROPA
a produzir tubos de rega ou sacos do lixo com
matéria-prima virgem. Carlos Bento, sócio-ge-
rente da Micronipol – Reciclagem de Plásticos,
em Ourém, manifesta outra preocupação.
“Andamos a pressionar para que os cader-
nos de encargos das obras públicas alterem as
especificações dos produtos para abrirem o le-
que à utilização de produtos reciclados”,revela,
tendo em conta que“os produtos evoluíram em
termos de qualidade”.
Para tal, contribuiu também o avanço tec-
nológico.CarlosBentoadquireequipamentos,no
máximo, de quatro em quatro anos e vai intro-
duzindo adaptações noutros,investimentos que
ascendem a milhões de euros. “Estes equipa-
mentos têm um ciclo de vida muito curto, por-
que sofrem um grande desgaste”, justifica.
Em2000,anoemqueiniciouactvidade,aMi-
cronipolcomeçouportransformarmateriaislim-
pos,resultantesdedesperdíciosdefábricaseem-
balagens industriais. Em 2014, passou a con-
centrar-se na transformação de materiais con-
taminados.“Há seis anos,se me dissessem que
iareciclarplásticosdolixo,diziaqueissoerauma
miragem”,observa Carlos Bento. “O próprio
mercadoexigiuquenascessemempresasqueso-
lucionassem este problema”,uma vez que sur-
giram ecopontos e as próprias empresas pas-
saram a aproveitar os seus desperdícios.
Ricardo Pereira refere que a
reciclagem chegou a ser
comparada a um negócio de
contrabando RICARDO GRAÇA
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:31 Página 36
37. [ 37 ][ P L Á S T I C O ]
EMPRESAS
PROCURAM
MERCADOS
PARA ESCOAR SACOS
PLÁSTICOS
Oreceiodequeaaplicaçãodeumataxaso-
bre a venda de sacos plásticos mais finos, que
entra em vigor dia 15, venha diminuir drasti-
camente o seu consumo, levou a Plasgal – Pro-
dução de Embalagens,em Leiria,a tomar a de-
cisão de entrar nos mercados espanhol e an-
golano.A Sacos 88 - Sociedade de Plásticos,em
Leiria, também vai procurar novos mercados
para escoar estes produtos.
Paulo Almeida, 43 anos, director-geral da
Plasgal, explica que esta alteração legislativa
trouxe novos desafios à empresa, cuja produ-
ção de sacos plásticos, manga plástica e filmes
flexíveis tem sido absorvida em 95% pelo mer-
cado interno.O imperativo de escoar a matéria-
-prima que vai deixar de ser utilizada em Por-
tugal vai obrigar a empresa a exportar. A in-
tenção é que,até ao final do ano,Espanha eAn-
gola absorvam 25% da produção.
“O mercado nacional sempre foi um mer-
cadoemcrescendo,oquenosdeixavacompou-
cacapacidadedisponívelparaaexportação”,jus-
tifica Paulo Almeida. Não esconde, no entanto,
que os riscos e encargos com as operações lo-
gísticaseoscombustíveistambémcontribuíram
para que não tenham dado esse passo antes.
“Devíamospenalizar
aatitudedaspessoas
enãoossacos”
Com a aplicação da taxa sobre a venda de
sacos plásticos, o Governo pretende diminuir
estes resíduos no meio ambiente.Contudo,Pau-
loAlmeida contesta a rapidez com que este pro-
cesso foi tratado,que dificultou a adaptação das
empresas de produção de sacos. A Plasgal pre-
vê investir cerca de 500 mil de euros na aqui-
sição de equipamentos e readaptação dos
processos de fabrico a sacos reutilizáveis.
“Não sei qual vai ser o impacto da taxa no
meu negócio,se vou ter de diminuir a produ-
ção ou mandar pessoas embora”, afirma
Amaro Reis,director-geral da Sacos 88,que se
encontranamesmasituação.“Pedimosumpe-
ríodo de carência de seis meses e deram-nos
um mês.Devia ter sido dado tempo às indús-
trias para se reinventarem.”
No caso da Plásticos 88,Amaro Reis re-
vela que vão diversificar a área das embala-
gens para produtos alimentares, para a in-
dústria e exportar os sacos finos para outros
países,onde não exista esta lei.“Depois,o mi-
nistro do Ambiente ainda vai dizer que esta
medida contribuiu para as empresas expor-
tarem mais”, ironiza.
AmaroReisdefendequeossacosmaisfi-
nos não têm o impacto negativo no ambien-
te que lhes está a ser atribuído pois são, ha-
bitualmente, reutilizados para depositar lixo
doméstico. Quanto aos sacos que são aban-
donadosemfeirasemercados,asoluçãoapon-
tada é simples: colocar no local contentores
paraquepossamserreciclados.“Devíamospe-
nalizar a atitude das pessoas e não os sacos.”
A Plasgal quer exportar
25% da produção
para Espanha e Angola RICARDO GRAÇA
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:31 Página 37
38. [ 38 ] [ P L Á S T I C O ]
RICARDO GRAÇA
A falta de técnicos qualificados
é uma das principais dificuldades
apontadas pelos industriais
de plástico
A indústria de plásticos está a sentir difi-
culdadesemencontrartécnicosqualificadospara
exercer funções intermédias nas empresas,
problema que está a afectar o seu desenvolvi-
mento.Estalacunaéapontadapordiversosem-
presários que pedem uma maior aproximação
entre a indústria e as instituições de ensino.
“O sistema de ensino não está a produzir
pessoas especializadas. Não há formação su-
perior nem técnica adequadas”, afirma Jorge
Santos,53 anos,director-geral daVipex,na Ma-
rinha Grande. Para impedir que esta situação
continueacondicionarodesenvolvimentodain-
dústria, defende um “ajustamento dos progra-
mas dos cursos às necessidades das empresas”,
no qual todos devem ter uma participação ac-
tiva. “Há um grande avanço a fazer para pro-
mover a ligação entre as empresas e as escolas.”
Guida Figueiredo,39 anos,administradora
do Grupo Carfi,com sede na Marinha Grande,
também considera que há um desajuste entre
aquilo que a indústria necessita e o que a esco-
la tem para oferecer, a nível técnico-profissio-
FALTA DE QUADROS
INTERMÉDIOS
PREJUDICA EMPRESAS
nal. Para ultrapassar este obstáculo, a empre-
sa tem recorrido à formação interna. “O co-
nhecimento tem de ser passado de geração em
geração, dos mais velhos para os mais novos.”
“Amaiorpartedos
engenheirosquerum
gabineteeum
computador,enquantona
Alemanhaumengenheiro
pensaprimeiroemsujar
asmãose,sódepois,
nocomputador”
A empresária lamenta,por outro lado,que
exista falta de vontade de trabalhar, já que os
quadros intermédios se recusam a fazer turnos.
Este problema também é sentido por José
Monteiro,57 anos,sócio-gerente da Simplastic,
naBatalha.“Amaiorpartedosengenheirosquer
um gabinete e um computador”, assegura.
“Enquanto naAlemanha,um engenheiro pen-
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:31 Página 38
39. [ 39 ][ P L Á S T I C O ]
sa primeiro em sujar as mãos e, só depois, no
computador.”
José Monteiro lamenta que tenham deixa-
do de existir cursos industriais,que podiam for-
mar recursos humanos qualificados para dar
resposta às necessidades das empresas.Apesar
de reconhecer a importância do Instituto Poli-
técnico de Leiria pela criação de cursos de en-
genharia, defende que faz falta formação in-
termédia.“Estão a encaminhar as pessoas todas
para as universidades,onde muitos cursos não
têm qualidade.”
Afacturadeelectricidadetambémestáaes-
trangular a actividade dos industriais de plás-
ticos. Os reflexos nos custo de produção são sig-
nificativos, o que retira vantagens competitivas
àsfábricasqueestãopresentesnosmercadosin-
ternacionais.
“Fabricamosenergiano
Paíseestamosacomprar
aosespanhóis10a11%
maisbarata”
O sócio-gerente da Simplastic contesta,
sobretudo,afaltadequalidadedoabastecimento
eléctrico, devido aos inúmeros cortes ao longo
doano,quesetraduzemem“custosbrutais”para
as empresas.“A EDP não investe nesta região.
A liberalização do mercado é ironia e jogo po-
lítico”, denuncia.“Os empresários deviam pro-
cessar judicialmente a EDP pelos prejuízos que
lhes causam.”
JáJoaquimMatos,82anos,administradorda
Plimat,na Marinha Grande,lamenta ter de pa-
gar a energia mais cara do que os concorrentes
espanhóis ou franceses, e não poder fazer re-
flectir esse valor no produto final,já que,se as-
sim fosse, perderia os clientes.
Como o empresário é obrigado a vender os
produtosaomesmopreçodosconcorrentes,aca-
ba por ter de cortar na sua margem de lucro.Por
mês, a Plimat paga 38 mil euros, porque optou
por comprar a energia em Espanha.“Fabrica-
mosenergianoPaíseestamosacompraraoses-
panhóis 10 a 11% mais barata”, denuncia.
José Fróis,60 anos,administrador da SIE –
SociedadeInternacionaldeEmbalagens,emLei-
ria, também mudou de fornecedor,para a Iber-
drola, para conseguir preços mais baixos e dei-
xar de ter tantos aumentos.O negócio foi,con-
tudo, mais além,já que também vende energia
à companhia espanhola.
“No ano passado,cobrimos o telhado do ar-
mazém com painéis fotovoltaicos para produ-
zirmos energia solar”, revela.Tendo em conta
que vende, em média, nove mil euros por mês,
prevêpagaroinvestimentoemseisanos. “Apar-
tir daí é lucro.”A factura da energia represen-
ta10a15%docustodeproduçãodaembalagem,
ou seja, 20 mil euros por mês.
Além destes entraves, Paulo Almeida, 43
anos,director-geral da Plasgal,em Leiria,refe-
re o incumprimento dos prazos de pagamento
do Estado (hospitais) e das autarquias.A pro-
pósito do Estado, Guida Figueiredo contesta o
valor da taxa de IRC.Como a Carfi também tem
uma fábrica na Polónia, onde esta taxa é mais
reduzida,incentivaosclientesacomprarlá,mas
nemsempreébemsucedida.“Temosclientesna
Finlândia que querem ser fornecidos pela Car-
fiPortugal”,exemplifica,apesardeaunidadefa-
bril do leste da Europa estar mais próxima.
A administradora do Grupo Carfi lamenta,
por outro lado, a má imagem que os produtos
madeinPortugaltêmnosmercadosexternos.“Os
políticos e outras entidades não ajudam nada”,
lamenta.“Devíamos valorizar-nos mais.Quan-
do nos sentamos à mesa das reuniões,partimos
logo em desvantagem”, afirma.
“Devíamosvalorizar-nos
mais.Quandonos
sentamosàmesadas
reuniões,partimoslogo
emdesvantagemporsermos
portugueses”
José Monteiro defende ainda que era im-
portante Portugal ter uma boa ferrovia para o
transportedemercadorias,investimentoquete-
ria repercussões positivas ainda ao nível da si-
nistralidade.Ao nível dos transportes,João Re-
zola Clemente,administrador da Baquelite Liz,
acrescenta que o transporte por barco,os atra-
sos e as greves dos estivadores também causam
estrangulamentos às empresas. “Estamos a
equacionardeixardeexportarparaaTunísiade-
vido aos custos e ao tempo que demora o
transporte”, refere.
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:31 Página 39
40. [ 40 ] [ P L Á S T I C O ]
A indústria de Plásticos portuguesa não
escapou à crise económica europeia, que se
fez sentir,sobretudo,em 2012.Os indicadores
económicos dão sinais de recuperação em
2013, mas o embate sofrido no ano anterior
gerou um arrefecimento das trocas comerciais.
Se observarmos as exportações, dentro e
fora da União Europeia, de produtos em
plástico fabricados em Portugal, constatamos
que caíram em 2012,especialmente no que diz
respeito ao fabrico de componentes e aces-
sórios para veículos automóveis. Em 2013, os
resultados melhoraram,mas,neste subsector,
ainda estão longe dos obtidos em 2011.
A crise reflectiu-se ainda na diminuição
do número de empresas do sector, que pas-
sou de 1.097 para 1.055 de 2011 para 2012, e,
naturalmente, no número de trabalhadores.
Em 2011 havia 33.819 pessoas a trabalhar em
fábricas de Plástico e,no ano seguinte,33.455.
Ou seja, o encerramento das 42 empresas ar-
rastou 364 pessoas para o desemprego.
Face a esta situação de crise na zona euro,
o volume de negócios da generalidade das
empresas que se manteve em actividade
também diminuiu, de 6.404 milhões em 2011
para 5.717 milhões de euros em 2012. Feitas
as contas, a facturação das 1.055 empresas
portuguesas desceu 11 por cento (687 milhões
de euros).
As 272 fábricas de componentes e aces-
sórios para a indústria automóvel foram as
que se ressentiram mais, já que se verificou
uma quebra do volume de negócios de 18 por
cento (383 milhões de euros) de um ano para
o outro.Apesar de só ter encerrado uma fá-
brica de matérias plásticas sob formas pri-
márias, as 64 que se mantiveram em activi-
dade em 2012 também reduziram drastica-
mente a sua facturação em 275 milhões de
euros. O impacto neste indicador económi-
co foi menos notório nos subsectores de fa-
brico de embalagens (menos 17 milhões de
euros) e de outros artigos de plástico (menos
11 milhões de euros).
CRISE NA EUROPA
ATINGE INDÚSTRIA
DE PLÁSTICOS
Quanto aos resultados líquidos, que
dão uma noção mais real da saúde finan-
ceira das empresas, verifica-se que a si-
tuação mais grave, vivida neste período, diz
respeito às fábricas de matérias plásticas
sob formas primárias, que já apresentavam
uma situação complicada em 2011 (-34 mi-
lhões de euros), que se agravou em 2012 (-
142 milhões de euros).
Os fabricantes de componentes e aces-
sórios para a indústria automóvel também se
ressentiram, ao passarem de resultados lí-
quidos de 69 milhões de euros em 2011 para
47 milhões de euros em 2012. Em contrapar-
tida, as empresas portuguesas dedicadas ao
fabrico de outros artigos de plástico e de em-
balagens de plástico melhoraram os seus re-
sultados, ao passarem de 23 para 24 milhões
de euros no primeiro caso e de sete para dez
milhões de euros no segundo.
RICARDO GRAÇA
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:44 Página 40
41. [ 41 ][ P L Á S T I C O ]
Exportações (Intra + Extra UE)
Fabricação de outros componentes e acessórios para veículos automóveis
Fabricação de outros artigos de plástico, n.e.
Fabricação de embalagens de plástico
Fabricação de matérias plásticas sob formas primárias
2012
2011 570
549
281 1.097
1.055
65 181
17064272
Fonte: GEE, com base nos dados das estatísticas do Comércio Internacional do INE (últimas versões disponíveis à data da publicação para o período considerado). Os dados do comércio intraco-
munitário incluem estimativas para as não respostas assim como para as empresas que se encontram abaixo dos limiares de assimilação.
N.º de empresas
Volume de negócios (Milhões de euros)
Corresponde
a 2.000 trabalhadores
2011
2012
33.819
33.455
N.º de trabalhadores
2011 2012 2013 Jan/Out Jan/Out
2013 2014
Fabricação de outros artigos de plástico, n.e. 177 182 198 164 184
Fabricação de outros componentes e acessórios 1.999 1.755 1.817 1.542 1.680
para veículos automóveis
Fabricação de matérias plásticas sob formas primárias 690 739 794 667 729
Fabricação de embalagens de plástico 156 155 173 142 158
Fonte:Cálculos GEE,a partir de dados do Sistema de Contas Integradas,INE.Gabinete de Estratégia e Estudos do Ministério da Economia.Dados cedidos por Pólo de Competitividade eTecnologia
Engineering &Tooling
Importações (Intra + Extra UE)
Fonte: Fonte: GEE, com base nos dados das estatísticas do Comércio Internacional do INE (últimas versões disponíveis à data da publicação para o período considerado). Os dados do comércio in-
tracomunitário incluem estimativas para as não respostas assim como para as empresas que se encontram abaixo dos limiares de assimilação.
Gabinete de Estratégia e Estudos do Ministério da Economia.Dados cedidos por Pólo de Competitividade eTecnologia Engineering &Tooling
2011 2012 2013 Jan/Out Jan/Out
2013 2014
Fabricação de outros artigos de plástico, n.e. 118 117 132 111 128
Fabricação de outros componentes e acessórios 2.341 2.069 2.027 1.694 1.788
para veículos automóveis
Fabricação de matérias plásticas sob formas primárias 1.356 1.300 1.423 1.186 1.272
Fabricação de embalagens de plástico 186 168 177 147 161
Fabricação de outros componentes e acessórios para veículos automóv
Fabricação de outros artigos de plástico, n.e.
Fabricação de embalagens de plástico
Fabricação de matérias plásticas sob formas primárias
20122011
885
3.406
1.520
592
6.404
5.717
874
3.023
1.245
575
Resultado líquido (Milhões de euros)
Fabricação de outros componentes
e acessórios para veículos automóveis
Fabricação de outros artigos de plástico, n.e.
Fabricação de embalagens de plástico
Fabricação de matérias plásticas sob formas primárias
-150
-120
-90
-60
-30
0
30
60
90
20122011
69
23
7
-142
-34
10
24
47
História da Indústria_plasticos_18_48:Layout 1 09-02-2015 13:32 Página 41
42. [ 42 ] [ P L Á S T I C O ]
Todos os alunos diplomados em Engenha-
ria de Polímeros têm emprego assegurado no fi-
nal do curso.A garantia é dada por Olga Sousa
Carneiro,directora do Departamento de Enge-
nharia de Polímeros (DEP) da Universidade do
Minho,quelamentaoaparentedesinteressepelo
curso, apesar da intensificação da divulgação.
“Invariavelmente,o número de ofertas de
emprego excede o número de recém-forma-
dos do Mestrado Integrado em Engenharia de
Polímeros (MIEPol)”, assegura Olga Carnei-
ro. Uma situação que se deve ao facto de ha-
ver poucos candidatos a optar por este curso
na primeira opção.
A directora do DEP explica que,hoje,a Uni-
versidade do Minho forma essencialmente
mestresemEngenhariadePolímeros,aumataxa
média de 25 por ano. Desde 1977, o Departa-
mento de Engenharia de Polímeros já diplomou
mais de 600 estudantes na área de Ciência e En-
genharia de Polímeros,nos diferentes graus de
ensino.
ODepartamentode
EngenhariadePolímeros
suportaoInstitutode
PolímeroseCompósitos,que
naúltimaavaliaçãodaFCT
teveaclassificaçãode
Excepcional
OsCursosdeFormaçãoEspecializada(CFE)
fazempartedaofertaformativadesde2007,apar
do mestrado em Propriedades eTecnologia de
Polímeros.Destinados a candidatos que não têm
formação de base em Engenharia de Polímeros,
funcionamcomoaparteescolardereferidomes-
trado, em regime de b-learning.
PROCURA
DE ENGENHEIROS
DE POLÍMEROS
É SUPERIOR
À OFERTA
ODEPteveasuaorigemnalicenciaturaem
Engenharia de Produção – ramo de Transfor-
mação de Matérias Plásticas, em 1977, em re-
sultado do desafio lançado à Universidade do
Minho, quase dois anos antes, pela então Se-
cretária de Estado da Indústria Pesada. A in-
tenção da governante era criar um curso capaz
de formar técnicos de nível universitário aptos
a responder às necessidades do sector.
Emresultadodeumamplodebateentrein-
dustriais do sector dos plásticos e dos moldes,
foi reconhecido o papel essencial da inovação
e do desenvolvimento tecnológico para o futu-
ro do sector,pelo que,em 2001,foi criado o Pólo
de Inovação em Engenharia de Polímeros
(PIEP), na Universidade do Minho, que cons-
titui o principal veículo de interacção do DEP
com a indústria.
“Ainda nesta área de I&DT+i, o Departa-
mento de Engenharia de Polímeros suporta o
Instituto de Polímeros e Compósitos,o qual in-
tegra o I3N, Laboratório Associado da Funda-
ção para a Ciência e aTecnologia (FCT),que na
última avaliação realizada pela FCT, em De-
zembro de 2014,teve a classificação de Excep-
cional”, revela.
Estas duas instituições, juntamente com o
PIEP, desenvolveram projetos de I&DT+I, em
2014,comumvalorglobalsuperiora15milhões
A Universidade do Minho é a
única instituição do ensino
superior a ministrar formação
específica na área da Engenharia
de Polímeros. DR
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