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Merchandising em redes sociais: anunciantes e influenciadores devem observar
algumas questões jurídicas.
Dagoberto L. M. M. Chaves
Reconhecimento, identificação e engajamento são elementos presentes na relação do
público com influenciadores digitais. Aos olhos do público, produtos utilizados por seus
influenciadores passam a ter um endosso de qualidade e assim se constrói uma forte
associação produto-pessoa.
A imagem do influenciador é o seu maior ativo e seu uso deve ser claramente
parametrizado. Por conta da associação produto-pessoa, qualquer atuação negativa de
uma marca, produto ou empresa contratante no mercado pode prejudicar a imagem
desse influenciador. De outro lado, a imagem de uma marca ou produto (ou, mais uma
vez, do próprio influenciador) também pode ser prejudicada por um influenciador que
não tenha obtido a devida autorização para uso de eventuais contribuições de terceiros
em seus conteúdos, que viole direitos e obrigações da relação contratual com a
plataforma (o Youtube, por exemplo), ou que por meio de declarações acabe por atingir
marca, produto ou instituição.
Além disso, por ser um modelo de negócios relativamente novo, alguns influenciadores
digitais não possuem a qualificação jurídica necessária para serem contratados e
receberem pagamentos por, por exemplo, terem formato de pessoa jurídica impróprio,
ou não possuírem em seu objeto social e cartão de CNPJ (códigos CNAE) atividades
aderentes aos serviços realizados, assim impossibilitando a emissão de notas fiscais com
descritivos adequados.
Exemplo do risco existente nesse tipo de relação foi a contratação de alguns youtubers
pelo Governo Federal para divulgação da Reforma do Ensino Médio, em fevereiro de
2017. Lançada a campanha, vieram à tona postagens racistas e homofóbicas que teriam
sido realizadas anos antes por um dos contratados.
Ainda, a identificação de postagens "pagas" de influenciadores digitais como
"mensagens publicitárias" demanda atenção. Nosso Código de Defesa do Consumidor
determina que “a publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e
imediatamente, a identifique como tal”. O CONAR vem sistematicamente notificando
influenciadores e instaurando processos éticos por estes não observarem o Código
Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, especialmente por não identificarem
claramente o cunho publicitário de postagens relacionadas a ações de merchandising.
Inclusive, em circular divulgada em dezembro de 2017, o CONAR reforçou que a
publicidade de bebidas alcoólicas “em redes sociais e por meio de influenciadores
digitais” também deve respeitar as regras aplicáveis à divulgação daqueles produtos.
Portanto, a devida atenção à legislação pertinente, a adequada qualificação jurídica dos
influenciadores e a elaboração de contratos (e de cláusulas específicas) que tratem de
questões como as mencionadas acima, em resumo, não apenas pode evitar danos à
imagem de influenciadores digitais, de marcas e produtos e de terceiros; como também
contribui para aumentar a eficácia e a segurança jurídica de sua contratação em ações
publicitárias.
Dagoberto L. M. M. Chaves, dlmmc@icloud.com
Advogado atuante nas áreas de tecnologia, televisão e mídias digitais desde 2001.
Abril/2018.

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  • 1. Merchandising em redes sociais: anunciantes e influenciadores devem observar algumas questões jurídicas. Dagoberto L. M. M. Chaves Reconhecimento, identificação e engajamento são elementos presentes na relação do público com influenciadores digitais. Aos olhos do público, produtos utilizados por seus influenciadores passam a ter um endosso de qualidade e assim se constrói uma forte associação produto-pessoa. A imagem do influenciador é o seu maior ativo e seu uso deve ser claramente parametrizado. Por conta da associação produto-pessoa, qualquer atuação negativa de uma marca, produto ou empresa contratante no mercado pode prejudicar a imagem desse influenciador. De outro lado, a imagem de uma marca ou produto (ou, mais uma vez, do próprio influenciador) também pode ser prejudicada por um influenciador que não tenha obtido a devida autorização para uso de eventuais contribuições de terceiros em seus conteúdos, que viole direitos e obrigações da relação contratual com a plataforma (o Youtube, por exemplo), ou que por meio de declarações acabe por atingir marca, produto ou instituição. Além disso, por ser um modelo de negócios relativamente novo, alguns influenciadores digitais não possuem a qualificação jurídica necessária para serem contratados e receberem pagamentos por, por exemplo, terem formato de pessoa jurídica impróprio, ou não possuírem em seu objeto social e cartão de CNPJ (códigos CNAE) atividades aderentes aos serviços realizados, assim impossibilitando a emissão de notas fiscais com descritivos adequados. Exemplo do risco existente nesse tipo de relação foi a contratação de alguns youtubers pelo Governo Federal para divulgação da Reforma do Ensino Médio, em fevereiro de 2017. Lançada a campanha, vieram à tona postagens racistas e homofóbicas que teriam sido realizadas anos antes por um dos contratados. Ainda, a identificação de postagens "pagas" de influenciadores digitais como "mensagens publicitárias" demanda atenção. Nosso Código de Defesa do Consumidor determina que “a publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal”. O CONAR vem sistematicamente notificando influenciadores e instaurando processos éticos por estes não observarem o Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, especialmente por não identificarem claramente o cunho publicitário de postagens relacionadas a ações de merchandising. Inclusive, em circular divulgada em dezembro de 2017, o CONAR reforçou que a publicidade de bebidas alcoólicas “em redes sociais e por meio de influenciadores digitais” também deve respeitar as regras aplicáveis à divulgação daqueles produtos. Portanto, a devida atenção à legislação pertinente, a adequada qualificação jurídica dos influenciadores e a elaboração de contratos (e de cláusulas específicas) que tratem de
  • 2. questões como as mencionadas acima, em resumo, não apenas pode evitar danos à imagem de influenciadores digitais, de marcas e produtos e de terceiros; como também contribui para aumentar a eficácia e a segurança jurídica de sua contratação em ações publicitárias. Dagoberto L. M. M. Chaves, dlmmc@icloud.com Advogado atuante nas áreas de tecnologia, televisão e mídias digitais desde 2001. Abril/2018.