Genialidade e loucura estão intimamente ligadas segundo muitos filósofos e cientistas. Vários estudos mostraram que escritores e compositores alternam entre períodos de grande inspiração e esterilidade criativa. Lombroso analisou figuras como Baudelaire, Comte, Goethe e Schopenhauer e concluiu que muitos gênios apresentavam sintomas de transtornos bipolares. A linha que separa a genialidade da loucura é tênue e há fortes indícios de que a loucura pode representar a
Genialidade e Loucura: A relação entre criatividade e transtornos mentais
1. Carolina Machado 11J
GENIALIDADE E LOUCURA
Nenhum grande génio existiu sem algum toque de loucura. Aristóteles
Edgar Allan Poe disse: Muitas pessoas já me caracterizaram como louco. Resta saber se a
loucura não representa, talvez, a forma mais elevada de inteligência. Nessa sua suspeita de que
genialidade e loucura estejam intimamente entrelaçadas, o escritor não estava sozinho. Muito
antes, Platão mostrara acreditar numa espécie de loucura divina como base fundamental de toda a
criatividade. Sócrates atribuía a condução da vida ao seu daemon (demónio), a sua voz interior.
Em meados de 1800, a ideia de génio louco foi corroborada pela Teoria da Evolução, de
Darwin. À época, a genialidade chegou a ser considerada uma desordem neuropatológica
congénita. Ernest Kretschemer, professor de Psiquiatria e Neurologia da Universidade de Marburg,
afirmava que a doença mental de qualquer tipo leva, na maioria esmagadora dos casos,
meramente a uma diminuição do poder da mente e ao desajuste social; mas que, nalguns casos
excepcionais, em homens de constituição mental especial e grandes talentos, leva ao
desenvolvimento de actividades geniais. Confirma ainda que a doença mental (…) é decididamente
mais frequente entre os génios do que entre a população geral.
Cesare Lombroso, professor de Medicina Legal da Universidade de Turim, fez, no seu livro
The Man of Genius, uma minuciosa análise sobre os inúmeros aspectos que possam estar
envolvidos com a ocorrência de genialidade, sejam influências meteorológicas, climáticas,
hereditárias, sejam aquelas relacionadas à inserção na sociedade com os seus diversos graus de
civilidade e oportunidade. Homens ilustres dos mais variados campos do conhecimento foram
objecto do seu estudo. Assim, figuras como Comte, Rousseau, Schopenhaeur e Baudelaire foram
analisados quanto aos seus traços caracteriológicos e sintomas psicopatológicos. Segundo ele,
Baudelaire, que vinha de uma família de excêntricos, era o tipo de lunático possuído por um Délire
des Grandeurs. August Comte, o precursor do Positivismo, foi assistido durante dez anos por
Esquirol, psiquiatra francês. Lombroso cita a confissão de Rosseau: A minha imaginação nunca é
tão alegre quanto quando estou a sofrer. (…) Se eu desejar escrever bem a Primavera, tem que ser
Inverno. Goethe, ícone da literatura alemã, haveria dito que o seu carácter passa da extrema
alegria à extrema melancolia e que cada aumento no conhecimento é um aumento na dor. Para
este professor, o mais completo tipo de loucura em génios é-nos apresentado em Schopenhauer,
em quem podemos encontrar todos os sintomas característicos dos vários degraus que levam à
insanidade, da rápida passagem da profunda tristeza à alegria excessiva. Seriam todos bipolares,
Baudelaire, Comte, Goethe e Schopenhauer.
Vários estudos mostraram que escritores e compositores alternam fases de grande
inspiração com fases em que o poço seca e a imaginação esmaece. Vêem-se tomados por uma
espécie de febre criadora que faz com que obras-primas sejam produzidas como num êxtase e de
forma automática.
Existem génios conhecidos pela excentricidade, tal como Lord Byron, e aqueles
introvertidos, tímidos e, às vezes, vítimas de uma timidez patológica. Lombroso fala de Corneille,
Descartes, Vírgilio, Addison, La Fontaine, Dryden, Manzoni e Newton como génios quase incapazes
de se expressam em público. Acrescenta que os homens de inteligência excepcional são tomados
frequentemente pela ideia ou sentimento de ter uma missão a cumprir e dotados de consciência
2. Carolina Machado 11J
da própria genialidade. Victor Hugo tinha obsessão em tornar-se o maior poeta de todos os
tempos. Hegel começou um discurso com estas palavras: Devo dizer, assim como Cristo, que não
apenas ensino a verdade, mas que também Eu sou a verdade. Lombroso conclui: Todos os génios
insanos são preocupados com os seus próprios egos. Muitas vezes conhecem e proclamam as suas
doenças e parecem obter algum alívio nos seus inexoráveis ataques, confessando-os.
A ideia de que os génios nascem génios não é nova. Francis Galton, influente psicólogo do
século XIX, forneceu evidências do carácter hereditário da genialidade. Em English Men of Science,
publicado em 1874, tomou os homens da ciência como objecto de estudo e provou que 48% deles
tinham pais eminentes e 51% tiveram eles próprios filhos que se destacaram na sociedade pelos
seus atributos, talentos e habilidades.
O senso comum sempre considerou que os génios fossem pessoas altamente criativas,
dificilmente compreendidas, esquisitas, estranhas, loucas. Houve sempre uma associação entre
loucura e genialidade e, nas últimas três décadas, as pesquisas sobre o assunto intensificaram-se e
resultados que apontam para a existência desta relação têm vindo a tomar forma. Os transtornos
psíquicos não determinam nem predispõem à genialidade, mas, de facto, existe entre eles uma
relação.
Uma lista interminável de artistas célebres parece confirmar o que já se desconfiava há
muito. Vincent Van Gogh, Paul Gauguin, Lord Byron, Liev Tolstói, Serguei Rachmaninov, Piotr Ilitch
Tchaikóvski, Robert Schumann – o célebre poder criativo de todos eles caminhava lado a lado com
uma instabilidade psíquica claramente dotada de traços patológicos.
É ténue a linha que separa a genialidade da loucura. De facto, há fortes indícios de que
esta seja realmente a forma mais elevada de inteligência.
Baseado em Genialidade e Loucura, http://www.neurobiologia.org/ex_2010/14_ARTIGO_GENIO_CRIAT_BIPOLAR_vi(OK).pdf