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Ano 1 | Nº 1 | 2015 - BOLETIM INFORMATIVO CIM UNISANTOS
Uso racional dos benzodiazepínicos
Os benzodiazepínicos – BZD - são fármacos que começaram a ser
utilizadas na década de 1960, sendo o Clordiazepóxido o primeiro representante
a ser lançado. Esta classe apresenta elevada eficácia terapêutica, com baixos
riscos iniciais, o que propiciou a rápida aderência dos prescritores a esses
medicamentos (SILVA, et al, 2015; OLIVEIRA; SILVA, 2012). Nas décadas de
1970 e 1980 tornou-se a classe de medicamentos mais comum dentre as
prescritas em todo mundo (HOOD, et al, 2012). Atualmente, seguem entre os
medicamentos psicoativos mais consumidos em diferentes países no mundo
(NOTO; OPALEYE; SOUZA, 2013).
Agem no sistema do ácido gama-amino-butírico (GABA), que é o principal
sistema de neurotransmissão inibitória do sistema nervoso central. Por conta
disso, a ação dos receptores A é potencializada. Essa ação agonista acaba
provocando hiperpolarização da membrana neuronal por aumentar o influxo de
cloro. Sua ação depressora do sistema nervoso central ocorre principalmente no
córtex pré-frontal e na amígdala (COELHO et al, 2006; MOURA, 2014).
Apresentam efeito ansiolítico, tranquilizante, hipnótico, sedativo,
anticonvulsivante e miorrelaxante. São extensivamente utilizados para
tratamento da insônia, ansiedade, desordens do sono, adjuvante em terapias em
pacientes depressivos e como relaxantes musculares (BECKER.; VALÉRIO,
2014; OLIVEIRA; SILVA, 2012; VICENS, et al, 2014).
É uma classe terapêutica com estruturas químicas diversificadas, o que
confere uma farmacocinética diferenciada. São classificados: a) curta-ação de 2-
10 h (oxazepazepam, temazepam; b) média ação de 10 - 15 h (alprozalam,
bromazepam, lorazepam); e c) de longa ação de 15 - 30 h (clobazam,
clonazepam, diazepam, nitrazepam) (ARTEMENKO, 2009).
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Ano 1 | Nº 1 | 2015 - BOLETIM INFORMATIVO CIM UNISANTOS
Figura 1 – Estrutura química comum dos benzodiazepínicos
Fonte: ARTEMENKO, 2009
O uso de BZD, tanto o uso a curto quanto a longo prazo, pode afetar
múltiplas áreas da cognição, interferindo com a formação e consolidação das
memórias, mais notavelmente nas lembranças de memórias novas, induzindo
amnésia anterógrada. São frequentemente usados em idosos, nos quais seus
efeitos podem ser intensificados pela menor metabolização que esse grupo
populacional apresenta, levando a alterações cognitivas, pior desempenho motor
e aumento dos riscos de quedas. Recentemente, o uso de longo prazo tem sido
associado a demência e ao aumento da mortalidade global (MOURA, 2014;
UZUN, et al, 2010; VICENS, 2014).
Apesar de serem medicamentos seguros e de ampla utilização, podem
produzir tolerância e dependência, quando utilizados em período de tempo que
ultrapasse os seis meses de tratamento preconizados na literatura. Sendo que a
dependência pode se manifestar em quadros clínicos de dependência química,
física ou psicológica (CAPONI; MANGINI, 2014; LUGOBONI, et al, 2014).
Atualmente, essa classe possui indicações precisas para controle da ansiedade
e como tratamento adjuvante dos principais transtornos psiquiátricos, mas
continuam sendo prescritos de modo indiscriminado, tanto por psiquiatras quanto
por médicos de outras especialidades (NASTASY, 2008). Importante salientar
que, a depender da doença a ser tratada, o uso a longo prazo pode se tornar
necessário. Tem se mostrado a eficácia no uso a longo prazo para o tratamento
da síndrome do pânico e agoraphobia (BANDELOW, B. et al, 2012).
O uso a longo prazo é um fenômeno que afeta de 2% a 7,5% da população
nos países desenvolvidos (LUGOBONI, et al, 2014). Na Holanda, em 2007,
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Ano 1 | Nº 1 | 2015 - BOLETIM INFORMATIVO CIM UNISANTOS
houve mais de dez milhões de prescrições de benzodiazepínicos para 1,8
milhões de indivíduos (MOURA, 2014). Na Alemanha, o uso é restrito de 2 a 4
semanas por ano desde a década de 1980, porém, segundo projeção recente
para a cidade de Holzbach, a prevalência de abuso e dependência na população
alemã é de 5% (HOFFMANN, K., 2015). Estudos epidemiológicos mostram uma
associação entre o uso desta classe terapêutica e o aumento de acidentes de
carro (LADER, 2012; ASSARI, et al, 2014).
Ainda que existam, há décadas, dispositivos legais que dispõem sobre a
obrigatoriedade de critérios orientadores para uma prática segura de prescrição,
dispensação e uso de medicamentos, a problemática relacionada ao uso
irracional de medicamentos se mantém atual (LUZ, 2014).
No decorrer da história do consumo das substâncias psicotrópicas e
psicoativas no Brasil, tem-se buscado medidas para o controle no que concerne
ao seu uso e compra. Com esse objetivo, em 12 de maio de 1998, o ministério
da saúde aprovou a Portaria n.º 344, que é o regulamento técnico sobre
substâncias e medicamentos sujeitos a controle especial, a qual inclui os
benzodiazepínicos (ANVISA, 1988; ARRUDA et al., 2012). Esta portaria
normatiza vários parâmetros para a prescrição e venda destes produtos, como
o correto preenchimento da receita, identificação do prescritor, do fornecedor,
entre outras. Estabelece a necessidade da notificação de receita, documento
que, acompanhado da prescrição, autoriza a dispensação de medicamentos à
base de substâncias constantes nesta Portaria.
Segundo dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, no período
de 2007 a 2010, foram observadas poucas alterações nos princípios ativos de
maior consumo na população geral no país, sendo os principais deles o
clonazepam, bromazepam e alprazolam, somando mais de vinte milhões de
unidades físicas dispensadas (UFD) por ano (MOURA, 2014). Esses dados nos
revelam que, mesmo após a legislação de controle entrar em vigência, ainda há
uso indiscriminado no país, o qual segue aumentando ano a ano.
Por outro lado, a prescrição médica indevida contribui para a manutenção
do uso crônico de benzodiazepínicos. Grande parte dos consumidores recebe
prescrições de clínicos gerais ou de outras especialidades médicas, e não de
psiquiatras. A distribuição gratuita dessa classe terapêutica por programas
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Ano 1 | Nº 1 | 2015 - BOLETIM INFORMATIVO CIM UNISANTOS
governamentais, o que sem maiores medidas de controle, acaba por também
facilitar o acesso (TELLES, 2011).
Segundo Ignácio e Nardi (2007 apud NETTO; FREITAS; PEREIRA, 2011,
p. 79) o consumo acentuado dos psicotrópicos pode estar associado ao fato dos
medicamentos serem considerados uma das principais formas de cuidado
contemporâneo, podendo afastar qualquer sofrimento da sociedade atual, tais
como depressão, ansiedade, transtornos psicóticos, solidão, crises econômicas
e tristeza.
Como conclusão, é possível afirmar que esta classe de medicamentos
apresenta claro perfil de segurança, sendo raros os casos de morte por uso
excessivo. Apesar disso não justifica a prescrição indiscriminada, considerando-
se o fato de terem altas taxas de tolerância, levando a aumento de dose para
alcançar o mesmo efeito, bem como causando dependência (CASTRO, et al;
2013, MOURA; 2014, NETO; 2009). Como visto acima mesmo com medidas de
controle, o aumento do consumo segue revelando a necessidade de novas
políticas públicas, melhor formação dos profissionais envolvidos no processo,
uma ampla divulgação de protocolos e diretrizes da melhor forma de prescrição
e um trabalho junto a população visando o uso racional dos benzodiazepínicos.
Referências:
ARTEMENKO, A. G. et al. Influence of the Structure of Substituted
Benzodiazepines. Pharmaceutical Chemistry Journal., v.43, n.8, 2009.
ASSARI, S. et al. Drug use among Iranian drivers involved in fatal car
accidents. Frontiersin Psychiatry, v.5, 2014.
BANDELOW, B. et al. Guidelines for the pharmacological treatment of
anxiety disorders, obsessive – compulsive disorder and posttraumatic stress
disorder in primary care. Int. Jr. of Psych. in Clin. Pract., v.16, p.77–84, 2012.
BECKER, I.R.T.; VALÉRIO, W.R. Utilização de medicamentos
benzodiazepínicos por usuários da atenção primaria em um município do
extremo sul catarinense. Revista Inova Saúde, v.3, n.1, jul. 2014.
CAPONI, S.N.C; MANGINI, Z.A.J. Condicionantes relacionados ao uso
crônico de clonazepam no Brasil: uma história de vida. Cad. de Pesq. Interdisc.
em Cis. Hums., v.15, n.106, p. 117-139, 2014.
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Ano 1 | Nº 1 | 2015 - BOLETIM INFORMATIVO CIM UNISANTOS
COELHO, F.M.S et al. Benzodiazepínicos: uso clínico e perspectivas.
Disponivel em:
<http://www.moreirajr.com.br/revistas.asp?id_materia=3291&fase=imprime>
Acesso em: 10 de ago. 2015.
LADER, M. Benzodiazepine harm: how can it be reduced?. Br J Clin
Pharmacol, v.77, p. 295–301, 2012.
LUGOBONI, F. et al. Quality of life in a cohort of high-dose benzodiazepine
dependent
patients. Drug and Alcohol Dependence, jun. 2014.
LUZ, R. L. S. A. et al. Uso de benzodiazepínicos na Estratégia Saúde da
Família: um estudo qualitativo. Revista CFF, Jornal Infarma. v.26, e.2. 2014.
MENEZES, C.M.S et al. Synthesis, Biological Evaluation, and Structure–
activity Relationship of Clonazepam, Meclonazepam, and 1,4-Benzodiazepine
Compounds with Schistosomicidal Activity. Chem Biol Drug Des., v.79, p.943–
949, 2012.
MOURA, M. Uso de benzodiazepínicos em idosos. Brasília Med., v. 51,
n. 1, p. 36-41, 2014.
NETTO, M.U.Q; FREITAS, O.; PEREIRA, L.R.L. Estudo sobre utilização
de benzodiazepínicos e antidepressivos. Rev Ciênc Farm Básica Apl., v.33, p.
77-81, 2012.
NOTO, A.R; OPALEYE, E.S.; SOUZA, A.R.L. Contextos e padrões do uso
indevido de benzodiazepínicos entre mulheres. Cienc. & Saúde Coletiva,
p.1131-1140, 2013.
OLIVEIRA, K.R; SILVA, R.B. Estudo da utilização e promoção do uso
racional de benzodiazepínicos em uma drogaria no município de São Luiz
Gonzaga – RS. Rev. Bras. Farm., v.93, p.153-160, 2012.
SILVA, V.P. et al. Perfil epidemiológico dos usuários de
benzodiazepínicos na atenção primária a saúde. Rev. Enferm. Cent. O. Min.,
v.5, p.1393-1400, 2015.
VICENS, C. et al. Comparative efficacy of two interventions to discontinue
long-term benzodiazepine use: cluster randomised controlled trial in primary
care. Br J Psychiatry v.204, p.471–479, 2014.
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Ano 1 | Nº 1 | 2015 - BOLETIM INFORMATIVO CIM UNISANTOS
UZUN, S. et al. Side effects of treatment with benzodiazepines. Psych.
Danub., v. 22, p.90–93, 2010.
Conteúdo elaborado por Marina Maria de Oliveira, aluna
do 10º semestre do curso de Farmácia da Universidade
Católica de Santos, sob supervisão do professor doutor Paulo
Angelo Lorandi.

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Uso racional dos benzodiazepínicos

  • 1. 1 Ano 1 | Nº 1 | 2015 - BOLETIM INFORMATIVO CIM UNISANTOS Uso racional dos benzodiazepínicos Os benzodiazepínicos – BZD - são fármacos que começaram a ser utilizadas na década de 1960, sendo o Clordiazepóxido o primeiro representante a ser lançado. Esta classe apresenta elevada eficácia terapêutica, com baixos riscos iniciais, o que propiciou a rápida aderência dos prescritores a esses medicamentos (SILVA, et al, 2015; OLIVEIRA; SILVA, 2012). Nas décadas de 1970 e 1980 tornou-se a classe de medicamentos mais comum dentre as prescritas em todo mundo (HOOD, et al, 2012). Atualmente, seguem entre os medicamentos psicoativos mais consumidos em diferentes países no mundo (NOTO; OPALEYE; SOUZA, 2013). Agem no sistema do ácido gama-amino-butírico (GABA), que é o principal sistema de neurotransmissão inibitória do sistema nervoso central. Por conta disso, a ação dos receptores A é potencializada. Essa ação agonista acaba provocando hiperpolarização da membrana neuronal por aumentar o influxo de cloro. Sua ação depressora do sistema nervoso central ocorre principalmente no córtex pré-frontal e na amígdala (COELHO et al, 2006; MOURA, 2014). Apresentam efeito ansiolítico, tranquilizante, hipnótico, sedativo, anticonvulsivante e miorrelaxante. São extensivamente utilizados para tratamento da insônia, ansiedade, desordens do sono, adjuvante em terapias em pacientes depressivos e como relaxantes musculares (BECKER.; VALÉRIO, 2014; OLIVEIRA; SILVA, 2012; VICENS, et al, 2014). É uma classe terapêutica com estruturas químicas diversificadas, o que confere uma farmacocinética diferenciada. São classificados: a) curta-ação de 2- 10 h (oxazepazepam, temazepam; b) média ação de 10 - 15 h (alprozalam, bromazepam, lorazepam); e c) de longa ação de 15 - 30 h (clobazam, clonazepam, diazepam, nitrazepam) (ARTEMENKO, 2009).
  • 2. 2 Ano 1 | Nº 1 | 2015 - BOLETIM INFORMATIVO CIM UNISANTOS Figura 1 – Estrutura química comum dos benzodiazepínicos Fonte: ARTEMENKO, 2009 O uso de BZD, tanto o uso a curto quanto a longo prazo, pode afetar múltiplas áreas da cognição, interferindo com a formação e consolidação das memórias, mais notavelmente nas lembranças de memórias novas, induzindo amnésia anterógrada. São frequentemente usados em idosos, nos quais seus efeitos podem ser intensificados pela menor metabolização que esse grupo populacional apresenta, levando a alterações cognitivas, pior desempenho motor e aumento dos riscos de quedas. Recentemente, o uso de longo prazo tem sido associado a demência e ao aumento da mortalidade global (MOURA, 2014; UZUN, et al, 2010; VICENS, 2014). Apesar de serem medicamentos seguros e de ampla utilização, podem produzir tolerância e dependência, quando utilizados em período de tempo que ultrapasse os seis meses de tratamento preconizados na literatura. Sendo que a dependência pode se manifestar em quadros clínicos de dependência química, física ou psicológica (CAPONI; MANGINI, 2014; LUGOBONI, et al, 2014). Atualmente, essa classe possui indicações precisas para controle da ansiedade e como tratamento adjuvante dos principais transtornos psiquiátricos, mas continuam sendo prescritos de modo indiscriminado, tanto por psiquiatras quanto por médicos de outras especialidades (NASTASY, 2008). Importante salientar que, a depender da doença a ser tratada, o uso a longo prazo pode se tornar necessário. Tem se mostrado a eficácia no uso a longo prazo para o tratamento da síndrome do pânico e agoraphobia (BANDELOW, B. et al, 2012). O uso a longo prazo é um fenômeno que afeta de 2% a 7,5% da população nos países desenvolvidos (LUGOBONI, et al, 2014). Na Holanda, em 2007,
  • 3. 3 Ano 1 | Nº 1 | 2015 - BOLETIM INFORMATIVO CIM UNISANTOS houve mais de dez milhões de prescrições de benzodiazepínicos para 1,8 milhões de indivíduos (MOURA, 2014). Na Alemanha, o uso é restrito de 2 a 4 semanas por ano desde a década de 1980, porém, segundo projeção recente para a cidade de Holzbach, a prevalência de abuso e dependência na população alemã é de 5% (HOFFMANN, K., 2015). Estudos epidemiológicos mostram uma associação entre o uso desta classe terapêutica e o aumento de acidentes de carro (LADER, 2012; ASSARI, et al, 2014). Ainda que existam, há décadas, dispositivos legais que dispõem sobre a obrigatoriedade de critérios orientadores para uma prática segura de prescrição, dispensação e uso de medicamentos, a problemática relacionada ao uso irracional de medicamentos se mantém atual (LUZ, 2014). No decorrer da história do consumo das substâncias psicotrópicas e psicoativas no Brasil, tem-se buscado medidas para o controle no que concerne ao seu uso e compra. Com esse objetivo, em 12 de maio de 1998, o ministério da saúde aprovou a Portaria n.º 344, que é o regulamento técnico sobre substâncias e medicamentos sujeitos a controle especial, a qual inclui os benzodiazepínicos (ANVISA, 1988; ARRUDA et al., 2012). Esta portaria normatiza vários parâmetros para a prescrição e venda destes produtos, como o correto preenchimento da receita, identificação do prescritor, do fornecedor, entre outras. Estabelece a necessidade da notificação de receita, documento que, acompanhado da prescrição, autoriza a dispensação de medicamentos à base de substâncias constantes nesta Portaria. Segundo dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, no período de 2007 a 2010, foram observadas poucas alterações nos princípios ativos de maior consumo na população geral no país, sendo os principais deles o clonazepam, bromazepam e alprazolam, somando mais de vinte milhões de unidades físicas dispensadas (UFD) por ano (MOURA, 2014). Esses dados nos revelam que, mesmo após a legislação de controle entrar em vigência, ainda há uso indiscriminado no país, o qual segue aumentando ano a ano. Por outro lado, a prescrição médica indevida contribui para a manutenção do uso crônico de benzodiazepínicos. Grande parte dos consumidores recebe prescrições de clínicos gerais ou de outras especialidades médicas, e não de psiquiatras. A distribuição gratuita dessa classe terapêutica por programas
  • 4. 4 Ano 1 | Nº 1 | 2015 - BOLETIM INFORMATIVO CIM UNISANTOS governamentais, o que sem maiores medidas de controle, acaba por também facilitar o acesso (TELLES, 2011). Segundo Ignácio e Nardi (2007 apud NETTO; FREITAS; PEREIRA, 2011, p. 79) o consumo acentuado dos psicotrópicos pode estar associado ao fato dos medicamentos serem considerados uma das principais formas de cuidado contemporâneo, podendo afastar qualquer sofrimento da sociedade atual, tais como depressão, ansiedade, transtornos psicóticos, solidão, crises econômicas e tristeza. Como conclusão, é possível afirmar que esta classe de medicamentos apresenta claro perfil de segurança, sendo raros os casos de morte por uso excessivo. Apesar disso não justifica a prescrição indiscriminada, considerando- se o fato de terem altas taxas de tolerância, levando a aumento de dose para alcançar o mesmo efeito, bem como causando dependência (CASTRO, et al; 2013, MOURA; 2014, NETO; 2009). Como visto acima mesmo com medidas de controle, o aumento do consumo segue revelando a necessidade de novas políticas públicas, melhor formação dos profissionais envolvidos no processo, uma ampla divulgação de protocolos e diretrizes da melhor forma de prescrição e um trabalho junto a população visando o uso racional dos benzodiazepínicos. Referências: ARTEMENKO, A. G. et al. Influence of the Structure of Substituted Benzodiazepines. Pharmaceutical Chemistry Journal., v.43, n.8, 2009. ASSARI, S. et al. Drug use among Iranian drivers involved in fatal car accidents. Frontiersin Psychiatry, v.5, 2014. BANDELOW, B. et al. Guidelines for the pharmacological treatment of anxiety disorders, obsessive – compulsive disorder and posttraumatic stress disorder in primary care. Int. Jr. of Psych. in Clin. Pract., v.16, p.77–84, 2012. BECKER, I.R.T.; VALÉRIO, W.R. Utilização de medicamentos benzodiazepínicos por usuários da atenção primaria em um município do extremo sul catarinense. Revista Inova Saúde, v.3, n.1, jul. 2014. CAPONI, S.N.C; MANGINI, Z.A.J. Condicionantes relacionados ao uso crônico de clonazepam no Brasil: uma história de vida. Cad. de Pesq. Interdisc. em Cis. Hums., v.15, n.106, p. 117-139, 2014.
  • 5. 5 Ano 1 | Nº 1 | 2015 - BOLETIM INFORMATIVO CIM UNISANTOS COELHO, F.M.S et al. Benzodiazepínicos: uso clínico e perspectivas. Disponivel em: <http://www.moreirajr.com.br/revistas.asp?id_materia=3291&fase=imprime> Acesso em: 10 de ago. 2015. LADER, M. Benzodiazepine harm: how can it be reduced?. Br J Clin Pharmacol, v.77, p. 295–301, 2012. LUGOBONI, F. et al. Quality of life in a cohort of high-dose benzodiazepine dependent patients. Drug and Alcohol Dependence, jun. 2014. LUZ, R. L. S. A. et al. Uso de benzodiazepínicos na Estratégia Saúde da Família: um estudo qualitativo. Revista CFF, Jornal Infarma. v.26, e.2. 2014. MENEZES, C.M.S et al. Synthesis, Biological Evaluation, and Structure– activity Relationship of Clonazepam, Meclonazepam, and 1,4-Benzodiazepine Compounds with Schistosomicidal Activity. Chem Biol Drug Des., v.79, p.943– 949, 2012. MOURA, M. Uso de benzodiazepínicos em idosos. Brasília Med., v. 51, n. 1, p. 36-41, 2014. NETTO, M.U.Q; FREITAS, O.; PEREIRA, L.R.L. Estudo sobre utilização de benzodiazepínicos e antidepressivos. Rev Ciênc Farm Básica Apl., v.33, p. 77-81, 2012. NOTO, A.R; OPALEYE, E.S.; SOUZA, A.R.L. Contextos e padrões do uso indevido de benzodiazepínicos entre mulheres. Cienc. & Saúde Coletiva, p.1131-1140, 2013. OLIVEIRA, K.R; SILVA, R.B. Estudo da utilização e promoção do uso racional de benzodiazepínicos em uma drogaria no município de São Luiz Gonzaga – RS. Rev. Bras. Farm., v.93, p.153-160, 2012. SILVA, V.P. et al. Perfil epidemiológico dos usuários de benzodiazepínicos na atenção primária a saúde. Rev. Enferm. Cent. O. Min., v.5, p.1393-1400, 2015. VICENS, C. et al. Comparative efficacy of two interventions to discontinue long-term benzodiazepine use: cluster randomised controlled trial in primary care. Br J Psychiatry v.204, p.471–479, 2014.
  • 6. 6 Ano 1 | Nº 1 | 2015 - BOLETIM INFORMATIVO CIM UNISANTOS UZUN, S. et al. Side effects of treatment with benzodiazepines. Psych. Danub., v. 22, p.90–93, 2010. Conteúdo elaborado por Marina Maria de Oliveira, aluna do 10º semestre do curso de Farmácia da Universidade Católica de Santos, sob supervisão do professor doutor Paulo Angelo Lorandi.