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HOMILIA PARA O SEGUNDO DOMINGO DO TEMPO COMUM B - 2009
          “Fala, Senhor, que teu servo escuta (1Sm 3,10)”.
          O que é uma “vocação”, como é que ela acontece, e quais são as suas
conseqüências? A resposta à primeira pergunta é simples: Vocare em latim significa
“chamar”. Uma vocação é alguém chamando uma outra pessoa. A vocação é um “oi!”, um
“olá”, um “ó de casa”.
          No seu contexto religioso, quem chama é Deus. E quem Ele chama? Quem Ele
quiser. Pode ser um indivíduo, como na primeira leitura da Missa de hoje; pode ser um
pequeno grupo, como acabamos de escutar no Evangelho, ou pode ser todo um povo. Israel
recebeu a vocação de ser o povo escolhido, o povo de Deus, e séculos depois a Igreja foi
chamada para tornar-se o povo de Deus ampliado – um novo povo de Deus, composto tanto
de judeus quanto de pagãos.
          Mas como é que isto acontece? Como ter certeza que é Deus mesmo que me chama,
em vez da minha imaginação, minhas circunstâncias, minhas necessidades psicológicas? Esta
é a parte mais bonita e mais misteriosa. No texto que ouvimos do primeiro livro de Samuel,
temos a descrição de uma vocação em “câmera rápida”. Todos nós sabemos o que significa
“câmera lenta”; então, deve também existir o contrário: um relato onde tudo é apresentado de
uma maneira muito acelerada, onde os eventos são apertados dentro um espaço pequeno de
tempo. Assim acontece com a vocação de Samuel. Ainda menino, três vezes na mesma noite
ele escuta uma voz desconhecida chamando-o por seu nome, e na última vez, com a ajuda do
sacerdote Eli, ele entende que aquele que o chama não é gente, mas o próprio Deus.
          Há muita verdade espiritual neste relato, muitos detalhes de grande significado. É só
questão de diminuir o compasso, de passar de presto para andante, quer dizer: de muito
rápido para devagar. Tirando esta pressa, o que fica? Como lemos na história de Samuel,
normalmente uma vocação não é compreendida a primeira vez que Deus fala. A gente escuta
uma voz, certo, mas não sabe quem está chamando; às vezes duvidamos que a chamada seja
realmente para nós; chegamos a desligar o telefone. Esta voz, aliás, não precisa ser uma voz
audível – um som. Nós nos lembramos que neste caso é Deus que está falando e ele é mestre
de todos os meios e maneiras de comunicar. Poderia ser a experiência de um pôr-do-sol fora
de série, ou de uma noite intensamente estrelada; poderia ser a sensação inesperada de uma
tremenda alegria sem estímulo concreto; poderia ser uma intuição da grandeza do universo e
do maior grandeza daquele que o fez; poderia ser uma nova convicção do que a vida não é
nada banal, mas sim de imenso, imenso valor.
          De todas estas maneiras, Deus é capaz de chamar a nossa atenção, de chamar o
nosso nome: “Samuel, Samuel”. Este detalhe é indispensável. Quando Deus fala, nós nos
experimentamos como abordados, atingidos. Esta voz é um dedo que penetra todas as
camadas do meu ser e mexe com meu coração. Há uma única palavra que nos comove
totalmente, que consegue unificar toda a nossa atenção. Esta palavra é nosso nome. Pensemos
em todos os momentos mais fortes do Evangelho quando Jesus tem algo de suprema
importância para comunicar: ele sempre começa com o nome da pessoa: Simão, Marta,
Lázaro. E talvez o momento mais belo entre eles é quando ele diz à mulher chorando ao
túmulo: Maria.
          Não é apenas coincidência que Deus nos chame à noite. O que é noite? A noite é um
outro mundo; um mundo de menos clareza e mais vulnerabilidade, de menos visibilidade para
os contornos concretos das coisas e mais abertura para o mistério da existência. Tempo de
sono e sonho, de poesia e de revelação. Normalmente Deus não nos chama ao meio-dia. Com
muito maior probabilidade, ele chama à meia-noite. A noite lhe oferece uma fresta, uma
brecha; as nossas defesas são mais baixas. Podemos escutar no silêncio da noite o que o
barulho do dia torna inaudível. Mas igualmente na manhã seguinte, podemos perguntar se



                                              1
“algo realmente aconteceu”, se tudo não passou de uma coisa da noite. E geralmente as coisas
vão assim.
           Passam alguns meses. Quem sabe, alguns anos. Nunca perdemos completamente a
impressão daquela experiência; ela nunca nos deixou, mas não conseguimos entender quem
falava ou qual foi o recado. E então, por uma segunda vez (não na mesma noite, mas um bom
tempo depois), Deus entra pela janela de nosso quarto, fica sentado ao pé de nossa cama, e de
novo, pronuncia o nosso nome: Samuel, Samuel. Percebemos que estamos na presença de um
alguém muito, muito especial e bom, bom, bom. Seria um anjo? O espírito de um ente querido
falecido? Não, é mais do que isso, só que não sabemos qual seria o nome certo para dar a este
ser. Ele bem sabe o nosso nome: veja com quanta liberdade e bondade ele o pronuncia; mas
nós nem temos uma noção de como ele se chama. Somos como Jacó que grita em sua luta
corpo a corpo com Deus: Diz-me o teu nome. E Deus responde: Como posso revelar o meu
nome, que é maravilhoso? Ele foge, e nós cedemos de novo ao peso de nosso sono. “Volta a
dormir, meu filho”.
           Mas não somos destinados a repetir para sempre a mesma experiência. Os outros
momentos, os outros apelos, as outras palavras – Samuel, Samuel – não caíram por terra.
Nasceu em nós uma sabedoria, uma intuição, um “Eli” – nome que em hebraico significa:
“Meu Deus.” Eli nos explica que é “Meu Deus” quem está chamando a gente, e se por sorte
Ele chamar uma terceira vez – quantos anos temos agora: vinte, vinte e cinco, trinta,
quarenta? – devemos ter uma resposta preparada. Qual resposta seria esta? Eu te conheço, eu
te ouço, eu te aceito, eu te obedeço. Quando se trata de uma verdadeira vocação, Aquele que
um dos hinos em nosso hinário intitula “Beleza dos céus” vem de novo e nos cria, ao
pronunciar o nosso nome: Samuel, Samuel. Se for Deus, ou se não for, quem saberia com cem
por cento de segurança neste momento? Mas sabemos que este é o momento de arriscar tudo,
apostar tudo, e tremendo de esperança, respondemos: “Fala Senhor, o teu servo escuta”.
           As Escrituras não contam o que Deus falou a Samuel naquela noite; nenhum texto
escrito é capaz de transmitir o que Deus fala a um coração humano. O que sabemos é que
desde aquele momento, Samuel crescia e o Senhor estava com ele. Esta é vocação. O Senhor
está com a gente, a gente está com o Senhor e, em conseqüência, a gente começa a tornar-se
grande interiormente com a grandeza de Deus. Como para Maria, Mãe de Deus, as palavras
que Deus lhe dirige são o tesouro dos tesouros. Ele as medita dentro de si; nenhuma delas cai
por terra.
           Mas para que Deus chamou Samuel? Qual é a sua vocação? Não, não é isto.
Vocação não é ser chamado para tornar-se profeta, apóstolo, missionário, vidente. Vocação
quer dizer: escutar e abraçar a verdade que Deus me quer para si, que Ele me separou para si...
desde o ventre materno, se a Bíblia não mente. Samuel, Samuel. Fala Senhor, teu servo
escuta. Este diálogo nunca terá fim, nunca cansará. Quem tem ouvidos, ouça.


por D. Bernardo Bonowitz
Mosteiro Trapista Nossa Senhora do Novo Mundo
Campo do Tenente, PR




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Vocação: Escutar a Chamada de Deus

  • 1. HOMILIA PARA O SEGUNDO DOMINGO DO TEMPO COMUM B - 2009 “Fala, Senhor, que teu servo escuta (1Sm 3,10)”. O que é uma “vocação”, como é que ela acontece, e quais são as suas conseqüências? A resposta à primeira pergunta é simples: Vocare em latim significa “chamar”. Uma vocação é alguém chamando uma outra pessoa. A vocação é um “oi!”, um “olá”, um “ó de casa”. No seu contexto religioso, quem chama é Deus. E quem Ele chama? Quem Ele quiser. Pode ser um indivíduo, como na primeira leitura da Missa de hoje; pode ser um pequeno grupo, como acabamos de escutar no Evangelho, ou pode ser todo um povo. Israel recebeu a vocação de ser o povo escolhido, o povo de Deus, e séculos depois a Igreja foi chamada para tornar-se o povo de Deus ampliado – um novo povo de Deus, composto tanto de judeus quanto de pagãos. Mas como é que isto acontece? Como ter certeza que é Deus mesmo que me chama, em vez da minha imaginação, minhas circunstâncias, minhas necessidades psicológicas? Esta é a parte mais bonita e mais misteriosa. No texto que ouvimos do primeiro livro de Samuel, temos a descrição de uma vocação em “câmera rápida”. Todos nós sabemos o que significa “câmera lenta”; então, deve também existir o contrário: um relato onde tudo é apresentado de uma maneira muito acelerada, onde os eventos são apertados dentro um espaço pequeno de tempo. Assim acontece com a vocação de Samuel. Ainda menino, três vezes na mesma noite ele escuta uma voz desconhecida chamando-o por seu nome, e na última vez, com a ajuda do sacerdote Eli, ele entende que aquele que o chama não é gente, mas o próprio Deus. Há muita verdade espiritual neste relato, muitos detalhes de grande significado. É só questão de diminuir o compasso, de passar de presto para andante, quer dizer: de muito rápido para devagar. Tirando esta pressa, o que fica? Como lemos na história de Samuel, normalmente uma vocação não é compreendida a primeira vez que Deus fala. A gente escuta uma voz, certo, mas não sabe quem está chamando; às vezes duvidamos que a chamada seja realmente para nós; chegamos a desligar o telefone. Esta voz, aliás, não precisa ser uma voz audível – um som. Nós nos lembramos que neste caso é Deus que está falando e ele é mestre de todos os meios e maneiras de comunicar. Poderia ser a experiência de um pôr-do-sol fora de série, ou de uma noite intensamente estrelada; poderia ser a sensação inesperada de uma tremenda alegria sem estímulo concreto; poderia ser uma intuição da grandeza do universo e do maior grandeza daquele que o fez; poderia ser uma nova convicção do que a vida não é nada banal, mas sim de imenso, imenso valor. De todas estas maneiras, Deus é capaz de chamar a nossa atenção, de chamar o nosso nome: “Samuel, Samuel”. Este detalhe é indispensável. Quando Deus fala, nós nos experimentamos como abordados, atingidos. Esta voz é um dedo que penetra todas as camadas do meu ser e mexe com meu coração. Há uma única palavra que nos comove totalmente, que consegue unificar toda a nossa atenção. Esta palavra é nosso nome. Pensemos em todos os momentos mais fortes do Evangelho quando Jesus tem algo de suprema importância para comunicar: ele sempre começa com o nome da pessoa: Simão, Marta, Lázaro. E talvez o momento mais belo entre eles é quando ele diz à mulher chorando ao túmulo: Maria. Não é apenas coincidência que Deus nos chame à noite. O que é noite? A noite é um outro mundo; um mundo de menos clareza e mais vulnerabilidade, de menos visibilidade para os contornos concretos das coisas e mais abertura para o mistério da existência. Tempo de sono e sonho, de poesia e de revelação. Normalmente Deus não nos chama ao meio-dia. Com muito maior probabilidade, ele chama à meia-noite. A noite lhe oferece uma fresta, uma brecha; as nossas defesas são mais baixas. Podemos escutar no silêncio da noite o que o barulho do dia torna inaudível. Mas igualmente na manhã seguinte, podemos perguntar se 1
  • 2. “algo realmente aconteceu”, se tudo não passou de uma coisa da noite. E geralmente as coisas vão assim. Passam alguns meses. Quem sabe, alguns anos. Nunca perdemos completamente a impressão daquela experiência; ela nunca nos deixou, mas não conseguimos entender quem falava ou qual foi o recado. E então, por uma segunda vez (não na mesma noite, mas um bom tempo depois), Deus entra pela janela de nosso quarto, fica sentado ao pé de nossa cama, e de novo, pronuncia o nosso nome: Samuel, Samuel. Percebemos que estamos na presença de um alguém muito, muito especial e bom, bom, bom. Seria um anjo? O espírito de um ente querido falecido? Não, é mais do que isso, só que não sabemos qual seria o nome certo para dar a este ser. Ele bem sabe o nosso nome: veja com quanta liberdade e bondade ele o pronuncia; mas nós nem temos uma noção de como ele se chama. Somos como Jacó que grita em sua luta corpo a corpo com Deus: Diz-me o teu nome. E Deus responde: Como posso revelar o meu nome, que é maravilhoso? Ele foge, e nós cedemos de novo ao peso de nosso sono. “Volta a dormir, meu filho”. Mas não somos destinados a repetir para sempre a mesma experiência. Os outros momentos, os outros apelos, as outras palavras – Samuel, Samuel – não caíram por terra. Nasceu em nós uma sabedoria, uma intuição, um “Eli” – nome que em hebraico significa: “Meu Deus.” Eli nos explica que é “Meu Deus” quem está chamando a gente, e se por sorte Ele chamar uma terceira vez – quantos anos temos agora: vinte, vinte e cinco, trinta, quarenta? – devemos ter uma resposta preparada. Qual resposta seria esta? Eu te conheço, eu te ouço, eu te aceito, eu te obedeço. Quando se trata de uma verdadeira vocação, Aquele que um dos hinos em nosso hinário intitula “Beleza dos céus” vem de novo e nos cria, ao pronunciar o nosso nome: Samuel, Samuel. Se for Deus, ou se não for, quem saberia com cem por cento de segurança neste momento? Mas sabemos que este é o momento de arriscar tudo, apostar tudo, e tremendo de esperança, respondemos: “Fala Senhor, o teu servo escuta”. As Escrituras não contam o que Deus falou a Samuel naquela noite; nenhum texto escrito é capaz de transmitir o que Deus fala a um coração humano. O que sabemos é que desde aquele momento, Samuel crescia e o Senhor estava com ele. Esta é vocação. O Senhor está com a gente, a gente está com o Senhor e, em conseqüência, a gente começa a tornar-se grande interiormente com a grandeza de Deus. Como para Maria, Mãe de Deus, as palavras que Deus lhe dirige são o tesouro dos tesouros. Ele as medita dentro de si; nenhuma delas cai por terra. Mas para que Deus chamou Samuel? Qual é a sua vocação? Não, não é isto. Vocação não é ser chamado para tornar-se profeta, apóstolo, missionário, vidente. Vocação quer dizer: escutar e abraçar a verdade que Deus me quer para si, que Ele me separou para si... desde o ventre materno, se a Bíblia não mente. Samuel, Samuel. Fala Senhor, teu servo escuta. Este diálogo nunca terá fim, nunca cansará. Quem tem ouvidos, ouça. por D. Bernardo Bonowitz Mosteiro Trapista Nossa Senhora do Novo Mundo Campo do Tenente, PR 2