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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO”
            FACULDADE DE ARQUITETURA, ARTES E COMUNICAÇÃO




                           “JAÚ EM RITMO DE BAILE”
     RECONSTITUIÇÃO JORNALÍSTICA DA HISTÓRIA DAS ORQUESTRAS
                      CONTINENTAL E CAPELOZZA DE JAÚ




                           LUÍS HENRIQUE MARQUES


                     ORIENTADOR: MURILO CÉSAR SOARES




Projeto experimental apresentado ao Departamento de Comunicação Social da Faculdade
de Arquitetura, Artes e Comunicação - Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita
Filho” - para obtenção do grau em Bacharel em Comunicação Social, habilitação em
Jornalismo de acordo com a Resolução número 002/84 do Conselho Federal de
Educação.




                                     Bauru, 1991.
2




                         Orientando: Luís Henrique Marques


 Orientador: Murilo César Soares, do Departamento de Ciências Humanas da Faculdade
de Arquitetura, Artes e Comunicação - Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita
                               Filho” - campus de Bauru
3




                                    Agradecimento


  A todos que colaboraram com este trabalho, em especial ao professor Murilo, pelo
entusiasmo com que se dispôs a orientar-me e aos ex-integrantes das orquestras por tudo
                           que aprendi com cada um deles.
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A minha família, em especial, aos meus pais, Bruno e Carmem.
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                                                               Índice
1. Introdução ..............................................................................................................
2. Jaú em um retrato dos anos 50 ..............................................................................
2.1 A “Terra das Tradições” ......................................................................................
2.2 A Intensa vida cultural ........................................................................................
3. Música: o que há de melhor entre as tradições do Jahu ........................................
3.1 Jazz-band: um produto “made in USA” ..............................................................
3.2 Tudo começou... ..................................................................................................
3.3 A cada apresentação, aumenta a popularidade ....................................................
3.4 Lps: uma nova experiência ..................................................................................
3.5 Dificuldades comprometem o futuro ...................................................................
4. “Tunin e Dante” ....................................................................................................
5. “Sabu” ...................................................................................................................
6. “Roberto Pavan” ....................................................................................................
7. O Baile ...................................................................................................................
8. “Waldomiro de Oliveira” ......................................................................................
9. “Danilo Fornalé” ...................................................................................................
10. “Constante Ometto” ............................................................................................
11. Jaú: a música hoje ...............................................................................................
12. Relatório sobre a reportagem “Jaú em ritmo de baile” .......................................
13. Bibliografia ..........................................................................................................
6


INTRODUÇÃO


       Cobrir uma lacuna na história de Jaú pode parecer muita pretensão. Mesmo assim,
é precisamente esse o intuito dessa reportagem.
       As Orquestras Continental e Capelozza de Jaú (SP), cujo período de existência
data, aproximadamente, de 1940 a 1970, alcançaram um surpreendente sucesso junto ao
público do Estado de São Paulo e de, pelo menos, mais cinco Estados do Brasil. Porém,
hoje em dia, pouca gente sabe disso, sobretudo entre os mais jovens.
       É fato que pouco se tem organizado e arquivado acerca das duas orquestras,
autênticos patrimônios histórico-musicais de Jaú.
       Desse modo, este trabalho de reportagem visa cobrir essa lacuna, tornando-se o
primeiro material organizado, a contar, em linguagem jornalística, a história das jazz-
bands Continental e Capelozza.
       A reportagem que se segue tem ainda como objetivo servir de subsídio para
estudos futuros, não só em relação a história das próprias orquestras, bem como em
relação ao significado social do baile nesse período, de 1940 a 1970.
       E é claro, apesar de se tratar de um trabalho jornalístico, portanto, crítico, não
deixa de ser uma homenagem aos antigos músicos e ex-integrantes da Capelozza e
Continental.
       É fundamental que, pelo menos, se cite e agradeça a colaboração de todos os
músicos e outras pessoas (o público da época) que, por razões técnicas, não mereceram
um espaço maior nesta reportagem. Gostaria de poder citá-los todos. Entretanto, é
inevitável que se deixe alguém de lado. Afinal, muita gente passou pelas orquestras de
Jaú. Gente que é viva e mora na cidade, mas também muitos que já faleceram ou que,
atualmente, não moram mais em Jaú. A todos, obrigado e também minhas desculpas se
cometi alguma injustiça.
       Mexer com o passado, como ficará demonstrado, é mexer com as tradições e
costumes antigos. Portanto, existe uma grande diferença entre mim e os meus
entrevistados. Trata-se de nada menos que algumas décadas... Contudo, quando se
entrevista alguém, como se acostuma afirmar na gíria, é preciso “entrar na dele”. Só é
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possível entender alguém para depois questioná-lo, se se entender o porquê de sua forma
de pensar. Por isso, procurei mergulhar no passado para poder compreender melhor essas
pessoas.
       E o fruto desse trabalho, nesses moldes, não se resume a apenas uma boa
reportagem. Nem aprende-se a ver o quão atrasadas, sob certos aspectos, eram as pessoas
nos anos 50. Aprende-se, portanto, a ver também o que tinham de positivo. Parece óbvio,
entretanto, ver o positivo nas coisas não é uma atitude comum nos nossos dias. E não
seria isso, por um acaso, o que está faltando, hoje, à imprensa em geral?
                                                                            o AUTOR
8




JAÚ EM UM RETRATO DOS ANOS 50
9


         15 de agosto de 1953. Já se passaram 100 anos desde que foi rezada a primeira
missa na pequena capela dedicada à Nossa Senhora do Patrocínio, a partir de então,
padroeira da cidade que estava nascendo.
         Jaú ou o Jahu, como preferem os mais antigos, está diferente. Cresceu... mas nem
tanto.
         Capital do Calçado Feminino, Capital da Terra Roxa, Terra de João Ribeiro de
Barros. Títulos não faltam. O jauense parece gostar dessas coisas. Talvez a sua marca
registrada seja, precisamente, o culto ao passado e seus heróis.
         E aqui reside um desafio: descobrir em meio a tantos adjetivos e superlativos o
que existe de mais substantivo na história de duas “personagens ilustres do Jahu”: as
Orquestras Continental e Capelozza.
         Como que por etapas, caro leitor, observe melhor essa cidade. Após 100 anos de
fundação, Jaú, apesar de inegáveis progressos que sua privilegiada situação econômica
tem proporcionado a sua população até aqui, em certo sentido, não evoluiu muito.
         Por outro lado, com apenas quarenta mil habitantes (incluindo o Distrito de
Potunduva), ela dispõe de benefícios de deixar muita cidade grande deste País de queixo
caído: foi uma das primeiras cidades do Brasil a contar com iluminação elétrica,
pavimentação de ruas e praças e sistema de ligação automática dos serviços telefônicos.
A base econômica que lhe permitiu esse e outros privilégios em sua infra-estrutura foi o
plantio de cana-de-açúcar e do café, além da indústria do calçado, especificamente, o
calçado feminino. Por isso, recebeu os títulos de Capital do Calçado Feminino e Capital
da Terra Roxa (solo propício, sobretudo, para a cultura do café).
         Agora, do que o povo jauense parece gostar mesmo é do título de Terra de João
Ribeiro de Barros. Não há quem não estufe o peito e encha a boca ao narrar a façanha do
aviador jauense, o primeiro a atravessar o Oceano Atlântico em um avião. Um ato
heróico, sem dúvida, principalmente se o leitor der uma espiada no hidroavião “Jahu”,
exposto no Museu da Aeronáutica, em São Paulo. Como alguém poderia voar em um
negócio daqueles?
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“Terra das Tradições”


        O sentimento ufanista é uma provável conseqüência da rígida e tradicional
maneira de agir e pensar desse povo. Há outras, contudo.
        Observe agora, um pouco desse comportamento. Para começar, dê uma olhada
como, nessas bandas, se encara o namoro. Só pra dar uma primeira idéia: pegar na mão,
só depois de seis meses! Beijar então, de cara, nem pensar! Chegar tarde em casa, fora de
cogitação! Se a moça não quiser ficar pra fora de casa (com exceção aos dias de baile),
ela deve entrar, impreterivelmente, às dez da noite! (Hoje, em dia, em pleno final do
século 20, não dá pra imaginar uma coisa dessas!...)
        Mas, um momento! Pode parecer que só em Jaú as coisas sejam assim, o que não
é verdade. Trata-se de um comportamento comum a toda a sociedade brasileira, cuja base
é a família patriarcal, envolvida por um forte sentimento religioso. Afinal, estamos nos
anos 50!
        E quanto ao preconceito racial? Não, ele não existe. Pelo menos é o que querem
demonstrar as pessoas. Sabe como é: “cabeça aberta” dá uma boa imagem... E isso o povo
adora. É, mas, na realidade, a coisa é bem diferente... Quem não ouviu falar que, em Jaú,
na Praça da República (o Jardim de Cima), brancos e pretos não circulam pelo mesmo
lado? Na verdade, os pretos nem chegam a andar na praça propriamente dita. Restringem-
se às suas calçadas laterais. Os negros, inclusive, possuem um clube só deles. O baile no
“Luiz Gama” é contudo, apreciado por todos, brancos e negros. Mas o preconceito
sobrevive. Talvez cada vez menos em atitudes externas, mas, com certeza, na cabeça das
pessoas: “Preto quando não suja na entrada, suja na saída”.
        E isso não é tudo. Mais que a cor, o que realmente conta é se você é filho (ou pelo
menos parente) do fulano ou do ciclano de tal. Sim, porque a partir daí é que você pode
ter uma noção mais precisa de quanto você é mais ou menos valorizado na cidade. Se
você tem o nome da família tal, você tem mais valor, seja porque essa família tem
dinheiro, seja porque tem prestígio político. Ou como acontece, em geral, porque tem os
dois.
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       As famílias ricas, defensoras da tradição, moral e bons costumes, permanecem de
mãos dadas com o poder público e religioso (quando não se confundem com os mesmos)
e ditam a ordem social vigente, bem como os modelos sociais a serem seguidos. Um dado
complementar: a maioria esmagadora dos habitantes é cristã, de confissão católica
romana.
       Os exemplos que tecem esse quadro seguiriam longe. Cito apenas mais um. Para
cada classe social, existe um clube recreativo: o “Jaú Clube” para os ricos; o “Aero
Clube” e o “Grêmio Paulista” para a classe média, e o “Clube Dansante Operário” (1)
para os mais pobres. É evidente que essa divisão não é precisa. Contudo, o que importa é
notar o quanto ela pode determinar o comportamento social. Por exemplo: um jovem de
família rica até pode ir ao baile no “Operário”, mas isso não iria pegar muito bem...
       Talvez, nesse sentido - o de estar atrelada a tradicionalismos e preconceitos -, é
que Jaú não tenha evoluído tanto nesses últimos 100 anos.


Intensa vida cultural


       Dando uma folga às tradições, é possível notar evidentes qualidades no povo de
Jaú. Essa pequena cidade do interior paulista, 341 quilômetros distante da capital São
Paulo, é um aquecido centro de manifestações culturais. Independente quanto tais
manifestações são ideologicamente válidas ou não, o que é importante constatar é que são
muitas e variadas. Um dado, no mínimo interessante, se o compararmos ao porte de Jaú.
       É José Fernandes (2) quem descreve esses dados de forma minuciosa: “Há dois
cinemas, sendo o Cine-Jaú, o principal, pois funciona em grande edifício de propriedade
da Empresa Teatral Pedutti, com capacidade para cerca de duas mil pessoas. O outro é o
Acadêmico, com amplo salão para espetáculos teatrais e conferências”. A cidade conta
ainda com: Casa da Cultura, Clube de Amadores Fotográficos, Clube de Xadrez, a
Corporação Musical “Carlos Gomes” (3), o Conservatório Jauense de Música, um núcleo
da Associação Paulista de Escritores, além de 10 bibliotecas, 4 das quais localizadas em
escolas.
12


       Sobre a imprensa e rádio, Fernandes escreve: “Há na cidade dois jornais diários: o
‘Comércio do Jahu’ e o ‘Correio da Manhã de Jaú’. A difusora local, a PRG7 que irradia
em onda 1010 kcs, foi instalada em 1934”. (4)
       No esporte, o futebol é a modalidade privilegiada. Além do Esporte Clube XV de
Novembro (profissional), que conta com estádio próprio, o “Arthur Simões” (5), cuja
capacidade é para 12 mil pessoas, Jaú possui vários clubes amadores. Os principais são
A. A. Palmeiras, A. C. Guarani e o A. C. Gráficos.
       Tudo isso mais as orquestras Continental e Líder. (6)




Notas
(1) Observe que a grafia da época para dançante era feita com “s” e não com “ç”, como
atualmente se utiliza.
(2) FERNANDES, José. Vultos e fatos da História de Jaú. Edição conjunta
extraordinária do Correio da Noroeste, Correio da Capital, Correio de Garça,
comemorativa do centenário de Jaú, São Paulo, 1955.
(3) A Corporação Musical “Carlos Gomes”, uma banda de coreto, no ano de 1991,
portanto, por ocasião da elaboração deste trabalho, completou 100 anos de existência.
(4) A rádio emissora PRG7 a que refere-se o texto é a Rádio Jauense AM, em
funcionamento até hoje.
(5) O estádio do E. C. XV de Novembro de Jaú, “Arthur Simões” foi substituído pelo
atual, “Zezinho Magalhães”.
(6) Líder Orquestra foi o nome que recebeu a orquestra fundada pelos irmãos Capelozza
logo após o seu retorno a Jaú, a qual, depois, passou a se chamar Capelozza e sua
Orquestra.
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A MÚSICA: O QUE HÁ DE MELHOR ENTRE AS TRADIÇÕES DO JAHU
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       Vaidades a parte, é quando a noite de sábado se aproxima que a cidade parece se
inebriar de um clima novo, diferente. É quando as pessoas demonstram seu lado poético,
romântico. Sábado é dia de baile e, precisamente por isso, tudo parece mudar...
       Na pomposidade do “Jaú Clube” ou na simplicidade do “Operário”, o baile em
Jaú parece conduzir magicamente as pessoas ao mundo dos sonhos. Alguém chamou essa
fase de “anos dourados”. Para os jovens, moças e rapazes, é o que parece: esses anos 50,
devido ao romantismo, são chamados os “anos dourados”.
       E o baile é o momento romântico por excelência. Agora, enquanto os jovens
dançam “sobre as nuvens”, tem gente que dá um duro danado para fazer do baile esse
momento especial. Cabe aos músicos da orquestra (a jazz-band) garantir, através da
suavidade de suas notas, esse clima que envolve o público.


Jazz-band: um produto “made in USA”


       Jazz-band, crooner, fox-trote, ok! A influência norte-americana era descarada. O
que não é de se espantar. Afinal, não era a primeira vez que os Estados Unidos da
América ditavam moda ao mundo. E o Brasil, como não poderia deixar de ser a um país
subdesenvolvido, foi na onda. Depois do surgimento, em 1912, das primeiras orquestras
americanas do tipo jazz-band, o Brasil aderiu a moda, em definitivo, a partir da década
seguinte.
       É certo que o sentimento nacionalista que envolvia o brasileiro nas décadas de 50
e 60 procurou compensar essa influência estrangeira, por exemplo, no repertório das
orquestras, com a introdução de um produto nacional. Assim, o samba e o samba-canção
passaram a conviver pacificamente com o jazz, o fox, o tango, o bolero, o mambo, a valsa
e outros ritmos importados.
       Desse modo, a jazz-band, uma “orquestra de origem dos negros norte-americanos,
caracterizada pelo ritmo sincopado de sua música e pelo papel desempenhado pela
improvisação”, como define Sérgio Ricardo S. Correa (1), no Brasil, sofreu algumas
modificações.
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       A principal delas foi exatamente a incorporação do samba ao seu repertório, o que
justificou a presença do pandeiro junto aos demais instrumentos básicos da jazz-band:
metais (sax, pistão e trombone), piano, guitarra, contra-baixo e bateria. O próprio samba,
por sua vez, sofreu influências de modo a adaptar-se a maneira de tocar da jazz-band.
“Criado para as orquestras de dança de salão, o samba-canção, entregue ao semi-
eruditismo dos orquestradores, foi progressivamente amolengando o ritmo até
transformar-se, no decorrer da década de 1940, na pasta sonora que o confundiu por vezes
com o bolero (samba “Risque”, de Ari Barroso, por exemplo)”. (2)
       A febre das jazz-bands, como define o crítico de música José Ramos Tinhorão,
chegou ao Brasil e como uma epidemia infestou todo o interior paulista. De fato, de lá,
surgiram várias orquestras e algumas de sucesso surpreendente, como a Laércio de
Franca, Pedrinho e sua Orquestra Guararapes, Orquestra Nelson de Tupã, Orquestra de
Jasson e outras.
       E Jaú não ficou atrás. Terra de tradições arraigadas e claramente influenciada por
modismos estrangeiros, a cidade teve o seu nome projetado muito além de seus limites
através de duas jazz-bands de sucesso: Continental e Capelozza.


Tudo começou...


       Fundada pelos irmãos Amélio e Plácido Antonio Capelozza, em 1940 (o seu
primeiro baile data de 7 de setembro de 1940, no “Jaú Clube”), a Continental ou como
ficou inicialmente conhecida, a Orquestra Típica Continental, tornou-se um patrimônio
musical da cidade. No começo, sua formação se constituía de três sax, dois pistões,
trombone, violão, bateria e crooner.
       Quatro anos após a fundação da Continental, os irmãos Capelozza resolveram
deixar a cidade para ir trabalhar em uma marcenaria com um tio, em Marília.
       A orquestra passou a ser dirigida por José Ayello e Antonio Waldomiro de
Oliveira. O primeiro, pistonista, havia deixado o trabalho no circo para tocar na
Continental. Cuidava da direção musical. “As bandas de circo eram quem revelavam os
músicos para as orquestras da época e assim, todo circo que aportava em Jaú era
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obrigatoriamente visitado pelos músicos. Se houvesse alguém bom, recebia o convite
para aqui ficar”. (3) O segundo, crooner, passou a cuidar da parte administrativa da
orquestra: fechava os contratos para bailes, providenciava alojamento para o pessoal,
alugava condução para as viagens, etc.
        A partir de 1948, após votação dos 11 músicos, Waldomiro de Oliveira foi
escolhido diretor da Continental, função que exercera até o fim da orquestra.
        Praticamente nesse mesmo período (fins de 1948 e início de 1949), os irmãos
Plácido Antonio (Tunin) e Amélio Capelozza, depois do insucesso com a marcenaria em
Marília, resolveram voltar a Jaú e fundaram a Líder Orquestra. Com eles, veio o crooner
Sabu.
        Além de provenientes do circo, os músicos contratados pelas jazz-bands vinham
de orquestras de outras cidades. A troca de músicos entre orquestras era um fato comum.
Em geral, tratavam-se de amadores e semi-profissionais. No caso da Continental, a partir
de 1955, quando viveu seu auge, os músicos eram inteiramente profissionais; viviam
exclusivamente dos rendimentos da orquestra. Alguns, inclusive, chegaram a ser trazidos
do Rio de Janeiro por Waldomiro de Oliveira.
        Entretanto, nesse mesmo período, a Capelozza (surgida no lugar da Líder
Orquestra, que quebrara), pelo contrário, mantinha em sua formação, praticamente
músicos amadores e semi-profissionais. Isso signficava que todos tinham outra profissão,
mesmo que, em alguns casos, possuíssem o registro de músico profissional. Esse registro
era expedido, até 1960, pela Polícia do Estado de São Paulo, o que depois passou a ser
feito pela Ordem dos Músicos do Estado. Assim, entre os músicos da Capelozza,
encontravam-se marceneiros, relojoeiro, comerciário, frentista de posto de gasolina,
funcionário público e assim por diante. Nota-se que, em geral, tinham como trabalho
principal um ofício, além de serem pais de família e terem origem humilde.
        Dificilmente, encontrava-se entre eles alguém com curso superior. Apesar disso,
em geral, haviam estudado música (via aulas particulares ou em conservatório) durante
anos e dentro de um esquema disciplinar rigoroso. Primeiro e invariavelmente, a teoria.
Só depois de um bom tempo é que se pegava no instrumento.
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       Como foi constatado por Luiz Augusto Milanesi através de pesquisa realizada em
Ibitinga, interior de São Paulo (4), também em Jaú o gosto pela música foi marcado por
uma forte influência de antigas famílias de imigrantes italianos: Senise, Fornalé,
Capelozza e outras. Influência que se dava quase sempre em nível familiar: o pai ou o tio
já era músico e, do convívio, nascia o interesse em aprender música.




       O rigor e disciplina com que se aprendia a tocar era naturalmente transportado
para o trabalho na orquestra, o que, apesar do amadorismo, lhe garantia um desempenho
profissional: não se tocava de ouvido e sim, somente através de partituras, as quais eram
compradas de arranjadores profissionais de São Paulo. Nesse aspecto, a Continental foi
mais longe. Sob a direção de Waldomiro de Oliveira, chegou não só a comprar arranjos
de maestros norte-americanos famosos da época (Tommy Dorsy, Benny Goodman) como
passou a contar com arranjadores entre os seus próprios integrantes: os pistonistas Tite,
Danilo e Luiz, o pianista Charles, o guitarrista Lima e o saxofonista Romeu.


A cada apresentação, aumenta a popularidade


       Para o profissional de música, me dizem ex-integrantes das orquestras, dava para
viver, enquanto que para o amador o cachê representava um acréscimo razoável ao
próprio orçamento.
       As orquestras, em geral, funcionavam sob a forma de cooperativas. A Continental
seguiu a regra geral: “Depois de pagas todas as despesas, o dinheiro arrecadado em um
baile era fraternalmente dividido - na verdade, o único que ficava com a parte menor era o
pandeirista - e uma pequena quantia ia para o caixinha”. (5)
       Na Líder Orquestra, o sistema de administração dos lucros e de direção era o
mesmo. Porém, os irmãos Capelozza, a um dado momento, propuseram aos demais
músicos comprar a parte de cada um no patrimônio da orquestra, de modo centralizar a
18


direção da mesma em suas mãos. A partir de então, a Líder Orquestra passou a se chamar
Capelozza e sua Orquestra.
       Com a popularidade crescente, as orquestras de Jaú passaram a ganhar também em
prestígio, não só junto ao público, como também junto ao meio musical. Havia finais de
semana em que eram solicitados por 3 ou 4 clubes diferentes (isso para uma mesma noite
de sábado). Num jornal regional de 1975, lê-se: “Não há cassino, estância hidro-mineral
ou hotel famoso em que não se tenha apresentado a Continental de Jaú nos seus principais
bailes”. (6)
       O critério de escolha de um baile variava entre o clube que pagava melhor ou a
cidade que ficava mais próxima. Em períodos de carnaval, considerava-se sobretudo esse
último critério, uma vez que as orquestras chegavam a se apresentar até 4 vezes num
mesmo final de semana.
       A Continental chegou a fazer, em média, 110 bailes por ano. Nos meses de
dezembro e janeiro, animava cerca de 25 bailes de formatura. Apresentou-se em um total
de 300 cidades dos Estados de São Paulo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro,
Paraná e Minas Gerais.
       Entre as principais apresentações, destacaram-se aquelas realizadas nas capitais e
grandes cidades, especialmente os shows na TV e rádio, quando acompanhou estrelas da
música nacional (os “cartazes” como eram conhecidos na época): Hebe Camargo,
Francisco Alves, Nelson Gonçalves, Marlene, Inesita Barroso, Gregório Barrios e outros.
Houve bailes que marcaram a memória da Continental, conforme narra o próprio Tunin
Capelozza, em entrevista concedida ao jornalista J. H. Teixeira do “Comércio do Jahu”
(edição de 14/09/1986). Ele recorda um baile animado pela Continental, em Araçatuba
(SP), o qual contou com a presença da então Miss Brasil, Martha Rocha: “Foi um baile
granfino mesmo. A toalete das senhoras ficava ao lado do palco. Então, quando passavam
as moças que iam à toalete, nós, os músicos, ficávamos boquiabertos e comentávamos se
a Martha Rocha seria mais bonita que aquelas que estavam passando ao nosso lado. Seu
moço, quando a Martha Rocha apareceu, todas as outras ficaram feias!”
19




Foto do jornal “Correio da Manhã de Jaú”, edição de 03/09/1955. Ao lado da foto, lê-se: “Hoje nos salões
de festas do Aeroclube de Jaú, grandioso baile para Coroação da Rainha da Escola Técnica Industrial de
nossa cidade, onde estará presente para dar um maior brilhantismo a famoso Capelozza e sua Orquestra.
Amanhã (domingo) - A Capelozza e sua Orquestra, abrilhantará uma grandiosa brincadeira dansante na
visinha cidade de Bocaina nos salões de festas do ‘Nosso Clube’”. Anúncios como este eram muito
comuns na década de 50, sobretudo nos meses de janeiro e dezembro (devido aos bailes de formatura) e
épocas de carnaval.
20


Lps: uma nova experiência


       A fama da Continental ultrapassou os horizontes que a própria Jaú podia
vislumbrar. Em 1956, surge a oportunidade para gravar o primeiro LP, um acontecimento
inédito na história de uma orquestra do interior paulista.
       Tal acontecimento, como a gravação do segundo LP, é contado, em detalhes pelo
jornalista Mário Schwarz do “Comércio do Jahu”, após entrevista com Waldomiro de
Oliveira (edição de 25/10/1987):


       “Waldomiro de Oliveira revelou a Dionísio, o irmão, que gostaria de gravar um
disco pela Continental. Os contatos foram feitos e um ano mais tarde a orquestra jauense
foi mostrar que já merecia uma chance no mercado de discos, apresentando-se no
programa ‘Papel Carbono’, da Rádio Nacional (7), não só uma música mas o programa
todo. Isso para que o executivo da gravadora aprovasse o lançamento de um disco. Mas a
reação do auditório foi tão boa que antes mesmo do final do programa, o responsável pela
gravadora já tinha se decidido a gravar um LP com a Continental. Um não, dois (...)
       Dos cinco saxofones, quatro pistões, três trombones, contra-baixo, bateria, piano e
guitarra, só não foram gravar no Rio um pistão e um trombone, substituídos por músicos
da Orquestra de Severino Araújo (Moura e Macacheira) e o primeiro LP, “Convite para o
Baile”, teve arranjos até de Vadico, o parceiro de Noel Rosa.
       O segundo, com a orquestra completa, de nome “Chegou a Orquestra de Jaú”, foi
gravado em dois dias, embora o estúdio estivesse reservado por uma semana. A
Continental estava afiadíssima.
       ‘Para gravar esses discos, passamos bons apuros. Ficamos em hotel de quinta
categoria e nossa refeição era a mais barata: macarronada, com Malzibier para reforçar.
Não foi fácil, mas valeu a pena’. No verão de 59, LP embaixo do braço, Waldomiro de
Oliveira voltou para Jaú e foi até a “A Musical”, conceituadíssima loja de discos da
cidade. Ele conta: ‘O Félix e o Licurgo eram vivos. Então pedi a eles que colocassem o
disco para tocar. Os dois adoraram e perguntaram: que orquestra é essa? Eu disse que era
a Continental e eles não acreditaram. Poucos dias depois, com a colaboração do Rotary
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Club, lançamos o nosso primeiro LP no Aero Clube para um público de
aproximadamente três mil pessoas. Até o Renato Mursi esteve aqui para o lançamento,
que foi um sucesso’”.


       Capelozza e sua Orquestra, dirigida pelos irmãos Amélio, Tunin e Irineu, seguiu
passos semelhantes aos da conterrânea Continental. Entretanto, não gravou LP. Segundo
seus antigos integrantes, a idéia de fazê-lo foi discutida. Contudo, concluíram que não
compensava financeiramente. Por isso, desistiram da idéia de gravar.
       Apesar disso, sua popularidade, sobretudo no Estado de São Paulo, por onde mais
se apresentou, é indiscutível. Também acompanhou gente famosa como Gregório Barrios,
Carlos Lombardi, Carlos Vilela e outros.


Dificuldades comprometem o futuro


       Quando se houve a história das orquestras de Jaú, a impressão que se tem (pelo
menos, a primeira impressão), é que se trata de uma epopéia, repleta de sucessos e só.
Engano. De fato, os ex-integrantes da Continental e Capelozza, se hoje riem das
passagens, mesmo as dolorosas, com certeza, nessas ocasiões, a vontade era de chorar,
acabar com tudo, “chutar o pau da barraca”.
       Entre todas as passagens da vida das jazz-bands, os ex-músicos são unânimes em
afirmar terem sido as viagens as mais difíceis.
       Fosse pelas estradas de terra, fosse pelos automóveis ou ônibus, cuja velocidade
máxima não ultrapassava os 30 km/h, uma viagem à vizinha Bauru ou a Bariri, poderia se
transformar em um transtorno. Em especial nos dias de chuva. O que pensar então,
quando se era contratado para tocar em cidades mais distantes, como em outros estados,
por exemplo?
       Mesmo que o cachê compensasse, teve gente que chegou a desistir de ser músico
por causa de tanto sacrifício. “A gente - conta Tunin Capelozza na mesma entrevista
concedida ao “Comércio do Jahu” (edição de 14/09/1986) - ia de ônibus, de carro ou de
trem, em estradas ruins, com chuva ou frio. Certa vez, fomos tocar na cidade de
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Rancharia no mês de junho. Fazia um frio danado, até geou naquela noite. O quanto
sofremos. Foi nesse dia que o nosso violonista Manoel Sabatino desistiu, não quis mais
saber da orquestra”. E continua: “Uma vez fomos em um baile e os carros encalharam na
estrada. Chegamos no clube a 1h30 e tocamos todos sujos de barro até o fim do baile”.
       A Continental teve dois ônibus próprios. O primeiro, chamou-se “Martha Rocha”,
em homenagem à ex-Miss Brasil. Depois, adquiriram outro, em melhores condições, o
“Adalgiza Colombo”, cujo nome também foi inspirado em uma Miss Brasil. A facilidade
de possuir condução própria não afastou, entretanto, as dificuldades. Não foram poucas as
vezes em que todos tiveram que descer do ônibus para empurrá-lo por quilômetros, com
lama e tudo.
       A Capelozza, por sua vez, se utilizava de carros ou ônibus alugados e de trem
(para as viagens mais longas). “Quando viajávamos de trem, você sabe, eles param pouco
tempo na estação. Então, não dava tempo para descarregar todos os instrumentos da
orquestra. Isso aconteceu mais de uma vez: era preciso alugar um carro, correr até a
próxima cidade onde parava o trem para retirar o restante dos instrumentos”, conta Tunin.
(8)
       Com o passar do tempo, precisamente com o advento do rock na década de 60, as
viagens tornaram-se uma preocupação menor para as orquestras. No seu lugar, surgiu a
concorrência dos pequenos conjuntos, os regionais (a base de violão, acordeom, pandeiro
e crooner) e, principalmente, os grupos de rock que introduziram o uso dos instrumentos
eletrônicos (guitarra, contra-baixo e depois órgão) e passaram a substituir as jazz-bands
na animação dos bailes.
       A concorrência se dava em dois níveis. O primeiro era justamente o financeiro:
ficava mais barato para o dono do clube contratar um conjunto com, no máximo, 5
elementos, do que uma orquestra que tinha, em média, 15 integrantes. O segundo era a
questão da preferência musical da época que passou a mudar sob influência de novos
modismos estrangeiros. O rock’n roll passou a perna no tango, samba-canção, bolero,
rumba, fox (cuja expressão máxima era a orquestra norte-americana de Glenn Miller,
modelo imprescindível para as nossas orquestras) e a juventude, principal público
consumidor do mercado fonográfico, aderiu em massa ao seu ritmo alucinante.
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       Essa situação sentenciou, por assim dizer, o fim das jazz-bands. Elas até que
resistiram bastante. A Continental, por exemplo, só encerrou suas atividades em 1968:
“um sonho que acabou exatamente em 12 de maio de 1968 (...) na pequena Angatuba,
onde a Continental tocou pela última vez. Restou também uma dívida que o Waldomiro
de Oliveira precisou de três anos para pagar”. (9)
       A Capelozza acabou mais ou menos no mesmo período. “A morte prematura do
irmão Amélio teve grande influência no fim da Orquestra Capelozza, mas Tunin não
desistiu. Formou um conjunto que se apresentava em festas e restaurantes”. (10)
       De fato, existiram também razões de ordem pessoal, inerentes a influência dos
modismos estrangeiros, que provocaram o fim das orquestras de Jaú. Entretanto, os
membros preferem não discutir o assunto. A resposta geral é “Cada um tem o seu tempo.
O nosso já passou”. Inclusive, sobre o relacionamento entre os músicos e entre as duas
orquestras rivais de Jaú, preferem, em geral, resumir questão em frases do tipo: “O
relacionamento era excelente”; “Até hoje, somos muito amigos”; “Sempre, sempre
amigos”. Se existiram pequenas ou grandes diferenças, depois de tanto tempo, preferem
esquecer. Saudável ou não, ironia do destino, as pessoas dessa cidade parecem tomar
atitude semelhante: as orquestras, patrimônio histórico-musical de Jaú, por falta de se
preservar a memória desse mesmo povo, parecem condenadas ao esquecimento.
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Notas
(1) CORREA, Ricardo S. Ouvinte Consciente. São Paulo, Ed. do Brasil S.A.
_________, p. 60.
(2) TINHORÃO, José R. Pequena história da música popular - Da modinha à canção
de protesto. Petrópolis, Ed. Vozes, 1978, p. 125.
(3) SCHWARZ, Mário. “Personagem: Waldomiro de Oliveira” in jornal Comércio do
Jahu, Jaú, 25/10/1987, p. 5.
(4) MILANESI, Luiz A. O Paraíso via Embratel. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1978.
(5) SCHWARZ, Mário. “Personagem: Waldomiro de Oliveira” in jornal Comércio do
Jahu, Jaú, 25/10/1987, p. 5.
(6) “O som das grandes bandas do interior paulista” in jornal Internews, suplemento de
cadeia de jornais da CBI, agosto/75, p. 15.
(7) “Papel Carbono”, programa da Rádio Nacional criado em 1937 e dirigido por Renato
Mursi, onde os candidatos deviam se apresentar imitando a voz de algum cantor já
famoso.
(8) TEIXEIRA, J.H. “Personagem: Tunin Capelozza” in jornal Comércio do Jahu, Jaú,
14/09/1986, p. 5.
(9) SCHWARZ, Mário. “Personagem: Waldomiro de Oliveira” in jornal Comércio do
Jahu, Jaú, 25/10/1987, p. 5.
(10) TEIXEIRA, J. H. “Personagem: Tunin Capelozza” in jornal Comércio do Jahu, Jaú,
14/09/1986, p. 5.
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“TUNIN E DANTE”
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       “E essa é a história da orquestra”, concluiu Tunin. E eu quase despenquei do sofá.
“Não é possível que alguém consiga resumir trinta ou quarenta anos de história em dez
minutos e concluir que é tudo”, pensei. Foi mais ou menos assim que começou a minha
primeira entrevista e, com certeza, uma das mais importantes para esta reportagem.
Confesso que vi meu trabalho ir “por água abaixo”. Como poderia fazê-lo a partir de dez
minguados minutos de entrevista?
       Talvez por estar mais que acostumado a contar a história das orquestras
Continental e Capelozza, o Tunin deve ter aprendido a resumi-la e por isso nem se deu
conta da rapidez com que quase liquidou a entrevista. E quase liquidou o meu trabalho.
       Por outro lado, o “seo” Tunin, como é conhecido Plácido Antonio Capelozza, um
dos fundadores da Continental e da Líder Orquestra (que depois transformou-se em
Orquestra Capelozza), aos 83 anos, não economiza palavras para elogiar os anos 50, fase
de ouro das jazz-bands que, como se dizia naquela época, abrilhantavam os bailes do
interior paulista de todo o Brasil.
       Mas voltemos à entrevista. São mais ou menos três da tarde quando aparece por
ali um novo personagem, convidado pelo Tunin para o nosso bate-papo.
       Baixinho e falante, Reodante Pepe, ou simplesmente Dante, é o oposto do amigo
Tunin que é alto e de pouca conversa, ou pelo menos, sem muitos rodeios. Quanto ao
Dante, era de se esperar, afinal foi o primeiro crooner da Continental e como todo bom
cantor, ele deve ser antes de tudo comunicativo.
       Estão todos de acordo em gravar e a entrevista recomeça.
       Apesar do contraste físico e de comportamento, os velhos amigos possuem uma
também velha paixão em comum: a música. E foi justamente essa paixão que levou o
então inexperiente Dante a encarar o seu primeiro baile no dia 7 de setembro de 1940, dia
da inauguração da Continental. Ele lembra com humor: “Eu tinha lá os meus vintes anos.
Cantava, mas cantava em seresta. Nunca havia me apresentado com uma orquestra. No
dia da inauguração, eu tremia que nem vara-verde! (risos) Eu tomei um litro de conhaque
ou uísque, eu não sei... Mas olha, a cada intervalo, eu ia lá e pá, pá, pá!! E voltava.
Acabou o baile e eu estava meio assim...” (risos)
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       Já a carreira do músico Tunin Capelozza começou bem antes. Filho de músico
italiano, na verdade, a sua história confunde-se com a própria história das orquestras
Continental e Capelozza e, antes mesmo do seu surgimento, quando, aos 16 anos, já
tocava no Jaú Jazz, o primeiro jazz-band da cidade. Isso mais ou menos no final dos anos
20, começo dos anos 30. Mais ou menos, porque nomes e datas fogem à sua memória.
       Tunin estudara com músicos da cidade: “... um senhor que se chamava Vitorino
Frigolo, o José Fornalé, o Danilo Fornalé... porque isso aqui antigamente não tinha
professor de música, não havia escola. A gente tomava lição na casa do músico”. Quando
mudou-se para Marília, juntamente com o irmão Amélio, por motivo de serviço, disse
que era para aposentar o sax, o clarinete e o bandoneom. “Mas quem nasceu pra música,
não consegue largar a música...”
       Entretanto, é o próprio Tunin quem adverte: “Vou falar a verdade pra você:
música nunca deu nada pra ninguém. Música é só perda de tempo!” Como acontecia com
uma boa parte dos músicos de Jaú, Tunin, Dante e outros possuíam uma profissão. O
Dante, por exemplo, era garçom, o Tunin e o irmão Amélio, marceneiros, o Irineu, o
terceiro dos irmãos Capelozza, relojoeiro e assim por diante. “Cada um tinha o seu
emprego. Nós nos reuníamos para ganhar um dinheirinho extra no sábado e no domingo.
E no carnaval a gente aproveitava para ganhar uns cobrinhos a mais”.
       Uma vida de sacrifícios, mas levada por um grande prazer pela música. Porém,
para o Dante, tanto sacrifício passou a não compensar mais. “Eu fiquei apenas um ano na
Continental. Depois desisti. Tinha um emprego e precisava faltar para acompanhar a
orquestra. Era uma complicação”. Depois disso, Dante foi para São Paulo, tendo voltado
para Jaú anos mais tarde.
       O Tunin continuou. Como ele próprio afirmou, “mais por prazer”. E esse prazer,
esse amor pela música, impressiona na sua pessoa. Logo que entrou pela sala de estar,
confesso que não acreditei que aquele senhor de mãos grossas (mãos de marceneiro), fala
alta e gestos bem italianizados, pudesse ter sido músico. Referindo-se à sua mulher,
contudo, é que se percebe um certo lirismo (claro, dentro do seu estilo de pessoa) que
parece envolvê-lo. Perguntei-lhe se não houve problemas com a mulher, tendo que
conciliar a vida de casado, de marceneiro (trabalhou 45 anos até se aposentar na fábrica
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de móveis Jahu Progride) e de músico. E ele respondeu: “é uma mulher que é um
espetáculo, se conformou com tudo e não houve problemas...” Diferente, mas não deixa
de ser uma sincera declaração de amor.
       A admiração do público, pelo menos das pessoas mais velhas, é incontestável.
Algo que vem de longe. Uma prova concreta do reconhecimento público dos valores do
músico Tunin Capelozza está na homenagem que recebeu de seu amigo, o maestro
Rubens Leonelli, então regente da Banda Sinfônica da Polícia Militar de São Paulo, por
ocasião da festa do aniversário de Jaú, em 1970. Velho conhecido de Tunin, Leonelli
resolveu fazer-lhe uma surpresa. A Banda Sinfônica da Polícia Militar iria se apresentar
em Jaú, na Igreja Matriz Nossa Senhora do Patrocínio com seus 120 músicos. No
repertório, entre os clássicos da música erudita, estava lá a valsa “Vera Lúcia” composta
por Tunin e dedicada à filha mais nova. Quando a banda começou a executar a valsa em
arranjo sinfônico e o público presente reconheceu a obra do jauense Tunin, todos
explodiram em palmas. Depois de execução da valsa, Tunin dirigiu-se ao maestro e aos
músicos para cumprimentá-los. Consigo levou a pequena Vera Lúcia. “As palmas
continuaram sem parar, por uns 10 minutos! Foi a maior emoção da minha vida!”, conta,
quase em lágrimas.
       Assim como para a filha mais nova, Tunin compôs as valsas “Nida” (dedicada à
esposa Leonilda), “Virgínia” e “Vilma” (para as outras duas filhas) e o choro “Walter”,
dedicado ao seu único filho homem.
       Apesar do seu comportamento simples, Tunin não se preocupa em esconder o
pouco de vaidade de seus mais de 40 anos de músico. “Com o público, barbaridade! Eu
era estimado, barbaridade!! Todo sábado tínhamos 3 ou 4 lugares para escolher. A nossa
orquestra era disputada!”
       O amigo Dante, aos seus 72 anos (e com uma filha de 14!) também não esconde a
vaidade: “O senhor cantaria hoje, em público, se tivesse oportunidade?”, pergunto. “Eu
até cantaria, mas sabe... a gente não tem mais aquela aparência de quando era jovem...
Penso que a mocidade de hoje não daria valor...”
       Não é pra menos que os irmãos Capelozza têm motivos para essa vaidade
incontida. Além do talento em si e justamente por isso, foram eles os fundadores de
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praticamente todas as jazz-bands de Jaú. “Tínhamos facilidade para formar um novo
grupo. Éramos nós quem imperava...”
       A esse propósito, Tunin se defende: “Se nós tivéssemos formado Capelozza e sua
Orquestra no começo, não tinham acontecido nada desses rolos, né? Mas nós fomos fazer
no fim... ninguém ia querer tirar o nome da gente...” “Mas o que eram esses rolos?”,
pergunto. “Havia os invejosos que queriam ficar dono, você tá me entendendo? Então,
nós pegávamos e deixávamos pra eles: fiquem donos vocês!! E formávamos outro
grupo”.
       Depois de tanto tempo, Tunin e Dante, como outros, não demonstram
preocupação ou interesse (nem querem comentar) a respeito das diferenças dentro de uma
orquestra ou sobre a rivalidade entre Capelozza e Continental. “Tanto tocando juntos,
como fora dos bailes, nós éramos sempre amigos”, garantiu Dante. “Até hoje, graças a
Deus!”, completou Tunin. Dante lembrou, inclusive, que não havia punições pré-
estabelecidas para quem errava, fugia ao compromisso. “Falava-se assim: oh, bichão!
Você tá dando tripa! E só”. Tratava-se de uma gíria da época que é o mesmo que “pisar
na bola” hoje. “Mas quanto à rivalidade entre a Continental e a Capelozza?”, insisto. É o
Tunin quem responde: “Existia uma rivalidade, barbaridade! Mas nunca nós deixamos de
ser amigos!!”
       Foi num clima espontâneo, diria, quase familiar, que se conduziu o nosso bate-
papo, a propósito, bem humorado. Tão humorado e espontâneo que, várias vezes, precisei
desligar o gravador, a pedido, para que meus entrevistados não se sentissem
constrangidos com aquele fato, aquela situação ou comentário. “Mas você está
gravando?! Corta isso, pelo amor de Deus!!” (risos)
       As duas horas e meia de entrevista passaram rápido. De tudo o que foi dito, bastou
a simplicidade e alegria daqueles senhores para entender que é preciso enxergar mais que
velhos hábitos e velhas tradições para entender o passado...
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“SABU”
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         Se você perguntar em Jaú pelo Marcílio Galdino Pires, provavelmente pouca
gente vai dizer que conhece. Agora, se, ao contrário, você perguntar pelo “seo” Sabu,
então sim, muita gente vai saber de quem se trata. Especialmente os mais velhos que não
se esquecem dos muitos dançados ao som da voz do crooner Sabu a frente de Capelozza e
sua Orquestra.
         O apelido Sabu (que depois virou nome artístico, registrado na Ordem dos
Músicos de São Paulo) foi inspirado em um antigo herói de cinema do início da década
de 60.
         Hoje, cantando apenas entre amigos e após um bom tempo afastado dos palcos,
Sabu é mais conhecido na cidade como o proprietário do Hotel Paulista, localizado
próximo à estação rodoviária.
         Apesar das diferentes atividades que desenvolvera no decorrer da sua vida, a de
cantor é, sem dúvida, a que lhe traz as melhores lembranças. Foi graças à música que a 4
de dezembro de 1987 recebera o título de Cidadão Jauense, cujo diploma exibe,
orgulhosamente, na recepção do seu hotel.
         E é exatamente sobre música que se desenrola o nosso bate-papo. A propósito,
quando o procurei e lhe disse sobre o que e porque deseja entrevistá-lo, de cara, mostrou-
se entusiasmado em colaborar. E me garantiu: “Você não vai tirar dez nesse trabalho! Vai
tirar mil!”
         A sua história como cantor começa quando moleque (por volta de 1945, 1946).
Certa vez, ganhara um concurso para cantores em um parque de diversões na sua cidade
natal, Agudos (SP). Na ocasião, cantar, para Sabu, era apenas uma diversão, um
passatempo. É nesse momento que acontece uma reviravolta em sua vida. Chega de
Marília um músico de jazz-band. Ele conhece Sabu e, sem hesitar, o convida para assumir
a vaga (que estava livre) de crooner na sua orquestra.
         Embora estivesse receoso, em virtude de sua inexperiência, encorajado pelo
músico, Sabu aceitou e partiu para Marília.
         Já fazia algum tempo que acompanhava a pequena orquestra de Marília, quando
Sabu resolveu partir para algo maior. Foi para São Paulo e prestou um concurso na Rádio
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Bandeirantes. “Passei. Então resolvi que iria para São Paulo, faria um cachê na
Bandeirantes e cantaria nas noites, nas bocas, como se diz”. Estava decidido a fazê-lo.
       Nesse meio tempo em que permanecera em Marília, conhecera os irmãos Amélio
e Tunin Capelozza (que haviam se mudado para lá para trabalhar com um tio na
marcenaria). “Então, a gente travou uma boa amizade, porque eles também são gente
fina”. E foi devido a essa amizade que novamente aconteceriam mudanças nos planos do
crooner Sabu.
       Decididos a retomar o trabalho com a música, os irmãos Capelozza propuseram a
Sabu que não deixasse a orquestra em Marília até que eles pudessem voltar para Jaú (o
que aconteceria em breve) e fundassem a sua própria orquestra, na qual ele assumiria a
função de crooner. “Eu não queria viver integralmente como profissional. Então, desisti
de ir para São Paulo e aceitei a proposta dos Capelozza”.
       E, de fato, foi o que aconteceu: em fins de 1948, Sabu e os Capelozza fundam a
Líder Orquestra, que depois passou a se chamar Capelozza e sua Orquestra. “Eu comecei
com eles. Sou fundador. Os Capelozza como chefes e eu como integrante da orquestra”.
       Em Jaú, preferindo não viver só de música, Sabu passou a trabalhar como inspetor
de alunos da Escola Profissional Joaquim Ferreira do Amaral, a Industrial. “Em 1954, 55,
mais ou menos, eu sai da escola. Ai comecei um novo trabalho, como vendedor.
Trabalhava de segunda a sexta. Depois ficava disponível para a orquestra”.
       Nos finais de semana havia muito trabalho. Mesmo depois de casado (casou-se em
setembro de 1958), continuou cantando. “Ah! Depois de casado, a mulher não gostava.
Sabe como é, é natural. Mas fiquei tempo cantando. No fim, a mulher aceitou porque a
gente já tinha mais despesas, não era um, éramos dois. Então, o dinheiro da orquestra
engrossava o orçamento. Juntava as coisas: uma porque gostava, outra porque rendia um
pouco”.
       E tinha bons motivos para gostar. Como cantor, assumia uma posição privilegiada
na orquestra. Era particularmente visado pelo público. “Eu era super bem tratado”. “Mas
as pessoas não tinha aquela tendência de vê-lo e aos outros músicos como estrelas?”,
arrisco. “Não, não. O relacionamento era muito bom. Todo mundo se aproximava da
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gente. Queriam conversar. Parece... a impressão que se tem é que, antigamente, se tinha
mais tempo para conversar. Parece que tinha mais calor humano”.
       No que sua baixa estatura não chama a atenção, a voz possante de Sabu convence.
Ainda mais porque, como cantor, aprendeu a ser comunicativo. “Apresentava o
repertório, fazia a abertura do baile, cumprimentando o público. Se tinha alguma coisa
pra anunciar, evidentemente era o cantor que fazia”.
       A dedicação à música o levou, mais que aprender a se relacionar com o público:
“Aprendi sax. Mas não tocava. Entretanto, estudava. Quem chegou a me ensinar música
foi o Sr. Amélio Capelozza, um senhor músico”.
       Sabu mantém a vitalidade de quando jovem, como quem prefere não falar em
idade. Ainda sim, recordar o passado da Capelozza traz para Sabu uma satisfação
especial. Tanto que já pensa em reservar um local especialmente para reunir os velhos
amigos, bater aquele papo e é claro, curtir uma boa música.
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“ROBERTO PAVAN”
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       O jovem saxofonista e clarinetista (talvez um dos músicos mais jovens que tenha
passado pela Orquestra Capelozza) está bem diferente. Além dos óculos, engordou e
ganhou cabelos brancos. Com pouco mais de 60 anos, Roberto Pavan é porém, uma
pessoa muito ativa. Talvez a sua profissão (hoje é comerciante, mas desde garoto
trabalhou no comércio como balconista) lhe exija isso. Tanto que não quis perder tempo.
Após procurá-lo, no dia seguinte, o entrevistei ali mesmo, no fundo da sua loja,
debruçado sobre o balcão. Logo em seguida, após nos despedirmos, ele retomou sem
demora os seus afazeres profissionais.
       Roberto parece ser uma pessoa prática e cuidadosa. Antes de iniciarmos a
entrevista, quis saber tudo o que pretendia perguntar-lhe. E a cada pergunta, procurava
responder com objetividade, o que contudo, não disfarçava o saudosismo com que
lembrava passagens da história de Capelozza e sua Orquestra. “Nós saímos, por exemplo,
pra tocar em Marília, Presidente Prudente, Rio Claro, Barra Bonita, Dois Córregos,
Bauru, Lins. Então, quando chegava a Orquestra Capelozza, não precisava falar mais
nada! A receptividade era maravilhosa! E nós percebíamos isso, mas nós éramos
humildes”.
       Para Roberto Pavan, maravilhoso era também o relacionamento entre os músicos.
Mesmo se no início, quando entrou para a Capelozza, sentia-se despreparado para tocar
com outros músicos mais experientes, Roberto disse sempre ter recebido apoio dos
colegas. Entretanto, ele, desde jovem, demonstrava uma certa objetividade na maneira de
pensar. Antes de tocar na Capelozza e após os seus primeiros estudos, Pavan fora
convidado para integrar a Líder Orquestra. “... na Líder Orquestra já existiam músicos
tradicionais e eu, como amador, senti muita dificuldade e tive que parar. Então, me
aprofundei bastante no estudo do clarinete e saxofone e tive a satisfação imensa em ser
convidado para tocar na Orquestra Capelozza, na qual trabalhei, mais ou menos, uns 12
ou 13 anos”.
       O amor à música e a sua dedicação ao estudo chegou a levar o então inexperiente
Roberto à posição de primeiro saxofone da orquestra, o que era uma posição privilegiada
entre os músicos. Para tanto, teve que “suar a camisa”. “Eu trabalhava no balcão. Às
vezes, voltava do baile com o instrumento na mão e ia trabalhar. Eu trabalhava das oito às
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seis da tarde - tinha uma hora de almoço - e estudava à noite. Estudava também nos
sábados e domingos durante o dia. Toda noite eu pegava o instrumento e estudava, no
mínimo, duas horas”.
       Além disso, como toda a orquestra, Roberto teve que enfrentar o lado difícil do
trabalho como músico, como por exemplo, as viagens em dias de chuva. “Houve uma
ocasião... eu era responsável pela montagem da orquestra, pelas estantes, as partituras, era
eu quem punha as pastas. Cada um tinha uma função. Essa era a minha. E houve uma
ocasião em que nós fomos para Bariri e deu uma chuva tremenda. Nós saímos daqui,
mais ou menos, cinco horas da tarde para começar o baile às dez da noite, 22 horas. E
como é que faz com o barro da estrada? Então, tinha que acorrentar o carro... E quando
furava o pneu, era um ‘deus-me-acuda’! Enfim, nós chegamos em Bariri. Montado tudo -
eu estava procurando o repertório - quando perguntei: ‘Cadê a pasta do repertório?’
Esqueceram em Jaú. E aí? Naquele tempo, não tinha outro jeito: eu tive que voltar para
Jaú com o chofer. E o baile ia começar às dez horas. Eram nove e meia quando eu dei
falta do repertório. E pra voltar para com aquela chuva? O que a orquestra fez? Ela tocou,
porque nós tínhamos músicos como o Amélio Capelozza, Tunin Capelozza, Hélio Cioti,
Luis Mingueti, nós tínhamos o Caraciti... Então, eles começaram a tocar, tocar... e eu
voltei para Jaú. Cheguei em Bariri meia noite. Eu estava inteirinho embarreado”.
       Sobre a rivalidade entre Continental e Capelozza, Roberto, ao contrário dos outros
músicos, foi bem mais claro em sua opinião: “... naquele tempo, a Continental se achava
superior a nós, só que não era! E sabe por quê? Porque a Continental tinha um estilo
diferente de tocar. Eles tocavam muito forte, alto. Mas o dançarino gostava realmente era
de dançar com a Capelozza, porque era uma orquestra mais suave”. Apesar da rivalidade,
ele garantiu que sempre foram amigos.
       A propósito, antes de aperfeiçoar os seus estudos em música no Conservatório
Jauense, tomou as primeiras lições com o maestro Danilo Fornalé (“expoente máximo
como professor que conheci!”) e participou de um pequeno conjunto (do qual não se
lembra o nome) dirigido por Romeu Fornalé, os irmãos, ambos ex-integrantes da
Orquestra Continental.
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       Para Pavan, como a maioria dos músicos da Capelozza, o trabalho da orquestra
era um “bico” que ajudava no orçamento, sobretudo depois que se casou pela primeira
vez, em 1952. “O casamento não complicou minha vida, porque eu amo e sempre amei a
música e minha primeira esposa, falecida, era uma moça compreensiva”.
       Hoje, bem estabelecido comercialmente, Roberto não sente mais falta da orquestra
como “bico”. Entretanto, lamenta o fato dela como de todas as orquestras do interior de
São Paulo terem terminado. Para ele, além da concorrência dos conjuntos de rock, um dos
motivos do seu fim, é o fato de que “hoje, o moço não pensa em estudar música. E os
músicos mais velhos foram se desgastando, foram morrendo e não houve renovação das
orquestras”.
       E justamente por isso, ou seja, o fato das jazz-bands da década de 50 (em
particular a Continental e a Capelozza) estarem condenadas ao esquecimento, é que
Roberto Pavan disse estar contente com iniciativas do tipo desta reportagem. “Acho isso
fantástico! Porque tudo passa, não? E se você não fizer isso, quem vai saber quem foi o
Roberto Pavan? Não que eu faça questão, aliás, eu não acho que se deva marcar o fulano
de tal, mas principalmente as duas orquestras. Inclusive, eu já pensei no dia de Santa
Cecília, 28 de novembro (1), fazer uma exposição na minha vitrine, mostrar para o
público jauense ou quiçá, da região, através de uma exposição de fotos, o que foram
realmente a Orquestra Continental, a Orquestra Capelozza, os seus músicos... Esse é o
sentido da coisa...”




Nota
(1) O entrevistado se enganou sobre a data da festa de Santa Cecília. A data correta é 22
de novembro.
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O BAILE
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       “Época muito romântica, o som da orquestra inspirou o nascimento de muitos
casamentos. Ainda hoje casais se lembram da música que a Continental estava
executando quando trocaram o primeiro olhar”. (1)
       Porém, o baile em pequenas cidades do interior, como Jaú, era mais que uma
oportunidade para encontro de moços apaixonados. Dançar ao som da jazz-band nos
finais de semana era uma das poucas opções de lazer para a maioria da população jauense
nos anos 50. Além disso, restavam o futebol, o bilhar, o bocha, o cinema, a paquera (o
chamado “footeen”) na praça ao som da “furiosa”. (2)
       Nesse período, enquanto o rádio conhecia o seu auge como veículo de
comunicação de massa, a TV no Brasil estava apenas engatinhando. Não era um veículo
popular. Ao contrário, possuir um aparelho de TV era um privilégio. Sendo assim, o
lazer, nas pequenas sociedades como a de Jaú estava quase que invariavelmente ligado às
relações humanas mais diretas. E o baile era, possivelmente, entre essas formas de lazer, a
predileta do público. Além do mais, do ponto de vista das gravadoras, o baile era
fundamental na manutenção do comércio de discos, uma vez que os sucessos do rádio
eram também tocados pelas jazz-bands.
       Como no rádio do Brasil da década de 50, o que “estava por cima” era a música
romântica (Nelson Gonçalves, Francisco Alves, entre outros, eram os cantores favoritos
do público), o que se ouvia nos bailes era justamente a valsa, o tango, o bolero, o samba-
canção, ritmos românticos por excelência. Para contrabalançar, tocava-se o jazz, o fox-
trote, a rumba, o mambo, o swing, ritmos mais agitados. De qualquer forma, quem
dançava era o casal, o que independente do ritmo mais ou menos acelerado, era uma
chance para uma aproximação mais efetiva entre o rapaz e a moça. Efetiva sim, mas nem
tanto... Afinal, havia como que uma “consciência coletiva” que determinava limites bem
claros até onde o rapaz podia chegar. Coladinhos mesmo só os namorados mais
avançados ou que tinham coragem para tanto, porque, normalmente, havia a direção do
clube que não permitia atitudes desse tipo.
       Sobre situações como essa, Tunin Capelozza recorda uma passagem da
Continental que, hoje, soaria no mínimo engraçada: “Vou contar um baile que nós
fizemos no Jaú Clube. Foram convidados estudantes de Campinas para tomar parte desse
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baile. Você sabe, Campinas era uma cidade diferente da nossa, uma cidade grande. Um
ambiente diferente. Os moços se beijavam... e não tinha nada disso por aqui. No clube, o
Totó Pacheco era o presidente. Ele ficava na porta assim... (levantou-se e fez a pose).
Aconteceu que um dos estudantes beijou uma moça que estava dançando. Ele esperou a
contra-dança, mandou chamar o rapaz na diretoria e falou: ‘O Sr. pode se retirar do
salão`. Bom, eram todos estudantes: tirou um, saíram todos. E acabou o baile. Tocamos
três músicas e ganhamos o baile inteirinho”.
       Atitudes rigorosas à parte, o baile era muito esperado por todos. Sobretudo nas
datas especiais, como o aniversário da cidade, os bailes caipiras em junho, os de
formatura em dezembro e janeiro, e os bailes das debutantes. Existia uma expectativa
muito grande em torno desses eventos. Observava-se com cuidado cada detalhe na
preparação para o baile. O crooner Sabu contou: “O baile aqui em Jaú, por exemplo - isso
eu me lembro perfeitamente - anunciava-se: ‘O Aero Clube vai promover o baile caipira
no dia 2 de julho`. Esse baile era anunciado em maio. Então, as moças se preparavam
para esse baile. Alguma comprava um sapato novo, fazia vestido novo, comprava
chapeuzinho, quer dizer, ia-se devidamente caracterizado. Todo mundo! O baile das
debutantes era muito interessante. Dois meses antes, os pais já ficavam se preparando,
comprando, fazendo vestido para as filhas. Mas era ‘o baile’! Era um ritual, alguma coisa
fora do comum, feita com muito capricho!”
       De fato, existia esse capricho. É o que me confirmou o casal Leon e Eunice: “As
moças iam de vestido longo, cores claras, suaves e cinturinha fina. O rapaz sempre de
terno e gravata. Usava-se muito terno branco”.
       O interesse pelo baile era geral, envolvia toda a cidade. Tanto que “quase todos os
nossos bailes eram irradiados pela Rádio Jauense (a PRG7). Isso era natural na época”,
completou Sabu.
       Quanto ao clima, ao ambiente no salão, todos, músicos e o público da época são
unânimes: havia muito respeito. É verdade que todos concordam que existia um
“controle” sobre o comportamento. Mas preferem dizer que a atitude de respeito era uma
opção para a maioria das pessoas. “O clima era simplesmente maravilhoso! Porque,
geralmente, o casal ia para dançar. O clima era tão gostoso que a gente que estava
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tocando lá no alto, no palco, percebia que o povo tinha satisfação enorme em dançar. Era
um ambiente sadio, gostoso, dançavam realmente. Havia pessoas que dançavam e
começavam às dez e só paravam às quatro da manhã. (...) Às vezes, tinha pessoas,
mocinhos de Jaú que iam conosco nos bailes só pra dançar, em São Manoel, Dois
Córregos, Barra Bonita...”, contou o saxofonista Roberto Pavan.
       Apesar do “controle de qualidade”, uma vez ou outra acontecia alguma confusão.
O meu próprio pai, Bruno Marques, contou-me que, certa vez, em um baile no “Clube
Dansante Operário”, um primo nosso “recebeu tábua” de uma moça ao convidá-la para
dançar. Quando uma moça, por qualquer motivo que fosse, “desse tábua”, isto é,
recusasse um convite para dançar, ela jamais poderia, durante o resto do baile, aceitar o
convite de outro rapaz. Se o fizesse, estaria desrespeitando o primeiro que lhe fizera o
convite. Foi o que aconteceu com o nosso primo. Ele foi desrespeitado. Inconformado e já
um tanto alterado por ter exagerado na dose do conhaque, não teve dúvida: partiu pra
cima da senhorita e meteu-lhe um belo tapa no rosto. Formou-se logo uma confusão.
Porém, para ele nada aconteceu. Funcionário da Receita Federal, o primo era quem
concedia os alvarás para a realização dos bailes. Logo, expulsá-lo do salão não seria uma
medida conveniente a ser tomada pela direção do clube...
       Entretanto, as situações mais pitorescas nos bailes da cidade eram aquelas que
envolviam os casais apaixonados. Em virtude do clima de respeito e severidade com que
se conduzia o relacionamento entre um rapaz e uma moça durante os anos 50, o namoro
era antes de tudo uma aventura. A dificuldade de se chegar a uma maior intimidade com a
namorada, obrigava o rapaz a passar por situações, em geral, constrangedoras. Entretanto,
para os casais que eram jovens naquele período, as barreiras de então davam um sabor
especial àquela aventura. O que para nós, início dos anos 90 (3), talvez já não teria a
menor graça.
       O casal Hipólito Leon e Eunice Pavanelli de Menezes recordou uma situação da
qual foram protagonistas e que dá uma boa idéia a esse respeito. Ambos eram jovens. Ele,
extrovertido, filho de família humilde. Ela, introvertida, filha de família abastada e
tradicional da cidade. “Quando a gente almoçava na casa dela, na mesa, ninguém abria a
boca. Só falava o pai”. Provavelmente por isso, para Leon, Eunice era uma pessoa difícil.
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Acontece que ele adorava dançar (diga-se de passagem, ainda hoje tem fama de bom
dançarino). Assim, algumas vezes, após deixar a namorada em casa, Leon ia com uma
turma de amigos para o clube. Preferia que a namorada não soubesse. “Mas se ficasse
sabendo, eu não iria esconder”.
        E foi o que aconteceu. Certa vez, uma amiga de Eunice viu Leon em um baile,
evidentemente, dançando com outra garota. “O baile foi em outra cidade, em Pederneiras
ou Dois Córregos”... Ao saber do fato, Eunice foi taxativa: “Então, não podemos
continuar namorando”. Assim, ambos de coração partido, resolveram terminar
solenemente o namoro. Escolheram dia, horário e local para fazê-lo. “Foi em frente a
delegacia. A gente ficou um tempão no ‘chove-não-molha’. Já fazia um ano que
estávamos namorando e eu ainda não tinha sequer dado um beijo nela...A gente ficava só
nos dois beijinhos no rosto e pronto. Quando, finalmente, resolvemos nos despedir, eu
não aguentei: agarrei-lhe e lhe dei aquele beijo! Foi uma cena cinematográfica!”
(enquanto ríamos, eu e o “seo” Leon, a dona Eunice ficou vermelha como um pimentão).
Depois daquilo, choramingando, Eunice disse a Leon: “É, agora a gente vai ter que
continuar namorando...” (risos)




Notas
(1) “O som das grandes bandas do interior paulista” in jornal Internews, suplemento de
cadeia de jornais da CBI, agosto/1975.
(2) “Furiosa”é o termo popular usado para nomear as bandas de coreto.
(3) Vale lembrar que este trabalho de reportagem foi concluído no final de 1991,
portanto, início da década de 90.
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“WALDOMIRO DE OLIVEIRA”
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       Antonio Waldomiro de Oliveira, 66 anos, casado, 4 filhos. São tantas e variadas as
atividades que exercera na sua vida até aqui (entre elas a de componente da Orquestra
Continental) que parece difícil saber por onde começar. Em virtude de sua falta de tempo,
foi difícil conseguir um momento para um bate-papo.
       É que o “seo” Waldomiro é e sempre foi uma pessoa muito ocupada. Desde o meu
primeiro contato - quando lhe apresentei a idéia dessa reportagem - ele estava com todo o
seu tempo tomado com a gravação de um disco. Uma iniciativa pessoal, algo, como
definiu o crooner Sabu (que teve participação neste LP) “para ficar para a posteridade”.
       Entretanto, desde o início, Waldomiro demonstrou-se prestativo, interessado em
colaborar. Ele, inclusive, emprestou-me um material precioso que contribuiu e muito para
a conclusão dessa reportagem. A sua contribuição foi fundamental, porque Waldomiro
esteve a frente da Continental durante a maior parte de sua existência.
       Desde cedo, encontrou a sua vocação para a música. Quando criança, aprendeu
piano e clarinete. Mas foi como cantor que se realizou.
       Começou no coral da Igreja, em Lins, sua cidade natal. Levando jeito para o
ensino, um ex-professor o convidou a vir morar em Jaú, onde passou a lecionar Mecânica
na Escola Industrial. Isso foi em 1943. Efetivou-se e, em 1969, se aposentou como
professor.
       Em Jaú, como cantor, começou dando “canjas” no Nosso Jazz (1) e depois na
Orquestra Típica Continental. Mais tarde, a convite dos Capelozza, passou a dividir a
função de cantor com João Rafa. Este último, tendo concluído o curso universitário,
deixou a orquestra. E Waldomiro assumiu integralmente a função de cantor da
Continental.
       Em 1947, os irmãos Amélio e Tunin Capelozza partiram para Marília por motivo
de serviço, deixando a orquestra nas mãos de Waldomiro e do pistonista José Ayello. Em
1948, Waldomiro assumiu inteiramente a direção da mesma. A partir daí, conforme
reconhece o próprio Tunin Capelozza, a Continental conheceu seu auge.
       Como cantor da orquestra, além de acompanhar os sucessos da época, Waldomiro
tinha que se virar com os tangos e as canções em inglês e francês. Na retaguarda,
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apoiando o então namorado, estava a Odete, hoje, sua esposa. Era ela quem datilografava
as letras das músicas.
       Mas a carreira do cantor Waldomiro de Oliveira poderia ter ido muito além do
sucesso com a Continental, como conta o jornalista Mário Schwarz (2): “Aproveitando o
conhecimento que tinha do Rio de Janeiro, onde em 1943, pelas mãos do irmão mais
velho, havia vencido o programa de calouros da lendária Rádio Nacional (‘ Hora do
Pato’), Waldomiro voltou à Guanabara, não como José Antonio (pseudônimo que havia
utilizado no programa de calouro), mas com o seu próprio nome para se apresentar no
programa ‘Papel Carbono’, do famosíssimo Renato Mursi: ‘Cantei Jezebel, gravada pelo
Jorge Goulart, e também ganhei o primeiro lugar. O Mursi quis me contratar
imediatamente para fazer parte do ‘cast’ da Nacional, prometendo que se eu ficasse, ele
me conseguiria uma gravação dentro de três meses, assim como tinha conseguido para
outro vencedor de ‘Papel Carbono’ há pouco tempo, o Agnaldo Rayol. Mas argumentei
que não podia deixar minha família, a escola e a orquestra de Jaú’. Ao menos por pouco
dias, Waldomiro de Oliveira fez parte do elenco da Rádio Nacional. Esteve até em Juiz de
Fora, Minas, com os cantores daquela emissora e recebeu, inclusive, propostas para
gravar compositores anônimos. Cantou também no Glória, onde conta foi ‘trisado’, ou
seja, em vez de apresentar uma música como estava previsto, foi obrigado a cantar mais
duas outras, fora do roteiro, atendendo a platéia. ‘O Renato Mursi não se conformava.
Vivia dizendo: ‘Puxa vida, Waldomiro, você foi trisado. Fica aqui’. E não fiquei, voltei
para Jaú. Mas aquele contato foi importante’.”
       A pessoa do Waldomiro chama atenção. É do tipo que se impõe, atirado. O ar de
professor é inconfundível. Mesmo os mais jovens que não o conheceram ou o conhecem
como músico (atualmente, é regente de um coral litúrgico formado apenas por vozes
masculinas, o “Nossa Gente”), com certeza, já ouviram falar dele como instrutor de canto
do Tiro de Guerra de Jaú. Ganhou uma comenda do Exército por isso.
       Waldomiro foi também: presidente da Comissão Pró-Instalação da Paróquia de
Nossa Senhora Aparecida (da qual depois foi seu diretor administrativo), fundador e
governador do Serra Clube de Jaú (3), fundador e regente do Coral Santa Cecília que
durou vinte anos e chegou a gravar um LP. E a lista continua. Durante 25 anos deu
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assistência aos presos da cadeia pública de Jaú, é membro do Lions e pertence à
Irmandade dos Vicentinos. Há 9 anos dirige um programa na Rádio Piratininga de Jaú,
todas as quintas-feiras, a partir das 22 horas. “É assim que Jaú canta” chegou a ser
irradiado em todo País pelo extinto Projeto Minerva. Waldomiro foi ainda vendedor em
uma revendedora de carros de Jaú.
        Seu curriculum vitae é ainda mais extenso. Mas até aqui dá pra se ter uma boa
idéia da vitalidade e disposição do maestro Waldomiro.
        Em se tratando de música, as realizações de Waldomiro não param em si mesmo.
Seu filho homem, Antonio Waldemir, ou simplesmente Mir, formado em Composição
pela Universidade de Campinas (UNICAMP) tornou-se um conhecido músico de Jaú e
região. Como se diz, “filho de peixe, peixinho é”.
        Entre os antigos músicos das orquestras de Jaú, Waldomiro ficou conhecido como
arrojado pela gravação dois Lps da Continental, uma iniciativa sua que, mesmo devido
aos prejuízos financeiros com os quais ele próprio teve que arcar, projetou ainda mais o
nome da orquestra e da cidade.
        Ele não esconde o orgulho com que realizou tudo isso, em especial como atuou
como cantor, diretor e regente da Orquestra Continental. Recentemente, em um encontro
de corais amadores realizado em Jaú, ao apresentar Waldomiro e seu grupo “Nossa
Gente”, a coordenadora do evento assim o definiu, referindo-se ao seu trabalho com a
música ao longo dos anos: “um lutador!”. Elogios à parte, algo que não dá para contestar.




Notas
(1) O Nosso Jazz foi um dos primeiros jazz-bands de Jaú, fundado pelos irmãos Amélio e
Tunin Capelozza. Com o fim do Nosso Jazz, os irmãos Capelozza fundaram a Orquestra
Continental.
(2) SCHWARZ, Mário. “Personagem: Waldomiro de Oliveira” in Jornal Comércio do
Jahu, Jaú, 25/10/1987, p. 5.
(3) Entidade católica que trabalha pelas vocações sacerdotais e religiosas.
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“DANILO FORNALÉ”
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       Falar da história da música de Jaú, sem falar em Danilo Fornalé é como cometer
sacrilégio. Exagero? Não, a julgar pelo que dizem as pessoas, músicos e públicos de Jaú,
em geral. E não é pra menos. Sem ter qualquer formação acadêmica no assunto, o ex-
pistonista da Orquestra Continental, Danilo Fornalé, já ensinou (e ensina) música para
muita gente de Jaú. Os próprios irmãos Capelozza aprenderam com Danilo. E ele
continua na ativa. Mesmo tendo deixado de lado o pistão há um bom tempo, Danilo
continua a viver de música. Atualmente, é professor na Escola Municipal de Música
Heitor Azzi, é o regente da “Carlos Gomes” (a banda de coreto que já tem 100 anos de
existência) e escreve composições e partituras para outros músicos.
       Baixo e franzino, Danilo, a considerar os estereótipos do artista em voga, à
primeira vista, não convence se tratar de um músico. Também não está preocupado com
isso. Fala da história da Continental com uma naturalidade que parece até ser coisa sem
muita importância. Não é o tipo saudosista, não fala com eloqüência nem parece estar
preocupado em convencer seu interlocutor de verdades. Para ele, ser músico, ao contrário
do que pensa muita gente, é ter uma profissão como outra qualquer.
       É curiosa essa atitude despretensiosa, sobretudo a julgar pelo seu currículo. Filho
e sobrinho de músicos (seu pai e um dos tios tocaram na Banda Carlos Gomes,. no seu
início, juntamente com o seu fundador, o maestro Heitor Azzi), Danilo Fornalé, segundo
ele próprio, aprendeu música sozinho. Teve um irmão, Romeu Fornalé (já falecido),
saxofonista, que também fizera parte da Orquestra Continental. Assim, através de um
dom natural e da convivência familiar, aprendeu a tocar e não largou mais o que, com o
tempo, passou a ser a sua profissão. Desde pequeno, acompanhava o pai e o tio que
tocavam na banda do maestro Azzi. E ainda moleque passou a fazer parte da “furiosa”. A
propósito, a entrevista se deu na sede da “Carlos Gomes”, que é também a sua residência.
       “Mas o Sr. não teve outra profissão?”, perguntei. “O meu pai queria que eu
exercesse a profissão de alfaiate. Comecei como aprendiz. Mas larguei. Isso não me
interessava”.
       Tanta dedicação a essa atividade é que faz com que se entenda o que me disse
Tunin Capelozza, referindo-se ao amigo: “É impressionante! Ele é capaz de ouvir uma
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música, qualquer que seja, pela primeira vez e depois, escrever a sua partitura... assim, no
ato!” De fato, além de músico da orquestra, foi também um dos seus arranjadores.
       Mas Danilo realmente não parece preocupado com elogios nem tampouco parecer
ser muito emotivo. Entretanto, quando lhe mostrei algumas fotos das orquestras de Jaú
que conseguira, ele não escondeu a emoção. Olhando bem para uma das fotos, me disse:
“Puxa! Que saudades!”
       Danilo é casado. Não teve filhos. Já teve muitos alunos. Como os Capelozza, boa
parte dos músicos das jazz-bands, nascidos em Jaú, tomaram lições com ele. Das
amizades, em especial como músico da Orquestra Continental, Danilo recorda uma
passagem curiosa. Tudo começou com uma brincadeira. E terminou em uma tragédia.
       Como é comum entre companheiros de trabalho, entre os músicos da Continental
sempre tinha um que “pegavam pra Cristo”. Ele se lembra do “seo” Giacomo, contra-
baixista. “Ele era mais velho. Uma pessoa muito simples, até simplória. Certa vez, por
brincadeira, o pessoal inventou que ele tinha morrido. Reconheço que foi humor negro...
Enfim... Então, o nosso fotógrafo tirou fotos do ‘enterro do Giacomo’. E mandaram para
Jaú. Ele próprio achou graça. Foi mais uma brincadeira... Acontece que pouco tempo
depois, num baile... estávamos tocando quando, de repente, ouvimos um barulho surdo
atrás. Olhamos e era o ‘seo’ Giacomo. Ele estava estirado no chão. Parou-se o baile,
procuramos atendê-lo. Mas foi tarde.... Ele morreu de parada cardíaca”.
       Muita coisa lhe foge à memória: nomes, datas, fatos. Foram mais de 20 anos como
componente da Continental. E isso há mais de trinta anos atrás. A impressão que se tem é
que ele não parece perturbado com o fato de que as pessoas possam esquecê-lo. “Cada
um tem a sua fase”, conclui.
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“CONSTANTE OMETTO”
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       Custou, mas encontrei. Ele estava em casa, no fundo do quintal, cuidando dos
frangos. Aos 77 anos, aposentado há um bom tempo, aquele trabalho todo com as
galinhas era para “se sentir útil”. Mas a verdade é que o “seo” Constante gosta daquele
serviço. Afinal, nasceu na roça e lá se aprende a gostar dessas coisas.
       E justamente o fato de ter vivido e trabalhado no campo durante a sua infância e
juventude é que faz da história do músico (saxofonista e clarinetista) Constante Ometto,
uma história única.
       A simplicidade ao narrar episódios de sua vida pessoal, bem como enquanto
músico das orquestras Continental e Capelozza, lembra um romance clássico. Talvez o
fato de possuir uma forte fé religiosa (é membro da Igreja Adventista de Jaú) faz com que
Constante veja a vida, mesmo as dificuldades do passado, como “um dom de Deus”. Por
isso, seu discurso é sempre entremeado de trechos bíblicos e alusões à fé.
       Desde cedo, Constante demonstrara uma forte inclinação para a música: “Vivia
cantando, na roça, vivia cantando”. Apesar de sua mãe ser contra (inconformada com o
gosto musical do filho, certa vez, quebrara sua viola), Constante adorava fazer seresta.
       Entretanto, a vida no sítio era dura. “Essa coisa de ter que dormir cedo para
acordar de madrugada e ir para a roça dificultava a gente fazer seresta”. E como se não
bastasse, “trabalhava-se muito e ganhava-se pouco”.
       Diante dessa situação, adorar música e estar descontente com que ganhava no
campo, Constante, ainda contrariando a opinião de sua mãe, partiu para um investimento
arrojado. Foi aprender música para ganhar mais dinheiro. Seus “professores”: os irmãos
Capelozza. Depois de estudar a teoria, optou pelo sax. Aprendeu também a tocar o
clarinete, mas era do sax que gostava.
       Para ele, a música, pelo menos no início, foi um empreendimento que deu certo.
De fato, os seus rendimentos aumentaram muito desde que começou a tocar no cabaré da
cidade (1). “A minha vida melhorou bastante naquele tempo”.
       E precisava realmente que melhorasse, uma vez que, nessa época, já estava
casado. Constante casou cedo, porque antes de tudo desejava sentir-se livre das antigas
pressões familiares, em especial da mãe que via o trabalho de músico com descrédito.
Dona Aparecida, sua primeira e única namorada e esposa há quase 50 anos, ao contrário,
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apoiava e muito o trabalho no cabaré. “Mas não havia problema em casa por tocar num
lugar daqueles?”, insisto. “Não, não. Porque a gente ia lá para trabalhar, não para perder
tempo com outras coisas”.
       A esse propósito, não teve dúvidas. Participou de nossa conversa a dona
Aparecida, esposa de Constante, que com sua simplicidade e espontaneidade, endossava
cada palavra do marido. E mais que isso: o já não tão jovem casal demonstrou a todo
momento de nossa entrevista uma harmonia comovente.
       Com vários problemas de saúde, entre eles o da audição, algumas vezes e de
forma inocente, dona Aparecida desviava a conversa do assunto com seus comentários.
Nesses momentos, Constante, com uma paciência incomum, dizia-me: “Ela não escuta
direito, não entende sobre o que estamos conversando. Por isso, interrompe...” E
procurava, com a mesma paciência, ouvi-la e ajudá-la a participar do assunto.
       Num dado momento, talvez entusiasmada com a minha visita, ela perguntou-me
se não gostaria de ouvir uma canção que eles costumam cantar na sua igreja. “Quando eu
era moça, eu também cantava bastante”, me diz. Constante resolveu acompanhá-la: “Se
não, ela não consegue. Ela anda um pouco sem voz”.
       Quando os Capelozza fundaram a Continental, convidaram o amigo Constante
para fazer parte da orquestra. Depois que se mudaram para Marília, Ometto permaneceu
na Continental. Ao voltarem para Jaú, os Capelozza fundaram a Líder Orquestra.
Novamente, em nome da antiga amizade, o saxofonista Constante saiu da Continental
para acompanhar os Capelozza. Ali permaneceu até o fim de Capelozza e sua Orquestra.
       Com o passar do tempo e com a chegada dos filhos (tiveram um casal, 6 netos e
até aqui 7 bisnetos), viver apenas de música deixou de ser um bom negócio. Ou pelo
menos, deixou de garantir por si só o sustento da família. Assim, Constante passou a
trabalhar na prefeitura, por onde acabou se aposentando.
       Sobre as orquestras de Jaú, Constante não esconde a saudade que sente daquele
tempo. Ele ressaltou sobretudo o respeito e prazer com que as pessoas se divertiam nos
bailes e como as orquestras da cidade eram muito aplaudidas por onde se apresentavam.
       Sentados na cozinha de sua casa, eu, Constante e Aparecida, parecíamos velhos
conhecidos, embora tivéssemos nos conhecido há pouco mais de uma hora atrás. Ambos
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os meus entrevistados demonstravam-se entusiasmados com a conversa e a sua
jovialidade me deixava de tal forma à vontade que não me dei conta da notável diferença
de gerações. A um certo momento, Ometto perguntou-me como o havia encontrado.
Então, contei-lhe como fizera. E ele me disse: “Estou contente que tenha se lembrado de
mim”. Posso entender o porquê disso. Se o vissem andar pelas ruas de Jaú a pé ou no seu
modesto fusca verde petróleo, pouquíssimas pessoas hoje, lhe dariam o devido valor que
merece.




Nota
(1) Na verdade, não se tratava de um cabaré propriamente dito, pelo menos não do tipo
que sabemos ter existido nas grandes cidades. Algo recatado que não feria muito a
imagem da cidade tradicional do interior de São Paulo.
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JAÚ: A MÚSICA HOJE
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       Comparar a atividade musical de Jaú nos anos 50, focalizando, em especial, a
atuação das jazz-bands, com os dias atuais, é uma tarefa difícil. Na verdade, nem dá para
comparar. Tudo mudou e muito.
       Não existem tantos bailes como antigamente. Afinal, nas décadas de 40 a 60, o
baile era uma das poucas opções populares de lazer. Hoje, ao contrário, o baile é um
acontecimento se não raro, ao menos, bem menos freqüente. O que contudo, não deixa de
ter um valor atrativo considerável.
       Para os músicos profissionais que atuam em Jaú e na região, é impossível pensar
seu trabalho em termos de orquestra. Aquela formação (cujo número médio ficava entre
15 e 20 elementos) seria insustentável para um grupo musical, hoje. Pelo menos, num
campo de trabalho como o interior.
       Contudo, para esses mesmos músicos, em geral, hoje em dia, a situação é melhor.
Mesmo sem tantos bailes, outras opções de trabalho, surgidas nos últimos anos, vieram a
se tornar novos espaços para o exercício da profissão de músico em cidades como Jaú.
       Além dos bailes, há os casamentos (cerimônia e festa), jantares dançantes,
restaurantes e bares. Nesse ambientes, a presença da música ao vivo passou a ser
exigência natural do público. Assim, o bar que tem música ao vivo, em geral, tem uma
freguesia maior. Logo, o cachê do músico também é maior, uma vez que ele recebe uma
quantia (o couver artístico), previamente estabelecida com o proprietário da casa, por
cada mesa ocupada.
       Para saber melhor a respeito da situação do músico de Jaú e região, procurei
Arquimedes Cantarine Ferreira, músico profissional e delegado regional da Ordem dos
Músicos do Brasil. “Não tenho o que reclamar. O grupo que está bem estruturado, tem
serviço para a semana toda”, garante Arquimedes. Para ele, inclusive, o trabalho em bares
nos finais de semana passou a ser uma segunda opção em relação aos casamentos e
jantares. Ele afirma com segurança de quem nos últimos 27 anos só viveu de música.
       Casado, com 3 filhos, aos 42 anos, Arquimedes tem um trio. Autodidata em sax,
flauta transversal, guitarra e contra-baixo e formado em violão clássico pelo
Conservatório Jauense de Música, também leciona no mesmo conservatório e em Bauru.
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Ele afirma que o nível dos músicos de Jaú, na atualidade, é bom, o que contribui para
tradição da cidade na área. O próprio Arquimedes teve um dos seus primeiros contatos
profissionais com a música tocando surdo e caixa no seu primeiro carnaval, quando
acompanhou a Orquestra Capelozza, esta na sua fase final.
       Uma característica fundamental para a sobrevivência da atividade profissional em
música, hoje, é precisamente o trabalho em pequenos grupos, duplas e/ou trios ou ainda
sozinho. Aliado a isso, o uso de órgãos, sintetizadores, baterias eletrônicas, veio a facilitar
o trabalho que, no caso do trio do Arquimedes depende em 70% de tecnologia. Isso tudo,
além de um repertório eclético, que atenda a todos os gostos e preferências, o que
significa, normalmente, acompanhar a música comercial das gravadoras e rádios.
       Há ainda outro espaço, que ajuda a manter a tradição musical da cidade que são as
aulas particulares, em escolas e conservatórios.. Por fim, surgiu um novo espaço musical,
tanto para os profissionais como para o público: o Projeto “Som na Praça”, uma iniciativa
da Prefeitura Municipal de Jaú que, aos sábados e domingos à noite, reúne músicos da
região que se apresentam na Praça Tancredo Neves (próxima à estação rodoviária).
       Sobre o mercado fonográfico, todos os músicos da cidade são enfáticos: não dá
nem pra pensar. Como aconteceu com a Continental, gravar um LP hoje (o que já se pode
fazer no interior) é um empreendimento nada lucrativo. Serve quanto muito para quem
pode investir dinheiro próprio, inclusive na divulgação e comercialização ou por gosto
pessoal. O mercado de discos é um campo restrito a poucos. Além do mais, apenas a
música comercial (com predominância para o que se toca fora do País) tem chance nesse
mercado. “Eu não poderia gravar apenas o que eu gosto, um disco instrumental, por
exemplo”, explica Arquimedes.
       Quando aos clubes, existem ainda o Aero Clube e o Grêmio Paulista. Além
desses, há o Caiçara Clube, o mais novo e luxuoso da cidade.
       Os principais bailes, contudo, são animados por grupos de fora, quase sempre, da
capital. O que se ouve nesses bailes é o de sempre, ou seja, a música comercial. Tangos,
valsas, boleros e outros antigos ritmos populares deixaram de ser populares. Agora,
pertencem ao passado. A propósito, o comentário dos jovens, em geral, é que é “uma
chatice” ouvir Glen Miller, Ray Coniff e por ai afora.
57


       Assim, mesmo com a presença do conjunto, o baile hoje parece mais com a boate
dos finais de semana (onde se liga o CD e pronto) do que com o baile mesmo. Bem, pelo
menos, é o que garantem os saudosistas.
58


RELATÓRIO SOBRE A REPORTAGEM “JAÚ EM RITMO DE BAILE”


       A idéia do tema, uma reportagem impressa sobre a história das orquestras
Continental e Capelozza de Jaú, surgiu ainda no segundo semestre de 1990.
       Jaú é uma cidade rica em tradições. Entretanto, conforme informações obtidas
empiricamente, pouco se tem organizado a respeito da história das orquestras Continental
e Capelozza, patrimônios da tradição musical de Jaú.
       A relevância do tema se dá pelo sucesso que tais orquestras de salão alcançaram
durante quase três décadas (1940 a 1970), cuja atuação permanece viva na memória das
pessoas que viveram aquele período.
       A partir desse fato, surgiu a idéia de se fazer essa reportagem que não só
procurasse cobrir essa lacuna na história da cidade, bem como servisse de subsídio a
pesquisas e estudos futuros.
       Assim, ainda em 1990, consultei alguns professores acerca da viabilidade da
proposta para o Projeto Experimental, a ser executado e apresentado no segundo semestre
de 1991.
       A confirmação veio no início do semestre seguinte, logo nas primeiras aulas da
disciplina Planejamento em Comunicação, quando o aluno discute em sala de aula sua
proposta para o Projeto Experimental e elabora um pré-projeto.
       Durante praticamente todo o primeiro semestre de 1990, dediquei-me, sob a
orientação do professor Dr. Antonio Carlos de Jesus, responsável pela disciplina
Planejamento em Comunicação, à elaboração desse pré-projeto, que nada mais é que um
roteiro inicial que direciona todo o trabalho do aluno na execução do próprio Projeto
Experimental.
       Antes contudo, de elaborar o pré-projeto, realizei um trabalho de pesquisa, o
“Conhecimento da Realidade”. Trata-se de um levantamento acerca do meio no qual se
desenvolve o assunto de pesquisa do projeto. No meu caso, ou seja, a “realidade” na qual
estavam inseridas as duas orquestras é a cidade de Jaú (SP), mais precisamente durante as
décadas de 40 a 70, período de existência das referidas jazz-bands.
59


       Desse modo, durante a última quinzena de março/91, pesquisei junto a fontes
informais (Biblioteca Municipal e do Museu Municipal) e fontes informais (os arquivos
pessoais de ex-integrantes das orquestras e público em geral) material (texto, fotos e
ilustrações) sobre esse período da história de Jaú e informações preliminares sobre o
objeto em estudo, ou seja, as duas orquestras. Ainda no final de março, redigi o
“Conhecimento da Realidade”.
       Em seguida, durante a primeira quinzena de abril/91, realizei uma pesquisa
bibliográfica sobre o assunto “música”, buscando focalizar sobretudo o período em
estudo. Além disso, li e fichei livros que se relacionavam direta e indiretamente ao
assunto. (Procurei consultar diversos professores a respeito de sugestões de leitura).
       Concluído esse trabalho, durante a primeira quinzena de maio/91, empenhei-me
na redação do pré-projeto e de uma proposta para a estrutura do próprio Projeto
Experimental.
       Munido do “Conhecimento da Realidade”, Pré-Projeto e Proposta de Estrutura do
Projeto, através de um ofício, solicitei a orientação do professor Murilo César Soares do
Departamento de Ciências Humanas da FAAC (Unesp-Bauru).
       Definida a orientação, iniciamos a partir do segundo semestre de 1991, algumas
reuniões para discutir o andamento do projeto.
       No entanto, ainda no primeiro semestre de 1991, sobretudo durante o mês de julho
(férias escolares) e início de agosto, realizei novo trabalho de pesquisa. Junto à Rádio
Piratininga de Jaú, consegui uma cópia da gravação do primeiro LP da Orquestra
Continental, “Convite para o Baile”. Junto ao Museu Municipal e alguns ex-integrantes
das orquestras, obtive fotos (que pude reproduzir) e matérias de jornais sobre o assunto.
       Entre os dias 01 e 10 de agosto, realizei entrevistas com os antigos músicos e
pessoas (a maioria casais) que viveram a época em estudo e acompanharam o sucesso da
Capelozza e Continental. Foram, ao todo, 10 entrevistas, das quais 6 mereceram, cada
uma, um capítulo especial no trabalho final. Além das entrevistas, realizei vários contatos
informais com ex-músicos e público em geral que, embora rápidos e não tendo sido
gravados, contribuíram significativamente com as informações que deles obtive.
60


       De posse das entrevistas transcritas, além do material anteriormente pesquisado
(“Conhecimento da Realidade”, bibliografia), iniciei ainda em agosto, o trabalho de
redação do projeto.
       Esse trabalho, realizado em microcomputador, estendeu-se até o início de
novembro. Durante esse período, o professor orientador acompanhou o trabalho de
redação com sugestões e correções.
       Redigido o projeto, bastou estruturá-lo a partir de um índice. Na última semana de
novembro, o trabalho foi entregue aos professores da banca examinadora, anteriormente
convidados.
61


BIBLIOGRAFIA


CORREA, Ricardo S. Ouvinte Consciente. São Paulo. Ed. do Brasil SA ______.

FERNANDES, José. Vultos e fatos da História de Jaú. Edição conjunta extraordinária
do Correio da Noroeste, Correio da Capital, Correio de Garça, comemorativa do
centenário de Jaú, São Paulo, 1955.

MILANESI, Luiz A . O Paraíso via Embratel. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1978.

“O som das grandes bandas do interior paulista” in Jornal Internews, suplemento de
cadeia de jornais da CBI, agosto/1975.

SCHWARZ, Mário. “Personagem: Waldomiro de Oliveira” in Jornal Comércio do Jahu,
Jaú, 25/10/1987, p. 5.

SEVERINO, Antonio J. Metodologia do Trabalho Científico. 16a. ed., São Paulo,
Cortez Editora & Editora Autores Associados, 1990.

SODRÉ, Muniz. Técnica de Reportagem: Notas sobre a Narrativa Jornalística. São
Paulo, Summus Editorial, 1986.

SUCUPIRA, Zélia. “Personalidade em destaque: Plácido Antonio Capelozza, ‘Tunin’” in
Jornal Comércio do Jahu, Jaú, 29/10/1978, p. 10.

TEIXEIRA, J. H. “Personagem: Tunin Capelozza” in Jornal Comércio do Jahu,
14/09/1987, p. 6.

TINHORÃO, José R. Música Popular - do Gramofone ao Rádio e TV. São Paulo,
Editora Ática, 1981.

TINHORÃO, José R. Pequena história da música popular - Da modinha à canção de
protesto. Petrópolis, Ed. Vozes, 1978.

TOSCANO, José Raphael. João Ribeiro de Barros - Apontamentos Históricos. 1a. ed.,
Jaú, Cartonagem Jauense Editora, 1986.
Reconstruindo a história das orquestras de Jaú

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Reconstruindo a história das orquestras de Jaú

  • 1. UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE ARQUITETURA, ARTES E COMUNICAÇÃO “JAÚ EM RITMO DE BAILE” RECONSTITUIÇÃO JORNALÍSTICA DA HISTÓRIA DAS ORQUESTRAS CONTINENTAL E CAPELOZZA DE JAÚ LUÍS HENRIQUE MARQUES ORIENTADOR: MURILO CÉSAR SOARES Projeto experimental apresentado ao Departamento de Comunicação Social da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação - Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - para obtenção do grau em Bacharel em Comunicação Social, habilitação em Jornalismo de acordo com a Resolução número 002/84 do Conselho Federal de Educação. Bauru, 1991.
  • 2. 2 Orientando: Luís Henrique Marques Orientador: Murilo César Soares, do Departamento de Ciências Humanas da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação - Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - campus de Bauru
  • 3. 3 Agradecimento A todos que colaboraram com este trabalho, em especial ao professor Murilo, pelo entusiasmo com que se dispôs a orientar-me e aos ex-integrantes das orquestras por tudo que aprendi com cada um deles.
  • 4. 4 A minha família, em especial, aos meus pais, Bruno e Carmem.
  • 5. 5 Índice 1. Introdução .............................................................................................................. 2. Jaú em um retrato dos anos 50 .............................................................................. 2.1 A “Terra das Tradições” ...................................................................................... 2.2 A Intensa vida cultural ........................................................................................ 3. Música: o que há de melhor entre as tradições do Jahu ........................................ 3.1 Jazz-band: um produto “made in USA” .............................................................. 3.2 Tudo começou... .................................................................................................. 3.3 A cada apresentação, aumenta a popularidade .................................................... 3.4 Lps: uma nova experiência .................................................................................. 3.5 Dificuldades comprometem o futuro ................................................................... 4. “Tunin e Dante” .................................................................................................... 5. “Sabu” ................................................................................................................... 6. “Roberto Pavan” .................................................................................................... 7. O Baile ................................................................................................................... 8. “Waldomiro de Oliveira” ...................................................................................... 9. “Danilo Fornalé” ................................................................................................... 10. “Constante Ometto” ............................................................................................ 11. Jaú: a música hoje ............................................................................................... 12. Relatório sobre a reportagem “Jaú em ritmo de baile” ....................................... 13. Bibliografia ..........................................................................................................
  • 6. 6 INTRODUÇÃO Cobrir uma lacuna na história de Jaú pode parecer muita pretensão. Mesmo assim, é precisamente esse o intuito dessa reportagem. As Orquestras Continental e Capelozza de Jaú (SP), cujo período de existência data, aproximadamente, de 1940 a 1970, alcançaram um surpreendente sucesso junto ao público do Estado de São Paulo e de, pelo menos, mais cinco Estados do Brasil. Porém, hoje em dia, pouca gente sabe disso, sobretudo entre os mais jovens. É fato que pouco se tem organizado e arquivado acerca das duas orquestras, autênticos patrimônios histórico-musicais de Jaú. Desse modo, este trabalho de reportagem visa cobrir essa lacuna, tornando-se o primeiro material organizado, a contar, em linguagem jornalística, a história das jazz- bands Continental e Capelozza. A reportagem que se segue tem ainda como objetivo servir de subsídio para estudos futuros, não só em relação a história das próprias orquestras, bem como em relação ao significado social do baile nesse período, de 1940 a 1970. E é claro, apesar de se tratar de um trabalho jornalístico, portanto, crítico, não deixa de ser uma homenagem aos antigos músicos e ex-integrantes da Capelozza e Continental. É fundamental que, pelo menos, se cite e agradeça a colaboração de todos os músicos e outras pessoas (o público da época) que, por razões técnicas, não mereceram um espaço maior nesta reportagem. Gostaria de poder citá-los todos. Entretanto, é inevitável que se deixe alguém de lado. Afinal, muita gente passou pelas orquestras de Jaú. Gente que é viva e mora na cidade, mas também muitos que já faleceram ou que, atualmente, não moram mais em Jaú. A todos, obrigado e também minhas desculpas se cometi alguma injustiça. Mexer com o passado, como ficará demonstrado, é mexer com as tradições e costumes antigos. Portanto, existe uma grande diferença entre mim e os meus entrevistados. Trata-se de nada menos que algumas décadas... Contudo, quando se entrevista alguém, como se acostuma afirmar na gíria, é preciso “entrar na dele”. Só é
  • 7. 7 possível entender alguém para depois questioná-lo, se se entender o porquê de sua forma de pensar. Por isso, procurei mergulhar no passado para poder compreender melhor essas pessoas. E o fruto desse trabalho, nesses moldes, não se resume a apenas uma boa reportagem. Nem aprende-se a ver o quão atrasadas, sob certos aspectos, eram as pessoas nos anos 50. Aprende-se, portanto, a ver também o que tinham de positivo. Parece óbvio, entretanto, ver o positivo nas coisas não é uma atitude comum nos nossos dias. E não seria isso, por um acaso, o que está faltando, hoje, à imprensa em geral? o AUTOR
  • 8. 8 JAÚ EM UM RETRATO DOS ANOS 50
  • 9. 9 15 de agosto de 1953. Já se passaram 100 anos desde que foi rezada a primeira missa na pequena capela dedicada à Nossa Senhora do Patrocínio, a partir de então, padroeira da cidade que estava nascendo. Jaú ou o Jahu, como preferem os mais antigos, está diferente. Cresceu... mas nem tanto. Capital do Calçado Feminino, Capital da Terra Roxa, Terra de João Ribeiro de Barros. Títulos não faltam. O jauense parece gostar dessas coisas. Talvez a sua marca registrada seja, precisamente, o culto ao passado e seus heróis. E aqui reside um desafio: descobrir em meio a tantos adjetivos e superlativos o que existe de mais substantivo na história de duas “personagens ilustres do Jahu”: as Orquestras Continental e Capelozza. Como que por etapas, caro leitor, observe melhor essa cidade. Após 100 anos de fundação, Jaú, apesar de inegáveis progressos que sua privilegiada situação econômica tem proporcionado a sua população até aqui, em certo sentido, não evoluiu muito. Por outro lado, com apenas quarenta mil habitantes (incluindo o Distrito de Potunduva), ela dispõe de benefícios de deixar muita cidade grande deste País de queixo caído: foi uma das primeiras cidades do Brasil a contar com iluminação elétrica, pavimentação de ruas e praças e sistema de ligação automática dos serviços telefônicos. A base econômica que lhe permitiu esse e outros privilégios em sua infra-estrutura foi o plantio de cana-de-açúcar e do café, além da indústria do calçado, especificamente, o calçado feminino. Por isso, recebeu os títulos de Capital do Calçado Feminino e Capital da Terra Roxa (solo propício, sobretudo, para a cultura do café). Agora, do que o povo jauense parece gostar mesmo é do título de Terra de João Ribeiro de Barros. Não há quem não estufe o peito e encha a boca ao narrar a façanha do aviador jauense, o primeiro a atravessar o Oceano Atlântico em um avião. Um ato heróico, sem dúvida, principalmente se o leitor der uma espiada no hidroavião “Jahu”, exposto no Museu da Aeronáutica, em São Paulo. Como alguém poderia voar em um negócio daqueles?
  • 10. 10 “Terra das Tradições” O sentimento ufanista é uma provável conseqüência da rígida e tradicional maneira de agir e pensar desse povo. Há outras, contudo. Observe agora, um pouco desse comportamento. Para começar, dê uma olhada como, nessas bandas, se encara o namoro. Só pra dar uma primeira idéia: pegar na mão, só depois de seis meses! Beijar então, de cara, nem pensar! Chegar tarde em casa, fora de cogitação! Se a moça não quiser ficar pra fora de casa (com exceção aos dias de baile), ela deve entrar, impreterivelmente, às dez da noite! (Hoje, em dia, em pleno final do século 20, não dá pra imaginar uma coisa dessas!...) Mas, um momento! Pode parecer que só em Jaú as coisas sejam assim, o que não é verdade. Trata-se de um comportamento comum a toda a sociedade brasileira, cuja base é a família patriarcal, envolvida por um forte sentimento religioso. Afinal, estamos nos anos 50! E quanto ao preconceito racial? Não, ele não existe. Pelo menos é o que querem demonstrar as pessoas. Sabe como é: “cabeça aberta” dá uma boa imagem... E isso o povo adora. É, mas, na realidade, a coisa é bem diferente... Quem não ouviu falar que, em Jaú, na Praça da República (o Jardim de Cima), brancos e pretos não circulam pelo mesmo lado? Na verdade, os pretos nem chegam a andar na praça propriamente dita. Restringem- se às suas calçadas laterais. Os negros, inclusive, possuem um clube só deles. O baile no “Luiz Gama” é contudo, apreciado por todos, brancos e negros. Mas o preconceito sobrevive. Talvez cada vez menos em atitudes externas, mas, com certeza, na cabeça das pessoas: “Preto quando não suja na entrada, suja na saída”. E isso não é tudo. Mais que a cor, o que realmente conta é se você é filho (ou pelo menos parente) do fulano ou do ciclano de tal. Sim, porque a partir daí é que você pode ter uma noção mais precisa de quanto você é mais ou menos valorizado na cidade. Se você tem o nome da família tal, você tem mais valor, seja porque essa família tem dinheiro, seja porque tem prestígio político. Ou como acontece, em geral, porque tem os dois.
  • 11. 11 As famílias ricas, defensoras da tradição, moral e bons costumes, permanecem de mãos dadas com o poder público e religioso (quando não se confundem com os mesmos) e ditam a ordem social vigente, bem como os modelos sociais a serem seguidos. Um dado complementar: a maioria esmagadora dos habitantes é cristã, de confissão católica romana. Os exemplos que tecem esse quadro seguiriam longe. Cito apenas mais um. Para cada classe social, existe um clube recreativo: o “Jaú Clube” para os ricos; o “Aero Clube” e o “Grêmio Paulista” para a classe média, e o “Clube Dansante Operário” (1) para os mais pobres. É evidente que essa divisão não é precisa. Contudo, o que importa é notar o quanto ela pode determinar o comportamento social. Por exemplo: um jovem de família rica até pode ir ao baile no “Operário”, mas isso não iria pegar muito bem... Talvez, nesse sentido - o de estar atrelada a tradicionalismos e preconceitos -, é que Jaú não tenha evoluído tanto nesses últimos 100 anos. Intensa vida cultural Dando uma folga às tradições, é possível notar evidentes qualidades no povo de Jaú. Essa pequena cidade do interior paulista, 341 quilômetros distante da capital São Paulo, é um aquecido centro de manifestações culturais. Independente quanto tais manifestações são ideologicamente válidas ou não, o que é importante constatar é que são muitas e variadas. Um dado, no mínimo interessante, se o compararmos ao porte de Jaú. É José Fernandes (2) quem descreve esses dados de forma minuciosa: “Há dois cinemas, sendo o Cine-Jaú, o principal, pois funciona em grande edifício de propriedade da Empresa Teatral Pedutti, com capacidade para cerca de duas mil pessoas. O outro é o Acadêmico, com amplo salão para espetáculos teatrais e conferências”. A cidade conta ainda com: Casa da Cultura, Clube de Amadores Fotográficos, Clube de Xadrez, a Corporação Musical “Carlos Gomes” (3), o Conservatório Jauense de Música, um núcleo da Associação Paulista de Escritores, além de 10 bibliotecas, 4 das quais localizadas em escolas.
  • 12. 12 Sobre a imprensa e rádio, Fernandes escreve: “Há na cidade dois jornais diários: o ‘Comércio do Jahu’ e o ‘Correio da Manhã de Jaú’. A difusora local, a PRG7 que irradia em onda 1010 kcs, foi instalada em 1934”. (4) No esporte, o futebol é a modalidade privilegiada. Além do Esporte Clube XV de Novembro (profissional), que conta com estádio próprio, o “Arthur Simões” (5), cuja capacidade é para 12 mil pessoas, Jaú possui vários clubes amadores. Os principais são A. A. Palmeiras, A. C. Guarani e o A. C. Gráficos. Tudo isso mais as orquestras Continental e Líder. (6) Notas (1) Observe que a grafia da época para dançante era feita com “s” e não com “ç”, como atualmente se utiliza. (2) FERNANDES, José. Vultos e fatos da História de Jaú. Edição conjunta extraordinária do Correio da Noroeste, Correio da Capital, Correio de Garça, comemorativa do centenário de Jaú, São Paulo, 1955. (3) A Corporação Musical “Carlos Gomes”, uma banda de coreto, no ano de 1991, portanto, por ocasião da elaboração deste trabalho, completou 100 anos de existência. (4) A rádio emissora PRG7 a que refere-se o texto é a Rádio Jauense AM, em funcionamento até hoje. (5) O estádio do E. C. XV de Novembro de Jaú, “Arthur Simões” foi substituído pelo atual, “Zezinho Magalhães”. (6) Líder Orquestra foi o nome que recebeu a orquestra fundada pelos irmãos Capelozza logo após o seu retorno a Jaú, a qual, depois, passou a se chamar Capelozza e sua Orquestra.
  • 13. 13 A MÚSICA: O QUE HÁ DE MELHOR ENTRE AS TRADIÇÕES DO JAHU
  • 14. 14 Vaidades a parte, é quando a noite de sábado se aproxima que a cidade parece se inebriar de um clima novo, diferente. É quando as pessoas demonstram seu lado poético, romântico. Sábado é dia de baile e, precisamente por isso, tudo parece mudar... Na pomposidade do “Jaú Clube” ou na simplicidade do “Operário”, o baile em Jaú parece conduzir magicamente as pessoas ao mundo dos sonhos. Alguém chamou essa fase de “anos dourados”. Para os jovens, moças e rapazes, é o que parece: esses anos 50, devido ao romantismo, são chamados os “anos dourados”. E o baile é o momento romântico por excelência. Agora, enquanto os jovens dançam “sobre as nuvens”, tem gente que dá um duro danado para fazer do baile esse momento especial. Cabe aos músicos da orquestra (a jazz-band) garantir, através da suavidade de suas notas, esse clima que envolve o público. Jazz-band: um produto “made in USA” Jazz-band, crooner, fox-trote, ok! A influência norte-americana era descarada. O que não é de se espantar. Afinal, não era a primeira vez que os Estados Unidos da América ditavam moda ao mundo. E o Brasil, como não poderia deixar de ser a um país subdesenvolvido, foi na onda. Depois do surgimento, em 1912, das primeiras orquestras americanas do tipo jazz-band, o Brasil aderiu a moda, em definitivo, a partir da década seguinte. É certo que o sentimento nacionalista que envolvia o brasileiro nas décadas de 50 e 60 procurou compensar essa influência estrangeira, por exemplo, no repertório das orquestras, com a introdução de um produto nacional. Assim, o samba e o samba-canção passaram a conviver pacificamente com o jazz, o fox, o tango, o bolero, o mambo, a valsa e outros ritmos importados. Desse modo, a jazz-band, uma “orquestra de origem dos negros norte-americanos, caracterizada pelo ritmo sincopado de sua música e pelo papel desempenhado pela improvisação”, como define Sérgio Ricardo S. Correa (1), no Brasil, sofreu algumas modificações.
  • 15. 15 A principal delas foi exatamente a incorporação do samba ao seu repertório, o que justificou a presença do pandeiro junto aos demais instrumentos básicos da jazz-band: metais (sax, pistão e trombone), piano, guitarra, contra-baixo e bateria. O próprio samba, por sua vez, sofreu influências de modo a adaptar-se a maneira de tocar da jazz-band. “Criado para as orquestras de dança de salão, o samba-canção, entregue ao semi- eruditismo dos orquestradores, foi progressivamente amolengando o ritmo até transformar-se, no decorrer da década de 1940, na pasta sonora que o confundiu por vezes com o bolero (samba “Risque”, de Ari Barroso, por exemplo)”. (2) A febre das jazz-bands, como define o crítico de música José Ramos Tinhorão, chegou ao Brasil e como uma epidemia infestou todo o interior paulista. De fato, de lá, surgiram várias orquestras e algumas de sucesso surpreendente, como a Laércio de Franca, Pedrinho e sua Orquestra Guararapes, Orquestra Nelson de Tupã, Orquestra de Jasson e outras. E Jaú não ficou atrás. Terra de tradições arraigadas e claramente influenciada por modismos estrangeiros, a cidade teve o seu nome projetado muito além de seus limites através de duas jazz-bands de sucesso: Continental e Capelozza. Tudo começou... Fundada pelos irmãos Amélio e Plácido Antonio Capelozza, em 1940 (o seu primeiro baile data de 7 de setembro de 1940, no “Jaú Clube”), a Continental ou como ficou inicialmente conhecida, a Orquestra Típica Continental, tornou-se um patrimônio musical da cidade. No começo, sua formação se constituía de três sax, dois pistões, trombone, violão, bateria e crooner. Quatro anos após a fundação da Continental, os irmãos Capelozza resolveram deixar a cidade para ir trabalhar em uma marcenaria com um tio, em Marília. A orquestra passou a ser dirigida por José Ayello e Antonio Waldomiro de Oliveira. O primeiro, pistonista, havia deixado o trabalho no circo para tocar na Continental. Cuidava da direção musical. “As bandas de circo eram quem revelavam os músicos para as orquestras da época e assim, todo circo que aportava em Jaú era
  • 16. 16 obrigatoriamente visitado pelos músicos. Se houvesse alguém bom, recebia o convite para aqui ficar”. (3) O segundo, crooner, passou a cuidar da parte administrativa da orquestra: fechava os contratos para bailes, providenciava alojamento para o pessoal, alugava condução para as viagens, etc. A partir de 1948, após votação dos 11 músicos, Waldomiro de Oliveira foi escolhido diretor da Continental, função que exercera até o fim da orquestra. Praticamente nesse mesmo período (fins de 1948 e início de 1949), os irmãos Plácido Antonio (Tunin) e Amélio Capelozza, depois do insucesso com a marcenaria em Marília, resolveram voltar a Jaú e fundaram a Líder Orquestra. Com eles, veio o crooner Sabu. Além de provenientes do circo, os músicos contratados pelas jazz-bands vinham de orquestras de outras cidades. A troca de músicos entre orquestras era um fato comum. Em geral, tratavam-se de amadores e semi-profissionais. No caso da Continental, a partir de 1955, quando viveu seu auge, os músicos eram inteiramente profissionais; viviam exclusivamente dos rendimentos da orquestra. Alguns, inclusive, chegaram a ser trazidos do Rio de Janeiro por Waldomiro de Oliveira. Entretanto, nesse mesmo período, a Capelozza (surgida no lugar da Líder Orquestra, que quebrara), pelo contrário, mantinha em sua formação, praticamente músicos amadores e semi-profissionais. Isso signficava que todos tinham outra profissão, mesmo que, em alguns casos, possuíssem o registro de músico profissional. Esse registro era expedido, até 1960, pela Polícia do Estado de São Paulo, o que depois passou a ser feito pela Ordem dos Músicos do Estado. Assim, entre os músicos da Capelozza, encontravam-se marceneiros, relojoeiro, comerciário, frentista de posto de gasolina, funcionário público e assim por diante. Nota-se que, em geral, tinham como trabalho principal um ofício, além de serem pais de família e terem origem humilde. Dificilmente, encontrava-se entre eles alguém com curso superior. Apesar disso, em geral, haviam estudado música (via aulas particulares ou em conservatório) durante anos e dentro de um esquema disciplinar rigoroso. Primeiro e invariavelmente, a teoria. Só depois de um bom tempo é que se pegava no instrumento.
  • 17. 17 Como foi constatado por Luiz Augusto Milanesi através de pesquisa realizada em Ibitinga, interior de São Paulo (4), também em Jaú o gosto pela música foi marcado por uma forte influência de antigas famílias de imigrantes italianos: Senise, Fornalé, Capelozza e outras. Influência que se dava quase sempre em nível familiar: o pai ou o tio já era músico e, do convívio, nascia o interesse em aprender música. O rigor e disciplina com que se aprendia a tocar era naturalmente transportado para o trabalho na orquestra, o que, apesar do amadorismo, lhe garantia um desempenho profissional: não se tocava de ouvido e sim, somente através de partituras, as quais eram compradas de arranjadores profissionais de São Paulo. Nesse aspecto, a Continental foi mais longe. Sob a direção de Waldomiro de Oliveira, chegou não só a comprar arranjos de maestros norte-americanos famosos da época (Tommy Dorsy, Benny Goodman) como passou a contar com arranjadores entre os seus próprios integrantes: os pistonistas Tite, Danilo e Luiz, o pianista Charles, o guitarrista Lima e o saxofonista Romeu. A cada apresentação, aumenta a popularidade Para o profissional de música, me dizem ex-integrantes das orquestras, dava para viver, enquanto que para o amador o cachê representava um acréscimo razoável ao próprio orçamento. As orquestras, em geral, funcionavam sob a forma de cooperativas. A Continental seguiu a regra geral: “Depois de pagas todas as despesas, o dinheiro arrecadado em um baile era fraternalmente dividido - na verdade, o único que ficava com a parte menor era o pandeirista - e uma pequena quantia ia para o caixinha”. (5) Na Líder Orquestra, o sistema de administração dos lucros e de direção era o mesmo. Porém, os irmãos Capelozza, a um dado momento, propuseram aos demais músicos comprar a parte de cada um no patrimônio da orquestra, de modo centralizar a
  • 18. 18 direção da mesma em suas mãos. A partir de então, a Líder Orquestra passou a se chamar Capelozza e sua Orquestra. Com a popularidade crescente, as orquestras de Jaú passaram a ganhar também em prestígio, não só junto ao público, como também junto ao meio musical. Havia finais de semana em que eram solicitados por 3 ou 4 clubes diferentes (isso para uma mesma noite de sábado). Num jornal regional de 1975, lê-se: “Não há cassino, estância hidro-mineral ou hotel famoso em que não se tenha apresentado a Continental de Jaú nos seus principais bailes”. (6) O critério de escolha de um baile variava entre o clube que pagava melhor ou a cidade que ficava mais próxima. Em períodos de carnaval, considerava-se sobretudo esse último critério, uma vez que as orquestras chegavam a se apresentar até 4 vezes num mesmo final de semana. A Continental chegou a fazer, em média, 110 bailes por ano. Nos meses de dezembro e janeiro, animava cerca de 25 bailes de formatura. Apresentou-se em um total de 300 cidades dos Estados de São Paulo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Paraná e Minas Gerais. Entre as principais apresentações, destacaram-se aquelas realizadas nas capitais e grandes cidades, especialmente os shows na TV e rádio, quando acompanhou estrelas da música nacional (os “cartazes” como eram conhecidos na época): Hebe Camargo, Francisco Alves, Nelson Gonçalves, Marlene, Inesita Barroso, Gregório Barrios e outros. Houve bailes que marcaram a memória da Continental, conforme narra o próprio Tunin Capelozza, em entrevista concedida ao jornalista J. H. Teixeira do “Comércio do Jahu” (edição de 14/09/1986). Ele recorda um baile animado pela Continental, em Araçatuba (SP), o qual contou com a presença da então Miss Brasil, Martha Rocha: “Foi um baile granfino mesmo. A toalete das senhoras ficava ao lado do palco. Então, quando passavam as moças que iam à toalete, nós, os músicos, ficávamos boquiabertos e comentávamos se a Martha Rocha seria mais bonita que aquelas que estavam passando ao nosso lado. Seu moço, quando a Martha Rocha apareceu, todas as outras ficaram feias!”
  • 19. 19 Foto do jornal “Correio da Manhã de Jaú”, edição de 03/09/1955. Ao lado da foto, lê-se: “Hoje nos salões de festas do Aeroclube de Jaú, grandioso baile para Coroação da Rainha da Escola Técnica Industrial de nossa cidade, onde estará presente para dar um maior brilhantismo a famoso Capelozza e sua Orquestra. Amanhã (domingo) - A Capelozza e sua Orquestra, abrilhantará uma grandiosa brincadeira dansante na visinha cidade de Bocaina nos salões de festas do ‘Nosso Clube’”. Anúncios como este eram muito comuns na década de 50, sobretudo nos meses de janeiro e dezembro (devido aos bailes de formatura) e épocas de carnaval.
  • 20. 20 Lps: uma nova experiência A fama da Continental ultrapassou os horizontes que a própria Jaú podia vislumbrar. Em 1956, surge a oportunidade para gravar o primeiro LP, um acontecimento inédito na história de uma orquestra do interior paulista. Tal acontecimento, como a gravação do segundo LP, é contado, em detalhes pelo jornalista Mário Schwarz do “Comércio do Jahu”, após entrevista com Waldomiro de Oliveira (edição de 25/10/1987): “Waldomiro de Oliveira revelou a Dionísio, o irmão, que gostaria de gravar um disco pela Continental. Os contatos foram feitos e um ano mais tarde a orquestra jauense foi mostrar que já merecia uma chance no mercado de discos, apresentando-se no programa ‘Papel Carbono’, da Rádio Nacional (7), não só uma música mas o programa todo. Isso para que o executivo da gravadora aprovasse o lançamento de um disco. Mas a reação do auditório foi tão boa que antes mesmo do final do programa, o responsável pela gravadora já tinha se decidido a gravar um LP com a Continental. Um não, dois (...) Dos cinco saxofones, quatro pistões, três trombones, contra-baixo, bateria, piano e guitarra, só não foram gravar no Rio um pistão e um trombone, substituídos por músicos da Orquestra de Severino Araújo (Moura e Macacheira) e o primeiro LP, “Convite para o Baile”, teve arranjos até de Vadico, o parceiro de Noel Rosa. O segundo, com a orquestra completa, de nome “Chegou a Orquestra de Jaú”, foi gravado em dois dias, embora o estúdio estivesse reservado por uma semana. A Continental estava afiadíssima. ‘Para gravar esses discos, passamos bons apuros. Ficamos em hotel de quinta categoria e nossa refeição era a mais barata: macarronada, com Malzibier para reforçar. Não foi fácil, mas valeu a pena’. No verão de 59, LP embaixo do braço, Waldomiro de Oliveira voltou para Jaú e foi até a “A Musical”, conceituadíssima loja de discos da cidade. Ele conta: ‘O Félix e o Licurgo eram vivos. Então pedi a eles que colocassem o disco para tocar. Os dois adoraram e perguntaram: que orquestra é essa? Eu disse que era a Continental e eles não acreditaram. Poucos dias depois, com a colaboração do Rotary
  • 21. 21 Club, lançamos o nosso primeiro LP no Aero Clube para um público de aproximadamente três mil pessoas. Até o Renato Mursi esteve aqui para o lançamento, que foi um sucesso’”. Capelozza e sua Orquestra, dirigida pelos irmãos Amélio, Tunin e Irineu, seguiu passos semelhantes aos da conterrânea Continental. Entretanto, não gravou LP. Segundo seus antigos integrantes, a idéia de fazê-lo foi discutida. Contudo, concluíram que não compensava financeiramente. Por isso, desistiram da idéia de gravar. Apesar disso, sua popularidade, sobretudo no Estado de São Paulo, por onde mais se apresentou, é indiscutível. Também acompanhou gente famosa como Gregório Barrios, Carlos Lombardi, Carlos Vilela e outros. Dificuldades comprometem o futuro Quando se houve a história das orquestras de Jaú, a impressão que se tem (pelo menos, a primeira impressão), é que se trata de uma epopéia, repleta de sucessos e só. Engano. De fato, os ex-integrantes da Continental e Capelozza, se hoje riem das passagens, mesmo as dolorosas, com certeza, nessas ocasiões, a vontade era de chorar, acabar com tudo, “chutar o pau da barraca”. Entre todas as passagens da vida das jazz-bands, os ex-músicos são unânimes em afirmar terem sido as viagens as mais difíceis. Fosse pelas estradas de terra, fosse pelos automóveis ou ônibus, cuja velocidade máxima não ultrapassava os 30 km/h, uma viagem à vizinha Bauru ou a Bariri, poderia se transformar em um transtorno. Em especial nos dias de chuva. O que pensar então, quando se era contratado para tocar em cidades mais distantes, como em outros estados, por exemplo? Mesmo que o cachê compensasse, teve gente que chegou a desistir de ser músico por causa de tanto sacrifício. “A gente - conta Tunin Capelozza na mesma entrevista concedida ao “Comércio do Jahu” (edição de 14/09/1986) - ia de ônibus, de carro ou de trem, em estradas ruins, com chuva ou frio. Certa vez, fomos tocar na cidade de
  • 22. 22 Rancharia no mês de junho. Fazia um frio danado, até geou naquela noite. O quanto sofremos. Foi nesse dia que o nosso violonista Manoel Sabatino desistiu, não quis mais saber da orquestra”. E continua: “Uma vez fomos em um baile e os carros encalharam na estrada. Chegamos no clube a 1h30 e tocamos todos sujos de barro até o fim do baile”. A Continental teve dois ônibus próprios. O primeiro, chamou-se “Martha Rocha”, em homenagem à ex-Miss Brasil. Depois, adquiriram outro, em melhores condições, o “Adalgiza Colombo”, cujo nome também foi inspirado em uma Miss Brasil. A facilidade de possuir condução própria não afastou, entretanto, as dificuldades. Não foram poucas as vezes em que todos tiveram que descer do ônibus para empurrá-lo por quilômetros, com lama e tudo. A Capelozza, por sua vez, se utilizava de carros ou ônibus alugados e de trem (para as viagens mais longas). “Quando viajávamos de trem, você sabe, eles param pouco tempo na estação. Então, não dava tempo para descarregar todos os instrumentos da orquestra. Isso aconteceu mais de uma vez: era preciso alugar um carro, correr até a próxima cidade onde parava o trem para retirar o restante dos instrumentos”, conta Tunin. (8) Com o passar do tempo, precisamente com o advento do rock na década de 60, as viagens tornaram-se uma preocupação menor para as orquestras. No seu lugar, surgiu a concorrência dos pequenos conjuntos, os regionais (a base de violão, acordeom, pandeiro e crooner) e, principalmente, os grupos de rock que introduziram o uso dos instrumentos eletrônicos (guitarra, contra-baixo e depois órgão) e passaram a substituir as jazz-bands na animação dos bailes. A concorrência se dava em dois níveis. O primeiro era justamente o financeiro: ficava mais barato para o dono do clube contratar um conjunto com, no máximo, 5 elementos, do que uma orquestra que tinha, em média, 15 integrantes. O segundo era a questão da preferência musical da época que passou a mudar sob influência de novos modismos estrangeiros. O rock’n roll passou a perna no tango, samba-canção, bolero, rumba, fox (cuja expressão máxima era a orquestra norte-americana de Glenn Miller, modelo imprescindível para as nossas orquestras) e a juventude, principal público consumidor do mercado fonográfico, aderiu em massa ao seu ritmo alucinante.
  • 23. 23 Essa situação sentenciou, por assim dizer, o fim das jazz-bands. Elas até que resistiram bastante. A Continental, por exemplo, só encerrou suas atividades em 1968: “um sonho que acabou exatamente em 12 de maio de 1968 (...) na pequena Angatuba, onde a Continental tocou pela última vez. Restou também uma dívida que o Waldomiro de Oliveira precisou de três anos para pagar”. (9) A Capelozza acabou mais ou menos no mesmo período. “A morte prematura do irmão Amélio teve grande influência no fim da Orquestra Capelozza, mas Tunin não desistiu. Formou um conjunto que se apresentava em festas e restaurantes”. (10) De fato, existiram também razões de ordem pessoal, inerentes a influência dos modismos estrangeiros, que provocaram o fim das orquestras de Jaú. Entretanto, os membros preferem não discutir o assunto. A resposta geral é “Cada um tem o seu tempo. O nosso já passou”. Inclusive, sobre o relacionamento entre os músicos e entre as duas orquestras rivais de Jaú, preferem, em geral, resumir questão em frases do tipo: “O relacionamento era excelente”; “Até hoje, somos muito amigos”; “Sempre, sempre amigos”. Se existiram pequenas ou grandes diferenças, depois de tanto tempo, preferem esquecer. Saudável ou não, ironia do destino, as pessoas dessa cidade parecem tomar atitude semelhante: as orquestras, patrimônio histórico-musical de Jaú, por falta de se preservar a memória desse mesmo povo, parecem condenadas ao esquecimento.
  • 24. 24 Notas (1) CORREA, Ricardo S. Ouvinte Consciente. São Paulo, Ed. do Brasil S.A. _________, p. 60. (2) TINHORÃO, José R. Pequena história da música popular - Da modinha à canção de protesto. Petrópolis, Ed. Vozes, 1978, p. 125. (3) SCHWARZ, Mário. “Personagem: Waldomiro de Oliveira” in jornal Comércio do Jahu, Jaú, 25/10/1987, p. 5. (4) MILANESI, Luiz A. O Paraíso via Embratel. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1978. (5) SCHWARZ, Mário. “Personagem: Waldomiro de Oliveira” in jornal Comércio do Jahu, Jaú, 25/10/1987, p. 5. (6) “O som das grandes bandas do interior paulista” in jornal Internews, suplemento de cadeia de jornais da CBI, agosto/75, p. 15. (7) “Papel Carbono”, programa da Rádio Nacional criado em 1937 e dirigido por Renato Mursi, onde os candidatos deviam se apresentar imitando a voz de algum cantor já famoso. (8) TEIXEIRA, J.H. “Personagem: Tunin Capelozza” in jornal Comércio do Jahu, Jaú, 14/09/1986, p. 5. (9) SCHWARZ, Mário. “Personagem: Waldomiro de Oliveira” in jornal Comércio do Jahu, Jaú, 25/10/1987, p. 5. (10) TEIXEIRA, J. H. “Personagem: Tunin Capelozza” in jornal Comércio do Jahu, Jaú, 14/09/1986, p. 5.
  • 26. 26 “E essa é a história da orquestra”, concluiu Tunin. E eu quase despenquei do sofá. “Não é possível que alguém consiga resumir trinta ou quarenta anos de história em dez minutos e concluir que é tudo”, pensei. Foi mais ou menos assim que começou a minha primeira entrevista e, com certeza, uma das mais importantes para esta reportagem. Confesso que vi meu trabalho ir “por água abaixo”. Como poderia fazê-lo a partir de dez minguados minutos de entrevista? Talvez por estar mais que acostumado a contar a história das orquestras Continental e Capelozza, o Tunin deve ter aprendido a resumi-la e por isso nem se deu conta da rapidez com que quase liquidou a entrevista. E quase liquidou o meu trabalho. Por outro lado, o “seo” Tunin, como é conhecido Plácido Antonio Capelozza, um dos fundadores da Continental e da Líder Orquestra (que depois transformou-se em Orquestra Capelozza), aos 83 anos, não economiza palavras para elogiar os anos 50, fase de ouro das jazz-bands que, como se dizia naquela época, abrilhantavam os bailes do interior paulista de todo o Brasil. Mas voltemos à entrevista. São mais ou menos três da tarde quando aparece por ali um novo personagem, convidado pelo Tunin para o nosso bate-papo. Baixinho e falante, Reodante Pepe, ou simplesmente Dante, é o oposto do amigo Tunin que é alto e de pouca conversa, ou pelo menos, sem muitos rodeios. Quanto ao Dante, era de se esperar, afinal foi o primeiro crooner da Continental e como todo bom cantor, ele deve ser antes de tudo comunicativo. Estão todos de acordo em gravar e a entrevista recomeça. Apesar do contraste físico e de comportamento, os velhos amigos possuem uma também velha paixão em comum: a música. E foi justamente essa paixão que levou o então inexperiente Dante a encarar o seu primeiro baile no dia 7 de setembro de 1940, dia da inauguração da Continental. Ele lembra com humor: “Eu tinha lá os meus vintes anos. Cantava, mas cantava em seresta. Nunca havia me apresentado com uma orquestra. No dia da inauguração, eu tremia que nem vara-verde! (risos) Eu tomei um litro de conhaque ou uísque, eu não sei... Mas olha, a cada intervalo, eu ia lá e pá, pá, pá!! E voltava. Acabou o baile e eu estava meio assim...” (risos)
  • 27. 27 Já a carreira do músico Tunin Capelozza começou bem antes. Filho de músico italiano, na verdade, a sua história confunde-se com a própria história das orquestras Continental e Capelozza e, antes mesmo do seu surgimento, quando, aos 16 anos, já tocava no Jaú Jazz, o primeiro jazz-band da cidade. Isso mais ou menos no final dos anos 20, começo dos anos 30. Mais ou menos, porque nomes e datas fogem à sua memória. Tunin estudara com músicos da cidade: “... um senhor que se chamava Vitorino Frigolo, o José Fornalé, o Danilo Fornalé... porque isso aqui antigamente não tinha professor de música, não havia escola. A gente tomava lição na casa do músico”. Quando mudou-se para Marília, juntamente com o irmão Amélio, por motivo de serviço, disse que era para aposentar o sax, o clarinete e o bandoneom. “Mas quem nasceu pra música, não consegue largar a música...” Entretanto, é o próprio Tunin quem adverte: “Vou falar a verdade pra você: música nunca deu nada pra ninguém. Música é só perda de tempo!” Como acontecia com uma boa parte dos músicos de Jaú, Tunin, Dante e outros possuíam uma profissão. O Dante, por exemplo, era garçom, o Tunin e o irmão Amélio, marceneiros, o Irineu, o terceiro dos irmãos Capelozza, relojoeiro e assim por diante. “Cada um tinha o seu emprego. Nós nos reuníamos para ganhar um dinheirinho extra no sábado e no domingo. E no carnaval a gente aproveitava para ganhar uns cobrinhos a mais”. Uma vida de sacrifícios, mas levada por um grande prazer pela música. Porém, para o Dante, tanto sacrifício passou a não compensar mais. “Eu fiquei apenas um ano na Continental. Depois desisti. Tinha um emprego e precisava faltar para acompanhar a orquestra. Era uma complicação”. Depois disso, Dante foi para São Paulo, tendo voltado para Jaú anos mais tarde. O Tunin continuou. Como ele próprio afirmou, “mais por prazer”. E esse prazer, esse amor pela música, impressiona na sua pessoa. Logo que entrou pela sala de estar, confesso que não acreditei que aquele senhor de mãos grossas (mãos de marceneiro), fala alta e gestos bem italianizados, pudesse ter sido músico. Referindo-se à sua mulher, contudo, é que se percebe um certo lirismo (claro, dentro do seu estilo de pessoa) que parece envolvê-lo. Perguntei-lhe se não houve problemas com a mulher, tendo que conciliar a vida de casado, de marceneiro (trabalhou 45 anos até se aposentar na fábrica
  • 28. 28 de móveis Jahu Progride) e de músico. E ele respondeu: “é uma mulher que é um espetáculo, se conformou com tudo e não houve problemas...” Diferente, mas não deixa de ser uma sincera declaração de amor. A admiração do público, pelo menos das pessoas mais velhas, é incontestável. Algo que vem de longe. Uma prova concreta do reconhecimento público dos valores do músico Tunin Capelozza está na homenagem que recebeu de seu amigo, o maestro Rubens Leonelli, então regente da Banda Sinfônica da Polícia Militar de São Paulo, por ocasião da festa do aniversário de Jaú, em 1970. Velho conhecido de Tunin, Leonelli resolveu fazer-lhe uma surpresa. A Banda Sinfônica da Polícia Militar iria se apresentar em Jaú, na Igreja Matriz Nossa Senhora do Patrocínio com seus 120 músicos. No repertório, entre os clássicos da música erudita, estava lá a valsa “Vera Lúcia” composta por Tunin e dedicada à filha mais nova. Quando a banda começou a executar a valsa em arranjo sinfônico e o público presente reconheceu a obra do jauense Tunin, todos explodiram em palmas. Depois de execução da valsa, Tunin dirigiu-se ao maestro e aos músicos para cumprimentá-los. Consigo levou a pequena Vera Lúcia. “As palmas continuaram sem parar, por uns 10 minutos! Foi a maior emoção da minha vida!”, conta, quase em lágrimas. Assim como para a filha mais nova, Tunin compôs as valsas “Nida” (dedicada à esposa Leonilda), “Virgínia” e “Vilma” (para as outras duas filhas) e o choro “Walter”, dedicado ao seu único filho homem. Apesar do seu comportamento simples, Tunin não se preocupa em esconder o pouco de vaidade de seus mais de 40 anos de músico. “Com o público, barbaridade! Eu era estimado, barbaridade!! Todo sábado tínhamos 3 ou 4 lugares para escolher. A nossa orquestra era disputada!” O amigo Dante, aos seus 72 anos (e com uma filha de 14!) também não esconde a vaidade: “O senhor cantaria hoje, em público, se tivesse oportunidade?”, pergunto. “Eu até cantaria, mas sabe... a gente não tem mais aquela aparência de quando era jovem... Penso que a mocidade de hoje não daria valor...” Não é pra menos que os irmãos Capelozza têm motivos para essa vaidade incontida. Além do talento em si e justamente por isso, foram eles os fundadores de
  • 29. 29 praticamente todas as jazz-bands de Jaú. “Tínhamos facilidade para formar um novo grupo. Éramos nós quem imperava...” A esse propósito, Tunin se defende: “Se nós tivéssemos formado Capelozza e sua Orquestra no começo, não tinham acontecido nada desses rolos, né? Mas nós fomos fazer no fim... ninguém ia querer tirar o nome da gente...” “Mas o que eram esses rolos?”, pergunto. “Havia os invejosos que queriam ficar dono, você tá me entendendo? Então, nós pegávamos e deixávamos pra eles: fiquem donos vocês!! E formávamos outro grupo”. Depois de tanto tempo, Tunin e Dante, como outros, não demonstram preocupação ou interesse (nem querem comentar) a respeito das diferenças dentro de uma orquestra ou sobre a rivalidade entre Capelozza e Continental. “Tanto tocando juntos, como fora dos bailes, nós éramos sempre amigos”, garantiu Dante. “Até hoje, graças a Deus!”, completou Tunin. Dante lembrou, inclusive, que não havia punições pré- estabelecidas para quem errava, fugia ao compromisso. “Falava-se assim: oh, bichão! Você tá dando tripa! E só”. Tratava-se de uma gíria da época que é o mesmo que “pisar na bola” hoje. “Mas quanto à rivalidade entre a Continental e a Capelozza?”, insisto. É o Tunin quem responde: “Existia uma rivalidade, barbaridade! Mas nunca nós deixamos de ser amigos!!” Foi num clima espontâneo, diria, quase familiar, que se conduziu o nosso bate- papo, a propósito, bem humorado. Tão humorado e espontâneo que, várias vezes, precisei desligar o gravador, a pedido, para que meus entrevistados não se sentissem constrangidos com aquele fato, aquela situação ou comentário. “Mas você está gravando?! Corta isso, pelo amor de Deus!!” (risos) As duas horas e meia de entrevista passaram rápido. De tudo o que foi dito, bastou a simplicidade e alegria daqueles senhores para entender que é preciso enxergar mais que velhos hábitos e velhas tradições para entender o passado...
  • 31. 31 Se você perguntar em Jaú pelo Marcílio Galdino Pires, provavelmente pouca gente vai dizer que conhece. Agora, se, ao contrário, você perguntar pelo “seo” Sabu, então sim, muita gente vai saber de quem se trata. Especialmente os mais velhos que não se esquecem dos muitos dançados ao som da voz do crooner Sabu a frente de Capelozza e sua Orquestra. O apelido Sabu (que depois virou nome artístico, registrado na Ordem dos Músicos de São Paulo) foi inspirado em um antigo herói de cinema do início da década de 60. Hoje, cantando apenas entre amigos e após um bom tempo afastado dos palcos, Sabu é mais conhecido na cidade como o proprietário do Hotel Paulista, localizado próximo à estação rodoviária. Apesar das diferentes atividades que desenvolvera no decorrer da sua vida, a de cantor é, sem dúvida, a que lhe traz as melhores lembranças. Foi graças à música que a 4 de dezembro de 1987 recebera o título de Cidadão Jauense, cujo diploma exibe, orgulhosamente, na recepção do seu hotel. E é exatamente sobre música que se desenrola o nosso bate-papo. A propósito, quando o procurei e lhe disse sobre o que e porque deseja entrevistá-lo, de cara, mostrou- se entusiasmado em colaborar. E me garantiu: “Você não vai tirar dez nesse trabalho! Vai tirar mil!” A sua história como cantor começa quando moleque (por volta de 1945, 1946). Certa vez, ganhara um concurso para cantores em um parque de diversões na sua cidade natal, Agudos (SP). Na ocasião, cantar, para Sabu, era apenas uma diversão, um passatempo. É nesse momento que acontece uma reviravolta em sua vida. Chega de Marília um músico de jazz-band. Ele conhece Sabu e, sem hesitar, o convida para assumir a vaga (que estava livre) de crooner na sua orquestra. Embora estivesse receoso, em virtude de sua inexperiência, encorajado pelo músico, Sabu aceitou e partiu para Marília. Já fazia algum tempo que acompanhava a pequena orquestra de Marília, quando Sabu resolveu partir para algo maior. Foi para São Paulo e prestou um concurso na Rádio
  • 32. 32 Bandeirantes. “Passei. Então resolvi que iria para São Paulo, faria um cachê na Bandeirantes e cantaria nas noites, nas bocas, como se diz”. Estava decidido a fazê-lo. Nesse meio tempo em que permanecera em Marília, conhecera os irmãos Amélio e Tunin Capelozza (que haviam se mudado para lá para trabalhar com um tio na marcenaria). “Então, a gente travou uma boa amizade, porque eles também são gente fina”. E foi devido a essa amizade que novamente aconteceriam mudanças nos planos do crooner Sabu. Decididos a retomar o trabalho com a música, os irmãos Capelozza propuseram a Sabu que não deixasse a orquestra em Marília até que eles pudessem voltar para Jaú (o que aconteceria em breve) e fundassem a sua própria orquestra, na qual ele assumiria a função de crooner. “Eu não queria viver integralmente como profissional. Então, desisti de ir para São Paulo e aceitei a proposta dos Capelozza”. E, de fato, foi o que aconteceu: em fins de 1948, Sabu e os Capelozza fundam a Líder Orquestra, que depois passou a se chamar Capelozza e sua Orquestra. “Eu comecei com eles. Sou fundador. Os Capelozza como chefes e eu como integrante da orquestra”. Em Jaú, preferindo não viver só de música, Sabu passou a trabalhar como inspetor de alunos da Escola Profissional Joaquim Ferreira do Amaral, a Industrial. “Em 1954, 55, mais ou menos, eu sai da escola. Ai comecei um novo trabalho, como vendedor. Trabalhava de segunda a sexta. Depois ficava disponível para a orquestra”. Nos finais de semana havia muito trabalho. Mesmo depois de casado (casou-se em setembro de 1958), continuou cantando. “Ah! Depois de casado, a mulher não gostava. Sabe como é, é natural. Mas fiquei tempo cantando. No fim, a mulher aceitou porque a gente já tinha mais despesas, não era um, éramos dois. Então, o dinheiro da orquestra engrossava o orçamento. Juntava as coisas: uma porque gostava, outra porque rendia um pouco”. E tinha bons motivos para gostar. Como cantor, assumia uma posição privilegiada na orquestra. Era particularmente visado pelo público. “Eu era super bem tratado”. “Mas as pessoas não tinha aquela tendência de vê-lo e aos outros músicos como estrelas?”, arrisco. “Não, não. O relacionamento era muito bom. Todo mundo se aproximava da
  • 33. 33 gente. Queriam conversar. Parece... a impressão que se tem é que, antigamente, se tinha mais tempo para conversar. Parece que tinha mais calor humano”. No que sua baixa estatura não chama a atenção, a voz possante de Sabu convence. Ainda mais porque, como cantor, aprendeu a ser comunicativo. “Apresentava o repertório, fazia a abertura do baile, cumprimentando o público. Se tinha alguma coisa pra anunciar, evidentemente era o cantor que fazia”. A dedicação à música o levou, mais que aprender a se relacionar com o público: “Aprendi sax. Mas não tocava. Entretanto, estudava. Quem chegou a me ensinar música foi o Sr. Amélio Capelozza, um senhor músico”. Sabu mantém a vitalidade de quando jovem, como quem prefere não falar em idade. Ainda sim, recordar o passado da Capelozza traz para Sabu uma satisfação especial. Tanto que já pensa em reservar um local especialmente para reunir os velhos amigos, bater aquele papo e é claro, curtir uma boa música.
  • 35. 35 O jovem saxofonista e clarinetista (talvez um dos músicos mais jovens que tenha passado pela Orquestra Capelozza) está bem diferente. Além dos óculos, engordou e ganhou cabelos brancos. Com pouco mais de 60 anos, Roberto Pavan é porém, uma pessoa muito ativa. Talvez a sua profissão (hoje é comerciante, mas desde garoto trabalhou no comércio como balconista) lhe exija isso. Tanto que não quis perder tempo. Após procurá-lo, no dia seguinte, o entrevistei ali mesmo, no fundo da sua loja, debruçado sobre o balcão. Logo em seguida, após nos despedirmos, ele retomou sem demora os seus afazeres profissionais. Roberto parece ser uma pessoa prática e cuidadosa. Antes de iniciarmos a entrevista, quis saber tudo o que pretendia perguntar-lhe. E a cada pergunta, procurava responder com objetividade, o que contudo, não disfarçava o saudosismo com que lembrava passagens da história de Capelozza e sua Orquestra. “Nós saímos, por exemplo, pra tocar em Marília, Presidente Prudente, Rio Claro, Barra Bonita, Dois Córregos, Bauru, Lins. Então, quando chegava a Orquestra Capelozza, não precisava falar mais nada! A receptividade era maravilhosa! E nós percebíamos isso, mas nós éramos humildes”. Para Roberto Pavan, maravilhoso era também o relacionamento entre os músicos. Mesmo se no início, quando entrou para a Capelozza, sentia-se despreparado para tocar com outros músicos mais experientes, Roberto disse sempre ter recebido apoio dos colegas. Entretanto, ele, desde jovem, demonstrava uma certa objetividade na maneira de pensar. Antes de tocar na Capelozza e após os seus primeiros estudos, Pavan fora convidado para integrar a Líder Orquestra. “... na Líder Orquestra já existiam músicos tradicionais e eu, como amador, senti muita dificuldade e tive que parar. Então, me aprofundei bastante no estudo do clarinete e saxofone e tive a satisfação imensa em ser convidado para tocar na Orquestra Capelozza, na qual trabalhei, mais ou menos, uns 12 ou 13 anos”. O amor à música e a sua dedicação ao estudo chegou a levar o então inexperiente Roberto à posição de primeiro saxofone da orquestra, o que era uma posição privilegiada entre os músicos. Para tanto, teve que “suar a camisa”. “Eu trabalhava no balcão. Às vezes, voltava do baile com o instrumento na mão e ia trabalhar. Eu trabalhava das oito às
  • 36. 36 seis da tarde - tinha uma hora de almoço - e estudava à noite. Estudava também nos sábados e domingos durante o dia. Toda noite eu pegava o instrumento e estudava, no mínimo, duas horas”. Além disso, como toda a orquestra, Roberto teve que enfrentar o lado difícil do trabalho como músico, como por exemplo, as viagens em dias de chuva. “Houve uma ocasião... eu era responsável pela montagem da orquestra, pelas estantes, as partituras, era eu quem punha as pastas. Cada um tinha uma função. Essa era a minha. E houve uma ocasião em que nós fomos para Bariri e deu uma chuva tremenda. Nós saímos daqui, mais ou menos, cinco horas da tarde para começar o baile às dez da noite, 22 horas. E como é que faz com o barro da estrada? Então, tinha que acorrentar o carro... E quando furava o pneu, era um ‘deus-me-acuda’! Enfim, nós chegamos em Bariri. Montado tudo - eu estava procurando o repertório - quando perguntei: ‘Cadê a pasta do repertório?’ Esqueceram em Jaú. E aí? Naquele tempo, não tinha outro jeito: eu tive que voltar para Jaú com o chofer. E o baile ia começar às dez horas. Eram nove e meia quando eu dei falta do repertório. E pra voltar para com aquela chuva? O que a orquestra fez? Ela tocou, porque nós tínhamos músicos como o Amélio Capelozza, Tunin Capelozza, Hélio Cioti, Luis Mingueti, nós tínhamos o Caraciti... Então, eles começaram a tocar, tocar... e eu voltei para Jaú. Cheguei em Bariri meia noite. Eu estava inteirinho embarreado”. Sobre a rivalidade entre Continental e Capelozza, Roberto, ao contrário dos outros músicos, foi bem mais claro em sua opinião: “... naquele tempo, a Continental se achava superior a nós, só que não era! E sabe por quê? Porque a Continental tinha um estilo diferente de tocar. Eles tocavam muito forte, alto. Mas o dançarino gostava realmente era de dançar com a Capelozza, porque era uma orquestra mais suave”. Apesar da rivalidade, ele garantiu que sempre foram amigos. A propósito, antes de aperfeiçoar os seus estudos em música no Conservatório Jauense, tomou as primeiras lições com o maestro Danilo Fornalé (“expoente máximo como professor que conheci!”) e participou de um pequeno conjunto (do qual não se lembra o nome) dirigido por Romeu Fornalé, os irmãos, ambos ex-integrantes da Orquestra Continental.
  • 37. 37 Para Pavan, como a maioria dos músicos da Capelozza, o trabalho da orquestra era um “bico” que ajudava no orçamento, sobretudo depois que se casou pela primeira vez, em 1952. “O casamento não complicou minha vida, porque eu amo e sempre amei a música e minha primeira esposa, falecida, era uma moça compreensiva”. Hoje, bem estabelecido comercialmente, Roberto não sente mais falta da orquestra como “bico”. Entretanto, lamenta o fato dela como de todas as orquestras do interior de São Paulo terem terminado. Para ele, além da concorrência dos conjuntos de rock, um dos motivos do seu fim, é o fato de que “hoje, o moço não pensa em estudar música. E os músicos mais velhos foram se desgastando, foram morrendo e não houve renovação das orquestras”. E justamente por isso, ou seja, o fato das jazz-bands da década de 50 (em particular a Continental e a Capelozza) estarem condenadas ao esquecimento, é que Roberto Pavan disse estar contente com iniciativas do tipo desta reportagem. “Acho isso fantástico! Porque tudo passa, não? E se você não fizer isso, quem vai saber quem foi o Roberto Pavan? Não que eu faça questão, aliás, eu não acho que se deva marcar o fulano de tal, mas principalmente as duas orquestras. Inclusive, eu já pensei no dia de Santa Cecília, 28 de novembro (1), fazer uma exposição na minha vitrine, mostrar para o público jauense ou quiçá, da região, através de uma exposição de fotos, o que foram realmente a Orquestra Continental, a Orquestra Capelozza, os seus músicos... Esse é o sentido da coisa...” Nota (1) O entrevistado se enganou sobre a data da festa de Santa Cecília. A data correta é 22 de novembro.
  • 39. 39 “Época muito romântica, o som da orquestra inspirou o nascimento de muitos casamentos. Ainda hoje casais se lembram da música que a Continental estava executando quando trocaram o primeiro olhar”. (1) Porém, o baile em pequenas cidades do interior, como Jaú, era mais que uma oportunidade para encontro de moços apaixonados. Dançar ao som da jazz-band nos finais de semana era uma das poucas opções de lazer para a maioria da população jauense nos anos 50. Além disso, restavam o futebol, o bilhar, o bocha, o cinema, a paquera (o chamado “footeen”) na praça ao som da “furiosa”. (2) Nesse período, enquanto o rádio conhecia o seu auge como veículo de comunicação de massa, a TV no Brasil estava apenas engatinhando. Não era um veículo popular. Ao contrário, possuir um aparelho de TV era um privilégio. Sendo assim, o lazer, nas pequenas sociedades como a de Jaú estava quase que invariavelmente ligado às relações humanas mais diretas. E o baile era, possivelmente, entre essas formas de lazer, a predileta do público. Além do mais, do ponto de vista das gravadoras, o baile era fundamental na manutenção do comércio de discos, uma vez que os sucessos do rádio eram também tocados pelas jazz-bands. Como no rádio do Brasil da década de 50, o que “estava por cima” era a música romântica (Nelson Gonçalves, Francisco Alves, entre outros, eram os cantores favoritos do público), o que se ouvia nos bailes era justamente a valsa, o tango, o bolero, o samba- canção, ritmos românticos por excelência. Para contrabalançar, tocava-se o jazz, o fox- trote, a rumba, o mambo, o swing, ritmos mais agitados. De qualquer forma, quem dançava era o casal, o que independente do ritmo mais ou menos acelerado, era uma chance para uma aproximação mais efetiva entre o rapaz e a moça. Efetiva sim, mas nem tanto... Afinal, havia como que uma “consciência coletiva” que determinava limites bem claros até onde o rapaz podia chegar. Coladinhos mesmo só os namorados mais avançados ou que tinham coragem para tanto, porque, normalmente, havia a direção do clube que não permitia atitudes desse tipo. Sobre situações como essa, Tunin Capelozza recorda uma passagem da Continental que, hoje, soaria no mínimo engraçada: “Vou contar um baile que nós fizemos no Jaú Clube. Foram convidados estudantes de Campinas para tomar parte desse
  • 40. 40 baile. Você sabe, Campinas era uma cidade diferente da nossa, uma cidade grande. Um ambiente diferente. Os moços se beijavam... e não tinha nada disso por aqui. No clube, o Totó Pacheco era o presidente. Ele ficava na porta assim... (levantou-se e fez a pose). Aconteceu que um dos estudantes beijou uma moça que estava dançando. Ele esperou a contra-dança, mandou chamar o rapaz na diretoria e falou: ‘O Sr. pode se retirar do salão`. Bom, eram todos estudantes: tirou um, saíram todos. E acabou o baile. Tocamos três músicas e ganhamos o baile inteirinho”. Atitudes rigorosas à parte, o baile era muito esperado por todos. Sobretudo nas datas especiais, como o aniversário da cidade, os bailes caipiras em junho, os de formatura em dezembro e janeiro, e os bailes das debutantes. Existia uma expectativa muito grande em torno desses eventos. Observava-se com cuidado cada detalhe na preparação para o baile. O crooner Sabu contou: “O baile aqui em Jaú, por exemplo - isso eu me lembro perfeitamente - anunciava-se: ‘O Aero Clube vai promover o baile caipira no dia 2 de julho`. Esse baile era anunciado em maio. Então, as moças se preparavam para esse baile. Alguma comprava um sapato novo, fazia vestido novo, comprava chapeuzinho, quer dizer, ia-se devidamente caracterizado. Todo mundo! O baile das debutantes era muito interessante. Dois meses antes, os pais já ficavam se preparando, comprando, fazendo vestido para as filhas. Mas era ‘o baile’! Era um ritual, alguma coisa fora do comum, feita com muito capricho!” De fato, existia esse capricho. É o que me confirmou o casal Leon e Eunice: “As moças iam de vestido longo, cores claras, suaves e cinturinha fina. O rapaz sempre de terno e gravata. Usava-se muito terno branco”. O interesse pelo baile era geral, envolvia toda a cidade. Tanto que “quase todos os nossos bailes eram irradiados pela Rádio Jauense (a PRG7). Isso era natural na época”, completou Sabu. Quanto ao clima, ao ambiente no salão, todos, músicos e o público da época são unânimes: havia muito respeito. É verdade que todos concordam que existia um “controle” sobre o comportamento. Mas preferem dizer que a atitude de respeito era uma opção para a maioria das pessoas. “O clima era simplesmente maravilhoso! Porque, geralmente, o casal ia para dançar. O clima era tão gostoso que a gente que estava
  • 41. 41 tocando lá no alto, no palco, percebia que o povo tinha satisfação enorme em dançar. Era um ambiente sadio, gostoso, dançavam realmente. Havia pessoas que dançavam e começavam às dez e só paravam às quatro da manhã. (...) Às vezes, tinha pessoas, mocinhos de Jaú que iam conosco nos bailes só pra dançar, em São Manoel, Dois Córregos, Barra Bonita...”, contou o saxofonista Roberto Pavan. Apesar do “controle de qualidade”, uma vez ou outra acontecia alguma confusão. O meu próprio pai, Bruno Marques, contou-me que, certa vez, em um baile no “Clube Dansante Operário”, um primo nosso “recebeu tábua” de uma moça ao convidá-la para dançar. Quando uma moça, por qualquer motivo que fosse, “desse tábua”, isto é, recusasse um convite para dançar, ela jamais poderia, durante o resto do baile, aceitar o convite de outro rapaz. Se o fizesse, estaria desrespeitando o primeiro que lhe fizera o convite. Foi o que aconteceu com o nosso primo. Ele foi desrespeitado. Inconformado e já um tanto alterado por ter exagerado na dose do conhaque, não teve dúvida: partiu pra cima da senhorita e meteu-lhe um belo tapa no rosto. Formou-se logo uma confusão. Porém, para ele nada aconteceu. Funcionário da Receita Federal, o primo era quem concedia os alvarás para a realização dos bailes. Logo, expulsá-lo do salão não seria uma medida conveniente a ser tomada pela direção do clube... Entretanto, as situações mais pitorescas nos bailes da cidade eram aquelas que envolviam os casais apaixonados. Em virtude do clima de respeito e severidade com que se conduzia o relacionamento entre um rapaz e uma moça durante os anos 50, o namoro era antes de tudo uma aventura. A dificuldade de se chegar a uma maior intimidade com a namorada, obrigava o rapaz a passar por situações, em geral, constrangedoras. Entretanto, para os casais que eram jovens naquele período, as barreiras de então davam um sabor especial àquela aventura. O que para nós, início dos anos 90 (3), talvez já não teria a menor graça. O casal Hipólito Leon e Eunice Pavanelli de Menezes recordou uma situação da qual foram protagonistas e que dá uma boa idéia a esse respeito. Ambos eram jovens. Ele, extrovertido, filho de família humilde. Ela, introvertida, filha de família abastada e tradicional da cidade. “Quando a gente almoçava na casa dela, na mesa, ninguém abria a boca. Só falava o pai”. Provavelmente por isso, para Leon, Eunice era uma pessoa difícil.
  • 42. 42 Acontece que ele adorava dançar (diga-se de passagem, ainda hoje tem fama de bom dançarino). Assim, algumas vezes, após deixar a namorada em casa, Leon ia com uma turma de amigos para o clube. Preferia que a namorada não soubesse. “Mas se ficasse sabendo, eu não iria esconder”. E foi o que aconteceu. Certa vez, uma amiga de Eunice viu Leon em um baile, evidentemente, dançando com outra garota. “O baile foi em outra cidade, em Pederneiras ou Dois Córregos”... Ao saber do fato, Eunice foi taxativa: “Então, não podemos continuar namorando”. Assim, ambos de coração partido, resolveram terminar solenemente o namoro. Escolheram dia, horário e local para fazê-lo. “Foi em frente a delegacia. A gente ficou um tempão no ‘chove-não-molha’. Já fazia um ano que estávamos namorando e eu ainda não tinha sequer dado um beijo nela...A gente ficava só nos dois beijinhos no rosto e pronto. Quando, finalmente, resolvemos nos despedir, eu não aguentei: agarrei-lhe e lhe dei aquele beijo! Foi uma cena cinematográfica!” (enquanto ríamos, eu e o “seo” Leon, a dona Eunice ficou vermelha como um pimentão). Depois daquilo, choramingando, Eunice disse a Leon: “É, agora a gente vai ter que continuar namorando...” (risos) Notas (1) “O som das grandes bandas do interior paulista” in jornal Internews, suplemento de cadeia de jornais da CBI, agosto/1975. (2) “Furiosa”é o termo popular usado para nomear as bandas de coreto. (3) Vale lembrar que este trabalho de reportagem foi concluído no final de 1991, portanto, início da década de 90.
  • 44. 44 Antonio Waldomiro de Oliveira, 66 anos, casado, 4 filhos. São tantas e variadas as atividades que exercera na sua vida até aqui (entre elas a de componente da Orquestra Continental) que parece difícil saber por onde começar. Em virtude de sua falta de tempo, foi difícil conseguir um momento para um bate-papo. É que o “seo” Waldomiro é e sempre foi uma pessoa muito ocupada. Desde o meu primeiro contato - quando lhe apresentei a idéia dessa reportagem - ele estava com todo o seu tempo tomado com a gravação de um disco. Uma iniciativa pessoal, algo, como definiu o crooner Sabu (que teve participação neste LP) “para ficar para a posteridade”. Entretanto, desde o início, Waldomiro demonstrou-se prestativo, interessado em colaborar. Ele, inclusive, emprestou-me um material precioso que contribuiu e muito para a conclusão dessa reportagem. A sua contribuição foi fundamental, porque Waldomiro esteve a frente da Continental durante a maior parte de sua existência. Desde cedo, encontrou a sua vocação para a música. Quando criança, aprendeu piano e clarinete. Mas foi como cantor que se realizou. Começou no coral da Igreja, em Lins, sua cidade natal. Levando jeito para o ensino, um ex-professor o convidou a vir morar em Jaú, onde passou a lecionar Mecânica na Escola Industrial. Isso foi em 1943. Efetivou-se e, em 1969, se aposentou como professor. Em Jaú, como cantor, começou dando “canjas” no Nosso Jazz (1) e depois na Orquestra Típica Continental. Mais tarde, a convite dos Capelozza, passou a dividir a função de cantor com João Rafa. Este último, tendo concluído o curso universitário, deixou a orquestra. E Waldomiro assumiu integralmente a função de cantor da Continental. Em 1947, os irmãos Amélio e Tunin Capelozza partiram para Marília por motivo de serviço, deixando a orquestra nas mãos de Waldomiro e do pistonista José Ayello. Em 1948, Waldomiro assumiu inteiramente a direção da mesma. A partir daí, conforme reconhece o próprio Tunin Capelozza, a Continental conheceu seu auge. Como cantor da orquestra, além de acompanhar os sucessos da época, Waldomiro tinha que se virar com os tangos e as canções em inglês e francês. Na retaguarda,
  • 45. 45 apoiando o então namorado, estava a Odete, hoje, sua esposa. Era ela quem datilografava as letras das músicas. Mas a carreira do cantor Waldomiro de Oliveira poderia ter ido muito além do sucesso com a Continental, como conta o jornalista Mário Schwarz (2): “Aproveitando o conhecimento que tinha do Rio de Janeiro, onde em 1943, pelas mãos do irmão mais velho, havia vencido o programa de calouros da lendária Rádio Nacional (‘ Hora do Pato’), Waldomiro voltou à Guanabara, não como José Antonio (pseudônimo que havia utilizado no programa de calouro), mas com o seu próprio nome para se apresentar no programa ‘Papel Carbono’, do famosíssimo Renato Mursi: ‘Cantei Jezebel, gravada pelo Jorge Goulart, e também ganhei o primeiro lugar. O Mursi quis me contratar imediatamente para fazer parte do ‘cast’ da Nacional, prometendo que se eu ficasse, ele me conseguiria uma gravação dentro de três meses, assim como tinha conseguido para outro vencedor de ‘Papel Carbono’ há pouco tempo, o Agnaldo Rayol. Mas argumentei que não podia deixar minha família, a escola e a orquestra de Jaú’. Ao menos por pouco dias, Waldomiro de Oliveira fez parte do elenco da Rádio Nacional. Esteve até em Juiz de Fora, Minas, com os cantores daquela emissora e recebeu, inclusive, propostas para gravar compositores anônimos. Cantou também no Glória, onde conta foi ‘trisado’, ou seja, em vez de apresentar uma música como estava previsto, foi obrigado a cantar mais duas outras, fora do roteiro, atendendo a platéia. ‘O Renato Mursi não se conformava. Vivia dizendo: ‘Puxa vida, Waldomiro, você foi trisado. Fica aqui’. E não fiquei, voltei para Jaú. Mas aquele contato foi importante’.” A pessoa do Waldomiro chama atenção. É do tipo que se impõe, atirado. O ar de professor é inconfundível. Mesmo os mais jovens que não o conheceram ou o conhecem como músico (atualmente, é regente de um coral litúrgico formado apenas por vozes masculinas, o “Nossa Gente”), com certeza, já ouviram falar dele como instrutor de canto do Tiro de Guerra de Jaú. Ganhou uma comenda do Exército por isso. Waldomiro foi também: presidente da Comissão Pró-Instalação da Paróquia de Nossa Senhora Aparecida (da qual depois foi seu diretor administrativo), fundador e governador do Serra Clube de Jaú (3), fundador e regente do Coral Santa Cecília que durou vinte anos e chegou a gravar um LP. E a lista continua. Durante 25 anos deu
  • 46. 46 assistência aos presos da cadeia pública de Jaú, é membro do Lions e pertence à Irmandade dos Vicentinos. Há 9 anos dirige um programa na Rádio Piratininga de Jaú, todas as quintas-feiras, a partir das 22 horas. “É assim que Jaú canta” chegou a ser irradiado em todo País pelo extinto Projeto Minerva. Waldomiro foi ainda vendedor em uma revendedora de carros de Jaú. Seu curriculum vitae é ainda mais extenso. Mas até aqui dá pra se ter uma boa idéia da vitalidade e disposição do maestro Waldomiro. Em se tratando de música, as realizações de Waldomiro não param em si mesmo. Seu filho homem, Antonio Waldemir, ou simplesmente Mir, formado em Composição pela Universidade de Campinas (UNICAMP) tornou-se um conhecido músico de Jaú e região. Como se diz, “filho de peixe, peixinho é”. Entre os antigos músicos das orquestras de Jaú, Waldomiro ficou conhecido como arrojado pela gravação dois Lps da Continental, uma iniciativa sua que, mesmo devido aos prejuízos financeiros com os quais ele próprio teve que arcar, projetou ainda mais o nome da orquestra e da cidade. Ele não esconde o orgulho com que realizou tudo isso, em especial como atuou como cantor, diretor e regente da Orquestra Continental. Recentemente, em um encontro de corais amadores realizado em Jaú, ao apresentar Waldomiro e seu grupo “Nossa Gente”, a coordenadora do evento assim o definiu, referindo-se ao seu trabalho com a música ao longo dos anos: “um lutador!”. Elogios à parte, algo que não dá para contestar. Notas (1) O Nosso Jazz foi um dos primeiros jazz-bands de Jaú, fundado pelos irmãos Amélio e Tunin Capelozza. Com o fim do Nosso Jazz, os irmãos Capelozza fundaram a Orquestra Continental. (2) SCHWARZ, Mário. “Personagem: Waldomiro de Oliveira” in Jornal Comércio do Jahu, Jaú, 25/10/1987, p. 5. (3) Entidade católica que trabalha pelas vocações sacerdotais e religiosas.
  • 48. 48 Falar da história da música de Jaú, sem falar em Danilo Fornalé é como cometer sacrilégio. Exagero? Não, a julgar pelo que dizem as pessoas, músicos e públicos de Jaú, em geral. E não é pra menos. Sem ter qualquer formação acadêmica no assunto, o ex- pistonista da Orquestra Continental, Danilo Fornalé, já ensinou (e ensina) música para muita gente de Jaú. Os próprios irmãos Capelozza aprenderam com Danilo. E ele continua na ativa. Mesmo tendo deixado de lado o pistão há um bom tempo, Danilo continua a viver de música. Atualmente, é professor na Escola Municipal de Música Heitor Azzi, é o regente da “Carlos Gomes” (a banda de coreto que já tem 100 anos de existência) e escreve composições e partituras para outros músicos. Baixo e franzino, Danilo, a considerar os estereótipos do artista em voga, à primeira vista, não convence se tratar de um músico. Também não está preocupado com isso. Fala da história da Continental com uma naturalidade que parece até ser coisa sem muita importância. Não é o tipo saudosista, não fala com eloqüência nem parece estar preocupado em convencer seu interlocutor de verdades. Para ele, ser músico, ao contrário do que pensa muita gente, é ter uma profissão como outra qualquer. É curiosa essa atitude despretensiosa, sobretudo a julgar pelo seu currículo. Filho e sobrinho de músicos (seu pai e um dos tios tocaram na Banda Carlos Gomes,. no seu início, juntamente com o seu fundador, o maestro Heitor Azzi), Danilo Fornalé, segundo ele próprio, aprendeu música sozinho. Teve um irmão, Romeu Fornalé (já falecido), saxofonista, que também fizera parte da Orquestra Continental. Assim, através de um dom natural e da convivência familiar, aprendeu a tocar e não largou mais o que, com o tempo, passou a ser a sua profissão. Desde pequeno, acompanhava o pai e o tio que tocavam na banda do maestro Azzi. E ainda moleque passou a fazer parte da “furiosa”. A propósito, a entrevista se deu na sede da “Carlos Gomes”, que é também a sua residência. “Mas o Sr. não teve outra profissão?”, perguntei. “O meu pai queria que eu exercesse a profissão de alfaiate. Comecei como aprendiz. Mas larguei. Isso não me interessava”. Tanta dedicação a essa atividade é que faz com que se entenda o que me disse Tunin Capelozza, referindo-se ao amigo: “É impressionante! Ele é capaz de ouvir uma
  • 49. 49 música, qualquer que seja, pela primeira vez e depois, escrever a sua partitura... assim, no ato!” De fato, além de músico da orquestra, foi também um dos seus arranjadores. Mas Danilo realmente não parece preocupado com elogios nem tampouco parecer ser muito emotivo. Entretanto, quando lhe mostrei algumas fotos das orquestras de Jaú que conseguira, ele não escondeu a emoção. Olhando bem para uma das fotos, me disse: “Puxa! Que saudades!” Danilo é casado. Não teve filhos. Já teve muitos alunos. Como os Capelozza, boa parte dos músicos das jazz-bands, nascidos em Jaú, tomaram lições com ele. Das amizades, em especial como músico da Orquestra Continental, Danilo recorda uma passagem curiosa. Tudo começou com uma brincadeira. E terminou em uma tragédia. Como é comum entre companheiros de trabalho, entre os músicos da Continental sempre tinha um que “pegavam pra Cristo”. Ele se lembra do “seo” Giacomo, contra- baixista. “Ele era mais velho. Uma pessoa muito simples, até simplória. Certa vez, por brincadeira, o pessoal inventou que ele tinha morrido. Reconheço que foi humor negro... Enfim... Então, o nosso fotógrafo tirou fotos do ‘enterro do Giacomo’. E mandaram para Jaú. Ele próprio achou graça. Foi mais uma brincadeira... Acontece que pouco tempo depois, num baile... estávamos tocando quando, de repente, ouvimos um barulho surdo atrás. Olhamos e era o ‘seo’ Giacomo. Ele estava estirado no chão. Parou-se o baile, procuramos atendê-lo. Mas foi tarde.... Ele morreu de parada cardíaca”. Muita coisa lhe foge à memória: nomes, datas, fatos. Foram mais de 20 anos como componente da Continental. E isso há mais de trinta anos atrás. A impressão que se tem é que ele não parece perturbado com o fato de que as pessoas possam esquecê-lo. “Cada um tem a sua fase”, conclui.
  • 51. 51 Custou, mas encontrei. Ele estava em casa, no fundo do quintal, cuidando dos frangos. Aos 77 anos, aposentado há um bom tempo, aquele trabalho todo com as galinhas era para “se sentir útil”. Mas a verdade é que o “seo” Constante gosta daquele serviço. Afinal, nasceu na roça e lá se aprende a gostar dessas coisas. E justamente o fato de ter vivido e trabalhado no campo durante a sua infância e juventude é que faz da história do músico (saxofonista e clarinetista) Constante Ometto, uma história única. A simplicidade ao narrar episódios de sua vida pessoal, bem como enquanto músico das orquestras Continental e Capelozza, lembra um romance clássico. Talvez o fato de possuir uma forte fé religiosa (é membro da Igreja Adventista de Jaú) faz com que Constante veja a vida, mesmo as dificuldades do passado, como “um dom de Deus”. Por isso, seu discurso é sempre entremeado de trechos bíblicos e alusões à fé. Desde cedo, Constante demonstrara uma forte inclinação para a música: “Vivia cantando, na roça, vivia cantando”. Apesar de sua mãe ser contra (inconformada com o gosto musical do filho, certa vez, quebrara sua viola), Constante adorava fazer seresta. Entretanto, a vida no sítio era dura. “Essa coisa de ter que dormir cedo para acordar de madrugada e ir para a roça dificultava a gente fazer seresta”. E como se não bastasse, “trabalhava-se muito e ganhava-se pouco”. Diante dessa situação, adorar música e estar descontente com que ganhava no campo, Constante, ainda contrariando a opinião de sua mãe, partiu para um investimento arrojado. Foi aprender música para ganhar mais dinheiro. Seus “professores”: os irmãos Capelozza. Depois de estudar a teoria, optou pelo sax. Aprendeu também a tocar o clarinete, mas era do sax que gostava. Para ele, a música, pelo menos no início, foi um empreendimento que deu certo. De fato, os seus rendimentos aumentaram muito desde que começou a tocar no cabaré da cidade (1). “A minha vida melhorou bastante naquele tempo”. E precisava realmente que melhorasse, uma vez que, nessa época, já estava casado. Constante casou cedo, porque antes de tudo desejava sentir-se livre das antigas pressões familiares, em especial da mãe que via o trabalho de músico com descrédito. Dona Aparecida, sua primeira e única namorada e esposa há quase 50 anos, ao contrário,
  • 52. 52 apoiava e muito o trabalho no cabaré. “Mas não havia problema em casa por tocar num lugar daqueles?”, insisto. “Não, não. Porque a gente ia lá para trabalhar, não para perder tempo com outras coisas”. A esse propósito, não teve dúvidas. Participou de nossa conversa a dona Aparecida, esposa de Constante, que com sua simplicidade e espontaneidade, endossava cada palavra do marido. E mais que isso: o já não tão jovem casal demonstrou a todo momento de nossa entrevista uma harmonia comovente. Com vários problemas de saúde, entre eles o da audição, algumas vezes e de forma inocente, dona Aparecida desviava a conversa do assunto com seus comentários. Nesses momentos, Constante, com uma paciência incomum, dizia-me: “Ela não escuta direito, não entende sobre o que estamos conversando. Por isso, interrompe...” E procurava, com a mesma paciência, ouvi-la e ajudá-la a participar do assunto. Num dado momento, talvez entusiasmada com a minha visita, ela perguntou-me se não gostaria de ouvir uma canção que eles costumam cantar na sua igreja. “Quando eu era moça, eu também cantava bastante”, me diz. Constante resolveu acompanhá-la: “Se não, ela não consegue. Ela anda um pouco sem voz”. Quando os Capelozza fundaram a Continental, convidaram o amigo Constante para fazer parte da orquestra. Depois que se mudaram para Marília, Ometto permaneceu na Continental. Ao voltarem para Jaú, os Capelozza fundaram a Líder Orquestra. Novamente, em nome da antiga amizade, o saxofonista Constante saiu da Continental para acompanhar os Capelozza. Ali permaneceu até o fim de Capelozza e sua Orquestra. Com o passar do tempo e com a chegada dos filhos (tiveram um casal, 6 netos e até aqui 7 bisnetos), viver apenas de música deixou de ser um bom negócio. Ou pelo menos, deixou de garantir por si só o sustento da família. Assim, Constante passou a trabalhar na prefeitura, por onde acabou se aposentando. Sobre as orquestras de Jaú, Constante não esconde a saudade que sente daquele tempo. Ele ressaltou sobretudo o respeito e prazer com que as pessoas se divertiam nos bailes e como as orquestras da cidade eram muito aplaudidas por onde se apresentavam. Sentados na cozinha de sua casa, eu, Constante e Aparecida, parecíamos velhos conhecidos, embora tivéssemos nos conhecido há pouco mais de uma hora atrás. Ambos
  • 53. 53 os meus entrevistados demonstravam-se entusiasmados com a conversa e a sua jovialidade me deixava de tal forma à vontade que não me dei conta da notável diferença de gerações. A um certo momento, Ometto perguntou-me como o havia encontrado. Então, contei-lhe como fizera. E ele me disse: “Estou contente que tenha se lembrado de mim”. Posso entender o porquê disso. Se o vissem andar pelas ruas de Jaú a pé ou no seu modesto fusca verde petróleo, pouquíssimas pessoas hoje, lhe dariam o devido valor que merece. Nota (1) Na verdade, não se tratava de um cabaré propriamente dito, pelo menos não do tipo que sabemos ter existido nas grandes cidades. Algo recatado que não feria muito a imagem da cidade tradicional do interior de São Paulo.
  • 55. 55 Comparar a atividade musical de Jaú nos anos 50, focalizando, em especial, a atuação das jazz-bands, com os dias atuais, é uma tarefa difícil. Na verdade, nem dá para comparar. Tudo mudou e muito. Não existem tantos bailes como antigamente. Afinal, nas décadas de 40 a 60, o baile era uma das poucas opções populares de lazer. Hoje, ao contrário, o baile é um acontecimento se não raro, ao menos, bem menos freqüente. O que contudo, não deixa de ter um valor atrativo considerável. Para os músicos profissionais que atuam em Jaú e na região, é impossível pensar seu trabalho em termos de orquestra. Aquela formação (cujo número médio ficava entre 15 e 20 elementos) seria insustentável para um grupo musical, hoje. Pelo menos, num campo de trabalho como o interior. Contudo, para esses mesmos músicos, em geral, hoje em dia, a situação é melhor. Mesmo sem tantos bailes, outras opções de trabalho, surgidas nos últimos anos, vieram a se tornar novos espaços para o exercício da profissão de músico em cidades como Jaú. Além dos bailes, há os casamentos (cerimônia e festa), jantares dançantes, restaurantes e bares. Nesse ambientes, a presença da música ao vivo passou a ser exigência natural do público. Assim, o bar que tem música ao vivo, em geral, tem uma freguesia maior. Logo, o cachê do músico também é maior, uma vez que ele recebe uma quantia (o couver artístico), previamente estabelecida com o proprietário da casa, por cada mesa ocupada. Para saber melhor a respeito da situação do músico de Jaú e região, procurei Arquimedes Cantarine Ferreira, músico profissional e delegado regional da Ordem dos Músicos do Brasil. “Não tenho o que reclamar. O grupo que está bem estruturado, tem serviço para a semana toda”, garante Arquimedes. Para ele, inclusive, o trabalho em bares nos finais de semana passou a ser uma segunda opção em relação aos casamentos e jantares. Ele afirma com segurança de quem nos últimos 27 anos só viveu de música. Casado, com 3 filhos, aos 42 anos, Arquimedes tem um trio. Autodidata em sax, flauta transversal, guitarra e contra-baixo e formado em violão clássico pelo Conservatório Jauense de Música, também leciona no mesmo conservatório e em Bauru.
  • 56. 56 Ele afirma que o nível dos músicos de Jaú, na atualidade, é bom, o que contribui para tradição da cidade na área. O próprio Arquimedes teve um dos seus primeiros contatos profissionais com a música tocando surdo e caixa no seu primeiro carnaval, quando acompanhou a Orquestra Capelozza, esta na sua fase final. Uma característica fundamental para a sobrevivência da atividade profissional em música, hoje, é precisamente o trabalho em pequenos grupos, duplas e/ou trios ou ainda sozinho. Aliado a isso, o uso de órgãos, sintetizadores, baterias eletrônicas, veio a facilitar o trabalho que, no caso do trio do Arquimedes depende em 70% de tecnologia. Isso tudo, além de um repertório eclético, que atenda a todos os gostos e preferências, o que significa, normalmente, acompanhar a música comercial das gravadoras e rádios. Há ainda outro espaço, que ajuda a manter a tradição musical da cidade que são as aulas particulares, em escolas e conservatórios.. Por fim, surgiu um novo espaço musical, tanto para os profissionais como para o público: o Projeto “Som na Praça”, uma iniciativa da Prefeitura Municipal de Jaú que, aos sábados e domingos à noite, reúne músicos da região que se apresentam na Praça Tancredo Neves (próxima à estação rodoviária). Sobre o mercado fonográfico, todos os músicos da cidade são enfáticos: não dá nem pra pensar. Como aconteceu com a Continental, gravar um LP hoje (o que já se pode fazer no interior) é um empreendimento nada lucrativo. Serve quanto muito para quem pode investir dinheiro próprio, inclusive na divulgação e comercialização ou por gosto pessoal. O mercado de discos é um campo restrito a poucos. Além do mais, apenas a música comercial (com predominância para o que se toca fora do País) tem chance nesse mercado. “Eu não poderia gravar apenas o que eu gosto, um disco instrumental, por exemplo”, explica Arquimedes. Quando aos clubes, existem ainda o Aero Clube e o Grêmio Paulista. Além desses, há o Caiçara Clube, o mais novo e luxuoso da cidade. Os principais bailes, contudo, são animados por grupos de fora, quase sempre, da capital. O que se ouve nesses bailes é o de sempre, ou seja, a música comercial. Tangos, valsas, boleros e outros antigos ritmos populares deixaram de ser populares. Agora, pertencem ao passado. A propósito, o comentário dos jovens, em geral, é que é “uma chatice” ouvir Glen Miller, Ray Coniff e por ai afora.
  • 57. 57 Assim, mesmo com a presença do conjunto, o baile hoje parece mais com a boate dos finais de semana (onde se liga o CD e pronto) do que com o baile mesmo. Bem, pelo menos, é o que garantem os saudosistas.
  • 58. 58 RELATÓRIO SOBRE A REPORTAGEM “JAÚ EM RITMO DE BAILE” A idéia do tema, uma reportagem impressa sobre a história das orquestras Continental e Capelozza de Jaú, surgiu ainda no segundo semestre de 1990. Jaú é uma cidade rica em tradições. Entretanto, conforme informações obtidas empiricamente, pouco se tem organizado a respeito da história das orquestras Continental e Capelozza, patrimônios da tradição musical de Jaú. A relevância do tema se dá pelo sucesso que tais orquestras de salão alcançaram durante quase três décadas (1940 a 1970), cuja atuação permanece viva na memória das pessoas que viveram aquele período. A partir desse fato, surgiu a idéia de se fazer essa reportagem que não só procurasse cobrir essa lacuna na história da cidade, bem como servisse de subsídio a pesquisas e estudos futuros. Assim, ainda em 1990, consultei alguns professores acerca da viabilidade da proposta para o Projeto Experimental, a ser executado e apresentado no segundo semestre de 1991. A confirmação veio no início do semestre seguinte, logo nas primeiras aulas da disciplina Planejamento em Comunicação, quando o aluno discute em sala de aula sua proposta para o Projeto Experimental e elabora um pré-projeto. Durante praticamente todo o primeiro semestre de 1990, dediquei-me, sob a orientação do professor Dr. Antonio Carlos de Jesus, responsável pela disciplina Planejamento em Comunicação, à elaboração desse pré-projeto, que nada mais é que um roteiro inicial que direciona todo o trabalho do aluno na execução do próprio Projeto Experimental. Antes contudo, de elaborar o pré-projeto, realizei um trabalho de pesquisa, o “Conhecimento da Realidade”. Trata-se de um levantamento acerca do meio no qual se desenvolve o assunto de pesquisa do projeto. No meu caso, ou seja, a “realidade” na qual estavam inseridas as duas orquestras é a cidade de Jaú (SP), mais precisamente durante as décadas de 40 a 70, período de existência das referidas jazz-bands.
  • 59. 59 Desse modo, durante a última quinzena de março/91, pesquisei junto a fontes informais (Biblioteca Municipal e do Museu Municipal) e fontes informais (os arquivos pessoais de ex-integrantes das orquestras e público em geral) material (texto, fotos e ilustrações) sobre esse período da história de Jaú e informações preliminares sobre o objeto em estudo, ou seja, as duas orquestras. Ainda no final de março, redigi o “Conhecimento da Realidade”. Em seguida, durante a primeira quinzena de abril/91, realizei uma pesquisa bibliográfica sobre o assunto “música”, buscando focalizar sobretudo o período em estudo. Além disso, li e fichei livros que se relacionavam direta e indiretamente ao assunto. (Procurei consultar diversos professores a respeito de sugestões de leitura). Concluído esse trabalho, durante a primeira quinzena de maio/91, empenhei-me na redação do pré-projeto e de uma proposta para a estrutura do próprio Projeto Experimental. Munido do “Conhecimento da Realidade”, Pré-Projeto e Proposta de Estrutura do Projeto, através de um ofício, solicitei a orientação do professor Murilo César Soares do Departamento de Ciências Humanas da FAAC (Unesp-Bauru). Definida a orientação, iniciamos a partir do segundo semestre de 1991, algumas reuniões para discutir o andamento do projeto. No entanto, ainda no primeiro semestre de 1991, sobretudo durante o mês de julho (férias escolares) e início de agosto, realizei novo trabalho de pesquisa. Junto à Rádio Piratininga de Jaú, consegui uma cópia da gravação do primeiro LP da Orquestra Continental, “Convite para o Baile”. Junto ao Museu Municipal e alguns ex-integrantes das orquestras, obtive fotos (que pude reproduzir) e matérias de jornais sobre o assunto. Entre os dias 01 e 10 de agosto, realizei entrevistas com os antigos músicos e pessoas (a maioria casais) que viveram a época em estudo e acompanharam o sucesso da Capelozza e Continental. Foram, ao todo, 10 entrevistas, das quais 6 mereceram, cada uma, um capítulo especial no trabalho final. Além das entrevistas, realizei vários contatos informais com ex-músicos e público em geral que, embora rápidos e não tendo sido gravados, contribuíram significativamente com as informações que deles obtive.
  • 60. 60 De posse das entrevistas transcritas, além do material anteriormente pesquisado (“Conhecimento da Realidade”, bibliografia), iniciei ainda em agosto, o trabalho de redação do projeto. Esse trabalho, realizado em microcomputador, estendeu-se até o início de novembro. Durante esse período, o professor orientador acompanhou o trabalho de redação com sugestões e correções. Redigido o projeto, bastou estruturá-lo a partir de um índice. Na última semana de novembro, o trabalho foi entregue aos professores da banca examinadora, anteriormente convidados.
  • 61. 61 BIBLIOGRAFIA CORREA, Ricardo S. Ouvinte Consciente. São Paulo. Ed. do Brasil SA ______. FERNANDES, José. Vultos e fatos da História de Jaú. Edição conjunta extraordinária do Correio da Noroeste, Correio da Capital, Correio de Garça, comemorativa do centenário de Jaú, São Paulo, 1955. MILANESI, Luiz A . O Paraíso via Embratel. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1978. “O som das grandes bandas do interior paulista” in Jornal Internews, suplemento de cadeia de jornais da CBI, agosto/1975. SCHWARZ, Mário. “Personagem: Waldomiro de Oliveira” in Jornal Comércio do Jahu, Jaú, 25/10/1987, p. 5. SEVERINO, Antonio J. Metodologia do Trabalho Científico. 16a. ed., São Paulo, Cortez Editora & Editora Autores Associados, 1990. SODRÉ, Muniz. Técnica de Reportagem: Notas sobre a Narrativa Jornalística. São Paulo, Summus Editorial, 1986. SUCUPIRA, Zélia. “Personalidade em destaque: Plácido Antonio Capelozza, ‘Tunin’” in Jornal Comércio do Jahu, Jaú, 29/10/1978, p. 10. TEIXEIRA, J. H. “Personagem: Tunin Capelozza” in Jornal Comércio do Jahu, 14/09/1987, p. 6. TINHORÃO, José R. Música Popular - do Gramofone ao Rádio e TV. São Paulo, Editora Ática, 1981. TINHORÃO, José R. Pequena história da música popular - Da modinha à canção de protesto. Petrópolis, Ed. Vozes, 1978. TOSCANO, José Raphael. João Ribeiro de Barros - Apontamentos Históricos. 1a. ed., Jaú, Cartonagem Jauense Editora, 1986.