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A FRONTEIRA ENTRE O DESESPERO E O DESEJO: Ideações suicidárias na
estrutura Borderline
A border between despair and desire: Suicidal ideations in the Borderline structure
Ana Cláudia da Costa Paiva
Mestranda em Psiquiatria Social e Cultural
Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra
claudiapaiva.94@gmail.com
Coimbra, 2016
Resumo
Na sociedade contemporânea, torna-se cada vez mais visível a erupção de sentimentos muitas vezes
marcada pelos acontecimentos de vida de cada indivíduo. Deste feito, este artigo debruça-se sobre
as diferentes perspetivas do Transtorno de Personalidade Borderline. Cingi-me inicialmente por
explicitar o conceito Borderline de acordo com as perspetivas ao longo dos anos de profissionais
que estudaram esta patologia. Num segundo ponto, será efetuada uma relação entre o transtorno de
personalidade mencionado anteriormente, com as ideações suicidárias. De seguida, está patente um
tópico relacionado com a (re) integração social dos mesmos dando relevância à atuação do
profissional da área social. Por fim, será apresentada uma breve conclusão sobre o tema exposto. O
presente artigo assenta numa revisão da literatura, sobre o tema em análise, que procura discutir as
consequências pessoais e sociais da estrutura Borderline, tendo em vista um melhor entendimento
deste fenómeno, simplificando a sua compreensão.
Palavras-chave: borderline; ideações suicidárias; integração.
Abstract
In contemporary society, the eruption of feelings often marked by the life of every individual
events it becomes more and more visible. This article focuses on the different perspectives of
Borderline Personality Disorder. According to the perspectives of professionals who have studied
this disease, I confine myself to clarify the borderline concept. In a second point, a ratio is made
between the aforementioned personality disorders with suicidal ideation. The next topic reflects the
Social (re) integrating of this individuals and the relevance of the work of the professionals in the
social area. Finally, a brief conclusion on the above present theme. This article is based on a
literature review about the subject, which discusses the personal and social consequences of
borderline structure with a view to a better understanding of this phenomenon, simplifying your
understanding.
Keywords: borderline; suicidal ideation; integration.
2
INTRODUÇÃO
Em Portugal, na atualidade, é notório o crescimento do interesse pela área da Saúde
Mental e como as alterações existentes a esse mesmo nível, podem levar ao
comprometimento do plano de interação.
A Personalidade representa um conjunto das características marcantes de um indivíduo,
que determina o seu relacionamento pessoal e social, referente ao pensar, sentir e agir.
Assim, patenteia um conjunto de padrões cognitivos, emocionais, motivacionais e
comportamentais estáveis, que são ativados em circunstâncias particulares e repetidos de
forma frequente (Mischel & Shoda, 1995; Westen, 1995, cit. por Saraiva & Cerejeira,
2014, p.425).
A enfermidade psíquica do Transtorno Borderline ou Personalidade Limítrofe, não é
ainda muito conhecida por parte da população. Embora afete indiscriminadamente
integrantes das mais diversas classes sociais, esta patologia incide particularmente no sexo
feminino no início da idade adulta.
Como descreve a psicóloga, com pós-graduação em psiquiatria Ana Beatriz Silva
(2013), na sua obra literária “Corações Descontrolados: Ciúmes, raiva, impulsividade - o
jeito Borderline de ser”, o transtorno surge pela primeira vez nessa fase onde, em geral,
ocorre o primeiro afeto não correspondido. A adolescência é a época das paixões, dos
comportamentos de risco: o adolescente tem que arriscar para aprender. Contudo, para o
indivíduo Borderline, é uma erupção emocional.
Esta estrutura é um transtorno mental complexo. Segundo estudos efetuados, este
transtorno está presente em 10% de todos os doentes psiquiátricos ambulatórios e em 20%
dos que se encontram hospitalizados (Schestatsky, 2005). A perturbação de personalidade
foi desde há muitos anos alvo de estudos por parte de vários autores, uma vez que aparenta
grande variabilidade na forma de transparecer os seus sintomas e consequentemente a
dificuldade na fase de diagnóstico.
Deste modo, as Perturbações da Personalidade, passam a ser entendidas como doenças
mentais de base constitucional situadas num continuum desenvolvimental com outras
perturbações mentais.
3
1. SAÚDE E DOENÇA MENTAL
Desde meados do século XX que a saúde se constitui num conceito específico e como
objetivo de investigação. Segundo a Constitution of the World Health Organization 1
(1948), a saúde defini-se como “estado de bem estar físico, mental e social, total, e não
apenas a ausência de doença ou de incapacidade”.
Por sua vez, doença mental remete para “um sofrimento humano concreto e imenso.
Podem ser manifestados níveis distintos de gravidade, no desenvolvimento das suas
capacidades e na relação com o seu círculo envolvente” (Basteiro, Gil, & Marin, 2013).
O transtorno Borderline surge como uma categoria diagnóstica utilizada num modo
mais vasto na clínica psiquiátrica, no princípio da década de 50 (Masterson, 1972, cit. por
Vilela & Dalgalarrondo, s.d).
A noção de Borderline constitui-se inicialmente como uma entidade vaga e imprecisa,
que compreende sintomas que se estendem desde o espectro neurótico, passando pelos
distúrbios de personalidade, até ao espectro psicótico. Consiste num transtorno fronteiriço
com descargas afetivas impulsivas, na irregularidade e contradição das relações
afetivas, na insegurança a respeito da própria identidade, nas disforias e, ocasionalmente,
nas ideações de delírio (Vilela & Dalgalarrondo, s.d.).
No ano de 1835 o Psiquiatra inglês James Prichard descreveu um grupo de pacientes
que manifestava uma “violência incontrolável”. Referia-se a uma insanidade moral, onde
os pacientes apresentavam uma “perversão mórbida” nas esferas dos valores éticos, dos
sentimentos e do humor (Vilela & Dalgalarrondo, s.d.).
No entanto, essa insanidade, não provocava alterações cognitivas ou manifestações
delirantes, ou seja, os pacientes falavam/raciocinavam sobre qualquer assunto.
Segundo a perpetiva de Chaslin (s.d., cit. por Vilela & Dalgalarrondo, s.d.), havia de
facto um território fronteiriço entre a “loucura” e a sanidade, uma borderland of insanity
como era mencionado.
De acordo com Pereira (1999, cit. por Cruz, 2012), o termo Borderline é encontrado
pela primeira vez na literatura com o psicanalista Adolf Stern, a 1938, num texto intitulado
“Terapia e investigação psicanalítica do grupo das neuroses Borderline”. Stern descreveu
1
A Constitution of the World Health Organization (WHO), conhecida como Organização Mundial de Saúde
(OMS), foi fundada a 7 de Abril de 1948, com sede em Genebra, na Suíça. A OMS tem como objetivo
desenvolver o máximo possível o nível de saúde de todos os povos, ou seja, melhorar o bem-estar físico,
mental e social dos cidadãos.
4
pacientes que tendiam a regredir intensamente na falta de uma estrutura ambiental mais
organizada, situação que os mesmos tentavam evitar.
Desde a criação deste conceito surgiram dúvidas, relativamente à questão de se
considerar o transtorno Borderline como: um tipo de paciente, um estado transitório, uma
organização de personalidade ou uma forma grave de neurose, como um tipo atenuado de
psicose ou como uma entidade nosológica de direito, ou, finalmente, tratar-se-ia apenas de
uma rubrica para quadros clínicos que estes não conseguiam confortavelmente enquadrar
nas categorias diagnósticas clássicas, já conhecidas (Vilela & Dalgalarrondo, s.d.).
Desta forma, a evolução histórica da sua terminologia sofreria alterações ao longo dos
anos. De acordo com as classificações nosográficas o Transtorno Borderline, atualmente, é
incluído na categoria de Transtornos de Personalidade. Recebeu essa classificação em
1980, com a publicação do Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders2
–III
(DSM-III), onde se tornou um conceito mais preciso e claro.
O conceito atual de Borderline remete para a classificação norte-americana das doenças
mentais (DSM V), publicado a 18 de maio de 2013, sendo esta a versão atual do manual.
Segundo Carneiro (2004), para um diagnóstico de um paciente Borderline, foram
estabelecidas seis características básicas: episódios psicóticos transitórios; impulsividade;
afeto intenso de natureza depressiva ou raivosa; adaptação superficial a situações sociais;
padrão oscilante nas relações afetivas, que pode ir desde um apego extremo a algo
transitório; fraco pensamento em situações não estruturadas.
O indivíduo com estrutura de personalidade Borderline, demonstra sobretudo
dificuldades afetivas onde se denota uma preocupação/ansiedade de possibilidade de perda
de identidade, ao se relacionar com o outro, bem como o desenvolvimento de pânico
convictos de que vão ser rejeitados a qualquer momento. Gabbard (1998, cit. por Cruz,
2012) menciona que existem perceções “quase delirantes” de abandono, chegando mesmo
a ocorrer regressões transferenciais psicóticas.
Após a pesquisa efetuada, procedi à seleção do testemunho de uma paciente com
transtorno Borderline:
“[…] Antes de eu ser diagnosticada, dizia sempre que era como se eu visse
diante de mim uma linha, e eu sabia que se eu a atravessasse não havia volta
a dar. Seriam horas de dor, transtorno, violência e muitos choros. E eu
simplesmente não sabia/não sei como evitar atravessar essa linha. […] Não
2
Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders – DSM, é um manual para profissionais da área da
saúde mental que confere uma listagem de diferentes categorias de transtornos mentais, bem como critérios
para o seu diagnóstico. Em termos de pesquisa na área da saúde mental, o DSM continua a ser a maior
referência da atualidade.
5
consigo controlar os meus sentimentos, sou descartada pelos outros.
Controlar-me é difícil, não posso controlar-me! Sou a minha própria bomba
[…] quando alguém me ama eu deveria sentir-me bem, mas acabo por fugir.
E quando me magoam eu agarro-me […] ” .
(Anónimo, 2 de Julho de 2014, cit. por Perez, 2014)
Perante este testemunho, está patente o quanto esta pessoa consegue relatar
minunciosamente o seu sofrimento.
Na Universidade de Toronto, um novo trabalho efetuado por pesquisadores dá a melhor
descrição, como foi considerada, dos circuitos neuronais subjacentes ao Transtorno de
Personalidade Borderline, admitindo que pode levar a melhores tratamentos e diagnóstico.
O Professor Assistente Anthony Ruocco (2013) desvendou os circuitos neuronais onde
por um lado são visíveis as regiões do cérebro que processam emoções negativas (por
exemplo, raiva e tristeza) que são hiperativos em pessoas com Personalidade Borderline.
Por outro lado, regiões na parte frontal do cérebro, que são pensadas para nos ajudar a
controlar as reações emocionais, são hipoativas para esses indivíduos em particular (figura
1).
Figura1- Imagem do cérebro com circuitos neuronais subjacentes ao Transtorno de Personalidade Borderline
(2013). Obtido de http://www.news.utoronto.ca/understanding-borderline-personality-disorder
Segundo o Professor Anthony Ruocco (2013, cit. por Kleiner, 2013), o sintoma de
base que as pessoas descrevem é a desregulação da emoção. Pessoas com Transtorno
Borderline podem percorrer as emoções, geralmente negativas, muito rapidamente.
Os primeiros sintomas dessa perturbação tendem a surgir na adolescência, persistindo
normalmente por toda a vida, embora na maioria dos casos a gravidade do transtorno
diminui com o tempo.
As mulheres são as mais afetadas pelo transtorno onde consta uma taxa de 75%. A
justificação mencionada por alguns autores, refere-se ao facto de os indivíduos do sexo
feminino estarem mais vulneráveis a traumas físicos/emocionais, como por exemplo
6
abusos sexuais na infância. O diagnóstico destes pacientes nem sempre é inteligível de
atribuir, uma vez que existe cerca de 60% de doentes bipolares que padecem de
perturbação Borderline. Tal facto leva a uma elevada taxa de comorbidade entre esta
perturbação e a doença bipolar (Ferreira, Lopes, Lourenço, Melo, & Maia, s.d.).
2. A PATOLOGIA LIMÍTROFE E AS IDEAÇÕES SUICIDÁRIAS
Clinicamente os pacientes da patologia limítrofe são, muitas vezes, pessoas cujo as suas
relações afetivas são instáveis marcadas pela dependência dita analítica e pela manipulação
agressiva. A libertação das tensões conflituais utiliza sobretudo as passagens ao ato,
implicando uma instabilidade socioprofissional e afetiva, bem como condutas de
autodestruição por impulsos suicidários, acidentes ou abusos de tóxicos.
Segundo Durkheim (1897, cit. por Saraiva e Cerejeira, 2014), o suicídio varia consoante
a integração social do indivíduo e da sua religião.
Podemos definir que o suicídio remete para pacientes que têm imensa dificuldade em se
relacionar. Algumas das causas apontadas para a exclusão deste distúrbio, passa por fatores
genéticos, abusos sexuais, exposição traumática à violência e consequentemente
desequilíbrio emocional e comportamentos impulsivos.
Sendo a estrutura Borderline considerada uma perturbação do humor, importa
mencionar que indivíduos que sofrem desta patologia, têm um aumento significativo no
risco de morte por suicídio 20 vezes superior à dos indivíduos sem uma patologia afetiva
(Saraiva & Cerejeira, 2014).
Segundo Pérez, Marco e Alandete (2014), várias pesquisas demonstraram que ambos os
comportamentos suicidas e não suicidas, são fenómenos comórbidos que estão presentes
em pacientes com este transtorno, considerados provenientes de fenómenos distintos, e
associado a diferentes métodos, motivos, frequência e gravidade da psicopatologia.
As razões que levam um indivíduo em particular a protagonizar episódios de
comportamentos suicidários são ambivalentes. Os fatores de risco estão subdivididos em
três categorias: fatores sociodemográficos, história pessoal e familiar, fatores da esfera
suicida.
O paciente Borderline apresenta um comportamento autodestrutivo, como o uso de
drogas, álcool e comportamentos autolesivos, sendo as tentativas de suicídio por impulso
as mais frequentes. O risco mais elevado nos primeiros anos após o início da doença é o
7
alcoolismo sendo o principal premeditor, particularmente na presença de perturbações da
personalidade.
Os indivíduos Borderline têm uma forte tendência para compras compulsivas, relações
sexuais de risco, ingestão de alimentos de forma compulsiva, desenvolvimento de
depressão, distúrbios de ansiedade, abuso de substâncias, transtorno afetivo bipolar, bem
como o desenrolar de outros transtornos de personalidade e violência.
Estes pacientes são conhecidos por pacientes “limítrofes” por viverem intensamente as
suas ações, manifestando uma instabilidade constante de humor.
Quando os pacientes evoluem para episódios psicóticos, o que acontece muito
raramente, sentem-se observados, perseguidos e gozados.
O reflexo das ideações suicidárias na vivência social tem consequências agravantes,
uma vez que a taxa de suicídio é bastante elevada, atingindo 10% dos pacientes.
A terapia para a estrutura Borderline apresenta vários componentes, incluindo terapia
individual, treino de habilidades, coaching por telefone e uma equipa de consulta terapeuta
(Linehan, Korslund, Harned, Gallop, Lungu, Neacsiu, McDavid, Comtois, & Gregory,
2015).
A evidência científica atual prevê na personalidade Borderline, uma maior ação no
controlo da impulsividade e da agressividade. Contudo, quando considerada no seu todo,
não existe uma recomendação psicofarmacológica preconizada para esta perturbação da
personalidade (Saraiva & Cerejeira, 2014).
De uma forma simples, o que é procurado no tratamento é” transformar” o transtorno,
ou seja, a pessoa vai continuar a ser sensível, emotiva, mas vai canalizar para ações
produtivas.
Sucessivamente profissionais de várias áreas unem-se com um propósito comum: dar a
conhecer a investigação científica mais recente na área do suicídio e dos comportamentos
autolesivos, partilhar saberes e experiências sobre a intervenção terapêutica nos quadros
clínicos mais frequentemente associados a esta temática e contribuir para a prevenção aos
diversos níveis (Sociedade Portuguesa de Suicidologia, 2014).
Assim, foi criado um Plano Nacional de Prevenção ao Suicídio (2013/2017) que se
mostrou essencial para a criação de sinergias, bem como a partilha de saberes para a
comunidade (Direção Geral da Saúde, 2013).
No caso Borderline é importante estar atento a vários sinais. Estes optam em grande
parte pelos comportamentos autolesivos, que constituem um comportamento sem
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intencionalidade suicida, envolvendo atos autolesivos intencionais, como por exemplo
cortarem-se ou ingerirem fármacos superiores às posologias terapêuticas reconhecidas. O
principal objetivo deste comportamento, é conseguir as mudanças desejadas
(Diekstra,1992, cit. por Saraiva & Cerejeira, 2014).
3. REABILITAÇÃO PSICOSOCIAL E (RE)INTEGRAÇÃO COMUNITÁRIA
O estigma denota-se como uma relação especial entre atributo e estereótipo
profundamente despreciativa levando à discriminação (Xavier, Klut, Neto, Ponte, &
Melo, 2013).
Nas sociedades industrializadas, o primeiro elemento para determinar a sanidade de
um indíviduo é o conceito “trabalho”, ou seja, se não é economicamente ativo é
destinado à margem social. Seguindo esta lógica, estes indivíduos foram alocados em
grandes instituições, tornando-se uma classe marginalizada destituída de cidadania,
afastada da família. Estes locais designados de “hospícios” e ”manicómios”, estavam
destinados a esconder o que acontecia nas suas infra-estruturas, sem fins terapêuticos e
com ausência de reabilitação (Basaglia, 2005, cit. por Passos, & Aires, 2013).
No final do século XVIII, o médico psiquiatra Philippe Pinel, categorizou a “loucura”
como uma doença, de tal forma que posteriormente os médicos passaram a ser vigilantes e
moderados dos excessos a que a doença podia levar. Desta forma, tudo o que não se
“encaixava” na sociedade passou a ser visto como patológico e portanto deveria ser
corrigido (Basaglia, 2005, cit. por Passos, & Aires, 2013).
Desde o século XX que a sociedade portuguesa tomou consciência da necessidade em
adotar políticas de conhecimento, na área da saúde mental, onde importa compreender,
capacitar e identificar os problemas psíquicos. Este é um direito de cidadania que deve ser
articulado com profissionais de saúde e divulgado pela comunicação social, promovendo a
literacia contra a discriminação do doente mental.
Já no ano de 2006, foi criada a Comissão Nacional para a Reestruturação dos
Serviços de Saúde Mental, que deu origem à publicação do Plano Nacional de Saúde
Mental 2007-2016 que visa, em grande parte, “promover a descentralização dos serviços
de saúde mental, de modo a permitir a prestação de cuidados mais próximos das pessoas
e a facilitar uma maior participação das comunidades, dos utentes e das suas famílias”
(Decreto-Lei n.º 5/2008 de 6 de Março, p. 1395).
9
Nas palavras de Hegenberg (2000, p. 14., cit. por Cruz, 2012), “ (…) no mundo de hoje
o sujeito está só. Dependente de um meio ambiente estável e acolhedor, o Borderline não
encontra guardia para o seu sofrimento, apenas encontra pessoas apressadas,
aparentemente satisfeitas na procura do sem bem-estar (…)”. Assim, o autor demonstra
que o contexto, da atualidade, contribuiu para o desamparo e para a sensação de solidão,
que marca o sujeito pela falta de apoio e compreensão.
Como Educadora Social, não posso deixar de realçar a importância da existência de um
trabalho multidisciplinar. No exercício do trabalho, os profissionais destas equipas têm
como ponto fulcral de intervenção o indivíduo e os seus cuidadores informais (Matos,
Pires, & Campos, 2009, cit. por Saraiva & Cerejeira 2016).
Cardoso (2008, cit. por Saraiva, 2016) refere a este propósito que é impossível realizar
uma investigação clínica ou tratar doentes sem recorrer ao trabalho integrado de equipas
multidisciplinares.
Para além das terapias, é preciso articular a construção de toda uma rede social de apoio
ao sujeito e familiares, como por exemplo os serviços de apoio telefónico. Os serviços de
atendimento telefónico, de uma forma geral, garantem o anonimato e oferecem a
possibilidade de falar sobre o problema do suicídio com voluntários escutantes, que
fornecem indicações sobre os locais especializados onde a pessoa se poderá dirigir para
obter ajuda ou o tratamento específico (Sociedade Portuguesa de Suicidologia, 2014).
A importância deste tipo de abordagem tem sido documentada cientificamente,
evidenciando geralmente melhor serviço aos doentes. De acordo com o Jornal Público
(2009), os indivíduos do sexo feminino, são os que apresentam uma taxa superior, no que
se refere ao uso dos serviços de apoio telefónico. Segundo a mesma fonte, as doenças
psicológicas e físicas bem como as dependências foram o principal motivo que levaram os
utentes a recorrerem ao serviço, com um total de 734 chamadas, nesse ano.
CONCLUSÃO
Como foi possível de perceber ao longo deste artigo, a saúde mental resultará sempre do
crescer com a diferença, da multiplicidade, mesmo que isso implique complexidade.
Winnicott (1971/1975, cit. por Oneto, Marques, & Pinheiro, 2009) define espaço
potencial como uma zona intermediária entre a realidade psíquica, pessoal e interna e a
realidade externa ou compartilhada; um espaço entre a realidade e a fantasia; uma terceira
forma de viver. Relaciona-se tanto com o interno como com o externo, mas não pertence a
10
nenhum destes dois domínios, é diferente deles. É o espaço do simbolismo, da imaginação,
da criatividade, que é apontado para as pessoas com patologia ”limítrofe”.
Após a análise bibliográfica necessária para a elaboração do presente artigo, verifico
que do mesmo jeito que a “crise” vem, ela vai embora. É um ciclo vicioso de busca pela
aprovação de um amor incondicional.
Alguns profissionais enfatizam que, sem tratamento, os sintomas podem piorar.
Para o terapeuta o tratamento do paciente Borderline é um desafio, por ser uma
patologia relativamente recente, apresenta analogias com outros quadros patológicos.
Com base nas teorias analisadas pode-se dizer que para o paciente “limítrofe” a
característica base para a terapia é a de apoio, é necessário um conjunto de sintomas para
um processo terapêutico ideal.
Em suma, embora o Transtorno de Personalidade Borderline pareça estar longe de ser
uma patologia com causas e tratamentos bem definidos, conclui-se que a maioria dos
transtornos de ordem psíquica passaram por um longo processo de compreendimento, logo
este transtorno não é exceção.
Indivíduos Borderline são seres humanos que vivem na fronteira entre o desespero do
que sentem e o desejo de que tudo fique bem, são pequenos “corações descontrolados”.
BILBIOGRAFIA
Basteiro, S., Gil , C., & Marin, R. (2013). Guia para Familiares de Doentes Mentais.
Lisboa: Federação Nacional das Associações de Famílias Pró-Saúde Mental.
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n%C3%A7a.pdf
Canastra, F., & Malheiro, M. (2009). Papel do Educador Social no quadro das novas
mediações socioeducativas. Obtido de
https://iconline.ipleiria.pt/bitstream/10400.8/345/1/O%20Papel%20espec%C3%AD
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strutura%C3%A7%C3%A3oSM_ABRIL2007.pdf
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Decreto-Lei n.º 5/2008 de 6 de Março. Diário da República nº 47 - I Série. Ministério da
Saúde. Lisboa.
Direção Geral da Saúde (2013). Plano Nacional de Prevenção de Suicídio 2013/2017.
Página consultada a 20.11.2015, em
http://www.portaldasaude.pt/NR/rdonlyres/BCA196AB-74F4-472B-B21E-
6386D4C7A9CB/0/i018789.pdf
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Trial and Component Analysis [versão eletrónica]. JAMA Psychiatry,72(5), 475-
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envolvidos. A importância das equipas multidisciplinares. Atlas da Saúde, s.p.
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apoio telefónico?”. Página consultada a 18.11.2015, em
http://www.spsuicidologia.pt/sobre-o-suicidio/questoes-frequentes/37-como-
funcionam-os-servicos-de-apoio-telefonico
Vilela, W., & Dalgalarrondo, P. (s.d.). Transtorno borderline: história e atualidade [versão
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http://www.psicopatologiafundamental.org/uploads/files/revistas/volume02/n2/tran
storno_borderline_historia_e_atualidade.pdf
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Que Caminho Percorremos? [versão eletrónica]. PsiLOGOS Vol. 11, nº 2, 10-21.
Obtido de
http://www.psilogos.com/Revista/Vol11N2/Indice15_ficheiros/Estigma%20doenca%20
mental.pdf

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Artigo Entre o Desespero e o DESEJO

  • 1. 1 A FRONTEIRA ENTRE O DESESPERO E O DESEJO: Ideações suicidárias na estrutura Borderline A border between despair and desire: Suicidal ideations in the Borderline structure Ana Cláudia da Costa Paiva Mestranda em Psiquiatria Social e Cultural Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra claudiapaiva.94@gmail.com Coimbra, 2016 Resumo Na sociedade contemporânea, torna-se cada vez mais visível a erupção de sentimentos muitas vezes marcada pelos acontecimentos de vida de cada indivíduo. Deste feito, este artigo debruça-se sobre as diferentes perspetivas do Transtorno de Personalidade Borderline. Cingi-me inicialmente por explicitar o conceito Borderline de acordo com as perspetivas ao longo dos anos de profissionais que estudaram esta patologia. Num segundo ponto, será efetuada uma relação entre o transtorno de personalidade mencionado anteriormente, com as ideações suicidárias. De seguida, está patente um tópico relacionado com a (re) integração social dos mesmos dando relevância à atuação do profissional da área social. Por fim, será apresentada uma breve conclusão sobre o tema exposto. O presente artigo assenta numa revisão da literatura, sobre o tema em análise, que procura discutir as consequências pessoais e sociais da estrutura Borderline, tendo em vista um melhor entendimento deste fenómeno, simplificando a sua compreensão. Palavras-chave: borderline; ideações suicidárias; integração. Abstract In contemporary society, the eruption of feelings often marked by the life of every individual events it becomes more and more visible. This article focuses on the different perspectives of Borderline Personality Disorder. According to the perspectives of professionals who have studied this disease, I confine myself to clarify the borderline concept. In a second point, a ratio is made between the aforementioned personality disorders with suicidal ideation. The next topic reflects the Social (re) integrating of this individuals and the relevance of the work of the professionals in the social area. Finally, a brief conclusion on the above present theme. This article is based on a literature review about the subject, which discusses the personal and social consequences of borderline structure with a view to a better understanding of this phenomenon, simplifying your understanding. Keywords: borderline; suicidal ideation; integration.
  • 2. 2 INTRODUÇÃO Em Portugal, na atualidade, é notório o crescimento do interesse pela área da Saúde Mental e como as alterações existentes a esse mesmo nível, podem levar ao comprometimento do plano de interação. A Personalidade representa um conjunto das características marcantes de um indivíduo, que determina o seu relacionamento pessoal e social, referente ao pensar, sentir e agir. Assim, patenteia um conjunto de padrões cognitivos, emocionais, motivacionais e comportamentais estáveis, que são ativados em circunstâncias particulares e repetidos de forma frequente (Mischel & Shoda, 1995; Westen, 1995, cit. por Saraiva & Cerejeira, 2014, p.425). A enfermidade psíquica do Transtorno Borderline ou Personalidade Limítrofe, não é ainda muito conhecida por parte da população. Embora afete indiscriminadamente integrantes das mais diversas classes sociais, esta patologia incide particularmente no sexo feminino no início da idade adulta. Como descreve a psicóloga, com pós-graduação em psiquiatria Ana Beatriz Silva (2013), na sua obra literária “Corações Descontrolados: Ciúmes, raiva, impulsividade - o jeito Borderline de ser”, o transtorno surge pela primeira vez nessa fase onde, em geral, ocorre o primeiro afeto não correspondido. A adolescência é a época das paixões, dos comportamentos de risco: o adolescente tem que arriscar para aprender. Contudo, para o indivíduo Borderline, é uma erupção emocional. Esta estrutura é um transtorno mental complexo. Segundo estudos efetuados, este transtorno está presente em 10% de todos os doentes psiquiátricos ambulatórios e em 20% dos que se encontram hospitalizados (Schestatsky, 2005). A perturbação de personalidade foi desde há muitos anos alvo de estudos por parte de vários autores, uma vez que aparenta grande variabilidade na forma de transparecer os seus sintomas e consequentemente a dificuldade na fase de diagnóstico. Deste modo, as Perturbações da Personalidade, passam a ser entendidas como doenças mentais de base constitucional situadas num continuum desenvolvimental com outras perturbações mentais.
  • 3. 3 1. SAÚDE E DOENÇA MENTAL Desde meados do século XX que a saúde se constitui num conceito específico e como objetivo de investigação. Segundo a Constitution of the World Health Organization 1 (1948), a saúde defini-se como “estado de bem estar físico, mental e social, total, e não apenas a ausência de doença ou de incapacidade”. Por sua vez, doença mental remete para “um sofrimento humano concreto e imenso. Podem ser manifestados níveis distintos de gravidade, no desenvolvimento das suas capacidades e na relação com o seu círculo envolvente” (Basteiro, Gil, & Marin, 2013). O transtorno Borderline surge como uma categoria diagnóstica utilizada num modo mais vasto na clínica psiquiátrica, no princípio da década de 50 (Masterson, 1972, cit. por Vilela & Dalgalarrondo, s.d). A noção de Borderline constitui-se inicialmente como uma entidade vaga e imprecisa, que compreende sintomas que se estendem desde o espectro neurótico, passando pelos distúrbios de personalidade, até ao espectro psicótico. Consiste num transtorno fronteiriço com descargas afetivas impulsivas, na irregularidade e contradição das relações afetivas, na insegurança a respeito da própria identidade, nas disforias e, ocasionalmente, nas ideações de delírio (Vilela & Dalgalarrondo, s.d.). No ano de 1835 o Psiquiatra inglês James Prichard descreveu um grupo de pacientes que manifestava uma “violência incontrolável”. Referia-se a uma insanidade moral, onde os pacientes apresentavam uma “perversão mórbida” nas esferas dos valores éticos, dos sentimentos e do humor (Vilela & Dalgalarrondo, s.d.). No entanto, essa insanidade, não provocava alterações cognitivas ou manifestações delirantes, ou seja, os pacientes falavam/raciocinavam sobre qualquer assunto. Segundo a perpetiva de Chaslin (s.d., cit. por Vilela & Dalgalarrondo, s.d.), havia de facto um território fronteiriço entre a “loucura” e a sanidade, uma borderland of insanity como era mencionado. De acordo com Pereira (1999, cit. por Cruz, 2012), o termo Borderline é encontrado pela primeira vez na literatura com o psicanalista Adolf Stern, a 1938, num texto intitulado “Terapia e investigação psicanalítica do grupo das neuroses Borderline”. Stern descreveu 1 A Constitution of the World Health Organization (WHO), conhecida como Organização Mundial de Saúde (OMS), foi fundada a 7 de Abril de 1948, com sede em Genebra, na Suíça. A OMS tem como objetivo desenvolver o máximo possível o nível de saúde de todos os povos, ou seja, melhorar o bem-estar físico, mental e social dos cidadãos.
  • 4. 4 pacientes que tendiam a regredir intensamente na falta de uma estrutura ambiental mais organizada, situação que os mesmos tentavam evitar. Desde a criação deste conceito surgiram dúvidas, relativamente à questão de se considerar o transtorno Borderline como: um tipo de paciente, um estado transitório, uma organização de personalidade ou uma forma grave de neurose, como um tipo atenuado de psicose ou como uma entidade nosológica de direito, ou, finalmente, tratar-se-ia apenas de uma rubrica para quadros clínicos que estes não conseguiam confortavelmente enquadrar nas categorias diagnósticas clássicas, já conhecidas (Vilela & Dalgalarrondo, s.d.). Desta forma, a evolução histórica da sua terminologia sofreria alterações ao longo dos anos. De acordo com as classificações nosográficas o Transtorno Borderline, atualmente, é incluído na categoria de Transtornos de Personalidade. Recebeu essa classificação em 1980, com a publicação do Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders2 –III (DSM-III), onde se tornou um conceito mais preciso e claro. O conceito atual de Borderline remete para a classificação norte-americana das doenças mentais (DSM V), publicado a 18 de maio de 2013, sendo esta a versão atual do manual. Segundo Carneiro (2004), para um diagnóstico de um paciente Borderline, foram estabelecidas seis características básicas: episódios psicóticos transitórios; impulsividade; afeto intenso de natureza depressiva ou raivosa; adaptação superficial a situações sociais; padrão oscilante nas relações afetivas, que pode ir desde um apego extremo a algo transitório; fraco pensamento em situações não estruturadas. O indivíduo com estrutura de personalidade Borderline, demonstra sobretudo dificuldades afetivas onde se denota uma preocupação/ansiedade de possibilidade de perda de identidade, ao se relacionar com o outro, bem como o desenvolvimento de pânico convictos de que vão ser rejeitados a qualquer momento. Gabbard (1998, cit. por Cruz, 2012) menciona que existem perceções “quase delirantes” de abandono, chegando mesmo a ocorrer regressões transferenciais psicóticas. Após a pesquisa efetuada, procedi à seleção do testemunho de uma paciente com transtorno Borderline: “[…] Antes de eu ser diagnosticada, dizia sempre que era como se eu visse diante de mim uma linha, e eu sabia que se eu a atravessasse não havia volta a dar. Seriam horas de dor, transtorno, violência e muitos choros. E eu simplesmente não sabia/não sei como evitar atravessar essa linha. […] Não 2 Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders – DSM, é um manual para profissionais da área da saúde mental que confere uma listagem de diferentes categorias de transtornos mentais, bem como critérios para o seu diagnóstico. Em termos de pesquisa na área da saúde mental, o DSM continua a ser a maior referência da atualidade.
  • 5. 5 consigo controlar os meus sentimentos, sou descartada pelos outros. Controlar-me é difícil, não posso controlar-me! Sou a minha própria bomba […] quando alguém me ama eu deveria sentir-me bem, mas acabo por fugir. E quando me magoam eu agarro-me […] ” . (Anónimo, 2 de Julho de 2014, cit. por Perez, 2014) Perante este testemunho, está patente o quanto esta pessoa consegue relatar minunciosamente o seu sofrimento. Na Universidade de Toronto, um novo trabalho efetuado por pesquisadores dá a melhor descrição, como foi considerada, dos circuitos neuronais subjacentes ao Transtorno de Personalidade Borderline, admitindo que pode levar a melhores tratamentos e diagnóstico. O Professor Assistente Anthony Ruocco (2013) desvendou os circuitos neuronais onde por um lado são visíveis as regiões do cérebro que processam emoções negativas (por exemplo, raiva e tristeza) que são hiperativos em pessoas com Personalidade Borderline. Por outro lado, regiões na parte frontal do cérebro, que são pensadas para nos ajudar a controlar as reações emocionais, são hipoativas para esses indivíduos em particular (figura 1). Figura1- Imagem do cérebro com circuitos neuronais subjacentes ao Transtorno de Personalidade Borderline (2013). Obtido de http://www.news.utoronto.ca/understanding-borderline-personality-disorder Segundo o Professor Anthony Ruocco (2013, cit. por Kleiner, 2013), o sintoma de base que as pessoas descrevem é a desregulação da emoção. Pessoas com Transtorno Borderline podem percorrer as emoções, geralmente negativas, muito rapidamente. Os primeiros sintomas dessa perturbação tendem a surgir na adolescência, persistindo normalmente por toda a vida, embora na maioria dos casos a gravidade do transtorno diminui com o tempo. As mulheres são as mais afetadas pelo transtorno onde consta uma taxa de 75%. A justificação mencionada por alguns autores, refere-se ao facto de os indivíduos do sexo feminino estarem mais vulneráveis a traumas físicos/emocionais, como por exemplo
  • 6. 6 abusos sexuais na infância. O diagnóstico destes pacientes nem sempre é inteligível de atribuir, uma vez que existe cerca de 60% de doentes bipolares que padecem de perturbação Borderline. Tal facto leva a uma elevada taxa de comorbidade entre esta perturbação e a doença bipolar (Ferreira, Lopes, Lourenço, Melo, & Maia, s.d.). 2. A PATOLOGIA LIMÍTROFE E AS IDEAÇÕES SUICIDÁRIAS Clinicamente os pacientes da patologia limítrofe são, muitas vezes, pessoas cujo as suas relações afetivas são instáveis marcadas pela dependência dita analítica e pela manipulação agressiva. A libertação das tensões conflituais utiliza sobretudo as passagens ao ato, implicando uma instabilidade socioprofissional e afetiva, bem como condutas de autodestruição por impulsos suicidários, acidentes ou abusos de tóxicos. Segundo Durkheim (1897, cit. por Saraiva e Cerejeira, 2014), o suicídio varia consoante a integração social do indivíduo e da sua religião. Podemos definir que o suicídio remete para pacientes que têm imensa dificuldade em se relacionar. Algumas das causas apontadas para a exclusão deste distúrbio, passa por fatores genéticos, abusos sexuais, exposição traumática à violência e consequentemente desequilíbrio emocional e comportamentos impulsivos. Sendo a estrutura Borderline considerada uma perturbação do humor, importa mencionar que indivíduos que sofrem desta patologia, têm um aumento significativo no risco de morte por suicídio 20 vezes superior à dos indivíduos sem uma patologia afetiva (Saraiva & Cerejeira, 2014). Segundo Pérez, Marco e Alandete (2014), várias pesquisas demonstraram que ambos os comportamentos suicidas e não suicidas, são fenómenos comórbidos que estão presentes em pacientes com este transtorno, considerados provenientes de fenómenos distintos, e associado a diferentes métodos, motivos, frequência e gravidade da psicopatologia. As razões que levam um indivíduo em particular a protagonizar episódios de comportamentos suicidários são ambivalentes. Os fatores de risco estão subdivididos em três categorias: fatores sociodemográficos, história pessoal e familiar, fatores da esfera suicida. O paciente Borderline apresenta um comportamento autodestrutivo, como o uso de drogas, álcool e comportamentos autolesivos, sendo as tentativas de suicídio por impulso as mais frequentes. O risco mais elevado nos primeiros anos após o início da doença é o
  • 7. 7 alcoolismo sendo o principal premeditor, particularmente na presença de perturbações da personalidade. Os indivíduos Borderline têm uma forte tendência para compras compulsivas, relações sexuais de risco, ingestão de alimentos de forma compulsiva, desenvolvimento de depressão, distúrbios de ansiedade, abuso de substâncias, transtorno afetivo bipolar, bem como o desenrolar de outros transtornos de personalidade e violência. Estes pacientes são conhecidos por pacientes “limítrofes” por viverem intensamente as suas ações, manifestando uma instabilidade constante de humor. Quando os pacientes evoluem para episódios psicóticos, o que acontece muito raramente, sentem-se observados, perseguidos e gozados. O reflexo das ideações suicidárias na vivência social tem consequências agravantes, uma vez que a taxa de suicídio é bastante elevada, atingindo 10% dos pacientes. A terapia para a estrutura Borderline apresenta vários componentes, incluindo terapia individual, treino de habilidades, coaching por telefone e uma equipa de consulta terapeuta (Linehan, Korslund, Harned, Gallop, Lungu, Neacsiu, McDavid, Comtois, & Gregory, 2015). A evidência científica atual prevê na personalidade Borderline, uma maior ação no controlo da impulsividade e da agressividade. Contudo, quando considerada no seu todo, não existe uma recomendação psicofarmacológica preconizada para esta perturbação da personalidade (Saraiva & Cerejeira, 2014). De uma forma simples, o que é procurado no tratamento é” transformar” o transtorno, ou seja, a pessoa vai continuar a ser sensível, emotiva, mas vai canalizar para ações produtivas. Sucessivamente profissionais de várias áreas unem-se com um propósito comum: dar a conhecer a investigação científica mais recente na área do suicídio e dos comportamentos autolesivos, partilhar saberes e experiências sobre a intervenção terapêutica nos quadros clínicos mais frequentemente associados a esta temática e contribuir para a prevenção aos diversos níveis (Sociedade Portuguesa de Suicidologia, 2014). Assim, foi criado um Plano Nacional de Prevenção ao Suicídio (2013/2017) que se mostrou essencial para a criação de sinergias, bem como a partilha de saberes para a comunidade (Direção Geral da Saúde, 2013). No caso Borderline é importante estar atento a vários sinais. Estes optam em grande parte pelos comportamentos autolesivos, que constituem um comportamento sem
  • 8. 8 intencionalidade suicida, envolvendo atos autolesivos intencionais, como por exemplo cortarem-se ou ingerirem fármacos superiores às posologias terapêuticas reconhecidas. O principal objetivo deste comportamento, é conseguir as mudanças desejadas (Diekstra,1992, cit. por Saraiva & Cerejeira, 2014). 3. REABILITAÇÃO PSICOSOCIAL E (RE)INTEGRAÇÃO COMUNITÁRIA O estigma denota-se como uma relação especial entre atributo e estereótipo profundamente despreciativa levando à discriminação (Xavier, Klut, Neto, Ponte, & Melo, 2013). Nas sociedades industrializadas, o primeiro elemento para determinar a sanidade de um indíviduo é o conceito “trabalho”, ou seja, se não é economicamente ativo é destinado à margem social. Seguindo esta lógica, estes indivíduos foram alocados em grandes instituições, tornando-se uma classe marginalizada destituída de cidadania, afastada da família. Estes locais designados de “hospícios” e ”manicómios”, estavam destinados a esconder o que acontecia nas suas infra-estruturas, sem fins terapêuticos e com ausência de reabilitação (Basaglia, 2005, cit. por Passos, & Aires, 2013). No final do século XVIII, o médico psiquiatra Philippe Pinel, categorizou a “loucura” como uma doença, de tal forma que posteriormente os médicos passaram a ser vigilantes e moderados dos excessos a que a doença podia levar. Desta forma, tudo o que não se “encaixava” na sociedade passou a ser visto como patológico e portanto deveria ser corrigido (Basaglia, 2005, cit. por Passos, & Aires, 2013). Desde o século XX que a sociedade portuguesa tomou consciência da necessidade em adotar políticas de conhecimento, na área da saúde mental, onde importa compreender, capacitar e identificar os problemas psíquicos. Este é um direito de cidadania que deve ser articulado com profissionais de saúde e divulgado pela comunicação social, promovendo a literacia contra a discriminação do doente mental. Já no ano de 2006, foi criada a Comissão Nacional para a Reestruturação dos Serviços de Saúde Mental, que deu origem à publicação do Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 que visa, em grande parte, “promover a descentralização dos serviços de saúde mental, de modo a permitir a prestação de cuidados mais próximos das pessoas e a facilitar uma maior participação das comunidades, dos utentes e das suas famílias” (Decreto-Lei n.º 5/2008 de 6 de Março, p. 1395).
  • 9. 9 Nas palavras de Hegenberg (2000, p. 14., cit. por Cruz, 2012), “ (…) no mundo de hoje o sujeito está só. Dependente de um meio ambiente estável e acolhedor, o Borderline não encontra guardia para o seu sofrimento, apenas encontra pessoas apressadas, aparentemente satisfeitas na procura do sem bem-estar (…)”. Assim, o autor demonstra que o contexto, da atualidade, contribuiu para o desamparo e para a sensação de solidão, que marca o sujeito pela falta de apoio e compreensão. Como Educadora Social, não posso deixar de realçar a importância da existência de um trabalho multidisciplinar. No exercício do trabalho, os profissionais destas equipas têm como ponto fulcral de intervenção o indivíduo e os seus cuidadores informais (Matos, Pires, & Campos, 2009, cit. por Saraiva & Cerejeira 2016). Cardoso (2008, cit. por Saraiva, 2016) refere a este propósito que é impossível realizar uma investigação clínica ou tratar doentes sem recorrer ao trabalho integrado de equipas multidisciplinares. Para além das terapias, é preciso articular a construção de toda uma rede social de apoio ao sujeito e familiares, como por exemplo os serviços de apoio telefónico. Os serviços de atendimento telefónico, de uma forma geral, garantem o anonimato e oferecem a possibilidade de falar sobre o problema do suicídio com voluntários escutantes, que fornecem indicações sobre os locais especializados onde a pessoa se poderá dirigir para obter ajuda ou o tratamento específico (Sociedade Portuguesa de Suicidologia, 2014). A importância deste tipo de abordagem tem sido documentada cientificamente, evidenciando geralmente melhor serviço aos doentes. De acordo com o Jornal Público (2009), os indivíduos do sexo feminino, são os que apresentam uma taxa superior, no que se refere ao uso dos serviços de apoio telefónico. Segundo a mesma fonte, as doenças psicológicas e físicas bem como as dependências foram o principal motivo que levaram os utentes a recorrerem ao serviço, com um total de 734 chamadas, nesse ano. CONCLUSÃO Como foi possível de perceber ao longo deste artigo, a saúde mental resultará sempre do crescer com a diferença, da multiplicidade, mesmo que isso implique complexidade. Winnicott (1971/1975, cit. por Oneto, Marques, & Pinheiro, 2009) define espaço potencial como uma zona intermediária entre a realidade psíquica, pessoal e interna e a realidade externa ou compartilhada; um espaço entre a realidade e a fantasia; uma terceira forma de viver. Relaciona-se tanto com o interno como com o externo, mas não pertence a
  • 10. 10 nenhum destes dois domínios, é diferente deles. É o espaço do simbolismo, da imaginação, da criatividade, que é apontado para as pessoas com patologia ”limítrofe”. Após a análise bibliográfica necessária para a elaboração do presente artigo, verifico que do mesmo jeito que a “crise” vem, ela vai embora. É um ciclo vicioso de busca pela aprovação de um amor incondicional. Alguns profissionais enfatizam que, sem tratamento, os sintomas podem piorar. Para o terapeuta o tratamento do paciente Borderline é um desafio, por ser uma patologia relativamente recente, apresenta analogias com outros quadros patológicos. Com base nas teorias analisadas pode-se dizer que para o paciente “limítrofe” a característica base para a terapia é a de apoio, é necessário um conjunto de sintomas para um processo terapêutico ideal. Em suma, embora o Transtorno de Personalidade Borderline pareça estar longe de ser uma patologia com causas e tratamentos bem definidos, conclui-se que a maioria dos transtornos de ordem psíquica passaram por um longo processo de compreendimento, logo este transtorno não é exceção. Indivíduos Borderline são seres humanos que vivem na fronteira entre o desespero do que sentem e o desejo de que tudo fique bem, são pequenos “corações descontrolados”. BILBIOGRAFIA Basteiro, S., Gil , C., & Marin, R. (2013). Guia para Familiares de Doentes Mentais. Lisboa: Federação Nacional das Associações de Famílias Pró-Saúde Mental. Bragança, O. (2013). Desinstitucionalização do doente mental (Dissertação de mestrado). Obtido de https://bibliotecadigital.ipb.pt/bitstream/10198/8409/1/Tese%20Orlando%20Braga n%C3%A7a.pdf Canastra, F., & Malheiro, M. (2009). Papel do Educador Social no quadro das novas mediações socioeducativas. Obtido de https://iconline.ipleiria.pt/bitstream/10400.8/345/1/O%20Papel%20espec%C3%AD fico%20do(a)%20educador(a)%20social_Fernando%20Canastra.pdf
  • 11. 11 Carneiro, L. (2004). Borderline – no limite entre a loucura e a razão [versão eletrónica]. Ciências & Cognição, Vol 03, 66-68. Obtido de http://www.cienciasecognicao.org/pdf/v03/cec_vol_3_m14420.pdf Clifford, D. (2009, Setembro 10). Suicídio: menos pedidos de ajuda desde que linha de apoio passou a ser paga. Público, s.p. Comissão Nacional para a Restruturação dos Serviços de Saúde Mental (s.d.). Reestruturação e Desenvolvimento dos Serviços de Saúde Mental- Plano de Ação 2007-2016. Obtido de http://www.sppsm.org/wp- content/uploads/2011/06/RELAT%C3%AERIOFINALComiss%C2%8Bo-ree- strutura%C3%A7%C3%A3oSM_ABRIL2007.pdf Constitution of the World Organization in October 2006. Basic Documents- Forty-fifth edition. Genebra. Cruz, M. (2012). Reflexões entre a relação entre a personalidade Borderline e as adições (Dissertação de mestrado). Obtido de http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47133/tde-14062012-154805/pt- br.php Decreto-Lei n.º 5/2008 de 6 de Março. Diário da República nº 47 - I Série. Ministério da Saúde. Lisboa. Direção Geral da Saúde (2013). Plano Nacional de Prevenção de Suicídio 2013/2017. Página consultada a 20.11.2015, em http://www.portaldasaude.pt/NR/rdonlyres/BCA196AB-74F4-472B-B21E- 6386D4C7A9CB/0/i018789.pdf Ferreira, B., Lopes, B., Lourenço, B., Melo, J., & Maia, T. (s.d.). Doença Bipolar e Perturbação Borderline da Personalidade - Comorbilidade ou Continuum [versão eletrónica]. Revista do Serviço de Psiquiatria do Hospital Fernando Fonseca, 53-
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