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ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
Ficha técnica
Título
Coordenadores do Projeto
Autores
Coordenadora de Revisão
Ilustradora
Alimentação Australopiteca:
o dilema da alimentação –
testemunhos verídicos
Sandra de Sá
Rui Amaral
Mariana Mota
Wellen Fontellene
Mafalda Arnauth
Eng. ª Diana Bedoya
Dr. Duarte Marques
Professor Dr. Armando Almeida
Dr. Lourenço Castro
Atleta Olímpica Rita Borralho
Dr. Márcia Almeida
Dr. Isabel Costa
Dr. Wenquian Chen
Dr. Elsa Novais
Dr. Luís Lourenço
Teresa Pitagros
Maria Oliveira Dias
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ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
Índice
Prólogo...............................................................................................................................7
Saúde no século XXI: uma revolução na alimentação impõe-se .............11
Viagens Gastronómicas ............................................................................................26
A reflexão dos nossos atos........................................................................................28
A essência da Alimentação no individuo ...........................................................30	
A Alimentação no desporto ....................................................................................32	
O Alimento como equilibrio energético ............................................................34	
Filosofia alimentar........................................................................................................36	
A força do Alimento ...................................................................................................43	
O estado de arte económico da Alimentação..................................................47 	
O que nos leva a escolher, o que nos vende o alimento............................ 50	
Ouvir a natureza ..........................................................................................................53	
Terapia Detox e Feedback........................................................................................57 	
O que como? ................................................................................................................59	
Receitas .........................................................................................................................64
Conclusão....................................................................................................................113
7
ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
Prólogo
A alimentação é um fenómeno incontornável, basilar paradigma da
atualidade, tema de gente magra e tema de gente gorda, que converge num
sentido aparente: o nirvana.
Na busca da plenitude alimentar intentam-se conjugações, e o ser holístico
que consome o tempo e o espaço é confrontado ao longo da sua história por
problemáticas dinâmicas do foro alimentar. Talvez a mais preocupante para a
nossa espécie seja a fome, má-nutrição, privação de comida, chamem-lhe o que
quiserem, senhores doutos da nutrição, mães de família, caçadores audazes,
agentes da indústria, políticos das nações. Ela acontece – quer se goste quer não
se goste – entre as populações do nosso mundo, e, por regra, devido a condições
geo-adversas, à instabilidade, a conflitos ou à mera pobreza. Povos famintos têm
maiores problemas no desenvolvimento da sua tribo, limitando capacidades
de produtividade, aprendizagem e evolução. A ausência de alimento, temível
flagelo, está relacionada diretamente com o grau de corpos vulneráveis e,
consequentemente, da mortalidade de um povo. Por dia, mil milhões de pessoas
ingeremmenosde1.800quilocalorias,eisto,segundoosobservatóriosquemedem
afelicidadedoshumanos,designa-sepor“fomehumana”.Aausênciadefomeestá
associada à felicidade. E, nesse caminho de pensamento, o construto “dinheiro”,
desde que aplicado em função das necessidades biológicas e emocionais do ser,
ajudará a adquirir a felicidade.
Somos originários da África – sim éramos todos mulatos no início. Com
qualquer coisa como 200 mil anos de presença terrestre, um corpo ereto que
permiteousopotencialdosbraçosnacriaçãodeferramentasquepossamintervir
no mundo, e, imagine-se, começamos a ficar modernos nos últimos 50 mil anos.
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Não havendo grandes diferenças desde então. Sem o facilitismo da crítica filial, o
meu pai poderia ser 50 mil anos mais velho que eu, e isso não me alteraria muito...
Somosorgânicos,somosconscientesdeteoriaseautênticasvagascósmicas
de informação.
No campo da ingestão, a química preconizada por Robert Boyle, Lavoisier
e outros cientistas experimentais gera uma verdadeira ordem mundial de
relação fortemente comercial entre a indústria química e as populações,
que, discutivelmente, procuram, ou é-lhes imposto pelo sistema, a alquimia
farmacológica para cada problema físico, mental e emocional.
Vivemos no terceiro planeta mais próximo do Sol, com 4,5 mil milhões de
anos (é até relativamente jovem), cientificamente designado por Planeta Azul –
os intelectuais dos últimos séculos adoram ser poetas, e, sim, a poesia conjuga-se
com a ciência. Lar de uma multiplicidade de espécies, incluindo os humanos, é
o único corpo celeste onde é conhecida a existência de vida e de alimento. No
domínio comparativo, somos os seres que melhor inovaram. Ainda que o Lord,
aqueleimponentefila-de-São-Miguel,jáconsigacontrolar-seeentendero“senta”
da Senhora Maria sempre que a vê entrar pelo portão, e, relatam-se também
de forma bem categórica, alguns macacos que conseguem quebrar nozes com
pedras, nós somos mais espertos; sobretudo pela inovação no domínio daquilo
que ingerimos. A comida. A bebida. E, mais recentemente, na Mesopotâmia, até
a alquimia veio invadir o universo do nosso vasto “aparelho alimentar”, onde
a mente joga um papel ativo naquilo que qualquer animal terrestre interpreta
como viver mais forte, mais jovem e saudável, através das melhores ingestões
alimentares possíveis.
Quem nunca criou um prato próprio, uma sobremesa, uma bebida? Bem-
vindos ao baile das verdades! E exista um leitor que reclame para si só o prémio
secreto de quem nunca, jamais, se arriscou a conceber vida gastronómica.
Todos somos mágicos. Todos somos importantes no processo. A ingestão
(ou consumo) torna-nos em figuras centrais. Existem os Compradores, os
Operacionais, e os Conceptuais. Que lugar ou lugares ocupa você? E criamos uma
grande variedade de soluções e problemas que partem do mesmo fenómeno: a
ingestão alimentar.
Conhecidos pelos latinos antigos como o “homem sábio”, somos a última
espécie dos primatas bípedes (mais precisamente, Homo) ainda viva. Sociáveis
desde a primeira célula, física e mentalmente, somos isto que observamos desde
este último quarto de tempo da nossa concepção divina. Sentimos ultimamente
acurvadocrescimentodeformamaisaceleradaedesconhecemosseestamosno
limiar da nossa potencialidade. Em todas as áreas e em todo o tempo da nossa
evolução, o último milénio demarca-se dos demais 199. Os sociólogos apontam
como causa o desenvolvimento da escrita e seus suportes, o que nos permitiu a
capacidade de partilha, global e intemporal, de informação.
E isso, para a nossa mente de abelhas, é mel. Somos vaidosos mentais. No
futuro prevemos telepatias, teletransportes e novos mundos. Os mais prudentes
aconselham-nos a voltarmos a ser naturais e orgânicos, por cautela a novas
9
ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
epidemias ou fenómenos (não controláveis) que advenham do desenvolvimento
imparável e incontrolável da espécie humana. Já apanhámos alguns sustos nesse
domínio. Temos um cérebro grandemente desenvolvido, com acesso de raiz
operacional ao raciocínio abstrato, à linguagem, à introspeção e à resolução de
problemas. Somos sábios e consideramo-nos superiores por isso, gostamos de
influenciaroambienteaonossoredor,procuramossempreexplicarosfenómenos
e somos dotados de capacidade de argumento, imaginação e crença. Somos
ainda os únicos conhecidos a usar o fogo, a vestir-se, a desenvolver ideias, que
depois implementamos de forma produtiva e abrangente, e, mais curiosamente,
independentemente da nossa era ou civilização, temos, comumente na nossa
espécie, o cuidado de separar o espaço para preparar os alimentos, para a
construção de ferramentas e utensílios específicos para a confecção e para a
concepção de protocolos, regras, receitas, modos e até ciências do foro alimentar.
Aalimentaçãotem-nosacompanhadofundamentalmenteporquecadaum
denóstemdecomer.Equemcomepior,émaisdébil.Equemcomemelhorémais
forte e saudável. 
Rui Amaral
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ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
PROF. DR. ARMANDO ALMEIDA
Médico veterinário reformado.
Foi Director da Estação Nacional de Avicultura e Cunicultura,
Professor Coordenador da Escola  Superior  Agrária de Coimbra
(Nutrição Animal, Avicultura, Cunicultura).
SAÚDE NO SÉCULO XXI
uma revolução na alimentação impõe-se
Estamos já no início do século XXI e, como é do conhecimento geral, o
presenteséculoterádepagara“fatura”doserrosdopassadoséc.XX,overdadeiro
século da revolução industrial e sua mundialização. De facto, o século XX, que,
mercê dos avanços científicos e tecnológicos, mudou por completo a história
da Humanidade em todos os campos do saber, contribuiu como jamais algum
outro para o conforto do homem, no sentido mais lato do termo. Foi também
o século que, entre outros factos, criou graves problemas, como o aquecimento
global e a poluição (terra, ar, águas), e no qual ocorreu o maior desenvolvimento
demográficodahistória,que,diretaeindiretamente,acelerouodesenvolvimento
dos mesmos problemas. O aumento da população – de cerca de mil milhões no
início do século XIX, para dois mil milhões na segunda década século XX, e
para os atuais seis mil e setecentos milhões – só foi possível com o aumento da
produção de alimentos, para suprir uma necessidade vital tantas vezes ignorada
e menosprezada por parte da maioria dos cidadãos, nomeadamente a dos países
industrializados de civilização ocidental.
Defacto,aesmagadoramaioriadoscidadãosraramentepensanosalimentos
no sentido “estrito do termo”, quando muito pensará na alimentação “quando a
fome aperta”. Com a evolução científica e tecnológica, a alimentação é cada vez
mais motivo de conversa, uma vez que há uma consciencialização da existência
de uma associação da dieta alimentar, com a saúde e o bem-estar. Hoje em dia
cerca de setenta a oitenta por cento (68%) da população dos países ocidentais
e industrializados habita nos centros urbanos, quando, há cem anos, a mesma
percentagem vivia nas zonas rurais.
A revolução industrial dos séculos XVIII e XIX trouxe, entre outros
acontecimentos, não só o crescimento populacional dos centros urbanos e
industriais, mas também uma diminuição de área agrícola, consequência do
alargamento daqueles centros e respetivas infraestruturas. Esta diminuição da
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área agrícola para a produção de alimentos naturais teve de ser compensada por
uma maior produção e eficiência dos sectores vegetal e animal da agricultura.
Agricultura intensiva – industrial e aquicultura
Um novo modelo de produção agrícola, denominado modelo intensivo –
intensivoindustrial–,frutodaciênciaetecnologia,foiimplementadoe,naprática,
expandiu-se após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Constatou-se que, em
apenasduasatrêsdécadas,aprodutividadetraduzidapeloaumentodeprodução
por unidade de superfície e tempo, bem como pela sua eficácia económica,
ultrapassou todas as expectativas, contrariando as más previsões malthusianas
do século XIX, ou seja: o aumento em progressão geométrica da população era
incompatível com o aumento em progressão aritmética dos alimentos, e daí
a fome. O aumento da produtividade deveu-se não só à genética (seleção de
raças, estirpes) mas também a fatores extragenéticos (environment dos anglo
saxónicos) – como uma nutrição correta (vegetal e animal) e um controlo das
patologiastípicasdegrandesconcentraçõeseefetivos–,edaí,infelizmente,entre
outras práticas, à necessidade da introdução de substâncias químicas sintéticas –
como fertilizantes, pesticidas, antibióticos, hormonas e antiparasitários, que são
praticamente essenciais ao equilíbrio do binómio“performance - sanidade”.
O modelo intensivo de produção agrícola (vegetal e animal) é
periodicamente comentado nos meios de informação pelas suas consequências
nefastas para o ambiente e a saúde. Lembram-se das vacas loucas, das dioxinas
nos ovos e nos frangos e dos nitrofuranos na carne dos perus? Infelizmente a
memória do povo é curta… Já na década de 60, e mais intensamente a partir
de 80, problemas associados à intensificação da agricultura (vegetal e animal)
começaram a fazer sentir-se com repercussões para o ambiente dos países mais
desenvolvidosecomreflexosnasaúdepública.Assimnãofoiapenasporacasoque
váriospaísesindustrializadoseavançadosjápossuíamproduçõeseregulamentos
próprios para a produção de alimentos biológicos anteriores ao Regulamento
(CEE) Nº2092/91 e ao Regulamento (CEE) Nºl804/1999 (regulamentos da década
de 90, relativos ao modo de produção biológico de alimentos vegetais e animais).
Pode-se dizer, grosso modo, que no século XIX, e anteriores, toda a produção de
alimentos pela agricultura clássica (vegetal e animal) era do tipo“biológico”(sem
fertilizantes químicos sintéticos e pesticidas).
Nas décadas recentes o grande crescimento e desenvolvimento da
criação industrial de peixes para consumo (aquicultura) surge como forma de
compensar a menor oferta das espécies “selvagens”, que, entre outros factos, se
deveu ao excesso de captura, à poluição das águas, e à diminuição da capacidade
reprodutiva.
Presentemente, a oferta de certas espécies (como a truta, a dourada, o
robalo e o salmão) a preços relativamente baixos para a maioria da população
é uma forma de compensar a qualidade, que não se limita ao gosto, facto só
compreensível por desconhecimento devido à falta de informação.
Os problemas básicos da aquicultura são semelhantes aos da produção
13
ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
animalintensiva:comooexcedentedequilogramasporunidadeespaço(volume
de água no pescado), traduzida por poluição (excesso de dejetos, por exemplo),
e, naturalmente, a presença de anti-infeciosos e químicos sintéticos com
finalidades das mais variadas, como corantes na carne do salmão. Na aquicultura,
a alimentação é feita à base de rações, cujos componentes (alimentos e produtos
incorporados) não são consumidos pelos homólogos ”selvagens” e, como
consequência, repercutem-se na sua carne (somos aquilo que comemos).
Nocasodosalmãodaaquicultura,aspessoaspensam,porexemplo,queasua
carne é rica em ácidos gordos poli saturados ómega 3, e, como tal, recomendável
e saudável, quando na realidade, é rica em ácido araquidónico (ácido gordo poli
saturado ómega 6, produzido no organismo do peixe a partir dos ácidos gordos
poli saturados alimentares e percursor de mensageiros inflamatórios), cujo
consumocontribuiparaumexcessodeproduçãodemensageirosinflamatóriosno
organismo humano (matéria de conhecimento relativamente recente no âmbito
da imunologia), para não mencionar a cor da carne avermelhada, que se deve à
incorporação de químicos sintéticos. Ao contrário do que a maioria das pessoas
pensa, estamos ainda nos primórdios do conhecimento científico em biologia
peloquenãonosdevemosadmirardasfrequentescontradições,frutoemgrande
parte dos avanços tecnológicos, bem assim das enormes fontes de informação.
A agricultura intensiva industrial (vegetal e animal) e a aquicultura
são atividades económicas assentes em empresas de produção de alimentos
naturais, que permitiram o desenvolvimento demográfico e o combate à fome,
nomeadamente pela oferta de alimentos a preços acessíveis à esmagadora
maioria das populações. Têm, todavia, a sua parte negativa, quando encarada
como fonte de ”produtos tóxicos” que, em certas circunstâncias, causam
problemas na saúde pública, direta (vacas loucas, doenças inflamatórias crónicas,
intoxicações alimentares, antibio-resistência) ou indiretamente, a poluição do
ambiente. Hoje em dia, são poucas as dúvidas sobre a necessidade de alterar os
modelos de produção de alimentos naturais dominantes nas últimas décadas,
mas as consequências socioeconómicas são de tal natureza que a maioria dos
responsáveis prefere não pensar, e só com situações como as de muitas “vacas
loucas”, talvez, passem ou comecem a pensar em soluções alternativas, que de
facto existem.
Indústria alimentar
Ao longo do séc. XX, com decalages entre países industrializados, o
desenvolvimento e crescimento da indústria alimentar é um facto, e a sua
participação na oferta de alimentos às populações é cada vez maior. A indústria
alimentar utiliza como matéria-prima de base alimentos naturais que, ao serem
transformados/processadospelaindustrialização,originamumprodutofinalque
na maioria das vezes nada tem a ver com o produto inicial, não só do ponto de
vista físico (basta apenas um olhar atento às prateleiras dos supermercados), mas
também do ponto de vista nutricional.
Atualmente a alimentação das populações dos países industrializados é,
14
na grande maioria, o somatório dos alimentos naturais da agricultura e pescas
produzidos pelo modelo intensivo e aquicultura, bem como os transformados
pela indústria alimentar. Embora alguns dos alimentos transformados, como o
clássico e secular pão, cujo elevado consumo é uma realidade para a maioria dos
cidadãos, derivado em parte do seu baixo preço relativo, sejam genericamente
aceites também como alimento bom e saudável, a verdade é que, à luz dos novos
conhecimentos no campo nutricional, o assunto é altamente discutível. De facto,
opãodasúltimasdécadasemnadaseassemelhaaopãodosnossosantepassados,
que era fabricado com cereais completos/integrais não contaminados com
químicos do ambiente, pesticidas, e fungicidas, e moídos (maior tempo de
digestão, absorção) e daí nutricionalmente superior e menos”tóxico”. De facto, a
partir dos cereais triturados pelas novas máquinas de elevada eficiência obtêm-
se, como produto final, uma farinha de estrutura semelhante ao “pó”, e, como
tal, de rápida digestão. Quando há refinação, como é frequente, a farinha obtida
é branca pela eliminação do tegumento (casca) e do gérmen, dois constituintes
estruturais e básicos em termos nutricionais (fibras, proteínas, vitaminas,
minerais, fitoquímicos). As farinhas brancas, com fins múltiplos na gastronomia,
ficam reduzidas praticamente ao “amido”, que, apesar de ser um hidrato de
carbono complexo do ponto de vista químico (múltiplas moléculas de glicose),
passa a comportar-se fisiologicamente como um hidrato de carbono simples,
(vulgar açúcar, glicose, frutose), sendo, como tal, rapidamente digerido e
absorvido, originando níveis elevados de açúcar no sangue (picos de glicemia).
Como é sabido, a utilização de alimentos transformados e industrializados
na alimentação é norma, nomeadamente aqueles que têm por base cereais
refinados. O seu elevado e frequente consumo origina picos de glicemia e
“descargas”respetivas de insulina (hormona pancreática de controlo da glicose),
comreflexosmetabólicosenormes,predispondoaodesenvolvimentodedoenças
inflamatórias crónicas do foro da medicina interna. É neste contexto que surge o
índice de glicemia (I.G), um índice técnico utilizado para averiguar a influência
do consumo de um alimento na taxa de açúcar no sangue (glicemia), cujo padrão
de referência é a glicose, e ao qual foi atribuído o índice 100. Variando de 0 a
100, considera-se que um índice superior a 70 é elevado, inferior a 50 é baixo, e
entre os dois é moderado. Um outro índice associado ao IG é a carga glicémica
(CG), que relaciona o IG com a quantidade de hidratos de carbono presentes
no alimento, sendo o preferido por certos nutricionistas e médicos, uma vez
que não é só o tipo do hidrato de carbono que é importante, mas também a sua
quantidade. A existência atual de largas centenas de alimentos industrializados,
em que a presença de hidratos de carbono é frequente, torna o conhecimento
do IG e da CG de um alimento quase uma“obrigação”, muito embora raramente
ou nunca esteja presente nos rótulos. Todavia é bom realçar que o índice de
glicemia dos alimentos não deve ser usado isoladamente, havendo vários fatores
que contribuem para o alterar, começando pelo consumo em que raramente os
alimentos são consumidos isoladamente (problema da interação dos alimentos e
tipos de nutrientes), e como tal, para certas situações clínicas, o aconselhamento
15
ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
de especialistas é fundamental. O frequente e elevado consumo de alimentos de
elevado índice de glicémia que originam “descargas” frequentes e elevadas de
insulina para o sangue criam situações de hiperinsulinémia, que podem levar
à insulina resistência (as células deixam de ser sensíveis à insulina, no sentido
de não permitirem a entrada da glicose e daí uma acumulação da glicose no
sangue, predispondo à pré-diabetes e diabetes). Segundo a opinião de certos
investigadores, a Insulina Resistência (Síndroma metabólico, Sindroma X) é e será
umdosproblemasdesaúdepúblicadoséculoXXIpelasuaassociaçãoàsdoenças
crónicas do foro da medicina interna, nomeadamente a diabetes II, obesidade, e
um cortejo de situações clínicas indesejáveis.
Infelizmente a Insulina Resistência (Síndroma X ou Metabólico) é ainda
um termo pouco conhecido do grande público, que continua obcecado pela
“psicose” do colesterol devido à sua associação às patologias cardiovasculares
(aterosclerose, AVC...), primeira causa de mortalidade nas décadas recentes nos
paísesindustrializados(sobretudonosE.U.A.).Recentementeestesfactoscomeçam
a ser contestados pela investigação, uma vez que já se começa a conhecer melhor
a etiopatogenia da aterosclerose, começando pela constatação de que cerca de
50% dos enfartes do miocárdio ocorrem em pessoas com níveis de colesterol
aceites como “normais”. Neste caso o nível de uma substância, a homocisteína
(aminoácidopresentenosangue),parecesermaiscredívelcomofatorderisco,ou
mesmodeumcertotipodeLDL(maucolesterol),nomeadamenteodaspartículas
mais pequenas, para não falar da necessidade da presença prévia de uma
inflamação, factor cada vez mais aceite como o principal factor determinante da
doença coronária do coração confirmado pelo teste de Proteína C Reativa de alta
sensibilidade. Isto, contudo, em nada invalida a tomada de precaução em relação
à colesterolémia (taxa do colesterol e seu tipo no sangue), cuja interpretação
cabe aos verdadeiros especialistas, uma vez que já se sabe que a participação do
colesterol alimentar no desenvolvimento das patologias cardíacas é pequena, e
que70a75%docolesterolpresentenosangueéfabricadopelopróprioorganismo
para cobrir as suas necessidades, nomeadamente para a produção da vitamina
D, hormonas sexuais (masculinas e femininas), e hormonas corticoesteróides
(cortisona,porexemplo).Cadavezmaissepensaqueocolesterolétãoresponsável
pelas doenças do coração, ou a causa das mesmas, como os cabelos brancos são
responsáveis pelo envelhecimento, ou a causa do mesmo.
Um outro grupo de alimentos da civilização industrial é constituido pelos
óleos vegetais (girassol, soja, sésamo, milho), todos ricos em ácidos gordos poli
saturados ómega 6, cujo excesso de utilização e consumo os torna tóxicos para o
organismo, como adiante se verá. As margarinas, tidas como gorduras vegetais
saudáveis, e que resultam da solidificação das gorduras vegetais líquidas, foram
quimicamente transformadas por hidrogenação em gordura semi-sólida para se
assemelharem à manteiga. A hidrogenação, mesmo parcial, permite aumentar
o período de conservação, evitando o ranço. São as célebres e malfadadas
gorduras “trans”. Todas essas novas gorduras sintéticas são metabolicamente
desconhecidas pelo organismo, e, portanto, prejudiciais à saúde, havendo cada
16
vez mais investigadores que as consideram grandes fatores de risco para as
doenças cardíacas.
Umoutroproblemaassociadoàindustrializaçãodosprodutosalimentares
está na adição do sal em excesso, quer para preservação dos produtos, quer
puramente para efeitos gastronómicos. O mau hábito de consumo de excesso de
sal é um problema educacional de base que se manifesta na maioria das pessoas
em problemas de hipertensão sanguínea e respetivas complicações no foro
cardiovascular, muito embora o assunto da hipertensão por excesso de sal, para
certos investigadores, seja discutível.
A imensidade de novos produtos alimentares no campo da pastelaria e
confeitaria,praticamentetodosàbasedefarinhas(hidratosdecarbonocomplexos
de cereais refinados), aos quais se adicionam açúcares, gorduras transformadas,
aditivos químicos dos mais diversos (os célebre E- dos rótulos das embalagens,
que visam praticamente manipular as características do produto alimentar
pela cor, sabor, durabilidade com vista a promover e aumentar as vendas
legalmente), e que globalmente são caracterizados pela sua elevada densidade
calórica (hipercalóricos), é motivo de alta preocupação pelo impacto negativo
que estes produtos têm na saúde. Estes acabam por contribuir não só para toda a
problemática associada ao excesso de peso por gordura (diabetes II com todas as
consequências), mas também, a médio e longo prazo, para outros problemas de
saúde do foro da medicina interna, que por ora se desconhecem.
Outroramoalimentaremcrescimentoexponencialétambémocampodas
bebidasadoçadasporaçúcaresnaturaisesintéticosque,nofundosãoconstituídos
por água adoçada acrescida de um ou mais produtos para justificar o nome.
Todas elas são de elevada apetência, e o seu marketing é de uma imaginação
impressionante, só justificado pela margem de lucro. Esses produtos alimentares
de fácil acesso, baixo preço e com larga clientela, as crianças principalmente,
são presentemente dos maiores responsáveis pelas patologias associadas ao
excesso de peso (obesidade), e diabetes II, deste grupo etário. As“bebidas doces”
são, no fundo, uma fonte de calorias ”vazias” (alimentos praticamente sem
micronutrientes como vitaminas, e minerais): não saciam, mas contribuem para
um aumento de consumo de calorias. Muito recentemente já se especula, com
alguma base científica, que os doces provocam uma viciação (efeito de droga),
sendo como tal explorada pela indústria alimentar.
O ramo alimentar de produtos processados e industrializados, como o das
carnesepeixes,pecanormalmenteporexcessodesal,aditivos(comoéocasodos
conservantes), e por tratamentos com altas temperaturas.
Os organismos geneticamente modificados (OGM), como o milho e a soja
transgénicos,sãoconquistasrelativamenterecentes,cujofuturonaalimentaçãose
auguracomplicado,umavezquetemsidoaltamentediscutidaasuaproblemática
no campo da toxicologia alimentar. Há estudos recentes que demostram que são
umperigoparaasaúde.Presentementeumapercentagemmuitíssimoelevadade
milho e soja são OGM e estão presentes em um sem fim de alimentos, e, como tal,
nos pratos do nosso dia-a-dia.
17
ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
Evolução da dieta alimentar ao longo dos tempos
O homem atual é, em termos genéticos (99,9%), praticamente idêntico
ao Homem primitivo (caçador e recolector) e, como tal, a sua fisiologia,
nomeadamente o seu metabolismo, é a mesma.
O homem primitivo, caçador e recolector de alimentos, alimentava-se,
comoomnívoro,deprodutosanimais(carnedecaça,pescado,ovos)edeprodutos
vegetais (folhas, raízes, frutas da estação). Há cerca de dez mil anos, quando
começou a dedicar-se à agricultura (revolução agrária), com o“cultivo de plantas
e domesticação de animais”, iniciou o consumo de novos produtos comestíveis,
como cereais, leguminosas e leite de outras espécies animais, possivelmente
desconhecidos ou raramente consumidos até então.Tratou-se possivelmente da
primeira grande revolução alimentar: dieta agrária. Os cereais e as leguminosas
passaram a ser alimentos básicos e, mesmo presentemente, para a maioria dos
médicosenutricionistas,sãoconsideradosalimentosdeelevadovalornutricional,
nomeadamentequandocompletos/integrais(boafontedeenergia,proteína,fibra,
vitaminas minerais, fitoquímicos), ao contrário da opinião dos investigadores da
relativamenterecenteescoladadietapaleolítica,quedefendemqueosalimentos
a consumir deverão estar de acordo com as características programadas no ADN
ou do genoma de origem do homem primitivo e como tal esses alimentos não
estariam incluídos.
Assim,nãoseráporpuracoincidênciaque,atualmente,muitomaispessoas
do que se pensa são “sensíveis ou intolerantes” ao “glúten”, tipo de proteína
resultante da associação de duas outras proteínas (gliadina e glutenina) presente
noscereais(trigo,aveia,cevada…),edaí,possivelmente,ajustificaçãodapresença
nos rótulos das embalagens de certos produtos alimentares da designação
“ausênciadeglúten”parapessoascomdoençacelíaca(doençaalérgicatraduzida
por uma má absorção de nutrientes por lesão ao nível do intestino delgado com
todasassuasconsequências).Hácientistasqueacreditamqueoglútendoscereais
afeta a saúde das pessoas, mesmo sem sintomas típicos da doença celíaca. Uma
outra família de proteínas dos cereais e leguminosas, as lectinas, podem também
afetarnegativamenteosintestinos,lesandoasvilosidadesintestinais,interferindo
na reabsorção de nutrientes e funcionando como anti nutrientes. A possível
participação na artrite reumatoide e em certas doenças auto imunes torna ainda
mais complexa a problemática do consumo dos cereais e leguminosas, que são
genericamente aceites como alimentos de excelência, nomeadamente o cereal
trigo, quando integral. Uma outra substância que está presente em quantidades
elevadas nos cereais e leguminosas é o ácido fítico que “adere” aos minerais, ao
cálcio, ao ferro, ao zinco e ao magnésio presentes nas sementes, tornando-os não
absorvíveis. Como se depreende, a matéria é altamente complexa e discutível,
mas o facto é que existe.
No campo do leite, o problema não será muito diferente. O leite materno
é o melhor e único alimento completo para bebés nos primeiros meses de vida,
e o não aproveitamento desse dom da natureza paga-se caro. A frequência da
amamentação é mínima (escassos dias) devido aos mais variados motivos,
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destacando-se a má informação. É de lamentar! O marketing feito nos últimos
anosàvoltadoleitecomoalimentodeexcelênciaparaaprevençãodaosteoporose
(doença associada à falta de cálcio nos ossos predispondo a fraturas) é lastimável.
Acontece que o homem é o único mamífero que consome leite depois de
desmamado, e nos animais – como a vaca, o hipopótamo, o elefante, enfim, todos
mamíferos, mas herbívoros – os ossos suportam centenas e milhares de quilos.
Curiosamente, países com maior ingestão de cálcio de origem láctea tendem
a ter mais, não menos, fraturas da anca (E.U.A, Nova Zelândia, Suécia, entre
outros). E mais comentários poderiam ser feitos sobre a matéria. A intolerância à
lactosedoleiteéumproblemaqueafetacercade70a75%dapopulaçãomundial
principalmente a de origem asiática e africana, que é incapaz de digerir o leite
por carência do enzima digestivo láctase, que, fisiologicamente, após o desmame
ou pouco depois deixa de ser fabricado pelo organismo. O facto de o leite e os
lacticínios serem produtos agradáveis e aceites como bons alimentos para muitas
pessoas, nomeadamente para aqueles que o toleram, é uma coisa, o facto de o
seu consumo dever ser incrementado como preventivo da osteoporose já é
outra coisa. A produção de leite de vaca é, nas últimas décadas, uma atividade
empresarial da agricultura, assente basicamente no modelo de produção
intensivo-industrial e, como tal, está inserida numa economia de mercado. O leite
que se bebe é uma mistura de largos milhares de litros de explorações diversas
e sabe-se que a presença de anti-infeciosos (antibióticos para tratamento de
infeções das glândulas mamárias) é frequente. Isto para não se falar da hormona
de crescimento utilizada como estimulante de uma maior produção, como se
depreende da leitura nas embalagens de certas marcas nos E.U.A.:“este leite não
contém hormona de crescimento”.
Nocampodascarnesoproblematambémécomplexo.Acarnedeoutroraera
basicamenteprovenientedeanimaisdepastoreio–poucogordamasequilibrada
em ácidos gordos poli saturados ómega 6 e 3 –, apresentando uma ausência de
substâncias tóxicas de origem ambiental. Nas décadas recentes, a integração
das empresas agrícolas na economia de mercado“obrigou”a que a produção de
carnes,porexemploadebovino,sejafeitapelomododeproduçãointensivo.Neste
tipo de produção uma boa parte da engorda é na maioria das vezes feita contra
natura, isto é: os animais estão confinados, e são alimentados frequentemente
com rações à base do cereal milho e subprodutos da industrialização (bagaços
de soja) – alimentos não consumidos pelos seus homólogos “selvagens” e cada
vez mais de origem transgénica e sob a influência de hormonas anabolizantes,
sintéticas ou não, antibióticos, entre outros. Como consequência, o teor em
gordura, nomeadamente a saturada das carnes da produção animal intensiva, é
muito superior ao das carnes de animais de pastoreio, apresentando assim uma
percentagemmuitomaiselevadadeácidogordosómega6emrelaçãoaoómega3,
com destaque para o ácido araquidónico (ácido gordo ómega 6 pró-inflamatório,
fabricado no organismo animal a partir de ómega 6 alimentar), e a muito provável
presença de hormonas anabolizantes, anti-infeciosos. O ácido alfa-linolénico,
(molécula“mãe”dafamíliadosácidosgordosómega3,presentenasfolhasverdes,
19
ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
nas nozes, na pera abacate, nos peixes gordos) e o ácido linoleico (molécula ”mãe”
dafamíliadosácidosgordosómega6,presentesnopasto,milho,soja,amendoime
respetivosóleos),sãoácidosgordosessenciaisqueoorganismonãoécapazdeos
fabricar, e uma das suas funções é a de constituírem respetivamente as matérias-
primas de construção de substâncias anti-inflamatórias e pró-inflamatórias do
organismo.
O forte desequilíbrio daqueles ácidos gordos poli saturados nas dietas
alimentares atuais (os ácidos gordos ómegas 6 chegam a ser dez a vinte vezes
superioresaosácidosgordosómega3,quandonãodeveriamexcederpossivelmente
duas a três vezes) é aceite como um dos grandes responsáveis pelas doenças
inflamatórias crónicas do foro da medicina interna das últimas décadas, sendo o
ácido araquidónico (A.A) o precursor de mensageiros inflamatórios (leucotrieno
B4, prostaglandina E2). Por outro lado, os ácidos gordos polinsaturados DHA
(ácido dodosahexanóico) e EPA (ácido eicosapentanóico), da família dos ácidos
gordosómega3,comportam-se,noorganismo,comoprecursoresdemensageiros
anti-inflamatórios (como a prostaglandina E3, o leucotrieno B5, as resolvinas,
e as protectinas). Também se sabe que as células gordas do tecido adiposo,
nomeadamente as da região abdominal, são muito ativas e não simples locais de
depósito e armazenamento de gorduras, desempenhando um papel importante
no fabrico de mensageiros inflamatórios como a interleucina 6, que é uma das
mais potentes moléculas inflamatórias.
É neste contexto de novos e recentes conhecimentos que se verifica o
estímulo ao consumo de peixes gordos de águas frias (sardinhas, salmão) e de
suplementos alimentares à base de ácidos gordos ómega 3, nomeadamente o
EPA e DHA presentes nos óleos de peixe e no krill (invertebrados semelhantes
ao camarão). Uma das suas grandes funções é atuarem como precursores de
mensageiros anti-inflamatórios no organismo, contrariando o papel inflamatório
dos ómegas 6 em excesso nas dietas atuais.
Hoje em dia o excesso de peso por gordura é frequente e certos estudos
clínicoseepidemiológicostêmvindoademonstraraexistênciadeumacorrelação
entre o grau de adiposidade, a saúde e bem-estar.
O índice de massa corporal (o quociente entre o peso em quilos e a altura
em metros ao quadrado) é um índice técnico frequentemente utilizado na prática
para averiguar esse grau. Há tabelas que permitem avaliar o I.M.C., considerando
valores inferiores a 18.5 (baixo peso), de 18.5 a 24.9 (peso correto/normal), de 25 a
29.9 (peso a mais/pré-obeso), e superiores a 30 (obeso, com diversos graus I,II,III).
Todavia, esse índice não se aplica, quando o excesso de peso se deve a elevada
massa muscular, como é o caso de certos atletas. Também a medição da cintura
(perímetro abdominal) pode dar uma ideia do grau de adiposidade (as mulheres
com cintura superior a 87.5 cm e os homens com cintura superior a 100 cm são
considerados obesos). As doenças crónicas do foro da medicina interna (mais
de cem), presentemente as predominantes no mundo ocidental industrializado,
constituemapreocupaçãomáximadasautoridadesdesaúdeporsedesconhecer
a sua verdadeira etiopatogenia, daí a terapêutica ser puramente sintomática.
20
Do pouco que se conhece, sabe-se que todas elas, embora aparentemente
não relacionadas, como a rinite alérgica e não alérgica, a asma, as doenças
cardiovasculares, as artrites (osteoartrite, artrite reumatoide), e a obesidade, têm
umdenominadorcomum:ainflamação.Ainflamaçãoéumcomplexomecanismo
de defesa e de reparação inato contra todo o tipo de agressão a cargo do sistema
imunitário. A inflamação aguda, que toda a gente conhece, manifestada por
sintomas(edema,rubor,caloredor),éomecanismoinatoeprimitivoquepermitiu
a sobrevivência do homem até aos nossos dias, quando as agressões microbianas
eram as principais causas de mortalidade. Com a evolução e presentemente
com a imensidade de novos agentes «agressores», nomeadamente as de ordem
química, houve possivelmente uma adaptação de defesa por parte do sistema
imunitário em que a inflamação continua a ter o seu papel com a diferença de
ser provocada por agressões excessivas e frequentes e não se apresentar com os
clássicossintomas,nomeadamentepelaausênciadedor,passandodespercebida
(inflamação silenciosa) e daí o perigo. A inflamação silenciosa pode levar anos a
manifestar-se através de uma doença crónica (aterosclerose, lúpus, acne, alergia,
asma, entre outras) cujos sintomas são em função da região do corpo afetada.
As inflamações são reguladas bioquimicamente por substâncias conhecidas
por eicosanóides (ácidos gordos polinsaturados de longa cadeia fabricados no
organismo a partir de outros ácidos gordos, ómega 6 e ómega 3, nomeadamente
A.A. e EPA.) e que funcionam como as clássicas hormonas. A relação daqueles
ácidos (A.A. / EPA.) é utilizada por certos investigadores para determinar o grau
de inflamação silenciosa e respetivos riscos, ou o teste de Proteína C Reativa.
Presentemente também se sabe que o nível de glicose e a insulina no sangue
interagemcomaproduçãodosácidosgordospolinsaturadosnoorganismo,como
o A.A. (pro-inflamatório), influenciando o desenvolvimento da inflamação.
Enfim, paradoxo dos paradoxos: havendo desde há escassas décadas, no
mundo ocidental industrializado, uma abundância e variedade de alimentos de
fácil acesso aos consumidores, o principal problema da saúde pública deriva
do consumo exagerado e frequente de certos produtos alimentares, quer os
transformadospelaindustrialização,(espéciedealimentosoupseudo-alimentos)
quer os naturais da agricultura intensiva e da aquicultura. De facto, uma segunda
revolução alimentar, a dieta industrial, teve lugar ao longo do século XX, mais
intensamenteapartirdasegundametade.Ohomempassouaconsumiralimentos
caracterizados basicamente por fatores como: elevado índice de glicémia, forte
concentração energética (hipercalóricos), elevada percentagem de gordura
“trans”, forte desequilíbrio nos tipos de gorduras (ácidos gordos polinsaturados
ómega 6 e ómega 3), um muito menor nível de fibras, de micronutrientes
(vitaminas, minerais) e fitoquímicos contra o que era habitual. Ou, por outras
palavras: nutricionalmente inferiores e metabolicamente inadaptados à sua
genética(ADN)comasdevidasconsequênciasnefastasparaasaúde,comoexplicaa
NutriçãoGenómicaeciênciasafins(nutrigenética,epigenética),ciênciasrecentes,
queestudama“expressão”dosgenesresultantedainteraçãodosmesmoscomos
fatoresextragenéticos/exposoma(qualidadedosalimentos,estilodevida,stresse).
21
ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
Nesta perspetiva, o alimento deixa de ser não apenas uma fonte de energia mas
também uma fonte de“informação”para os genes, permitindo a sua“expressão”.
A interação entre o genoma (ADN), a nutrição (dieta alimentar) e a saúde será um
dospilaresdamedicinadofuturo.Nãoépormeracoincidênciaqueoaumentoem
espiral das doenças crónicas ocorre com a mudança do regime alimentar, como
sucedeu, com maior incidência, a partir da segunda metade do passado século
XX. Estudos clínicos e epidemiológicos comprovam tal facto, muito embora ainda
não se saiba explicar em rigor a verdadeira etiopatogenia das diversas doenças
crónicas,emqueoexcessodepesoporgorduraeaobesidadeparecemseroponto
central. Sempre houve pessoas gordas e obesas, mas o seu número era ínfimo, ao
contrário do que presentemente parece ser norma, como nos E.U.A.. Na U.E., em
certospaíses,tambémjácomeçaaserumproblema,inclusiveemPortugal,anível
das crianças, por excesso de consumo de produtos à base de hidratos de carbono
refinados e açucarados e bebidas adoçadas (refrigerantes).
Da mesma forma como existem mecanismos fisiológicos inatos para
o controlo de certos padrões de normalidade (como a temperatura corporal,
a glicemia e o balanço hídrico), essenciais à manutenção da constância do
meio interno (homeostasia), deverá haver, segundo certos investigadores,
um mecanismo para o controlo da energia armazenada (gordura corporal).
A descoberta de substâncias como a leptina e a adiponectina, atuando como
hormonas ao nível do sistema nervoso central nos centros de saciedade e apetite
do hipotálamo e funcionando em sistema de feedback, parece comprovar tal
hipótese. A gordura corporal (armazenamento de energia) no homem primitivo
pode ser interpretada como um mecanismo de sobrevivência contra a escassez
periódica de alimentos e de calorias, sendo o seu controlo, presentemente, cada
vez mais imperfeito e complexo, devido basicamente à abundância de oferta de
alimentos (naturais de agricultura intensiva, aquicultura e os transformados pela
industrialização) e ao excesso de sedentarismo.
Estamos em crer que, quando os fatores “agressores” são excessivos e
frequentes, contrariando uma resposta fisiológica do organismo tendo em vista a
homeostasia, as células deixam de lhes ser sensíveis, tornando-se resistentes. Da
mesma forma como a utilização excessiva de uma chave pode tornar impossível
a abertura de uma fechadura, também um excesso e frequente consumo de
hidratos de carbono refinados e de açúcares, predispõe à diabetes 2 pela insulina
resistência. Como tal não será descabido aceitar que um excesso e frequente
consumo de calorias deveria predispor à obesidade pela saciedade resistência.
Situaçõesclínicascomodiabetes2eobesidade,queeraminexistentesnohomem
primitivo, devem-se basicamente às diferenças na dieta alimentar e ao modelo de
vida (sedentarismo, stresse frequente e excessivo) do homem atual.
O séc. XXI será, portanto, um século complicadíssimo em termos de saúde
pública, em que as doenças crónicas do foro de medicina interna terão de ser
rapidamente combatidas, uma vez que as principais causas de morbilidade e
mortalidade de outrora (doenças infeciosas, infecto-contagiosas e parasitárias)
foramousãopraticamentecontroladaspelosavançosnocampodaprevençãoda
22
medicina profilática (profilaxia higiénica, médica e sanitária) e terapêutica (anti-
infeciosos, antiparasitários).
O que comer
Apósestasconsiderações,emboramuitogenéricas,ocidadãoconsumidor
fará naturalmente a seguinte pergunta: o que comer? É uma pergunta
aparentemente descabida, pelo menos no mundo ocidental atual em que há
superabundância e variedade de produtos comestíveis, muitos dos quais (como
os transformados/processados) os nossos antepassados não distantes jamais
denominariam alimentos.
De facto, se possivelmente há cerca de dez mil anos ocorreu a primeira
revolução alimentar com o consumo de novos alimentos naturais e completos
(verdadeiros alimentos), foi no séc. XX, e mais concretamente a partir da segunda
metade (1950), que ocorreu a verdadeira e grande revolução alimentar (dieta
industrial),passandoohomemaconsumirprodutoscomestíveis,nomeadamente
os transformados/processados cujas características são metabolicamente
desconhecidaspeloorganismooumelhor,donossogenoma(ADN),comtodasas
consequências negativas para a saúde e o bem-estar.
Apesar das diferenças económicas entre os diversos países, a maioria dos
produtoscomestíveissãoescolhidospelosconsumidoresbasicamenteemfunção
da segurança sanitária, do gosto, do preço, e, naturalmente, do grau educacional
e do modelo de vida, não lhes passando pela mente que a sua dieta alimentar
possa ter alguma relação com o crescimento em espiral, nas últimas décadas, das
doenças inflamatórias crónicas, que no nosso entender, se deve à longa“lavagem
do cérebro”que todos sofremos sem darmos por isso, aceitando como“normal”,
os componentes alimentares da dieta industrial de há décadas. O homem atual
continua, em termos genéticos e fisiológicos, praticamente idêntico ao homem
primitivo (caçador e recolector de alimentos) de pelo menos há cinquenta a
duzentos mil anos (50.000 - 200.000) uma verdade, difícil de “engolir” para a
maioria dos cidadãos.
Antes de mais convinha informar os leitores que tiveram a paciência
de se terem debruçado sobre este artigo de que o seu autor tem como hobby
favorito, dos últimos trinta anos, a nutrição humana, tendo vindo a acompanhar
a sua evolução pela leitura atualizada de livros, escritos de revistas de autores
nacionais e estrangeiros, (médicos, nutricionistas, jornalistas científicos), estes
sendo maioitariamente americanos, cujas obras premiadas como bestsellers os
tornam, no seu entender, suficientemente credíveis. Embora tenha constatado
divergênciasentreautoresemalgunsaspetos,frutopossivelmentedanecessidade
de justificar as suas obras ou, entre outros, por certos aspetos nutricionais não
serem claros e pelas dificuldades inerentes à investigação científica no homem
(amostragem, duração da experiência, custos), penso que uma alimentação
saudável, no atual contexto cultural e sócio-económico, deverá assentar, grosso
modo, nas seguintes normas:
consumo mínimo de alimentos transformados/ processados/ /
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ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
industrializados;
menorconsumo,sepossível,dealimentosnaturaisoriundosdaagricultura
intensiva (vegetal e animal) e da aquicultura;
maior consumo de alimentos naturais e completos/integrais, se possível
biológicos, quer vegetais quer animais e pescado selvagem (capturado).
Na minha opinião, bem como na dos especialistas que consultei, uma
alimentaçãosaudável,dependeessencialmentedotipodealimentosconsumidos
(naturais, transformados/industrializados), incluindo o modo de os confecionar,
nãoesquecendo,naturalmente,amoderaçãonoconsumo.Aquantificaçãoexpressa
em unidades de peso ou em percentagens, por exemplo de macronutrientes
(hidratos de carbono, lípidos/gorduras e proteínas) associadas às calorias, é
matéria,sejustificável,paraespecialistasesituaçõespontuais.Ohomemcomeçou
a preocupar-se com as “calorias ” e outros aspetos nutricionais há relativamente
escassas décadas; quer derivado de uma das“doenças crónicas da civilização”do
foro da medicina interna, quer por motivos” estéticos”. A verdade é que, salvo
situaçõespontuais,aesmagadoramaioriadoscidadãosnuncasepreocupoucom
a alimentação no sentido nutricional/médico, do termo. A preocupação estaria
mais na possibilidade de garantir uma refeição para ”matar a fome”, conviver.
O tipo, variedade ou diversidade e moderação do consumo de alimentos
são aspetos fundamentais numa dieta alimentar saudável. A diversidade dos
verdadeiros alimentos, como os provenientes da agricultura e pescas, significa
possibilidade de ingestão de uma gama maior de diferentes nutrientes, uma
vez que, à exceção do leite materno na fase inicial de vida, nenhum alimento é
completo em termos nutricionais. O transporte e meios de conservação, uma das
grandes conquistas do século XX, nomeadamente a rede de frio, são fatores que
possibilitam o consumo de uma grande variedade de alimentos ao longo do ano.
Amoderaçãoéumconceitodesignificadodiscutívelpelasuasubjetividade,
mas compreensível. Todos os excessos originam frequentemente desequilíbrios
nutricionais; de facto, a individualidade biológica (genética) origina a não
existência de dietas alimentares universais e daí o conselho de especialistas para
situações pontuais.
A procura de uma alimentação ou dieta alimentar saudável tem sido,nas
últimas décadas, quase uma obsessão por parte dos governos, instituições, e
investigadores, que, por motivos diversos, não dizem abertamente que é a“dieta
alimentar industrial dos nossos dias” a principal responsável pelo aumento em
espiral das doenças crónicas não transmissíveis do foro da medicina interna,
cujas consequências sócio económicas e na saúde pública são incomensuráveis.
O problema sendo grave desde há décadas, tornou-se gravíssimo nos últimos
anos, pela associação cumulativa da saúde com a crise económica e financeira.
As pirâmides alimentares e as rodas de alimentos surgem como guias de
aconselhamento para uma alimentação saudável de forma a minimizar os
efeitos negativos da dieta industrial. Os alimentos são associados em grupos com
semelhantes propriedades nutricionais e respetivas quantificações – matéria
complexa e mais que discutível. Continuamos a pensar que o modelo alimentar
24
do homem primitivo (caçador e recolector de alimentos) deveria ser ainda uma
fontedeinspiraçãoemerecerumaatençãoespecial,umavezqueháfundamento
científico assente em estudos antropológicos, arqueológicos e clínicos. No
entanto,nummundocomcercadesetemilmilhõesdehabitantes,opragmatismo
terá o seu papel no sentido de olhar para um ideal, respeitando a realidade e, daí,
a complexidade para a sua solução.
O problema atual da saúde pública no campo das doenças crónicas está
em saber até que ponto o homem é capaz de se adaptar à dieta alimentar das
últimas décadas sem o recurso frequente à medicação sintomática e paliativa
como forma de minimizar os seus efeitos negativos na saúde e no bem-estar.
De facto, acreditamos que só com uma nova mutação ou mutações no genoma
humano, do tipo da que possivelmente ocorreu há cerca de nove mil anos, em
relação ao gene para a láctase (enzima digestivo para a lactose do leite), numa
parte da população humana de então, como forma de adaptação ao consumo de
leite na dieta alimentar da revolução agrária, será possível inverter tal situação,
facto que, no nosso entender, é no futuro pouco ou nada provável.
Uma solução possível, mais correta e viável, é proceder a uma revolução
no campo alimentar, começando pela educação (informação), investigação e
implementaçãodeummodeloagrícolasustentado,comoobiológico,apesardos
enormes custos sociais económicos e financeiros pelo menos a curto termo.
Sendo a escolha de alimentos um fator indiscutível para uma dieta
alimentar saudável, é essencial, para não dizer fundamental, combater o
sedentarismo, outro grave problema da vida moderna, uma vez que a influência
deste no metabolismo é elevada, havendo quem pense que a falta de exercício
do homem moderno é tão negativa como a má nutrição. O simples andar, subir
escadas, estar menos tempo sentado, lavar o carro, entre outras actividades, são
atos que todo o cidadão pode realizar diariamente, e a velha desculpa da falta de
tempo não pega, tendo todo cabimento o velho ditado“enganar os outros é fácil
mas enganar-me a mim mesmo…”. A proliferação de ginásios é, dentro de certos
limites, uma consequência e a prova disso.
Conclusão
Tudo leva a crer que, havendo uma correlação de facto entre a dieta
alimentar, cada vez mais globalizada, dos países ricos e industrializados
ocidentais e o desenvolvimento exponencial das doenças crónicas – conforme
opiniãocrescentedeinvestigadores,médicos,enutricionistas–,somosobrigados
a aceitar que estamos perante um grave problema, cuja solução é demasiado
complexa pelas suas implicações no campo socioeconómico e, naturalmente,
político, mas que em nada invalida a necessidade de que algo deva ser feito e
depressa. Temos consciência da existência de um número aceitável de cidadãos
que foram e são periodicamente informados e alertados pelos diversos media
da problemática advinda do consumo de certos alimentos, mas a verdade é que
o problema alimentar é tão grave que deverá merecer um tratamento especial,
25
ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
paranãodizerrevolucionário.Asaúdedoscidadãosultrapassadelongeasopções
políticas associadas ao modelo de desenvolvimento económico, repartição de
riquezas, entre outros, pelo que os mesmos têm o direito de serem, no mínimo,
bem informados para decidirem, independentemente da sua classe social.
Estamos plenamente conscientes de que continuar a colaborar na manutenção
de uma situação real e lesiva para as gerações futuras coloca-nos numa posição
indesejável, daí a razão do presente artigo, que pretende ser, acima de tudo, um
ALERTA.
Professor Doutor Armando Almeida
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DR. LOURENÇO DE CASTRO
Estudou Gestão
Começou por ser professor de Educação Visual
Pertenceu à Direção de Empresas Multinacionais de Retalho
Especializado
Passou pela Direção de Hipermercados
Gosta acima de tudo da VIDA e dos seus detalhes
Fascina-o conhecer e aproximar PESSOAS
Viajens Gastrónomicas
Parágrafos soltos …
Perante o convite de falar sobre alimentação, não fui capaz de recusar.
Escrever será mais difícil, mas tentarei ultrapassar o desafio.
Alimentação para o comum dos Portugueses não é uma necessidade, mas
simumprazer.Abasedoamordeperdiçãopelacomidareside,emprimeirolugar,
na qualidade dos produtos da nossa culinária, desde o peixe de mares fortes, às
carnes de pastos naturais, passando por legumes e frutas com sabores raros –
noutras regiões temos os ingredientes para os prazeres da boa mesa portuguesa.
A boa disposição e o prazer da amena cavaqueira tornam a mesa num
local de culto, a ideia de que “um bom garfo deve comer muito” é um obsoleto
paradigma, onde na sua base a “alimentação é de salutar”. E concordo que
“prolongar as refeições é um erro cultural”.
Como em quase todas as áreas, assistimos a uma falta de preparação para
estetema.Emmuitasoutrasáreaspartimosdoprincípiodequeaspessoasnascem
ensinadas.Ospaisempurramparaaescolaeaescolaempurraparaospaismuitas
matérias que as pessoas são obrigadas a absorver por autodidatismo.
Visitei a Feira de Chocolate, em Paris, e, no meio de tamanha azáfama,
deliciei-me a ver uma aula de introdução ao Chocolate para miúdos de 5 a 8 anos.
Uma professora ensinava as crianças a descobrir o Chocolate.
Numa visita ao Museu Picasso, em Paris, assisti a uma aula para crianças
frente a um dos mais famosos quadros do pintor. A professora, com perguntas
abertas, fazia as crianças descobrirem o quadro.
Estes dois exemplos mostram como se deve fazer descobrir as coisas boas
da vida.
 Ensinar a descobrir a gastronomia na vertente sensorial e na vertente
prática parecem dois eixos onde é importante investir.
Sou uma pessoa aberta a descobrir e experimentar a alimentação de várias
culturas e povos. Enquanto escrevia estes momentos cogitei felizardamente esta
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ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
humilde apreciação. Adapto-me bem e consigo descobrir os sabores e a forma de
confeccionarótimosmanjaresdosDeuses.Adorocozinhar,epartodasdescobertas
que vou fazendo para a minha criatividade.
Hoje em dia assiste-se a muitas tendências na culinária, mas defendo que a
base deva ser a tradicional, pois as raízes não se devem perder.
Voltandoaotema,queéalimentaçãoenãogastronomia.Aalimentaçãoéa
principal base para uma vida saudável. Um regime alimentar que nos traga saúde
e bem-estar é sem dúvida um motivo para ser feliz.
As pessoas que conseguem manter o seu equilíbrio são mais felizes.
Esta sociedade atual, sem tempo e sem espaço para uma alimentação
saudável,leva-nosporcaminhosperigosos,dosquaissónosdamoscontaquando
o corpo manifesta alarmantes sinais.
Nonossomundoosaleoaçúcarsãodoiselementosutilizadosemexcesso,
principais inimigos que nos assombram nos dias festivos, nas reuniões familiares,
no convívio com amigos.
Paraosestudiososdeixoumapergunta:porqueseráqueascoisasquemais
adoramos na alimentação são aquelas de que não devemos abusar?
Este“faz mal”e“não devemos comer”são o grande dilema da alimentação
atual.
Porque da alimentação também fazem parte os líquidos, nesta matéria
também somos bafejados por todas as delícias, desde a água da cerveja ao vinho.
Anecessidadedenoseducarmosparabeberemquantidadecertaesabersaborear
tudo o que a bebida tem é um desafio, devendo ser conseguido um equilíbrio.
Gostaria de ter tempo para desenvolver alguns destes tópicos, trabalhar
mais na arquitetura do texto, mas infelizmente o tempo é escasso.
A última conferência que ouvi de José Saramago foi na Universidade de
Arquitetura de Lisboa, a convite do meu amigo José Manuel Castanheira.
Na conferência do José, ele falava de uma “Edite Piaff”, vestida de preto
e sem mais adornos. Perante aquele mesmo discurso, eu chorava e a minha
companhia ria, o que me fez confirmar que, de facto, perante a mesma realidade,
somos tão diferentes a sentir e a saborear.
Há dias, a saborear meia dúzia de vieiras o tempo parou; o meu filho diz
muito baixinho: “estas vieiras têm tudo: o que lhe puseste no tempero, e o que
sentiste ao confeccioná-las”.
Gostava de partilhar mais sobre alimentação e menos sobre gastronomia,
mas este texto está a fazer-me sentir um gastrónomo apaixonado.
Grato por“contigo”partilhar ideias, experiências, sentimentos e paixões.
Manuel
28
DR. DUARTE FILIPE BATISTA
DE MATOS MARQUES
Licenciatura em Relações Internacionais
Frequência de Mestrado em Relações Internacionais/
Assuntos Europeus
Consultor
DeputadodoPSD–pertenceàscomissõesparlamentares
Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas
[Suplente]
Comissão de Assuntos Europeus
Comissão de Educação, Ciência e Cultura
Comissão Parlamentar de Inquérito à gestão do BES e do Grupo Espírito Santo
A REFLEXÃO DOS NOSSOS ATOS
Nunca pensei que alguém tivesse a coragem, ou ousadia, ou mesmo
irresponsabilidade de me pedir para escrever um texto para um livro sobre
alimentação saudável.
Depois de pensar vários dias sobre o tema, e de ter perguntado à
coordenadora do projeto se era mesmo a mim que queria convidar, percebi,
finalmente, que podia dar um contributo.
Muitos não se apercebem mas a segunda maior causa de morte entre os
jovens, logo a seguir ao trauma, não só na Europa mas em todo o mundo, são as
doençasassociadasaproblemascardiovasculares.FoiporissoquenaAssembleia
da Republica promovi uma resolução sobre a‘’alimentação e vida saudável’.
A vida que muitos levamos, tal como eu, obriga a um grande esforço e
disciplina para conseguir promover uma alimentação saudável e equilibrada.
Hoje raramente surge a oportunidade de almoçar ou jantar em casa, de fazer
umadietaequilibradaaolongodasemana,oudeprogramardevidamenteanossa
alimentação.
São cafés a mais, pequenas refeições saltadas, demasiadas refeições em
restaurantes, que não são culpados pela nossa indisciplina, e falta de tempo ou
capacidadedesacrifícioparaumaatividadefísicaquecompensetodosesteserros.
Felizmente a sociedade Portuguesa está cada vez mais desperta para os
problemas da obesidade e as consequências que isso traz. Fico contente de ver
mais gente na rua a correr, as lojas de comida saudável com mais clientes, e as
secções de produtos hortícolas e frutícolas  dos supermercados cheios de gente.
Porém, não obstante isso, as estatísticas não desarmam, os números não
baixam, antes pelo contrário. Por isso, nesse projeto que atrás mencionei
29
ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
propunha uma rotulagem sobre os níveis calóricos dos alimentos, pois
acredito, cada vez mais, que a disciplina alimentar passa muito por um maior
conhecimento sobre os alimentos que consumimos.
A educação alimentar começa em casa, no que aprendemos, no que
preparamos para o nosso dia. Não devemos ter complexos, ou vergonha, de
trazer connosco uma “típica” marmita, um reforço alimentar, uma peça de
fruta que nos possa servir de “muleta” ao longo de dia. Tenho a certeza que se
houver um mínimo de esforço, um melhor conhecimento dos alimentos e um
planeamento atempado, qualquer um de nós, com vidas mais ou menos ativas,
pode ter uma alimentação saudável.
Duarte Marques
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MAFALDA AURNAUTH
Nasci em Lisboa, e, apesar de ter ingressado
na Faculdade de Medicina Veterinária, foi o
Fado e uma carreira na Música que tomaram
conta do meu percurso profissional, que tem já
20 anos. Tendo 7 álbuns de originais editados
e tenho levado esta Arte um pouco a todo o
mundo. Continua a fascinar-me a comunicação e
ligação com os outros, e uma evolução pessoal e
profissional a todos os níveis.
A ESSÊNCIA DA ALIMENTAÇÃO NO INDIVIDUO
Ao longo de toda a vida a alimentação ocupa um lugar preponderante no
desenvolvimentodapessoa,enquantoparteintegrantedasociedade.Associa-sea
comida a encontros familiares, festividades, comemorações, prazer, mas também
desde muito cedo encaramo-la como um mundo cheio de tentações, pecados e
restrições.
O acesso a uma informação clara sobre os beneficios de diferentes hábitos
alimentares é essencial. Só muito recentemente se comunica com clareza os
terríveisefeitosdoaçúcar,etalacontecenumaerajácompletamentedominadae
manipulada por isso, especialmente se falamos de crianças.
Outro ponto muito importante é evitar tudo o que não é natural. Difícil,
muito difícil. A facilidade de qualquer coisa embalada, especialmente para quem
vive em viagem, é muito tentadora.
É essencial procurar informação sobre todos os tipos de alimentação
que, com mais ou menos garantia, nos podem trazer todo o tipo de benefícios,
quer por serem provenientes de uma cultura cuidada e de confiança, quer pelas
suas propriedades altamente nutritivas. Muitos destes tipos de alimentação
são extremamente agradáveis depois de nos desabituarmos dos vícios diários,
culturais e rotineiros. Hoje em dia, a diversidade e oferta de superalimentos é
incrível, e a junção da satisfação que esses alimentos bem confeccionados nos
pode trazer com uma sensação de leveza, de energia e vivacidade é preciosa.
Quem tiver um historial de distúrbios digestivos, dores de estômago, dores de
intestinos,enxaquecas,retençãodelíquidosetantosoutrossintomas,sabebemo
valor de se sentir bem no seu corpo.
Cuide-se! Não se prive do que gosta, mas descubra outras coisas que goste
31
ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
e que também gostem de si.
As informações que recolhi guardo e divulgo neste momento ao leitor:
Evitar químicos e produtos que não sejam naturais - evitar embalados ou
alimentos processados, refrigerantes, adoçantes artificias;
Evitar as farinhas brancas e os açúcares refinados;
Evitar fritos e gorduras – cozinho sobretudo em panelas antiaderentes;
Tomarumbompequeno-almoço,umalmoçoequilibradoondeoslegumes
serão sempre metade do prato e o restante só proteína ou por vezes um cereal, e
fazer um jantar leve, guardando para dias de festa as loucuras que muitas vezes
nos apetecem ao fim do dia, depois de um dia grande e cheio de turbulência.
Beber bastante água ou líquidos como chá.
Se entendermos a alimentação como nossa “amiga” e os cuidados como
“bons parceiros”, esta acabará, eventualmente, por nos levar a um lugar muito
mais confortável e prazeiroso, e a um bem-estar precioso e infinitamente mais
gratificante do que o que as más escolhas alimentares nos podem trazer, por
muito enganador que seja o seu efeito no momento.
Mafalda Aurnauth
32
RITA BORRALHO
É uma Atleta Olímpica Portuguesa que
representou o Sport Lisboa e Benfica durante
20 anos. Foi uma das melhores da sua geração
em provas de atletismo de meio fundo e fundo,
nacionais e internacionais (na difícil década de 80
e inicio dos anos 90), a par de nomes como Carlos
Lopes e Rosa Mota, entre outros.
Sobressaiu nas distâncias de 10.000 metros e
maratona, sendo recordada como a primeira
grande maratonista portuguesa a nível
internacional, contribuindo para o sucesso daquela que foi considerada a
“geração de ouro” do atletismo português.
Venceu a maratona de Barcelona em 1982, a maratona de New Jersey em
1986 e a maratona de Lisboa em 1991.
Atualmente desempenha as funções de assessora desportiva, apoiando
atletas profissionais e amadores, numa vertente direcionada não apenas
para o desempenho desportivo como também para a saúde e o bem-estar
geral. Sempre permaneceu ligada ao atletismo em Portugal e no Brasil, e,
entre outras actividades, foi criadora, em parceria com a atleta olímpica
por si treinada, Janete Mayal, da assessoria desportiva Mayal Athletics, no
Brasil, fundadora do Maratona Clube do Brasil, e fundadora da assessoria
desportiva RB Running, em Portugal.
A ALIMENTAÇÃO NO DESPORTO
Comoatletadealtacompetiçãoquefui,eagoratreinadora,tentofazeruma
alimentação o mais saudável possível. A atividade física requer um corpo são e
mente sã, dois elementos imprescindíveis ao sucesso da minha profissão.
O pequeno-almoço é realmente a refeição mais importante para começar
o dia em plena forma e em equilíbrio perfeito depois de uma boa noite de sono.
O descanso é igualmente importante. No que diz respeito à área da alimentação
tento criar diariamente um pequeno-almoço diferente, variando conjugações
entre leite, cereais, fruta, iogurte, mel, e pão integral.
Ao longo do dia vou fazendo várias refeições: por norma, a meio da
manhã como uma peça de fruta; ao almoço começo sempre por uma sopa, e o
prato principal normalmente engloba peixe e salada, terminando a refeição com
outra peça de fruta (na minha alimentação, para além das saladas, dou bastante
prioridade ao peixe); a meio da tarde, o lanche costuma ser composto por sumos
naturaiseumapeçadefruta;aojantar,pormedeitarcedo,costumocomerpouco
33
ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
–chegamesmoaserarefeiçãoprincipalemquecomomenos–,apenascomosopa
e uma peça de fruta.
Paraalémdomeutestemunho,pretendoaindadeixaraquiomeucontributo,
alertando para o facto de o exercício físico não se dever fazer em jejum. O corpo
é uma potente máquina que trabalha com um motor importantíssimo, que é a
nossamente,eaforçaéocombustívelporelatransformadoemestímulo,quenos
eleva onde quisermos. Nada se faz sem treino e disciplina! Soluções milagrosas
não existem. Tudo depende de nós.
Rita
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DR.ª WENQIAN CHEN
Médica. Licenciada pela Faculdade de Medicina
Tradicional Chinesa (MTC), no Hospital de
Tianjing (China). Entre 1986 e 1992 esteve no
departamento de MTC e de Medicina Interna, no
Serviço de Urgências do Hospital de Tianjing.
Desde 1992 está a exercer em Portugal. É
detentora do SPAsia, um Centro de Terapias
Chinesas que se dedica à divugação, tratamento e
leccionamento da Medicina Tradicional Chinesa.
O ALIMENTO COMO EQUILIBRIO ENERGÉTICO
Oconceitodedoençaparaafilosofiaorientalévistocomoumdesequilíbrio
energético. A doença não é tratada com medicação, mas sim com mudanças de
hábitos da vida. O nosso estilo de vida é que influência decisivamente o nosso
estado de saúde.
Existem três fatores que desencadeiam a doença:
1. Emoções;
2. Fatores climatéricos/ambientais;
3. Hábitos de vida.
Os fatores emocionais responsáveis são:
1. Euforia - Fogo
2. Melancolia -Terra
3. Ansiedade - Terra
4. Tristeza - Metal
5. Medo - Água
6. Terror - Água
7. Ira - Madeira
Sendo que a cada um dos cinco elementos estão associados os seguintes
órgãos:
Madeira – fígado, vesícula biliar, tendões, e unhas.
35
ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
Fogo – coração, intestino delgado, e sangue.
Terra – baço, pâncreas, estômago, e músculos.
Metal – pulmão, intestino grosso, pele.
Água – rim, bexiga, ossos, e dentes.
As emoções repetitivas consomem muita energia ao órgão a que está
associado, desencadeando a instabilidade nesse elemento. Os 5 elementos ficam
instáveis e daí surge a doença.
Os hábitos de vida (como os vícios, o sedentarismo, o excesso de atividade
sexualeaalimentação)sãoresponsáveispeloconsumoexageradoedesarmónico
de energia, produzindo lentamente desequilibrios energéticos nos vários
elementos. Neste sentido, adquirir hábitos saudáveis torna-se imprescindível
para manter uma boa saúde visível e palpável.
Deste modo, a alimentação torna-se a base para o equilibrio harmónico,
pois sem ela não sobrevivemos; devemos preferir alimentos naturais e o mais
primitivos possível, como a fruta e vegetais. A natureza dá-nos tudo o que
precisamos para viver em harmonia e paz com o nosso corpo, e com os demais.
Aproveite, mas não em demasia, os frutos, o sol, a água. Seja Feliz!
Wenqian Chen
36
DR.ª ISABEL COSTA
Naturopata e consultora alimentar, realizando
consultas, aulas, palestras, workshops sobre
alimentação saudável.
Autora do primeiro livro escrito e publicado em
Portugal sobre alimentação crua, intitulado “Pela Sua
Saúde!”.
Formadora externa no Instituto Medicina Tradicional. 
Colaboradora habitual da revista “Zen Energy” e do
“Portal Sapo Mulher”. 
Co-organizadora do Congresso Multidisciplinar
“Alimentação Saudável” e co-fundadora do projecto
“Vegan Chef Portugal”.
Nomeada Embaixadora da Paz em 2011 pela Federação das Mulheres para a
Paz Mundial.
FILOSÓFIA ALIMENTAR
“Diz-me o que comes, dir-te-ei quem és”. Este velho ditado, que por outras
palavras nos remete para uma reflexão de nós mesmos pela constatação dos
amigosqueescolhemos,tambémseaplicaàsnossasescolhasalimentareserevela
muito mais do que á primeira vista possamos imaginar.
A nossa dieta regular dá-nos os seguintes indicadores:
1. A tendência para determinados problemas de saúde;
2. Deficiências vitamínicas;
3. O nível económico;
4. A cultura;
5. As nossas crenças;
6. A nossa postura perante a vida e a natureza;
7. As emoções que condicionam a escolha alimentar;
8. A chamada de atenção do corpo para um distúrbio de saúde.
Vamos olhar um pouco para cada um destes aspetos. Se eu estiver a
conduzir numa estrada que termina num abismo, a não ser que retroceda no
caminho,inevitavelmentechegareiaumpontodenãoretornoecaionoabismo.O
mesmosepassacomaalimentação.Seduranteanoseanosadietaforconstituída
por carnes, enchidos, fritos, gorduras, e hidratos de carbono refinados, e em
excesso, sem alimentos saudáveis como a fruta, os legumes, e os cereais integrais,
infalivelmente estamos no caminho do abismo, em que um dia ouviremos o
diagnóstico de colesterolémia, ácido úrico, ureia e glicose elevados, que não
sendodetidosatempoacarretamumprognósticodeproblemascardiovasculares,
hipertensão, arteriosclerose, diabetes, cancro, e demais doenças crónicas que
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ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
invadem a contemporaneidade.
Portanto, pelo que ingerimos hoje, podemos facilmente compreender
como nos sentiremos amanhã.Também lá diz o ditado“pela boca morre o peixe”!
Umaalimentaçãodesprovidadefrutaselegumeséumaalimentaçãopobre
em vitaminas e sais minerais, debilitando assim o nosso sistema imunitário, que
não terá uma grande capacidade de resistência face às doenças.
Sem dúvida que o tipo de alimentos que se come pode revelar o estatuto
económico,independentementedeseremossaudáveisounão.Háalimentosque
recheiam as mesas das pessoas de um nível económico mais elevado e não são
propriamentesaudáveis,comoéocasodomarisco.Poroutrolado,temossituações
de pessoas que vivem isoladas nas aldeias, alimentando-se apenas do que a terra
lhesdá,sempossibilidadesfinanceirasdeexperiênciasgastronómicascaras,eque
têmumaalimentaçãomuitosaudáveleumaqualidadedevidasuperior.Podemos
vermuitosexemplosnasaldeiasportuguesasdepopulaçõesidosasquecommais
de 80 anos ainda trabalham no campo e não sofrem de doenças mentais (que são
cada vez mais frequentes nas cidades – não apenas pela alimentação, mas por
vários fatores em conjunto) e que têm uma grande resistência física e qualidade
de vida.
Cada povo, na sua cultura e costumes, expressa-se na alimentação de
acordocomassuascondiçõesgeográficas,clima,alimentosdaregiãoeatémesmo
de acordo com a sua própria história.
As crenças e tradições manifestam-se em épocas festivas como é o caso
do Natal e da Páscoa (a um nível global), e influenciam e condicionam muitas
escolhas a nível individual. Existem muitos conceitos que no mínimo são
estranhos e revelam um distanciamento muito grande da nossa alma. Um desses
conceitosestáligadoaoconsumodecarne.EmalgunspaísesdoOrientecome-se
carnedecãoporqueacreditamquedáforçaevigorsexual,sobretudoaoshomens.
Felizmente os jovens têm vindo a abandonar esta ideia!
Em Portugal, as pessoas que gostam muito de carne em detrimento de
peixe dizem que precisam desse alimento em abundância porque “peixe não
puxa carroça”(é interessante notar que isto é afirmado sobretudo pelos homens
também), e como tal precisam de comer carne para ter força. Mas, os animais que
puxamcarroçacomemerva!Osanimaismaisfortesàfacedoplanetanarealidade
são herbívoros e também são os de maior longevidade, ao passo que os animais
carnívoros têm muito menos resistência física e vivem menos tempo. Portanto
se olharmos para o exemplo da natureza precisamos de reformular os nossos
conceitos e não aproveitar um ditado popular para justificar a escolha alimentar.
Durante milhares de anos, a carne também foi símbolo de riqueza e de
uma posição social elevada, e como tal reservada às classes mais ricas, deixando
o povo limitado aos cereais e legumes. No Oriente existiu ao longo da história um
conceitoidênticoemrelaçãoaoarroz.Oarrozintegraleramaisbaratoedestinado
aospobresenquantooarrozbrancodestinadoàsclassesmaisabastadas.Éirónico
como o mais saudável era considerado de baixo nível.
Em Portugal, até à data da revolução de 1974, a alimentação era simples
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e a carne não era consumida diariamente. Posteriormente, comer muita carne e
encher os carrinhos de compras no supermercado com comida empacotada de
toda a espécie, tornou-se um símbolo de melhoria de estatuto social. Felizmente
hoje em dia começa-se a ver por outra perspetiva.
AnossaescolhaalimentartemumimpactoprofundonaNatureza.Odesejo
deconsumodesenfreadodecarnedasociedadeocidentaltemtidoconsequências
dramáticas no ecossistema da Terra. Destroem-se milhares de hectares de
florestas para criar zonas de pasto para alimentar o gado, extinguindo assim
muitas espécies por destruição do seu habitat natural. O aumento da espécie
bovina e suína contribui para o aumento da poluição do ar e da água.Todos estes
fatores contribuem em larga escala para o aumento do aquecimento global. Os
terrenos utilizados em larga escala para alimentar o gado, se fossem cultivados
com cereais, poderiam eliminar a fome da face da Terra.
Não gostamos de pensar nisto, mas a realidade é que o ato do carniceiro
começa com o desejo do consumidor. O nosso desejo de comer carne contribui
para a destruição do planeta, para o aumento do aquecimento global, para cada
criança que morre de fome no mundo a cada 2 segundos, e para o sofrimento
dos animais que são maltratados desde que nascem até à morte, quase sempre
agonizante.
Talvez o leitor ache que tudo isto é um exagero, mas infelizmente não é.
Todas as nossas escolhas têm repercussões no mundo. Pode dizer: mas quem sou
eu para mudar o mundo? Sou apenas um ponto neste mar de gente. Pois, mas
todosestespontosapensaremassiméqueconstituemomardegenteeenquanto
cada um não se consciencializar da sua mudança, continuaremos a viver num
mundo de caos. É este o mundo que querem deixar para as futuras gerações? A
escolha é feita hoje!
O que é que a alimentação revela sobre as nossas emoções? Os alimentos
menos saudáveis que escolhemos com muita regularidade são o resultado dos
nossos estados emocionais, e por isso se torna tão difícil equilibrar a dieta.
Por exemplo: quando uma pessoa se sente triste, o que escolhe comer?
Peixe cozido com brócolos? Um bife grelhado com batata cozida? Claro que não!
De um modo geral, a escolha recai no chocolate ou nos doces.
Quando estamos apaixonados sentimos que não precisamos de comer
(ou pelo menos uma dose mínima basta) e até de dormir. Vivemos num estado
“iluminado” que nos nutre. Pesquisas cientificas têm revelado que no estado de
paixão são libertadas hormonas que nos dão uma profunda sensação de prazer
e bem-estar. Por outro lado, quando sofremos uma desilusão essas hormonas
diminuem.Ochocolateporseuladocontribuiparaqueelasaumentemumpouco
dando alguma satisfação e prazer através do paladar. O chocolate também está
associado à sensualidade e é um símbolo de amor entre apaixonados.
A tristeza é a emoção que afeta os pulmões, tornando-nos mais sensíveis a
constipações e gripes.
Com excessos em momentos de tristeza e saudosismo, são as mulheres
que têm mais tendência para comer chocolates, os homens preferem petiscos e
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ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
queijos. O chocolate é mais suave e feminino, enquanto o queijo e petiscos são
“comida de homem”.
É claro que em situações de tristeza também há muitas pessoas que
simplesmente não comem ou optam por outros alimentos, mas aqui estamos a
ver de um modo geral como se processa a ligação entre as emoções e a escolha
alimentar.
Airaéaemoçãoqueafetaofígado.Oditadopopularquerefereumapessoa
como tendo “maus fígados” não se refere ao órgão, mas ao comportamento de
alguém que é muito mal-humorado. Ao manter constantemente este padrão
energético irá afetar a energia do órgão. Com esta emoção, a pessoa tem
compulsão para carne e alimentos duros para trincar. A pressão que é exercida
pelos maxilares para mastigar ajuda a“compensar”esta emoção.
A irritação afeta a vesícula e por isso desejamos alimentos fritos, em
especial batatas fritas e salgados como croquetes, rissóis, e pastéis de bacalhau.
O medo afeta a energia dos rins e compele-nos para alimentos com muito
sal. A ansiedade e a preocupação desgastam a energia do estômago (originando
gastrites e úlceras) e do baço, e compelem-nos a petiscar um pouco de tudo sem
critério específico.
Consumir hidratos de carbono (pão, bolachas, massas) diária e
excessivamente revela uma grande solidão na alma. A comida torna-se muitas
vezes o refúgio, o escape, o “amigo silencioso”, o vício que aparentemente não
prejudica ninguém, a não ser o próprio (mas isso é mesmo aparentemente)!
Aqui reside a grande dificuldade de equilibrar a alimentação, sobretudo
a nível do sexo feminino. Existem muitos processos no subconsciente que nos
condicionam.Temos muitos exemplos: a mulher que embora“queira”emagrecer,
rapidamenterecuperaoqueperdeu,porumladoporquefezdietasextremamente
rigorosas e impossíveis de manter, mas por outro lado pela insegurança de ter
perdidoagorduraquea“protegia”.Àsvezesagorduraprotegederelacionamentos,
de intimidade à qual se quer distância. O medo de ser notada, de ser atraente, do
contacto sexual.
O homem, que quer ser o“rochedo”para a sua família e para a sua empresa
tem tendência a manter a barriga. É aquele com quem todos podem contar, em
quem se podem apoiar sempre, é estável, é seguro; e muitas vezes a barriga
mantem-se mesmo com restrições alimentares.
Estessãoapenasalgunsexemplos.Éclaroquetemossemprequeconsiderar
os problemas glandulares e hormonais, mas na situação de obesidade estes são
uma percentagem mínima.
A nossa evolução e crescimento interior pressupõem uma reflexão e uma
mudança natural na alimentação. Deixo como sugestão uma autoanálise, uma
observaçãodosalimentosdesejadosedaemoção,doestadodeespíritoquesevive
nomomento.Éumaformadeautoconhecimento,decompreendermosopercurso
em que nos encontramos e a partir daí procurar as mudanças mais benéficas e
da forma mais sólida, não apenas uma solução aparente, mas a cura da raiz do
problema.
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Só nos é imposto o que nós permitimos. A escolha é sempre individual e a
melhor escolha está ao nosso alcance. Basta querer. Basta ouvir o coração e olhar
para a nossa alma.
O corpo tem uma consciência que nos mostra, pelos nossos desejos, o
desequilíbrio emocional, e o modo como isso afeta a parte física. Por exemplo,
numasituaçãodecandidíase,sentimosumdesejomuitoforteporalgunsalimentos,
como chocolates, queijos gordos e cogumelos. Estes alimentos vão alimentar a
Cândida Albicans (que é responsável pela candidíase), fazendo-a proliferar ainda
mais, portanto ao analisar o que desejamos comer, podemos perceber o padrão
emocional e o que está subjacente no corpo físico. Estamos no tempo de ouvir a
consciência do nosso corpo.
No nosso carro colocamos o combustível adequado, fazemos as revisões e
tudo o que seja necessário para o seu perfeito funcionamento. No entanto, com o
nosso corpo, que é precioso e insubstituível, tantas vezes lhe negamos o direito
aoqueémelhorparaoseufuncionamentoperfeito,dando-lheoalimentoerrado.
Precisamos de repensar sobre a nossa qualidade de vida, e não apenas
quando chegamos à velhice: os nossos hábitos ao longo da vida irão sem dúvida
condicionar a qualidade de vida que teremos mais tarde. Afinal, estamos sempre
a dizer que o bem mais precioso que temos é a saúde, mas fazemos muito pouco
para a manter. E o mais irónico é que se chama“fanáticos”às pessoas que tentam
viver uma vida com padrões saudáveis quando elas estão a contribuir para o bem
de todos e não apenas o seu.
Vejamos: quando uma pessoa está saudável, está feliz, pode trabalhar,
a família também está feliz, a empresa tem pessoas para trabalhar e todos
contribuímosparaobemdanação.Quandoestamosdoentesficamosdeprimidos,
de baixa, a família toda sofre, a empresa é afetada, o país sofre as consequências
das doenças.
Atualmente, pelo menos 70% das doenças derivam de fatores
comportamentais, isto é, aqueles sobre os quais nós temos responsabilidade,
como é o caso da alimentação. Portanto, precisamos de refletir profundamente.
Quandonósmudamoscomconsciência,tudoéfácil,quandonãoqueremos
mudar,avidaimpõeamudançapelascrisesquenosapanhamdesprevenidos.Em
pleno século XXI, o tempo exige de nós uma reflexão profunda sobre os nossos
valores e as nossas escolhas. Cabe a cada um de nós, como entidades únicas e
insubstituíveis no Universo, fazer a melhor escolha.
Após esta reflexão, surge a questão: o que comer? Independentemente do
tipo de dieta que escolherem, é fundamental a ingestão de alimentos crus (de
origem vegetal claro!) na proporção mais adequada a cada pessoa considerando
vários fatores, como o estado de saúde, época do ano, e muitos mais.
Na realidade apenas os alimentos crus mantêm a sua estrutura vital
(enzimas, vitaminas, sais minerais) na íntegra, pois a temperatura na qual os
alimentos são cozinhados destrói quase tudo, deixando-os completamente
desvitalizados. O ser humano morre se a sua temperatura interior chegar aos
42º, e da mesma forma toda a atividade enzimática cessa a partir dos 50º, sem
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ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
exceção. As enzimas são estruturas protéicas essenciais à vida e fazem parte de
todas as atividades bioquímicas do organismo, tais como a digestão e absorção
dos alimentos, atividade cerebral, equilíbrio hormonal, humor, reposição celular,
sistema imunitário, entre outras.
Quando nascemos o nosso organismo dispõe de uma determinada quota
deenzimas(endógenas),mastambémprecisamosdeingerirenzimasatravésdos
alimentos (exógenas). Quanto mais desprovida de enzimas for a nossa dieta, mais
enzimas se vão usar da nossa reserva, reduzindo assim a nossa saúde. Esta é uma
das causas de doenças degenerativas e envelhecimento precoce. Existem vários
fatores que diminuem as enzimas no nosso organismo:
Alimentação acidificante e desvitalizada (excesso de produtos animais,
fritos, produtos refinados, açúcar, chocolate, álcool, café), e falta de alimentos
saudáveis;
Stresse e emoções negativas;
Uso excessivo de medicamentos e antibióticos;
Poluição ambiental e tabaco.
Todos estes fatores diminuem a atividade enzimática e acidificam o
nosso corpo, contribuindo para vários tipos de inflamações, cancro, problemas
cardiovasculares, e osteoporose.
Perante isto, precisamos de refletir seriamente sobre os nossos hábitos
alimentares. É a nossa saúde que está em risco! Eu sei que a imagem não é
agradável,masobifeeacosteletaquetantosgostamsãoalimentosprovenientes
de cadáveres de animais, que assim que são abatidos entram em processo de
decomposição. Mesmo os animais carnívoros não comem animais já mortos há
algumtempoanãosernumcasodefomeextrema,porqueestãoemdecomposição.
A carne e outros produtos de origem animal vão acumular toxinas no
nosso organismo, que não é“omnívoro”, como tantos interesses da indústria nos
querem fazer acreditar. Por exemplo, o aparelho digestivo de um carnívoro tem
sucos gástricos mais potentes do que os nossos, o intestino é curto para eliminar
rapidamenteenãoputrificarnoorganismo(temde3a5metros)enquantoonosso
intestinotem12metros,oquesignificaquenãosendoeliminadorapidamentevai
putrificar no nosso intestino, e isso é percetível até pelo cheiro nauseabundo das
fezes da maioria das pessoas.
As frutas, os legumes, os germinados, as frutas oleaginosas, os cereais
integrais, os super alimentos, são os únicos que realmente protegem a nossa
saúde:
são ricos em antioxidantes, vitaminas, sais minerais, e enzimas;
têm uma ação curativa e remineralizadora no nosso organismo;
protegem de doenças graves;
fortalecem o sistema imunitário;
diminuem os níveis de colesterol;
mantêm um estado mental e emocional equilibrado;
ajudam a emagrecer;
diminuem os odores corporais;
42
regularizam o trânsito intestinal;
melhoram o estado da pele e cabelo;
trazem mais energia vital ao nosso corpo e rejuvenescem.
Nem todas as pessoas poderão ou desejarão fazer uma alimentação 100%
crua, mas se incluírem na vossa dieta normal pelo menos 50% de alimentos crus
e diminuírem o consumo de produtos animais (carne, peixe, leite, ovos, queijos)
irão sentir uma alteração profunda no vosso corpo e, na vossa mente, um grau de
energia e clareza mental muito mais intensos. Não é possível sentirmo-nos felizes
quando o nosso corpo sofre, e ele é parte intrínseca do nosso ser, o nosso fiel
companheiro24horaspordiaenquantovivermosnestebeloplaneta.Nãomerece
o nosso bom companheiro ser tratado com carinho e comida saudável?
A alimentação crua é o elixir da juventude ao nosso alcance, rebobinando
todo o nosso sistema para a saúde e felicidade tornando a velha máxima“mente
sã em corpo são”a realidade do dia-a-dia.
Cadaumtemumpercursoerespeitoavossacaminhadasagrada.Obrigada
por fazerem parte da minha vida através desta leitura.
Um grande bem-haja para todos.
Isabel Costa
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ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
DR.ª MÁRCIA ALMEIDA
É presidente da ComMedida IPSS.
Naturopata, economista e psicóloga  faz clínica e
escreve sobre temas voltados para a alimentação
natural, medicinas alternativas, bem-estar e
qualidade de vida. Estudou Medicinas Alternativas
em Lisboa e em Madrid, abriu uma clínica na
margem Sul, onde trabalhou por mais de uma
década. Pioneira em Portugal na divulgação
da comida viva, com workshops, palestras
e consultas, autora do site e blog “Leite da Terra”
e autora do ebook “ Cruzinhando - Receitas de
Comida Vivas”.
A FORÇA DO ALIMENTO
NestemeutestemunhovoufalarsobreaComidaVivaemPortugal,oudevo
dizer o Crudivoriamo, ou simplesmente Raw Food.
Foi em meados de 2003 que comecei a olhar o cru como uma solução para
os problemas de saúde dos meus pacientes, mas na realidade só vim a investir de
um modo cultural no cru em 2006. Foi um caminho difícil, cheio de altos e baixos,
erros e acertos. Além de aumentar o consumo, de um modo que não esperava,
em oleaginosas (antes simples aperitivos), hoje um indispensável complemento
alimentar.
Com uma curiosidade quase infantil assisti ao processo de germinação
das sementes, ou, nas palavras da professora Ana Branco, observei as sementes
acordando, colocando os “narizinhos” de fora, uma prova indubitável da vida
nelas existente.
Apesar de em minha casa ser a única a seguir uma dieta crudívora, estava,
de facto, animada e motivada a consultar toda a informação disponível relativa
ao conceito e à prática de raw food, onde para além do consumo dos alimentos
em crú (ou amornados a um máximo de 45º), os ingredientes deverão ser
maioritariamente biológicos.
Deparei-me com novas formas de fome, mas, verdade seja dita, também
conheci novos níveis de saciedade. Foi uma aprendizagem contínua, o saboroso
tomou gradualmente outras formas, outros cheiros, outros paladares.
O meu corpo sofre as consequências da desintoxicação abrupta. Desde a
fase de negação, passando pela barriga inchada, as cólicas, as enxaquecas até a
aceitação, a persistência ganhou e eu... Sobrevivi.
Aminhacozinhaganhounovavida,orobôdecozinhacomeçouatrabalhar
44
afanosamente em todas as refeições, do pequeno-almoço à ceia; a “panela
furada” (um simples coador de voal) passou a ser a minha melhor amiga. Como
consequência directa, a minha dieta passou a ser 100% viva, aproximadamente
60%dehortaliçasevegetais,30%defrutase10%degrãos,sementesecastanhas,
germinadas.Orawfoodnãopermiteoaquecimentoaquecidasamaisde38°/45º
porque destrói a vida dos alimentos.
PLANEAR AS REFEIÇÕES
Quando se decide mudar os hábitos alimentares para outro tipo de
alimentação a que não se está habituado, o mais difícil nos primeiros tempos
é reaprender a organizar-se. No fundo, aprender as receitas, providenciar e
preparar os alimentos.
Quem, numa alimentação tradicional, convidar amigos para uma
churrascadaenãotiver,porexemplo,descongeladoacarnecompradanavéspera
terá com certeza problemas na hora da refeição. No crudivorismo germinar
alimentos é um acto essencial do qual não se pode prescindir nem tão pouco
apressar, pois as sementes necessitam de tempo para se completar a preceito.
Em alternativa, há a possibilidade de comprar sementes já germinadas em
estabelecimentosespecializados,maspagandoumcustomaiselevado,eestando
sujeita à sua disponibilidade em stock, o que nunca é garantido.
Nas reais emergências posso sempre recorrer as frutas e as saladas.
COMO BAPTIZAR OS MEUS PRATOS
Umfactoressencialparacativarosrecém-vindosaocrudivorismoéatribuir
designações aos pratos confeccionados com alimentos crús, que estabeleçam
uma analogia com as receitas da alimentação tradicional. Assim, a utilização de
vocábulos como “esparguete”, “soufflé”, “mousse”, criará na mente uma imagem
associada aos pratos da cozinha tradicional, que levará, de imediato, a uma maior
predisposição para a aceitação de novos sabores, utilizando a memória gustativa
paraumpadrãodecomparaçãoinevitável.Douumexemplo:quandochamoaum
prato crudívoro de “lasanha de courgette” toda a gente lembrará a tradicional
disposição em camadas de tiras de massa alternadas com recheio de carne, mas
na verdade, o que irá encontrar serão finas tiras de courgette com recheio de
molho de tomate e amêndoas picadas que simula na perfeição a carne da receita
tradicional.Ocorreomesmocoma“mousse”dechocolateondeasnatasdãolugar
ao abacate batido sendo que a grande diferença é que aqui não terei problemas
quando pensar em repetir!
Regras Raw
Deve-se seguir sempre a regra principal: tudo tem de ser vegano, fresco,
integral e maduro; nada é cozido, frito, ou assado, muito menos processado. Pode
comer todo o tipo de frutas, vegetais, hortaliças, grãos, sementes e castanhas
germinadas.
Dados Crus
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ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA
Comer Raw food ou ser “crudicista” significa comer grandes quantidades
de enzimas vivas – os catalisadores de energia e na digestão que ajudam a
restaurar a eficiência do combustível do seu corpo. Segundo o Dr. Edward Howell,
o primeiro pesquisador das enzimas, “as enzimas são substâncias que tornam
a vida possível. São necessários para todas as reacções químicas que ocorrem
no corpo. Sem enzimas nenhuma actividade alguma vez aconteceria. Nem as
vitaminas nem os minerais ou as hormonas conseguiriam fazer o seu trabalho
sem enzimas.” As enzimas constituem uma reserva limitada e a sua ausência
conduz inevitavelmente à morte.
A ingestão de alimentos crus evita, assim, a destruição das enzimas que
a comida contem, facilitando a digestão e evitando gastar as nossas próprias
reservas. Ainda segundo Howell, a falta de enzimas na comida cozida é, também,
umadasrazõesmaioresdoenvelhecimentoemorteprecoceeacausasubjacente
à maior parte das doenças. Se o nosso corpo está ocupado com a digestão de
alimentos cozidos e a consequente produção das enzimas destinados à saliva, ao
suco gástrico, ao suco pancreático e aos sucos intestinais, haverá uma produção
diminutadeenzimasparaoutrospropósitos.Quandoistoacontece,sofremoutros
destinatários da produção de enzimas, como o coração, rins, músculos, e outros
órgãos e tecidos.
Estafaltadeenzimasocorrenamaioriadapopulaçãodospaísescivilizados,
que se alimenta de modo tradicional (alimentos cozidos e processados).
Segundo estudos científicos recolhidos ao longo de mais de 40 anos, pelo
Dr. Howell,“o homem é o que menos enzimas da digestão dos amidos tem no seu
sangue, entre todas as criaturas”.
OutragrandepersonagemcrudívorafoiaDra.KirstineNolfi,famosamédica
dinamarquesa,falecidaem1967,com66anos,quedescreveuassuasexperiências
com os alimentos vivos numa pequena brochura traduzida para varias línguas, e
do qual não resisto a tirar um excerto:
“(…) Adotei uma alimentação exclusivamente crua porque fiquei
gravemente doente.
Tive cancro da mama. A doença, é claro, havia sido precedida de má
nutrição e maus hábitos durante doze anos de formação hospitalar. Inicialmente,
descobri um pequeno nódulo no seio direito. Cansada e sem ânimo, não prestei
muita atenção ao nódulo, até cinco semanas mais tarde. Descobri que estava do
tamanho de um ovo de galinha.
Havia crescido aderindo à pele — um sinal característico do cancro. Como
médica, estava suficientemente bem informada para não me querer submeter ao
tratamento geralmente usado nesses casos. Lembrei, então, de passar para uma
alimentação 100% vegetariana crua.
Parti em busca da natureza. Vivi durante algum tempo numa pequena
ilha. Tomava banhos de sol durante várias horas por dia, dormia numa barraca
e tomava banhos de mar. Alimentei-me exclusivamente de frutas e hortaliças
cruas. Mais tarde, introduzi esse hábito de vida no sanatório Humlegaarden.
Após dois meses, comecei a melhorar. O nódulo foi regredindo e minhas
46
forças voltaram. Aparentemente, estava curada e senti-me muito bem.
Após um ano de boa saúde — persuadida pelo Dr. Hindhede — tentei
voltar, a título de experiência, a uma alimentação vegetariana que incluía 50% de
alimentos vegetais cozidos. Após alguns meses, comecei a sentir uma dor aguda
noseioondeotumorhaviaaderidoàpele.Adoraumentouepercebiqueocancro
estavacrescendonovamente.Ocancrovoltaradevidoaosalimentoscozidos.Mais
uma vez, voltei à alimentação crua. A dor diminuiu rapidamente e eu senti-me
menos cansada.
Como médica, achei que deveria usar a experiência adquirida para ajudar
outras pessoas doentes. Sob minha iniciativa, foi criada uma sociedade anónima
que comprou a propriedade Humlegaarden. Bem adequada ao meu propósito,
ela foi adaptada como sanatório onde todos os doentes e funcionários seguiam
somente a alimentação crua.
Alimentos crus são vivos (…).”
Por que razão a alimentação 100% crua exerce um efeito tão
comprovadamente benéfico para as pessoas que a adotam?
Em primeiro lugar, isso ocorre porque o alimento cru é um alimento vivo,
isto é, tal como nos oferece a Natureza. É somente a planta, com as suas finas
folhasverdesabertas,queconsegueabsorveraluzsolaretransformá-laemraízes,
tubérculos, frutas e sementes. Por isso, tanto os homens como os animais usam
as plantas para proporcionar energia solar ao seu organismo. Nessa perspectiva,
chamo os alimentos crus de“alimentos vivos”, ao contrário dos alimentos cozidos,
que considero “alimentos mortos”. Devemos cuidar para que os alimentos não
contenhamsubstânciasquecontrariamaquímicadoorganismodemodoaevitar
que os resíduos não fiquem retidos por muito tempo e apodreçam no intestino
grosso. Portanto, o melhor alimento é aquele que é totalmente natural — não
passou por nenhum tipo de processamento. É ainda preciso acrescentar que o
alimento vivo é muito mais fácil de digerir.
Os alimentos crus ajudam e fortalecem o organismo de todas as maneiras
porque eles contêm enzimas, elementos vivos básicos, e vitaminas que se
combinam de forma natural, dissolvendo e eliminando as toxinas. Toda a pessoa
sensata percebe que a nossa alimentação atual é muito destrutiva. É a causa
mais comum e mais grave das doenças físicas e psicológicas, e da degeneração
constitucional do organismo. Precisamos de procurar hábitos de vida, e
alimentação, mais saudáveis, se queremos viver melhor agora e no futuro. Não
podemoscontentar-nosfazendoconcessõessemcolocaremjogoavidaeasaúde.
Precisamos, por isso, de adoptar a única solução correcta, e esta passa por uma
alimentação 100% crua.
		 Márcia Almeida
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  • 3. 3 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA Ficha técnica Título Coordenadores do Projeto Autores Coordenadora de Revisão Ilustradora Alimentação Australopiteca: o dilema da alimentação – testemunhos verídicos Sandra de Sá Rui Amaral Mariana Mota Wellen Fontellene Mafalda Arnauth Eng. ª Diana Bedoya Dr. Duarte Marques Professor Dr. Armando Almeida Dr. Lourenço Castro Atleta Olímpica Rita Borralho Dr. Márcia Almeida Dr. Isabel Costa Dr. Wenquian Chen Dr. Elsa Novais Dr. Luís Lourenço Teresa Pitagros Maria Oliveira Dias
  • 4.
  • 5. 5 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA Índice Prólogo...............................................................................................................................7 Saúde no século XXI: uma revolução na alimentação impõe-se .............11 Viagens Gastronómicas ............................................................................................26 A reflexão dos nossos atos........................................................................................28 A essência da Alimentação no individuo ...........................................................30 A Alimentação no desporto ....................................................................................32 O Alimento como equilibrio energético ............................................................34 Filosofia alimentar........................................................................................................36 A força do Alimento ...................................................................................................43 O estado de arte económico da Alimentação..................................................47 O que nos leva a escolher, o que nos vende o alimento............................ 50 Ouvir a natureza ..........................................................................................................53 Terapia Detox e Feedback........................................................................................57 O que como? ................................................................................................................59 Receitas .........................................................................................................................64 Conclusão....................................................................................................................113
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  • 7. 7 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA Prólogo A alimentação é um fenómeno incontornável, basilar paradigma da atualidade, tema de gente magra e tema de gente gorda, que converge num sentido aparente: o nirvana. Na busca da plenitude alimentar intentam-se conjugações, e o ser holístico que consome o tempo e o espaço é confrontado ao longo da sua história por problemáticas dinâmicas do foro alimentar. Talvez a mais preocupante para a nossa espécie seja a fome, má-nutrição, privação de comida, chamem-lhe o que quiserem, senhores doutos da nutrição, mães de família, caçadores audazes, agentes da indústria, políticos das nações. Ela acontece – quer se goste quer não se goste – entre as populações do nosso mundo, e, por regra, devido a condições geo-adversas, à instabilidade, a conflitos ou à mera pobreza. Povos famintos têm maiores problemas no desenvolvimento da sua tribo, limitando capacidades de produtividade, aprendizagem e evolução. A ausência de alimento, temível flagelo, está relacionada diretamente com o grau de corpos vulneráveis e, consequentemente, da mortalidade de um povo. Por dia, mil milhões de pessoas ingeremmenosde1.800quilocalorias,eisto,segundoosobservatóriosquemedem afelicidadedoshumanos,designa-sepor“fomehumana”.Aausênciadefomeestá associada à felicidade. E, nesse caminho de pensamento, o construto “dinheiro”, desde que aplicado em função das necessidades biológicas e emocionais do ser, ajudará a adquirir a felicidade. Somos originários da África – sim éramos todos mulatos no início. Com qualquer coisa como 200 mil anos de presença terrestre, um corpo ereto que permiteousopotencialdosbraçosnacriaçãodeferramentasquepossamintervir no mundo, e, imagine-se, começamos a ficar modernos nos últimos 50 mil anos.
  • 8. 8 Não havendo grandes diferenças desde então. Sem o facilitismo da crítica filial, o meu pai poderia ser 50 mil anos mais velho que eu, e isso não me alteraria muito... Somosorgânicos,somosconscientesdeteoriaseautênticasvagascósmicas de informação. No campo da ingestão, a química preconizada por Robert Boyle, Lavoisier e outros cientistas experimentais gera uma verdadeira ordem mundial de relação fortemente comercial entre a indústria química e as populações, que, discutivelmente, procuram, ou é-lhes imposto pelo sistema, a alquimia farmacológica para cada problema físico, mental e emocional. Vivemos no terceiro planeta mais próximo do Sol, com 4,5 mil milhões de anos (é até relativamente jovem), cientificamente designado por Planeta Azul – os intelectuais dos últimos séculos adoram ser poetas, e, sim, a poesia conjuga-se com a ciência. Lar de uma multiplicidade de espécies, incluindo os humanos, é o único corpo celeste onde é conhecida a existência de vida e de alimento. No domínio comparativo, somos os seres que melhor inovaram. Ainda que o Lord, aqueleimponentefila-de-São-Miguel,jáconsigacontrolar-seeentendero“senta” da Senhora Maria sempre que a vê entrar pelo portão, e, relatam-se também de forma bem categórica, alguns macacos que conseguem quebrar nozes com pedras, nós somos mais espertos; sobretudo pela inovação no domínio daquilo que ingerimos. A comida. A bebida. E, mais recentemente, na Mesopotâmia, até a alquimia veio invadir o universo do nosso vasto “aparelho alimentar”, onde a mente joga um papel ativo naquilo que qualquer animal terrestre interpreta como viver mais forte, mais jovem e saudável, através das melhores ingestões alimentares possíveis. Quem nunca criou um prato próprio, uma sobremesa, uma bebida? Bem- vindos ao baile das verdades! E exista um leitor que reclame para si só o prémio secreto de quem nunca, jamais, se arriscou a conceber vida gastronómica. Todos somos mágicos. Todos somos importantes no processo. A ingestão (ou consumo) torna-nos em figuras centrais. Existem os Compradores, os Operacionais, e os Conceptuais. Que lugar ou lugares ocupa você? E criamos uma grande variedade de soluções e problemas que partem do mesmo fenómeno: a ingestão alimentar. Conhecidos pelos latinos antigos como o “homem sábio”, somos a última espécie dos primatas bípedes (mais precisamente, Homo) ainda viva. Sociáveis desde a primeira célula, física e mentalmente, somos isto que observamos desde este último quarto de tempo da nossa concepção divina. Sentimos ultimamente acurvadocrescimentodeformamaisaceleradaedesconhecemosseestamosno limiar da nossa potencialidade. Em todas as áreas e em todo o tempo da nossa evolução, o último milénio demarca-se dos demais 199. Os sociólogos apontam como causa o desenvolvimento da escrita e seus suportes, o que nos permitiu a capacidade de partilha, global e intemporal, de informação. E isso, para a nossa mente de abelhas, é mel. Somos vaidosos mentais. No futuro prevemos telepatias, teletransportes e novos mundos. Os mais prudentes aconselham-nos a voltarmos a ser naturais e orgânicos, por cautela a novas
  • 9. 9 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA epidemias ou fenómenos (não controláveis) que advenham do desenvolvimento imparável e incontrolável da espécie humana. Já apanhámos alguns sustos nesse domínio. Temos um cérebro grandemente desenvolvido, com acesso de raiz operacional ao raciocínio abstrato, à linguagem, à introspeção e à resolução de problemas. Somos sábios e consideramo-nos superiores por isso, gostamos de influenciaroambienteaonossoredor,procuramossempreexplicarosfenómenos e somos dotados de capacidade de argumento, imaginação e crença. Somos ainda os únicos conhecidos a usar o fogo, a vestir-se, a desenvolver ideias, que depois implementamos de forma produtiva e abrangente, e, mais curiosamente, independentemente da nossa era ou civilização, temos, comumente na nossa espécie, o cuidado de separar o espaço para preparar os alimentos, para a construção de ferramentas e utensílios específicos para a confecção e para a concepção de protocolos, regras, receitas, modos e até ciências do foro alimentar. Aalimentaçãotem-nosacompanhadofundamentalmenteporquecadaum denóstemdecomer.Equemcomepior,émaisdébil.Equemcomemelhorémais forte e saudável.  Rui Amaral
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  • 11. 11 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA PROF. DR. ARMANDO ALMEIDA Médico veterinário reformado. Foi Director da Estação Nacional de Avicultura e Cunicultura, Professor Coordenador da Escola  Superior  Agrária de Coimbra (Nutrição Animal, Avicultura, Cunicultura). SAÚDE NO SÉCULO XXI uma revolução na alimentação impõe-se Estamos já no início do século XXI e, como é do conhecimento geral, o presenteséculoterádepagara“fatura”doserrosdopassadoséc.XX,overdadeiro século da revolução industrial e sua mundialização. De facto, o século XX, que, mercê dos avanços científicos e tecnológicos, mudou por completo a história da Humanidade em todos os campos do saber, contribuiu como jamais algum outro para o conforto do homem, no sentido mais lato do termo. Foi também o século que, entre outros factos, criou graves problemas, como o aquecimento global e a poluição (terra, ar, águas), e no qual ocorreu o maior desenvolvimento demográficodahistória,que,diretaeindiretamente,acelerouodesenvolvimento dos mesmos problemas. O aumento da população – de cerca de mil milhões no início do século XIX, para dois mil milhões na segunda década século XX, e para os atuais seis mil e setecentos milhões – só foi possível com o aumento da produção de alimentos, para suprir uma necessidade vital tantas vezes ignorada e menosprezada por parte da maioria dos cidadãos, nomeadamente a dos países industrializados de civilização ocidental. Defacto,aesmagadoramaioriadoscidadãosraramentepensanosalimentos no sentido “estrito do termo”, quando muito pensará na alimentação “quando a fome aperta”. Com a evolução científica e tecnológica, a alimentação é cada vez mais motivo de conversa, uma vez que há uma consciencialização da existência de uma associação da dieta alimentar, com a saúde e o bem-estar. Hoje em dia cerca de setenta a oitenta por cento (68%) da população dos países ocidentais e industrializados habita nos centros urbanos, quando, há cem anos, a mesma percentagem vivia nas zonas rurais. A revolução industrial dos séculos XVIII e XIX trouxe, entre outros acontecimentos, não só o crescimento populacional dos centros urbanos e industriais, mas também uma diminuição de área agrícola, consequência do alargamento daqueles centros e respetivas infraestruturas. Esta diminuição da
  • 12. 12 área agrícola para a produção de alimentos naturais teve de ser compensada por uma maior produção e eficiência dos sectores vegetal e animal da agricultura. Agricultura intensiva – industrial e aquicultura Um novo modelo de produção agrícola, denominado modelo intensivo – intensivoindustrial–,frutodaciênciaetecnologia,foiimplementadoe,naprática, expandiu-se após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Constatou-se que, em apenasduasatrêsdécadas,aprodutividadetraduzidapeloaumentodeprodução por unidade de superfície e tempo, bem como pela sua eficácia económica, ultrapassou todas as expectativas, contrariando as más previsões malthusianas do século XIX, ou seja: o aumento em progressão geométrica da população era incompatível com o aumento em progressão aritmética dos alimentos, e daí a fome. O aumento da produtividade deveu-se não só à genética (seleção de raças, estirpes) mas também a fatores extragenéticos (environment dos anglo saxónicos) – como uma nutrição correta (vegetal e animal) e um controlo das patologiastípicasdegrandesconcentraçõeseefetivos–,edaí,infelizmente,entre outras práticas, à necessidade da introdução de substâncias químicas sintéticas – como fertilizantes, pesticidas, antibióticos, hormonas e antiparasitários, que são praticamente essenciais ao equilíbrio do binómio“performance - sanidade”. O modelo intensivo de produção agrícola (vegetal e animal) é periodicamente comentado nos meios de informação pelas suas consequências nefastas para o ambiente e a saúde. Lembram-se das vacas loucas, das dioxinas nos ovos e nos frangos e dos nitrofuranos na carne dos perus? Infelizmente a memória do povo é curta… Já na década de 60, e mais intensamente a partir de 80, problemas associados à intensificação da agricultura (vegetal e animal) começaram a fazer sentir-se com repercussões para o ambiente dos países mais desenvolvidosecomreflexosnasaúdepública.Assimnãofoiapenasporacasoque váriospaísesindustrializadoseavançadosjápossuíamproduçõeseregulamentos próprios para a produção de alimentos biológicos anteriores ao Regulamento (CEE) Nº2092/91 e ao Regulamento (CEE) Nºl804/1999 (regulamentos da década de 90, relativos ao modo de produção biológico de alimentos vegetais e animais). Pode-se dizer, grosso modo, que no século XIX, e anteriores, toda a produção de alimentos pela agricultura clássica (vegetal e animal) era do tipo“biológico”(sem fertilizantes químicos sintéticos e pesticidas). Nas décadas recentes o grande crescimento e desenvolvimento da criação industrial de peixes para consumo (aquicultura) surge como forma de compensar a menor oferta das espécies “selvagens”, que, entre outros factos, se deveu ao excesso de captura, à poluição das águas, e à diminuição da capacidade reprodutiva. Presentemente, a oferta de certas espécies (como a truta, a dourada, o robalo e o salmão) a preços relativamente baixos para a maioria da população é uma forma de compensar a qualidade, que não se limita ao gosto, facto só compreensível por desconhecimento devido à falta de informação. Os problemas básicos da aquicultura são semelhantes aos da produção
  • 13. 13 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA animalintensiva:comooexcedentedequilogramasporunidadeespaço(volume de água no pescado), traduzida por poluição (excesso de dejetos, por exemplo), e, naturalmente, a presença de anti-infeciosos e químicos sintéticos com finalidades das mais variadas, como corantes na carne do salmão. Na aquicultura, a alimentação é feita à base de rações, cujos componentes (alimentos e produtos incorporados) não são consumidos pelos homólogos ”selvagens” e, como consequência, repercutem-se na sua carne (somos aquilo que comemos). Nocasodosalmãodaaquicultura,aspessoaspensam,porexemplo,queasua carne é rica em ácidos gordos poli saturados ómega 3, e, como tal, recomendável e saudável, quando na realidade, é rica em ácido araquidónico (ácido gordo poli saturado ómega 6, produzido no organismo do peixe a partir dos ácidos gordos poli saturados alimentares e percursor de mensageiros inflamatórios), cujo consumocontribuiparaumexcessodeproduçãodemensageirosinflamatóriosno organismo humano (matéria de conhecimento relativamente recente no âmbito da imunologia), para não mencionar a cor da carne avermelhada, que se deve à incorporação de químicos sintéticos. Ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, estamos ainda nos primórdios do conhecimento científico em biologia peloquenãonosdevemosadmirardasfrequentescontradições,frutoemgrande parte dos avanços tecnológicos, bem assim das enormes fontes de informação. A agricultura intensiva industrial (vegetal e animal) e a aquicultura são atividades económicas assentes em empresas de produção de alimentos naturais, que permitiram o desenvolvimento demográfico e o combate à fome, nomeadamente pela oferta de alimentos a preços acessíveis à esmagadora maioria das populações. Têm, todavia, a sua parte negativa, quando encarada como fonte de ”produtos tóxicos” que, em certas circunstâncias, causam problemas na saúde pública, direta (vacas loucas, doenças inflamatórias crónicas, intoxicações alimentares, antibio-resistência) ou indiretamente, a poluição do ambiente. Hoje em dia, são poucas as dúvidas sobre a necessidade de alterar os modelos de produção de alimentos naturais dominantes nas últimas décadas, mas as consequências socioeconómicas são de tal natureza que a maioria dos responsáveis prefere não pensar, e só com situações como as de muitas “vacas loucas”, talvez, passem ou comecem a pensar em soluções alternativas, que de facto existem. Indústria alimentar Ao longo do séc. XX, com decalages entre países industrializados, o desenvolvimento e crescimento da indústria alimentar é um facto, e a sua participação na oferta de alimentos às populações é cada vez maior. A indústria alimentar utiliza como matéria-prima de base alimentos naturais que, ao serem transformados/processadospelaindustrialização,originamumprodutofinalque na maioria das vezes nada tem a ver com o produto inicial, não só do ponto de vista físico (basta apenas um olhar atento às prateleiras dos supermercados), mas também do ponto de vista nutricional. Atualmente a alimentação das populações dos países industrializados é,
  • 14. 14 na grande maioria, o somatório dos alimentos naturais da agricultura e pescas produzidos pelo modelo intensivo e aquicultura, bem como os transformados pela indústria alimentar. Embora alguns dos alimentos transformados, como o clássico e secular pão, cujo elevado consumo é uma realidade para a maioria dos cidadãos, derivado em parte do seu baixo preço relativo, sejam genericamente aceites também como alimento bom e saudável, a verdade é que, à luz dos novos conhecimentos no campo nutricional, o assunto é altamente discutível. De facto, opãodasúltimasdécadasemnadaseassemelhaaopãodosnossosantepassados, que era fabricado com cereais completos/integrais não contaminados com químicos do ambiente, pesticidas, e fungicidas, e moídos (maior tempo de digestão, absorção) e daí nutricionalmente superior e menos”tóxico”. De facto, a partir dos cereais triturados pelas novas máquinas de elevada eficiência obtêm- se, como produto final, uma farinha de estrutura semelhante ao “pó”, e, como tal, de rápida digestão. Quando há refinação, como é frequente, a farinha obtida é branca pela eliminação do tegumento (casca) e do gérmen, dois constituintes estruturais e básicos em termos nutricionais (fibras, proteínas, vitaminas, minerais, fitoquímicos). As farinhas brancas, com fins múltiplos na gastronomia, ficam reduzidas praticamente ao “amido”, que, apesar de ser um hidrato de carbono complexo do ponto de vista químico (múltiplas moléculas de glicose), passa a comportar-se fisiologicamente como um hidrato de carbono simples, (vulgar açúcar, glicose, frutose), sendo, como tal, rapidamente digerido e absorvido, originando níveis elevados de açúcar no sangue (picos de glicemia). Como é sabido, a utilização de alimentos transformados e industrializados na alimentação é norma, nomeadamente aqueles que têm por base cereais refinados. O seu elevado e frequente consumo origina picos de glicemia e “descargas”respetivas de insulina (hormona pancreática de controlo da glicose), comreflexosmetabólicosenormes,predispondoaodesenvolvimentodedoenças inflamatórias crónicas do foro da medicina interna. É neste contexto que surge o índice de glicemia (I.G), um índice técnico utilizado para averiguar a influência do consumo de um alimento na taxa de açúcar no sangue (glicemia), cujo padrão de referência é a glicose, e ao qual foi atribuído o índice 100. Variando de 0 a 100, considera-se que um índice superior a 70 é elevado, inferior a 50 é baixo, e entre os dois é moderado. Um outro índice associado ao IG é a carga glicémica (CG), que relaciona o IG com a quantidade de hidratos de carbono presentes no alimento, sendo o preferido por certos nutricionistas e médicos, uma vez que não é só o tipo do hidrato de carbono que é importante, mas também a sua quantidade. A existência atual de largas centenas de alimentos industrializados, em que a presença de hidratos de carbono é frequente, torna o conhecimento do IG e da CG de um alimento quase uma“obrigação”, muito embora raramente ou nunca esteja presente nos rótulos. Todavia é bom realçar que o índice de glicemia dos alimentos não deve ser usado isoladamente, havendo vários fatores que contribuem para o alterar, começando pelo consumo em que raramente os alimentos são consumidos isoladamente (problema da interação dos alimentos e tipos de nutrientes), e como tal, para certas situações clínicas, o aconselhamento
  • 15. 15 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA de especialistas é fundamental. O frequente e elevado consumo de alimentos de elevado índice de glicémia que originam “descargas” frequentes e elevadas de insulina para o sangue criam situações de hiperinsulinémia, que podem levar à insulina resistência (as células deixam de ser sensíveis à insulina, no sentido de não permitirem a entrada da glicose e daí uma acumulação da glicose no sangue, predispondo à pré-diabetes e diabetes). Segundo a opinião de certos investigadores, a Insulina Resistência (Síndroma metabólico, Sindroma X) é e será umdosproblemasdesaúdepúblicadoséculoXXIpelasuaassociaçãoàsdoenças crónicas do foro da medicina interna, nomeadamente a diabetes II, obesidade, e um cortejo de situações clínicas indesejáveis. Infelizmente a Insulina Resistência (Síndroma X ou Metabólico) é ainda um termo pouco conhecido do grande público, que continua obcecado pela “psicose” do colesterol devido à sua associação às patologias cardiovasculares (aterosclerose, AVC...), primeira causa de mortalidade nas décadas recentes nos paísesindustrializados(sobretudonosE.U.A.).Recentementeestesfactoscomeçam a ser contestados pela investigação, uma vez que já se começa a conhecer melhor a etiopatogenia da aterosclerose, começando pela constatação de que cerca de 50% dos enfartes do miocárdio ocorrem em pessoas com níveis de colesterol aceites como “normais”. Neste caso o nível de uma substância, a homocisteína (aminoácidopresentenosangue),parecesermaiscredívelcomofatorderisco,ou mesmodeumcertotipodeLDL(maucolesterol),nomeadamenteodaspartículas mais pequenas, para não falar da necessidade da presença prévia de uma inflamação, factor cada vez mais aceite como o principal factor determinante da doença coronária do coração confirmado pelo teste de Proteína C Reativa de alta sensibilidade. Isto, contudo, em nada invalida a tomada de precaução em relação à colesterolémia (taxa do colesterol e seu tipo no sangue), cuja interpretação cabe aos verdadeiros especialistas, uma vez que já se sabe que a participação do colesterol alimentar no desenvolvimento das patologias cardíacas é pequena, e que70a75%docolesterolpresentenosangueéfabricadopelopróprioorganismo para cobrir as suas necessidades, nomeadamente para a produção da vitamina D, hormonas sexuais (masculinas e femininas), e hormonas corticoesteróides (cortisona,porexemplo).Cadavezmaissepensaqueocolesterolétãoresponsável pelas doenças do coração, ou a causa das mesmas, como os cabelos brancos são responsáveis pelo envelhecimento, ou a causa do mesmo. Um outro grupo de alimentos da civilização industrial é constituido pelos óleos vegetais (girassol, soja, sésamo, milho), todos ricos em ácidos gordos poli saturados ómega 6, cujo excesso de utilização e consumo os torna tóxicos para o organismo, como adiante se verá. As margarinas, tidas como gorduras vegetais saudáveis, e que resultam da solidificação das gorduras vegetais líquidas, foram quimicamente transformadas por hidrogenação em gordura semi-sólida para se assemelharem à manteiga. A hidrogenação, mesmo parcial, permite aumentar o período de conservação, evitando o ranço. São as célebres e malfadadas gorduras “trans”. Todas essas novas gorduras sintéticas são metabolicamente desconhecidas pelo organismo, e, portanto, prejudiciais à saúde, havendo cada
  • 16. 16 vez mais investigadores que as consideram grandes fatores de risco para as doenças cardíacas. Umoutroproblemaassociadoàindustrializaçãodosprodutosalimentares está na adição do sal em excesso, quer para preservação dos produtos, quer puramente para efeitos gastronómicos. O mau hábito de consumo de excesso de sal é um problema educacional de base que se manifesta na maioria das pessoas em problemas de hipertensão sanguínea e respetivas complicações no foro cardiovascular, muito embora o assunto da hipertensão por excesso de sal, para certos investigadores, seja discutível. A imensidade de novos produtos alimentares no campo da pastelaria e confeitaria,praticamentetodosàbasedefarinhas(hidratosdecarbonocomplexos de cereais refinados), aos quais se adicionam açúcares, gorduras transformadas, aditivos químicos dos mais diversos (os célebre E- dos rótulos das embalagens, que visam praticamente manipular as características do produto alimentar pela cor, sabor, durabilidade com vista a promover e aumentar as vendas legalmente), e que globalmente são caracterizados pela sua elevada densidade calórica (hipercalóricos), é motivo de alta preocupação pelo impacto negativo que estes produtos têm na saúde. Estes acabam por contribuir não só para toda a problemática associada ao excesso de peso por gordura (diabetes II com todas as consequências), mas também, a médio e longo prazo, para outros problemas de saúde do foro da medicina interna, que por ora se desconhecem. Outroramoalimentaremcrescimentoexponencialétambémocampodas bebidasadoçadasporaçúcaresnaturaisesintéticosque,nofundosãoconstituídos por água adoçada acrescida de um ou mais produtos para justificar o nome. Todas elas são de elevada apetência, e o seu marketing é de uma imaginação impressionante, só justificado pela margem de lucro. Esses produtos alimentares de fácil acesso, baixo preço e com larga clientela, as crianças principalmente, são presentemente dos maiores responsáveis pelas patologias associadas ao excesso de peso (obesidade), e diabetes II, deste grupo etário. As“bebidas doces” são, no fundo, uma fonte de calorias ”vazias” (alimentos praticamente sem micronutrientes como vitaminas, e minerais): não saciam, mas contribuem para um aumento de consumo de calorias. Muito recentemente já se especula, com alguma base científica, que os doces provocam uma viciação (efeito de droga), sendo como tal explorada pela indústria alimentar. O ramo alimentar de produtos processados e industrializados, como o das carnesepeixes,pecanormalmenteporexcessodesal,aditivos(comoéocasodos conservantes), e por tratamentos com altas temperaturas. Os organismos geneticamente modificados (OGM), como o milho e a soja transgénicos,sãoconquistasrelativamenterecentes,cujofuturonaalimentaçãose auguracomplicado,umavezquetemsidoaltamentediscutidaasuaproblemática no campo da toxicologia alimentar. Há estudos recentes que demostram que são umperigoparaasaúde.Presentementeumapercentagemmuitíssimoelevadade milho e soja são OGM e estão presentes em um sem fim de alimentos, e, como tal, nos pratos do nosso dia-a-dia.
  • 17. 17 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA Evolução da dieta alimentar ao longo dos tempos O homem atual é, em termos genéticos (99,9%), praticamente idêntico ao Homem primitivo (caçador e recolector) e, como tal, a sua fisiologia, nomeadamente o seu metabolismo, é a mesma. O homem primitivo, caçador e recolector de alimentos, alimentava-se, comoomnívoro,deprodutosanimais(carnedecaça,pescado,ovos)edeprodutos vegetais (folhas, raízes, frutas da estação). Há cerca de dez mil anos, quando começou a dedicar-se à agricultura (revolução agrária), com o“cultivo de plantas e domesticação de animais”, iniciou o consumo de novos produtos comestíveis, como cereais, leguminosas e leite de outras espécies animais, possivelmente desconhecidos ou raramente consumidos até então.Tratou-se possivelmente da primeira grande revolução alimentar: dieta agrária. Os cereais e as leguminosas passaram a ser alimentos básicos e, mesmo presentemente, para a maioria dos médicosenutricionistas,sãoconsideradosalimentosdeelevadovalornutricional, nomeadamentequandocompletos/integrais(boafontedeenergia,proteína,fibra, vitaminas minerais, fitoquímicos), ao contrário da opinião dos investigadores da relativamenterecenteescoladadietapaleolítica,quedefendemqueosalimentos a consumir deverão estar de acordo com as características programadas no ADN ou do genoma de origem do homem primitivo e como tal esses alimentos não estariam incluídos. Assim,nãoseráporpuracoincidênciaque,atualmente,muitomaispessoas do que se pensa são “sensíveis ou intolerantes” ao “glúten”, tipo de proteína resultante da associação de duas outras proteínas (gliadina e glutenina) presente noscereais(trigo,aveia,cevada…),edaí,possivelmente,ajustificaçãodapresença nos rótulos das embalagens de certos produtos alimentares da designação “ausênciadeglúten”parapessoascomdoençacelíaca(doençaalérgicatraduzida por uma má absorção de nutrientes por lesão ao nível do intestino delgado com todasassuasconsequências).Hácientistasqueacreditamqueoglútendoscereais afeta a saúde das pessoas, mesmo sem sintomas típicos da doença celíaca. Uma outra família de proteínas dos cereais e leguminosas, as lectinas, podem também afetarnegativamenteosintestinos,lesandoasvilosidadesintestinais,interferindo na reabsorção de nutrientes e funcionando como anti nutrientes. A possível participação na artrite reumatoide e em certas doenças auto imunes torna ainda mais complexa a problemática do consumo dos cereais e leguminosas, que são genericamente aceites como alimentos de excelência, nomeadamente o cereal trigo, quando integral. Uma outra substância que está presente em quantidades elevadas nos cereais e leguminosas é o ácido fítico que “adere” aos minerais, ao cálcio, ao ferro, ao zinco e ao magnésio presentes nas sementes, tornando-os não absorvíveis. Como se depreende, a matéria é altamente complexa e discutível, mas o facto é que existe. No campo do leite, o problema não será muito diferente. O leite materno é o melhor e único alimento completo para bebés nos primeiros meses de vida, e o não aproveitamento desse dom da natureza paga-se caro. A frequência da amamentação é mínima (escassos dias) devido aos mais variados motivos,
  • 18. 18 destacando-se a má informação. É de lamentar! O marketing feito nos últimos anosàvoltadoleitecomoalimentodeexcelênciaparaaprevençãodaosteoporose (doença associada à falta de cálcio nos ossos predispondo a fraturas) é lastimável. Acontece que o homem é o único mamífero que consome leite depois de desmamado, e nos animais – como a vaca, o hipopótamo, o elefante, enfim, todos mamíferos, mas herbívoros – os ossos suportam centenas e milhares de quilos. Curiosamente, países com maior ingestão de cálcio de origem láctea tendem a ter mais, não menos, fraturas da anca (E.U.A, Nova Zelândia, Suécia, entre outros). E mais comentários poderiam ser feitos sobre a matéria. A intolerância à lactosedoleiteéumproblemaqueafetacercade70a75%dapopulaçãomundial principalmente a de origem asiática e africana, que é incapaz de digerir o leite por carência do enzima digestivo láctase, que, fisiologicamente, após o desmame ou pouco depois deixa de ser fabricado pelo organismo. O facto de o leite e os lacticínios serem produtos agradáveis e aceites como bons alimentos para muitas pessoas, nomeadamente para aqueles que o toleram, é uma coisa, o facto de o seu consumo dever ser incrementado como preventivo da osteoporose já é outra coisa. A produção de leite de vaca é, nas últimas décadas, uma atividade empresarial da agricultura, assente basicamente no modelo de produção intensivo-industrial e, como tal, está inserida numa economia de mercado. O leite que se bebe é uma mistura de largos milhares de litros de explorações diversas e sabe-se que a presença de anti-infeciosos (antibióticos para tratamento de infeções das glândulas mamárias) é frequente. Isto para não se falar da hormona de crescimento utilizada como estimulante de uma maior produção, como se depreende da leitura nas embalagens de certas marcas nos E.U.A.:“este leite não contém hormona de crescimento”. Nocampodascarnesoproblematambémécomplexo.Acarnedeoutroraera basicamenteprovenientedeanimaisdepastoreio–poucogordamasequilibrada em ácidos gordos poli saturados ómega 6 e 3 –, apresentando uma ausência de substâncias tóxicas de origem ambiental. Nas décadas recentes, a integração das empresas agrícolas na economia de mercado“obrigou”a que a produção de carnes,porexemploadebovino,sejafeitapelomododeproduçãointensivo.Neste tipo de produção uma boa parte da engorda é na maioria das vezes feita contra natura, isto é: os animais estão confinados, e são alimentados frequentemente com rações à base do cereal milho e subprodutos da industrialização (bagaços de soja) – alimentos não consumidos pelos seus homólogos “selvagens” e cada vez mais de origem transgénica e sob a influência de hormonas anabolizantes, sintéticas ou não, antibióticos, entre outros. Como consequência, o teor em gordura, nomeadamente a saturada das carnes da produção animal intensiva, é muito superior ao das carnes de animais de pastoreio, apresentando assim uma percentagemmuitomaiselevadadeácidogordosómega6emrelaçãoaoómega3, com destaque para o ácido araquidónico (ácido gordo ómega 6 pró-inflamatório, fabricado no organismo animal a partir de ómega 6 alimentar), e a muito provável presença de hormonas anabolizantes, anti-infeciosos. O ácido alfa-linolénico, (molécula“mãe”dafamíliadosácidosgordosómega3,presentenasfolhasverdes,
  • 19. 19 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA nas nozes, na pera abacate, nos peixes gordos) e o ácido linoleico (molécula ”mãe” dafamíliadosácidosgordosómega6,presentesnopasto,milho,soja,amendoime respetivosóleos),sãoácidosgordosessenciaisqueoorganismonãoécapazdeos fabricar, e uma das suas funções é a de constituírem respetivamente as matérias- primas de construção de substâncias anti-inflamatórias e pró-inflamatórias do organismo. O forte desequilíbrio daqueles ácidos gordos poli saturados nas dietas alimentares atuais (os ácidos gordos ómegas 6 chegam a ser dez a vinte vezes superioresaosácidosgordosómega3,quandonãodeveriamexcederpossivelmente duas a três vezes) é aceite como um dos grandes responsáveis pelas doenças inflamatórias crónicas do foro da medicina interna das últimas décadas, sendo o ácido araquidónico (A.A) o precursor de mensageiros inflamatórios (leucotrieno B4, prostaglandina E2). Por outro lado, os ácidos gordos polinsaturados DHA (ácido dodosahexanóico) e EPA (ácido eicosapentanóico), da família dos ácidos gordosómega3,comportam-se,noorganismo,comoprecursoresdemensageiros anti-inflamatórios (como a prostaglandina E3, o leucotrieno B5, as resolvinas, e as protectinas). Também se sabe que as células gordas do tecido adiposo, nomeadamente as da região abdominal, são muito ativas e não simples locais de depósito e armazenamento de gorduras, desempenhando um papel importante no fabrico de mensageiros inflamatórios como a interleucina 6, que é uma das mais potentes moléculas inflamatórias. É neste contexto de novos e recentes conhecimentos que se verifica o estímulo ao consumo de peixes gordos de águas frias (sardinhas, salmão) e de suplementos alimentares à base de ácidos gordos ómega 3, nomeadamente o EPA e DHA presentes nos óleos de peixe e no krill (invertebrados semelhantes ao camarão). Uma das suas grandes funções é atuarem como precursores de mensageiros anti-inflamatórios no organismo, contrariando o papel inflamatório dos ómegas 6 em excesso nas dietas atuais. Hoje em dia o excesso de peso por gordura é frequente e certos estudos clínicoseepidemiológicostêmvindoademonstraraexistênciadeumacorrelação entre o grau de adiposidade, a saúde e bem-estar. O índice de massa corporal (o quociente entre o peso em quilos e a altura em metros ao quadrado) é um índice técnico frequentemente utilizado na prática para averiguar esse grau. Há tabelas que permitem avaliar o I.M.C., considerando valores inferiores a 18.5 (baixo peso), de 18.5 a 24.9 (peso correto/normal), de 25 a 29.9 (peso a mais/pré-obeso), e superiores a 30 (obeso, com diversos graus I,II,III). Todavia, esse índice não se aplica, quando o excesso de peso se deve a elevada massa muscular, como é o caso de certos atletas. Também a medição da cintura (perímetro abdominal) pode dar uma ideia do grau de adiposidade (as mulheres com cintura superior a 87.5 cm e os homens com cintura superior a 100 cm são considerados obesos). As doenças crónicas do foro da medicina interna (mais de cem), presentemente as predominantes no mundo ocidental industrializado, constituemapreocupaçãomáximadasautoridadesdesaúdeporsedesconhecer a sua verdadeira etiopatogenia, daí a terapêutica ser puramente sintomática.
  • 20. 20 Do pouco que se conhece, sabe-se que todas elas, embora aparentemente não relacionadas, como a rinite alérgica e não alérgica, a asma, as doenças cardiovasculares, as artrites (osteoartrite, artrite reumatoide), e a obesidade, têm umdenominadorcomum:ainflamação.Ainflamaçãoéumcomplexomecanismo de defesa e de reparação inato contra todo o tipo de agressão a cargo do sistema imunitário. A inflamação aguda, que toda a gente conhece, manifestada por sintomas(edema,rubor,caloredor),éomecanismoinatoeprimitivoquepermitiu a sobrevivência do homem até aos nossos dias, quando as agressões microbianas eram as principais causas de mortalidade. Com a evolução e presentemente com a imensidade de novos agentes «agressores», nomeadamente as de ordem química, houve possivelmente uma adaptação de defesa por parte do sistema imunitário em que a inflamação continua a ter o seu papel com a diferença de ser provocada por agressões excessivas e frequentes e não se apresentar com os clássicossintomas,nomeadamentepelaausênciadedor,passandodespercebida (inflamação silenciosa) e daí o perigo. A inflamação silenciosa pode levar anos a manifestar-se através de uma doença crónica (aterosclerose, lúpus, acne, alergia, asma, entre outras) cujos sintomas são em função da região do corpo afetada. As inflamações são reguladas bioquimicamente por substâncias conhecidas por eicosanóides (ácidos gordos polinsaturados de longa cadeia fabricados no organismo a partir de outros ácidos gordos, ómega 6 e ómega 3, nomeadamente A.A. e EPA.) e que funcionam como as clássicas hormonas. A relação daqueles ácidos (A.A. / EPA.) é utilizada por certos investigadores para determinar o grau de inflamação silenciosa e respetivos riscos, ou o teste de Proteína C Reativa. Presentemente também se sabe que o nível de glicose e a insulina no sangue interagemcomaproduçãodosácidosgordospolinsaturadosnoorganismo,como o A.A. (pro-inflamatório), influenciando o desenvolvimento da inflamação. Enfim, paradoxo dos paradoxos: havendo desde há escassas décadas, no mundo ocidental industrializado, uma abundância e variedade de alimentos de fácil acesso aos consumidores, o principal problema da saúde pública deriva do consumo exagerado e frequente de certos produtos alimentares, quer os transformadospelaindustrialização,(espéciedealimentosoupseudo-alimentos) quer os naturais da agricultura intensiva e da aquicultura. De facto, uma segunda revolução alimentar, a dieta industrial, teve lugar ao longo do século XX, mais intensamenteapartirdasegundametade.Ohomempassouaconsumiralimentos caracterizados basicamente por fatores como: elevado índice de glicémia, forte concentração energética (hipercalóricos), elevada percentagem de gordura “trans”, forte desequilíbrio nos tipos de gorduras (ácidos gordos polinsaturados ómega 6 e ómega 3), um muito menor nível de fibras, de micronutrientes (vitaminas, minerais) e fitoquímicos contra o que era habitual. Ou, por outras palavras: nutricionalmente inferiores e metabolicamente inadaptados à sua genética(ADN)comasdevidasconsequênciasnefastasparaasaúde,comoexplicaa NutriçãoGenómicaeciênciasafins(nutrigenética,epigenética),ciênciasrecentes, queestudama“expressão”dosgenesresultantedainteraçãodosmesmoscomos fatoresextragenéticos/exposoma(qualidadedosalimentos,estilodevida,stresse).
  • 21. 21 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA Nesta perspetiva, o alimento deixa de ser não apenas uma fonte de energia mas também uma fonte de“informação”para os genes, permitindo a sua“expressão”. A interação entre o genoma (ADN), a nutrição (dieta alimentar) e a saúde será um dospilaresdamedicinadofuturo.Nãoépormeracoincidênciaqueoaumentoem espiral das doenças crónicas ocorre com a mudança do regime alimentar, como sucedeu, com maior incidência, a partir da segunda metade do passado século XX. Estudos clínicos e epidemiológicos comprovam tal facto, muito embora ainda não se saiba explicar em rigor a verdadeira etiopatogenia das diversas doenças crónicas,emqueoexcessodepesoporgorduraeaobesidadeparecemseroponto central. Sempre houve pessoas gordas e obesas, mas o seu número era ínfimo, ao contrário do que presentemente parece ser norma, como nos E.U.A.. Na U.E., em certospaíses,tambémjácomeçaaserumproblema,inclusiveemPortugal,anível das crianças, por excesso de consumo de produtos à base de hidratos de carbono refinados e açucarados e bebidas adoçadas (refrigerantes). Da mesma forma como existem mecanismos fisiológicos inatos para o controlo de certos padrões de normalidade (como a temperatura corporal, a glicemia e o balanço hídrico), essenciais à manutenção da constância do meio interno (homeostasia), deverá haver, segundo certos investigadores, um mecanismo para o controlo da energia armazenada (gordura corporal). A descoberta de substâncias como a leptina e a adiponectina, atuando como hormonas ao nível do sistema nervoso central nos centros de saciedade e apetite do hipotálamo e funcionando em sistema de feedback, parece comprovar tal hipótese. A gordura corporal (armazenamento de energia) no homem primitivo pode ser interpretada como um mecanismo de sobrevivência contra a escassez periódica de alimentos e de calorias, sendo o seu controlo, presentemente, cada vez mais imperfeito e complexo, devido basicamente à abundância de oferta de alimentos (naturais de agricultura intensiva, aquicultura e os transformados pela industrialização) e ao excesso de sedentarismo. Estamos em crer que, quando os fatores “agressores” são excessivos e frequentes, contrariando uma resposta fisiológica do organismo tendo em vista a homeostasia, as células deixam de lhes ser sensíveis, tornando-se resistentes. Da mesma forma como a utilização excessiva de uma chave pode tornar impossível a abertura de uma fechadura, também um excesso e frequente consumo de hidratos de carbono refinados e de açúcares, predispõe à diabetes 2 pela insulina resistência. Como tal não será descabido aceitar que um excesso e frequente consumo de calorias deveria predispor à obesidade pela saciedade resistência. Situaçõesclínicascomodiabetes2eobesidade,queeraminexistentesnohomem primitivo, devem-se basicamente às diferenças na dieta alimentar e ao modelo de vida (sedentarismo, stresse frequente e excessivo) do homem atual. O séc. XXI será, portanto, um século complicadíssimo em termos de saúde pública, em que as doenças crónicas do foro de medicina interna terão de ser rapidamente combatidas, uma vez que as principais causas de morbilidade e mortalidade de outrora (doenças infeciosas, infecto-contagiosas e parasitárias) foramousãopraticamentecontroladaspelosavançosnocampodaprevençãoda
  • 22. 22 medicina profilática (profilaxia higiénica, médica e sanitária) e terapêutica (anti- infeciosos, antiparasitários). O que comer Apósestasconsiderações,emboramuitogenéricas,ocidadãoconsumidor fará naturalmente a seguinte pergunta: o que comer? É uma pergunta aparentemente descabida, pelo menos no mundo ocidental atual em que há superabundância e variedade de produtos comestíveis, muitos dos quais (como os transformados/processados) os nossos antepassados não distantes jamais denominariam alimentos. De facto, se possivelmente há cerca de dez mil anos ocorreu a primeira revolução alimentar com o consumo de novos alimentos naturais e completos (verdadeiros alimentos), foi no séc. XX, e mais concretamente a partir da segunda metade (1950), que ocorreu a verdadeira e grande revolução alimentar (dieta industrial),passandoohomemaconsumirprodutoscomestíveis,nomeadamente os transformados/processados cujas características são metabolicamente desconhecidaspeloorganismooumelhor,donossogenoma(ADN),comtodasas consequências negativas para a saúde e o bem-estar. Apesar das diferenças económicas entre os diversos países, a maioria dos produtoscomestíveissãoescolhidospelosconsumidoresbasicamenteemfunção da segurança sanitária, do gosto, do preço, e, naturalmente, do grau educacional e do modelo de vida, não lhes passando pela mente que a sua dieta alimentar possa ter alguma relação com o crescimento em espiral, nas últimas décadas, das doenças inflamatórias crónicas, que no nosso entender, se deve à longa“lavagem do cérebro”que todos sofremos sem darmos por isso, aceitando como“normal”, os componentes alimentares da dieta industrial de há décadas. O homem atual continua, em termos genéticos e fisiológicos, praticamente idêntico ao homem primitivo (caçador e recolector de alimentos) de pelo menos há cinquenta a duzentos mil anos (50.000 - 200.000) uma verdade, difícil de “engolir” para a maioria dos cidadãos. Antes de mais convinha informar os leitores que tiveram a paciência de se terem debruçado sobre este artigo de que o seu autor tem como hobby favorito, dos últimos trinta anos, a nutrição humana, tendo vindo a acompanhar a sua evolução pela leitura atualizada de livros, escritos de revistas de autores nacionais e estrangeiros, (médicos, nutricionistas, jornalistas científicos), estes sendo maioitariamente americanos, cujas obras premiadas como bestsellers os tornam, no seu entender, suficientemente credíveis. Embora tenha constatado divergênciasentreautoresemalgunsaspetos,frutopossivelmentedanecessidade de justificar as suas obras ou, entre outros, por certos aspetos nutricionais não serem claros e pelas dificuldades inerentes à investigação científica no homem (amostragem, duração da experiência, custos), penso que uma alimentação saudável, no atual contexto cultural e sócio-económico, deverá assentar, grosso modo, nas seguintes normas: consumo mínimo de alimentos transformados/ processados/ /
  • 23. 23 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA industrializados; menorconsumo,sepossível,dealimentosnaturaisoriundosdaagricultura intensiva (vegetal e animal) e da aquicultura; maior consumo de alimentos naturais e completos/integrais, se possível biológicos, quer vegetais quer animais e pescado selvagem (capturado). Na minha opinião, bem como na dos especialistas que consultei, uma alimentaçãosaudável,dependeessencialmentedotipodealimentosconsumidos (naturais, transformados/industrializados), incluindo o modo de os confecionar, nãoesquecendo,naturalmente,amoderaçãonoconsumo.Aquantificaçãoexpressa em unidades de peso ou em percentagens, por exemplo de macronutrientes (hidratos de carbono, lípidos/gorduras e proteínas) associadas às calorias, é matéria,sejustificável,paraespecialistasesituaçõespontuais.Ohomemcomeçou a preocupar-se com as “calorias ” e outros aspetos nutricionais há relativamente escassas décadas; quer derivado de uma das“doenças crónicas da civilização”do foro da medicina interna, quer por motivos” estéticos”. A verdade é que, salvo situaçõespontuais,aesmagadoramaioriadoscidadãosnuncasepreocupoucom a alimentação no sentido nutricional/médico, do termo. A preocupação estaria mais na possibilidade de garantir uma refeição para ”matar a fome”, conviver. O tipo, variedade ou diversidade e moderação do consumo de alimentos são aspetos fundamentais numa dieta alimentar saudável. A diversidade dos verdadeiros alimentos, como os provenientes da agricultura e pescas, significa possibilidade de ingestão de uma gama maior de diferentes nutrientes, uma vez que, à exceção do leite materno na fase inicial de vida, nenhum alimento é completo em termos nutricionais. O transporte e meios de conservação, uma das grandes conquistas do século XX, nomeadamente a rede de frio, são fatores que possibilitam o consumo de uma grande variedade de alimentos ao longo do ano. Amoderaçãoéumconceitodesignificadodiscutívelpelasuasubjetividade, mas compreensível. Todos os excessos originam frequentemente desequilíbrios nutricionais; de facto, a individualidade biológica (genética) origina a não existência de dietas alimentares universais e daí o conselho de especialistas para situações pontuais. A procura de uma alimentação ou dieta alimentar saudável tem sido,nas últimas décadas, quase uma obsessão por parte dos governos, instituições, e investigadores, que, por motivos diversos, não dizem abertamente que é a“dieta alimentar industrial dos nossos dias” a principal responsável pelo aumento em espiral das doenças crónicas não transmissíveis do foro da medicina interna, cujas consequências sócio económicas e na saúde pública são incomensuráveis. O problema sendo grave desde há décadas, tornou-se gravíssimo nos últimos anos, pela associação cumulativa da saúde com a crise económica e financeira. As pirâmides alimentares e as rodas de alimentos surgem como guias de aconselhamento para uma alimentação saudável de forma a minimizar os efeitos negativos da dieta industrial. Os alimentos são associados em grupos com semelhantes propriedades nutricionais e respetivas quantificações – matéria complexa e mais que discutível. Continuamos a pensar que o modelo alimentar
  • 24. 24 do homem primitivo (caçador e recolector de alimentos) deveria ser ainda uma fontedeinspiraçãoemerecerumaatençãoespecial,umavezqueháfundamento científico assente em estudos antropológicos, arqueológicos e clínicos. No entanto,nummundocomcercadesetemilmilhõesdehabitantes,opragmatismo terá o seu papel no sentido de olhar para um ideal, respeitando a realidade e, daí, a complexidade para a sua solução. O problema atual da saúde pública no campo das doenças crónicas está em saber até que ponto o homem é capaz de se adaptar à dieta alimentar das últimas décadas sem o recurso frequente à medicação sintomática e paliativa como forma de minimizar os seus efeitos negativos na saúde e no bem-estar. De facto, acreditamos que só com uma nova mutação ou mutações no genoma humano, do tipo da que possivelmente ocorreu há cerca de nove mil anos, em relação ao gene para a láctase (enzima digestivo para a lactose do leite), numa parte da população humana de então, como forma de adaptação ao consumo de leite na dieta alimentar da revolução agrária, será possível inverter tal situação, facto que, no nosso entender, é no futuro pouco ou nada provável. Uma solução possível, mais correta e viável, é proceder a uma revolução no campo alimentar, começando pela educação (informação), investigação e implementaçãodeummodeloagrícolasustentado,comoobiológico,apesardos enormes custos sociais económicos e financeiros pelo menos a curto termo. Sendo a escolha de alimentos um fator indiscutível para uma dieta alimentar saudável, é essencial, para não dizer fundamental, combater o sedentarismo, outro grave problema da vida moderna, uma vez que a influência deste no metabolismo é elevada, havendo quem pense que a falta de exercício do homem moderno é tão negativa como a má nutrição. O simples andar, subir escadas, estar menos tempo sentado, lavar o carro, entre outras actividades, são atos que todo o cidadão pode realizar diariamente, e a velha desculpa da falta de tempo não pega, tendo todo cabimento o velho ditado“enganar os outros é fácil mas enganar-me a mim mesmo…”. A proliferação de ginásios é, dentro de certos limites, uma consequência e a prova disso. Conclusão Tudo leva a crer que, havendo uma correlação de facto entre a dieta alimentar, cada vez mais globalizada, dos países ricos e industrializados ocidentais e o desenvolvimento exponencial das doenças crónicas – conforme opiniãocrescentedeinvestigadores,médicos,enutricionistas–,somosobrigados a aceitar que estamos perante um grave problema, cuja solução é demasiado complexa pelas suas implicações no campo socioeconómico e, naturalmente, político, mas que em nada invalida a necessidade de que algo deva ser feito e depressa. Temos consciência da existência de um número aceitável de cidadãos que foram e são periodicamente informados e alertados pelos diversos media da problemática advinda do consumo de certos alimentos, mas a verdade é que o problema alimentar é tão grave que deverá merecer um tratamento especial,
  • 25. 25 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA paranãodizerrevolucionário.Asaúdedoscidadãosultrapassadelongeasopções políticas associadas ao modelo de desenvolvimento económico, repartição de riquezas, entre outros, pelo que os mesmos têm o direito de serem, no mínimo, bem informados para decidirem, independentemente da sua classe social. Estamos plenamente conscientes de que continuar a colaborar na manutenção de uma situação real e lesiva para as gerações futuras coloca-nos numa posição indesejável, daí a razão do presente artigo, que pretende ser, acima de tudo, um ALERTA. Professor Doutor Armando Almeida
  • 26. 26 DR. LOURENÇO DE CASTRO Estudou Gestão Começou por ser professor de Educação Visual Pertenceu à Direção de Empresas Multinacionais de Retalho Especializado Passou pela Direção de Hipermercados Gosta acima de tudo da VIDA e dos seus detalhes Fascina-o conhecer e aproximar PESSOAS Viajens Gastrónomicas Parágrafos soltos … Perante o convite de falar sobre alimentação, não fui capaz de recusar. Escrever será mais difícil, mas tentarei ultrapassar o desafio. Alimentação para o comum dos Portugueses não é uma necessidade, mas simumprazer.Abasedoamordeperdiçãopelacomidareside,emprimeirolugar, na qualidade dos produtos da nossa culinária, desde o peixe de mares fortes, às carnes de pastos naturais, passando por legumes e frutas com sabores raros – noutras regiões temos os ingredientes para os prazeres da boa mesa portuguesa. A boa disposição e o prazer da amena cavaqueira tornam a mesa num local de culto, a ideia de que “um bom garfo deve comer muito” é um obsoleto paradigma, onde na sua base a “alimentação é de salutar”. E concordo que “prolongar as refeições é um erro cultural”. Como em quase todas as áreas, assistimos a uma falta de preparação para estetema.Emmuitasoutrasáreaspartimosdoprincípiodequeaspessoasnascem ensinadas.Ospaisempurramparaaescolaeaescolaempurraparaospaismuitas matérias que as pessoas são obrigadas a absorver por autodidatismo. Visitei a Feira de Chocolate, em Paris, e, no meio de tamanha azáfama, deliciei-me a ver uma aula de introdução ao Chocolate para miúdos de 5 a 8 anos. Uma professora ensinava as crianças a descobrir o Chocolate. Numa visita ao Museu Picasso, em Paris, assisti a uma aula para crianças frente a um dos mais famosos quadros do pintor. A professora, com perguntas abertas, fazia as crianças descobrirem o quadro. Estes dois exemplos mostram como se deve fazer descobrir as coisas boas da vida.  Ensinar a descobrir a gastronomia na vertente sensorial e na vertente prática parecem dois eixos onde é importante investir. Sou uma pessoa aberta a descobrir e experimentar a alimentação de várias culturas e povos. Enquanto escrevia estes momentos cogitei felizardamente esta
  • 27. 27 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA humilde apreciação. Adapto-me bem e consigo descobrir os sabores e a forma de confeccionarótimosmanjaresdosDeuses.Adorocozinhar,epartodasdescobertas que vou fazendo para a minha criatividade. Hoje em dia assiste-se a muitas tendências na culinária, mas defendo que a base deva ser a tradicional, pois as raízes não se devem perder. Voltandoaotema,queéalimentaçãoenãogastronomia.Aalimentaçãoéa principal base para uma vida saudável. Um regime alimentar que nos traga saúde e bem-estar é sem dúvida um motivo para ser feliz. As pessoas que conseguem manter o seu equilíbrio são mais felizes. Esta sociedade atual, sem tempo e sem espaço para uma alimentação saudável,leva-nosporcaminhosperigosos,dosquaissónosdamoscontaquando o corpo manifesta alarmantes sinais. Nonossomundoosaleoaçúcarsãodoiselementosutilizadosemexcesso, principais inimigos que nos assombram nos dias festivos, nas reuniões familiares, no convívio com amigos. Paraosestudiososdeixoumapergunta:porqueseráqueascoisasquemais adoramos na alimentação são aquelas de que não devemos abusar? Este“faz mal”e“não devemos comer”são o grande dilema da alimentação atual. Porque da alimentação também fazem parte os líquidos, nesta matéria também somos bafejados por todas as delícias, desde a água da cerveja ao vinho. Anecessidadedenoseducarmosparabeberemquantidadecertaesabersaborear tudo o que a bebida tem é um desafio, devendo ser conseguido um equilíbrio. Gostaria de ter tempo para desenvolver alguns destes tópicos, trabalhar mais na arquitetura do texto, mas infelizmente o tempo é escasso. A última conferência que ouvi de José Saramago foi na Universidade de Arquitetura de Lisboa, a convite do meu amigo José Manuel Castanheira. Na conferência do José, ele falava de uma “Edite Piaff”, vestida de preto e sem mais adornos. Perante aquele mesmo discurso, eu chorava e a minha companhia ria, o que me fez confirmar que, de facto, perante a mesma realidade, somos tão diferentes a sentir e a saborear. Há dias, a saborear meia dúzia de vieiras o tempo parou; o meu filho diz muito baixinho: “estas vieiras têm tudo: o que lhe puseste no tempero, e o que sentiste ao confeccioná-las”. Gostava de partilhar mais sobre alimentação e menos sobre gastronomia, mas este texto está a fazer-me sentir um gastrónomo apaixonado. Grato por“contigo”partilhar ideias, experiências, sentimentos e paixões. Manuel
  • 28. 28 DR. DUARTE FILIPE BATISTA DE MATOS MARQUES Licenciatura em Relações Internacionais Frequência de Mestrado em Relações Internacionais/ Assuntos Europeus Consultor DeputadodoPSD–pertenceàscomissõesparlamentares Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas [Suplente] Comissão de Assuntos Europeus Comissão de Educação, Ciência e Cultura Comissão Parlamentar de Inquérito à gestão do BES e do Grupo Espírito Santo A REFLEXÃO DOS NOSSOS ATOS Nunca pensei que alguém tivesse a coragem, ou ousadia, ou mesmo irresponsabilidade de me pedir para escrever um texto para um livro sobre alimentação saudável. Depois de pensar vários dias sobre o tema, e de ter perguntado à coordenadora do projeto se era mesmo a mim que queria convidar, percebi, finalmente, que podia dar um contributo. Muitos não se apercebem mas a segunda maior causa de morte entre os jovens, logo a seguir ao trauma, não só na Europa mas em todo o mundo, são as doençasassociadasaproblemascardiovasculares.FoiporissoquenaAssembleia da Republica promovi uma resolução sobre a‘’alimentação e vida saudável’. A vida que muitos levamos, tal como eu, obriga a um grande esforço e disciplina para conseguir promover uma alimentação saudável e equilibrada. Hoje raramente surge a oportunidade de almoçar ou jantar em casa, de fazer umadietaequilibradaaolongodasemana,oudeprogramardevidamenteanossa alimentação. São cafés a mais, pequenas refeições saltadas, demasiadas refeições em restaurantes, que não são culpados pela nossa indisciplina, e falta de tempo ou capacidadedesacrifícioparaumaatividadefísicaquecompensetodosesteserros. Felizmente a sociedade Portuguesa está cada vez mais desperta para os problemas da obesidade e as consequências que isso traz. Fico contente de ver mais gente na rua a correr, as lojas de comida saudável com mais clientes, e as secções de produtos hortícolas e frutícolas  dos supermercados cheios de gente. Porém, não obstante isso, as estatísticas não desarmam, os números não baixam, antes pelo contrário. Por isso, nesse projeto que atrás mencionei
  • 29. 29 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA propunha uma rotulagem sobre os níveis calóricos dos alimentos, pois acredito, cada vez mais, que a disciplina alimentar passa muito por um maior conhecimento sobre os alimentos que consumimos. A educação alimentar começa em casa, no que aprendemos, no que preparamos para o nosso dia. Não devemos ter complexos, ou vergonha, de trazer connosco uma “típica” marmita, um reforço alimentar, uma peça de fruta que nos possa servir de “muleta” ao longo de dia. Tenho a certeza que se houver um mínimo de esforço, um melhor conhecimento dos alimentos e um planeamento atempado, qualquer um de nós, com vidas mais ou menos ativas, pode ter uma alimentação saudável. Duarte Marques
  • 30. 30 MAFALDA AURNAUTH Nasci em Lisboa, e, apesar de ter ingressado na Faculdade de Medicina Veterinária, foi o Fado e uma carreira na Música que tomaram conta do meu percurso profissional, que tem já 20 anos. Tendo 7 álbuns de originais editados e tenho levado esta Arte um pouco a todo o mundo. Continua a fascinar-me a comunicação e ligação com os outros, e uma evolução pessoal e profissional a todos os níveis. A ESSÊNCIA DA ALIMENTAÇÃO NO INDIVIDUO Ao longo de toda a vida a alimentação ocupa um lugar preponderante no desenvolvimentodapessoa,enquantoparteintegrantedasociedade.Associa-sea comida a encontros familiares, festividades, comemorações, prazer, mas também desde muito cedo encaramo-la como um mundo cheio de tentações, pecados e restrições. O acesso a uma informação clara sobre os beneficios de diferentes hábitos alimentares é essencial. Só muito recentemente se comunica com clareza os terríveisefeitosdoaçúcar,etalacontecenumaerajácompletamentedominadae manipulada por isso, especialmente se falamos de crianças. Outro ponto muito importante é evitar tudo o que não é natural. Difícil, muito difícil. A facilidade de qualquer coisa embalada, especialmente para quem vive em viagem, é muito tentadora. É essencial procurar informação sobre todos os tipos de alimentação que, com mais ou menos garantia, nos podem trazer todo o tipo de benefícios, quer por serem provenientes de uma cultura cuidada e de confiança, quer pelas suas propriedades altamente nutritivas. Muitos destes tipos de alimentação são extremamente agradáveis depois de nos desabituarmos dos vícios diários, culturais e rotineiros. Hoje em dia, a diversidade e oferta de superalimentos é incrível, e a junção da satisfação que esses alimentos bem confeccionados nos pode trazer com uma sensação de leveza, de energia e vivacidade é preciosa. Quem tiver um historial de distúrbios digestivos, dores de estômago, dores de intestinos,enxaquecas,retençãodelíquidosetantosoutrossintomas,sabebemo valor de se sentir bem no seu corpo. Cuide-se! Não se prive do que gosta, mas descubra outras coisas que goste
  • 31. 31 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA e que também gostem de si. As informações que recolhi guardo e divulgo neste momento ao leitor: Evitar químicos e produtos que não sejam naturais - evitar embalados ou alimentos processados, refrigerantes, adoçantes artificias; Evitar as farinhas brancas e os açúcares refinados; Evitar fritos e gorduras – cozinho sobretudo em panelas antiaderentes; Tomarumbompequeno-almoço,umalmoçoequilibradoondeoslegumes serão sempre metade do prato e o restante só proteína ou por vezes um cereal, e fazer um jantar leve, guardando para dias de festa as loucuras que muitas vezes nos apetecem ao fim do dia, depois de um dia grande e cheio de turbulência. Beber bastante água ou líquidos como chá. Se entendermos a alimentação como nossa “amiga” e os cuidados como “bons parceiros”, esta acabará, eventualmente, por nos levar a um lugar muito mais confortável e prazeiroso, e a um bem-estar precioso e infinitamente mais gratificante do que o que as más escolhas alimentares nos podem trazer, por muito enganador que seja o seu efeito no momento. Mafalda Aurnauth
  • 32. 32 RITA BORRALHO É uma Atleta Olímpica Portuguesa que representou o Sport Lisboa e Benfica durante 20 anos. Foi uma das melhores da sua geração em provas de atletismo de meio fundo e fundo, nacionais e internacionais (na difícil década de 80 e inicio dos anos 90), a par de nomes como Carlos Lopes e Rosa Mota, entre outros. Sobressaiu nas distâncias de 10.000 metros e maratona, sendo recordada como a primeira grande maratonista portuguesa a nível internacional, contribuindo para o sucesso daquela que foi considerada a “geração de ouro” do atletismo português. Venceu a maratona de Barcelona em 1982, a maratona de New Jersey em 1986 e a maratona de Lisboa em 1991. Atualmente desempenha as funções de assessora desportiva, apoiando atletas profissionais e amadores, numa vertente direcionada não apenas para o desempenho desportivo como também para a saúde e o bem-estar geral. Sempre permaneceu ligada ao atletismo em Portugal e no Brasil, e, entre outras actividades, foi criadora, em parceria com a atleta olímpica por si treinada, Janete Mayal, da assessoria desportiva Mayal Athletics, no Brasil, fundadora do Maratona Clube do Brasil, e fundadora da assessoria desportiva RB Running, em Portugal. A ALIMENTAÇÃO NO DESPORTO Comoatletadealtacompetiçãoquefui,eagoratreinadora,tentofazeruma alimentação o mais saudável possível. A atividade física requer um corpo são e mente sã, dois elementos imprescindíveis ao sucesso da minha profissão. O pequeno-almoço é realmente a refeição mais importante para começar o dia em plena forma e em equilíbrio perfeito depois de uma boa noite de sono. O descanso é igualmente importante. No que diz respeito à área da alimentação tento criar diariamente um pequeno-almoço diferente, variando conjugações entre leite, cereais, fruta, iogurte, mel, e pão integral. Ao longo do dia vou fazendo várias refeições: por norma, a meio da manhã como uma peça de fruta; ao almoço começo sempre por uma sopa, e o prato principal normalmente engloba peixe e salada, terminando a refeição com outra peça de fruta (na minha alimentação, para além das saladas, dou bastante prioridade ao peixe); a meio da tarde, o lanche costuma ser composto por sumos naturaiseumapeçadefruta;aojantar,pormedeitarcedo,costumocomerpouco
  • 33. 33 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA –chegamesmoaserarefeiçãoprincipalemquecomomenos–,apenascomosopa e uma peça de fruta. Paraalémdomeutestemunho,pretendoaindadeixaraquiomeucontributo, alertando para o facto de o exercício físico não se dever fazer em jejum. O corpo é uma potente máquina que trabalha com um motor importantíssimo, que é a nossamente,eaforçaéocombustívelporelatransformadoemestímulo,quenos eleva onde quisermos. Nada se faz sem treino e disciplina! Soluções milagrosas não existem. Tudo depende de nós. Rita
  • 34. 34 DR.ª WENQIAN CHEN Médica. Licenciada pela Faculdade de Medicina Tradicional Chinesa (MTC), no Hospital de Tianjing (China). Entre 1986 e 1992 esteve no departamento de MTC e de Medicina Interna, no Serviço de Urgências do Hospital de Tianjing. Desde 1992 está a exercer em Portugal. É detentora do SPAsia, um Centro de Terapias Chinesas que se dedica à divugação, tratamento e leccionamento da Medicina Tradicional Chinesa. O ALIMENTO COMO EQUILIBRIO ENERGÉTICO Oconceitodedoençaparaafilosofiaorientalévistocomoumdesequilíbrio energético. A doença não é tratada com medicação, mas sim com mudanças de hábitos da vida. O nosso estilo de vida é que influência decisivamente o nosso estado de saúde. Existem três fatores que desencadeiam a doença: 1. Emoções; 2. Fatores climatéricos/ambientais; 3. Hábitos de vida. Os fatores emocionais responsáveis são: 1. Euforia - Fogo 2. Melancolia -Terra 3. Ansiedade - Terra 4. Tristeza - Metal 5. Medo - Água 6. Terror - Água 7. Ira - Madeira Sendo que a cada um dos cinco elementos estão associados os seguintes órgãos: Madeira – fígado, vesícula biliar, tendões, e unhas.
  • 35. 35 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA Fogo – coração, intestino delgado, e sangue. Terra – baço, pâncreas, estômago, e músculos. Metal – pulmão, intestino grosso, pele. Água – rim, bexiga, ossos, e dentes. As emoções repetitivas consomem muita energia ao órgão a que está associado, desencadeando a instabilidade nesse elemento. Os 5 elementos ficam instáveis e daí surge a doença. Os hábitos de vida (como os vícios, o sedentarismo, o excesso de atividade sexualeaalimentação)sãoresponsáveispeloconsumoexageradoedesarmónico de energia, produzindo lentamente desequilibrios energéticos nos vários elementos. Neste sentido, adquirir hábitos saudáveis torna-se imprescindível para manter uma boa saúde visível e palpável. Deste modo, a alimentação torna-se a base para o equilibrio harmónico, pois sem ela não sobrevivemos; devemos preferir alimentos naturais e o mais primitivos possível, como a fruta e vegetais. A natureza dá-nos tudo o que precisamos para viver em harmonia e paz com o nosso corpo, e com os demais. Aproveite, mas não em demasia, os frutos, o sol, a água. Seja Feliz! Wenqian Chen
  • 36. 36 DR.ª ISABEL COSTA Naturopata e consultora alimentar, realizando consultas, aulas, palestras, workshops sobre alimentação saudável. Autora do primeiro livro escrito e publicado em Portugal sobre alimentação crua, intitulado “Pela Sua Saúde!”. Formadora externa no Instituto Medicina Tradicional.  Colaboradora habitual da revista “Zen Energy” e do “Portal Sapo Mulher”.  Co-organizadora do Congresso Multidisciplinar “Alimentação Saudável” e co-fundadora do projecto “Vegan Chef Portugal”. Nomeada Embaixadora da Paz em 2011 pela Federação das Mulheres para a Paz Mundial. FILOSÓFIA ALIMENTAR “Diz-me o que comes, dir-te-ei quem és”. Este velho ditado, que por outras palavras nos remete para uma reflexão de nós mesmos pela constatação dos amigosqueescolhemos,tambémseaplicaàsnossasescolhasalimentareserevela muito mais do que á primeira vista possamos imaginar. A nossa dieta regular dá-nos os seguintes indicadores: 1. A tendência para determinados problemas de saúde; 2. Deficiências vitamínicas; 3. O nível económico; 4. A cultura; 5. As nossas crenças; 6. A nossa postura perante a vida e a natureza; 7. As emoções que condicionam a escolha alimentar; 8. A chamada de atenção do corpo para um distúrbio de saúde. Vamos olhar um pouco para cada um destes aspetos. Se eu estiver a conduzir numa estrada que termina num abismo, a não ser que retroceda no caminho,inevitavelmentechegareiaumpontodenãoretornoecaionoabismo.O mesmosepassacomaalimentação.Seduranteanoseanosadietaforconstituída por carnes, enchidos, fritos, gorduras, e hidratos de carbono refinados, e em excesso, sem alimentos saudáveis como a fruta, os legumes, e os cereais integrais, infalivelmente estamos no caminho do abismo, em que um dia ouviremos o diagnóstico de colesterolémia, ácido úrico, ureia e glicose elevados, que não sendodetidosatempoacarretamumprognósticodeproblemascardiovasculares, hipertensão, arteriosclerose, diabetes, cancro, e demais doenças crónicas que
  • 37. 37 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA invadem a contemporaneidade. Portanto, pelo que ingerimos hoje, podemos facilmente compreender como nos sentiremos amanhã.Também lá diz o ditado“pela boca morre o peixe”! Umaalimentaçãodesprovidadefrutaselegumeséumaalimentaçãopobre em vitaminas e sais minerais, debilitando assim o nosso sistema imunitário, que não terá uma grande capacidade de resistência face às doenças. Sem dúvida que o tipo de alimentos que se come pode revelar o estatuto económico,independentementedeseremossaudáveisounão.Háalimentosque recheiam as mesas das pessoas de um nível económico mais elevado e não são propriamentesaudáveis,comoéocasodomarisco.Poroutrolado,temossituações de pessoas que vivem isoladas nas aldeias, alimentando-se apenas do que a terra lhesdá,sempossibilidadesfinanceirasdeexperiênciasgastronómicascaras,eque têmumaalimentaçãomuitosaudáveleumaqualidadedevidasuperior.Podemos vermuitosexemplosnasaldeiasportuguesasdepopulaçõesidosasquecommais de 80 anos ainda trabalham no campo e não sofrem de doenças mentais (que são cada vez mais frequentes nas cidades – não apenas pela alimentação, mas por vários fatores em conjunto) e que têm uma grande resistência física e qualidade de vida. Cada povo, na sua cultura e costumes, expressa-se na alimentação de acordocomassuascondiçõesgeográficas,clima,alimentosdaregiãoeatémesmo de acordo com a sua própria história. As crenças e tradições manifestam-se em épocas festivas como é o caso do Natal e da Páscoa (a um nível global), e influenciam e condicionam muitas escolhas a nível individual. Existem muitos conceitos que no mínimo são estranhos e revelam um distanciamento muito grande da nossa alma. Um desses conceitosestáligadoaoconsumodecarne.EmalgunspaísesdoOrientecome-se carnedecãoporqueacreditamquedáforçaevigorsexual,sobretudoaoshomens. Felizmente os jovens têm vindo a abandonar esta ideia! Em Portugal, as pessoas que gostam muito de carne em detrimento de peixe dizem que precisam desse alimento em abundância porque “peixe não puxa carroça”(é interessante notar que isto é afirmado sobretudo pelos homens também), e como tal precisam de comer carne para ter força. Mas, os animais que puxamcarroçacomemerva!Osanimaismaisfortesàfacedoplanetanarealidade são herbívoros e também são os de maior longevidade, ao passo que os animais carnívoros têm muito menos resistência física e vivem menos tempo. Portanto se olharmos para o exemplo da natureza precisamos de reformular os nossos conceitos e não aproveitar um ditado popular para justificar a escolha alimentar. Durante milhares de anos, a carne também foi símbolo de riqueza e de uma posição social elevada, e como tal reservada às classes mais ricas, deixando o povo limitado aos cereais e legumes. No Oriente existiu ao longo da história um conceitoidênticoemrelaçãoaoarroz.Oarrozintegraleramaisbaratoedestinado aospobresenquantooarrozbrancodestinadoàsclassesmaisabastadas.Éirónico como o mais saudável era considerado de baixo nível. Em Portugal, até à data da revolução de 1974, a alimentação era simples
  • 38. 38 e a carne não era consumida diariamente. Posteriormente, comer muita carne e encher os carrinhos de compras no supermercado com comida empacotada de toda a espécie, tornou-se um símbolo de melhoria de estatuto social. Felizmente hoje em dia começa-se a ver por outra perspetiva. AnossaescolhaalimentartemumimpactoprofundonaNatureza.Odesejo deconsumodesenfreadodecarnedasociedadeocidentaltemtidoconsequências dramáticas no ecossistema da Terra. Destroem-se milhares de hectares de florestas para criar zonas de pasto para alimentar o gado, extinguindo assim muitas espécies por destruição do seu habitat natural. O aumento da espécie bovina e suína contribui para o aumento da poluição do ar e da água.Todos estes fatores contribuem em larga escala para o aumento do aquecimento global. Os terrenos utilizados em larga escala para alimentar o gado, se fossem cultivados com cereais, poderiam eliminar a fome da face da Terra. Não gostamos de pensar nisto, mas a realidade é que o ato do carniceiro começa com o desejo do consumidor. O nosso desejo de comer carne contribui para a destruição do planeta, para o aumento do aquecimento global, para cada criança que morre de fome no mundo a cada 2 segundos, e para o sofrimento dos animais que são maltratados desde que nascem até à morte, quase sempre agonizante. Talvez o leitor ache que tudo isto é um exagero, mas infelizmente não é. Todas as nossas escolhas têm repercussões no mundo. Pode dizer: mas quem sou eu para mudar o mundo? Sou apenas um ponto neste mar de gente. Pois, mas todosestespontosapensaremassiméqueconstituemomardegenteeenquanto cada um não se consciencializar da sua mudança, continuaremos a viver num mundo de caos. É este o mundo que querem deixar para as futuras gerações? A escolha é feita hoje! O que é que a alimentação revela sobre as nossas emoções? Os alimentos menos saudáveis que escolhemos com muita regularidade são o resultado dos nossos estados emocionais, e por isso se torna tão difícil equilibrar a dieta. Por exemplo: quando uma pessoa se sente triste, o que escolhe comer? Peixe cozido com brócolos? Um bife grelhado com batata cozida? Claro que não! De um modo geral, a escolha recai no chocolate ou nos doces. Quando estamos apaixonados sentimos que não precisamos de comer (ou pelo menos uma dose mínima basta) e até de dormir. Vivemos num estado “iluminado” que nos nutre. Pesquisas cientificas têm revelado que no estado de paixão são libertadas hormonas que nos dão uma profunda sensação de prazer e bem-estar. Por outro lado, quando sofremos uma desilusão essas hormonas diminuem.Ochocolateporseuladocontribuiparaqueelasaumentemumpouco dando alguma satisfação e prazer através do paladar. O chocolate também está associado à sensualidade e é um símbolo de amor entre apaixonados. A tristeza é a emoção que afeta os pulmões, tornando-nos mais sensíveis a constipações e gripes. Com excessos em momentos de tristeza e saudosismo, são as mulheres que têm mais tendência para comer chocolates, os homens preferem petiscos e
  • 39. 39 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA queijos. O chocolate é mais suave e feminino, enquanto o queijo e petiscos são “comida de homem”. É claro que em situações de tristeza também há muitas pessoas que simplesmente não comem ou optam por outros alimentos, mas aqui estamos a ver de um modo geral como se processa a ligação entre as emoções e a escolha alimentar. Airaéaemoçãoqueafetaofígado.Oditadopopularquerefereumapessoa como tendo “maus fígados” não se refere ao órgão, mas ao comportamento de alguém que é muito mal-humorado. Ao manter constantemente este padrão energético irá afetar a energia do órgão. Com esta emoção, a pessoa tem compulsão para carne e alimentos duros para trincar. A pressão que é exercida pelos maxilares para mastigar ajuda a“compensar”esta emoção. A irritação afeta a vesícula e por isso desejamos alimentos fritos, em especial batatas fritas e salgados como croquetes, rissóis, e pastéis de bacalhau. O medo afeta a energia dos rins e compele-nos para alimentos com muito sal. A ansiedade e a preocupação desgastam a energia do estômago (originando gastrites e úlceras) e do baço, e compelem-nos a petiscar um pouco de tudo sem critério específico. Consumir hidratos de carbono (pão, bolachas, massas) diária e excessivamente revela uma grande solidão na alma. A comida torna-se muitas vezes o refúgio, o escape, o “amigo silencioso”, o vício que aparentemente não prejudica ninguém, a não ser o próprio (mas isso é mesmo aparentemente)! Aqui reside a grande dificuldade de equilibrar a alimentação, sobretudo a nível do sexo feminino. Existem muitos processos no subconsciente que nos condicionam.Temos muitos exemplos: a mulher que embora“queira”emagrecer, rapidamenterecuperaoqueperdeu,porumladoporquefezdietasextremamente rigorosas e impossíveis de manter, mas por outro lado pela insegurança de ter perdidoagorduraquea“protegia”.Àsvezesagorduraprotegederelacionamentos, de intimidade à qual se quer distância. O medo de ser notada, de ser atraente, do contacto sexual. O homem, que quer ser o“rochedo”para a sua família e para a sua empresa tem tendência a manter a barriga. É aquele com quem todos podem contar, em quem se podem apoiar sempre, é estável, é seguro; e muitas vezes a barriga mantem-se mesmo com restrições alimentares. Estessãoapenasalgunsexemplos.Éclaroquetemossemprequeconsiderar os problemas glandulares e hormonais, mas na situação de obesidade estes são uma percentagem mínima. A nossa evolução e crescimento interior pressupõem uma reflexão e uma mudança natural na alimentação. Deixo como sugestão uma autoanálise, uma observaçãodosalimentosdesejadosedaemoção,doestadodeespíritoquesevive nomomento.Éumaformadeautoconhecimento,decompreendermosopercurso em que nos encontramos e a partir daí procurar as mudanças mais benéficas e da forma mais sólida, não apenas uma solução aparente, mas a cura da raiz do problema.
  • 40. 40 Só nos é imposto o que nós permitimos. A escolha é sempre individual e a melhor escolha está ao nosso alcance. Basta querer. Basta ouvir o coração e olhar para a nossa alma. O corpo tem uma consciência que nos mostra, pelos nossos desejos, o desequilíbrio emocional, e o modo como isso afeta a parte física. Por exemplo, numasituaçãodecandidíase,sentimosumdesejomuitoforteporalgunsalimentos, como chocolates, queijos gordos e cogumelos. Estes alimentos vão alimentar a Cândida Albicans (que é responsável pela candidíase), fazendo-a proliferar ainda mais, portanto ao analisar o que desejamos comer, podemos perceber o padrão emocional e o que está subjacente no corpo físico. Estamos no tempo de ouvir a consciência do nosso corpo. No nosso carro colocamos o combustível adequado, fazemos as revisões e tudo o que seja necessário para o seu perfeito funcionamento. No entanto, com o nosso corpo, que é precioso e insubstituível, tantas vezes lhe negamos o direito aoqueémelhorparaoseufuncionamentoperfeito,dando-lheoalimentoerrado. Precisamos de repensar sobre a nossa qualidade de vida, e não apenas quando chegamos à velhice: os nossos hábitos ao longo da vida irão sem dúvida condicionar a qualidade de vida que teremos mais tarde. Afinal, estamos sempre a dizer que o bem mais precioso que temos é a saúde, mas fazemos muito pouco para a manter. E o mais irónico é que se chama“fanáticos”às pessoas que tentam viver uma vida com padrões saudáveis quando elas estão a contribuir para o bem de todos e não apenas o seu. Vejamos: quando uma pessoa está saudável, está feliz, pode trabalhar, a família também está feliz, a empresa tem pessoas para trabalhar e todos contribuímosparaobemdanação.Quandoestamosdoentesficamosdeprimidos, de baixa, a família toda sofre, a empresa é afetada, o país sofre as consequências das doenças. Atualmente, pelo menos 70% das doenças derivam de fatores comportamentais, isto é, aqueles sobre os quais nós temos responsabilidade, como é o caso da alimentação. Portanto, precisamos de refletir profundamente. Quandonósmudamoscomconsciência,tudoéfácil,quandonãoqueremos mudar,avidaimpõeamudançapelascrisesquenosapanhamdesprevenidos.Em pleno século XXI, o tempo exige de nós uma reflexão profunda sobre os nossos valores e as nossas escolhas. Cabe a cada um de nós, como entidades únicas e insubstituíveis no Universo, fazer a melhor escolha. Após esta reflexão, surge a questão: o que comer? Independentemente do tipo de dieta que escolherem, é fundamental a ingestão de alimentos crus (de origem vegetal claro!) na proporção mais adequada a cada pessoa considerando vários fatores, como o estado de saúde, época do ano, e muitos mais. Na realidade apenas os alimentos crus mantêm a sua estrutura vital (enzimas, vitaminas, sais minerais) na íntegra, pois a temperatura na qual os alimentos são cozinhados destrói quase tudo, deixando-os completamente desvitalizados. O ser humano morre se a sua temperatura interior chegar aos 42º, e da mesma forma toda a atividade enzimática cessa a partir dos 50º, sem
  • 41. 41 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA exceção. As enzimas são estruturas protéicas essenciais à vida e fazem parte de todas as atividades bioquímicas do organismo, tais como a digestão e absorção dos alimentos, atividade cerebral, equilíbrio hormonal, humor, reposição celular, sistema imunitário, entre outras. Quando nascemos o nosso organismo dispõe de uma determinada quota deenzimas(endógenas),mastambémprecisamosdeingerirenzimasatravésdos alimentos (exógenas). Quanto mais desprovida de enzimas for a nossa dieta, mais enzimas se vão usar da nossa reserva, reduzindo assim a nossa saúde. Esta é uma das causas de doenças degenerativas e envelhecimento precoce. Existem vários fatores que diminuem as enzimas no nosso organismo: Alimentação acidificante e desvitalizada (excesso de produtos animais, fritos, produtos refinados, açúcar, chocolate, álcool, café), e falta de alimentos saudáveis; Stresse e emoções negativas; Uso excessivo de medicamentos e antibióticos; Poluição ambiental e tabaco. Todos estes fatores diminuem a atividade enzimática e acidificam o nosso corpo, contribuindo para vários tipos de inflamações, cancro, problemas cardiovasculares, e osteoporose. Perante isto, precisamos de refletir seriamente sobre os nossos hábitos alimentares. É a nossa saúde que está em risco! Eu sei que a imagem não é agradável,masobifeeacosteletaquetantosgostamsãoalimentosprovenientes de cadáveres de animais, que assim que são abatidos entram em processo de decomposição. Mesmo os animais carnívoros não comem animais já mortos há algumtempoanãosernumcasodefomeextrema,porqueestãoemdecomposição. A carne e outros produtos de origem animal vão acumular toxinas no nosso organismo, que não é“omnívoro”, como tantos interesses da indústria nos querem fazer acreditar. Por exemplo, o aparelho digestivo de um carnívoro tem sucos gástricos mais potentes do que os nossos, o intestino é curto para eliminar rapidamenteenãoputrificarnoorganismo(temde3a5metros)enquantoonosso intestinotem12metros,oquesignificaquenãosendoeliminadorapidamentevai putrificar no nosso intestino, e isso é percetível até pelo cheiro nauseabundo das fezes da maioria das pessoas. As frutas, os legumes, os germinados, as frutas oleaginosas, os cereais integrais, os super alimentos, são os únicos que realmente protegem a nossa saúde: são ricos em antioxidantes, vitaminas, sais minerais, e enzimas; têm uma ação curativa e remineralizadora no nosso organismo; protegem de doenças graves; fortalecem o sistema imunitário; diminuem os níveis de colesterol; mantêm um estado mental e emocional equilibrado; ajudam a emagrecer; diminuem os odores corporais;
  • 42. 42 regularizam o trânsito intestinal; melhoram o estado da pele e cabelo; trazem mais energia vital ao nosso corpo e rejuvenescem. Nem todas as pessoas poderão ou desejarão fazer uma alimentação 100% crua, mas se incluírem na vossa dieta normal pelo menos 50% de alimentos crus e diminuírem o consumo de produtos animais (carne, peixe, leite, ovos, queijos) irão sentir uma alteração profunda no vosso corpo e, na vossa mente, um grau de energia e clareza mental muito mais intensos. Não é possível sentirmo-nos felizes quando o nosso corpo sofre, e ele é parte intrínseca do nosso ser, o nosso fiel companheiro24horaspordiaenquantovivermosnestebeloplaneta.Nãomerece o nosso bom companheiro ser tratado com carinho e comida saudável? A alimentação crua é o elixir da juventude ao nosso alcance, rebobinando todo o nosso sistema para a saúde e felicidade tornando a velha máxima“mente sã em corpo são”a realidade do dia-a-dia. Cadaumtemumpercursoerespeitoavossacaminhadasagrada.Obrigada por fazerem parte da minha vida através desta leitura. Um grande bem-haja para todos. Isabel Costa
  • 43. 43 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA DR.ª MÁRCIA ALMEIDA É presidente da ComMedida IPSS. Naturopata, economista e psicóloga  faz clínica e escreve sobre temas voltados para a alimentação natural, medicinas alternativas, bem-estar e qualidade de vida. Estudou Medicinas Alternativas em Lisboa e em Madrid, abriu uma clínica na margem Sul, onde trabalhou por mais de uma década. Pioneira em Portugal na divulgação da comida viva, com workshops, palestras e consultas, autora do site e blog “Leite da Terra” e autora do ebook “ Cruzinhando - Receitas de Comida Vivas”. A FORÇA DO ALIMENTO NestemeutestemunhovoufalarsobreaComidaVivaemPortugal,oudevo dizer o Crudivoriamo, ou simplesmente Raw Food. Foi em meados de 2003 que comecei a olhar o cru como uma solução para os problemas de saúde dos meus pacientes, mas na realidade só vim a investir de um modo cultural no cru em 2006. Foi um caminho difícil, cheio de altos e baixos, erros e acertos. Além de aumentar o consumo, de um modo que não esperava, em oleaginosas (antes simples aperitivos), hoje um indispensável complemento alimentar. Com uma curiosidade quase infantil assisti ao processo de germinação das sementes, ou, nas palavras da professora Ana Branco, observei as sementes acordando, colocando os “narizinhos” de fora, uma prova indubitável da vida nelas existente. Apesar de em minha casa ser a única a seguir uma dieta crudívora, estava, de facto, animada e motivada a consultar toda a informação disponível relativa ao conceito e à prática de raw food, onde para além do consumo dos alimentos em crú (ou amornados a um máximo de 45º), os ingredientes deverão ser maioritariamente biológicos. Deparei-me com novas formas de fome, mas, verdade seja dita, também conheci novos níveis de saciedade. Foi uma aprendizagem contínua, o saboroso tomou gradualmente outras formas, outros cheiros, outros paladares. O meu corpo sofre as consequências da desintoxicação abrupta. Desde a fase de negação, passando pela barriga inchada, as cólicas, as enxaquecas até a aceitação, a persistência ganhou e eu... Sobrevivi. Aminhacozinhaganhounovavida,orobôdecozinhacomeçouatrabalhar
  • 44. 44 afanosamente em todas as refeições, do pequeno-almoço à ceia; a “panela furada” (um simples coador de voal) passou a ser a minha melhor amiga. Como consequência directa, a minha dieta passou a ser 100% viva, aproximadamente 60%dehortaliçasevegetais,30%defrutase10%degrãos,sementesecastanhas, germinadas.Orawfoodnãopermiteoaquecimentoaquecidasamaisde38°/45º porque destrói a vida dos alimentos. PLANEAR AS REFEIÇÕES Quando se decide mudar os hábitos alimentares para outro tipo de alimentação a que não se está habituado, o mais difícil nos primeiros tempos é reaprender a organizar-se. No fundo, aprender as receitas, providenciar e preparar os alimentos. Quem, numa alimentação tradicional, convidar amigos para uma churrascadaenãotiver,porexemplo,descongeladoacarnecompradanavéspera terá com certeza problemas na hora da refeição. No crudivorismo germinar alimentos é um acto essencial do qual não se pode prescindir nem tão pouco apressar, pois as sementes necessitam de tempo para se completar a preceito. Em alternativa, há a possibilidade de comprar sementes já germinadas em estabelecimentosespecializados,maspagandoumcustomaiselevado,eestando sujeita à sua disponibilidade em stock, o que nunca é garantido. Nas reais emergências posso sempre recorrer as frutas e as saladas. COMO BAPTIZAR OS MEUS PRATOS Umfactoressencialparacativarosrecém-vindosaocrudivorismoéatribuir designações aos pratos confeccionados com alimentos crús, que estabeleçam uma analogia com as receitas da alimentação tradicional. Assim, a utilização de vocábulos como “esparguete”, “soufflé”, “mousse”, criará na mente uma imagem associada aos pratos da cozinha tradicional, que levará, de imediato, a uma maior predisposição para a aceitação de novos sabores, utilizando a memória gustativa paraumpadrãodecomparaçãoinevitável.Douumexemplo:quandochamoaum prato crudívoro de “lasanha de courgette” toda a gente lembrará a tradicional disposição em camadas de tiras de massa alternadas com recheio de carne, mas na verdade, o que irá encontrar serão finas tiras de courgette com recheio de molho de tomate e amêndoas picadas que simula na perfeição a carne da receita tradicional.Ocorreomesmocoma“mousse”dechocolateondeasnatasdãolugar ao abacate batido sendo que a grande diferença é que aqui não terei problemas quando pensar em repetir! Regras Raw Deve-se seguir sempre a regra principal: tudo tem de ser vegano, fresco, integral e maduro; nada é cozido, frito, ou assado, muito menos processado. Pode comer todo o tipo de frutas, vegetais, hortaliças, grãos, sementes e castanhas germinadas. Dados Crus
  • 45. 45 ALIMENTAÇÃO AUSTROLOPITECA Comer Raw food ou ser “crudicista” significa comer grandes quantidades de enzimas vivas – os catalisadores de energia e na digestão que ajudam a restaurar a eficiência do combustível do seu corpo. Segundo o Dr. Edward Howell, o primeiro pesquisador das enzimas, “as enzimas são substâncias que tornam a vida possível. São necessários para todas as reacções químicas que ocorrem no corpo. Sem enzimas nenhuma actividade alguma vez aconteceria. Nem as vitaminas nem os minerais ou as hormonas conseguiriam fazer o seu trabalho sem enzimas.” As enzimas constituem uma reserva limitada e a sua ausência conduz inevitavelmente à morte. A ingestão de alimentos crus evita, assim, a destruição das enzimas que a comida contem, facilitando a digestão e evitando gastar as nossas próprias reservas. Ainda segundo Howell, a falta de enzimas na comida cozida é, também, umadasrazõesmaioresdoenvelhecimentoemorteprecoceeacausasubjacente à maior parte das doenças. Se o nosso corpo está ocupado com a digestão de alimentos cozidos e a consequente produção das enzimas destinados à saliva, ao suco gástrico, ao suco pancreático e aos sucos intestinais, haverá uma produção diminutadeenzimasparaoutrospropósitos.Quandoistoacontece,sofremoutros destinatários da produção de enzimas, como o coração, rins, músculos, e outros órgãos e tecidos. Estafaltadeenzimasocorrenamaioriadapopulaçãodospaísescivilizados, que se alimenta de modo tradicional (alimentos cozidos e processados). Segundo estudos científicos recolhidos ao longo de mais de 40 anos, pelo Dr. Howell,“o homem é o que menos enzimas da digestão dos amidos tem no seu sangue, entre todas as criaturas”. OutragrandepersonagemcrudívorafoiaDra.KirstineNolfi,famosamédica dinamarquesa,falecidaem1967,com66anos,quedescreveuassuasexperiências com os alimentos vivos numa pequena brochura traduzida para varias línguas, e do qual não resisto a tirar um excerto: “(…) Adotei uma alimentação exclusivamente crua porque fiquei gravemente doente. Tive cancro da mama. A doença, é claro, havia sido precedida de má nutrição e maus hábitos durante doze anos de formação hospitalar. Inicialmente, descobri um pequeno nódulo no seio direito. Cansada e sem ânimo, não prestei muita atenção ao nódulo, até cinco semanas mais tarde. Descobri que estava do tamanho de um ovo de galinha. Havia crescido aderindo à pele — um sinal característico do cancro. Como médica, estava suficientemente bem informada para não me querer submeter ao tratamento geralmente usado nesses casos. Lembrei, então, de passar para uma alimentação 100% vegetariana crua. Parti em busca da natureza. Vivi durante algum tempo numa pequena ilha. Tomava banhos de sol durante várias horas por dia, dormia numa barraca e tomava banhos de mar. Alimentei-me exclusivamente de frutas e hortaliças cruas. Mais tarde, introduzi esse hábito de vida no sanatório Humlegaarden. Após dois meses, comecei a melhorar. O nódulo foi regredindo e minhas
  • 46. 46 forças voltaram. Aparentemente, estava curada e senti-me muito bem. Após um ano de boa saúde — persuadida pelo Dr. Hindhede — tentei voltar, a título de experiência, a uma alimentação vegetariana que incluía 50% de alimentos vegetais cozidos. Após alguns meses, comecei a sentir uma dor aguda noseioondeotumorhaviaaderidoàpele.Adoraumentouepercebiqueocancro estavacrescendonovamente.Ocancrovoltaradevidoaosalimentoscozidos.Mais uma vez, voltei à alimentação crua. A dor diminuiu rapidamente e eu senti-me menos cansada. Como médica, achei que deveria usar a experiência adquirida para ajudar outras pessoas doentes. Sob minha iniciativa, foi criada uma sociedade anónima que comprou a propriedade Humlegaarden. Bem adequada ao meu propósito, ela foi adaptada como sanatório onde todos os doentes e funcionários seguiam somente a alimentação crua. Alimentos crus são vivos (…).” Por que razão a alimentação 100% crua exerce um efeito tão comprovadamente benéfico para as pessoas que a adotam? Em primeiro lugar, isso ocorre porque o alimento cru é um alimento vivo, isto é, tal como nos oferece a Natureza. É somente a planta, com as suas finas folhasverdesabertas,queconsegueabsorveraluzsolaretransformá-laemraízes, tubérculos, frutas e sementes. Por isso, tanto os homens como os animais usam as plantas para proporcionar energia solar ao seu organismo. Nessa perspectiva, chamo os alimentos crus de“alimentos vivos”, ao contrário dos alimentos cozidos, que considero “alimentos mortos”. Devemos cuidar para que os alimentos não contenhamsubstânciasquecontrariamaquímicadoorganismodemodoaevitar que os resíduos não fiquem retidos por muito tempo e apodreçam no intestino grosso. Portanto, o melhor alimento é aquele que é totalmente natural — não passou por nenhum tipo de processamento. É ainda preciso acrescentar que o alimento vivo é muito mais fácil de digerir. Os alimentos crus ajudam e fortalecem o organismo de todas as maneiras porque eles contêm enzimas, elementos vivos básicos, e vitaminas que se combinam de forma natural, dissolvendo e eliminando as toxinas. Toda a pessoa sensata percebe que a nossa alimentação atual é muito destrutiva. É a causa mais comum e mais grave das doenças físicas e psicológicas, e da degeneração constitucional do organismo. Precisamos de procurar hábitos de vida, e alimentação, mais saudáveis, se queremos viver melhor agora e no futuro. Não podemoscontentar-nosfazendoconcessõessemcolocaremjogoavidaeasaúde. Precisamos, por isso, de adoptar a única solução correcta, e esta passa por uma alimentação 100% crua. Márcia Almeida