SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 48
Baixar para ler offline
1
ESCOLA DE HUMANIDADES
CURSO DE TEOLOGIA
ROGER MESQUITA HAAG
DIREÇÃO ESPIRITUAL:
NECESSIDADE, HISTÓRIA E DICAS PRÁTICAS
Porto alegre
2023
2
ROGER MESQUITA HAAG
DIREÇÃO ESPIRITUAL:
NECESSIDADE, HISTÓRIA E DICAS PRÁTICAS
Monografia apresentada ao Curso de Teologia
da Escola de Humanidades da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul,
como requisito parcial para a obtenção do grau
de Bacharel em Teologia.
Orientador: Prof. Dr. Pe. Tiago de Fraga Gomes.
Porto Alegre
2023
3
ROGER MESQUITA HAAG
DIREÇÃO ESPIRITUAL:
NECESSIDADE, HISTÓRIA E DICAS PRÁTICAS
Monografia apresentada ao Curso de Teologia
da Escola de Humanidades da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul,
como requisito parcial para a obtenção do grau
de Bacharel em Teologia.
Orientador: Prof. Dr. Pe. Tiago de Fraga Gomes.
Aprovado em 04 de Julho de 2023.
___________________________________
Prof. Dr. Pe. Tiago de Fraga Gomes
(Orientador)
___________________________________
Prof. Dr. Pe. Carlos Jose Monteiro Steffen
4
SUMÁRIO
RESUMO................................................................................................................ 5
ABSTRACT............................................................................................................ 6
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS................................................................ 7
INTRODUÇÃO....................................................................................................... 8
1 NECESSIDADE HUMANA DE DIREÇÃO ESPIRITUAL.................................. 10
1.1 SER HUMANO E SENTIDO DA VIDA........................................................ 10
1.2 SER HUMANO E REALIZAÇÃO: PECADO, JUSTIFICAÇÃO E GRAÇA .. 16
2 DIREÇÃO ESPIRITUAL NA HISTÓRIA ........................................................... 20
2.1 DIREÇÃO ESPIRITUAL NAS SAGRADAS ESCRITURAS........................ 20
2.2 DIREÇÃO ESPIRITUAL NA HISTÓRIA DA IGREJA ................................. 23
2.3 DIREÇÃO ESPIRITUAL NO MAGISTÉRIO DA IGREJA............................ 29
3 PRÁTICA DA DIREÇÃO ESPIRITUAL ............................................................ 33
3.1 CONCEITO DE DIREÇÃO ESPIRITUAL ................................................... 33
3.2 DIRETOR ESPIRITUAL ............................................................................. 35
3.3 DIRIGIDO ESPIRITUAL ............................................................................. 39
3.4 CONVERSA DE DIREÇÃO ESPIRITUAL E SUA PREPARAÇÃO............. 42
CONCLUSÃO ...................................................................................................... 45
REFERÊNCIAS.................................................................................................... 46
5
RESUMO
Esse trabalho apresenta, de maneira introdutória, a importância da prática da
direção espiritual, com base em estudos de especialistas, teólogos, fontes da
Sagrada Escritura e ensinamentos do magistério. Seu objetivo é identificar as
necessidades que levam a essa prática, suas origens e como proceder. Portanto,
o foco da obra está na relação mestre e discípulo, que remonta aos primeiros
religiosos a praticarem a direção espiritual: os padres do deserto. O trabalho visa
responder perguntas frequentes de pessoas que ouvem falar sobre essa prática,
mas não a conhecem profundamente: qual é a necessidade que o homem tem de
ser dirigido? De onde vem essa prática? Como ocorre a direção espiritual e com
quem?
PALAVRAS-CHAVE: Direção Espiritual. Sentido da Vida. Pecado. Graça. Ser
Humano. Realização.
6
ABSTRACT
This work presents, in an introductory manner, the importance of the practice of
spiritual direction, based on studies by experts, theologians, sources from Sacred
Scripture, and teachings of the Magisterium. Its objective is to identify the needs
that lead to this practice, its origins, and how to proceed. Therefore, the focus of the
work lies in the master-disciple relationship, which dates back to the first religious
individuals who practiced spiritual direction: the desert fathers. The work aims to
answer frequently asked questions from people who have heard about this practice
but do not have a deep understanding of it: what is the need for human beings to be
guided? Where does this practice come from? How does spiritual direction occur
and with whom?
KEYWORDS: Spiritual Direction. Sense of life. Sin. Grace. Human being.
Realization.
7
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CIC – Catecismo da Igreja Católica.
CV – Christus Vivit.
GE – Gaudete et Exsultate.
GS – Gaudium et Spes.
LG – Lumen Gentium.
OT – Optatam Totius.
PDV – Pastores Dabo Vobis.
PMP – O presbítero, mestre da Palavra, ministro dos sacramentos e guia da
comunidade, em vista do terceiro milênio.
PO – Presbyterorum Ordinis.
SCD – O sacerdote ministro da misericórdia divina – Subsídio para confessores e
diretores espirituais.
8
INTRODUÇÃO
O trabalho a seguir é um itinerário introdutório à prática de direção espiritual.
O grande objetivo aqui é demonstrar quão necessária essa prática é para o homem
de todos os tempos, principalmente para o homem contemporâneo, que, em muitas
realidades, tem potencializado grandes misérias e vícios do passado.
No primeiro capítulo, o texto vai destacar uma certa necessidade
antropológica do homem, tanto espiritual quanto humana, com base principalmente
em dois autores: Pe. Henrique de Lima Vaz, que, com toda a sua sabedoria,
apresenta uma antropologia na qual o homem é compreendido em três dimensões,
não sendo reduzido à mera condição animal sem a dimensão espiritual; e Viktor E.
Frankl, o grande logoterapeuta dos campos de concentração, que apresenta uma
visão antropológica semelhante, na qual ambas as visões se complementam e
revelam um homem que necessita buscar um sentido para a vida. O capítulo
encerra abordando a necessidade da direção espiritual para a vida espiritual,
evidenciando que o homem, condicionado pela concupiscência, necessita de
alguém que o auxilie a guiar seus passos em direção a uma vida na graça.
No segundo capítulo, após ter diagnosticado a necessidade, o texto vai
abordar a realidade histórica, começando pela Sagrada Escritura, passando pela
história da Igreja e concluindo com a exploração da doutrina presente no magistério
mais atual da Igreja. O interessante deste capítulo é descobrir como essa prática
evoluiu ao longo do tempo e como ainda mantém seu objetivo principal, que é a
busca pelo amadurecimento espiritual em prol da santidade.
No terceiro capítulo, serão apresentadas algumas definições e orientações
práticas para aproveitar bem a prática da direção espiritual. Será abordada a
definição de direção espiritual, quem é o diretor e quem é o dirigido, e o capítulo
será concluído com uma abordagem e dicas práticas de como tanto o diretor quanto
o dirigido podem aproveitar melhor essa prática.
9
Por fim, a pesquisa busca fornecer um subsídio básico para que qualquer
pessoa que o leia compreenda o que é essa prática, qual a sua necessidade e
como proceder para ser um bom dirigido. Que Deus, nosso Senhor, continue a falar
aos corações por meio do seu Santíssimo Espírito e não deixe de chamar
sacerdotes, religiosos e leigos bem instruídos para guiar cada vez mais e melhor o
povo de Deus, que tanto necessita.
10
1 NECESSIDADE HUMANA DE DIREÇÃO ESPIRITUAL
O homem, em sua realidade antropológica, tem necessidade de uma
completude, algo que o faça sair de si mesmo e ir ao encontro de algo ou alguém.
Portanto, é justamente essa a realidade que podemos identificar em uma visão não
meramente filosófica, mas também psicoterapêutica e espiritual do homem. O
homem então, busca não somente um sentido para vida, mas alguém que o ajude
a discernir e encontrar esse sentido que na condição de vida espiritual é o próprio
Deus.
1.1 SER HUMANO E SENTIDO DA VIDA
O ser humano é muito complexo, disso todo ser que se reconhece humano
sabe, mas, é de tamanha preocupação que o homem entenda a fundo o que ele
mesmo é. Sabendo dessa necessidade de aprofundamento antropológico, um
conhecido filosofo brasileiro chamado Pe. Henrique de Lima Vaz, em sua obra
"Antropologia Filosófica: a questão da pessoa”, apresenta uma definição do ser
humano que enfatiza a dimensão relacional do seu ser:
Ser pessoa é ser relação, é estar para o outro, é estar com o outro,
é estar por meio do outro. O homem é pessoa porque está aberto
para a alteridade, para a transcendência, para o Mistério que é a
fonte de todo ser, de todo conhecimento, de todo amor, de todo
valor.1
O Pe, Henrique de Lima Vaz, ainda destaca que essa abertura para a
transcendência não é algo que o ser humano possa escolher ou rejeitar, mas sim
uma condição ontológica inerente à sua natureza: "O homem não escolheu ser
transcendente, não fez opção por essa abertura para o ser; ele é assim, por
natureza, constitutivamente”2 Dessa forma, para o padre Henrique, a
transcendência é uma dimensão fundamental do ser humano, que o impulsiona em
direção ao Mistério divino e à busca de sentido para a sua existência.
1 VAZ, Henrique Cláudio de Lima. Antropologia Filosófica, p. 76.
2 VAZ, Henrique Cláudio de Lima. Antropologia Filosófica, p. 139.
11
O ser humano é uma unidade complexa e integrada, composta por três
dimensões interdependentes. A dimensão corpórea diz respeito ao corpo físico, à
biologia e aos processos fisiológicos que OS mantêm vivos. A dimensão psíquica
abrange os pensamentos, emoções, sentimentos e comportamentos, enquanto a
dimensão espiritual se relaciona com a busca por significado, valores e sentido de
propósito.3
Em relação à dimensão corpórea, Vaz destaca que o corpo humano é uma
realidade fundamental na compreensão do ser humano, pois é através dele que a
pessoa se relaciona com o mundo e com os outros. Para ele, "o corpo é a expressão
sensível da pessoa, é o lugar de sua presença no mundo e o meio de sua
comunicação com ele”4. Quando um homem se encontra com um corpo, entende-
se que só ele em si mesmo não expressa o todo do ser humano, mas, pode-se
dizer que o corpo expressa algo a mais do que só materialidade. Por isso, que
afirma também ter uma dimensão psíquica.
Quanto à dimensão psíquica, Vaz enfatiza a importância da subjetividade na
compreensão do ser humano, afirmando que "a interioridade do ser humano é o
lugar de sua subjetividade e a fonte de seu sentido"5. Nessa dimensão, estão
presentes os aspectos cognitivos, emocionais e volitivos do ser humano. No íntimo
dessa realidade, pode-se entender que nessa dimensão o ser humano é
questionado sobre o sentido da vida e questionando-se sobre isso encontra uma
dimensão ainda mais profunda em si que é a dimensão espiritual, a parte mais
profunda e significativa da vida humana, responsável por dar sentido e direção à
existência. Ele argumenta que a dimensão espiritual é a fonte da transcendência,
da criatividade, da liberdade e da responsabilidade humana.6
Padre Vaz também enfatiza que a dimensão espiritual não pode ser reduzida
a conceitos abstratos ou teorias religiosas. Para ele, a dimensão espiritual é uma
experiência concreta da presença de Deus na vida humana. O homem para Vaz é
um ser com essas dimensões, mas, explica que não se pode pensar essas
3 VAZ, Henrique de Lima. Antropologia Filosófica, p. 139.
4 VAZ, Henrique de Lima. Antropologia Filosófica, p. 81.
5 VAZ, Henrique de Lima. Antropologia Filosófica, p. 104.
6 Cf. VAZ, Henrique de Lima. Antropologia Filosófica, p. 104.
12
dimensões, como que em partes do ser humano, mas deve ser pensado em uma
unidade.
O homem é um ser unitário, total, que compreende uma dimensão
corpórea, uma dimensão psíquica e uma dimensão espiritual, que
não podem ser compreendidas separadamente, mas somente em
sua interconexão. O homem, porém, é mais do que a soma dessas
dimensões. Ele é um ser dotado de unidade, de identidade, de
consciência de si mesmo.7
Nesta passagem, Padre Henrique de Lima Vaz afirma que o ser humano é
uma unidade composta por suas dimensões corpórea, psíquica e espiritual, que
não podem ser compreendidas separadamente. Ele também destaca que o ser
humano é mais do que a soma dessas dimensões, pois possui identidade e
consciência de si mesmo. Essa consciência de si mesmo faz com que o homem
encontre o sentido da sua própria vida.
Segundo Vaz, o sentido da vida pode ser encontrado na busca pela
transcendência e na realização do projeto pessoal de cada indivíduo. Ele afirma
que "o homem é um ser em busca de sentido, e esse sentido não pode ser dado a
ele de fora, mas é preciso que ele mesmo o construa"8
Vaz também destaca a importância da felicidade na vida humana, mas
ressalta que ela não pode ser buscada diretamente, mas sim como consequência
da realização do projeto pessoal de cada indivíduo. Ele afirma que "a felicidade não
é um fim em si mesma, mas sim a consequência da realização do projeto de vida
de cada um"9
O psicoterapeuta Viktor E. Frankl, apresenta uma necessidade de busca por
esse sentido, quando identifica no homem uma realidade chamada “vazio
existência”, que tem por definição a falta do sentido da vida.
O homem está desfocado, pois tempos atrás ele tinha valores e tradições
que ajudavam a seguir em frente. Hoje o homem, sem valores e sem as tradições,
beira o tédio e o não saber o que fazer de sua vida. Frankl nos apresenta essas
afirmações de maneira bem clara:
7 VAZ, Henrique de Lima. Antropologia Filosófica, p. 20.
8 VAZ, Henrique de Lima Escritos de filosofia II: Ética e cultura, p. 21.
9 VAZ, Henrique de Lima Escritos de filosofia II: Ética e cultura, p. 53.
13
Diversamente do que acontece aos outros animais, o homem não
vem imposto por pulsões e instintos o que deve fazer e,
diversamente do homem de outros tempos, não lhe vem imposto o
que deveria fazer por tradições e valores tradicionais. Ora, não
existindo tais imperativos, o homem talvez não saiba mais o que
quer fazer. O resultado? Ou faz o que fazem os outros- o que vem
a ser o conformismo- ou então faz o que outros impõem que ele
faça- que vem a ser o totalitarismo.10
O exemplo que Frankl expõe de um homem que segue o fluxo, ou que vive
conformado com o que os outros fazem, demonstra que o homem está sofrendo:
primeiro com a forma com que o homem é entendido no contexto contemporâneo
(ou seja, sendo apenas mais um em meio a massa, perdendo a cada dia sua
individuação e demonstrando que não segue um sentido próprio que o realize, mas
um sentido em massa). Essa visão é errada, pois nesse caso estaria um homem
que consiste na unidade de corpo, alma e espírito; o homem é um ser individual, e,
ao pensá-lo em massa, o faz adentrar em conformismos que produzem - em massa
- homens vazios de sentido e realização. O mesmo acontece quando, olhando a
segunda afirmação de Frankl, o homem que perdeu suas tradições e valores
adentra em apenas obedecer a ordens e limitar-se ao totalitarismo, o que também
analisa o homem de uma maneira mecanicista, desvalorizando-o de si.
O totalitarismo que o homem se coloca é porque, no fundo, sente que tem
que fazer algo da sua vida; entretanto, por não conseguir encontrar esse "algo" (ao
menos de maneira inicial), prefere seguir aquilo que os outros o impõem, para que
ao menos tenha sua vida dotada de afazeres que o tiram a angústia de se
questionar pelo sentido, mas é importante saber que “O sentido da vida difere de
pessoa para pessoa e de momento para momento. O que é exigido de cada um é
que seja sua própria tarefa.”11
Frankl ainda afirma que o vazio existencial pode se apresentar em diversas
formas, inclusive em buscas de sentido frustradas, como por exemplo a busca de
poder, de dinheiro e sexo. Ainda, demonstra que a libido sexual pode entrar em
proporções desmedidas em relação ao vazio.
O homem que sente o vazio existencial anda como que sobre um labirinto
que não tem caminhos, pois não sabe para onde andar ou seguir fazendo com que
10 FRANKL. E Viktor. Um sentido para vida: Psicoterapia e humanismo, p. 24.
11 FRANKL, Viktor E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração, p.111.
14
o sentimento de angústia e tédio tomem conta dele: “O vazio existencial manifesta-
se principalmente num estado de tédio”12
Por definição, o vazio é a falta de sentido, mas também é ele que move o
homem a buscar um significado para sua vida. De certa forma, é sadio o homem,
uma vez na vida, sentir-se vazio de sentido ou se enfrentar internamente por essa
busca de sentido. O ser humano deve ter esse confronto, para então entender o
valor de se ter um “como” e “para que” viver. O homem que se preocupa com o
vazio não é doente (como dizia Freud), mas, “demonstra sua humanidade”13.
O logoterapeuta analisa em suas maiores obras a importância de se destacar
a vontade de sentido, e, do ponto de vista fenomenológico, pode-se afirmar que a
vontade de sentido é uma necessidade fundamental e básica no homem. É algo
específico e necessário na unidade, pois o homem que não tem vontade de sentido
(ou não tem um sentido) está fadado à morte.
Essa vontade de sentido é algo intrínseco ao homem. Para Frankl, um
logoterapeuta não pode conferir sentidos, mas ajudar a descobri-los, quando diz
“Não podemos dar sentido à vida de outra pessoa, mas podemos ajudá-la a
encontrar seu próprio sentido”.14 O ser humano não deve também ser tirado do seu
próprio contexto, o que levaria a um reducionismo. O sentido propriamente dito não
pode ser passado de geração em geração, como as tradições, mas ele é entendido
a partir de uma situação concreta na vida individual. A logoterapia não diz o que é
um sentido, mas pode demonstrar que ele existe e que o próprio paciente tem um.
Além disso, demonstra que a vida é dotada dele, podendo chegar até o seu último
suspiro sentindo-o e buscando-o.
Pode-se ver que Frankl preocupa-se com as realidades atuais, como por
exemplo com o suicídio, conforme transcrição do trecho abaixo:
Foi desprezado ou esquecido que se uma pessoa chegou a colocar
as bases do sentido que procurava, então está pronta para sofrer,
a oferecer sacrifícios, a dar até, se necessário, a própria vida por
amor daquele sentido. Ao contrário, se não existir algum sentido
para seu viver, uma pessoa tende a tirar-se a vida e está pronta a
12 FRANKL, Viktor E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração, p. 131.
13 Cf. FRANKL, Viktor E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração, p. 22.
14 FRANKL, Viktor E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração, p. 110.
15
fazê-lo mesmo que suas necessidades sob quaisquer aspectos
estejam satisfeitas.15
A pessoa sem o sentido de sua vida perde o caminho abaixo de seus pés.
Para Frankl, não é determinado que aconteça o suicídio, mas uma vida sem um
sentido é como viver sem viver, pois, o sentido fornece a força necessária para
enfrentar qualquer possível acontecimento trágico. O que não tem sentido diante
da vida tende a tirar sua vida, pois, se não há sentido, para onde a vida deve seguir
seu rumo?
É importante destacar essas questões do suicídio analisadas do ponto de
vista de uma “falta de sentido para se viver”, pois é justamente umas das
preocupações de Frankl, que passou por grandes provações de sentido em meio
ao campo de concentração. É um homem que realmente encontrou um sentido para
o qual viver - mesmo que esse sentido seja a publicação dos seus escritos perdidos
em Auschwitz.
A vontade de sentido, para Frankl, é a vontade do puramente humano; ela
alimenta a vontade corporal e psíquica, fazendo assim com que essa vontade
psicossomática seja permeada pela vontade espiritual do sentido, levando o
homem a superar qualquer sacrifício, dor e atividades de limite humano.
Frankl entende que na vida não há momento algum que não se tenha
sentido. Esse sentido pode não estar descoberto, mas “a vida não deixa jamais de
ter sentido.”16. Sempre terá um sentido a ser descoberto. Em qualquer situação
pode-se descobrir o sentido, e Frankl mostra isso quando diz:
Mas não devemos esquecer que podemos descobrir um sentido na
vida mesmo quando nos vemos numa situação sem esperança, na
qualidade de vítimas sem nenhuma ajuda, mesmo quando
enfrentamos um destino que não pode ser mudado. O que
realmente importa e conta mais é dar testemunho do potencial,
unicamente humano, que, em sua forma mais alta, deve transformar
uma tragédia em um triunfo pessoal, (...). Quando não temos mais
condição de mudar uma situação – pensemos em uma doença
incurável, um câncer que não pode ser operado – então somos
estimulados a mudar a nós mesmos.
A mudança interior parte do encontro com o sentido na vida e acarreta o
triunfo do homem sobre a tragédia, quando se desvenda o sentido velado. Quem
15 FRANKL, Viktor E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração, p. 18.
16 FRANKL, E Viktor. Um sentido para vida: Psicoterapia e humanismo, p. 41.
16
encontra um sentido em meio ao sofrimento triunfa, pois é capaz de sofrer, oferecer
sacrifícios e doar-se ao outro. Mas o caminho que se dá entre o vazio existencial e
o encontro com o sentido da vida é um caminho de acompanhamento e diálogo
com algum profissional, com um terapeuta e até um diretor espiritual, pois o
homem, por si mesmo, e por estar sempre sob a influência do pecado, nunca
consegue enxergar o cenário completo, por isso, é preciso entender mais sobre o
ponto de vista espiritual e teológico essa necessidade de sentido e
acompanhamento.
1.2 SER HUMANO E REALIZAÇÃO: PECADO, JUSTIFICAÇÃO E GRAÇA
O pecado é sempre uma escolha do homem contra si mesmo. O homem,
por desobediência ao mandamento do Senhor, escolhe livremente viver segundo
seus próprios preceitos e normas, e é exatamente aí que as coisas se complicam,
pois, age diretamente contra si mesmo. São Paulo diz “Eis por que, como por meio
de um só homem o pecado entrou no mundo e, pelo pecado, a morte” (Rm 5,12.),
“e, ao dizer isso, chama a atenção para o fato de que o pecado é um caminho
seguro para a morte, não apenas biológica, mas também a morte da graça no
homem”.17
O pecado dos primeiros pais exerce uma tremenda influência na vida
humana, inclusive atualmente. Como todos pecam por causa do pecado de Adão,
também todos sofrem as consequências desse pecado, conforme afirmou Leo J.
Treze.
O trágico é que não foi um pecado só de Adão. Como todos nós
estávamos potencialmente presentes no nosso Pai comum, todos
sofremos com esse pecado. Por Decreto divino, Adão era o
embaixador plenipotenciário de todo o gênero humano. O que ele
fez, todos o fizemos.18
O homem, consequentemente, está fadado a tudo aquilo que entrou em seu
coração através do pecado. Por isso, está fadado à morte, fraquezas e doenças,
bem como a outro mal chamado concupiscência. São Paulo deixa claro na prática
17 GARRIGOU-LAGRANGE, Reginald. As três idades da vida interior, p. 350.
18 TRESE, Leo J. A fé explicada, p. 51.
17
o que significa a concupiscência ao afirmar: “Pois a carne tem aspirações contrárias
ao Espírito e o Espírito contrárias a carne. Eles se opõem reciprocamente, de sorte
que não fazeis o que quereis” (Gl 5,17), Assim, pode-se afirmar que a
concupiscência nada mais é do que uma inclinação, um condicionamento que a
carne impõe sobre o Espírito.
A realidade do homem ferido pelo pecado é, de fato, triste. Essa tristeza fica
evidente quando se compara a condição atual do homem com seu estado original,
antes do pecado. Como afirmou Lagrange, é importante lembrar que a humanidade
foi criada em um estado de graça, em que a harmonia e a perfeição reinavam.
Existia nele uma perfeita harmonia com entre Deus e a alma, feita
para o conhecer, amar e servir, e entre a alma e o corpo; tanto que
a alma, de fato, estava submissa a Deus, as paixões ou emoções
da sensibilidade estavam submissas a reta razão iluminada pela fé,
e à vontade vivificada pela caridade; o próprio corpo tinha o
privilégio de participar desta harmonia, no sentido de que ele não
estava sujeito à doença nem à morte.19
O pecado é como uma laranja podre em meio a uma caixa de laranjas boas,
que vai contaminando e deteriorando tudo ao seu redor até que tudo esteja tomado
de podridão. Em virtude da sua falta, Adão transmitiu para a humanidade uma
natureza decaída, privada da graça divina e ferida (Cf. CIC403). Daí se origina uma
vontade inclinada para o mal e fraca para o bem, uma razão tendenciosa ao erro e
uma sensibilidade que busca o prazer de maneira desordenada. Essa condição do
homem ferido pelo pecado é triste, pois ele se afasta cada vez mais da sua
verdadeira natureza e se torna escravo dos seus próprios desejos egoístas.20
O homem vê-se dividido, inteiramente coberto por uma vontade dividida que
“Conserva o desejo do bem, mas a sua natureza está ferida pelo pecado original.”
(CIC 1707). Essa natureza ferida faz com que o homem entre em uma guerra
pessoal e firme, na qual não pode contar somente com suas próprias forças, como
afirma a Constituição Pastoral Gaudium et Spes.
O homem encontra-se, pois, dividido em si mesmo. E assim, toda a
vida humana, quer singular quer coletiva, apresenta-se como uma
luta dramática entre o bem e o mal, entre a luz e as trevas. Mais: o
homem descobre-se incapaz de repelir por si mesmo as
arremetidas do inimigo: cada um sente-se como que preso com
cadeias. Mas o Senhor em pessoa veio para libertar e fortalecer o
19 GARRIGOU-LAGRANGE, Reginald. As três idades da vida interior, p. 350.
20 Cf. GARRIGOU-LAGRANGE, Reginald. As três idades da vida interior, p. 351.
18
homem, renovando-o interiormente e lançando fora o príncipe deste
mundo (cfr. Jo. 12,31), que o mantinha na servidão do pecado.
Porque o pecado diminui o homem, impedindo-o de atingir a sua
plena realização (GS 13).
O homem, que já não pode contar somente com suas próprias forças, agora
conta com as forças de Jesus Cristo, que o redime, liberta e o faz Seu filho de um
modo inimaginável. Ele se incorpora em Cristo, tornando-se um com Ele e
tornando-se filho de Deus21. Essa redenção e libertação do homem são conhecidas
como justificação, que nada mais é do que a “iniciativa divina que arranca o ser
humano do pecado e o restaura na vida da graça”22. Tal iniciativa, acontece pela
redenção dada por Cristo por sua morte e ressurreição. Por sua redenção deixou
para toda a humanidade a Igreja, como nos afirma a Lumen Gentium:
Veio pois o Filho, enviado pelo Pai, que n’Ele nos elegeu antes de
criar o mundo, e nos predestinou para sermos seus filhos de
adopção, porque lhe aprouve reunir n'Ele todas as coisas (cf. Ef 1,
4-5.10). Por isso, Cristo, a fim de cumprir a vontade do Pai, deu
começo na terra ao Reino dos Céus e revelou-nos o seu mistério,
realizando, com a própria obediência, a redenção. A Igreja, ou seja,
o Reino de Cristo já presente em mistério, cresce visivelmente no
mundo pelo poder de Deus. Tal começo e crescimento exprimem-
nos o sangue e a água que manaram do lado aberto de Jesus
crucificado (cfr. Jo 19,34), e preanunciam-nos as palavras do
Senhor acerca da Sua morte na cruz: “Quando Eu for elevado acima
da terra, atrairei todos a mim” (Jo 12,32 gr.). Sempre que no altar
se celebra o sacrifício da cruz, na qual “Cristo, nossa Páscoa, foi
imolado” (1Cor. 5,7), realiza-se também a obra da nossa redenção
(LG 3).
A iniciativa divina também permitiu que o homem, através da Igreja,
recebesse, pelo batismo, essa vida na graça, que é fortalecida pelo sacramento da
confirmação e alimentada pela Eucaristia. O batismo é o sacramento pelo qual o
pecado original é apagado e a vida da graça de Cristo é concedida.23 É justamente
pelo batismo que o homem experimenta a graça da justificação. O Catecismo
afirma que, através do batismo, o homem participa dessa imensa graça e a recebe:
A Santíssima Trindade confere ao batizado a graça santificante, a
graça da justificação, que – o torna capaz de crer em Deus, esperar
n’Ele e O amar, pelas virtudes teologais; – lhe dá o poder de viver e
agir sob a moção do Espírito Santo e pelos dons do Espírito Santo;
– lhe permite crescer no bem, pelas virtudes morais. Assim, todo o
21 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 113.
22 SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 114.
23 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 114.
19
organismo da vida sobrenatural do cristão tem a sua raiz no santo
Batismo (CIC 1266).
O batismo o qual o próprio Jesus enviou seus discípulos a realizar quando
diz “Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as
em nome do Pai, do Filho, e do Espírito Santo” (Mt 20,19). É o início da vida na
graça, é onde o homem inicia sua vida na filiação divina e dá o primeiro passo no
progresso espiritual. É justamente nesse batismo que o homem ferido não só
recebe a cura do pecado, mas também a graça de se tornar filho de Deus, ou seja,
ele recebe a graça santificante, como afirmado no catecismo citado acima.
A graça santificante é o início da santificação na alma, e por ela o homem
mergulha na suprema bondade de Deus, que não mede esforços para se doar:
A graça de Cristo é dom gratuito que Deus nos faz da sua vida,
infundida pelo Espírito Santo na nossa alma para a curar do pecado
e a santificar. É a graça santificante ou deificante, recebida no
Baptismo. É, em nós, a nascente da obra de santificação (CIC
1999).
Por mais que tamanha graça seja alcançada por meio do santo batismo, o
homem ainda carrega algumas “sequelas” da devastação causada pelo pecado em
seu interior. “as consequências para a natureza, debilidade e inclinada para o mal,
persistem no homem e chamam-no para o combate espiritual”24. Para sair vitorioso
nesse combate, o homem deve buscar vencer a si mesmo, mas também encontrar
alguém que o ajude a fazer um bom discernimento daquilo que se apresenta. Por
isso, receber conselhos e ter alguém que ajude o homem a fazer tal discernimento
é fundamental, e a esse aconselhamento dá-se o nome de direção espiritual.
O aconselhamento ou direção espiritual ajuda a distinguir “o Espírito
da Verdade e o espírito do erro” (1Jo 4,6) e a “revestir o homem
novo, criado à imagem de Deus, em verdadeira justiça e santidade”
(Ef 4,24). A direção espiritual é sobretudo um auxílio para o
discernimento no caminho da santidade ou perfeição (SCD 77).
E essa prática tão importante teve lugar ao longo do tempo, desde o Antigo
Testamento até os dias atuais. Ela tem sido explorada e aproveitada pelos homens
que buscam alcançar a graça de viver com Deus na eternidade.
24 SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 14.
20
2 DIREÇÃO ESPIRITUAL NA HISTÓRIA
O ser humano ao longo de todas as eras, em seus momentos mais
desafiadores ou em seus desejos mais extravagantes, sempre buscou orientação
ou conselho de indivíduos mais experientes. Quando as angústias ou os anseios
se relacionam com a esfera espiritual, as pessoas sempre recorreram a sacerdotes,
religiosos e leigos devidamente instruídos, o que a Igreja entende como
aconselhamento espiritual ou direção espiritual. Assim afirma a Igreja, através da
Sagrada Escritura, da Tradição e do Magistério.
Como afirma o Frei Patrício Sciardini OCD:
Não é meu interesse tentar provar, à luz dos grandes mestres das
religiões, a necessidade de termos amigos que possam nos ajudar
a superar dificuldades da vida. Para tal reflexão basta lançar um
olhar ao Antigos Testamento e perceber que Deus não criou o ser
humano e o abandonou a si mesmo.25
2.1 DIREÇÃO ESPIRITUAL NA SAGRADAS ESCRITURAS
A Sagrada Escritura está repleta de afirmações que nos indicam e
fundamentam aquilo que posteriormente será conhecido como direção espiritual. E
algumas dessas passagens podem ser consideradas como fundamentos que
levaram à edificação e orientação dessa prática. Deus inclusive indica que
busquemos por essa prática “Busca o conselho de toda a pessoa sensata, e não
desprezes nenhum conselho salutar” (Tb 4,18). É especialmente feliz aquele que
segue os bons conselhos, pois trata-se da verdade e da sabedoria. Essa sabedoria
participa da sabedoria do Criador. Por parte daquele que é sábio, cabe a ele o
serviço de ensinar e guiar seus seguidores com retidão e constância, pois conforme
a Escritura “O verdadeiro sábio ensina o seu povo e os frutos de sua inteligência
são garantidos” (Eclo 37,27). A dinâmica de ensinar o povo é própria dos sábios,
dos verdadeiros sábios.
25 SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 23.
21
O livro da Sagrada Escritura que poderia ser um guia para a direção
espiritual é o livro dos Provérbios. Em sua introdução, o próprio autor define o
propósito e a finalidade do livro, indicando assim a beleza da vida daqueles que
seguem conselhos: os sábios. Desde o Antigo Testamento até o Novo Testamento,
a Palavra de Deus está repleta de passagens que podem fundamentar essa
realidade de que o ser humano precisa de orientação, ou como se afirma, de
direção espiritual.
Provérbios de Salomão, filho de Davi, rei de Israel; para conhecer
sabedoria e disciplina, para penetrar as sentenças profundas, para
adquirir disciplina e sensatez, -justiça, direito e retidão -, para
ensinar sagacidade aos ingênuos, conhecimento e reflexão ao
jovem, que o sábio escute, e aumente a sua experiência, e o
prudente adquira a arte de dirigir -, para penetrar provérbios e
sentenças obscuras, os ditos dos sábios e os seus enigmas (Pr 1,1-
6)
O Novo Testamento aborda de forma mais profunda a realidade relacionada
ao destino final dos seres humanos, que é a comunhão com Deus nos céus. Há
uma preocupação com as almas e uma espécie de discipulado por parte dos
líderes.
Obedecei aos vossos dirigentes, e sede-lhes dóceis; por que velam
pessoalmente sobre as vossas almas, e disso prestarão contas.
Assim poderão fazê-lo com alegria e não gemendo, o que não vos
seria vantajoso (Hb 13,17).
Essa passagem de Hebreus traz à tona uma realidade muito característica
da obediência, que está no centro e no coração de toda a Sagrada Escritura quando
se trata da santificação da alma e do cuidado com a alma. A própria preocupação
do Senhor com os Seus discípulos, o amor com o qual os aconselhava e guiava
suas almas ao amadurecimento.26
A realidade dos profetas e dos santos patriarcas como diretores espirituais
é muito evidente no Antigo Testamento, mas no Novo Testamento, em Cristo,
dentro dessa importância dada à relação do homem com Deus e como é cobrada
dos próprios fiéis essa familiaridade com Deus para alcançar a perfeição, fica clara
a necessidade do próprio homem perceber essa realidade, “provavelmente, não
pode ser alcançada sem ajuda de alguém experiente nessa comunhão com Ele”27.
26 Cf BETÊ, Eneas de Camargo. Direção Espiritual, 29/09/2017.
27 SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 29.
22
O Senhor Jesus é o próprio mestre, aquele que orienta e guia. Em Seu
evangelho, Ele instrui seus seguidores a buscarem o Reino de Deus e Sua justiça,
prometendo que o restante lhes será acrescentado. Todo o ensinamento de Jesus
é uma prática e uma direção espiritual, pois Ele deseja ser o único mestre da vida
humana. Somente Sua palavra e orientação podem conduzir à vida de perfeição. A
melhor síntese do Evangelho como direção espiritual certamente são as bem-
aventuranças.28
As bem-aventuranças trazem para a humanidade um valor teleológico, ou
seja, um valor que aponta para uma finalidade, um objetivo que o homem busca
alcançar.
Felizes os pobres no espírito por que deles é o Reino dos Céus.
Felizes os mansos por que herdarão a terra. Felizes os aflitos, por
que serão consolados. Felizes os que tem fome e sede de justiça,
por que serão saciados. Felizes os misericordiosos, por que
alcançarão misericórdia. Felizes os puros no coração por que verão
a Deus. Felizes os que promovem a paz, por que serão chamados
filhos de Deus. Felizes os perseguidos por causa da justiça, por
deles é o Reino dos Céus (Mt 5,3-10).
Nessas palavras reside o maior alimento espiritual e a mais bela orientação
que um diretor espiritual poderia oferecer. Elas proporcionam consolo diante das
dores e dificuldades, além de uma orientação clara para que a humanidade aspire
à nobreza de buscar a felicidade nas profundezas do coração de Nosso Senhor.
Nas cartas apostólicas e no livro de Atos dos Apóstolos, encontram-se vários
relatos sobre as direções e orientações espirituais que os apóstolos, ou aqueles
designados pelos apóstolos, forneciam como líderes espirituais nas comunidades.
Era uma prática dos apóstolos, devido ao seu número limitado, deixar pessoas
capacitadas nas principais igrejas primitivas para continuar dirigindo e orientando o
povo local. Esses líderes espirituais eram responsáveis por fornecer direção e
orientação espiritual ao povo daquela região.29
28 SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 39.
29 Cf BETÊ, Eneas de Camargo. Direção Espiritual, 29/09/2017.
23
2.2 DIREÇÃO ESPIRITUAL NA HISTÓRIA DA IGREJA
À medida que o cristianismo começou a se espalhar, foi nesse momento que
surgiu a direção espiritual como a conhecemos atualmente, embora com algumas
diferenças em relação à forma e frequência. Naquela época, parecia mais um
processo de discernimento das reflexões internas daqueles que seguiam os padres
no deserto e almejavam viver uma vida semelhante à deles. Essa busca por
orientação espiritual era feita de uma maneira mais próxima e pessoal, com uma
ênfase no diálogo íntimo do coração.30
No deserto, a direção consiste na transmissão da experiência de
um modo muito prático, frequentemente original. Dá-se ao discípulo
ordens- por vezes absurdas- para quebrar a sua vontade própria ou
para testar sua obediência. Far-se -á o mesmo recitar um grande
número de orações vocais ou será impedido de as recitar... Exigir-
se-á que ele se abandone totalmente nas mãos de seu "formador"
e que ele mostre este abandono numa abertura cotidiana de todos
os seus pensamentos bons ou maus. Este método não é para ser
desdenhado. Tem seus frutos (terá tido também suas vítimas).
Baseia-se sobre a escolha livre de um ancião por um discípulo, que
pode, por outro lado, deixá-lo. Ela é uma relação essencialmente
provisória.31
Os cristãos que viviam no deserto, aos poucos, aproximavam-se da
necessidade de discernir aquilo que percebiam no silêncio e na oração. A graça de
Deus, que fluía no coração humano, falava e chamava o cristão para uma
determinada forma de vida ou para escrever sobre um determinado assunto,
levando-os a buscar alguém que pudesse ajudá-los nesse discernimento, a fim de
esclarecer ou facilitar a compreensão daquilo que Deus, pela Sua graça, derramava
na alma.
Na realidade posterior aos desertos, tanto na realidade anacoreta, ou seja,
aqueles que viviam isolados e sem comunidade, quanto nos cenobitas, ou seja,
aqueles que viviam no silêncio, mas já em comunidades de monges. Os anacoretas
tiveram como fundador Santo Antão, e os cenobitas foram fundados por São
30 Cf BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX.
01/2011.
31 VEILLEUX, Dom Armand. A paternidade Espiritual na Tradição cenobitica, 01/11/1998.
24
Pacômio, sendo ele o autor da primeira regra monástica, que define como o monge
deve viver.32
Os padres do deserto, tanto aqueles que viviam sozinhos quanto os que
formavam pequenas comunidades, sempre adotavam uma dinâmica de mestre-
discípulo. Buscavam um monge mais experiente e idoso com o objetivo de
encontrar orientações sobre características e formas de viver, ou até mesmo para
receber suas instruções a fim de alcançar a graça de Deus por meio delas.33
Nas comunidades monásticas, a abertura de consciência é
institucionalizada ao abade ou prior do mosteiro, ou a algum outro
monge com grande experiência. Dessa forma, a direção espiritual
se torna uma prática comum. Encontramos testemunhos a esse
respeito de representantes da teologia ascética, como Cassiano,
que viveu por muitos anos entre os monges da Palestina, da Síria e
do Egito. Em um de seus livros, ele exorta fervorosamente os jovens
cenobitas a abrirem seus corações ao monge mais velho
encarregado de sua direção; ele pede que eles expressem sem
hesitação ou falsa vergonha seus pensamentos mais secretos e se
entreguem completamente à sua opinião no discernimento do que
é bom ou ruim. Essa recomendação continua válida até hoje.34
Nesse mesmo período, de acordo com o Frei Patrício Sciadini, a paternidade
espiritual exercida pelos padres do deserto não se relacionava diretamente com os
métodos psicológicos contemporâneos, mas guardava certa relação quando se
tratava da ajuda mútua entre mestre e discípulo. A grande diferença reside no fato
de que o método psicológico atual dispensa a palavra de Deus, ao passo que a
direção espiritual nunca pode dispensar a palavra de Deus e a ação da Graça pelo
Espírito Santo.35
Através da vida de Santo Antão, é possível observar que os anacoretas
levavam uma vida dedicada à direção espiritual e à ascese, mesmo que isso não
fosse evidente à primeira vista. As pessoas buscavam esses anacoretas em busca
de graças, orações e orientações espirituais.
Ali passou vinte anos sem interrupção. As pessoas vinham pedir
conselhos, consolos e milagres, embora não deixasse ver por
ninguém. Um dia já não pôde conter a impaciência de seus
admiradores, os quais derrubaram o muro construído por Antão.
Haviam passado vinte anos e não se notavam em seu rosto nem
32 Cf. MARIN, Antonio Royo, O.P. Grandes mestres da vida espiritual, p. 76.
33 Cf.SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 59.
34 MAGAÑA, Guadalupe. Desarrollo histórico de la Dirección Espiritual,17/06/2023. Tradução nossa.
35 Cf. SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 59.
25
em seu aspecto marcas de extrema dureza de sua ascese. Tudo
nele respirava serenidade e pureza.36
O universo cenobita era um pouco diferente, pois os monges se organizavam
em comunidades e seu fundador, São Pacômio, estabeleceu uma regra que definia
várias funções para aqueles que viviam em um cenóbio, como um abade geral,
ecônomo, enfermeiro, entre outros. No entanto, a atenção principal era dada ao
progresso espiritual do monge.37
Procurava-se com esmero a devida instrução espiritual e o
progresso ascético dos monges, para os quais se estabelecia uma
estrita pontualidade, rigoroso silêncio, determinadas preces, etc.
Tudo estava baseado sobre a guarda perfeita da castidade, da
pobreza e da obediência aos superiores, assim como sobre o
exercício de uma rigorosa penitencia.
É importante notar que nesse contexto, os monges não buscavam apenas
conselhos ou discernimento, mas sim uma instrução guiada e uma formação de um
itinerário espiritual, como um plano de vida a ser seguido. Isso demonstra diversas
realidades que também são relevantes no contexto contemporâneo.
Posteriormente, um dos grandes homens responsáveis por difundir a
importância da direção espiritual foi o Papa São Gregório Magno. Através de sua
obra Regula Pastoralis (A Regra Pastoral), ele abordou a formação do clero e a
direção espiritual, porém, aqui a ideia de diretor espiritual não era pessoal, mas sim
como um pastor ou guia das almas em geral.
Foi São Columbano, nos princípios do século VII, quem reintroduziu a ideia
da direção espiritual em um contexto individual. Através do sacramento da
confissão, ele se tornou um guia espiritual para muitas pessoas. No entanto, do
século VII ao XI, não houve grandes avanços ou mudanças significativas na prática
da direção espiritual.38
A partir do século XII, temos uma figura importante na história da direção
espiritual, que é São Bernardo de Claraval. Ele se destaca como um dos grandes
autores a abordar a necessidade da direção espiritual. São Bernardo foi um
36 MARIN, Antonio Royo, O.P. Grandes mestres da vida espiritual, p. 77.
37 Cf MARIN, Antonio Royo, O.P. Grandes mestres da vida espiritual, p. 89.
38Cf BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX,
01/2011.
26
renomado diretor espiritual de sua época e forneceu valiosos conselhos a Eusébio
III, que posteriormente se tornou um santo papa.
São Bernardo deixou claro a importância da direção espiritual ao enfatizar:
“Não sei o que os outros pensam de si mesmos sobre esse assunto; eu falo por
experiência própria e, no que me diz respeito, digo que é mais fácil e seguro para
mim dirigir os outros do que me dirigir sozinho.”39 Ele expressou claramente que a
direção espiritual é, ao mesmo tempo, necessária e um ato de colocar-se sob os
cuidados de outro.40
No século XIII, surgiram as ordens mendicantes e, devido à sua maior
liberdade em relação ao contato com as pessoas em comparação aos monges,
alcançaram um número maior de pessoas. Dessa forma, o desejo e a prática da
direção espiritual também começaram a se estender aos fiéis leigos. Os frades das
ordens mendicantes tinham como principal responsabilidade o cuidado das almas,
que incluía a formação cristã, hoje conhecida como catequese, e a direção
espiritual. Inclusive, o Concílio de Latrão IV menciona a necessidade de que as
catedrais sempre tivessem um sacerdote disponível para realizar essa tarefa.41
No século XV, surge São Vicente Ferrer como uma figura proeminente no
mundo cristão. Ele escreveu sobre a necessidade da direção espiritual e expressou
sua preocupação com a escassez de diretores espirituais em seu tempo. Para ele,
essa escassez era considerada terrível, pois ele reconhecia a importância vital da
direção espiritual. Juntamente com essa época, surge o grande livro de Tomás de
Kempis, Imitação de Cristo, que se tornou um verdadeiro guia espiritual. Após esse
período, teve início a chamada "idade de ouro" da direção espiritual, como afirmou
o padre Manuel dos Santos.
A idade de ouro da direção espiritual está constituída pelos séculos
XVI e XVII, quando os principais artífices da Reforma Católica
divulgaram amplamente os benefícios que a direção espiritual traz
as almas que desejam progredir na vida cristã. Dentre tantos
39 BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011.
40 Cf. BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX,
01/2011.
41 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 46.
27
nomes, cabe citar Santo Inácio de Loyola, Santa Tereza de Àvila,
São Francisco de Sales.42
Durante a idade de ouro, com Santo Inácio de Loyola, surgiu a poderosa
Companhia de Jesus. Santo Inácio apresentou um valioso manual de direção
espiritual, que servia como um guia para conduzir os exercícios de espiritualidade.
Para Santo Inácio, o diretor espiritual desempenhava o papel de testemunha de
Deus e de Seus trabalhos na alma da pessoa que era orientada. Era o diretor
espiritual que auxiliava no discernimento e na identificação das moções de Deus
na alma daquele que estava sendo direcionado. É por essa razão que a direção
espiritual tinha tanta importância na época de Santo Inácio.43
Nesse mesmo período, surgiu uma doutora da Igreja, Santa Teresa de
Jesus, que foi a reformadora da Ordem Carmelita. Ela é amplamente conhecida por
suas obras sobre a vida espiritual. Santa Teresa tinha uma prática de direção
espiritual mais ligada ao sacramento da confissão, especialmente em relação às
suas monjas. Ela enfatizava a importância do diretor espiritual ser letrado, ter amplo
conhecimento e inteligência. Ela mesma teve experiências negativas com diretores
pouco instruídos. Além de atender suas monjas, Santa Teresa também passou a
atender leigos em direção espiritual.44
Santa Teresa tinha uma autêntica direção espiritual, não apenas
para suas filhas espirituais, mas também para alguns eclesiásticos
e fiéis leigos. Nesse sentido, suas cartas para seu irmão Lorenzo
de Cepeda são verdadeiras cartas de direção espiritual,
especialmente no que se refere ao caminho da oração.45
Após o tempo de Santa Teresa, surgiram muitos outros santos conhecidos
e importantes na direção espiritual. Cada um deles tinha suas ênfases particulares,
alguns enfocando mais a moralidade, outros a mística, outros a caridade, e assim
por diante. Dentre eles, é válido destacar nomes como São João da Cruz, Santo
Afonso Maria de Ligório, São João Maria Vianney, São João Bosco, entre outros.46
42 SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 47.
43BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011.
44BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011.
45BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011.
Tradução nossa.
46 BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011.
28
São João Maria Vianney se destacou por sua abordagem altamente
personalizada na direção espiritual, que se assemelha ao que é praticado
posteriormente e atualmente na Igreja. Ele se comportava de maneira distinta com
cada penitente e dirigido, levando em conta suas necessidades e circunstâncias
individuais.47
Após o Concílio Vaticano II, não ocorreu uma certa decadência na pratica da
direção espiritual. Houve, no entanto, mudanças e desafios que afetaram a prática
da direção espiritual. Alguns desses motivos são:
Nos anos setenta, a expressão direção espiritual foi caindo em
desuso, e com ela, como sucede frequentemente na linguagem, a
realidade que significava. Vários fatores somaram nesse fenômeno.
Por exemplo: A desvalorização do sacramento da reconciliação; a
reação a uma visão excessivamente individual da vida espiritual,
considerada elitista, sem levar compromisso social e político, uma
visão exagerada sobre o período anterior; o grande
desenvolvimento das ciências humanas, nas quais algumas das
teorias mais difundidas propagaram exageros contrários à ideia
cristã de ser humano; o fato de que algumas escolas de psicologia
tenham reduzido a pessoa a um conjunto de ideias, impulsos e
reflexos, e um obscurecimento da compreensão da liberdade; a
circunstância de que na pedagogia, tenha havido particular êxito da
apelação à espontaneidade como elemento da formação.48
É importante reconhecer que, embora tenha havido uma desvalorização da
direção espiritual em algum momento, essa realidade não pode ser considerada
um desastre em sua totalidade. Atualmente, observa-se uma retomada e uma maior
aproximação das pessoas em relação à busca por direção espiritual, inclusive por
parte daqueles que antes encontravam dificuldades nesse aspecto. Essa tendência
desperta uma esperança de que mais pessoas possam se beneficiar dessa prática
e, portanto, é necessário aprofundar-se nas orientações trazidas pelo Magistério
sobre o assunto.49
47 BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011.
48 SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 47.
49 Cf. SCIADINI, Patrício OCD, A pedagogia da Direção Espiritual, p. 75.
29
2.3 DIREÇÃO ESPIRITUAL NO MAGISTÉRIO DA IGREJA
O magistério da Igreja, especialmente em uma realidade mais próxima do
tempo atual, abordou o tema da direção espiritual de maneira muito especial na
formação sacerdotal. No entanto, é importante ressaltar que a prática da direção
espiritual remonta a uma realidade milenar, conforme destacado pela própria
congregação para o clero.
O aconselhamento espiritual, chamado também de direção e
acompanhamento espiritual, é praticado desde os primeiros séculos
da Igreja até os nossos dias. Trata-se de uma praxe milenar, que
deu frutos de santidade e de disponibilidade evangelizadora. (SCD
64)
No documento da Congregação para o Clero, intitulado O Sacerdote Ministro
da Misericórdia Divina, destaca-se que a direção espiritual não se destina apenas
a cristãos que não são sacerdotes, mas também que não são exclusivamente os
sacerdotes que podem orientar as almas. Durante muitos séculos, a Igreja manteve
essa prática sob a orientação de monges e sacerdotes. No entanto, ao longo da
história, constataram-se outras realidades em que a direção espiritual se tornou
também algo próprio de leigos bem formados e religiosos.
Mesmo que predominantemente a direção espiritual tenha sido
dada por monges e sacerdotes, sempre existiram fiéis (religiosos e
leigos) – como por exemplo, Santa Catarina – que prestaram este
serviço. A legislação eclesiástica recolheu toda esta experiência e
a aplicou sobretudo na formação inicial à vida sacerdotal e
consagrada. Existem também fiéis leigos bem formados, homens e
mulheres, que desenvolvem este serviço de aconselhamento no
caminho da santidade (SCD 65).
No mesmo documento, há uma preocupação evidente com a formação dos
ministros que também atuam como diretores espirituais, a fim de oferecer uma
prática mais diligente e aprofundada desse tema. Portanto, a Congregação para o
Clero elabora esse documento com o objetivo de fornecer direcionamento tanto
para os diretores espirituais atuais quanto para os futuros (Cf. SCD 66).
A Igreja, em sua ação pastoral, tem sempre a missão de auxiliar os fiéis no
processo de discernimento dos carismas. Para que isso ocorra, é necessário
buscar ajuda e acompanhamento daqueles que passam por essa realidade, e é
nesse contexto que surge a figura do diretor espiritual. É por isso que o magistério
30
se preocupa tanto com essa prática e essa pratica. A direção espiritual não substitui
nem é substituída em todo o conjunto da atividade pastoral da Igreja, mas possui
um lugar específico e fundamental para o funcionamento da vida paroquial e
diocesana, a partir de cada membro que vivencia essa prática.50
Na exortação apostólica Gaudete et Exsultate, o Papa Francisco comenta a
importância do discernimento e aborda como esse processo deve ser realizado de
maneira adequada. Ao utilizar o termo bom conselho, ele certamente faz referência
a um tipo específico de direcionamento espiritual. (Cf. GE 166)
Em outra Exortação apostólica, intitulada Christus Vivit, o Santo Padre
aborda o discernimento dentro de uma perspectiva vocacional e destaca que “Há
sacerdotes, religiosos, religiosas, leigos, profissionais e até jovens qualificados, que
podem acompanhar os jovens no seu discernimento vocacional” (CV 291). Esse
acompanhamento é uma característica intrínseca da direção espiritual, sendo
inclusive um aspecto sempre presente no contexto dessa prática, especialmente
no que diz respeito ao discernimento vocacional. Nesse contexto, o Papa destaca
a importância dessas sensibilidades que podem ser incorporadas à preocupação
do magistério em relação aos diretores espirituais.
A partir desse momento, é possível compreender que o magistério busca
abordar mais profundamente essa prática no contexto da formação sacerdotal e
religiosa, especialmente após o Concílio Vaticano II. Após um sínodo sobre o tema,
a Exortação Apostólica Pós-sinodal Pastores Dabo Vobis vem ressaltar a
importância dessa prática, que foi defendida por São João Paulo II e mencionada
por São Paulo VI.
Também a prática da direção espiritual contribui muito para
favorecer a formação permanente dos sacerdotes. É um meio
clássico, que nada perdeu do seu precioso valor, não só para
assegurar a formação espiritual mas ainda para promover e
sustentar uma contínua fidelidade e generosidade no exercício do
ministério sacerdotal. Como então escrevia o futuro Papa Paulo VI,
“a direção espiritual tem uma função belíssima e pode dizer-se
indispensável para a educação moral e espiritual da juventude que
queira interpretar e seguir com absoluta lealdade a vocação da
própria vida, seja ela qual for, e conserva sempre uma importância
benéfica para todas as idades da vida, quando à luz e à caridade
de um conselho piedoso e prudente se pede a comprovação da
50 Cf. MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual,
p. 45.
31
própria retidão e o conforto para o cumprimento generoso dos
próprios deveres. É meio pedagógico muito delicado, mas de
grandíssimo valor; é arte pedagógica e psicológica de grande
responsabilidade para quem a exercita; é exercício espiritual de
humildade e de confiança para quem a recebe” (PDV 81).
Assim, torna-se evidente a tendência do magistério pós-Concílio de
promover essa prática, principalmente na vida dos sacerdotes e religiosos. O
próprio Concílio Vaticano II, no documento Optatam Totius, enfatiza a importância
do diretor espiritual na formação espiritual dos seminaristas, visando capacitá-los a
se tornarem bons padres, capazes de unir a vida de estudos doutrinários e
pastorais. O documento afirma “A formação espiritual deve estar estreitamente
unida com a formação doutrinal e pastoral graças sobretudo à colaboração do
director espiritual” (OT 8).
Na realidade da formação permanente, o magistério também enfatiza a
necessidade dos sacerdotes serem provedores de amizade espiritual e apoio
mútuo, especialmente nessa prática. O texto da Congregação para o Clero,
intitulado O Presbítero, Mestre da Palavra, Ministro dos Sacramentos e Guia da
Comunidade, em vista do Terceiro Milênio, diz o seguinte:
Também os irmãos no presbiterado devem ser objetivo privilegiado
da caridade pastoral do sacerdote. Ajudar-lhes espiritual e
materialmente, facilitar-lhes delicadamente a confissão e a direção
espiritual, tornar amável o caminho de serviço, ser-lhes próximos
nas suas dificuldades, acompanhá-los com atenção fraterna em
qualquer dificuldade, na velhice e na doença. Eis um campo
realmente precioso para a prática das virtudes sacerdotais (PMP
Cap III, p.3).
O próprio decreto Presbyterorum Ordinis do Concílio Vaticano II, que oferece
orientações para a vida do presbítero, destaca claramente a importância dessa
prática na vida dos sacerdotes, considerando-a uma forma de auxílio para manter
a fidelidade sacerdotal. Isso envolve a oração diária com Nosso Senhor, a visita e
culto pessoal à Sagrada Comunhão (Cf PO 11). Para que um sacerdote se
mantenha fiel, é essencial que ele também se mantenha firme na direção espiritual,
pois por meio dela ele é ajudado a seguir os passos corretos e a discernir, como
mencionado anteriormente, o melhor caminho a ser percorrido diante do mundo em
que vivemos.
A prática da direção espiritual parece estar intrinsecamente ligada ao
sacramento da penitência, já que as pessoas continuamente buscam orientação e
32
conselho para suas vidas nesse contexto. No entanto, a Congregação para o Clero
também destaca a importância dessa prática na vida dos leigos e como ela pode
ajudar a sustentar as vocações na Igreja. Conforme afirmado a seguir:
A descoberta e a difusão desta prática, em momentos diversos da
administração da penitência, é um grande benefício para a Igreja no
tempo presente. A disponibilidade generosa e ativa dos presbíteros
para praticá-la constitui também uma ocasião importante para
determinar e sustentar as vocações ao sacerdócio e as várias
formas de vida consagrada (SCD 73).
O texto da Congregação para o Clero declara que a prática da direção
espiritual, que conduz os fiéis a uma vida de santidade e discernimento vocacional,
é uma prioridade pastoral. Ele pede aos sacerdotes que dediquem seu tempo a
essa obra de auxílio espiritual, orientação e formação dos fiéis (Cf. SCD 71).
Uma conclusão clara que pode ser tirada dessa passagem pelo magistério
é que a prática da direção espiritual auxilia os indivíduos em sua formação e,
especialmente, os ajuda a trilhar o caminho da santidade, que é tão necessário na
vida sacerdotal e religiosa, sobre as quais o magistério predominantemente fala.
No entanto, é importante aprofundar-se no entendimento de como essa prática
pode ser aplicada na vida dos leigos, jovens e daqueles que também aspiram à
santidade. Para isso, é necessário explorar a experiência de descobrir com clareza
o que essa prática é e conhecer um pouco mais sobre sua aplicação na vida real.
33
3 PRÁTICA DA DIREÇÃO ESPIRITUAL
É de suma importância reconhecer a necessidade do ser humano de buscar
uma direção espiritual e compreender como essa prática se desenvolveu ao longo
da história e na vida da Igreja. No entanto, não basta apenas ter conhecimento
sobre a importância e a ocorrência histórica dessa prática; é necessário saber como
colocá-la em prática e compreender como ela acontece na realidade.
Aqueles que desejam vivenciar essa prática devem ser capazes de, pelo
menos, definir o que é direção espiritual, compreender as responsabilidades do
dirigido, identificar quem pode ser um diretor espiritual e como escolher um
adequado. Além disso, é crucial compreender como se preparar para essa prática,
a fim de que seja verdadeiramente proveitosa para a vida espiritual.
3.1 CONCEITO DE DIREÇÃO ESPIRITUAL
A Direção espiritual é fundamentalmente uma ajuda.51 Ela é um auxílio para
o discernimento no caminho da “santidade ou perfeição” (SCD 77). É com base
nessas duas definições que se pode dizer que a direção espiritual é um meio pelo
qual o cristão pode receber ajuda para fazer um reto discernimento da realidade
que o interpela e provoca. Como diz o padre Manoel Augusto dos Santos: “É a
ajuda dada por um cristão (diretor) a outro (dirigido), ajuda essa que capacita o
dirigido a prestar à comunicação pessoal de Deus com ele.”52
Fala-se de “direção” porque aqui está relacionado a outros verbos como
acompanhar, guiar e orientar. Esse termo é comumente trocado por
acompanhamento ou orientação, para que não pareça uma imposição autoritária,
como algumas pessoas pensam. No entanto, ao analisar de maneira mais ampla,
entende-se que o acompanhamento espiritual abrange uma esfera mais ampla e
51 MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual,
p.20.
52 SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p.28.
34
não é tão pessoal como a direção espiritual. O padre Manoel defende a ideia de
que a Igreja sempre acompanha os cristãos, mas a direção espiritual personaliza
mais a prática, enquanto o acompanhamento se estende a uma vivência mais
ampla.53
Há um anseio gravado no homem pela perfeição e pela santidade, como
afirmado acima. São Paulo aos Colossenses (3,1), afirma: “Se, pois, ressuscitastes
com Cristo, procurai as coisas do alto”. E no encontro de Jesus com Nicodemos, é
possível contemplar o próprio Senhor falando “Em verdade, em verdade te digo:
quem não nascer de novo não pode ver o Reino de Deus” (Jo 3,3). (Outras
traduções colocam “do alto”). Esse nascer de novo, ou do alto, é o caminho que é
proposto e oferecido pela direção espiritual.54
A direção espiritual é comparada a uma espécie de treinamento, semelhante
ao que é chamado de coaching no mundo atual, e o diretor espiritual é o coach ou
técnico dessa prática. Para o amadurecimento cristão, a Igreja recomenda essa
prática, pois é através dela que a vida interior do cristão se mantém vibrante.55
Segundo a congregação para o clero, ela tem por objetivo ajudar “a formar a
consciência instruindo a mente, iluminando a memória, fortalecendo a vontade,
orientando a afetividade e, com coragem, encaminhando-se generosamente rumo
à santidade” (SCD 81).
A direção espiritual pode ocorrer de várias formas diferentes. Pode ser mais
intensa no início, pode acontecer mensalmente ou em um período de tempo mais
prolongado, ou mesmo ser realizada apenas uma vez. A Congregação para o Clero
esclarece essa questão ao dizer:
A direção pode ser habitual ou um acompanhamento transitório ad
casum. Além disso, esta pode ser mais intensa inicialmente. É
frequente que alguns fiéis, no caminho da vocação, sintam-se
convidados a pedir a direção espiritual, graças a pregação, a leitura,
aos retiros e encontros de oração, ou mesmo a confissão. Uma
leitura atenta dos documentos do Magistério pode suscitar a
exigência de procurar um diretor com a intenção de viver mais
coerentemente a vida cristã. Esta entrega à vida espiritual conduz a
um maior desempenho na vida social: “a disponibilidade para Deus
53 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p.29.
54 Cf. SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 15.
55 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p.193.
35
abre à disponibilidade para os irmãos e para uma vida entendida
como tarefa solidária e jubilosa” (SCD 86).
O desejo de iniciar a direção espiritual pode surgir de várias maneiras no
coração dos cristãos, como mencionado anteriormente. Isso ocorre porque o ser
humano tem esse desejo e necessidade de ser orientado, conforme afirmado no
primeiro capítulo. É importante que a Igreja promova momentos de espiritualidade
em suas práticas, para que os fiéis tenham a graça de usufruir dessa prática e
alimentar sua vida espiritual. Sempre mantendo em mente que o Espírito Santo é
o grande conselheiro, como afirmado pela Congregação para o Clero: O
acompanhamento e o conselho conduzem também aos meios concretos. Em todo
este processo, é necessário ter presente que o verdadeiro diretor é o Espírito Santo,
enquanto que o fiel conserva toda a própria responsabilidade e iniciativa (SCD 82).
3.2 DIRETOR ESPIRITUAL
O que o diretor espiritual faz é considerado por muitos uma arte, pois quando
se fala em educar as consciências, não se trata de lidar com um material inanimado
como os elementos da natureza, mas sim de trabalhar com pessoas e suas almas.
O frei Patrício, juntamente com outros autores, denomina esse processo como: “a
arte das artes”56. Isso ocorre porque um bom diretor espiritual, como um educador,
reconhece que sua competência não é agir em nome dos outros, mas sim auxiliar
e orientar para que o próprio indivíduo aja e tome suas próprias decisões. Essa
abordagem é considerada uma arte.57
O ofício de diretor espiritual, incluindo os grandes mestres espirituais, muitas
vezes começou com base em sua própria experiência, a partir da qual eles
extraíram princípios para a vida pessoal e para a direção espiritual. No entanto, a
experiência não pode ser estática. É necessário que o diretor espiritual procure
compreender a ação de Deus em sua própria vida e na vida dos outros, pois “Se
56 SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 92.
57 Cf. SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 93.
36
acredita que a sua experiência é “a experiência”, que o seu caminho é “o caminho”,
não será jamais um bom diretor espiritual”58.
Todo diretor espiritual deve reconhecer com humildade que tem
seus próprios limites. Nenhum diretor deve acreditar, e ainda menos
dizer, que é capaz de guiar, ou acompanhar, todos que vêm a ele
(..). Não deve, pois, surpreender-se se as pessoas que vieram bater
a sua porta, não mais voltaram.
O diretor espiritual que reconhece seus limites e entende que é o Espírito
Santo o verdadeiro diretor e guia da alma, está no caminho certo. No entanto, é
importante que exista conhecimento humano para que a graça possa operar. Nesse
sentido, o diretor espiritual precisa ser humilde para reconhecer quando é
necessário encaminhar a pessoa para outro que possa oferecer mais ajuda à alma,
ou quando ele mesmo não possui os instrumentos necessários para lidar com uma
determinada dificuldade que surge.59
O Padre Manoel destaca que um bom mestre espiritual precisa ter ciência,
experiência e o dom do discernimento. Ele aborda a ideia de que, sem esse dom
do discernimento, mesmo que alguém possua conhecimento sobre a história da
espiritualidade e seja versado no tema, pode se tornar um diretor espiritual
medíocre.60
Além disso, o diretor espiritual precisa ter convicções firmes que o auxiliem
a sempre se posicionar corretamente em relação à Igreja, a Deus e à pessoa que
está sendo direcionada:
1.A consciência de que não é nem o modelo nem o modelador: o
modelo é Jesus Cristo; o modelador, o Espirito Santo, por meio da
graça; 2. Seu papel é apenas(..) o de ser instrumento nas mãos de
Deus; as orientações que dá não podem ser “opiniões pessoais”; 3.
A direção espiritual, por ser tarefa sobrenatural(santificadora), deve
apoiar-se, antes de mais nada, nos meios sobrenaturais (na sua
oração, na sua mortificação, em uma solida vida interior, própria de
quem procura seriamente a santidade); 4.Como fruto da vida
interior, o instrumento de Deus estará em condições de manter
58 SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p.197.
59 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p.197.
60 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p.198.
37
aceso o zelo apostólico, a vibração que contagia e leva os outros a
vibrar, a desejar servir e a fazer apostolado.61
O diretor espiritual também deve sempre levar em consideração que ele
desempenha quatro funções essenciais, conhecidas como “ofícios”: o de Médico,
Bom Pastor, Mestre e Pai. Esses ofícios conferem ao diretor espiritual um caráter
e uma identidade específica como diretor.
O ofício de médico no diretor espiritual envolve a capacidade de fazer um
bom diagnóstico da situação apresentada pelo dirigido. Para isso, é necessário
recomendar os remédios adequados. É essencial ter conhecimento das “doenças”
espirituais e saber discernir se é o momento de prescrever um tratamento mais
suave, como um remédio, ou se é necessário um tratamento mais agressivo, como
uma “cirurgia” espiritual.62
O ofício de bom pastor no diretor espiritual consiste em conhecer e
compreender o dirigido, a fim de ajudar a dar direção à sua vida e protegê-lo dos
perigos que podem afetar sua alma. É por meio desse papel de pastor que o diretor
deve falar a verdade com caridade, assim como um pastor que acaricia as ovelhas,
mas também as repreende com o cajado quando necessário, para que
permaneçam atentas. Por essa razão, o diretor espiritual não pode ser apenas um
amigo complacente, mas alguém que tenha a coragem de corrigir, se necessário.63
O ofício de mestre no diretor espiritual é a capacidade de ser um instrumento
nas mãos de Deus para discernir o bem e o mal, identificar o que vem de Deus e o
que não vem. O diretor deve ter conhecimento da vida espiritual e ajudar o dirigido
a descobrir os desígnios de Deus para sua vida. Para isso, o diretor espiritual deve
ser um mestre na oração, um mestre na busca das virtudes, na vida ascética e um
mestre na doutrina. Ele deve ensinar e guiar o dirigido nesses aspectos importantes
da vida espiritual.64
61 SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 202.
62 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 204.
63 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 205.
64 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 205.
38
O ofício de pai no diretor espiritual implica em encontrar o equilíbrio entre
exigência e bondade, evitando tanto a cobrança excessiva quanto a negligência. O
pai espiritual nunca deve demonstrar mágoa, decepção ou desespero, mas deve
mostrar a força e a serenidade de um pai, para que o dirigido não seja abalado e
desista da necessária mudança de vida. O diretor espiritual deve agir como um pai
amoroso, incentivando, corrigindo e apoiando, com o objetivo de ajudar o dirigido a
crescer e progredir espiritualmente65 “Um sacerdote bondoso, “paizão “, pode ser
muito querido, mas quase com certeza vai “mal-criar” as almas, vai deixá-las
enfraquecidas, com vida interior muito frágil.”66
Por fim, é importante destacar algumas diretrizes que podem auxiliar o
diretor espiritual a orientar adequadamente o dirigido. São considerações a serem
levadas em conta: Considerar a vocação eclesial específica do dirigido; Conhecer
a vida concreta do dirigido, incluindo trabalho, família, entre outros aspectos;
Prestar atenção aos passos da vida vocacional, especialmente quando
relacionados a um carisma específico; É oportuno iniciar a direção espiritual com
um itinerário da vida do dirigido; Elaborar um plano de vida é de grande ajuda; No
plano de vida, podem surgir dificuldades e barreiras ao se entregar mais a Deus;
Fazer e empregar propósitos para a vida espiritual é útil; Fomentar a liberdade e a
responsabilidade do dirigido; Facilitar a sinceridade, sendo amável e discreto;
Manter sempre um comportamento caridoso e afetivo; Guardar sigilo
profissionalmente.67
Essas diretrizes podem ser um guia para que o diretor espiritual conduza o
dirigido de forma adequada, respeitando sua vocação, vida concreta e ajudando-o
no crescimento espiritual.68
65 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: Elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 205.
66 SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: Elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 205.
67 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: Elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 209.
68 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: Elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 210.
39
3.3 DIRIGIDO ESPIRITUAL
O fato é que todo ser humano tem o direito de ser guiado e auxiliado a
encontrar a direção de sua vida em relação a Deus. Para que isso ocorra, é
necessário que o dirigido, ou a pessoa que busca esse auxílio, possua pelo menos
algumas disposições humanas. Tomás Rodriguez Miranda, Sj, afirma o seguinte:
Supomos que, para seguir um processo de direção espiritual
suficientemente adequado, é necessário um mínimo de “qualidade
humana” e um mínimo de experiência espiritual da pessoa. Partir
do zero absoluto, ou seja, sem nenhuma ciência e experiência
espiritual, e muito poucas qualidades humanas de auto prospecção
e de relacionamento dialogal, seria estar muito longe de iniciar o
que é essencial à direção espiritual: uma procura profunda do
desígnio de Deus sobre a pessoa.69
A realidade que se apresenta é que o dirigido é aquela pessoa que se sente
chamada a viver a vida espiritual e a buscar de maneira sólida um itinerário de vida
espiritual que o abrace e o ajude a amadurecer. No entanto, algumas bases
humanas são necessárias para que a direção espiritual tenha o efeito desejado e
possa trazer resultados grandiosos para a alma. Portanto, o autor Tomás Rodriguez
elabora uma lista com algumas qualidades humanas e espirituais que o dirigido
deve possuir, mesmo que em um grau inicial.
a. Humanamente, o dirigido deve possuir algumas
qualidades mínimas de cultura que lhe permitam: 1. Ser
aceito por outro e aceitar a si mesmo; 2. Confiar em um
outro ser humano e ser receptivo; 3. Manter-se livre
interiormente e, portanto, ser responsável por suas
próprias decisões (...); 4. Abrir-se sinceramente ao
outro; 5. Comunicar-se expressar-se com suas palavras
sem medos nem bloqueios e de uma forma adequada;
6. Ter suficiente equilíbrio emocional e afetivo de
maneira que suas emoções sejam controláveis em um
mínimo adequado (...); 7. “Ser consciente” do que
acontece com ele (...); 8. Distinguir suas experiências
psicológicas das espirituais (...); 9. Construir o “tempo
psicológico” para se abrir e se expressar a Deus em
alguma forma de oração (...); 10. Ter e amadurecer um
sadio sentido de “pertencer” a um corpo (Família, Igreja,
comunidade...)
b. Espiritualmente, ele necessita de: 1. Uma “sensibilidade
religiosa”, em grau suficiente para viver as relações
com Deus e certa familiaridade com Ele; 2. Docilidade
interior para buscas os desígnios de Deus sobre si (...);
69 MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual,
p.135.
40
3 Certo grau de serenidade para observar (“ler”) os
movimentos de Deus em sua alma; 4. Capacidade de
renúncia (...); 5. Habilidade para fazer oração formal
sem grandes dificuldades.70
Pode-se observar que essas características são importantes e necessárias
para o desenvolvimento pessoal e para a vida interior daqueles que buscam direção
espiritual, conforme colocado pelo próprio autor. “Não se pretende que tenha essas
bases maduras desde o princípio mas, ao menos, certa capacidade para
desenvolvê-las.”71. Para isso, o dirigido precisa amadurecer essas qualidades
mencionadas anteriormente, cultivando em si uma atitude de busca por sentido em
sua vida, demonstrando fidelidade ao processo de desenvolvimento delineado junto
ao diretor espiritual, mantendo-se totalmente disponível e flexível para agir de
acordo com a vontade de Deus, e adotando uma postura de sinceridade e
transparência completa com o diretor espiritual.72
A transparência e a sinceridade são elementos marcantes e de extrema
importância para alcançar as graças próprias da direção espiritual. São Josemaria
Escrivá, em seu livro Caminho, aborda exatamente essa questão ao dizer: “Não
ocultes ao teu Diretor essas insinuações do inimigo. – A tua vitória, ao abrir-lhe a
tua alma, te dá mais graça de Deus. – E, além disso, tens agora, para continuares
a vencer, o dom de conselho e as orações do teu pai espiritual”73. A sinceridade e
transparência ajudam o próprio diretor a dar conselhos mais eficazes e,
principalmente, auxiliam no seu ofício de médico espiritual. Se o dirigido não for
transparente, poderá receber um tratamento para dores de cabeça sem saber que
na verdade está lidando com um câncer.
Um outro ponto a ser contemplado é a realidade de que o dirigido precisa
ser dócil e ter disposição para seguir as indicações recebidas com alegria. Isso não
70 MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual,
p.136.
71 MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual,
p.137.
72 Cf. MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual,
p.139.
73 ESCRIVÁ, Josemaria. Caminho, p. 42.
41
significa que o dirigido precise ter uma atitude de passividade, pelo contrário, ele
deve ter uma atitude de acolhimento e pro atividade.74
Recorre à direção espiritual cada vez com mais humildade, e
pontualmente, o que é também humildade.
Pensa – e não te enganas, por que aí é Deus quem te fala- que és
como uma criança pequena – sincera! -, a quem vão ensinando
falar, a ler, a conhecer as flores e os pássaros, a viver as alegrias e
as penas, a reparar no chão que pisa.75
Há de se destacar, enfim, a necessidade do dirigido de permanecer
perseverante na luta, e essa luta se forja no dia a dia, de semana em semana e de
mês em mês. Para que essa perseverança se forme, é preciso elaborar junto do
diretor várias metas e objetivos claros, sabendo identificar quais são os mais
adequados para alcançá-los.76 A luz dos objetivos básicos da direção espiritual: “1)
Buscar a Deus; 2) Compreender a si mesmo no âmbito de sua própria realidade e
3) procurar a verdade que deve ser enfrentada em sua realidade. É necessário que
isto o personalize: o que busco? O que quero? O que pretendo?”77
O dirigido precisa ter uma relação saudável com seu diretor espiritual, e por
isso, precisa saber que, para que essa relação seja saudável, o diretor não assume
as decisões e ações do dirigido. A pessoa que busca direção precisa compreender
que não deve existir uma obediência estrita, mas sim um certo grau de docilidade
que não seja alienante nem servil. Sendo assim, o próprio dirigido deve preservar
sua independência e cultivar sua autonomia a ponto de ser capaz de discernir se
vai seguir ou não os conselhos recebidos.78
A esse respeito, é importante mencionar dois grandes riscos. O primeiro
deles está relacionado ao fato de o dirigido tentar manipular o diretor para receber
conselhos que estejam alinhados com seus próprios gostos e desejos
desordenados. O segundo risco é o de esperar que o diretor tome todas as decisões
em seu lugar, quando na realidade é o dirigido quem deve assumir a
74 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p.190.
75 ESCRIVÁ, Josemaria. Sulco, p. 105.
76 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 190.
77 MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual,
p.141.
78 Cf. MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual,
p.142.
42
responsabilidade por suas próprias decisões, embasadas nos conselhos
recebidos.79
Por fim, quando o dirigido possui as qualidades humanas e espirituais,
mantém-se livre, sincero e dócil ao diretor espiritual, pode-se certamente
testemunhar em sua vida aquilo que Garrigou-Lagrange menciona:
Nestas condições, o diretor poderá ser o instrumento do Espirito
Santo para controlar sua ação em nós e para nos tornar cada vez
mais dóceis às inspirações divinas. Assim, avançaremos de
verdade pelo caminho estreito, que se alarga cada vez mais ao nos
aproximarmos da infinita bondade de Deus, para qual ele nos
conduz.80
3.4 CONVERSA DE DIREÇÃO ESPIRITUAL E SUA PREPARAÇÃO
Há alguns aspectos práticos a serem considerados, e entre eles, existem
três fundamentais para uma direção espiritual boa e frutífera: a frequência, a
duração e o local.
A frequência da direção espiritual propriamente dita, ou seja, aquela que envolve
esforço e um acompanhamento sério para buscar a santidade, é algo muito pessoal
e deve ser discutido em diálogo com o próprio dirigido. Não se pode simplesmente
seguir a indicação de alguém que diz ter um diretor espiritual, mas que na verdade
aparece apenas a cada seis meses. O tempo de frequência varia, mas deve ser
dentro de um mês, seja semanalmente, quinzenalmente ou até mesmo
mensalmente.81 A Congregação para o Clero expressa claramente sua visão,
ressaltando que a frequência da direção espiritual depende da interpretação e da
situação individual de cada pessoa. Ela afirma o seguinte:
A periodicidade das conversas depende dos momentos e das
situações, porque não existe uma regra fixa. Os momentos iniciais
da formação requerem uma periodicidade mais frequente e
assídua. É melhor que a conversa seja feita espontaneamente, sem
esperar para ser chamado (SCD 106).
79 Cf. MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual,
p.142.
80 GARRIGOU-LAGRANGE, Reginald. As três idades da vida interior, p. 322.
81 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 238.
43
A duração da direção espiritual varia consideravelmente, dependendo do
estágio de vida e do processo de orientação em que o dirigido se encontra. Isso é
decidido de comum acordo entre ambas as partes. Mas, “No início é bom e
necessário oferecer à pessoa que procura a direção espiritual a possibilidade de
falar o tempo que quiser”82, Ou seja, é importante permitir que a pessoa possa
expressar com clareza o que está acontecendo em sua vida atual. No entanto, a
direção espiritual, embora não deva ser apressada ou feita rapidamente, também
não deve ser excessivamente demorada. O padre Manuel afirma que:
Pode-se dizer que a duração deve ser de aproximadamente trinta
minutos, podendo ser de até uma hora para casos muito especiais,
ou de quinze minutos, também em situações anômalas. O que
importa é que o dirigido seja ouvido e aconselhado, ao menos
naquilo que, de momento, seja importante ou até decisivo.83
Quanto ao local, um ambiente honesto e minimamente discreto pode ser
utilizado, mas é sempre importante seguir as normas de prudência e adotar critérios
de escolha adequados. No entanto, é necessário observar o que a Congregação
para o Clero diz a respeito:
Frequentemente a direção espiritual como ministério está ligada à
confissão, onde o sacerdote age em nome de Cristo e mostra uma
atitude de pai, amigo, médico e guia espiritual. É o servidor do
perdão e orienta o caminho da contemplação e da perfeição, com
respeito e fidelidade ao Magistério e à tradição espiritual da Igreja
(SCD 116).
Observando essa realidade, é necessário adaptar as orientações para a
confissão e tentar aplicá-las de alguma forma à direção espiritual, pelo menos nos
casos em que a prudência indique, como na direção dos jovens. Pode-se
recomendar que seja realizada em um confessionário ou em uma sala com porta
de vidro, por exemplo.84
Ao diretor espiritual, é sempre importante observar algumas sugestões
práticas, destacando aquelas que o padre Manoel indica em seu livro Curso sobre
direção espiritual. Resumidamente, ele comenta algumas realidades a serem
observadas pelos diretores espirituais.
82 SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 157.
83 SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 238.
84 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 239.
44
O padre comenta que é importante para o diretor espiritual lembrar que ele
não pode ser um burocrata das questões espirituais, mas sim um pai, um pastor,
um mestre e um médico, como afirmado acima. Além disso, o padre Manoel
destaca a importância do diretor controlar seus estados de ânimo, fomentar a
liberdade e a responsabilidade do dirigido, lembrar que a direção espiritual não é
um interrogatório, ajudar os dirigidos mais loquazes, fixar um tempo para a
conversa e ter zelo e esforço para compreender o dirigido.85
Sabendo a frequência com que se terá a direção espiritual e a duração que
levará, é importante elaborar e preparar a conversa que se terá com o diretor
espiritual. Para isso, é necessário ter calma e abordar cada ponto de forma clara e
compreensível. Com isso em mente, seguem algumas dicas práticas para o
dirigido: Preparar cuidadosamente cada conversa, rezando antecipadamente,
refletindo e anotando os temas que deseja abordar com o diretor espiritual, fazendo
uma lista de assuntos a serem discutidos, à luz do Espírito Santo; Evitar conversas
superficiais e irrelevantes durante a direção espiritual. Não desperdiçar o precioso
tempo com assuntos como clima, futebol ou fofocas atualizadas. Abordar os temas
com objetividade e, se necessário, utilizar um assunto aleatório apenas como
introdução ou prólogo; Começar falando sobre os assuntos mais difíceis e
delicados, para evitar o medo ou a vergonha que podem levar a omitir informações
importantes. Falar sobre quedas graves, infidelidades, recorrências de pecados em
luta, entre outros; Discutir problemas que estejam exigindo maior esforço, como
situações familiares, questões no trabalho, desafios na igreja, etc.; Revisar as
orientações e conselhos dados em direções anteriores, abordando as dificuldades
encontradas em segui-los ou implementá-los; Refletir e conversar sobre novas
propostas e iniciativas desejadas na vida espiritual, como iniciar uma prática de
piedade específica, ler um novo livro, etc.; Reservar espaço para discutir as
virtudes, especialmente aquela(s) em que você tem maior dificuldade ou que sente
que falta em sua vida.86
85 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 247.
86 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento
pastoral e acompanhamento espiritual, p. 245-246.
45
CONCLUSÃO
Ao findar dessas várias ideias e afirmações tiradas de uma dificultosa
pesquisa é preciso concluir primeiramente que a direção espiritual é um dos meios
que Deus em sua infinita misericórdia deixa para nós, seus filhos. Que grande graça
poder ser objeto do seu ministério de pastor, mestre, médico e pai nas pessoas dos
diretores espirituais.
É importante ter em vista que o trabalho realizado até aqui tinha o intuito de
trazer um subsidio introdutório sobre a pratica da direção espiritual para que aquele
que deseja conhecer mais dessa pratica saiba responder as perguntas: qual a
necessidade dessa pratica na minha vida? De onde surgiu essa pratica? O que ela
é? Quem é o diretor e como me preparar para essa pratica?
Nesse quesito é importante destacar que o objetivo foi concluído, tendo em
vista o que foi apresentado pelo texto é possível afirmar que alguém que não
conhecesse essa prática teria condições de lendo ter uma noção geral e pratica da
direção espiritual, assim como ter condições de se preparar e aprofundar na vida
espiritual a partir das dicas e orientações apresentadas. É possível também
declarar que os capítulos conseguem confirmarem aquilo que era suas propostas,
tanto de identificarem uma necessidade, quanto deixar clara as origens e dar
orientações e dicas práticas para aqueles que serão objetos da direção espiritual
quanto aqueles que atenderão as direções.
Concluo que a prática da direção espiritual é fundamental para a formação
integral do ser do homem a partir do pecado de Adão, pois é por meio de uma vida
organizada e planejada a partir de Cristo e da ação de Deus na alma que o homem
pode dar passos seguros rumo a santidade. É de suma importância a direção
espiritual aos leigos, eles que são o sustento da Igreja no ponto de vista da ação
pastoral.
Em um futuro, possivelmente continuará a pesquisa sobre a relação entre
psicologia e direção espiritual, com ênfase na integração entre psicólogos e
diretores espirituais. Já se constata nessa pesquisa a necessidade de
conhecimento por parte do diretor espiritual nessa área.
46
REFERÊNCIAS
BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el
siglo XIX. Jan. 2011. Disponível em:
https://www.collationes.org/system/files/inlinefiles/1.1%20Breve%20panor%C3%A1mica%
20hist%C3%B3rica%20de%20la%20direcci%C3%B3n%20espiritual%20hasta%20el%20s
iglo%20XIX%20-%20Manuel%20Belda_0.pdf. Acesso: 16 jun. 2023.
BETÊ, Eneas de Camargo. Direção Espiritual, 29 set. 2017. Disponível em:
https://dj.org.br/a-direcao-espiritual-i-conceito-e-resumo-historico/. Acesso em: 12
jun. 2023.
BÍBLIA de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2002.
CATECISMO da Igreja Católica. Disponível em:
https://www.vatican.va/archive/cathechism_po/index_new/prima-pagina-
cic_po.html. Acesso em: 23 mai. 2023.
CONCÍLIO VATICANO II. Lumen Gentium. Disponível em:
https://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-
ii_const_19641121_lumen-gentium_po.html. Acesso em: 15 mai. 2023.
CONCÍLIO VATICANO II. Optatam Totius. Disponível em:
https://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vatii_de
cree_19651028_optatam-totius_po.html#. Acesso em: 27 jun. 2023.
CONCÍLIO VATICANO II. Presbyterorum Ordinis Disponível em:
https://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-
ii_decree_19651207_presbyterorum-ordinis_po.html. Acesso em: 27 jun. 2023.
CONGREGAÇÃO PARA O CLERO. O presbítero, mestre da Palavra, ministro dos
sacramentos e guia da comunidade, em vista do terceiro milênio. Disponível em:
https://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cclergy/documents/rc_con_ccle
rgy_doc_19031999_pretres_po.html. Acesso em: 27 jun. 2023.
CONGREGAÇÃO PARA O CLERO. O sacerdote ministro da misericórdia divina -
Subsídio para confessores e diretores espirituais. Disponível em:
https://www.clerus.org/clerus/dati/2011-08/08-13/sussidio_per_confessori_pt.pdf.
Acesso em: 27 jun. 2023.
ESCRIVÁ, Josemaria. Caminho. 12. ed. São Paulo: Quadrante, 2016.
ESCRIVÁ, Josemaria. Sulco. 4. ed. São Paulo: Quadrante, 2016.
FRANCISCO, Papa. Christus Vivit. Disponível em:
https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-
francesco_esortazione-ap_20190325_christus-vivit.html. Acesso em: 27 jun. 2023.
47
FRANCISCO, Papa. Gaudete et Exsultate. Disponível em:
https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papafr
ancesco_esortazione-ap_20180319_gaudete-et-exsultate.html#O_discernimento.
Acesso em: 27 jun. 2023.
FRANKL. E. Viktor. Um sentido para vida: psicoterapia e humanismo.18. ed. Trad.
Victor Hugo Silveira Lapenta. São Paulo: Ideias&Letras, 2014.
FRANKL, Viktor E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração.
42. ed. Trad. Walter. Schlupp; Carlos C. Aveline. São Leopoldo: Sinodal; Petrópolis:
vozes, 2007.
GARRIGOU-LAGRANGE, Reginald. As três idades da vida interior. Tomo I. Trad.
Antonio Carlos Santini. São Paulo: Cultor de Livros, 2018.
JOÃO PAULO II, Papa. Pastores Dabo Vobis. Disponível em:
https://www.vatican.va/content/johnpaulii/pt/apost_exhortations/documents/hf_jpii_
exh_25031992_pastores-dabo-vobis.html. Acesso em: 27 jun. 2023.
MAGAÑA, Guadalupe. Desarrollo histórico de la Dirección Espiritual. 16 mai. 2018.
Disponível em: https://es.catholic.net/op/articulos/4973/cat/165/desarrollo-
historico-de-la-direccion-espiritual.html#modal. Acesso em: 15 jun. 23.
MARIN, Antonio Royo, O.P. Grandes mestres da vida espiritual. Campinas:
Ecclesiae, 2019.
MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do
acompanhamento espiritual. São Paulo: Paulus, 2009.
SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para
aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual. São Paulo: Cultor de
Livros, 2019.
SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual. 4. ed. São Paulo:
Loyola, 2012.
TRESE, Leo J. A fé explicada. 5. ed. Trad. Isabel Perez. São Paulo: Quadrante,
1990.
VAZ, Henrique de Lima. Antropologia Filosófica. 12. ed. São Paulo: Loyola, 1991.
VAZ, Henrique de Lima. Escritos de filosofia II: Ética e cultura. 5. ed. São Paulo:
Loyola, 1988.
VEILLEUX, Dom Armand. A paternidade Espiritual na Tradição cenobitica. 01 nov.
1998. Disponível em: https://www.padresdodeserto.net/pater.htm. Acesso em: 03
jul. 2023.
48

Mais conteúdo relacionado

Mais procurados

Educación religiosa con calidad
Educación religiosa con calidadEducación religiosa con calidad
Educación religiosa con calidadCea Familia
 
Liturgia breve histórico
Liturgia   breve históricoLiturgia   breve histórico
Liturgia breve históricoNúccia Ortega
 
Disciplina de Teologia do Novo Testamento
Disciplina de Teologia do Novo TestamentoDisciplina de Teologia do Novo Testamento
Disciplina de Teologia do Novo Testamentofaculdadeteologica
 
Liturgia: SAGRADA CEIA DO SENHOR: “O MISTÉRIO DA FÉ”
Liturgia: SAGRADA CEIA DO SENHOR: “O MISTÉRIO DA FÉ”Liturgia: SAGRADA CEIA DO SENHOR: “O MISTÉRIO DA FÉ”
Liturgia: SAGRADA CEIA DO SENHOR: “O MISTÉRIO DA FÉ”Leandro Couto
 
1. Introdução do curso teologia do corpo
1. Introdução do curso teologia do corpo1. Introdução do curso teologia do corpo
1. Introdução do curso teologia do corpoWebExecutivo1
 
PLANEJAMENTO PASTORAL PAROQUIAL.pdf
PLANEJAMENTO PASTORAL PAROQUIAL.pdfPLANEJAMENTO PASTORAL PAROQUIAL.pdf
PLANEJAMENTO PASTORAL PAROQUIAL.pdfZILMARMELOPEREIRA
 
Formação para leitores e salmistas
Formação para leitores e salmistasFormação para leitores e salmistas
Formação para leitores e salmistaspascomichu
 
Historia da igreja aula 2
Historia da igreja aula 2Historia da igreja aula 2
Historia da igreja aula 2Lisanro Cronje
 
FORMAÇÃO SOBRE A BÍBLIA
FORMAÇÃO SOBRE A BÍBLIAFORMAÇÃO SOBRE A BÍBLIA
FORMAÇÃO SOBRE A BÍBLIAWebExecutivo1
 
Curso de evangelismo
Curso de evangelismoCurso de evangelismo
Curso de evangelismoadnacoes
 
Curso Biblico Introduccion I
Curso Biblico Introduccion ICurso Biblico Introduccion I
Curso Biblico Introduccion Ijuanmiguel1
 
RICA: Escrutínios e Exorcismos
RICA: Escrutínios e Exorcismos RICA: Escrutínios e Exorcismos
RICA: Escrutínios e Exorcismos Fábio Vasconcelos
 

Mais procurados (20)

Educación religiosa con calidad
Educación religiosa con calidadEducación religiosa con calidad
Educación religiosa con calidad
 
Perfil do catequista
Perfil do catequistaPerfil do catequista
Perfil do catequista
 
Liturgia breve histórico
Liturgia   breve históricoLiturgia   breve histórico
Liturgia breve histórico
 
Método MCC - Precursillo
Método MCC - PrecursilloMétodo MCC - Precursillo
Método MCC - Precursillo
 
Disciplina de Teologia do Novo Testamento
Disciplina de Teologia do Novo TestamentoDisciplina de Teologia do Novo Testamento
Disciplina de Teologia do Novo Testamento
 
Liturgia: SAGRADA CEIA DO SENHOR: “O MISTÉRIO DA FÉ”
Liturgia: SAGRADA CEIA DO SENHOR: “O MISTÉRIO DA FÉ”Liturgia: SAGRADA CEIA DO SENHOR: “O MISTÉRIO DA FÉ”
Liturgia: SAGRADA CEIA DO SENHOR: “O MISTÉRIO DA FÉ”
 
2. introdução ao novo testamento
2.  introdução ao novo testamento2.  introdução ao novo testamento
2. introdução ao novo testamento
 
Retiro com catequistas
Retiro com catequistasRetiro com catequistas
Retiro com catequistas
 
Heresiologia
HeresiologiaHeresiologia
Heresiologia
 
Eucaristia
EucaristiaEucaristia
Eucaristia
 
A espiritualidade do catequista
A espiritualidade do catequistaA espiritualidade do catequista
A espiritualidade do catequista
 
1. Introdução do curso teologia do corpo
1. Introdução do curso teologia do corpo1. Introdução do curso teologia do corpo
1. Introdução do curso teologia do corpo
 
PLANEJAMENTO PASTORAL PAROQUIAL.pdf
PLANEJAMENTO PASTORAL PAROQUIAL.pdfPLANEJAMENTO PASTORAL PAROQUIAL.pdf
PLANEJAMENTO PASTORAL PAROQUIAL.pdf
 
Formação para leitores e salmistas
Formação para leitores e salmistasFormação para leitores e salmistas
Formação para leitores e salmistas
 
Historia da igreja aula 2
Historia da igreja aula 2Historia da igreja aula 2
Historia da igreja aula 2
 
FORMAÇÃO SOBRE A BÍBLIA
FORMAÇÃO SOBRE A BÍBLIAFORMAÇÃO SOBRE A BÍBLIA
FORMAÇÃO SOBRE A BÍBLIA
 
Curso de evangelismo
Curso de evangelismoCurso de evangelismo
Curso de evangelismo
 
Formação de Pais Sobre Eucaristia
Formação de Pais Sobre EucaristiaFormação de Pais Sobre Eucaristia
Formação de Pais Sobre Eucaristia
 
Curso Biblico Introduccion I
Curso Biblico Introduccion ICurso Biblico Introduccion I
Curso Biblico Introduccion I
 
RICA: Escrutínios e Exorcismos
RICA: Escrutínios e Exorcismos RICA: Escrutínios e Exorcismos
RICA: Escrutínios e Exorcismos
 

Semelhante a Direção Espiritual: Necessidade, História e Dicas Práticas

Conhecendo o espiritismo (adenáuer novaes)
Conhecendo o espiritismo (adenáuer novaes)Conhecendo o espiritismo (adenáuer novaes)
Conhecendo o espiritismo (adenáuer novaes)Helio Cruz
 
Conhecendo o-espiritismo
Conhecendo o-espiritismoConhecendo o-espiritismo
Conhecendo o-espiritismoFlavio Oliveira
 
Conhecendo o Espiritismo (Adenauer Novaes).pdf
Conhecendo o Espiritismo (Adenauer Novaes).pdfConhecendo o Espiritismo (Adenauer Novaes).pdf
Conhecendo o Espiritismo (Adenauer Novaes).pdfhailanachaves2
 
A pesquisa mediúnica na obra de lamartine palhano!
A pesquisa mediúnica na obra de lamartine palhano!A pesquisa mediúnica na obra de lamartine palhano!
A pesquisa mediúnica na obra de lamartine palhano!Leonardo Pereira
 
62012277 programa-homospiritualis-diversidade-religiosa-expressao-do-espirito...
62012277 programa-homospiritualis-diversidade-religiosa-expressao-do-espirito...62012277 programa-homospiritualis-diversidade-religiosa-expressao-do-espirito...
62012277 programa-homospiritualis-diversidade-religiosa-expressao-do-espirito...Instituto de Psicobiofísica Rama Schain
 
O Que É Espiritualismo - Pablo de Salamanca
O Que É Espiritualismo - Pablo de Salamanca  O Que É Espiritualismo - Pablo de Salamanca
O Que É Espiritualismo - Pablo de Salamanca Diego Silva
 
Literatura espiritualista
Literatura espiritualistaLiteratura espiritualista
Literatura espiritualistaFlavio Pereira
 
curso-de-meditacao-transcendental
 curso-de-meditacao-transcendental curso-de-meditacao-transcendental
curso-de-meditacao-transcendentalRe David
 
Projeto genoma
Projeto genomaProjeto genoma
Projeto genomair_joice
 
Projeto genoma
Projeto genomaProjeto genoma
Projeto genomair_joice
 
Conhecendo o espiritismo
Conhecendo o espiritismoConhecendo o espiritismo
Conhecendo o espiritismosocialceia
 
A caminho da campanha da fraternidade 2013
A caminho da campanha da fraternidade 2013A caminho da campanha da fraternidade 2013
A caminho da campanha da fraternidade 2013marquione ban
 
A caminho-da-campanha-da-fraternidade 2013
A caminho-da-campanha-da-fraternidade 2013A caminho-da-campanha-da-fraternidade 2013
A caminho-da-campanha-da-fraternidade 2013Bernadetecebs .
 
Tcc o mito e sua relevância no ensino religioso
Tcc o mito e sua relevância no ensino religiosoTcc o mito e sua relevância no ensino religioso
Tcc o mito e sua relevância no ensino religiosoluciano
 
Aula 2 o que é o espiritismo
Aula 2   o que é o espiritismoAula 2   o que é o espiritismo
Aula 2 o que é o espiritismossusereccc9c
 
Introdução teologia moral.pptx
Introdução teologia moral.pptxIntrodução teologia moral.pptx
Introdução teologia moral.pptxSandra Vale
 
Psicologiae espiritualidade
Psicologiae espiritualidadePsicologiae espiritualidade
Psicologiae espiritualidadeRosimeri Lopes
 

Semelhante a Direção Espiritual: Necessidade, História e Dicas Práticas (20)

Conhecendo o espiritismo (adenáuer novaes)
Conhecendo o espiritismo (adenáuer novaes)Conhecendo o espiritismo (adenáuer novaes)
Conhecendo o espiritismo (adenáuer novaes)
 
Conhecendo o-espiritismo
Conhecendo o-espiritismoConhecendo o-espiritismo
Conhecendo o-espiritismo
 
Conhecendo o Espiritismo (Adenauer Novaes).pdf
Conhecendo o Espiritismo (Adenauer Novaes).pdfConhecendo o Espiritismo (Adenauer Novaes).pdf
Conhecendo o Espiritismo (Adenauer Novaes).pdf
 
A pesquisa mediúnica na obra de lamartine palhano!
A pesquisa mediúnica na obra de lamartine palhano!A pesquisa mediúnica na obra de lamartine palhano!
A pesquisa mediúnica na obra de lamartine palhano!
 
62012277 programa-homospiritualis-diversidade-religiosa-expressao-do-espirito...
62012277 programa-homospiritualis-diversidade-religiosa-expressao-do-espirito...62012277 programa-homospiritualis-diversidade-religiosa-expressao-do-espirito...
62012277 programa-homospiritualis-diversidade-religiosa-expressao-do-espirito...
 
Fides et ratio 1
Fides et ratio 1Fides et ratio 1
Fides et ratio 1
 
Fides et Ratio
Fides et RatioFides et Ratio
Fides et Ratio
 
O Que É Espiritualismo - Pablo de Salamanca
O Que É Espiritualismo - Pablo de Salamanca  O Que É Espiritualismo - Pablo de Salamanca
O Que É Espiritualismo - Pablo de Salamanca
 
Literatura espiritualista
Literatura espiritualistaLiteratura espiritualista
Literatura espiritualista
 
curso-de-meditacao-transcendental
 curso-de-meditacao-transcendental curso-de-meditacao-transcendental
curso-de-meditacao-transcendental
 
Projeto genoma
Projeto genomaProjeto genoma
Projeto genoma
 
Projeto genoma
Projeto genomaProjeto genoma
Projeto genoma
 
Conhecendo o espiritismo
Conhecendo o espiritismoConhecendo o espiritismo
Conhecendo o espiritismo
 
A caminho da campanha da fraternidade 2013
A caminho da campanha da fraternidade 2013A caminho da campanha da fraternidade 2013
A caminho da campanha da fraternidade 2013
 
A caminho-da-campanha-da-fraternidade 2013
A caminho-da-campanha-da-fraternidade 2013A caminho-da-campanha-da-fraternidade 2013
A caminho-da-campanha-da-fraternidade 2013
 
Tcc o mito e sua relevância no ensino religioso
Tcc o mito e sua relevância no ensino religiosoTcc o mito e sua relevância no ensino religioso
Tcc o mito e sua relevância no ensino religioso
 
Aula 2 o que é o espiritismo
Aula 2   o que é o espiritismoAula 2   o que é o espiritismo
Aula 2 o que é o espiritismo
 
Conhecendo
ConhecendoConhecendo
Conhecendo
 
Introdução teologia moral.pptx
Introdução teologia moral.pptxIntrodução teologia moral.pptx
Introdução teologia moral.pptx
 
Psicologiae espiritualidade
Psicologiae espiritualidadePsicologiae espiritualidade
Psicologiae espiritualidade
 

Último

Paulo é vítima de fake news e o primeiro culto num domingo
Paulo é vítima de fake news e o primeiro culto num domingoPaulo é vítima de fake news e o primeiro culto num domingo
Paulo é vítima de fake news e o primeiro culto num domingoPIB Penha
 
2 joão (1) 1.pptx As TRÊS CARTAS DO APÓSTOLO JOÃO têm uma mensagem solene e u...
2 joão (1) 1.pptx As TRÊS CARTAS DO APÓSTOLO JOÃO têm uma mensagem solene e u...2 joão (1) 1.pptx As TRÊS CARTAS DO APÓSTOLO JOÃO têm uma mensagem solene e u...
2 joão (1) 1.pptx As TRÊS CARTAS DO APÓSTOLO JOÃO têm uma mensagem solene e u...MiltonCesarAquino1
 
As violações das leis do Criador (material em pdf)
As violações das leis do Criador (material em pdf)As violações das leis do Criador (material em pdf)
As violações das leis do Criador (material em pdf)natzarimdonorte
 
O Livro dos Mortos do Antigo Egito_240402_210013.pdf
O Livro dos Mortos do Antigo Egito_240402_210013.pdfO Livro dos Mortos do Antigo Egito_240402_210013.pdf
O Livro dos Mortos do Antigo Egito_240402_210013.pdfmhribas
 
Oração A Bem-Aventurada Irmã Dulce Dos Pobres
Oração A Bem-Aventurada Irmã Dulce Dos PobresOração A Bem-Aventurada Irmã Dulce Dos Pobres
Oração A Bem-Aventurada Irmã Dulce Dos PobresNilson Almeida
 
EUBIOSOFIA - MEMÓRIAS DA SOCIEDADE TEOSÓFICA BRASILEIRA
EUBIOSOFIA - MEMÓRIAS DA SOCIEDADE TEOSÓFICA BRASILEIRAEUBIOSOFIA - MEMÓRIAS DA SOCIEDADE TEOSÓFICA BRASILEIRA
EUBIOSOFIA - MEMÓRIAS DA SOCIEDADE TEOSÓFICA BRASILEIRAMarco Aurélio Rodrigues Dias
 
Lição 5 - Os Inimigos do Cristão - EBD.pptx
Lição 5 - Os Inimigos do Cristão - EBD.pptxLição 5 - Os Inimigos do Cristão - EBD.pptx
Lição 5 - Os Inimigos do Cristão - EBD.pptxCelso Napoleon
 
Tabela bíblica Periódica - Livros da Bíblia.pdf
Tabela bíblica Periódica - Livros da Bíblia.pdfTabela bíblica Periódica - Livros da Bíblia.pdf
Tabela bíblica Periódica - Livros da Bíblia.pdfAgnaldo Fernandes
 
Lição 4 - Como se Conduzir na Caminhada.pptx
Lição 4 - Como se Conduzir na Caminhada.pptxLição 4 - Como se Conduzir na Caminhada.pptx
Lição 4 - Como se Conduzir na Caminhada.pptxCelso Napoleon
 
Dar valor ao Nada! No Caminho da Autorrealização
Dar valor ao Nada! No Caminho da AutorrealizaçãoDar valor ao Nada! No Caminho da Autorrealização
Dar valor ao Nada! No Caminho da Autorrealizaçãocorpusclinic
 
As festas esquecidas.pdf................
As festas esquecidas.pdf................As festas esquecidas.pdf................
As festas esquecidas.pdf................natzarimdonorte
 
METODOLOGIA ELANA* – ENSINO LEVA AUTONOMIA NO APRENDIZADO. UMA PROPOSTA COMP...
METODOLOGIA ELANA* – ENSINO LEVA  AUTONOMIA NO APRENDIZADO. UMA PROPOSTA COMP...METODOLOGIA ELANA* – ENSINO LEVA  AUTONOMIA NO APRENDIZADO. UMA PROPOSTA COMP...
METODOLOGIA ELANA* – ENSINO LEVA AUTONOMIA NO APRENDIZADO. UMA PROPOSTA COMP...PIB Penha
 
O Sacramento do perdão, da reconciliação.
O Sacramento do perdão, da reconciliação.O Sacramento do perdão, da reconciliação.
O Sacramento do perdão, da reconciliação.LucySouza16
 
Série Evangelho no Lar - Pão Nosso - Cap. 132 - Em tudo
Série Evangelho no Lar - Pão Nosso - Cap. 132 - Em tudoSérie Evangelho no Lar - Pão Nosso - Cap. 132 - Em tudo
Série Evangelho no Lar - Pão Nosso - Cap. 132 - Em tudoRicardo Azevedo
 

Último (17)

Paulo é vítima de fake news e o primeiro culto num domingo
Paulo é vítima de fake news e o primeiro culto num domingoPaulo é vítima de fake news e o primeiro culto num domingo
Paulo é vítima de fake news e o primeiro culto num domingo
 
2 joão (1) 1.pptx As TRÊS CARTAS DO APÓSTOLO JOÃO têm uma mensagem solene e u...
2 joão (1) 1.pptx As TRÊS CARTAS DO APÓSTOLO JOÃO têm uma mensagem solene e u...2 joão (1) 1.pptx As TRÊS CARTAS DO APÓSTOLO JOÃO têm uma mensagem solene e u...
2 joão (1) 1.pptx As TRÊS CARTAS DO APÓSTOLO JOÃO têm uma mensagem solene e u...
 
As violações das leis do Criador (material em pdf)
As violações das leis do Criador (material em pdf)As violações das leis do Criador (material em pdf)
As violações das leis do Criador (material em pdf)
 
O Livro dos Mortos do Antigo Egito_240402_210013.pdf
O Livro dos Mortos do Antigo Egito_240402_210013.pdfO Livro dos Mortos do Antigo Egito_240402_210013.pdf
O Livro dos Mortos do Antigo Egito_240402_210013.pdf
 
Oração A Bem-Aventurada Irmã Dulce Dos Pobres
Oração A Bem-Aventurada Irmã Dulce Dos PobresOração A Bem-Aventurada Irmã Dulce Dos Pobres
Oração A Bem-Aventurada Irmã Dulce Dos Pobres
 
EUBIOSOFIA - MEMÓRIAS DA SOCIEDADE TEOSÓFICA BRASILEIRA
EUBIOSOFIA - MEMÓRIAS DA SOCIEDADE TEOSÓFICA BRASILEIRAEUBIOSOFIA - MEMÓRIAS DA SOCIEDADE TEOSÓFICA BRASILEIRA
EUBIOSOFIA - MEMÓRIAS DA SOCIEDADE TEOSÓFICA BRASILEIRA
 
VICIOS MORAIS E COMPORTAMENTAIS NA VISÃO ESPÍRITA
VICIOS MORAIS E COMPORTAMENTAIS  NA VISÃO ESPÍRITAVICIOS MORAIS E COMPORTAMENTAIS  NA VISÃO ESPÍRITA
VICIOS MORAIS E COMPORTAMENTAIS NA VISÃO ESPÍRITA
 
Lição 5 - Os Inimigos do Cristão - EBD.pptx
Lição 5 - Os Inimigos do Cristão - EBD.pptxLição 5 - Os Inimigos do Cristão - EBD.pptx
Lição 5 - Os Inimigos do Cristão - EBD.pptx
 
Aprendendo a se amar e a perdoar a si mesmo
Aprendendo a se amar e a perdoar a si mesmoAprendendo a se amar e a perdoar a si mesmo
Aprendendo a se amar e a perdoar a si mesmo
 
Tabela bíblica Periódica - Livros da Bíblia.pdf
Tabela bíblica Periódica - Livros da Bíblia.pdfTabela bíblica Periódica - Livros da Bíblia.pdf
Tabela bíblica Periódica - Livros da Bíblia.pdf
 
Lição 4 - Como se Conduzir na Caminhada.pptx
Lição 4 - Como se Conduzir na Caminhada.pptxLição 4 - Como se Conduzir na Caminhada.pptx
Lição 4 - Como se Conduzir na Caminhada.pptx
 
Dar valor ao Nada! No Caminho da Autorrealização
Dar valor ao Nada! No Caminho da AutorrealizaçãoDar valor ao Nada! No Caminho da Autorrealização
Dar valor ao Nada! No Caminho da Autorrealização
 
As festas esquecidas.pdf................
As festas esquecidas.pdf................As festas esquecidas.pdf................
As festas esquecidas.pdf................
 
METODOLOGIA ELANA* – ENSINO LEVA AUTONOMIA NO APRENDIZADO. UMA PROPOSTA COMP...
METODOLOGIA ELANA* – ENSINO LEVA  AUTONOMIA NO APRENDIZADO. UMA PROPOSTA COMP...METODOLOGIA ELANA* – ENSINO LEVA  AUTONOMIA NO APRENDIZADO. UMA PROPOSTA COMP...
METODOLOGIA ELANA* – ENSINO LEVA AUTONOMIA NO APRENDIZADO. UMA PROPOSTA COMP...
 
O Sacramento do perdão, da reconciliação.
O Sacramento do perdão, da reconciliação.O Sacramento do perdão, da reconciliação.
O Sacramento do perdão, da reconciliação.
 
Centros de Força do Perispírito (plexos, chacras)
Centros de Força do Perispírito (plexos, chacras)Centros de Força do Perispírito (plexos, chacras)
Centros de Força do Perispírito (plexos, chacras)
 
Série Evangelho no Lar - Pão Nosso - Cap. 132 - Em tudo
Série Evangelho no Lar - Pão Nosso - Cap. 132 - Em tudoSérie Evangelho no Lar - Pão Nosso - Cap. 132 - Em tudo
Série Evangelho no Lar - Pão Nosso - Cap. 132 - Em tudo
 

Direção Espiritual: Necessidade, História e Dicas Práticas

  • 1. 1 ESCOLA DE HUMANIDADES CURSO DE TEOLOGIA ROGER MESQUITA HAAG DIREÇÃO ESPIRITUAL: NECESSIDADE, HISTÓRIA E DICAS PRÁTICAS Porto alegre 2023
  • 2. 2 ROGER MESQUITA HAAG DIREÇÃO ESPIRITUAL: NECESSIDADE, HISTÓRIA E DICAS PRÁTICAS Monografia apresentada ao Curso de Teologia da Escola de Humanidades da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Teologia. Orientador: Prof. Dr. Pe. Tiago de Fraga Gomes. Porto Alegre 2023
  • 3. 3 ROGER MESQUITA HAAG DIREÇÃO ESPIRITUAL: NECESSIDADE, HISTÓRIA E DICAS PRÁTICAS Monografia apresentada ao Curso de Teologia da Escola de Humanidades da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Teologia. Orientador: Prof. Dr. Pe. Tiago de Fraga Gomes. Aprovado em 04 de Julho de 2023. ___________________________________ Prof. Dr. Pe. Tiago de Fraga Gomes (Orientador) ___________________________________ Prof. Dr. Pe. Carlos Jose Monteiro Steffen
  • 4. 4 SUMÁRIO RESUMO................................................................................................................ 5 ABSTRACT............................................................................................................ 6 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS................................................................ 7 INTRODUÇÃO....................................................................................................... 8 1 NECESSIDADE HUMANA DE DIREÇÃO ESPIRITUAL.................................. 10 1.1 SER HUMANO E SENTIDO DA VIDA........................................................ 10 1.2 SER HUMANO E REALIZAÇÃO: PECADO, JUSTIFICAÇÃO E GRAÇA .. 16 2 DIREÇÃO ESPIRITUAL NA HISTÓRIA ........................................................... 20 2.1 DIREÇÃO ESPIRITUAL NAS SAGRADAS ESCRITURAS........................ 20 2.2 DIREÇÃO ESPIRITUAL NA HISTÓRIA DA IGREJA ................................. 23 2.3 DIREÇÃO ESPIRITUAL NO MAGISTÉRIO DA IGREJA............................ 29 3 PRÁTICA DA DIREÇÃO ESPIRITUAL ............................................................ 33 3.1 CONCEITO DE DIREÇÃO ESPIRITUAL ................................................... 33 3.2 DIRETOR ESPIRITUAL ............................................................................. 35 3.3 DIRIGIDO ESPIRITUAL ............................................................................. 39 3.4 CONVERSA DE DIREÇÃO ESPIRITUAL E SUA PREPARAÇÃO............. 42 CONCLUSÃO ...................................................................................................... 45 REFERÊNCIAS.................................................................................................... 46
  • 5. 5 RESUMO Esse trabalho apresenta, de maneira introdutória, a importância da prática da direção espiritual, com base em estudos de especialistas, teólogos, fontes da Sagrada Escritura e ensinamentos do magistério. Seu objetivo é identificar as necessidades que levam a essa prática, suas origens e como proceder. Portanto, o foco da obra está na relação mestre e discípulo, que remonta aos primeiros religiosos a praticarem a direção espiritual: os padres do deserto. O trabalho visa responder perguntas frequentes de pessoas que ouvem falar sobre essa prática, mas não a conhecem profundamente: qual é a necessidade que o homem tem de ser dirigido? De onde vem essa prática? Como ocorre a direção espiritual e com quem? PALAVRAS-CHAVE: Direção Espiritual. Sentido da Vida. Pecado. Graça. Ser Humano. Realização.
  • 6. 6 ABSTRACT This work presents, in an introductory manner, the importance of the practice of spiritual direction, based on studies by experts, theologians, sources from Sacred Scripture, and teachings of the Magisterium. Its objective is to identify the needs that lead to this practice, its origins, and how to proceed. Therefore, the focus of the work lies in the master-disciple relationship, which dates back to the first religious individuals who practiced spiritual direction: the desert fathers. The work aims to answer frequently asked questions from people who have heard about this practice but do not have a deep understanding of it: what is the need for human beings to be guided? Where does this practice come from? How does spiritual direction occur and with whom? KEYWORDS: Spiritual Direction. Sense of life. Sin. Grace. Human being. Realization.
  • 7. 7 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CIC – Catecismo da Igreja Católica. CV – Christus Vivit. GE – Gaudete et Exsultate. GS – Gaudium et Spes. LG – Lumen Gentium. OT – Optatam Totius. PDV – Pastores Dabo Vobis. PMP – O presbítero, mestre da Palavra, ministro dos sacramentos e guia da comunidade, em vista do terceiro milênio. PO – Presbyterorum Ordinis. SCD – O sacerdote ministro da misericórdia divina – Subsídio para confessores e diretores espirituais.
  • 8. 8 INTRODUÇÃO O trabalho a seguir é um itinerário introdutório à prática de direção espiritual. O grande objetivo aqui é demonstrar quão necessária essa prática é para o homem de todos os tempos, principalmente para o homem contemporâneo, que, em muitas realidades, tem potencializado grandes misérias e vícios do passado. No primeiro capítulo, o texto vai destacar uma certa necessidade antropológica do homem, tanto espiritual quanto humana, com base principalmente em dois autores: Pe. Henrique de Lima Vaz, que, com toda a sua sabedoria, apresenta uma antropologia na qual o homem é compreendido em três dimensões, não sendo reduzido à mera condição animal sem a dimensão espiritual; e Viktor E. Frankl, o grande logoterapeuta dos campos de concentração, que apresenta uma visão antropológica semelhante, na qual ambas as visões se complementam e revelam um homem que necessita buscar um sentido para a vida. O capítulo encerra abordando a necessidade da direção espiritual para a vida espiritual, evidenciando que o homem, condicionado pela concupiscência, necessita de alguém que o auxilie a guiar seus passos em direção a uma vida na graça. No segundo capítulo, após ter diagnosticado a necessidade, o texto vai abordar a realidade histórica, começando pela Sagrada Escritura, passando pela história da Igreja e concluindo com a exploração da doutrina presente no magistério mais atual da Igreja. O interessante deste capítulo é descobrir como essa prática evoluiu ao longo do tempo e como ainda mantém seu objetivo principal, que é a busca pelo amadurecimento espiritual em prol da santidade. No terceiro capítulo, serão apresentadas algumas definições e orientações práticas para aproveitar bem a prática da direção espiritual. Será abordada a definição de direção espiritual, quem é o diretor e quem é o dirigido, e o capítulo será concluído com uma abordagem e dicas práticas de como tanto o diretor quanto o dirigido podem aproveitar melhor essa prática.
  • 9. 9 Por fim, a pesquisa busca fornecer um subsídio básico para que qualquer pessoa que o leia compreenda o que é essa prática, qual a sua necessidade e como proceder para ser um bom dirigido. Que Deus, nosso Senhor, continue a falar aos corações por meio do seu Santíssimo Espírito e não deixe de chamar sacerdotes, religiosos e leigos bem instruídos para guiar cada vez mais e melhor o povo de Deus, que tanto necessita.
  • 10. 10 1 NECESSIDADE HUMANA DE DIREÇÃO ESPIRITUAL O homem, em sua realidade antropológica, tem necessidade de uma completude, algo que o faça sair de si mesmo e ir ao encontro de algo ou alguém. Portanto, é justamente essa a realidade que podemos identificar em uma visão não meramente filosófica, mas também psicoterapêutica e espiritual do homem. O homem então, busca não somente um sentido para vida, mas alguém que o ajude a discernir e encontrar esse sentido que na condição de vida espiritual é o próprio Deus. 1.1 SER HUMANO E SENTIDO DA VIDA O ser humano é muito complexo, disso todo ser que se reconhece humano sabe, mas, é de tamanha preocupação que o homem entenda a fundo o que ele mesmo é. Sabendo dessa necessidade de aprofundamento antropológico, um conhecido filosofo brasileiro chamado Pe. Henrique de Lima Vaz, em sua obra "Antropologia Filosófica: a questão da pessoa”, apresenta uma definição do ser humano que enfatiza a dimensão relacional do seu ser: Ser pessoa é ser relação, é estar para o outro, é estar com o outro, é estar por meio do outro. O homem é pessoa porque está aberto para a alteridade, para a transcendência, para o Mistério que é a fonte de todo ser, de todo conhecimento, de todo amor, de todo valor.1 O Pe, Henrique de Lima Vaz, ainda destaca que essa abertura para a transcendência não é algo que o ser humano possa escolher ou rejeitar, mas sim uma condição ontológica inerente à sua natureza: "O homem não escolheu ser transcendente, não fez opção por essa abertura para o ser; ele é assim, por natureza, constitutivamente”2 Dessa forma, para o padre Henrique, a transcendência é uma dimensão fundamental do ser humano, que o impulsiona em direção ao Mistério divino e à busca de sentido para a sua existência. 1 VAZ, Henrique Cláudio de Lima. Antropologia Filosófica, p. 76. 2 VAZ, Henrique Cláudio de Lima. Antropologia Filosófica, p. 139.
  • 11. 11 O ser humano é uma unidade complexa e integrada, composta por três dimensões interdependentes. A dimensão corpórea diz respeito ao corpo físico, à biologia e aos processos fisiológicos que OS mantêm vivos. A dimensão psíquica abrange os pensamentos, emoções, sentimentos e comportamentos, enquanto a dimensão espiritual se relaciona com a busca por significado, valores e sentido de propósito.3 Em relação à dimensão corpórea, Vaz destaca que o corpo humano é uma realidade fundamental na compreensão do ser humano, pois é através dele que a pessoa se relaciona com o mundo e com os outros. Para ele, "o corpo é a expressão sensível da pessoa, é o lugar de sua presença no mundo e o meio de sua comunicação com ele”4. Quando um homem se encontra com um corpo, entende- se que só ele em si mesmo não expressa o todo do ser humano, mas, pode-se dizer que o corpo expressa algo a mais do que só materialidade. Por isso, que afirma também ter uma dimensão psíquica. Quanto à dimensão psíquica, Vaz enfatiza a importância da subjetividade na compreensão do ser humano, afirmando que "a interioridade do ser humano é o lugar de sua subjetividade e a fonte de seu sentido"5. Nessa dimensão, estão presentes os aspectos cognitivos, emocionais e volitivos do ser humano. No íntimo dessa realidade, pode-se entender que nessa dimensão o ser humano é questionado sobre o sentido da vida e questionando-se sobre isso encontra uma dimensão ainda mais profunda em si que é a dimensão espiritual, a parte mais profunda e significativa da vida humana, responsável por dar sentido e direção à existência. Ele argumenta que a dimensão espiritual é a fonte da transcendência, da criatividade, da liberdade e da responsabilidade humana.6 Padre Vaz também enfatiza que a dimensão espiritual não pode ser reduzida a conceitos abstratos ou teorias religiosas. Para ele, a dimensão espiritual é uma experiência concreta da presença de Deus na vida humana. O homem para Vaz é um ser com essas dimensões, mas, explica que não se pode pensar essas 3 VAZ, Henrique de Lima. Antropologia Filosófica, p. 139. 4 VAZ, Henrique de Lima. Antropologia Filosófica, p. 81. 5 VAZ, Henrique de Lima. Antropologia Filosófica, p. 104. 6 Cf. VAZ, Henrique de Lima. Antropologia Filosófica, p. 104.
  • 12. 12 dimensões, como que em partes do ser humano, mas deve ser pensado em uma unidade. O homem é um ser unitário, total, que compreende uma dimensão corpórea, uma dimensão psíquica e uma dimensão espiritual, que não podem ser compreendidas separadamente, mas somente em sua interconexão. O homem, porém, é mais do que a soma dessas dimensões. Ele é um ser dotado de unidade, de identidade, de consciência de si mesmo.7 Nesta passagem, Padre Henrique de Lima Vaz afirma que o ser humano é uma unidade composta por suas dimensões corpórea, psíquica e espiritual, que não podem ser compreendidas separadamente. Ele também destaca que o ser humano é mais do que a soma dessas dimensões, pois possui identidade e consciência de si mesmo. Essa consciência de si mesmo faz com que o homem encontre o sentido da sua própria vida. Segundo Vaz, o sentido da vida pode ser encontrado na busca pela transcendência e na realização do projeto pessoal de cada indivíduo. Ele afirma que "o homem é um ser em busca de sentido, e esse sentido não pode ser dado a ele de fora, mas é preciso que ele mesmo o construa"8 Vaz também destaca a importância da felicidade na vida humana, mas ressalta que ela não pode ser buscada diretamente, mas sim como consequência da realização do projeto pessoal de cada indivíduo. Ele afirma que "a felicidade não é um fim em si mesma, mas sim a consequência da realização do projeto de vida de cada um"9 O psicoterapeuta Viktor E. Frankl, apresenta uma necessidade de busca por esse sentido, quando identifica no homem uma realidade chamada “vazio existência”, que tem por definição a falta do sentido da vida. O homem está desfocado, pois tempos atrás ele tinha valores e tradições que ajudavam a seguir em frente. Hoje o homem, sem valores e sem as tradições, beira o tédio e o não saber o que fazer de sua vida. Frankl nos apresenta essas afirmações de maneira bem clara: 7 VAZ, Henrique de Lima. Antropologia Filosófica, p. 20. 8 VAZ, Henrique de Lima Escritos de filosofia II: Ética e cultura, p. 21. 9 VAZ, Henrique de Lima Escritos de filosofia II: Ética e cultura, p. 53.
  • 13. 13 Diversamente do que acontece aos outros animais, o homem não vem imposto por pulsões e instintos o que deve fazer e, diversamente do homem de outros tempos, não lhe vem imposto o que deveria fazer por tradições e valores tradicionais. Ora, não existindo tais imperativos, o homem talvez não saiba mais o que quer fazer. O resultado? Ou faz o que fazem os outros- o que vem a ser o conformismo- ou então faz o que outros impõem que ele faça- que vem a ser o totalitarismo.10 O exemplo que Frankl expõe de um homem que segue o fluxo, ou que vive conformado com o que os outros fazem, demonstra que o homem está sofrendo: primeiro com a forma com que o homem é entendido no contexto contemporâneo (ou seja, sendo apenas mais um em meio a massa, perdendo a cada dia sua individuação e demonstrando que não segue um sentido próprio que o realize, mas um sentido em massa). Essa visão é errada, pois nesse caso estaria um homem que consiste na unidade de corpo, alma e espírito; o homem é um ser individual, e, ao pensá-lo em massa, o faz adentrar em conformismos que produzem - em massa - homens vazios de sentido e realização. O mesmo acontece quando, olhando a segunda afirmação de Frankl, o homem que perdeu suas tradições e valores adentra em apenas obedecer a ordens e limitar-se ao totalitarismo, o que também analisa o homem de uma maneira mecanicista, desvalorizando-o de si. O totalitarismo que o homem se coloca é porque, no fundo, sente que tem que fazer algo da sua vida; entretanto, por não conseguir encontrar esse "algo" (ao menos de maneira inicial), prefere seguir aquilo que os outros o impõem, para que ao menos tenha sua vida dotada de afazeres que o tiram a angústia de se questionar pelo sentido, mas é importante saber que “O sentido da vida difere de pessoa para pessoa e de momento para momento. O que é exigido de cada um é que seja sua própria tarefa.”11 Frankl ainda afirma que o vazio existencial pode se apresentar em diversas formas, inclusive em buscas de sentido frustradas, como por exemplo a busca de poder, de dinheiro e sexo. Ainda, demonstra que a libido sexual pode entrar em proporções desmedidas em relação ao vazio. O homem que sente o vazio existencial anda como que sobre um labirinto que não tem caminhos, pois não sabe para onde andar ou seguir fazendo com que 10 FRANKL. E Viktor. Um sentido para vida: Psicoterapia e humanismo, p. 24. 11 FRANKL, Viktor E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração, p.111.
  • 14. 14 o sentimento de angústia e tédio tomem conta dele: “O vazio existencial manifesta- se principalmente num estado de tédio”12 Por definição, o vazio é a falta de sentido, mas também é ele que move o homem a buscar um significado para sua vida. De certa forma, é sadio o homem, uma vez na vida, sentir-se vazio de sentido ou se enfrentar internamente por essa busca de sentido. O ser humano deve ter esse confronto, para então entender o valor de se ter um “como” e “para que” viver. O homem que se preocupa com o vazio não é doente (como dizia Freud), mas, “demonstra sua humanidade”13. O logoterapeuta analisa em suas maiores obras a importância de se destacar a vontade de sentido, e, do ponto de vista fenomenológico, pode-se afirmar que a vontade de sentido é uma necessidade fundamental e básica no homem. É algo específico e necessário na unidade, pois o homem que não tem vontade de sentido (ou não tem um sentido) está fadado à morte. Essa vontade de sentido é algo intrínseco ao homem. Para Frankl, um logoterapeuta não pode conferir sentidos, mas ajudar a descobri-los, quando diz “Não podemos dar sentido à vida de outra pessoa, mas podemos ajudá-la a encontrar seu próprio sentido”.14 O ser humano não deve também ser tirado do seu próprio contexto, o que levaria a um reducionismo. O sentido propriamente dito não pode ser passado de geração em geração, como as tradições, mas ele é entendido a partir de uma situação concreta na vida individual. A logoterapia não diz o que é um sentido, mas pode demonstrar que ele existe e que o próprio paciente tem um. Além disso, demonstra que a vida é dotada dele, podendo chegar até o seu último suspiro sentindo-o e buscando-o. Pode-se ver que Frankl preocupa-se com as realidades atuais, como por exemplo com o suicídio, conforme transcrição do trecho abaixo: Foi desprezado ou esquecido que se uma pessoa chegou a colocar as bases do sentido que procurava, então está pronta para sofrer, a oferecer sacrifícios, a dar até, se necessário, a própria vida por amor daquele sentido. Ao contrário, se não existir algum sentido para seu viver, uma pessoa tende a tirar-se a vida e está pronta a 12 FRANKL, Viktor E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração, p. 131. 13 Cf. FRANKL, Viktor E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração, p. 22. 14 FRANKL, Viktor E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração, p. 110.
  • 15. 15 fazê-lo mesmo que suas necessidades sob quaisquer aspectos estejam satisfeitas.15 A pessoa sem o sentido de sua vida perde o caminho abaixo de seus pés. Para Frankl, não é determinado que aconteça o suicídio, mas uma vida sem um sentido é como viver sem viver, pois, o sentido fornece a força necessária para enfrentar qualquer possível acontecimento trágico. O que não tem sentido diante da vida tende a tirar sua vida, pois, se não há sentido, para onde a vida deve seguir seu rumo? É importante destacar essas questões do suicídio analisadas do ponto de vista de uma “falta de sentido para se viver”, pois é justamente umas das preocupações de Frankl, que passou por grandes provações de sentido em meio ao campo de concentração. É um homem que realmente encontrou um sentido para o qual viver - mesmo que esse sentido seja a publicação dos seus escritos perdidos em Auschwitz. A vontade de sentido, para Frankl, é a vontade do puramente humano; ela alimenta a vontade corporal e psíquica, fazendo assim com que essa vontade psicossomática seja permeada pela vontade espiritual do sentido, levando o homem a superar qualquer sacrifício, dor e atividades de limite humano. Frankl entende que na vida não há momento algum que não se tenha sentido. Esse sentido pode não estar descoberto, mas “a vida não deixa jamais de ter sentido.”16. Sempre terá um sentido a ser descoberto. Em qualquer situação pode-se descobrir o sentido, e Frankl mostra isso quando diz: Mas não devemos esquecer que podemos descobrir um sentido na vida mesmo quando nos vemos numa situação sem esperança, na qualidade de vítimas sem nenhuma ajuda, mesmo quando enfrentamos um destino que não pode ser mudado. O que realmente importa e conta mais é dar testemunho do potencial, unicamente humano, que, em sua forma mais alta, deve transformar uma tragédia em um triunfo pessoal, (...). Quando não temos mais condição de mudar uma situação – pensemos em uma doença incurável, um câncer que não pode ser operado – então somos estimulados a mudar a nós mesmos. A mudança interior parte do encontro com o sentido na vida e acarreta o triunfo do homem sobre a tragédia, quando se desvenda o sentido velado. Quem 15 FRANKL, Viktor E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração, p. 18. 16 FRANKL, E Viktor. Um sentido para vida: Psicoterapia e humanismo, p. 41.
  • 16. 16 encontra um sentido em meio ao sofrimento triunfa, pois é capaz de sofrer, oferecer sacrifícios e doar-se ao outro. Mas o caminho que se dá entre o vazio existencial e o encontro com o sentido da vida é um caminho de acompanhamento e diálogo com algum profissional, com um terapeuta e até um diretor espiritual, pois o homem, por si mesmo, e por estar sempre sob a influência do pecado, nunca consegue enxergar o cenário completo, por isso, é preciso entender mais sobre o ponto de vista espiritual e teológico essa necessidade de sentido e acompanhamento. 1.2 SER HUMANO E REALIZAÇÃO: PECADO, JUSTIFICAÇÃO E GRAÇA O pecado é sempre uma escolha do homem contra si mesmo. O homem, por desobediência ao mandamento do Senhor, escolhe livremente viver segundo seus próprios preceitos e normas, e é exatamente aí que as coisas se complicam, pois, age diretamente contra si mesmo. São Paulo diz “Eis por que, como por meio de um só homem o pecado entrou no mundo e, pelo pecado, a morte” (Rm 5,12.), “e, ao dizer isso, chama a atenção para o fato de que o pecado é um caminho seguro para a morte, não apenas biológica, mas também a morte da graça no homem”.17 O pecado dos primeiros pais exerce uma tremenda influência na vida humana, inclusive atualmente. Como todos pecam por causa do pecado de Adão, também todos sofrem as consequências desse pecado, conforme afirmou Leo J. Treze. O trágico é que não foi um pecado só de Adão. Como todos nós estávamos potencialmente presentes no nosso Pai comum, todos sofremos com esse pecado. Por Decreto divino, Adão era o embaixador plenipotenciário de todo o gênero humano. O que ele fez, todos o fizemos.18 O homem, consequentemente, está fadado a tudo aquilo que entrou em seu coração através do pecado. Por isso, está fadado à morte, fraquezas e doenças, bem como a outro mal chamado concupiscência. São Paulo deixa claro na prática 17 GARRIGOU-LAGRANGE, Reginald. As três idades da vida interior, p. 350. 18 TRESE, Leo J. A fé explicada, p. 51.
  • 17. 17 o que significa a concupiscência ao afirmar: “Pois a carne tem aspirações contrárias ao Espírito e o Espírito contrárias a carne. Eles se opõem reciprocamente, de sorte que não fazeis o que quereis” (Gl 5,17), Assim, pode-se afirmar que a concupiscência nada mais é do que uma inclinação, um condicionamento que a carne impõe sobre o Espírito. A realidade do homem ferido pelo pecado é, de fato, triste. Essa tristeza fica evidente quando se compara a condição atual do homem com seu estado original, antes do pecado. Como afirmou Lagrange, é importante lembrar que a humanidade foi criada em um estado de graça, em que a harmonia e a perfeição reinavam. Existia nele uma perfeita harmonia com entre Deus e a alma, feita para o conhecer, amar e servir, e entre a alma e o corpo; tanto que a alma, de fato, estava submissa a Deus, as paixões ou emoções da sensibilidade estavam submissas a reta razão iluminada pela fé, e à vontade vivificada pela caridade; o próprio corpo tinha o privilégio de participar desta harmonia, no sentido de que ele não estava sujeito à doença nem à morte.19 O pecado é como uma laranja podre em meio a uma caixa de laranjas boas, que vai contaminando e deteriorando tudo ao seu redor até que tudo esteja tomado de podridão. Em virtude da sua falta, Adão transmitiu para a humanidade uma natureza decaída, privada da graça divina e ferida (Cf. CIC403). Daí se origina uma vontade inclinada para o mal e fraca para o bem, uma razão tendenciosa ao erro e uma sensibilidade que busca o prazer de maneira desordenada. Essa condição do homem ferido pelo pecado é triste, pois ele se afasta cada vez mais da sua verdadeira natureza e se torna escravo dos seus próprios desejos egoístas.20 O homem vê-se dividido, inteiramente coberto por uma vontade dividida que “Conserva o desejo do bem, mas a sua natureza está ferida pelo pecado original.” (CIC 1707). Essa natureza ferida faz com que o homem entre em uma guerra pessoal e firme, na qual não pode contar somente com suas próprias forças, como afirma a Constituição Pastoral Gaudium et Spes. O homem encontra-se, pois, dividido em si mesmo. E assim, toda a vida humana, quer singular quer coletiva, apresenta-se como uma luta dramática entre o bem e o mal, entre a luz e as trevas. Mais: o homem descobre-se incapaz de repelir por si mesmo as arremetidas do inimigo: cada um sente-se como que preso com cadeias. Mas o Senhor em pessoa veio para libertar e fortalecer o 19 GARRIGOU-LAGRANGE, Reginald. As três idades da vida interior, p. 350. 20 Cf. GARRIGOU-LAGRANGE, Reginald. As três idades da vida interior, p. 351.
  • 18. 18 homem, renovando-o interiormente e lançando fora o príncipe deste mundo (cfr. Jo. 12,31), que o mantinha na servidão do pecado. Porque o pecado diminui o homem, impedindo-o de atingir a sua plena realização (GS 13). O homem, que já não pode contar somente com suas próprias forças, agora conta com as forças de Jesus Cristo, que o redime, liberta e o faz Seu filho de um modo inimaginável. Ele se incorpora em Cristo, tornando-se um com Ele e tornando-se filho de Deus21. Essa redenção e libertação do homem são conhecidas como justificação, que nada mais é do que a “iniciativa divina que arranca o ser humano do pecado e o restaura na vida da graça”22. Tal iniciativa, acontece pela redenção dada por Cristo por sua morte e ressurreição. Por sua redenção deixou para toda a humanidade a Igreja, como nos afirma a Lumen Gentium: Veio pois o Filho, enviado pelo Pai, que n’Ele nos elegeu antes de criar o mundo, e nos predestinou para sermos seus filhos de adopção, porque lhe aprouve reunir n'Ele todas as coisas (cf. Ef 1, 4-5.10). Por isso, Cristo, a fim de cumprir a vontade do Pai, deu começo na terra ao Reino dos Céus e revelou-nos o seu mistério, realizando, com a própria obediência, a redenção. A Igreja, ou seja, o Reino de Cristo já presente em mistério, cresce visivelmente no mundo pelo poder de Deus. Tal começo e crescimento exprimem- nos o sangue e a água que manaram do lado aberto de Jesus crucificado (cfr. Jo 19,34), e preanunciam-nos as palavras do Senhor acerca da Sua morte na cruz: “Quando Eu for elevado acima da terra, atrairei todos a mim” (Jo 12,32 gr.). Sempre que no altar se celebra o sacrifício da cruz, na qual “Cristo, nossa Páscoa, foi imolado” (1Cor. 5,7), realiza-se também a obra da nossa redenção (LG 3). A iniciativa divina também permitiu que o homem, através da Igreja, recebesse, pelo batismo, essa vida na graça, que é fortalecida pelo sacramento da confirmação e alimentada pela Eucaristia. O batismo é o sacramento pelo qual o pecado original é apagado e a vida da graça de Cristo é concedida.23 É justamente pelo batismo que o homem experimenta a graça da justificação. O Catecismo afirma que, através do batismo, o homem participa dessa imensa graça e a recebe: A Santíssima Trindade confere ao batizado a graça santificante, a graça da justificação, que – o torna capaz de crer em Deus, esperar n’Ele e O amar, pelas virtudes teologais; – lhe dá o poder de viver e agir sob a moção do Espírito Santo e pelos dons do Espírito Santo; – lhe permite crescer no bem, pelas virtudes morais. Assim, todo o 21 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 113. 22 SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 114. 23 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 114.
  • 19. 19 organismo da vida sobrenatural do cristão tem a sua raiz no santo Batismo (CIC 1266). O batismo o qual o próprio Jesus enviou seus discípulos a realizar quando diz “Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho, e do Espírito Santo” (Mt 20,19). É o início da vida na graça, é onde o homem inicia sua vida na filiação divina e dá o primeiro passo no progresso espiritual. É justamente nesse batismo que o homem ferido não só recebe a cura do pecado, mas também a graça de se tornar filho de Deus, ou seja, ele recebe a graça santificante, como afirmado no catecismo citado acima. A graça santificante é o início da santificação na alma, e por ela o homem mergulha na suprema bondade de Deus, que não mede esforços para se doar: A graça de Cristo é dom gratuito que Deus nos faz da sua vida, infundida pelo Espírito Santo na nossa alma para a curar do pecado e a santificar. É a graça santificante ou deificante, recebida no Baptismo. É, em nós, a nascente da obra de santificação (CIC 1999). Por mais que tamanha graça seja alcançada por meio do santo batismo, o homem ainda carrega algumas “sequelas” da devastação causada pelo pecado em seu interior. “as consequências para a natureza, debilidade e inclinada para o mal, persistem no homem e chamam-no para o combate espiritual”24. Para sair vitorioso nesse combate, o homem deve buscar vencer a si mesmo, mas também encontrar alguém que o ajude a fazer um bom discernimento daquilo que se apresenta. Por isso, receber conselhos e ter alguém que ajude o homem a fazer tal discernimento é fundamental, e a esse aconselhamento dá-se o nome de direção espiritual. O aconselhamento ou direção espiritual ajuda a distinguir “o Espírito da Verdade e o espírito do erro” (1Jo 4,6) e a “revestir o homem novo, criado à imagem de Deus, em verdadeira justiça e santidade” (Ef 4,24). A direção espiritual é sobretudo um auxílio para o discernimento no caminho da santidade ou perfeição (SCD 77). E essa prática tão importante teve lugar ao longo do tempo, desde o Antigo Testamento até os dias atuais. Ela tem sido explorada e aproveitada pelos homens que buscam alcançar a graça de viver com Deus na eternidade. 24 SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 14.
  • 20. 20 2 DIREÇÃO ESPIRITUAL NA HISTÓRIA O ser humano ao longo de todas as eras, em seus momentos mais desafiadores ou em seus desejos mais extravagantes, sempre buscou orientação ou conselho de indivíduos mais experientes. Quando as angústias ou os anseios se relacionam com a esfera espiritual, as pessoas sempre recorreram a sacerdotes, religiosos e leigos devidamente instruídos, o que a Igreja entende como aconselhamento espiritual ou direção espiritual. Assim afirma a Igreja, através da Sagrada Escritura, da Tradição e do Magistério. Como afirma o Frei Patrício Sciardini OCD: Não é meu interesse tentar provar, à luz dos grandes mestres das religiões, a necessidade de termos amigos que possam nos ajudar a superar dificuldades da vida. Para tal reflexão basta lançar um olhar ao Antigos Testamento e perceber que Deus não criou o ser humano e o abandonou a si mesmo.25 2.1 DIREÇÃO ESPIRITUAL NA SAGRADAS ESCRITURAS A Sagrada Escritura está repleta de afirmações que nos indicam e fundamentam aquilo que posteriormente será conhecido como direção espiritual. E algumas dessas passagens podem ser consideradas como fundamentos que levaram à edificação e orientação dessa prática. Deus inclusive indica que busquemos por essa prática “Busca o conselho de toda a pessoa sensata, e não desprezes nenhum conselho salutar” (Tb 4,18). É especialmente feliz aquele que segue os bons conselhos, pois trata-se da verdade e da sabedoria. Essa sabedoria participa da sabedoria do Criador. Por parte daquele que é sábio, cabe a ele o serviço de ensinar e guiar seus seguidores com retidão e constância, pois conforme a Escritura “O verdadeiro sábio ensina o seu povo e os frutos de sua inteligência são garantidos” (Eclo 37,27). A dinâmica de ensinar o povo é própria dos sábios, dos verdadeiros sábios. 25 SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 23.
  • 21. 21 O livro da Sagrada Escritura que poderia ser um guia para a direção espiritual é o livro dos Provérbios. Em sua introdução, o próprio autor define o propósito e a finalidade do livro, indicando assim a beleza da vida daqueles que seguem conselhos: os sábios. Desde o Antigo Testamento até o Novo Testamento, a Palavra de Deus está repleta de passagens que podem fundamentar essa realidade de que o ser humano precisa de orientação, ou como se afirma, de direção espiritual. Provérbios de Salomão, filho de Davi, rei de Israel; para conhecer sabedoria e disciplina, para penetrar as sentenças profundas, para adquirir disciplina e sensatez, -justiça, direito e retidão -, para ensinar sagacidade aos ingênuos, conhecimento e reflexão ao jovem, que o sábio escute, e aumente a sua experiência, e o prudente adquira a arte de dirigir -, para penetrar provérbios e sentenças obscuras, os ditos dos sábios e os seus enigmas (Pr 1,1- 6) O Novo Testamento aborda de forma mais profunda a realidade relacionada ao destino final dos seres humanos, que é a comunhão com Deus nos céus. Há uma preocupação com as almas e uma espécie de discipulado por parte dos líderes. Obedecei aos vossos dirigentes, e sede-lhes dóceis; por que velam pessoalmente sobre as vossas almas, e disso prestarão contas. Assim poderão fazê-lo com alegria e não gemendo, o que não vos seria vantajoso (Hb 13,17). Essa passagem de Hebreus traz à tona uma realidade muito característica da obediência, que está no centro e no coração de toda a Sagrada Escritura quando se trata da santificação da alma e do cuidado com a alma. A própria preocupação do Senhor com os Seus discípulos, o amor com o qual os aconselhava e guiava suas almas ao amadurecimento.26 A realidade dos profetas e dos santos patriarcas como diretores espirituais é muito evidente no Antigo Testamento, mas no Novo Testamento, em Cristo, dentro dessa importância dada à relação do homem com Deus e como é cobrada dos próprios fiéis essa familiaridade com Deus para alcançar a perfeição, fica clara a necessidade do próprio homem perceber essa realidade, “provavelmente, não pode ser alcançada sem ajuda de alguém experiente nessa comunhão com Ele”27. 26 Cf BETÊ, Eneas de Camargo. Direção Espiritual, 29/09/2017. 27 SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 29.
  • 22. 22 O Senhor Jesus é o próprio mestre, aquele que orienta e guia. Em Seu evangelho, Ele instrui seus seguidores a buscarem o Reino de Deus e Sua justiça, prometendo que o restante lhes será acrescentado. Todo o ensinamento de Jesus é uma prática e uma direção espiritual, pois Ele deseja ser o único mestre da vida humana. Somente Sua palavra e orientação podem conduzir à vida de perfeição. A melhor síntese do Evangelho como direção espiritual certamente são as bem- aventuranças.28 As bem-aventuranças trazem para a humanidade um valor teleológico, ou seja, um valor que aponta para uma finalidade, um objetivo que o homem busca alcançar. Felizes os pobres no espírito por que deles é o Reino dos Céus. Felizes os mansos por que herdarão a terra. Felizes os aflitos, por que serão consolados. Felizes os que tem fome e sede de justiça, por que serão saciados. Felizes os misericordiosos, por que alcançarão misericórdia. Felizes os puros no coração por que verão a Deus. Felizes os que promovem a paz, por que serão chamados filhos de Deus. Felizes os perseguidos por causa da justiça, por deles é o Reino dos Céus (Mt 5,3-10). Nessas palavras reside o maior alimento espiritual e a mais bela orientação que um diretor espiritual poderia oferecer. Elas proporcionam consolo diante das dores e dificuldades, além de uma orientação clara para que a humanidade aspire à nobreza de buscar a felicidade nas profundezas do coração de Nosso Senhor. Nas cartas apostólicas e no livro de Atos dos Apóstolos, encontram-se vários relatos sobre as direções e orientações espirituais que os apóstolos, ou aqueles designados pelos apóstolos, forneciam como líderes espirituais nas comunidades. Era uma prática dos apóstolos, devido ao seu número limitado, deixar pessoas capacitadas nas principais igrejas primitivas para continuar dirigindo e orientando o povo local. Esses líderes espirituais eram responsáveis por fornecer direção e orientação espiritual ao povo daquela região.29 28 SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 39. 29 Cf BETÊ, Eneas de Camargo. Direção Espiritual, 29/09/2017.
  • 23. 23 2.2 DIREÇÃO ESPIRITUAL NA HISTÓRIA DA IGREJA À medida que o cristianismo começou a se espalhar, foi nesse momento que surgiu a direção espiritual como a conhecemos atualmente, embora com algumas diferenças em relação à forma e frequência. Naquela época, parecia mais um processo de discernimento das reflexões internas daqueles que seguiam os padres no deserto e almejavam viver uma vida semelhante à deles. Essa busca por orientação espiritual era feita de uma maneira mais próxima e pessoal, com uma ênfase no diálogo íntimo do coração.30 No deserto, a direção consiste na transmissão da experiência de um modo muito prático, frequentemente original. Dá-se ao discípulo ordens- por vezes absurdas- para quebrar a sua vontade própria ou para testar sua obediência. Far-se -á o mesmo recitar um grande número de orações vocais ou será impedido de as recitar... Exigir- se-á que ele se abandone totalmente nas mãos de seu "formador" e que ele mostre este abandono numa abertura cotidiana de todos os seus pensamentos bons ou maus. Este método não é para ser desdenhado. Tem seus frutos (terá tido também suas vítimas). Baseia-se sobre a escolha livre de um ancião por um discípulo, que pode, por outro lado, deixá-lo. Ela é uma relação essencialmente provisória.31 Os cristãos que viviam no deserto, aos poucos, aproximavam-se da necessidade de discernir aquilo que percebiam no silêncio e na oração. A graça de Deus, que fluía no coração humano, falava e chamava o cristão para uma determinada forma de vida ou para escrever sobre um determinado assunto, levando-os a buscar alguém que pudesse ajudá-los nesse discernimento, a fim de esclarecer ou facilitar a compreensão daquilo que Deus, pela Sua graça, derramava na alma. Na realidade posterior aos desertos, tanto na realidade anacoreta, ou seja, aqueles que viviam isolados e sem comunidade, quanto nos cenobitas, ou seja, aqueles que viviam no silêncio, mas já em comunidades de monges. Os anacoretas tiveram como fundador Santo Antão, e os cenobitas foram fundados por São 30 Cf BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX. 01/2011. 31 VEILLEUX, Dom Armand. A paternidade Espiritual na Tradição cenobitica, 01/11/1998.
  • 24. 24 Pacômio, sendo ele o autor da primeira regra monástica, que define como o monge deve viver.32 Os padres do deserto, tanto aqueles que viviam sozinhos quanto os que formavam pequenas comunidades, sempre adotavam uma dinâmica de mestre- discípulo. Buscavam um monge mais experiente e idoso com o objetivo de encontrar orientações sobre características e formas de viver, ou até mesmo para receber suas instruções a fim de alcançar a graça de Deus por meio delas.33 Nas comunidades monásticas, a abertura de consciência é institucionalizada ao abade ou prior do mosteiro, ou a algum outro monge com grande experiência. Dessa forma, a direção espiritual se torna uma prática comum. Encontramos testemunhos a esse respeito de representantes da teologia ascética, como Cassiano, que viveu por muitos anos entre os monges da Palestina, da Síria e do Egito. Em um de seus livros, ele exorta fervorosamente os jovens cenobitas a abrirem seus corações ao monge mais velho encarregado de sua direção; ele pede que eles expressem sem hesitação ou falsa vergonha seus pensamentos mais secretos e se entreguem completamente à sua opinião no discernimento do que é bom ou ruim. Essa recomendação continua válida até hoje.34 Nesse mesmo período, de acordo com o Frei Patrício Sciadini, a paternidade espiritual exercida pelos padres do deserto não se relacionava diretamente com os métodos psicológicos contemporâneos, mas guardava certa relação quando se tratava da ajuda mútua entre mestre e discípulo. A grande diferença reside no fato de que o método psicológico atual dispensa a palavra de Deus, ao passo que a direção espiritual nunca pode dispensar a palavra de Deus e a ação da Graça pelo Espírito Santo.35 Através da vida de Santo Antão, é possível observar que os anacoretas levavam uma vida dedicada à direção espiritual e à ascese, mesmo que isso não fosse evidente à primeira vista. As pessoas buscavam esses anacoretas em busca de graças, orações e orientações espirituais. Ali passou vinte anos sem interrupção. As pessoas vinham pedir conselhos, consolos e milagres, embora não deixasse ver por ninguém. Um dia já não pôde conter a impaciência de seus admiradores, os quais derrubaram o muro construído por Antão. Haviam passado vinte anos e não se notavam em seu rosto nem 32 Cf. MARIN, Antonio Royo, O.P. Grandes mestres da vida espiritual, p. 76. 33 Cf.SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 59. 34 MAGAÑA, Guadalupe. Desarrollo histórico de la Dirección Espiritual,17/06/2023. Tradução nossa. 35 Cf. SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 59.
  • 25. 25 em seu aspecto marcas de extrema dureza de sua ascese. Tudo nele respirava serenidade e pureza.36 O universo cenobita era um pouco diferente, pois os monges se organizavam em comunidades e seu fundador, São Pacômio, estabeleceu uma regra que definia várias funções para aqueles que viviam em um cenóbio, como um abade geral, ecônomo, enfermeiro, entre outros. No entanto, a atenção principal era dada ao progresso espiritual do monge.37 Procurava-se com esmero a devida instrução espiritual e o progresso ascético dos monges, para os quais se estabelecia uma estrita pontualidade, rigoroso silêncio, determinadas preces, etc. Tudo estava baseado sobre a guarda perfeita da castidade, da pobreza e da obediência aos superiores, assim como sobre o exercício de uma rigorosa penitencia. É importante notar que nesse contexto, os monges não buscavam apenas conselhos ou discernimento, mas sim uma instrução guiada e uma formação de um itinerário espiritual, como um plano de vida a ser seguido. Isso demonstra diversas realidades que também são relevantes no contexto contemporâneo. Posteriormente, um dos grandes homens responsáveis por difundir a importância da direção espiritual foi o Papa São Gregório Magno. Através de sua obra Regula Pastoralis (A Regra Pastoral), ele abordou a formação do clero e a direção espiritual, porém, aqui a ideia de diretor espiritual não era pessoal, mas sim como um pastor ou guia das almas em geral. Foi São Columbano, nos princípios do século VII, quem reintroduziu a ideia da direção espiritual em um contexto individual. Através do sacramento da confissão, ele se tornou um guia espiritual para muitas pessoas. No entanto, do século VII ao XI, não houve grandes avanços ou mudanças significativas na prática da direção espiritual.38 A partir do século XII, temos uma figura importante na história da direção espiritual, que é São Bernardo de Claraval. Ele se destaca como um dos grandes autores a abordar a necessidade da direção espiritual. São Bernardo foi um 36 MARIN, Antonio Royo, O.P. Grandes mestres da vida espiritual, p. 77. 37 Cf MARIN, Antonio Royo, O.P. Grandes mestres da vida espiritual, p. 89. 38Cf BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011.
  • 26. 26 renomado diretor espiritual de sua época e forneceu valiosos conselhos a Eusébio III, que posteriormente se tornou um santo papa. São Bernardo deixou claro a importância da direção espiritual ao enfatizar: “Não sei o que os outros pensam de si mesmos sobre esse assunto; eu falo por experiência própria e, no que me diz respeito, digo que é mais fácil e seguro para mim dirigir os outros do que me dirigir sozinho.”39 Ele expressou claramente que a direção espiritual é, ao mesmo tempo, necessária e um ato de colocar-se sob os cuidados de outro.40 No século XIII, surgiram as ordens mendicantes e, devido à sua maior liberdade em relação ao contato com as pessoas em comparação aos monges, alcançaram um número maior de pessoas. Dessa forma, o desejo e a prática da direção espiritual também começaram a se estender aos fiéis leigos. Os frades das ordens mendicantes tinham como principal responsabilidade o cuidado das almas, que incluía a formação cristã, hoje conhecida como catequese, e a direção espiritual. Inclusive, o Concílio de Latrão IV menciona a necessidade de que as catedrais sempre tivessem um sacerdote disponível para realizar essa tarefa.41 No século XV, surge São Vicente Ferrer como uma figura proeminente no mundo cristão. Ele escreveu sobre a necessidade da direção espiritual e expressou sua preocupação com a escassez de diretores espirituais em seu tempo. Para ele, essa escassez era considerada terrível, pois ele reconhecia a importância vital da direção espiritual. Juntamente com essa época, surge o grande livro de Tomás de Kempis, Imitação de Cristo, que se tornou um verdadeiro guia espiritual. Após esse período, teve início a chamada "idade de ouro" da direção espiritual, como afirmou o padre Manuel dos Santos. A idade de ouro da direção espiritual está constituída pelos séculos XVI e XVII, quando os principais artífices da Reforma Católica divulgaram amplamente os benefícios que a direção espiritual traz as almas que desejam progredir na vida cristã. Dentre tantos 39 BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011. 40 Cf. BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011. 41 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 46.
  • 27. 27 nomes, cabe citar Santo Inácio de Loyola, Santa Tereza de Àvila, São Francisco de Sales.42 Durante a idade de ouro, com Santo Inácio de Loyola, surgiu a poderosa Companhia de Jesus. Santo Inácio apresentou um valioso manual de direção espiritual, que servia como um guia para conduzir os exercícios de espiritualidade. Para Santo Inácio, o diretor espiritual desempenhava o papel de testemunha de Deus e de Seus trabalhos na alma da pessoa que era orientada. Era o diretor espiritual que auxiliava no discernimento e na identificação das moções de Deus na alma daquele que estava sendo direcionado. É por essa razão que a direção espiritual tinha tanta importância na época de Santo Inácio.43 Nesse mesmo período, surgiu uma doutora da Igreja, Santa Teresa de Jesus, que foi a reformadora da Ordem Carmelita. Ela é amplamente conhecida por suas obras sobre a vida espiritual. Santa Teresa tinha uma prática de direção espiritual mais ligada ao sacramento da confissão, especialmente em relação às suas monjas. Ela enfatizava a importância do diretor espiritual ser letrado, ter amplo conhecimento e inteligência. Ela mesma teve experiências negativas com diretores pouco instruídos. Além de atender suas monjas, Santa Teresa também passou a atender leigos em direção espiritual.44 Santa Teresa tinha uma autêntica direção espiritual, não apenas para suas filhas espirituais, mas também para alguns eclesiásticos e fiéis leigos. Nesse sentido, suas cartas para seu irmão Lorenzo de Cepeda são verdadeiras cartas de direção espiritual, especialmente no que se refere ao caminho da oração.45 Após o tempo de Santa Teresa, surgiram muitos outros santos conhecidos e importantes na direção espiritual. Cada um deles tinha suas ênfases particulares, alguns enfocando mais a moralidade, outros a mística, outros a caridade, e assim por diante. Dentre eles, é válido destacar nomes como São João da Cruz, Santo Afonso Maria de Ligório, São João Maria Vianney, São João Bosco, entre outros.46 42 SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 47. 43BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011. 44BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011. 45BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011. Tradução nossa. 46 BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011.
  • 28. 28 São João Maria Vianney se destacou por sua abordagem altamente personalizada na direção espiritual, que se assemelha ao que é praticado posteriormente e atualmente na Igreja. Ele se comportava de maneira distinta com cada penitente e dirigido, levando em conta suas necessidades e circunstâncias individuais.47 Após o Concílio Vaticano II, não ocorreu uma certa decadência na pratica da direção espiritual. Houve, no entanto, mudanças e desafios que afetaram a prática da direção espiritual. Alguns desses motivos são: Nos anos setenta, a expressão direção espiritual foi caindo em desuso, e com ela, como sucede frequentemente na linguagem, a realidade que significava. Vários fatores somaram nesse fenômeno. Por exemplo: A desvalorização do sacramento da reconciliação; a reação a uma visão excessivamente individual da vida espiritual, considerada elitista, sem levar compromisso social e político, uma visão exagerada sobre o período anterior; o grande desenvolvimento das ciências humanas, nas quais algumas das teorias mais difundidas propagaram exageros contrários à ideia cristã de ser humano; o fato de que algumas escolas de psicologia tenham reduzido a pessoa a um conjunto de ideias, impulsos e reflexos, e um obscurecimento da compreensão da liberdade; a circunstância de que na pedagogia, tenha havido particular êxito da apelação à espontaneidade como elemento da formação.48 É importante reconhecer que, embora tenha havido uma desvalorização da direção espiritual em algum momento, essa realidade não pode ser considerada um desastre em sua totalidade. Atualmente, observa-se uma retomada e uma maior aproximação das pessoas em relação à busca por direção espiritual, inclusive por parte daqueles que antes encontravam dificuldades nesse aspecto. Essa tendência desperta uma esperança de que mais pessoas possam se beneficiar dessa prática e, portanto, é necessário aprofundar-se nas orientações trazidas pelo Magistério sobre o assunto.49 47 BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX, 01/2011. 48 SANTOS, Manoel Augusto. Curso sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 47. 49 Cf. SCIADINI, Patrício OCD, A pedagogia da Direção Espiritual, p. 75.
  • 29. 29 2.3 DIREÇÃO ESPIRITUAL NO MAGISTÉRIO DA IGREJA O magistério da Igreja, especialmente em uma realidade mais próxima do tempo atual, abordou o tema da direção espiritual de maneira muito especial na formação sacerdotal. No entanto, é importante ressaltar que a prática da direção espiritual remonta a uma realidade milenar, conforme destacado pela própria congregação para o clero. O aconselhamento espiritual, chamado também de direção e acompanhamento espiritual, é praticado desde os primeiros séculos da Igreja até os nossos dias. Trata-se de uma praxe milenar, que deu frutos de santidade e de disponibilidade evangelizadora. (SCD 64) No documento da Congregação para o Clero, intitulado O Sacerdote Ministro da Misericórdia Divina, destaca-se que a direção espiritual não se destina apenas a cristãos que não são sacerdotes, mas também que não são exclusivamente os sacerdotes que podem orientar as almas. Durante muitos séculos, a Igreja manteve essa prática sob a orientação de monges e sacerdotes. No entanto, ao longo da história, constataram-se outras realidades em que a direção espiritual se tornou também algo próprio de leigos bem formados e religiosos. Mesmo que predominantemente a direção espiritual tenha sido dada por monges e sacerdotes, sempre existiram fiéis (religiosos e leigos) – como por exemplo, Santa Catarina – que prestaram este serviço. A legislação eclesiástica recolheu toda esta experiência e a aplicou sobretudo na formação inicial à vida sacerdotal e consagrada. Existem também fiéis leigos bem formados, homens e mulheres, que desenvolvem este serviço de aconselhamento no caminho da santidade (SCD 65). No mesmo documento, há uma preocupação evidente com a formação dos ministros que também atuam como diretores espirituais, a fim de oferecer uma prática mais diligente e aprofundada desse tema. Portanto, a Congregação para o Clero elabora esse documento com o objetivo de fornecer direcionamento tanto para os diretores espirituais atuais quanto para os futuros (Cf. SCD 66). A Igreja, em sua ação pastoral, tem sempre a missão de auxiliar os fiéis no processo de discernimento dos carismas. Para que isso ocorra, é necessário buscar ajuda e acompanhamento daqueles que passam por essa realidade, e é nesse contexto que surge a figura do diretor espiritual. É por isso que o magistério
  • 30. 30 se preocupa tanto com essa prática e essa pratica. A direção espiritual não substitui nem é substituída em todo o conjunto da atividade pastoral da Igreja, mas possui um lugar específico e fundamental para o funcionamento da vida paroquial e diocesana, a partir de cada membro que vivencia essa prática.50 Na exortação apostólica Gaudete et Exsultate, o Papa Francisco comenta a importância do discernimento e aborda como esse processo deve ser realizado de maneira adequada. Ao utilizar o termo bom conselho, ele certamente faz referência a um tipo específico de direcionamento espiritual. (Cf. GE 166) Em outra Exortação apostólica, intitulada Christus Vivit, o Santo Padre aborda o discernimento dentro de uma perspectiva vocacional e destaca que “Há sacerdotes, religiosos, religiosas, leigos, profissionais e até jovens qualificados, que podem acompanhar os jovens no seu discernimento vocacional” (CV 291). Esse acompanhamento é uma característica intrínseca da direção espiritual, sendo inclusive um aspecto sempre presente no contexto dessa prática, especialmente no que diz respeito ao discernimento vocacional. Nesse contexto, o Papa destaca a importância dessas sensibilidades que podem ser incorporadas à preocupação do magistério em relação aos diretores espirituais. A partir desse momento, é possível compreender que o magistério busca abordar mais profundamente essa prática no contexto da formação sacerdotal e religiosa, especialmente após o Concílio Vaticano II. Após um sínodo sobre o tema, a Exortação Apostólica Pós-sinodal Pastores Dabo Vobis vem ressaltar a importância dessa prática, que foi defendida por São João Paulo II e mencionada por São Paulo VI. Também a prática da direção espiritual contribui muito para favorecer a formação permanente dos sacerdotes. É um meio clássico, que nada perdeu do seu precioso valor, não só para assegurar a formação espiritual mas ainda para promover e sustentar uma contínua fidelidade e generosidade no exercício do ministério sacerdotal. Como então escrevia o futuro Papa Paulo VI, “a direção espiritual tem uma função belíssima e pode dizer-se indispensável para a educação moral e espiritual da juventude que queira interpretar e seguir com absoluta lealdade a vocação da própria vida, seja ela qual for, e conserva sempre uma importância benéfica para todas as idades da vida, quando à luz e à caridade de um conselho piedoso e prudente se pede a comprovação da 50 Cf. MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual, p. 45.
  • 31. 31 própria retidão e o conforto para o cumprimento generoso dos próprios deveres. É meio pedagógico muito delicado, mas de grandíssimo valor; é arte pedagógica e psicológica de grande responsabilidade para quem a exercita; é exercício espiritual de humildade e de confiança para quem a recebe” (PDV 81). Assim, torna-se evidente a tendência do magistério pós-Concílio de promover essa prática, principalmente na vida dos sacerdotes e religiosos. O próprio Concílio Vaticano II, no documento Optatam Totius, enfatiza a importância do diretor espiritual na formação espiritual dos seminaristas, visando capacitá-los a se tornarem bons padres, capazes de unir a vida de estudos doutrinários e pastorais. O documento afirma “A formação espiritual deve estar estreitamente unida com a formação doutrinal e pastoral graças sobretudo à colaboração do director espiritual” (OT 8). Na realidade da formação permanente, o magistério também enfatiza a necessidade dos sacerdotes serem provedores de amizade espiritual e apoio mútuo, especialmente nessa prática. O texto da Congregação para o Clero, intitulado O Presbítero, Mestre da Palavra, Ministro dos Sacramentos e Guia da Comunidade, em vista do Terceiro Milênio, diz o seguinte: Também os irmãos no presbiterado devem ser objetivo privilegiado da caridade pastoral do sacerdote. Ajudar-lhes espiritual e materialmente, facilitar-lhes delicadamente a confissão e a direção espiritual, tornar amável o caminho de serviço, ser-lhes próximos nas suas dificuldades, acompanhá-los com atenção fraterna em qualquer dificuldade, na velhice e na doença. Eis um campo realmente precioso para a prática das virtudes sacerdotais (PMP Cap III, p.3). O próprio decreto Presbyterorum Ordinis do Concílio Vaticano II, que oferece orientações para a vida do presbítero, destaca claramente a importância dessa prática na vida dos sacerdotes, considerando-a uma forma de auxílio para manter a fidelidade sacerdotal. Isso envolve a oração diária com Nosso Senhor, a visita e culto pessoal à Sagrada Comunhão (Cf PO 11). Para que um sacerdote se mantenha fiel, é essencial que ele também se mantenha firme na direção espiritual, pois por meio dela ele é ajudado a seguir os passos corretos e a discernir, como mencionado anteriormente, o melhor caminho a ser percorrido diante do mundo em que vivemos. A prática da direção espiritual parece estar intrinsecamente ligada ao sacramento da penitência, já que as pessoas continuamente buscam orientação e
  • 32. 32 conselho para suas vidas nesse contexto. No entanto, a Congregação para o Clero também destaca a importância dessa prática na vida dos leigos e como ela pode ajudar a sustentar as vocações na Igreja. Conforme afirmado a seguir: A descoberta e a difusão desta prática, em momentos diversos da administração da penitência, é um grande benefício para a Igreja no tempo presente. A disponibilidade generosa e ativa dos presbíteros para praticá-la constitui também uma ocasião importante para determinar e sustentar as vocações ao sacerdócio e as várias formas de vida consagrada (SCD 73). O texto da Congregação para o Clero declara que a prática da direção espiritual, que conduz os fiéis a uma vida de santidade e discernimento vocacional, é uma prioridade pastoral. Ele pede aos sacerdotes que dediquem seu tempo a essa obra de auxílio espiritual, orientação e formação dos fiéis (Cf. SCD 71). Uma conclusão clara que pode ser tirada dessa passagem pelo magistério é que a prática da direção espiritual auxilia os indivíduos em sua formação e, especialmente, os ajuda a trilhar o caminho da santidade, que é tão necessário na vida sacerdotal e religiosa, sobre as quais o magistério predominantemente fala. No entanto, é importante aprofundar-se no entendimento de como essa prática pode ser aplicada na vida dos leigos, jovens e daqueles que também aspiram à santidade. Para isso, é necessário explorar a experiência de descobrir com clareza o que essa prática é e conhecer um pouco mais sobre sua aplicação na vida real.
  • 33. 33 3 PRÁTICA DA DIREÇÃO ESPIRITUAL É de suma importância reconhecer a necessidade do ser humano de buscar uma direção espiritual e compreender como essa prática se desenvolveu ao longo da história e na vida da Igreja. No entanto, não basta apenas ter conhecimento sobre a importância e a ocorrência histórica dessa prática; é necessário saber como colocá-la em prática e compreender como ela acontece na realidade. Aqueles que desejam vivenciar essa prática devem ser capazes de, pelo menos, definir o que é direção espiritual, compreender as responsabilidades do dirigido, identificar quem pode ser um diretor espiritual e como escolher um adequado. Além disso, é crucial compreender como se preparar para essa prática, a fim de que seja verdadeiramente proveitosa para a vida espiritual. 3.1 CONCEITO DE DIREÇÃO ESPIRITUAL A Direção espiritual é fundamentalmente uma ajuda.51 Ela é um auxílio para o discernimento no caminho da “santidade ou perfeição” (SCD 77). É com base nessas duas definições que se pode dizer que a direção espiritual é um meio pelo qual o cristão pode receber ajuda para fazer um reto discernimento da realidade que o interpela e provoca. Como diz o padre Manoel Augusto dos Santos: “É a ajuda dada por um cristão (diretor) a outro (dirigido), ajuda essa que capacita o dirigido a prestar à comunicação pessoal de Deus com ele.”52 Fala-se de “direção” porque aqui está relacionado a outros verbos como acompanhar, guiar e orientar. Esse termo é comumente trocado por acompanhamento ou orientação, para que não pareça uma imposição autoritária, como algumas pessoas pensam. No entanto, ao analisar de maneira mais ampla, entende-se que o acompanhamento espiritual abrange uma esfera mais ampla e 51 MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual, p.20. 52 SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p.28.
  • 34. 34 não é tão pessoal como a direção espiritual. O padre Manoel defende a ideia de que a Igreja sempre acompanha os cristãos, mas a direção espiritual personaliza mais a prática, enquanto o acompanhamento se estende a uma vivência mais ampla.53 Há um anseio gravado no homem pela perfeição e pela santidade, como afirmado acima. São Paulo aos Colossenses (3,1), afirma: “Se, pois, ressuscitastes com Cristo, procurai as coisas do alto”. E no encontro de Jesus com Nicodemos, é possível contemplar o próprio Senhor falando “Em verdade, em verdade te digo: quem não nascer de novo não pode ver o Reino de Deus” (Jo 3,3). (Outras traduções colocam “do alto”). Esse nascer de novo, ou do alto, é o caminho que é proposto e oferecido pela direção espiritual.54 A direção espiritual é comparada a uma espécie de treinamento, semelhante ao que é chamado de coaching no mundo atual, e o diretor espiritual é o coach ou técnico dessa prática. Para o amadurecimento cristão, a Igreja recomenda essa prática, pois é através dela que a vida interior do cristão se mantém vibrante.55 Segundo a congregação para o clero, ela tem por objetivo ajudar “a formar a consciência instruindo a mente, iluminando a memória, fortalecendo a vontade, orientando a afetividade e, com coragem, encaminhando-se generosamente rumo à santidade” (SCD 81). A direção espiritual pode ocorrer de várias formas diferentes. Pode ser mais intensa no início, pode acontecer mensalmente ou em um período de tempo mais prolongado, ou mesmo ser realizada apenas uma vez. A Congregação para o Clero esclarece essa questão ao dizer: A direção pode ser habitual ou um acompanhamento transitório ad casum. Além disso, esta pode ser mais intensa inicialmente. É frequente que alguns fiéis, no caminho da vocação, sintam-se convidados a pedir a direção espiritual, graças a pregação, a leitura, aos retiros e encontros de oração, ou mesmo a confissão. Uma leitura atenta dos documentos do Magistério pode suscitar a exigência de procurar um diretor com a intenção de viver mais coerentemente a vida cristã. Esta entrega à vida espiritual conduz a um maior desempenho na vida social: “a disponibilidade para Deus 53 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p.29. 54 Cf. SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 15. 55 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p.193.
  • 35. 35 abre à disponibilidade para os irmãos e para uma vida entendida como tarefa solidária e jubilosa” (SCD 86). O desejo de iniciar a direção espiritual pode surgir de várias maneiras no coração dos cristãos, como mencionado anteriormente. Isso ocorre porque o ser humano tem esse desejo e necessidade de ser orientado, conforme afirmado no primeiro capítulo. É importante que a Igreja promova momentos de espiritualidade em suas práticas, para que os fiéis tenham a graça de usufruir dessa prática e alimentar sua vida espiritual. Sempre mantendo em mente que o Espírito Santo é o grande conselheiro, como afirmado pela Congregação para o Clero: O acompanhamento e o conselho conduzem também aos meios concretos. Em todo este processo, é necessário ter presente que o verdadeiro diretor é o Espírito Santo, enquanto que o fiel conserva toda a própria responsabilidade e iniciativa (SCD 82). 3.2 DIRETOR ESPIRITUAL O que o diretor espiritual faz é considerado por muitos uma arte, pois quando se fala em educar as consciências, não se trata de lidar com um material inanimado como os elementos da natureza, mas sim de trabalhar com pessoas e suas almas. O frei Patrício, juntamente com outros autores, denomina esse processo como: “a arte das artes”56. Isso ocorre porque um bom diretor espiritual, como um educador, reconhece que sua competência não é agir em nome dos outros, mas sim auxiliar e orientar para que o próprio indivíduo aja e tome suas próprias decisões. Essa abordagem é considerada uma arte.57 O ofício de diretor espiritual, incluindo os grandes mestres espirituais, muitas vezes começou com base em sua própria experiência, a partir da qual eles extraíram princípios para a vida pessoal e para a direção espiritual. No entanto, a experiência não pode ser estática. É necessário que o diretor espiritual procure compreender a ação de Deus em sua própria vida e na vida dos outros, pois “Se 56 SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 92. 57 Cf. SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 93.
  • 36. 36 acredita que a sua experiência é “a experiência”, que o seu caminho é “o caminho”, não será jamais um bom diretor espiritual”58. Todo diretor espiritual deve reconhecer com humildade que tem seus próprios limites. Nenhum diretor deve acreditar, e ainda menos dizer, que é capaz de guiar, ou acompanhar, todos que vêm a ele (..). Não deve, pois, surpreender-se se as pessoas que vieram bater a sua porta, não mais voltaram. O diretor espiritual que reconhece seus limites e entende que é o Espírito Santo o verdadeiro diretor e guia da alma, está no caminho certo. No entanto, é importante que exista conhecimento humano para que a graça possa operar. Nesse sentido, o diretor espiritual precisa ser humilde para reconhecer quando é necessário encaminhar a pessoa para outro que possa oferecer mais ajuda à alma, ou quando ele mesmo não possui os instrumentos necessários para lidar com uma determinada dificuldade que surge.59 O Padre Manoel destaca que um bom mestre espiritual precisa ter ciência, experiência e o dom do discernimento. Ele aborda a ideia de que, sem esse dom do discernimento, mesmo que alguém possua conhecimento sobre a história da espiritualidade e seja versado no tema, pode se tornar um diretor espiritual medíocre.60 Além disso, o diretor espiritual precisa ter convicções firmes que o auxiliem a sempre se posicionar corretamente em relação à Igreja, a Deus e à pessoa que está sendo direcionada: 1.A consciência de que não é nem o modelo nem o modelador: o modelo é Jesus Cristo; o modelador, o Espirito Santo, por meio da graça; 2. Seu papel é apenas(..) o de ser instrumento nas mãos de Deus; as orientações que dá não podem ser “opiniões pessoais”; 3. A direção espiritual, por ser tarefa sobrenatural(santificadora), deve apoiar-se, antes de mais nada, nos meios sobrenaturais (na sua oração, na sua mortificação, em uma solida vida interior, própria de quem procura seriamente a santidade); 4.Como fruto da vida interior, o instrumento de Deus estará em condições de manter 58 SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p.197. 59 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p.197. 60 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p.198.
  • 37. 37 aceso o zelo apostólico, a vibração que contagia e leva os outros a vibrar, a desejar servir e a fazer apostolado.61 O diretor espiritual também deve sempre levar em consideração que ele desempenha quatro funções essenciais, conhecidas como “ofícios”: o de Médico, Bom Pastor, Mestre e Pai. Esses ofícios conferem ao diretor espiritual um caráter e uma identidade específica como diretor. O ofício de médico no diretor espiritual envolve a capacidade de fazer um bom diagnóstico da situação apresentada pelo dirigido. Para isso, é necessário recomendar os remédios adequados. É essencial ter conhecimento das “doenças” espirituais e saber discernir se é o momento de prescrever um tratamento mais suave, como um remédio, ou se é necessário um tratamento mais agressivo, como uma “cirurgia” espiritual.62 O ofício de bom pastor no diretor espiritual consiste em conhecer e compreender o dirigido, a fim de ajudar a dar direção à sua vida e protegê-lo dos perigos que podem afetar sua alma. É por meio desse papel de pastor que o diretor deve falar a verdade com caridade, assim como um pastor que acaricia as ovelhas, mas também as repreende com o cajado quando necessário, para que permaneçam atentas. Por essa razão, o diretor espiritual não pode ser apenas um amigo complacente, mas alguém que tenha a coragem de corrigir, se necessário.63 O ofício de mestre no diretor espiritual é a capacidade de ser um instrumento nas mãos de Deus para discernir o bem e o mal, identificar o que vem de Deus e o que não vem. O diretor deve ter conhecimento da vida espiritual e ajudar o dirigido a descobrir os desígnios de Deus para sua vida. Para isso, o diretor espiritual deve ser um mestre na oração, um mestre na busca das virtudes, na vida ascética e um mestre na doutrina. Ele deve ensinar e guiar o dirigido nesses aspectos importantes da vida espiritual.64 61 SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 202. 62 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 204. 63 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 205. 64 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 205.
  • 38. 38 O ofício de pai no diretor espiritual implica em encontrar o equilíbrio entre exigência e bondade, evitando tanto a cobrança excessiva quanto a negligência. O pai espiritual nunca deve demonstrar mágoa, decepção ou desespero, mas deve mostrar a força e a serenidade de um pai, para que o dirigido não seja abalado e desista da necessária mudança de vida. O diretor espiritual deve agir como um pai amoroso, incentivando, corrigindo e apoiando, com o objetivo de ajudar o dirigido a crescer e progredir espiritualmente65 “Um sacerdote bondoso, “paizão “, pode ser muito querido, mas quase com certeza vai “mal-criar” as almas, vai deixá-las enfraquecidas, com vida interior muito frágil.”66 Por fim, é importante destacar algumas diretrizes que podem auxiliar o diretor espiritual a orientar adequadamente o dirigido. São considerações a serem levadas em conta: Considerar a vocação eclesial específica do dirigido; Conhecer a vida concreta do dirigido, incluindo trabalho, família, entre outros aspectos; Prestar atenção aos passos da vida vocacional, especialmente quando relacionados a um carisma específico; É oportuno iniciar a direção espiritual com um itinerário da vida do dirigido; Elaborar um plano de vida é de grande ajuda; No plano de vida, podem surgir dificuldades e barreiras ao se entregar mais a Deus; Fazer e empregar propósitos para a vida espiritual é útil; Fomentar a liberdade e a responsabilidade do dirigido; Facilitar a sinceridade, sendo amável e discreto; Manter sempre um comportamento caridoso e afetivo; Guardar sigilo profissionalmente.67 Essas diretrizes podem ser um guia para que o diretor espiritual conduza o dirigido de forma adequada, respeitando sua vocação, vida concreta e ajudando-o no crescimento espiritual.68 65 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: Elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 205. 66 SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: Elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 205. 67 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: Elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 209. 68 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: Elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 210.
  • 39. 39 3.3 DIRIGIDO ESPIRITUAL O fato é que todo ser humano tem o direito de ser guiado e auxiliado a encontrar a direção de sua vida em relação a Deus. Para que isso ocorra, é necessário que o dirigido, ou a pessoa que busca esse auxílio, possua pelo menos algumas disposições humanas. Tomás Rodriguez Miranda, Sj, afirma o seguinte: Supomos que, para seguir um processo de direção espiritual suficientemente adequado, é necessário um mínimo de “qualidade humana” e um mínimo de experiência espiritual da pessoa. Partir do zero absoluto, ou seja, sem nenhuma ciência e experiência espiritual, e muito poucas qualidades humanas de auto prospecção e de relacionamento dialogal, seria estar muito longe de iniciar o que é essencial à direção espiritual: uma procura profunda do desígnio de Deus sobre a pessoa.69 A realidade que se apresenta é que o dirigido é aquela pessoa que se sente chamada a viver a vida espiritual e a buscar de maneira sólida um itinerário de vida espiritual que o abrace e o ajude a amadurecer. No entanto, algumas bases humanas são necessárias para que a direção espiritual tenha o efeito desejado e possa trazer resultados grandiosos para a alma. Portanto, o autor Tomás Rodriguez elabora uma lista com algumas qualidades humanas e espirituais que o dirigido deve possuir, mesmo que em um grau inicial. a. Humanamente, o dirigido deve possuir algumas qualidades mínimas de cultura que lhe permitam: 1. Ser aceito por outro e aceitar a si mesmo; 2. Confiar em um outro ser humano e ser receptivo; 3. Manter-se livre interiormente e, portanto, ser responsável por suas próprias decisões (...); 4. Abrir-se sinceramente ao outro; 5. Comunicar-se expressar-se com suas palavras sem medos nem bloqueios e de uma forma adequada; 6. Ter suficiente equilíbrio emocional e afetivo de maneira que suas emoções sejam controláveis em um mínimo adequado (...); 7. “Ser consciente” do que acontece com ele (...); 8. Distinguir suas experiências psicológicas das espirituais (...); 9. Construir o “tempo psicológico” para se abrir e se expressar a Deus em alguma forma de oração (...); 10. Ter e amadurecer um sadio sentido de “pertencer” a um corpo (Família, Igreja, comunidade...) b. Espiritualmente, ele necessita de: 1. Uma “sensibilidade religiosa”, em grau suficiente para viver as relações com Deus e certa familiaridade com Ele; 2. Docilidade interior para buscas os desígnios de Deus sobre si (...); 69 MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual, p.135.
  • 40. 40 3 Certo grau de serenidade para observar (“ler”) os movimentos de Deus em sua alma; 4. Capacidade de renúncia (...); 5. Habilidade para fazer oração formal sem grandes dificuldades.70 Pode-se observar que essas características são importantes e necessárias para o desenvolvimento pessoal e para a vida interior daqueles que buscam direção espiritual, conforme colocado pelo próprio autor. “Não se pretende que tenha essas bases maduras desde o princípio mas, ao menos, certa capacidade para desenvolvê-las.”71. Para isso, o dirigido precisa amadurecer essas qualidades mencionadas anteriormente, cultivando em si uma atitude de busca por sentido em sua vida, demonstrando fidelidade ao processo de desenvolvimento delineado junto ao diretor espiritual, mantendo-se totalmente disponível e flexível para agir de acordo com a vontade de Deus, e adotando uma postura de sinceridade e transparência completa com o diretor espiritual.72 A transparência e a sinceridade são elementos marcantes e de extrema importância para alcançar as graças próprias da direção espiritual. São Josemaria Escrivá, em seu livro Caminho, aborda exatamente essa questão ao dizer: “Não ocultes ao teu Diretor essas insinuações do inimigo. – A tua vitória, ao abrir-lhe a tua alma, te dá mais graça de Deus. – E, além disso, tens agora, para continuares a vencer, o dom de conselho e as orações do teu pai espiritual”73. A sinceridade e transparência ajudam o próprio diretor a dar conselhos mais eficazes e, principalmente, auxiliam no seu ofício de médico espiritual. Se o dirigido não for transparente, poderá receber um tratamento para dores de cabeça sem saber que na verdade está lidando com um câncer. Um outro ponto a ser contemplado é a realidade de que o dirigido precisa ser dócil e ter disposição para seguir as indicações recebidas com alegria. Isso não 70 MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual, p.136. 71 MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual, p.137. 72 Cf. MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual, p.139. 73 ESCRIVÁ, Josemaria. Caminho, p. 42.
  • 41. 41 significa que o dirigido precise ter uma atitude de passividade, pelo contrário, ele deve ter uma atitude de acolhimento e pro atividade.74 Recorre à direção espiritual cada vez com mais humildade, e pontualmente, o que é também humildade. Pensa – e não te enganas, por que aí é Deus quem te fala- que és como uma criança pequena – sincera! -, a quem vão ensinando falar, a ler, a conhecer as flores e os pássaros, a viver as alegrias e as penas, a reparar no chão que pisa.75 Há de se destacar, enfim, a necessidade do dirigido de permanecer perseverante na luta, e essa luta se forja no dia a dia, de semana em semana e de mês em mês. Para que essa perseverança se forme, é preciso elaborar junto do diretor várias metas e objetivos claros, sabendo identificar quais são os mais adequados para alcançá-los.76 A luz dos objetivos básicos da direção espiritual: “1) Buscar a Deus; 2) Compreender a si mesmo no âmbito de sua própria realidade e 3) procurar a verdade que deve ser enfrentada em sua realidade. É necessário que isto o personalize: o que busco? O que quero? O que pretendo?”77 O dirigido precisa ter uma relação saudável com seu diretor espiritual, e por isso, precisa saber que, para que essa relação seja saudável, o diretor não assume as decisões e ações do dirigido. A pessoa que busca direção precisa compreender que não deve existir uma obediência estrita, mas sim um certo grau de docilidade que não seja alienante nem servil. Sendo assim, o próprio dirigido deve preservar sua independência e cultivar sua autonomia a ponto de ser capaz de discernir se vai seguir ou não os conselhos recebidos.78 A esse respeito, é importante mencionar dois grandes riscos. O primeiro deles está relacionado ao fato de o dirigido tentar manipular o diretor para receber conselhos que estejam alinhados com seus próprios gostos e desejos desordenados. O segundo risco é o de esperar que o diretor tome todas as decisões em seu lugar, quando na realidade é o dirigido quem deve assumir a 74 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p.190. 75 ESCRIVÁ, Josemaria. Sulco, p. 105. 76 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 190. 77 MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual, p.141. 78 Cf. MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual, p.142.
  • 42. 42 responsabilidade por suas próprias decisões, embasadas nos conselhos recebidos.79 Por fim, quando o dirigido possui as qualidades humanas e espirituais, mantém-se livre, sincero e dócil ao diretor espiritual, pode-se certamente testemunhar em sua vida aquilo que Garrigou-Lagrange menciona: Nestas condições, o diretor poderá ser o instrumento do Espirito Santo para controlar sua ação em nós e para nos tornar cada vez mais dóceis às inspirações divinas. Assim, avançaremos de verdade pelo caminho estreito, que se alarga cada vez mais ao nos aproximarmos da infinita bondade de Deus, para qual ele nos conduz.80 3.4 CONVERSA DE DIREÇÃO ESPIRITUAL E SUA PREPARAÇÃO Há alguns aspectos práticos a serem considerados, e entre eles, existem três fundamentais para uma direção espiritual boa e frutífera: a frequência, a duração e o local. A frequência da direção espiritual propriamente dita, ou seja, aquela que envolve esforço e um acompanhamento sério para buscar a santidade, é algo muito pessoal e deve ser discutido em diálogo com o próprio dirigido. Não se pode simplesmente seguir a indicação de alguém que diz ter um diretor espiritual, mas que na verdade aparece apenas a cada seis meses. O tempo de frequência varia, mas deve ser dentro de um mês, seja semanalmente, quinzenalmente ou até mesmo mensalmente.81 A Congregação para o Clero expressa claramente sua visão, ressaltando que a frequência da direção espiritual depende da interpretação e da situação individual de cada pessoa. Ela afirma o seguinte: A periodicidade das conversas depende dos momentos e das situações, porque não existe uma regra fixa. Os momentos iniciais da formação requerem uma periodicidade mais frequente e assídua. É melhor que a conversa seja feita espontaneamente, sem esperar para ser chamado (SCD 106). 79 Cf. MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual, p.142. 80 GARRIGOU-LAGRANGE, Reginald. As três idades da vida interior, p. 322. 81 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 238.
  • 43. 43 A duração da direção espiritual varia consideravelmente, dependendo do estágio de vida e do processo de orientação em que o dirigido se encontra. Isso é decidido de comum acordo entre ambas as partes. Mas, “No início é bom e necessário oferecer à pessoa que procura a direção espiritual a possibilidade de falar o tempo que quiser”82, Ou seja, é importante permitir que a pessoa possa expressar com clareza o que está acontecendo em sua vida atual. No entanto, a direção espiritual, embora não deva ser apressada ou feita rapidamente, também não deve ser excessivamente demorada. O padre Manuel afirma que: Pode-se dizer que a duração deve ser de aproximadamente trinta minutos, podendo ser de até uma hora para casos muito especiais, ou de quinze minutos, também em situações anômalas. O que importa é que o dirigido seja ouvido e aconselhado, ao menos naquilo que, de momento, seja importante ou até decisivo.83 Quanto ao local, um ambiente honesto e minimamente discreto pode ser utilizado, mas é sempre importante seguir as normas de prudência e adotar critérios de escolha adequados. No entanto, é necessário observar o que a Congregação para o Clero diz a respeito: Frequentemente a direção espiritual como ministério está ligada à confissão, onde o sacerdote age em nome de Cristo e mostra uma atitude de pai, amigo, médico e guia espiritual. É o servidor do perdão e orienta o caminho da contemplação e da perfeição, com respeito e fidelidade ao Magistério e à tradição espiritual da Igreja (SCD 116). Observando essa realidade, é necessário adaptar as orientações para a confissão e tentar aplicá-las de alguma forma à direção espiritual, pelo menos nos casos em que a prudência indique, como na direção dos jovens. Pode-se recomendar que seja realizada em um confessionário ou em uma sala com porta de vidro, por exemplo.84 Ao diretor espiritual, é sempre importante observar algumas sugestões práticas, destacando aquelas que o padre Manoel indica em seu livro Curso sobre direção espiritual. Resumidamente, ele comenta algumas realidades a serem observadas pelos diretores espirituais. 82 SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual, p. 157. 83 SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 238. 84 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 239.
  • 44. 44 O padre comenta que é importante para o diretor espiritual lembrar que ele não pode ser um burocrata das questões espirituais, mas sim um pai, um pastor, um mestre e um médico, como afirmado acima. Além disso, o padre Manoel destaca a importância do diretor controlar seus estados de ânimo, fomentar a liberdade e a responsabilidade do dirigido, lembrar que a direção espiritual não é um interrogatório, ajudar os dirigidos mais loquazes, fixar um tempo para a conversa e ter zelo e esforço para compreender o dirigido.85 Sabendo a frequência com que se terá a direção espiritual e a duração que levará, é importante elaborar e preparar a conversa que se terá com o diretor espiritual. Para isso, é necessário ter calma e abordar cada ponto de forma clara e compreensível. Com isso em mente, seguem algumas dicas práticas para o dirigido: Preparar cuidadosamente cada conversa, rezando antecipadamente, refletindo e anotando os temas que deseja abordar com o diretor espiritual, fazendo uma lista de assuntos a serem discutidos, à luz do Espírito Santo; Evitar conversas superficiais e irrelevantes durante a direção espiritual. Não desperdiçar o precioso tempo com assuntos como clima, futebol ou fofocas atualizadas. Abordar os temas com objetividade e, se necessário, utilizar um assunto aleatório apenas como introdução ou prólogo; Começar falando sobre os assuntos mais difíceis e delicados, para evitar o medo ou a vergonha que podem levar a omitir informações importantes. Falar sobre quedas graves, infidelidades, recorrências de pecados em luta, entre outros; Discutir problemas que estejam exigindo maior esforço, como situações familiares, questões no trabalho, desafios na igreja, etc.; Revisar as orientações e conselhos dados em direções anteriores, abordando as dificuldades encontradas em segui-los ou implementá-los; Refletir e conversar sobre novas propostas e iniciativas desejadas na vida espiritual, como iniciar uma prática de piedade específica, ler um novo livro, etc.; Reservar espaço para discutir as virtudes, especialmente aquela(s) em que você tem maior dificuldade ou que sente que falta em sua vida.86 85 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 247. 86 Cf. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual, p. 245-246.
  • 45. 45 CONCLUSÃO Ao findar dessas várias ideias e afirmações tiradas de uma dificultosa pesquisa é preciso concluir primeiramente que a direção espiritual é um dos meios que Deus em sua infinita misericórdia deixa para nós, seus filhos. Que grande graça poder ser objeto do seu ministério de pastor, mestre, médico e pai nas pessoas dos diretores espirituais. É importante ter em vista que o trabalho realizado até aqui tinha o intuito de trazer um subsidio introdutório sobre a pratica da direção espiritual para que aquele que deseja conhecer mais dessa pratica saiba responder as perguntas: qual a necessidade dessa pratica na minha vida? De onde surgiu essa pratica? O que ela é? Quem é o diretor e como me preparar para essa pratica? Nesse quesito é importante destacar que o objetivo foi concluído, tendo em vista o que foi apresentado pelo texto é possível afirmar que alguém que não conhecesse essa prática teria condições de lendo ter uma noção geral e pratica da direção espiritual, assim como ter condições de se preparar e aprofundar na vida espiritual a partir das dicas e orientações apresentadas. É possível também declarar que os capítulos conseguem confirmarem aquilo que era suas propostas, tanto de identificarem uma necessidade, quanto deixar clara as origens e dar orientações e dicas práticas para aqueles que serão objetos da direção espiritual quanto aqueles que atenderão as direções. Concluo que a prática da direção espiritual é fundamental para a formação integral do ser do homem a partir do pecado de Adão, pois é por meio de uma vida organizada e planejada a partir de Cristo e da ação de Deus na alma que o homem pode dar passos seguros rumo a santidade. É de suma importância a direção espiritual aos leigos, eles que são o sustento da Igreja no ponto de vista da ação pastoral. Em um futuro, possivelmente continuará a pesquisa sobre a relação entre psicologia e direção espiritual, com ênfase na integração entre psicólogos e diretores espirituais. Já se constata nessa pesquisa a necessidade de conhecimento por parte do diretor espiritual nessa área.
  • 46. 46 REFERÊNCIAS BELDA, Manuel. Breve panorâmica histórica de la direccion espiritual hasta el siglo XIX. Jan. 2011. Disponível em: https://www.collationes.org/system/files/inlinefiles/1.1%20Breve%20panor%C3%A1mica% 20hist%C3%B3rica%20de%20la%20direcci%C3%B3n%20espiritual%20hasta%20el%20s iglo%20XIX%20-%20Manuel%20Belda_0.pdf. Acesso: 16 jun. 2023. BETÊ, Eneas de Camargo. Direção Espiritual, 29 set. 2017. Disponível em: https://dj.org.br/a-direcao-espiritual-i-conceito-e-resumo-historico/. Acesso em: 12 jun. 2023. BÍBLIA de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2002. CATECISMO da Igreja Católica. Disponível em: https://www.vatican.va/archive/cathechism_po/index_new/prima-pagina- cic_po.html. Acesso em: 23 mai. 2023. CONCÍLIO VATICANO II. Lumen Gentium. Disponível em: https://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat- ii_const_19641121_lumen-gentium_po.html. Acesso em: 15 mai. 2023. CONCÍLIO VATICANO II. Optatam Totius. Disponível em: https://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vatii_de cree_19651028_optatam-totius_po.html#. Acesso em: 27 jun. 2023. CONCÍLIO VATICANO II. Presbyterorum Ordinis Disponível em: https://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat- ii_decree_19651207_presbyterorum-ordinis_po.html. Acesso em: 27 jun. 2023. CONGREGAÇÃO PARA O CLERO. O presbítero, mestre da Palavra, ministro dos sacramentos e guia da comunidade, em vista do terceiro milênio. Disponível em: https://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cclergy/documents/rc_con_ccle rgy_doc_19031999_pretres_po.html. Acesso em: 27 jun. 2023. CONGREGAÇÃO PARA O CLERO. O sacerdote ministro da misericórdia divina - Subsídio para confessores e diretores espirituais. Disponível em: https://www.clerus.org/clerus/dati/2011-08/08-13/sussidio_per_confessori_pt.pdf. Acesso em: 27 jun. 2023. ESCRIVÁ, Josemaria. Caminho. 12. ed. São Paulo: Quadrante, 2016. ESCRIVÁ, Josemaria. Sulco. 4. ed. São Paulo: Quadrante, 2016. FRANCISCO, Papa. Christus Vivit. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa- francesco_esortazione-ap_20190325_christus-vivit.html. Acesso em: 27 jun. 2023.
  • 47. 47 FRANCISCO, Papa. Gaudete et Exsultate. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papafr ancesco_esortazione-ap_20180319_gaudete-et-exsultate.html#O_discernimento. Acesso em: 27 jun. 2023. FRANKL. E. Viktor. Um sentido para vida: psicoterapia e humanismo.18. ed. Trad. Victor Hugo Silveira Lapenta. São Paulo: Ideias&Letras, 2014. FRANKL, Viktor E. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração. 42. ed. Trad. Walter. Schlupp; Carlos C. Aveline. São Leopoldo: Sinodal; Petrópolis: vozes, 2007. GARRIGOU-LAGRANGE, Reginald. As três idades da vida interior. Tomo I. Trad. Antonio Carlos Santini. São Paulo: Cultor de Livros, 2018. JOÃO PAULO II, Papa. Pastores Dabo Vobis. Disponível em: https://www.vatican.va/content/johnpaulii/pt/apost_exhortations/documents/hf_jpii_ exh_25031992_pastores-dabo-vobis.html. Acesso em: 27 jun. 2023. MAGAÑA, Guadalupe. Desarrollo histórico de la Dirección Espiritual. 16 mai. 2018. Disponível em: https://es.catholic.net/op/articulos/4973/cat/165/desarrollo- historico-de-la-direccion-espiritual.html#modal. Acesso em: 15 jun. 23. MARIN, Antonio Royo, O.P. Grandes mestres da vida espiritual. Campinas: Ecclesiae, 2019. MIRANDA, Tomas Rodriguez, SJ. A direção espiritual: pastoral do acompanhamento espiritual. São Paulo: Paulus, 2009. SANTOS, Manoel Augusto. Curso Sobre Direção Espiritual: elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual. São Paulo: Cultor de Livros, 2019. SCIADINI, Patrício OCD. A pedagogia da Direção Espiritual. 4. ed. São Paulo: Loyola, 2012. TRESE, Leo J. A fé explicada. 5. ed. Trad. Isabel Perez. São Paulo: Quadrante, 1990. VAZ, Henrique de Lima. Antropologia Filosófica. 12. ed. São Paulo: Loyola, 1991. VAZ, Henrique de Lima. Escritos de filosofia II: Ética e cultura. 5. ed. São Paulo: Loyola, 1988. VEILLEUX, Dom Armand. A paternidade Espiritual na Tradição cenobitica. 01 nov. 1998. Disponível em: https://www.padresdodeserto.net/pater.htm. Acesso em: 03 jul. 2023.
  • 48. 48