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Universidade Federal do Rio de Janeiro
COPPE - Programa de Engenharia Oceânica
Área de Engenharia Costeira & Oceanográfica
PROCESSOS SEDIMENTOLÓGICOS EM ESTUÁRIOS
Victor Freire Motta
Professor Titular - COPPE/UFRJ - PEnO (1978)
I. INTRODUÇÃO.................................................................................................................................................1
II. AS DIFERENÇAS ENTRE OS MECANISMOS GERADORES DA MORFOLOGIA DOS RIOS E DOS ESTUÁRIOS..........2
III. O CONCEITO DE ESTUÁRIO "IDEAL" ..............................................................................................................4
IV. REVISTA DE ALGUNS PROCESSOS DE ALTERAÇÃO MORFOLÓGICA DESENCADEADOS POR INTERVENÇÕES
HUMANAS EM ESTUÁRIOS SUJEITOS À MARÉ.................................................................................................4
V. OS EFEITOS DA CIRCULAÇÃO NO TRANSPORTE DE SEDIMENTOS...................................................................6
VI. CONCLUSÕES.................................................................................................................................................8
VII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.....................................................................................................................8
I. INTRODUÇÃO
1 - Na linguagem não-especializada, estuário é o trecho de rio sujeito à influência da maré. Entretanto,
tem-se hoje um conceito generalizado de estuário, que é devido D.W. Pritchard [1]:
"Um estuário é um corpo d'água semiconfinado na costa, que tem ligação livre com o mar e
dentro do qual água do mar entra em contacto com água doce, proveniente da drenagem do in-
terior das terras".
Em tal conceito é a interação da água salgada com a água doce, qualquer que seja o modo pelo qual se
processo, que constitui a característica essencial dos estuários. Até mesmo os corpos deágua, em liga-
ção livre com mar sem maré, são considerados estuários e neles a interação da água salgada com a
água doce assume a modalidade particular de estratificação total, com instrusão salina se fazendo sob
a forma de cunha com interface bem definida. É claro, porém, que os principais processos sedimento-
lógicos e morfológicos, que vamos abordar, têm com principal agente fisico a penetração da maré.
2 - Chamamos de processos sedimentológicos a colocação em movimento de grãos de sedimentos, o
transporte e a cessação deste. O fato de a maior parte de um dado estuário se encontrar abrigado da
ação de ondas de oscilação e a circunstância de em geral os estuários constituirem o trecho final de um
rio, propiciam a presença de sedimentos finos, çõesivos, silte e argila, que em geral não intervêem nos
processos litorâneos. Tais sedimentos não são transportados por arraste, mas somente em supensão
[2], [3], as maiores concentrações ocorrendo perto do fundo, e a cessação do transporte significam de-
posição no fundo.
3 - Os processos morfológicos consistem nas alterações das carcterísticas geométricas em planta e em
perfil ou em seção transversal dos estuários, em consequência de rupturas no equilíbrio dinâmico do
transporte de sedimentos. Um curso deágua tem, em geral, quatro graus de liberdade: pode variar de
largura, de profundidade, de declividade e formar meandros. Nos estuários as declividades longitu-
dinais do fundo são muito pequenas, podendo até ser nulas, e uma variação muito comum em planta
se dá com as posições e as dimensões dos bancos.
Falecido em 04/82.
- 2 -
4 - Muitos dos principais portos do mundo e algumas das maiores cidades se situam no interior de
estuários, como Rotterdam. Amsterdam, Antuerpia, Londres, Liverpool, Southampton, Hamburgo,
Bremen, Bordeaux, Lisboa, Buenos Aires, Santos, etc. Este fato torna frequentes as intervenções hu-
manas nas condições naturais dos estuários, sob a forma de aprofundamento de canais naturais, alar-
gamentos, dragagem de compartimentos em comúnicação com o corpo principal do estuário (docas,
etc.), construção de aterros, tomadas deágua, lançamento de efluentes industriais e sanitários, desvios
ou barramentos das contribuições líquidas e sólidas de montante. Em vários países, por exemplo, a
Grã-Bretanha, os Países Baixos e a Alémanha, o maior volume de problemas hidráulicos se apresenta
em relação a estuários, conforme a natureza dos estudos nos respectivos institutos de pesquisas hi-
dráulicas traduz claramente. Tais fatos acarretaram nas três últimas décadas grande progresso dos
conhecimentos humanos sobre o comportamento hidráulico, salino e sedimentológico dos estuários.
Infelizmente, no Brasil tais assuntos ainda são pouco conhecidos e pouco se sabe sobre aqueles aspec-
tos do funcionamento dos estuários brasileiros. Basta dizer que, com exceção do Estuário Santista, re-
centemente objeto de estudos encomendados pela PORTOBRAS, nem sequer se conhece com razoável
pormenor o mecanismo de propagação da maré em qualquer estuário brasileiro.
5 - São diversas as fontes dos sedimentos que vão ter aos estuários [4]. Podem provir da extremidade
de montante, trazidos pelas vazões fluviais e resultantes da erosão das bacias contribuintes ou dos
próprios leitos fluviais. Podem penetrar pela extremidade marítima, trazidos pelas correntes de maré
e de densidades ou até por ondas que entrem no estuário, e provir de transporte litorâneo ou de ero-
são da plataforma continental. Podem provir de erosão eólica de dunas ou de bancos que a maré cu-
bra e descubra. Podem provir de despejos sólidos de origem industrial ou doméstica ou do retorno de
materiais dragados. Podem provir até de decomposição ou dejetos de organismos vivos, marinhos ou
fluviais.
II. AS DIFERENÇAS ENTRE OS MECANISMOS GERADORES DA MORFOLOGIA DOS RIOS E
DOS ESTUÁRIOS
6 - O que distingue os estuários de qualquer outro sistema natural, de que se ocupam os engenheiros
hidráulicos, é a presença e a interação de vários mecanismos físicos dos quais os essenciais são os se-
guintes [5]:
a) propagação da maré, decorrente da geometria do estuário e da maré na embocadura;
b) o aparecimento de gradientes longitudinais, verticais e eventualmente transversais de salinida-
des, em consequência dos efeitos das forças de gravidade devidas às diferenças de densidade
entre a água salgada, que penetra do mar, e a água doce, proveniente de montante;
c) o escoamento, com sentido resultante para a embocadura, destas contribuições líquidas de
montante;
d) as forças de Coriolis e centrífugas, induzindo escoamentos secundários, devidos respectiva-
mente a rotação da Terra e a curvatura dos canais naturais;
e) a entrada de contribuições sólidas, que se pode fazer tanto pela embocadura (a extremidade ex-
terna) quanto pela extremidade interna, e os processos de transporte dos sedimentos, dentro do
estuário, pelas correntes de maré e pela circulação provocada pelos gradientes de densidade.
7 - Um conceito muito útil para os problemas de morfologia fluvial é o de "equilíbrio dinâmico" ou de
"regime" [princípio do auto-ajustamento], cuja forma mais acabada se deve a escola anglo-indiana de
Hidráulica Fluvial [6], [7], [8]. Tal conceito estabelece que, em rio em terreno aluvial, sujeito única-
mente a escoamentos unidirecionais, existe relação unívoca entre as variáveis independentes - a vazão
líquida e sólida na extremidade de montante do estirão considerado - e as variáveis dependentes - a
largura, a profundidade e a declividade - do estirão. Se as variáveis independentes se alteram por cau-
sas naturais ou artificiais, as variáveis dependentes também se modificam, no sentido de estabelecer
nova situação de equilíbrio. Tal conceito foi estabelecido inicialmente para canais de irrigação que
funcionavam a vazão constante. Posteriormente, foi generalizado para os rios sujeitos a regime de va-
zões variáveis ao longo do ano e comportando um quarto grau de liberdade: o de formar meandros.
No caso dos rios, as variações sazonais independentes acarretam flutuações das variáveis dependen-
tes em torno de um situação de equilíbrio médio anual, que se pode considerar como determinada por
uma "vazão geradora do leito" ("dominant discharge") [9].
2
- 3 -
8 - Nos estuários a amplitude da maré na embocadura varia continuamente entre máximos nas sizí-
gias e mínimos nas quadraturas, no caso mais geral, e as vazões fluviais, na extremidade de montante,
variam com as estações do ano. Entretanto, é possível generalizar o conceito "de regime" para os estu-
ários, admitindo que haja também condições "dominantes" para geração de sua morfologia [10]. Tais
"condições dominantes" consistem em marés de sizígia média na embocadura ou na combinação de
tais marés com vazões fluviais de montante, no caso destas serem consideráveis, conforme ocorre fre-
quentemente no Brasil.
9 - Entretanto, existe diferença muito importante entre o mecanismo gerador da morfologia dos rios
e a dos estuários. Nos rios, as variáveis independentes, as vazões líquidas e sólidas, são praticamente
impostas pela bacia contribuinte e sua relação de causalildade, com as variáveis dependentes, é de
sentido único. Nos estuários, há "feed back" entre as variáveis dependentes e as independentes,
aquelas podendo também atuar sobre estas. Com efeito, nos estuários sujeitos a maré, em terreno
aluvial, onde não haja controles naturais de paredes fixas, como formações rochosas, e supondo pe-
quenas as contribuições de montante, é uma dada amplitude de maré na embocadura que gera a ge-
ometria do estuário. Todavia, ao alterar-se artificialmente, de maneira extensa, a geometria do estuá-
rio, por alargamentos e aprofundamentos ou por constrições do leito (por exemplo, construindo gran-
des aterros ou fechando braços), o mecanismo de propagação da maré, ao longo do estuário, se modi-
ficará, ainda que a amplitude da maré externa permaneça constante.
10 - As formas em planta e em perfil do estuário, bem como a distribuição e a textura dos depósitos, a
natureza e a quantidade dos sedimentos em trânsito, tanto por arraste quanto em suspensão, decor-
rem de uma interação complexa em que um conjunto de variáveis é representado por:
a) a maré na foz (amplitude e andamento no tempo);
b) o mecanismo de propagação da maré (amplitude e andamento no tempo ao longo do estuário);
c) as contribuições líquidas e sólidas de montante;
d) a quantidade e a qualidade de materia sólida introduzida do mar para dentro do estuário, por
correntes de maré ou de densidade e eventual penetração de ondas;
e) a granulometria e a densidade dos sedimentos de origem continental.
O outro conjunto de variáveis engloba:
a) as profundidades, larguras e declividades dos canais naturais;
b) as dimensões e posições dos bancos;
c) os gradientes longitudinais e verticais de salinidades decorrentes do encontro da água salgada
proveniente do oceano com água doce de origem continental;
d) a textura granulométrica dos depósitos.
11 - Funções desconhecidas - e provávelmente diferentes para cada estuário - ligam todas estas gran-
dezas entre si. Se houver alterações de uma das grandezas dependentes, sem que mudem as variáveis
independentes, a grandeza alterada volta a seu valor de equilíbrio. Se houver modificação de uma
variável independente, as grandezas dependentes assumem novos valores correspondentes à nova
situação de equilíbrio. Como já vimos, a variável "independente" principal - o mecanismo de propaga-
ção da maré - pode ser afetado por qualquer alteração natural ou artificial na geometria do estuário.
Esta modificação pode agir, quer sobre a celeridade de propagação da maré, quer sobre a defasagem
entre a variação de níveis e a variação de velocidades, quer sobre a perda de carga no escoamento de
maré, quer diretamente sobre o volume do prisma a ser cheio e esvaziado. Então, em vez da causali-
dade "unidirecional" dos rios, tem-se um "feed back" em que a variável a princípio "dependente" pode
modificar a variável "independente" e esta, por sua vez, impor novo valor a variável "dependente".
12 - Conforme veremos oportunamente, foi graças a tal fato que se conseguiu aprofundar considera-
velmente o acesso a muitos portos no interior de estuários, como Londres ou Bremen, sem incorrer em
aumentos insuportáveis dos volumes anuais de dragagem de manutenção. Em outras palavras, as
profundidades "de equilíbrio" podem ser aumentadas, se forem modificadas apropriadamente a geo-
metria do estuário.
3
- 4 -
13 - Em resumo, há uma interação continua entre os diversos processos que influenciam o movimen-
to da água, do sal e dos sedimentos, particularmente os transportados em suspensão, em um estuário.
A intensidade e a rapidez de tais interações variam considerávelmente e muitas vezes são de natureza
unilateral [11]. Por exemplo, a propagação da maré tem influência dominante no movimento do sal e
de em vasa suspensão, enquanto estes, por sua vez, exercem influência muito menor sobre a propaga-
ção da maré. Esta desigualdade de interações tornou possível construir modelos matemáticos, simpli-
ficados, porém razoávelmente precisos, do transporte de vasa em suspensão, sem que se tentasse si-
mular o movimento do sal, os complexos processos de cisalhamento interno dos escoamentos ou a
interação do transporte da vasa em suspensão com o escoamento da maré [11].
III. O CONCEITO DE ESTUÁRIO "IDEAL"
14 - O estuário "ideal" seria aquele ao longo do qual fossem constantes as amplitudes das variações de
níveis e as amplitudes das variações de velocidades médias instantâneas, através das diferentes seções
[12]. Demonstra-se algebricamente que a forma em planta, acarretando tais propriedades, consistiria
em variação exponencial inversa da largura, no nível médio, com a distância à embocadura. Tem-se
então:
( )0 exp coty y nx= − ϕ
onde y - largura do estuário no nível médio de cada seção;
y0 - idem na embocadura;
x - distância da seção considerada à embocadura;
n = S/A - razão entre a amplitude do desnível da superficie livre na seção considerada e a
amplitude da maré na embocadura;
ϕ - medida angular da defasagem entre a variação de níveis e a variação de velocidades.
15 - No caso de as vazões fluviais serem desprezíveis em face das vazões do escoamento de maré, e na
ausência de paredes fixas, a forma em planta do estuário ideal constituiria a configuração de equilí-
brio produzida por aquele escoamento. Alguns estuários preenchem as hipóteses acima formuladas e
aproximadamente apresentam em planta a forma do estuário ideal, tais como a Delaware e o Tâmisa.
É facil obter em laboratório a configuração em planta do estuário ideal, reproduzindo sucessivos ci-
clos de maré na embocadura de um canal retilíneo, aberto em leito móvel com seção transversal insu-
ficiente para estar em equilíbrio [13]. A forma do estuário ideal, em tais condições, aparece por erosão
do canal inicial.
16 - Inversamente, ao constatar-se que a forma em planta de um dado estuário aproxima-se sensivel-
mente da configuração do estuário ideal, pode-se concluir imediatamente que:
a) as vazões fluviais desempenham um papel desprezível na geração da morfologia do estuário
em questão;
b) os escoamentos de maré já produziram configuração de equilíbrio.
Tal equilíbrio só poderá ser dinâmico se sedimentos marinhos continuarem a chegar à embocadura.
IV. REVISTA DE ALGUNS PROCESSOS DE ALTERAÇÃO MORFOLÓGICA DESENCADEADOS
POR INTERVENÇÕES HUMANAS EM ESTUÁRIOS SUJEITOS À MARÉ.
17 - Compreender-se-á talvez mais claramente o exposto na seção II se forem considerados alguns
processos de alteração morfológica, abrangendo-se trechos de estuários sujeitos a maré. Tais processos
foram desencadeados por obras de engenharia que se executaram em tais estuários [14].
18 - Como exemplo de como é possível aprofundar um estuário pelo simples aumento de volume de
seu prisma de maré, sem incorrer em proibitivos aumentos de dragagem de manutenção e sem recor-
rer a obras de regularização ou calibração, ao contrário do que inevitável para um rio sujeito única-
4
- 5 -
mente a escoamentos unidirecionais, citaremos o caso do estuário do Weser, na Alémanha Ocidental,
dentro do qual se situa o porto de Bremen, a cerca de 80 km da embocadura no Mar do Norte [14].
19 - Até 1887, as profundidades naturais do Weser permitiam a entrada de navios com calado de ape-
nas 3 m. O estirão entre a embocadura e Bremen sofreu, entre aquele ano e 1952 consideráveis apro-
fundamentos, alargamentos e remoção de obstáculos por dragagem. O abaixamneto total das costas
do fundo, logo a jusante de Bremen, foi da ordem de 10m. O efeito de tais dragagens nos níveis dos
premarés foi pequeno, ao longo de todo o estuário, mas resultou abaixamento conside-rável dos ní-
veis dos baixamarés nos estirões internos do Weser, particularmente no próprio porto de Bremen on-
de foi da ordem de 3m. Antes das alterações mencionadas, a aplitude da maré na embo-cadura era de
3,4 m e, em Bremen, de apenas 0,20 m. Depois da dragagem de cerca de 4 x 10 m3 no estuário, a ampli-
tude da maré em Bremen havia aumentado, em 1945, para 3,1 m, quase o mesmo valor da embocadu-
ra.
20 - Os dados acima caracterizam grande aumento do volume do prisma de maré do estuário. É tal
aumento que permite manter as seções aprofundadas, ao contrário do que aconteceria nos rios, a não
ser que se construissem obras de regularização de modo a calibrar o leito. Na realidade o aumento das
profundidades foi maior do que o proporcionado pelas dragagens porque as correntes com velocida-
des aumentadas, correspondentes ao novo prisma de maré decorrente do abaixamento dos baixama-
rés, ainda aprofundaram por erosão os fundos deixados pelas dragagem. Em outras palavras, aumen-
taram as profundidades porque se intensificou o agente que as preserva: as correntes de enchente e de
vazante, aumentadas pelo aumento do volume do prisma de maré.
21 - Cabe assinalar que, para colher os beneficios obtidos no Weser, são necessárias duas condições:
a) que haja margem para provocar o aumento do volume do prisma de maré, isto é, que as ampli-
tudes de maré nos estirões internos do estuário sejam sensívelmente menores que na emboca-
dura;
b) que o aprofundamento ou largamento seja suficiente drástico para afetar grandes extensões do
estuário - aprofundamento e alargamento de pequeno trecho não afetaria ou pouco afetaria as
amplitudes de maré mais para dentro do estuário.
22 - Inversamente, muitos têm sido os estuários que sofreram processo de assoreamento generalizado,
no leito propriamente dito e na embocadura, em consequência de se ter reduzido drasticamente o vo-
lume do prisma de maré pela construção de aterros ou pelo fechamento de braços. Embora o processo
não haja sido devidamente documentado, foi evidentemente o que aconteceu no braço ao Sul da ilha
em que está o porto de São Francisco do Sul, em Santa Catarina, depois da construção de um aterro-
barragem rodoviário. Os aterros em lagoas litorâneas, como as que existem na região do Rio de Janei-
ro, são particularmente nocivos à preservação das respectivas embocaduras.
23 - Outra alteração capaz de deteriorar as profundidades, ao longo de extensos trechos de estuá-
rios, pode ser deflagrada pela alteração na defasagem entre a variação de níveis e a variação de ve-
locidades. O caso ocorrido em outro estuário alémão desembocando no Mar do Norte, o Eider, ilustra
bem tal fato.
24 - As marés de tempestade ("storm surges") constituem um flagelo das regiões ribeirinhas do Sul do
Mar do Norte. Para defendê-las constroem-se diques ao longo da costa e, nos estuários, barragens
munidas de comportas que se fecham durante aquelas ocorrências. Construiu-se uma de tais barra-
gens no estuário do Eider, no extremo Norte da Alémanha, durante a década de 30. Acontece que a-
quele estuário era do tipo "desobstruido" para a penetração da maré. Isto é: as inversões de correntes
tinham lugar, não nas estofas de baixamar e preamar, porém a meia-maré [onda de maré progressiva],
os escoamentos de enchente se processando da meia-maré enchente a meia-maré vazante e os escoa-
mentos de vazante se fazendo da meia-maré vazante a meia-maré enchente. Resultavam velocidades
de vazante muito maiores que as de enchente porque nas vazantes, além das vazões serem maiores
por incluirem as contribuições de montante, as áreas molhadas eram menores, por corresponderem a
níveis d'água mais baixos, mais próximos dos baixamarés. Em consequência, as capacidades de trans-
porte dos escoamentos de vazante eram sensívelmente maiores que as dos escoamentos de enchente.
Em outras palavras, o estuário tinha uma boa capacidade de expelir os sedimentos que nele penetra-
vam pela embocadura, e era realmente por esta que entrava maior quantidade de sedimentos.
5
- 6 -
25 - Com a construção da barragem, alterou-se a defasagem entre a maré vertical (variação de níveis) e
a maré horizontal (correntes). As inversões de correntes passaram a ter lugar nas estofas, com alguns
minutos de atraso em relação respectivamente aos baixamarés e preamarés, [onda de maré estacioná-
ria]. As correntes de enchente passaram a ocorrer entre os baixamarés e preamarés. As de vazan-
tes,entre os preamarés e baixamarés. Desapareceu a dominância da capacidade de transporte das cor-
rentes de vazantes sobre as de enchente e perdeu-se a capacidade de autodepuração sedimentar do
estuário. Resultou processo generalizado de assessoramento entre a embocadura e a barragem, com
graves prejuizos para a navegação no estuário.
26 - Uma terceira causa possível de deflagrar processos de assoreamento generalizado em estuários
é a construção de guias de corrente que inibem a livre formação de meandros. Muitas vezes cons-
troem-se guias de correntes ("training walls") para manter alinhamentos de canais de navegação, mas,
em vez dos canais assim enquadrados se manterem ou se aprofundarem, se envasam porque desapa-
rece a possibilidade de formar meandros e consequentemente elimina-se um mecanismo natural que
repõe em suspensão material fino, oriundo do mar e depositado sobre os fundos nas estofas. Foi o que
aconteceu no estuário do Lune, no condado ingles de Lancashire, que se evasou entre 1844 e 1955, a
ponto de seu volume de prisma de maré se haver reduzido de 47,3% em seguida a construção de um
sistema de guias de correntes, que inibiram completamente a formação de meandros [14].
V. OS EFEITOS DA CIRCULAÇÃO NO TRANSPORTE DE SEDIMENTOS
27 - Chama-se de circulação estuarina à circulação provocada por forças de gravidade resultantes dos
gradientes longitudinais e verticais de salidade. Tais gradientes são provocados pelo encontro da água
salgada com água doce.
28 - É evidente que nos estuários totalmente estratificados a cunha salina funciona como verdadeira
rolha hidráulica, impedindo que sedimentos provenientes do mar penetram no estuário além da ex-
tremidade da cunha e ao mesmo tempo impossibilitando que sedimentos de origem continental avan-
cem para fora daquela mesma extremidade. Com efeito, em virtude da circulação existente dentro da
cunha salina, com velocidades dirigidas para dentro do estuário ao longo do fundo e para fora ao lon-
go da interface, a extremidade da cunha salina constitue ponto preferencial de acumulação para se-
dimentos de origem tanto marinha quanto continental. Imediatamente a montante daquela extremi-
dade o sentido do escoamento, e, portanto também do transporte de sedimentos perto do fundo, se
dirige para fora do estuário. Imediatamente a jusante do mesmo ponto o escoamento, e o transporte
de sedimentos próximos do fundo, se dirigem para dentro do estuário.
29 - Entretanto, também nos estuários parcialmente misturados e até nos totalmente misturados, a
circulação estuarina desempenha grande papel no transporte de sedimentos, particularmente em sus-
pensão, e já se mencionou que os sedimentos mais finos somente são transportados em suspensão [2],
[3].
30 - Para uma dada seção transversal de estuário e considerando a duração completa de um ciclo de
maré, pode-se escrever a seguinte equação de continuidade:
V V Q dV E f
t
t T
= +
+
∫ t
onde VV - é o volume total de água que atravessa a seção durante a vazante;
VE - é o volume total que atravessa a seção durante a enchete, que é o volume do prisma de
maré para montante da seção considerada;
Qf - é a vazão fluvial instantânea, de água doce, na extremidade interna do estuário;
T - é o periodo da maré, (12h 25 min para maré semidiurna).
Entretanto, tal equação se aplica à seção transversal considerada como um todo. Em consequência da
circulação estuarina, em estuário total ou parcialmente misturado, há uma parte da seção transversal -
a parte mais profunda - em que entra mais água na enchente do que sai na vazante. Na outra parte da
seção - mais próxima da superficie - sai mais água na vazante do que entra na enchente; a rigor, perto
da superficie, a diferença entre a quantidade de água que sai na vazante e que entra na enchente e
também maior do que a quantidade de água doce que entra pela extremidade interna do estuário,
6
- 7 -
pois a esta quantidade de água doce, se soma àquela quantidade de água salgada que entrou pelo
fundo, diminui de salinidade e, portanto de densidade, em consequência subiu para a camada superi-
or e por esta sai do estuário para o mar.
31 - A presença de uma circulação estuarina faz com que as velocidades médias (Vm), ao longo de ci-
clos completos de maré e em pontos fixos em relação à geometria do estuário, em geral não seja nula.
Isto é, tem-se em geral:
V
T
V dtm
t
t T
= ≠
+
∫
1
0
onde V é a velocidade instantânea no ponto considerado. Abaixo de certa distância ao fundo, estas
velocidades médias ou residuais são dirigidas para dentro do estuário, desde que se esteja na região
de instrusão salina. Acima daquela distância as velocidades médias ou residuais são dirigidas para
fora. O ponto no fundo em que a velocidade residual é nula é um ponto nodal do estuário ("null drift
point") para a amplitude de maré na embocadura e o deflúvio de água doce durante o ciclo completo
de maré, que estiverem em consideração. Para amplitude de maré constante na embocadura, o ponto
nodal se deslocará para dentro do estuário, se o deflúvio de água doce diminuir, e se deslocará em
direção à embocadura, se aquele deflúvio aumentar. Se o deflúvio de água doce durante o ciclo com-
pleto de maré permanecer, o aumento da amplitude da maré na embocadura tenderá a fazer avançar
o ponto nodal para dentro do estuário e a diminuição da amplitude da maré na embocadura tenderá a
aproximar desta o ponto nodal.
32 - Em um estuário real, as amplitude da maré na embocadura variam, ao longo do mes lunar, entre
sizígias e quadraturas e as vazões fluviais na extremidade interna variam pelo menos com as estações
do ano, entre cheias e estiagens. Em geral, portanto, o ponto nodal se deslocará dentro de um certo
trecho do estuário, isto é; sua posição variará dentro de uma certa gama de distâncias da embocadura.
33 - O ponto nodal é, por conseguinte, um ponto de acumulação de sedimentos que entram no estuá-
rio e são transportados perto do fundo, sejam de origem marinha ou continental. Dentre os estuários
cujos sedimentos são bem finos (areia muito fina, silte e argila) existem alguns cujos pontos nodais se
situam muito para dentro e não controlam realmente os processos de deposição que neles se desenro-
lam. É por exemplo, o caso do Estuário Santista, onde os pontos nodais se situam praticamente no so-
pé da Serra do Mar. Entretanto, em outros estuários, como o Tâmisa na Grã-Bretanha e o Garonne na
França, dentro do qual se situa o porto de Bordeaux, a posição dos pontos nodais desempenha papel
decisivo nos processos de deposição. Muito antes de se ter esclarecido o mecanismo da circulação es-
tuarina, se sabia que o "Mud Reach" do Tâmisa e a zona do "Bouchon Vaseux" no Garonne eram os
trechos mais sujeitos a envasamento, e a quantidade de vasa neles acumulada era tal que fazia apare-
cer um fundo duplo em registros de ecobatímetro. Em geral, em estuário no qual a zona, em que se
desloca o ponto nodal, se situa em trecho aprofundado por dragagem, e naquela zona que se concen-
tram os maiores gastos com dragagem de manutenção.
34 - Na prática, em vez de calcular as velocidades residuais acima definidas, pode ser mais cômodo
trabalhar com um "parâmetro de dominância dos escoamentos de vazante" definido por:
V dt
V dt V dt
t
t T
t
t T
t
t T
V
E V
+
+ +
∫
∫ ∫+
(em %)
onde TV corresponde à parcela da vazante e TE à parcela da enchente na duração do ciclo da maré T, e
V é a velocidade intantânea no ponto considerado. Na expressão acima o numerador é igual à área
correspondente à fase de vazante em gráfico de velocidade para ponto fixo em relação à geometria do
estuário, durante o ciclo completo de maré; e o denominador é a área correspondente à fase de en-
chente somada à de vazante no mesmo gráfico.
Um valor de 50% para o parâmetro em questão indica que no ponto considerado, para determinada
combinação de amplitude de maré na embocadura com deflúvio de água doce, entra durante a en-
7
- 8 -
chente o mesmo volume de água que sai na vazante. Valor superior a 50% revela dominância da va-
zante - sai mais água na vazante do que entra na enchente. É o que acontece perto da superficie em
estuário total ou parcialmente misturado. Valor inferior a 50% significa dominância de enchente - en-
tra mais água na enchente do que sai na vazante. É o que se constata nos pontos próximos do fundo
em estuários total ou parcialmente misturados.
35 - Gráficos traduzindo a variação dos valores de tal parâmetro na vertical e ao longo do estuário, no
fundo e na superficie, permitem caracterizar a circulação estuarina e o sistema geral de transporte em
suspensão.
36 - Cabe assinalar que, para que os valores daquele parâmetro sejam realmente elucidativos, devem
verificar-se as seguintes condições:
a) que não haja variação do nível médio do mar durante ciclo de maré (por exemplo, devido a e-
feitos meteorológicos);
b) que o nível final do ciclo seja igual ao inicial.
Assim, este método de análise da circulação estuarina funciona bem em local sujeito à maré diurna,
mas, em local de maré semidiurna com desigualdades diurnas, as medições de correntes, com base
nas quais se tracam as curvas develocidade no ponto considerado, devem estender-se por dia lunar
completo, ou sejam 24 horas e 50 minutos solares médios. Como o Estuário Santista não preenche as
condições acima, não é possível caracterizar-lhe a circulação estuarina a partir de medições de corren-
tes se estendendo por apenas ciclos individuais de maré.
VI. CONCLUSÕES
37 - Os estuários constituem os sistemas naturais mais complicados com que lidam os engenheiros
hidráulicos. Neles se passa uma cadeia complexa de interações e qualquer alteração, que se introduza
em qualquer aspecto de suas condições naturais, pode deflagra toda uma longa série de repercussões.
Estas podem prejudicar terceiros ou frustar os próprios objetivos que se tem em vista ao propor a alte-
ração. É indispensável prever tais efeitos, sob todos os pontos de vista, antes de executar a alteração,
correndo a pormenorizados estudos de campo, a análise da história do estuário e a simulação fisica e
(ou) matemática dos diferentes aspectos de seu funcionamento hidráulico, salino e sedimentológico.
38 - O estudo da história de um dado estuário, das evoluções por que passou ao longo do tempo e
particularmente dos efeitos das intervenções, que nele se fizeram, é sempre muito elucidativo e pode
por si só, esclarecer muitas questões relativas a seu funcionamento.
39 - Ao se programarem medições de correntes em estuários, deve- se antes de tudo, ter em mira ca-
racterizar a circulação resultante dos gradientes de salinidade e os respectivos efeitos no transporte de
sedimentos.
VII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] - PRITCHARD, D.W., "What is an Estuary: Physical Viewpoint", in "Estuaries", edited by G.H. Lauff, Publication N- 83,
American Association for the Advancement of Science, Washington, 1967
[2] - PARHENIADES, E., "Engineering Properties of Estuarine Sediments". Simpósio patrocinado pela NATO, Conferência N-
16, Lisboa.
[3] - PARTHENIADES,E., "Salinity Intrusion in Estuaries and its Effect on Shoaling", in "River Mechanics". Vol.II, Edited and
Published by Hsieh Wen Shen, Fort Collins, Colorado, 1971
[4] - Mc DOWELL, D.M. e O'CONNOR, B.A., "Hydraulic Behaviour of Estuaries", The MacMillan Press Ltd., London., 1977.
[5] - IPPEN, A.T., "Salinity Intrusion in Estuaries", In "Estuary and Coastline Hydrodinamics", Chapter 13, Edited by A.T. Ippen.
Mc Graw Hill Book Co., New York, 1966.
[6] - BLENCH, T. "Regime Behaviour of Canals and Rivers". Butterworths Scientific Publications, Londres, 1957
[7] - LACEY,G., "Stable Channels in Alluvium". Proceedings of the Institution of Civil Engineers, Vol. 229, 1929-03, Part I, pg 259,
Londres.
[8] - LACEY,G. "Regime Flow in Incoherent Alluvium". Publication n- 20, Central Board of Irrigation, India, 1939.
8
- 9 -
[9] - INGLIS, C.C., "Meanders and their Bearing on River Training". Institution of Civil Engineers, Maritime and Waterways
Division, Paper N- 7, Londres, 1947.
[10] ALLEN, F.H., INGLIS, C.C, "The Regime of the Thames Estuary as Affected by Currents, Salinities and River Flow". Pro-
ceedings of the Instituion of Civl Engineers, vol. 7, pgs. 827-878, August, 1957.
[11] - ODD, N.V.M., OWEN, M.W., "A Two-Layer Model of Mud Transport in The Thames Estuary". Proceeddings of the Insti-
tuion of Civil Engineers, Paper 7517 S, Londres, 1972.
[12] PILLSBURY, G.P. "Tidal Hydraulics", Chapter VIII. U S Army Corps of Engineers, Vicksburg, Mississipi, 1956.
[13] - HIDRAULICS RESEARCH STATION, "Basic Tidal Inlet Model", in "Hidraulics Research, 1960", Relatório anual, pgs.50-52,
Her Majesty's Sationery Office, Londres, 1961.
[14] - KESTNER, F.J.T., "The Effects of Engineering Works on Tidal Estuaries", Chapter 17 in "River Enginneering and Water
Conservation Works", edited By R.B. Thorn, Butterworths, Londres, 1966.
[15] - INGLIS, C.C. e KESTNER, F.J.T., "Changes in the Wach as Affected by Training Walls and Reclamation Works" Proceed-
ings of the Instituion of Civil Engineers, vol. 11, pg.435-466, Dezembro de 1958, Londres.
[16] - PRICE, W.A., KENDRICK, M.P. "Field and Model Insvestigation into the Reasons for Siltation in the Mersey Estuary".
Proceeding of the Instition of Civil Engineers, vol. 24, pg-473-518, Londres, 1963.
[17] - FALEIGH, D.R.P., INGLISH, C.C., "The Behaviour and Control of the Karnafuli Estuary, East Pakistan". Instituon of Civil
Engineers, Conference on Civil Engineering Problems Overseas, Londres, Julho de 1962.
[18] - MIGNIOT, C. "Etude des Propriétés Physiques de Differents Sediments Três Fins et de Leur Comportement sous des Ac-
tions Hidrodynamiques". La Houille Blanche, n- 7, 1968, pg.591-620, Grenoble.
[19] - ORGERON,C., "Etude sur Modele Reduit de la Sedimentation dans l'Estuaire de la Vilaine après Construction du Barrage
d'Arzal". Idem, idem, idem, pg.621-630.
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  • 1. Universidade Federal do Rio de Janeiro COPPE - Programa de Engenharia Oceânica Área de Engenharia Costeira & Oceanográfica PROCESSOS SEDIMENTOLÓGICOS EM ESTUÁRIOS Victor Freire Motta Professor Titular - COPPE/UFRJ - PEnO (1978) I. INTRODUÇÃO.................................................................................................................................................1 II. AS DIFERENÇAS ENTRE OS MECANISMOS GERADORES DA MORFOLOGIA DOS RIOS E DOS ESTUÁRIOS..........2 III. O CONCEITO DE ESTUÁRIO "IDEAL" ..............................................................................................................4 IV. REVISTA DE ALGUNS PROCESSOS DE ALTERAÇÃO MORFOLÓGICA DESENCADEADOS POR INTERVENÇÕES HUMANAS EM ESTUÁRIOS SUJEITOS À MARÉ.................................................................................................4 V. OS EFEITOS DA CIRCULAÇÃO NO TRANSPORTE DE SEDIMENTOS...................................................................6 VI. CONCLUSÕES.................................................................................................................................................8 VII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.....................................................................................................................8 I. INTRODUÇÃO 1 - Na linguagem não-especializada, estuário é o trecho de rio sujeito à influência da maré. Entretanto, tem-se hoje um conceito generalizado de estuário, que é devido D.W. Pritchard [1]: "Um estuário é um corpo d'água semiconfinado na costa, que tem ligação livre com o mar e dentro do qual água do mar entra em contacto com água doce, proveniente da drenagem do in- terior das terras". Em tal conceito é a interação da água salgada com a água doce, qualquer que seja o modo pelo qual se processo, que constitui a característica essencial dos estuários. Até mesmo os corpos deágua, em liga- ção livre com mar sem maré, são considerados estuários e neles a interação da água salgada com a água doce assume a modalidade particular de estratificação total, com instrusão salina se fazendo sob a forma de cunha com interface bem definida. É claro, porém, que os principais processos sedimento- lógicos e morfológicos, que vamos abordar, têm com principal agente fisico a penetração da maré. 2 - Chamamos de processos sedimentológicos a colocação em movimento de grãos de sedimentos, o transporte e a cessação deste. O fato de a maior parte de um dado estuário se encontrar abrigado da ação de ondas de oscilação e a circunstância de em geral os estuários constituirem o trecho final de um rio, propiciam a presença de sedimentos finos, çõesivos, silte e argila, que em geral não intervêem nos processos litorâneos. Tais sedimentos não são transportados por arraste, mas somente em supensão [2], [3], as maiores concentrações ocorrendo perto do fundo, e a cessação do transporte significam de- posição no fundo. 3 - Os processos morfológicos consistem nas alterações das carcterísticas geométricas em planta e em perfil ou em seção transversal dos estuários, em consequência de rupturas no equilíbrio dinâmico do transporte de sedimentos. Um curso deágua tem, em geral, quatro graus de liberdade: pode variar de largura, de profundidade, de declividade e formar meandros. Nos estuários as declividades longitu- dinais do fundo são muito pequenas, podendo até ser nulas, e uma variação muito comum em planta se dá com as posições e as dimensões dos bancos. Falecido em 04/82.
  • 2. - 2 - 4 - Muitos dos principais portos do mundo e algumas das maiores cidades se situam no interior de estuários, como Rotterdam. Amsterdam, Antuerpia, Londres, Liverpool, Southampton, Hamburgo, Bremen, Bordeaux, Lisboa, Buenos Aires, Santos, etc. Este fato torna frequentes as intervenções hu- manas nas condições naturais dos estuários, sob a forma de aprofundamento de canais naturais, alar- gamentos, dragagem de compartimentos em comúnicação com o corpo principal do estuário (docas, etc.), construção de aterros, tomadas deágua, lançamento de efluentes industriais e sanitários, desvios ou barramentos das contribuições líquidas e sólidas de montante. Em vários países, por exemplo, a Grã-Bretanha, os Países Baixos e a Alémanha, o maior volume de problemas hidráulicos se apresenta em relação a estuários, conforme a natureza dos estudos nos respectivos institutos de pesquisas hi- dráulicas traduz claramente. Tais fatos acarretaram nas três últimas décadas grande progresso dos conhecimentos humanos sobre o comportamento hidráulico, salino e sedimentológico dos estuários. Infelizmente, no Brasil tais assuntos ainda são pouco conhecidos e pouco se sabe sobre aqueles aspec- tos do funcionamento dos estuários brasileiros. Basta dizer que, com exceção do Estuário Santista, re- centemente objeto de estudos encomendados pela PORTOBRAS, nem sequer se conhece com razoável pormenor o mecanismo de propagação da maré em qualquer estuário brasileiro. 5 - São diversas as fontes dos sedimentos que vão ter aos estuários [4]. Podem provir da extremidade de montante, trazidos pelas vazões fluviais e resultantes da erosão das bacias contribuintes ou dos próprios leitos fluviais. Podem penetrar pela extremidade marítima, trazidos pelas correntes de maré e de densidades ou até por ondas que entrem no estuário, e provir de transporte litorâneo ou de ero- são da plataforma continental. Podem provir de erosão eólica de dunas ou de bancos que a maré cu- bra e descubra. Podem provir de despejos sólidos de origem industrial ou doméstica ou do retorno de materiais dragados. Podem provir até de decomposição ou dejetos de organismos vivos, marinhos ou fluviais. II. AS DIFERENÇAS ENTRE OS MECANISMOS GERADORES DA MORFOLOGIA DOS RIOS E DOS ESTUÁRIOS 6 - O que distingue os estuários de qualquer outro sistema natural, de que se ocupam os engenheiros hidráulicos, é a presença e a interação de vários mecanismos físicos dos quais os essenciais são os se- guintes [5]: a) propagação da maré, decorrente da geometria do estuário e da maré na embocadura; b) o aparecimento de gradientes longitudinais, verticais e eventualmente transversais de salinida- des, em consequência dos efeitos das forças de gravidade devidas às diferenças de densidade entre a água salgada, que penetra do mar, e a água doce, proveniente de montante; c) o escoamento, com sentido resultante para a embocadura, destas contribuições líquidas de montante; d) as forças de Coriolis e centrífugas, induzindo escoamentos secundários, devidos respectiva- mente a rotação da Terra e a curvatura dos canais naturais; e) a entrada de contribuições sólidas, que se pode fazer tanto pela embocadura (a extremidade ex- terna) quanto pela extremidade interna, e os processos de transporte dos sedimentos, dentro do estuário, pelas correntes de maré e pela circulação provocada pelos gradientes de densidade. 7 - Um conceito muito útil para os problemas de morfologia fluvial é o de "equilíbrio dinâmico" ou de "regime" [princípio do auto-ajustamento], cuja forma mais acabada se deve a escola anglo-indiana de Hidráulica Fluvial [6], [7], [8]. Tal conceito estabelece que, em rio em terreno aluvial, sujeito única- mente a escoamentos unidirecionais, existe relação unívoca entre as variáveis independentes - a vazão líquida e sólida na extremidade de montante do estirão considerado - e as variáveis dependentes - a largura, a profundidade e a declividade - do estirão. Se as variáveis independentes se alteram por cau- sas naturais ou artificiais, as variáveis dependentes também se modificam, no sentido de estabelecer nova situação de equilíbrio. Tal conceito foi estabelecido inicialmente para canais de irrigação que funcionavam a vazão constante. Posteriormente, foi generalizado para os rios sujeitos a regime de va- zões variáveis ao longo do ano e comportando um quarto grau de liberdade: o de formar meandros. No caso dos rios, as variações sazonais independentes acarretam flutuações das variáveis dependen- tes em torno de um situação de equilíbrio médio anual, que se pode considerar como determinada por uma "vazão geradora do leito" ("dominant discharge") [9]. 2
  • 3. - 3 - 8 - Nos estuários a amplitude da maré na embocadura varia continuamente entre máximos nas sizí- gias e mínimos nas quadraturas, no caso mais geral, e as vazões fluviais, na extremidade de montante, variam com as estações do ano. Entretanto, é possível generalizar o conceito "de regime" para os estu- ários, admitindo que haja também condições "dominantes" para geração de sua morfologia [10]. Tais "condições dominantes" consistem em marés de sizígia média na embocadura ou na combinação de tais marés com vazões fluviais de montante, no caso destas serem consideráveis, conforme ocorre fre- quentemente no Brasil. 9 - Entretanto, existe diferença muito importante entre o mecanismo gerador da morfologia dos rios e a dos estuários. Nos rios, as variáveis independentes, as vazões líquidas e sólidas, são praticamente impostas pela bacia contribuinte e sua relação de causalildade, com as variáveis dependentes, é de sentido único. Nos estuários, há "feed back" entre as variáveis dependentes e as independentes, aquelas podendo também atuar sobre estas. Com efeito, nos estuários sujeitos a maré, em terreno aluvial, onde não haja controles naturais de paredes fixas, como formações rochosas, e supondo pe- quenas as contribuições de montante, é uma dada amplitude de maré na embocadura que gera a ge- ometria do estuário. Todavia, ao alterar-se artificialmente, de maneira extensa, a geometria do estuá- rio, por alargamentos e aprofundamentos ou por constrições do leito (por exemplo, construindo gran- des aterros ou fechando braços), o mecanismo de propagação da maré, ao longo do estuário, se modi- ficará, ainda que a amplitude da maré externa permaneça constante. 10 - As formas em planta e em perfil do estuário, bem como a distribuição e a textura dos depósitos, a natureza e a quantidade dos sedimentos em trânsito, tanto por arraste quanto em suspensão, decor- rem de uma interação complexa em que um conjunto de variáveis é representado por: a) a maré na foz (amplitude e andamento no tempo); b) o mecanismo de propagação da maré (amplitude e andamento no tempo ao longo do estuário); c) as contribuições líquidas e sólidas de montante; d) a quantidade e a qualidade de materia sólida introduzida do mar para dentro do estuário, por correntes de maré ou de densidade e eventual penetração de ondas; e) a granulometria e a densidade dos sedimentos de origem continental. O outro conjunto de variáveis engloba: a) as profundidades, larguras e declividades dos canais naturais; b) as dimensões e posições dos bancos; c) os gradientes longitudinais e verticais de salinidades decorrentes do encontro da água salgada proveniente do oceano com água doce de origem continental; d) a textura granulométrica dos depósitos. 11 - Funções desconhecidas - e provávelmente diferentes para cada estuário - ligam todas estas gran- dezas entre si. Se houver alterações de uma das grandezas dependentes, sem que mudem as variáveis independentes, a grandeza alterada volta a seu valor de equilíbrio. Se houver modificação de uma variável independente, as grandezas dependentes assumem novos valores correspondentes à nova situação de equilíbrio. Como já vimos, a variável "independente" principal - o mecanismo de propaga- ção da maré - pode ser afetado por qualquer alteração natural ou artificial na geometria do estuário. Esta modificação pode agir, quer sobre a celeridade de propagação da maré, quer sobre a defasagem entre a variação de níveis e a variação de velocidades, quer sobre a perda de carga no escoamento de maré, quer diretamente sobre o volume do prisma a ser cheio e esvaziado. Então, em vez da causali- dade "unidirecional" dos rios, tem-se um "feed back" em que a variável a princípio "dependente" pode modificar a variável "independente" e esta, por sua vez, impor novo valor a variável "dependente". 12 - Conforme veremos oportunamente, foi graças a tal fato que se conseguiu aprofundar considera- velmente o acesso a muitos portos no interior de estuários, como Londres ou Bremen, sem incorrer em aumentos insuportáveis dos volumes anuais de dragagem de manutenção. Em outras palavras, as profundidades "de equilíbrio" podem ser aumentadas, se forem modificadas apropriadamente a geo- metria do estuário. 3
  • 4. - 4 - 13 - Em resumo, há uma interação continua entre os diversos processos que influenciam o movimen- to da água, do sal e dos sedimentos, particularmente os transportados em suspensão, em um estuário. A intensidade e a rapidez de tais interações variam considerávelmente e muitas vezes são de natureza unilateral [11]. Por exemplo, a propagação da maré tem influência dominante no movimento do sal e de em vasa suspensão, enquanto estes, por sua vez, exercem influência muito menor sobre a propaga- ção da maré. Esta desigualdade de interações tornou possível construir modelos matemáticos, simpli- ficados, porém razoávelmente precisos, do transporte de vasa em suspensão, sem que se tentasse si- mular o movimento do sal, os complexos processos de cisalhamento interno dos escoamentos ou a interação do transporte da vasa em suspensão com o escoamento da maré [11]. III. O CONCEITO DE ESTUÁRIO "IDEAL" 14 - O estuário "ideal" seria aquele ao longo do qual fossem constantes as amplitudes das variações de níveis e as amplitudes das variações de velocidades médias instantâneas, através das diferentes seções [12]. Demonstra-se algebricamente que a forma em planta, acarretando tais propriedades, consistiria em variação exponencial inversa da largura, no nível médio, com a distância à embocadura. Tem-se então: ( )0 exp coty y nx= − ϕ onde y - largura do estuário no nível médio de cada seção; y0 - idem na embocadura; x - distância da seção considerada à embocadura; n = S/A - razão entre a amplitude do desnível da superficie livre na seção considerada e a amplitude da maré na embocadura; ϕ - medida angular da defasagem entre a variação de níveis e a variação de velocidades. 15 - No caso de as vazões fluviais serem desprezíveis em face das vazões do escoamento de maré, e na ausência de paredes fixas, a forma em planta do estuário ideal constituiria a configuração de equilí- brio produzida por aquele escoamento. Alguns estuários preenchem as hipóteses acima formuladas e aproximadamente apresentam em planta a forma do estuário ideal, tais como a Delaware e o Tâmisa. É facil obter em laboratório a configuração em planta do estuário ideal, reproduzindo sucessivos ci- clos de maré na embocadura de um canal retilíneo, aberto em leito móvel com seção transversal insu- ficiente para estar em equilíbrio [13]. A forma do estuário ideal, em tais condições, aparece por erosão do canal inicial. 16 - Inversamente, ao constatar-se que a forma em planta de um dado estuário aproxima-se sensivel- mente da configuração do estuário ideal, pode-se concluir imediatamente que: a) as vazões fluviais desempenham um papel desprezível na geração da morfologia do estuário em questão; b) os escoamentos de maré já produziram configuração de equilíbrio. Tal equilíbrio só poderá ser dinâmico se sedimentos marinhos continuarem a chegar à embocadura. IV. REVISTA DE ALGUNS PROCESSOS DE ALTERAÇÃO MORFOLÓGICA DESENCADEADOS POR INTERVENÇÕES HUMANAS EM ESTUÁRIOS SUJEITOS À MARÉ. 17 - Compreender-se-á talvez mais claramente o exposto na seção II se forem considerados alguns processos de alteração morfológica, abrangendo-se trechos de estuários sujeitos a maré. Tais processos foram desencadeados por obras de engenharia que se executaram em tais estuários [14]. 18 - Como exemplo de como é possível aprofundar um estuário pelo simples aumento de volume de seu prisma de maré, sem incorrer em proibitivos aumentos de dragagem de manutenção e sem recor- rer a obras de regularização ou calibração, ao contrário do que inevitável para um rio sujeito única- 4
  • 5. - 5 - mente a escoamentos unidirecionais, citaremos o caso do estuário do Weser, na Alémanha Ocidental, dentro do qual se situa o porto de Bremen, a cerca de 80 km da embocadura no Mar do Norte [14]. 19 - Até 1887, as profundidades naturais do Weser permitiam a entrada de navios com calado de ape- nas 3 m. O estirão entre a embocadura e Bremen sofreu, entre aquele ano e 1952 consideráveis apro- fundamentos, alargamentos e remoção de obstáculos por dragagem. O abaixamneto total das costas do fundo, logo a jusante de Bremen, foi da ordem de 10m. O efeito de tais dragagens nos níveis dos premarés foi pequeno, ao longo de todo o estuário, mas resultou abaixamento conside-rável dos ní- veis dos baixamarés nos estirões internos do Weser, particularmente no próprio porto de Bremen on- de foi da ordem de 3m. Antes das alterações mencionadas, a aplitude da maré na embo-cadura era de 3,4 m e, em Bremen, de apenas 0,20 m. Depois da dragagem de cerca de 4 x 10 m3 no estuário, a ampli- tude da maré em Bremen havia aumentado, em 1945, para 3,1 m, quase o mesmo valor da embocadu- ra. 20 - Os dados acima caracterizam grande aumento do volume do prisma de maré do estuário. É tal aumento que permite manter as seções aprofundadas, ao contrário do que aconteceria nos rios, a não ser que se construissem obras de regularização de modo a calibrar o leito. Na realidade o aumento das profundidades foi maior do que o proporcionado pelas dragagens porque as correntes com velocida- des aumentadas, correspondentes ao novo prisma de maré decorrente do abaixamento dos baixama- rés, ainda aprofundaram por erosão os fundos deixados pelas dragagem. Em outras palavras, aumen- taram as profundidades porque se intensificou o agente que as preserva: as correntes de enchente e de vazante, aumentadas pelo aumento do volume do prisma de maré. 21 - Cabe assinalar que, para colher os beneficios obtidos no Weser, são necessárias duas condições: a) que haja margem para provocar o aumento do volume do prisma de maré, isto é, que as ampli- tudes de maré nos estirões internos do estuário sejam sensívelmente menores que na emboca- dura; b) que o aprofundamento ou largamento seja suficiente drástico para afetar grandes extensões do estuário - aprofundamento e alargamento de pequeno trecho não afetaria ou pouco afetaria as amplitudes de maré mais para dentro do estuário. 22 - Inversamente, muitos têm sido os estuários que sofreram processo de assoreamento generalizado, no leito propriamente dito e na embocadura, em consequência de se ter reduzido drasticamente o vo- lume do prisma de maré pela construção de aterros ou pelo fechamento de braços. Embora o processo não haja sido devidamente documentado, foi evidentemente o que aconteceu no braço ao Sul da ilha em que está o porto de São Francisco do Sul, em Santa Catarina, depois da construção de um aterro- barragem rodoviário. Os aterros em lagoas litorâneas, como as que existem na região do Rio de Janei- ro, são particularmente nocivos à preservação das respectivas embocaduras. 23 - Outra alteração capaz de deteriorar as profundidades, ao longo de extensos trechos de estuá- rios, pode ser deflagrada pela alteração na defasagem entre a variação de níveis e a variação de ve- locidades. O caso ocorrido em outro estuário alémão desembocando no Mar do Norte, o Eider, ilustra bem tal fato. 24 - As marés de tempestade ("storm surges") constituem um flagelo das regiões ribeirinhas do Sul do Mar do Norte. Para defendê-las constroem-se diques ao longo da costa e, nos estuários, barragens munidas de comportas que se fecham durante aquelas ocorrências. Construiu-se uma de tais barra- gens no estuário do Eider, no extremo Norte da Alémanha, durante a década de 30. Acontece que a- quele estuário era do tipo "desobstruido" para a penetração da maré. Isto é: as inversões de correntes tinham lugar, não nas estofas de baixamar e preamar, porém a meia-maré [onda de maré progressiva], os escoamentos de enchente se processando da meia-maré enchente a meia-maré vazante e os escoa- mentos de vazante se fazendo da meia-maré vazante a meia-maré enchente. Resultavam velocidades de vazante muito maiores que as de enchente porque nas vazantes, além das vazões serem maiores por incluirem as contribuições de montante, as áreas molhadas eram menores, por corresponderem a níveis d'água mais baixos, mais próximos dos baixamarés. Em consequência, as capacidades de trans- porte dos escoamentos de vazante eram sensívelmente maiores que as dos escoamentos de enchente. Em outras palavras, o estuário tinha uma boa capacidade de expelir os sedimentos que nele penetra- vam pela embocadura, e era realmente por esta que entrava maior quantidade de sedimentos. 5
  • 6. - 6 - 25 - Com a construção da barragem, alterou-se a defasagem entre a maré vertical (variação de níveis) e a maré horizontal (correntes). As inversões de correntes passaram a ter lugar nas estofas, com alguns minutos de atraso em relação respectivamente aos baixamarés e preamarés, [onda de maré estacioná- ria]. As correntes de enchente passaram a ocorrer entre os baixamarés e preamarés. As de vazan- tes,entre os preamarés e baixamarés. Desapareceu a dominância da capacidade de transporte das cor- rentes de vazantes sobre as de enchente e perdeu-se a capacidade de autodepuração sedimentar do estuário. Resultou processo generalizado de assessoramento entre a embocadura e a barragem, com graves prejuizos para a navegação no estuário. 26 - Uma terceira causa possível de deflagrar processos de assoreamento generalizado em estuários é a construção de guias de corrente que inibem a livre formação de meandros. Muitas vezes cons- troem-se guias de correntes ("training walls") para manter alinhamentos de canais de navegação, mas, em vez dos canais assim enquadrados se manterem ou se aprofundarem, se envasam porque desapa- rece a possibilidade de formar meandros e consequentemente elimina-se um mecanismo natural que repõe em suspensão material fino, oriundo do mar e depositado sobre os fundos nas estofas. Foi o que aconteceu no estuário do Lune, no condado ingles de Lancashire, que se evasou entre 1844 e 1955, a ponto de seu volume de prisma de maré se haver reduzido de 47,3% em seguida a construção de um sistema de guias de correntes, que inibiram completamente a formação de meandros [14]. V. OS EFEITOS DA CIRCULAÇÃO NO TRANSPORTE DE SEDIMENTOS 27 - Chama-se de circulação estuarina à circulação provocada por forças de gravidade resultantes dos gradientes longitudinais e verticais de salidade. Tais gradientes são provocados pelo encontro da água salgada com água doce. 28 - É evidente que nos estuários totalmente estratificados a cunha salina funciona como verdadeira rolha hidráulica, impedindo que sedimentos provenientes do mar penetram no estuário além da ex- tremidade da cunha e ao mesmo tempo impossibilitando que sedimentos de origem continental avan- cem para fora daquela mesma extremidade. Com efeito, em virtude da circulação existente dentro da cunha salina, com velocidades dirigidas para dentro do estuário ao longo do fundo e para fora ao lon- go da interface, a extremidade da cunha salina constitue ponto preferencial de acumulação para se- dimentos de origem tanto marinha quanto continental. Imediatamente a montante daquela extremi- dade o sentido do escoamento, e, portanto também do transporte de sedimentos perto do fundo, se dirige para fora do estuário. Imediatamente a jusante do mesmo ponto o escoamento, e o transporte de sedimentos próximos do fundo, se dirigem para dentro do estuário. 29 - Entretanto, também nos estuários parcialmente misturados e até nos totalmente misturados, a circulação estuarina desempenha grande papel no transporte de sedimentos, particularmente em sus- pensão, e já se mencionou que os sedimentos mais finos somente são transportados em suspensão [2], [3]. 30 - Para uma dada seção transversal de estuário e considerando a duração completa de um ciclo de maré, pode-se escrever a seguinte equação de continuidade: V V Q dV E f t t T = + + ∫ t onde VV - é o volume total de água que atravessa a seção durante a vazante; VE - é o volume total que atravessa a seção durante a enchete, que é o volume do prisma de maré para montante da seção considerada; Qf - é a vazão fluvial instantânea, de água doce, na extremidade interna do estuário; T - é o periodo da maré, (12h 25 min para maré semidiurna). Entretanto, tal equação se aplica à seção transversal considerada como um todo. Em consequência da circulação estuarina, em estuário total ou parcialmente misturado, há uma parte da seção transversal - a parte mais profunda - em que entra mais água na enchente do que sai na vazante. Na outra parte da seção - mais próxima da superficie - sai mais água na vazante do que entra na enchente; a rigor, perto da superficie, a diferença entre a quantidade de água que sai na vazante e que entra na enchente e também maior do que a quantidade de água doce que entra pela extremidade interna do estuário, 6
  • 7. - 7 - pois a esta quantidade de água doce, se soma àquela quantidade de água salgada que entrou pelo fundo, diminui de salinidade e, portanto de densidade, em consequência subiu para a camada superi- or e por esta sai do estuário para o mar. 31 - A presença de uma circulação estuarina faz com que as velocidades médias (Vm), ao longo de ci- clos completos de maré e em pontos fixos em relação à geometria do estuário, em geral não seja nula. Isto é, tem-se em geral: V T V dtm t t T = ≠ + ∫ 1 0 onde V é a velocidade instantânea no ponto considerado. Abaixo de certa distância ao fundo, estas velocidades médias ou residuais são dirigidas para dentro do estuário, desde que se esteja na região de instrusão salina. Acima daquela distância as velocidades médias ou residuais são dirigidas para fora. O ponto no fundo em que a velocidade residual é nula é um ponto nodal do estuário ("null drift point") para a amplitude de maré na embocadura e o deflúvio de água doce durante o ciclo completo de maré, que estiverem em consideração. Para amplitude de maré constante na embocadura, o ponto nodal se deslocará para dentro do estuário, se o deflúvio de água doce diminuir, e se deslocará em direção à embocadura, se aquele deflúvio aumentar. Se o deflúvio de água doce durante o ciclo com- pleto de maré permanecer, o aumento da amplitude da maré na embocadura tenderá a fazer avançar o ponto nodal para dentro do estuário e a diminuição da amplitude da maré na embocadura tenderá a aproximar desta o ponto nodal. 32 - Em um estuário real, as amplitude da maré na embocadura variam, ao longo do mes lunar, entre sizígias e quadraturas e as vazões fluviais na extremidade interna variam pelo menos com as estações do ano, entre cheias e estiagens. Em geral, portanto, o ponto nodal se deslocará dentro de um certo trecho do estuário, isto é; sua posição variará dentro de uma certa gama de distâncias da embocadura. 33 - O ponto nodal é, por conseguinte, um ponto de acumulação de sedimentos que entram no estuá- rio e são transportados perto do fundo, sejam de origem marinha ou continental. Dentre os estuários cujos sedimentos são bem finos (areia muito fina, silte e argila) existem alguns cujos pontos nodais se situam muito para dentro e não controlam realmente os processos de deposição que neles se desenro- lam. É por exemplo, o caso do Estuário Santista, onde os pontos nodais se situam praticamente no so- pé da Serra do Mar. Entretanto, em outros estuários, como o Tâmisa na Grã-Bretanha e o Garonne na França, dentro do qual se situa o porto de Bordeaux, a posição dos pontos nodais desempenha papel decisivo nos processos de deposição. Muito antes de se ter esclarecido o mecanismo da circulação es- tuarina, se sabia que o "Mud Reach" do Tâmisa e a zona do "Bouchon Vaseux" no Garonne eram os trechos mais sujeitos a envasamento, e a quantidade de vasa neles acumulada era tal que fazia apare- cer um fundo duplo em registros de ecobatímetro. Em geral, em estuário no qual a zona, em que se desloca o ponto nodal, se situa em trecho aprofundado por dragagem, e naquela zona que se concen- tram os maiores gastos com dragagem de manutenção. 34 - Na prática, em vez de calcular as velocidades residuais acima definidas, pode ser mais cômodo trabalhar com um "parâmetro de dominância dos escoamentos de vazante" definido por: V dt V dt V dt t t T t t T t t T V E V + + + ∫ ∫ ∫+ (em %) onde TV corresponde à parcela da vazante e TE à parcela da enchente na duração do ciclo da maré T, e V é a velocidade intantânea no ponto considerado. Na expressão acima o numerador é igual à área correspondente à fase de vazante em gráfico de velocidade para ponto fixo em relação à geometria do estuário, durante o ciclo completo de maré; e o denominador é a área correspondente à fase de en- chente somada à de vazante no mesmo gráfico. Um valor de 50% para o parâmetro em questão indica que no ponto considerado, para determinada combinação de amplitude de maré na embocadura com deflúvio de água doce, entra durante a en- 7
  • 8. - 8 - chente o mesmo volume de água que sai na vazante. Valor superior a 50% revela dominância da va- zante - sai mais água na vazante do que entra na enchente. É o que acontece perto da superficie em estuário total ou parcialmente misturado. Valor inferior a 50% significa dominância de enchente - en- tra mais água na enchente do que sai na vazante. É o que se constata nos pontos próximos do fundo em estuários total ou parcialmente misturados. 35 - Gráficos traduzindo a variação dos valores de tal parâmetro na vertical e ao longo do estuário, no fundo e na superficie, permitem caracterizar a circulação estuarina e o sistema geral de transporte em suspensão. 36 - Cabe assinalar que, para que os valores daquele parâmetro sejam realmente elucidativos, devem verificar-se as seguintes condições: a) que não haja variação do nível médio do mar durante ciclo de maré (por exemplo, devido a e- feitos meteorológicos); b) que o nível final do ciclo seja igual ao inicial. Assim, este método de análise da circulação estuarina funciona bem em local sujeito à maré diurna, mas, em local de maré semidiurna com desigualdades diurnas, as medições de correntes, com base nas quais se tracam as curvas develocidade no ponto considerado, devem estender-se por dia lunar completo, ou sejam 24 horas e 50 minutos solares médios. Como o Estuário Santista não preenche as condições acima, não é possível caracterizar-lhe a circulação estuarina a partir de medições de corren- tes se estendendo por apenas ciclos individuais de maré. VI. CONCLUSÕES 37 - Os estuários constituem os sistemas naturais mais complicados com que lidam os engenheiros hidráulicos. Neles se passa uma cadeia complexa de interações e qualquer alteração, que se introduza em qualquer aspecto de suas condições naturais, pode deflagra toda uma longa série de repercussões. Estas podem prejudicar terceiros ou frustar os próprios objetivos que se tem em vista ao propor a alte- ração. É indispensável prever tais efeitos, sob todos os pontos de vista, antes de executar a alteração, correndo a pormenorizados estudos de campo, a análise da história do estuário e a simulação fisica e (ou) matemática dos diferentes aspectos de seu funcionamento hidráulico, salino e sedimentológico. 38 - O estudo da história de um dado estuário, das evoluções por que passou ao longo do tempo e particularmente dos efeitos das intervenções, que nele se fizeram, é sempre muito elucidativo e pode por si só, esclarecer muitas questões relativas a seu funcionamento. 39 - Ao se programarem medições de correntes em estuários, deve- se antes de tudo, ter em mira ca- racterizar a circulação resultante dos gradientes de salinidade e os respectivos efeitos no transporte de sedimentos. VII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS [1] - PRITCHARD, D.W., "What is an Estuary: Physical Viewpoint", in "Estuaries", edited by G.H. Lauff, Publication N- 83, American Association for the Advancement of Science, Washington, 1967 [2] - PARHENIADES, E., "Engineering Properties of Estuarine Sediments". Simpósio patrocinado pela NATO, Conferência N- 16, Lisboa. [3] - PARTHENIADES,E., "Salinity Intrusion in Estuaries and its Effect on Shoaling", in "River Mechanics". Vol.II, Edited and Published by Hsieh Wen Shen, Fort Collins, Colorado, 1971 [4] - Mc DOWELL, D.M. e O'CONNOR, B.A., "Hydraulic Behaviour of Estuaries", The MacMillan Press Ltd., London., 1977. [5] - IPPEN, A.T., "Salinity Intrusion in Estuaries", In "Estuary and Coastline Hydrodinamics", Chapter 13, Edited by A.T. Ippen. Mc Graw Hill Book Co., New York, 1966. [6] - BLENCH, T. "Regime Behaviour of Canals and Rivers". Butterworths Scientific Publications, Londres, 1957 [7] - LACEY,G., "Stable Channels in Alluvium". Proceedings of the Institution of Civil Engineers, Vol. 229, 1929-03, Part I, pg 259, Londres. [8] - LACEY,G. "Regime Flow in Incoherent Alluvium". Publication n- 20, Central Board of Irrigation, India, 1939. 8
  • 9. - 9 - [9] - INGLIS, C.C., "Meanders and their Bearing on River Training". Institution of Civil Engineers, Maritime and Waterways Division, Paper N- 7, Londres, 1947. [10] ALLEN, F.H., INGLIS, C.C, "The Regime of the Thames Estuary as Affected by Currents, Salinities and River Flow". Pro- ceedings of the Instituion of Civl Engineers, vol. 7, pgs. 827-878, August, 1957. [11] - ODD, N.V.M., OWEN, M.W., "A Two-Layer Model of Mud Transport in The Thames Estuary". Proceeddings of the Insti- tuion of Civil Engineers, Paper 7517 S, Londres, 1972. [12] PILLSBURY, G.P. "Tidal Hydraulics", Chapter VIII. U S Army Corps of Engineers, Vicksburg, Mississipi, 1956. [13] - HIDRAULICS RESEARCH STATION, "Basic Tidal Inlet Model", in "Hidraulics Research, 1960", Relatório anual, pgs.50-52, Her Majesty's Sationery Office, Londres, 1961. [14] - KESTNER, F.J.T., "The Effects of Engineering Works on Tidal Estuaries", Chapter 17 in "River Enginneering and Water Conservation Works", edited By R.B. Thorn, Butterworths, Londres, 1966. [15] - INGLIS, C.C. e KESTNER, F.J.T., "Changes in the Wach as Affected by Training Walls and Reclamation Works" Proceed- ings of the Instituion of Civil Engineers, vol. 11, pg.435-466, Dezembro de 1958, Londres. [16] - PRICE, W.A., KENDRICK, M.P. "Field and Model Insvestigation into the Reasons for Siltation in the Mersey Estuary". Proceeding of the Instition of Civil Engineers, vol. 24, pg-473-518, Londres, 1963. [17] - FALEIGH, D.R.P., INGLISH, C.C., "The Behaviour and Control of the Karnafuli Estuary, East Pakistan". Instituon of Civil Engineers, Conference on Civil Engineering Problems Overseas, Londres, Julho de 1962. [18] - MIGNIOT, C. "Etude des Propriétés Physiques de Differents Sediments Três Fins et de Leur Comportement sous des Ac- tions Hidrodynamiques". La Houille Blanche, n- 7, 1968, pg.591-620, Grenoble. [19] - ORGERON,C., "Etude sur Modele Reduit de la Sedimentation dans l'Estuaire de la Vilaine après Construction du Barrage d'Arzal". Idem, idem, idem, pg.621-630. 9