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Cadernos de Pesquisa, v. 35, n. 125, maio/ago. 2005
Resenhas
UMA HISTÓRIA DA INFÂNCIA:
DA IDADE MÉDIA À ÉPOCA
CONTEMPORÂNEA NO OCIDENTE.
Colin Heywood
Porto Alegre: Artmed, 2004, 284p.
Passaram-se mais de 25 anos ao longo
dos quais a obra de Philippe Ariès, História
social da infância e da família, foi traduzida no
Brasil e reinou quase solitária como referên-
cia para a história da infância ocidental. A pu-
blicação do livro de Colin Heywood permite
aos leitores brasileiros o acesso a uma com-
petente síntese do avanço dos estudos sobre
o tema em alguns países europeus e nos EUA.
Heywood faz um rastreamento de pes-
quisas produzidas no Reino Unido, na Fran-
ça, nos EUA, bem como na Itália, na Rússia e
nos países escandinavos, entre outros. Isso
surpreende, pois não é comum encontrar-
mos obras de autores estrangeiros que reú-
nam como referências a bibliografia em língua
francesa e em língua inglesa. Os estudos so-
bre a história da infância em nosso país têm
se ocupado de algumas dessas pesquisas eu-
ropéias e norte-americanas e das críticas às
teses de Ariès, mas as trataram em análises
mais pontuais, referidas a um ou outro aspec-
to do tema.
O livro organiza-se em três partes. A
primeira, ocupa-se das mudanças nas concep-
ções de infância a partir da Idade Média. A
segunda, trata da relação das crianças com
seus pais e com seus pares ao longo das eta-
pas do seu processo de crescimento. A ter-
ceira parte dedica-se às crianças no mundo
mais amplo, envolvendo o trabalho, a saúde
e a educação. Mesmo com a grande abran-
gência de fontes bibliográficas, a linguagem é
acessível a um amplo público leitor.
O livro parte da compreensão de que
seria simplista considerar a ausência ou a pre-
sença do sentimento da infância em um ou
outro período da história. Considera mais fru-
tífera a busca de diferentes concepções sobre
a infância em diferentes tempos e lugares.
O autor identifica várias “descobertas”
da infância: nos séculos VI a VII, nos séculos
XII a XIV, nos séculos XVI e XVII, no século
XVIII e início do XIX, e no final do XIX e iní-
cio do XX. A história da infância move-se por
“linhas sinuosas”, de modo que a criança pode
ter sido considerada impura no início do sé-
culo XX, como o fora na Alta Idade Média.
Se há uma mudança de longo prazo em que
a progressiva aceitação da necessidade de
uma educação escolar prolonga a infância e a
adolescência, se há um interesse crescente e
uma imagem cada vez mais positiva da infân-
cia, os debates assumem uma forma cíclica e
não linear. A ambigüidade, nos diferentes
momentos, polariza a criança entre a impu-
reza e a inocência, entre as características ina-
tas e as adquiridas, entre a independência e
a dependência, entre meninos e meninas.
As relações das crianças com seus pais
e pares é discutida sob vários aspectos: o
desejo ou não de se ter filhos, o parto, o
batismo, a apresentação das crianças à co-
munidade e a morte de mães e crianças.
Heywood constata que até o impacto da
medicina moderna, no final do século XIX,
ter filhos era um empreendimento arrisca-
do, mas isso não impedia a expectativa de
procriação entre aqueles que se casavam.
A seguir, discute a questão das amas-
de-leite, a alimentação, o vestuário, a higie-
ne, o infanticídio, o abandono. Considera
que a natureza dramática de algumas dessas
questões, assim como a ampla documenta-
ção oriunda de instituições de atendimento
e do judiciário, entre outras, favorece a ên-
fase da historiografia nesses aspectos. Entre-
tanto, pondera que a maioria das crianças
terá sido poupada desses traumas, vivendo
histórias mais banais.
Quanto à segunda fase da infância, do
desmame aos sete anos, identifica contrastan-
240 Cadernos de Pesquisa, v. 35, n. 125, maio/ago. 2005
Resenhas
tes formas de atitude dos pais: o tipo indife-
rente; o tipo “invasivo” ou “evangélico”, que
vê a criança como pecadora inata; o seu opos-
to, que a toma como naturalmente inocente;
e o tipo moderado. O autor cita pesquisas
que indicam diferentes modos de comporta-
mento materno e paterno, tanto entre per-
sonagens da nobreza e da burguesia como
entre trabalhadores, camponeses e escravos
norte-americanos.
A seguir, trata dos aprendizados e da
educação das crianças: o controle dos esfínc-
teres, o caminhar, a fala, os brinquedos e
brincadeiras, os livros infantis. Amedrontar,
ironizar, castigar física e moralmente são for-
mas de tratamento que ocorreram em dife-
rentes momentos, embora também se pu-
desse identificar o combate a essas práticas,
como no século XI, quando Santo Anselmo
apontava as vantagens da gentileza e dos
bons exemplos.
Aos sete anos marcava-se uma trans-
formação na vida das crianças. Mudavam-se
os trajes, diferenciavam-se os gêneros, atri-
buíam-se responsabilidades. Ampliavam-se
as relações sociais, seja pela entrada no mun-
do do trabalho ou do estudo, muitas vezes
com a saída de casa, seja pelo maior conví-
vio com os grupos de pares, que irão rivali-
zar com a família nas influências sobre a so-
cialização das crianças.
A última parte do livro trata da presen-
ça das crianças no mundo do trabalho e da
sua saúde e educação. O autor considera
que, apesar dos exemplos cruéis de explo-
ração do trabalho infantil, grande parte do
trabalho feito pelas crianças no passado se-
ria casual e de pouco esforço, relacionado a
tarefas de ajudar os adultos nos seus afaze-
res. Há exemplos de ambas as formas de tra-
tamento, das suaves às extenuantes, no cam-
po e na cidade, antes e após a industrialização.
As fábricas intensificaram os abusos sobre as
crianças e se isso levou à discussão e formu-
lação de leis, a legislação não chegou a proi-
bir, mas a regulamentar o trabalho infantil e
seus efeitos são passíveis de discussão. A
condenação e eliminação de boa parte do
trabalho infantil, a construção de uma con-
cepção moderna da infância, que destaca a
sua vulnerabilidade e que põe a escola como
local privilegiado para a infância, foi fruto de
um longo processo.
Quanto à saúde, antes da medicina
moderna, as crianças eram muito mais vul-
neráveis a inúmeros problemas, embora as
evidências sobre as dificuldades por que pas-
saram não sejam muitas. A melhoria dessa
condição, com o passar do tempo, pode ser
observada, por exemplo, pelos dados dos
registros militares, relacionados à altura dos
jovens: adolescentes da classe trabalhadora,
nascidos no final da década de 1950, tinham
30 centímetros acima dos nascidos em me-
ados do século XVIII, na Inglaterra. Mas há
também estudos que mostram um declínio
da estatura, em certos períodos, como en-
tre 1760 e 1800, em Viena, provavelmente
relacionado à deterioração dos padrões de
vida e suas conseqüências para a nutrição.
Outro indicador importante refere-se à mor-
talidade, que começa a diminuir, aos poucos,
a partir do final do século XVIII, e mais efe-
tivamente a partir do final do século XIX. En-
tretanto, o autor afirma que a melhoria nos
dados estatísticos pode encobrir a persistên-
cia das desigualdades sociais: no século XIX,
as crianças pobres e trabalhadoras eram mais
baixas e morriam em maior número do que
as de classe alta.
A substituição do trabalho pela escola,
como principal ocupação da criança, fica mais
caracterizada no final do século XIX e início
do século XX. É uma longa história, que se
inicia nos países protestantes do norte euro-
peu, no século XVII. No século XVIII, refor-
241
Cadernos de Pesquisa, v. 35, n. 125, maio/ago. 2005
Resenhas
madores começam a pensar em termos de
um sistema nacional de educação. Heywood
chama a atenção para as pesquisas que se
ocupam das experiências educacionais ante-
riores, no âmbito do aprendizado dos ofíci-
os, no período medieval. Considera ainda,
que o acesso à educação também se fez mar-
car pelas desigualdades econômicas e de gê-
nero e raça.
Nas conclusões, o autor reafirma a
recorrência de vários temas nessa longa tra-
jetória, da Alta Idade Média ao século XX.
Indica melhorias significativas para sua saúde,
educação e bem-estar, assim como o final da
crença na impureza da infância. Considera,
por fim, que as crianças não teriam sido víti-
mas passivas, possuindo alguma capacidade
de resistência e de escolha.
Algumas críticas e considerações po-
dem ser apresentadas à obra. Inicialmente,
à edição brasileira. O cuidado com a revi-
são poderia ter evitado as várias falhas de
digitação. O mesmo quanto à tradução, que
incorre em alguns problemas. No subtítu-
lo da obra, entende-se “tempos modernos”
(modern times, no original) como “época
contemporânea”. Embora o autor, no último
capítulo e em alguns poucos momentos do
livro, refira-se aos tempos atuais, o seu es-
tudo estende-se de fato ao início do século
XX, sem ocupar-se das questões ocorridas
ao longo do século passado. Em outro mo-
mento, para se referir ao controle dos es-
fíncteres, afirma-se que uma das primeiras
tarefas propostas por pais e amas “era o en-
sinamento de como utilizar o banheiro”.
Parece haver um receio no uso de expres-
sões como defecar e urinar e aí não se pode
dizer se o problema é da tradução ou do
texto original. Uma das falhas mais gritantes
ocorre na página 178, quando ear deveria
ser traduzido por “orelha” e não “ouvido”,
pois não é factível que, na situação descrita,
para castigar uma criança em uma oficina,
alguém tenha “martelado um prego em seu
ouvido”.
Quanto ao texto e à amplitude do pe-
ríodo estudado, em alguns momentos, pa-
rece que se transita com uma certa ligeire-
za do período medieval aos séculos XVIII e
XIX, sem considerar as diferentes condições
dos diferentes momentos históricos. Apoia-
do nas pesquisas realizadas em diversos paí-
ses, o livro pouco pode falar, ainda, da vida
das crianças nos ambientes rurais. Entretan-
to, o esforço “olímpico” de síntese, como
considera o autor, torna essas simplificações
quase que inevitáveis.
É louvável a preocupação que acompa-
nha todo o texto, de evitar uma compreensão
da história como seqüência linear e evoluti-
va, assim como, por conseqüência, o en-
tendimento de que, em cada momento ha-
veria uma única infância, o que representa
um grande avanço em relação às teses de
Ariès. Mas ainda persiste, em vários momen-
tos, uma certa compreensão hierarquizada
das formas de sentimento e de relação en-
tre adultos e crianças, como se os sentimen-
tos mais positivos brotassem das classes su-
periores, irradiando-se para as inferiores.
Em outros momentos, a ponderação
das ambigüidades pode levar a uma minimi-
zação das situações de exploração infantil,
como na página 179, em que o autor afirma
que “de forma nenhuma estas eram vítimas
passivas da exploração” e que, de algum
modo, “as crianças conseguiam transformar
o chão de fábrica em um lugar de diversão
para si próprias, subvertendo a atenção dos
adultos ao seu redor”. É necessário, de fato,
metodologicamente, evitar as interpretações
generalizadas, que acabam por ajuizar que
tais ou quais crianças tiveram ou não tiveram
infância. Por isso, é importante buscar as evi-
dências de como a condição infantil se ma-
242 Cadernos de Pesquisa, v. 35, n. 125, maio/ago. 2005
Resenhas
nifesta, mesmo nas condições mais adversas.
Mas também é preciso estar atento para não
se cair no pólo oposto e considerar que es-
sas crianças seriam felizes e independentes
diante de uma relação de forças tão desigual
como as que têm com os adultos.
Finalmente, cabe uma consideração do
lado de cá, do hemisfério sul. A história oci-
dental ainda é contada no livro, como se não
existíssemos, como se a colonização, o ouro,
a prata, a batata e tantas outras coisas não fi-
zessem parte da história do ocidente. Isso
também remete à expressão “ocidental”,
que retira explicitamente da análise os aspec-
tos das relações com as sociedades e cultu-
ras orientais, que têm suas implicações na
nossa história da infância. Para ser mais co-
erente com a preocupação em se conside-
rar as diferentes condições sociais, culturais
etc., para uma compreensão mais consisten-
te da História, caberia referir-se à história da
humanidade.
É claro que isso parece pedir demais,
o que é fácil de se fazer em uma ligeira apre-
ciação. Mas não custa indicar caminhos de
reflexão para as nossas análises e pesquisas,
sem deixar de considerar a importância do
trabalho do autor, que avança muito mais do
que outros, que generalizam para todo o
mundo a partir de um único país ou região,
ou de uma única referência lingüística.
Recomenda-se a leitura do livro a to-
dos os que tenham interesse na temática.
Moysés Kuhmann Jr.
Departamemto de Pesquisas Educacionais da
Fundação Carlos Chagas
mkj@fcc.org.br

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História da infância do período medieval à contemporaneidade

  • 1. 239 Cadernos de Pesquisa, v. 35, n. 125, maio/ago. 2005 Resenhas UMA HISTÓRIA DA INFÂNCIA: DA IDADE MÉDIA À ÉPOCA CONTEMPORÂNEA NO OCIDENTE. Colin Heywood Porto Alegre: Artmed, 2004, 284p. Passaram-se mais de 25 anos ao longo dos quais a obra de Philippe Ariès, História social da infância e da família, foi traduzida no Brasil e reinou quase solitária como referên- cia para a história da infância ocidental. A pu- blicação do livro de Colin Heywood permite aos leitores brasileiros o acesso a uma com- petente síntese do avanço dos estudos sobre o tema em alguns países europeus e nos EUA. Heywood faz um rastreamento de pes- quisas produzidas no Reino Unido, na Fran- ça, nos EUA, bem como na Itália, na Rússia e nos países escandinavos, entre outros. Isso surpreende, pois não é comum encontrar- mos obras de autores estrangeiros que reú- nam como referências a bibliografia em língua francesa e em língua inglesa. Os estudos so- bre a história da infância em nosso país têm se ocupado de algumas dessas pesquisas eu- ropéias e norte-americanas e das críticas às teses de Ariès, mas as trataram em análises mais pontuais, referidas a um ou outro aspec- to do tema. O livro organiza-se em três partes. A primeira, ocupa-se das mudanças nas concep- ções de infância a partir da Idade Média. A segunda, trata da relação das crianças com seus pais e com seus pares ao longo das eta- pas do seu processo de crescimento. A ter- ceira parte dedica-se às crianças no mundo mais amplo, envolvendo o trabalho, a saúde e a educação. Mesmo com a grande abran- gência de fontes bibliográficas, a linguagem é acessível a um amplo público leitor. O livro parte da compreensão de que seria simplista considerar a ausência ou a pre- sença do sentimento da infância em um ou outro período da história. Considera mais fru- tífera a busca de diferentes concepções sobre a infância em diferentes tempos e lugares. O autor identifica várias “descobertas” da infância: nos séculos VI a VII, nos séculos XII a XIV, nos séculos XVI e XVII, no século XVIII e início do XIX, e no final do XIX e iní- cio do XX. A história da infância move-se por “linhas sinuosas”, de modo que a criança pode ter sido considerada impura no início do sé- culo XX, como o fora na Alta Idade Média. Se há uma mudança de longo prazo em que a progressiva aceitação da necessidade de uma educação escolar prolonga a infância e a adolescência, se há um interesse crescente e uma imagem cada vez mais positiva da infân- cia, os debates assumem uma forma cíclica e não linear. A ambigüidade, nos diferentes momentos, polariza a criança entre a impu- reza e a inocência, entre as características ina- tas e as adquiridas, entre a independência e a dependência, entre meninos e meninas. As relações das crianças com seus pais e pares é discutida sob vários aspectos: o desejo ou não de se ter filhos, o parto, o batismo, a apresentação das crianças à co- munidade e a morte de mães e crianças. Heywood constata que até o impacto da medicina moderna, no final do século XIX, ter filhos era um empreendimento arrisca- do, mas isso não impedia a expectativa de procriação entre aqueles que se casavam. A seguir, discute a questão das amas- de-leite, a alimentação, o vestuário, a higie- ne, o infanticídio, o abandono. Considera que a natureza dramática de algumas dessas questões, assim como a ampla documenta- ção oriunda de instituições de atendimento e do judiciário, entre outras, favorece a ên- fase da historiografia nesses aspectos. Entre- tanto, pondera que a maioria das crianças terá sido poupada desses traumas, vivendo histórias mais banais. Quanto à segunda fase da infância, do desmame aos sete anos, identifica contrastan-
  • 2. 240 Cadernos de Pesquisa, v. 35, n. 125, maio/ago. 2005 Resenhas tes formas de atitude dos pais: o tipo indife- rente; o tipo “invasivo” ou “evangélico”, que vê a criança como pecadora inata; o seu opos- to, que a toma como naturalmente inocente; e o tipo moderado. O autor cita pesquisas que indicam diferentes modos de comporta- mento materno e paterno, tanto entre per- sonagens da nobreza e da burguesia como entre trabalhadores, camponeses e escravos norte-americanos. A seguir, trata dos aprendizados e da educação das crianças: o controle dos esfínc- teres, o caminhar, a fala, os brinquedos e brincadeiras, os livros infantis. Amedrontar, ironizar, castigar física e moralmente são for- mas de tratamento que ocorreram em dife- rentes momentos, embora também se pu- desse identificar o combate a essas práticas, como no século XI, quando Santo Anselmo apontava as vantagens da gentileza e dos bons exemplos. Aos sete anos marcava-se uma trans- formação na vida das crianças. Mudavam-se os trajes, diferenciavam-se os gêneros, atri- buíam-se responsabilidades. Ampliavam-se as relações sociais, seja pela entrada no mun- do do trabalho ou do estudo, muitas vezes com a saída de casa, seja pelo maior conví- vio com os grupos de pares, que irão rivali- zar com a família nas influências sobre a so- cialização das crianças. A última parte do livro trata da presen- ça das crianças no mundo do trabalho e da sua saúde e educação. O autor considera que, apesar dos exemplos cruéis de explo- ração do trabalho infantil, grande parte do trabalho feito pelas crianças no passado se- ria casual e de pouco esforço, relacionado a tarefas de ajudar os adultos nos seus afaze- res. Há exemplos de ambas as formas de tra- tamento, das suaves às extenuantes, no cam- po e na cidade, antes e após a industrialização. As fábricas intensificaram os abusos sobre as crianças e se isso levou à discussão e formu- lação de leis, a legislação não chegou a proi- bir, mas a regulamentar o trabalho infantil e seus efeitos são passíveis de discussão. A condenação e eliminação de boa parte do trabalho infantil, a construção de uma con- cepção moderna da infância, que destaca a sua vulnerabilidade e que põe a escola como local privilegiado para a infância, foi fruto de um longo processo. Quanto à saúde, antes da medicina moderna, as crianças eram muito mais vul- neráveis a inúmeros problemas, embora as evidências sobre as dificuldades por que pas- saram não sejam muitas. A melhoria dessa condição, com o passar do tempo, pode ser observada, por exemplo, pelos dados dos registros militares, relacionados à altura dos jovens: adolescentes da classe trabalhadora, nascidos no final da década de 1950, tinham 30 centímetros acima dos nascidos em me- ados do século XVIII, na Inglaterra. Mas há também estudos que mostram um declínio da estatura, em certos períodos, como en- tre 1760 e 1800, em Viena, provavelmente relacionado à deterioração dos padrões de vida e suas conseqüências para a nutrição. Outro indicador importante refere-se à mor- talidade, que começa a diminuir, aos poucos, a partir do final do século XVIII, e mais efe- tivamente a partir do final do século XIX. En- tretanto, o autor afirma que a melhoria nos dados estatísticos pode encobrir a persistên- cia das desigualdades sociais: no século XIX, as crianças pobres e trabalhadoras eram mais baixas e morriam em maior número do que as de classe alta. A substituição do trabalho pela escola, como principal ocupação da criança, fica mais caracterizada no final do século XIX e início do século XX. É uma longa história, que se inicia nos países protestantes do norte euro- peu, no século XVII. No século XVIII, refor-
  • 3. 241 Cadernos de Pesquisa, v. 35, n. 125, maio/ago. 2005 Resenhas madores começam a pensar em termos de um sistema nacional de educação. Heywood chama a atenção para as pesquisas que se ocupam das experiências educacionais ante- riores, no âmbito do aprendizado dos ofíci- os, no período medieval. Considera ainda, que o acesso à educação também se fez mar- car pelas desigualdades econômicas e de gê- nero e raça. Nas conclusões, o autor reafirma a recorrência de vários temas nessa longa tra- jetória, da Alta Idade Média ao século XX. Indica melhorias significativas para sua saúde, educação e bem-estar, assim como o final da crença na impureza da infância. Considera, por fim, que as crianças não teriam sido víti- mas passivas, possuindo alguma capacidade de resistência e de escolha. Algumas críticas e considerações po- dem ser apresentadas à obra. Inicialmente, à edição brasileira. O cuidado com a revi- são poderia ter evitado as várias falhas de digitação. O mesmo quanto à tradução, que incorre em alguns problemas. No subtítu- lo da obra, entende-se “tempos modernos” (modern times, no original) como “época contemporânea”. Embora o autor, no último capítulo e em alguns poucos momentos do livro, refira-se aos tempos atuais, o seu es- tudo estende-se de fato ao início do século XX, sem ocupar-se das questões ocorridas ao longo do século passado. Em outro mo- mento, para se referir ao controle dos es- fíncteres, afirma-se que uma das primeiras tarefas propostas por pais e amas “era o en- sinamento de como utilizar o banheiro”. Parece haver um receio no uso de expres- sões como defecar e urinar e aí não se pode dizer se o problema é da tradução ou do texto original. Uma das falhas mais gritantes ocorre na página 178, quando ear deveria ser traduzido por “orelha” e não “ouvido”, pois não é factível que, na situação descrita, para castigar uma criança em uma oficina, alguém tenha “martelado um prego em seu ouvido”. Quanto ao texto e à amplitude do pe- ríodo estudado, em alguns momentos, pa- rece que se transita com uma certa ligeire- za do período medieval aos séculos XVIII e XIX, sem considerar as diferentes condições dos diferentes momentos históricos. Apoia- do nas pesquisas realizadas em diversos paí- ses, o livro pouco pode falar, ainda, da vida das crianças nos ambientes rurais. Entretan- to, o esforço “olímpico” de síntese, como considera o autor, torna essas simplificações quase que inevitáveis. É louvável a preocupação que acompa- nha todo o texto, de evitar uma compreensão da história como seqüência linear e evoluti- va, assim como, por conseqüência, o en- tendimento de que, em cada momento ha- veria uma única infância, o que representa um grande avanço em relação às teses de Ariès. Mas ainda persiste, em vários momen- tos, uma certa compreensão hierarquizada das formas de sentimento e de relação en- tre adultos e crianças, como se os sentimen- tos mais positivos brotassem das classes su- periores, irradiando-se para as inferiores. Em outros momentos, a ponderação das ambigüidades pode levar a uma minimi- zação das situações de exploração infantil, como na página 179, em que o autor afirma que “de forma nenhuma estas eram vítimas passivas da exploração” e que, de algum modo, “as crianças conseguiam transformar o chão de fábrica em um lugar de diversão para si próprias, subvertendo a atenção dos adultos ao seu redor”. É necessário, de fato, metodologicamente, evitar as interpretações generalizadas, que acabam por ajuizar que tais ou quais crianças tiveram ou não tiveram infância. Por isso, é importante buscar as evi- dências de como a condição infantil se ma-
  • 4. 242 Cadernos de Pesquisa, v. 35, n. 125, maio/ago. 2005 Resenhas nifesta, mesmo nas condições mais adversas. Mas também é preciso estar atento para não se cair no pólo oposto e considerar que es- sas crianças seriam felizes e independentes diante de uma relação de forças tão desigual como as que têm com os adultos. Finalmente, cabe uma consideração do lado de cá, do hemisfério sul. A história oci- dental ainda é contada no livro, como se não existíssemos, como se a colonização, o ouro, a prata, a batata e tantas outras coisas não fi- zessem parte da história do ocidente. Isso também remete à expressão “ocidental”, que retira explicitamente da análise os aspec- tos das relações com as sociedades e cultu- ras orientais, que têm suas implicações na nossa história da infância. Para ser mais co- erente com a preocupação em se conside- rar as diferentes condições sociais, culturais etc., para uma compreensão mais consisten- te da História, caberia referir-se à história da humanidade. É claro que isso parece pedir demais, o que é fácil de se fazer em uma ligeira apre- ciação. Mas não custa indicar caminhos de reflexão para as nossas análises e pesquisas, sem deixar de considerar a importância do trabalho do autor, que avança muito mais do que outros, que generalizam para todo o mundo a partir de um único país ou região, ou de uma única referência lingüística. Recomenda-se a leitura do livro a to- dos os que tenham interesse na temática. Moysés Kuhmann Jr. Departamemto de Pesquisas Educacionais da Fundação Carlos Chagas mkj@fcc.org.br