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SISTEMAS MUSICAIS EM ALMEIDA PRADO:

                           nas fases Síntese e Pós Moderna

                                                                             Edson Hansen Sant'Ana
                                                                            Universidade de Brasília
                                                                       edhansen_2000@hotmail.com


       Este trabalho surgiu de uma preocupação por uma abordagem analítica que leve a um
entendimento possível da obra do ponto de vista estético ou poético, como distinguiria Pareyson
(1984). Busca uma expansão do processo analítico por uma interpretação crítica conceitual dos
dados materiais no contexto dos sistemas musicais, em direção ao sentido da poética composicional.
Este trabalho surgiu, sobretudo, de uma inquietação pela busca de uma ferramenta analítica que
reflita o pensamento da obra, uma abordagem analítica cujos parâmetros estejam intimamente
relacionados com as questões da Poética da composição tal qual enunciadas por Almeida Prado.
       Nos trabalhos sobre a obra de Almeida Prado nota-se uma tendência predominante para
abordagens que visam resolver questões da performance e interpretação musical, resultando, muitas
vezes, numa análise descritiva que tange mais os dados materiais do que ao referencial teórico. O
trabalho de MOREIRA (2002) se destaca pela postura predominantemente analítica. Entretanto, a
ferramenta analítica da “teoria dos conjuntos” adotada pela especialista, ressente-se justamente de
uma maior proximidade com questões da Poética.
       Para tanto, faz-se necessário um estudo preparatório relativo às inúmeras conceituações que
Almeida Prado teceu a respeito de sua obra e técnica composicional. O presente trabalho busca
sistematizar os enunciados do compositor que visam explicar os seus princípios composicionais.
Busca extrair de tais declarações os conceitos-chaves que possam nortear a construção de uma
ferramenta analítica que contemple sua poética. Almeja-se que essa ferramenta tenha parâmetros
que possam ser traduzidos tecnicamente.


                      Um “Novo Sistema”: entre o Tonal e o Atonal

       O compositor estabelece o terreno sistêmico localizado “entre” os sistemas herdados
historicamente, o tonal e o atonal. Tal terreno sistêmico não apenas permite transitar entre os
demais sistemas, mas depende desse fluxo. Sua re-visitação ao tonal se dá numa outra ordem de
construção, sob grande liberdade de criação e autonomia.
         A música contemporânea, que neste século se dividiu em múltiplos caminhos estéticos, viu-se de
         repente com uma responsabilidade de coerência e explicação lógica. Era me oferecida então a chance
         de organizar um sistema capaz de abarcar várias situações sonoras, colocando-as juntas, criando um
         mínimo de unidade. Esse pluralismo, tão rico de possibilidades, teria que ser parte do Novo Sistema.
         (ALMEIDA PRADO, 1985, p. 541)
       O autor diz que as “Cartas Celestes” está entre o sistema tonal e entre o sistema atonal, esse
estar ‘entre’ ocupa uma lacuna que é chamada de “novo sistema”. É nesse espaço ‘entre’ que o
compositor diz atuar criando um ‘modus’ de composição. Um “novo sistema” que se apodera de
uma indefinição, um espaço justamente ‘entre’ o tonal e o atonal, mas que salienta o ‘trânsito’ que
pratica entre tais sistemas.
       Quanto aos sistemas tonal e atonal/serial, Almeida Prado diz que o “seu discurso como
compositor não é tonal - Beethoven e nem serial - Schoenberg. Ele diz: “uma fusão desses dois
sistemas” [...] Esse estar no “novo sistema” [...] “trabalha com mecanismos intervalares e não se
subordina às regras de qualquer sistema” (NADAI, 2007, p. 25).


                                            Transtonalismo
       O compositor explica que esse “novo sistema” se articula pelo sistema de ressonância dos
harmônicos superiores e inferiores. “O meu sistema seria então, uma tentativa de colocar juntos as
experiências atonais com o uso racional dos Harmônicos Superiores e Inferiores, criando Zonas de
Percepção da Ressonância.(ALMEIDA PRADO, 1985, p.559).
       O conceito de “zonas de ressonância”, oriundo da série harmônica, é um construto que está
relacionado historicamente com o sistema tonal, foi re-apropriado por Almeida Prado a partir do
conceito do “acorde de Messiaen” como uma janela de possibilidades de superação das dicotomias
entre tonal e o atonal. Tal acorde conjuga a sobreposição de duas estruturas; ambas iniciam-se
conceitualmente na nota centro (nota comum) de onde partem uma lógica intervalar superior
(acorde maior: com 7a. menor, 9.ª maior, uma 11.ª aumentada e uma 14.ª bequadralizada e a 15.ª);
e uma estrutura inferior que inicia-se nesta mesma nota comum, que baseia-se numa série
harmônica invertida com notas que possuem uma relação intervalar de quatro saltos de terças ( a
partir da nota comum em direção ao grave). A extremidade desses quatro jogos de intervalos de
terças inversas a partir da nota central forma uma 9.ª maior abaixo (um acorde maior começando
com esse 4.º intervalo a partir da nota central: acorde maior com 7.ª menor mais 9.ª maior – a qual é
a nota central). A partir do 1.º intervalo da base (em direção a região grave) desenha-se o restante da
estrutura inferior em uma escala no modo Lócrio (que parte de uma oitava abaixo da nota comum -
nota central).
       ALMEIDA PRADO declara que o transtonalismo prevê a combinação dos materiais que
vem da lógica do sistema das ressonâncias. As estruturas sonoras são expandidas pela utilização de
procedimentos e técnicas que são oriundos dos outros sistemas. Assim todo proceder, como os
materiais musicais são aglutinados ao transtonalismo. Essa associação de processos cumpre a
exigência do novo sistema que é “entre” e que é esse espaço, um terreno hábil para o trânsito e
combinação fluente dessas regras e normativas; a fusão ou gradação das normativas determinam
novas cores, mas mútua coexistência desses sistemas. O resultado é um grande alcance
composicional por ampla mutação, variabilidade e multiplicidade.
       ALMEIDA PRADO afirma que o seu transtonalismo vai de 1973 a 1983, e que a partir de
1983 começa seu pós-modernismo que dá abertura a uma poética de “ecletismo total” (GROSSO
1997, p.194; apud ASSIS, 1997, p.7; apud GUIGUE e PINHEIRO, 2001, p. 4). Mesmo que o
compositor tenha declarado que a partir de então se abriu para uma fase eclética, ainda é marcante o
transtonalismo nos Poesilúdios, obra que, segundo o próprio compositor, inaugura a sua quarta fase
(entrevista de ALMEIDA PRADO, 2002, apud MOREIRA 2004, p. 74).
       “Em minha tese (PRADO, 1985), tentei racionalizar um pouco. O transtonal refere-se a uma
mistura de serial, com atonal, e com tonal”. O conceito transtonal aplica-se à utilização de notas que
pertençam às ressonâncias de uma nota de um acorde fundamental (PERSICHETTI, 1985). “O
transtonalismo como sistema de organização das alturas encontra um dos seus fundamentos no
acorde de ressonância de Messiaen, que se baseia no emprego da série harmônica”. [...] “Preferimos
descrever o transtonalismo como um sistema predominantemente atonal de organização acrônica
das alturas, que absorve e amplia o princípio do baixo fundamental herdado de Rameau
[GUBERNIKOFF 1999], e as relações baseadas na série harmônica, incluindo, sem restrição, as
construções forjadas a partir dos primeiros harmônicos — os que formam as tríades perfeitas”
(GUIGUE & PINHEIRO, 2001, p. 4).
       Almeida Prado quando fala de seu transtonalismo diz que não criou “nenhum sistema para
que outros possam imitar – como o ‘sistema serial’ de Schoenberg. Assim ele diz que não existe
uma normativa ortodoxa, mas sim possibilidades livres. Trata-se de uma síntese, uma mistura de
ordem livre do que é tonal, atonal e serial. “O transtonal é aquilo que parece ser tonal, que tens ares
de tonal, mas que não tem as regras do tonal, é o uso livre das ressonâncias, com alguns harmônicos
usados de maneira consciente e outros como notas invasoras” (ALMEIDA PRADO, 2002; apud
MOREIRA, 2002, p.63). Ele diz como que tais estruturas lineares ou verticais fossem formadas
dentro da idéia de “esculpir” dentro do conceito instrumental da ressonância.


                          O “Ecletismo Total”: uma Síntese de Sistemas


       Se num primeiro plano de compreensão pode-se entender cada sistema como contendo suas
regras e normativas, e assim “cada um dos sistemas (modal, tonal, atonal, pós-serial, etc.) opera em
função de determinadas relações que se formam a partir de suas estruturas de referência” (GAZIRI,
1993, p. 8); a proposição do “ecletismo total” é uma postura de partilhar, de aproximar sistemas
diferentes, e criar uma zona de troca, de convergência. Vai além do espaço e das normativas do
próprio transtonalismo. A visão e ação abarcante sobre os três sistemas são resultantes reas dessa
poética que expressa materialmente a síntese dos sistemas.
       “Esse pluralismo, tão rico em possibilidades teria que ser parte do novo sistema”
(ALMEIDA PRADO, 1985, p.541) “[...] O transtonal refere-se a uma mistura [...]” (ALMEIDA
PRADO, 2002; apud MOREIRA, 2002, p.63). As retóricas baseadas ou que tramitam entre esses
sistemas, são aplicadas de maneira livre e que indicam trânsito fluente sem separações estanques;
sendo o próprio espaço para tal trânsito uma característica importante do “novo sistema”. Os dois
sistemas – o tonal e o atonal – convivem com a lógica de ressonâncias superiores e inferiores desse
novo sistema.

         “Após a “6.ª Carta Celeste”, composta em 1982, (...) resolvi fazer colagens claramente
         visíveis nos “Poesilúdios”. Uma total ausência de querer ser coerente, um assumir o
         incoerente. É uma fase nova em relação às anteriores, embora tenha coisas das outras. O que
         nasceu com os “Poesilúdios” foi uma atitude de maior liberdade” (ALMEIDA PRADO,
         2002; MOREIRA, 2002, p. 47)

       Almeida Prado continua a afirmar que com os “Poesilúdios” existe a abertura de uma nova
fase. Uma atitude de maior liberdade. Poderá ser que a crítica possa atribuir a esta obra a
classificação de uma composição de transição estilística, mas de fato nela verifica-se uma gama de
multiplicidade e variabilidade dos materiais, sistemas e conceitos:
“interligação de texturas não necessariamente coerentes: um material modal pode ser
         seguido por um ‘cluster’ (parecem que não deviam estar juntos, mas estão: citações,
         releituras, divagações e uma incoerência assumidamente onírica, surreal). Isso é o Pós-
         Moderno na pintura e no cinema também” (ALMEIDA PRADO, 2002; apud MOREIRA,
         2002, 59).

       No percurso da pesquisa bibliográfica se ocorreu um deparar com parte de um texto de que
consegue expressar a visão pós-moderna do compositor. Tal aplicação textual consegue traduzir
uma ligação técnica-filosófica com o perfil de pensamento que é enunciado na composição de
Almeida Prado, nas fases - “síntese” e “pós-moderna”. As palavras de DELEUZE e GUATARI
tangenciam o espírito da poética do compositor e podem ajudar nessa busca de delinear uma teoria
técnica-estética.
         “Colocando em variação contínua todos os componentes, a música se torna, ela mesma, um
         sistema sobrelinear, um rizoma ao invés de uma árvore, e fica a serviço de um continuum
         cósmico virtual, do qual até mesmo os buracos, os silêncios, as rupturas, os cortes fazem
         parte. De tal forma que o importante não seja certamente um pseudocorte entre o sistema
         tonal e uma música atonal; esta, ao contrário, rompendo com o sistema tonal, não faz senão
         levar o temperamento até suas conseqüências extremas (entretanto, nenhum vienense se
         dedicou a isso). O essencial é quase o movimento inverso: a efervescência que afeta o
         próprio sistema tonal, em um longo período dos séculos XIX e XX, e que dissolve o
         temperamento, amplia o cromatismo, conservando ainda um tonal relativo, reinventa novas
         modalidades, conduz o maior e o menor para uma nova mescla, e ganha a cada vez domínios
         de variação contínua para esta ou aquela variável. Essa efervescência passa para o primeiro
         plano, se faz ouvir por si mesma, e faz ouvir, por seu material molecular assim trabalhado, as
         forças não sonoras do cosmos que sempre agitavam a música — um pouco de Tempo em
         estado puro, um grão de Intensidade absoluta... Tonal, modal, atonal não significam mais
         quase nada. Não existe senão a música para ser a arte como cosmos, e traçar as linhas
         virtuais da variação infinita” (DELEUZE & GUATARI, 1980, Vol 2, 33).

                                             Conclusões

       A trajetória deste estudo pretendeu abranger e elucidar três grandes contemplações temáticas
da teorização dos sistemas musicais que o compositor manipula e faz conviver em seu ‘modus de
composição’. É interesse deste também trazer para perto destas discussões técnicas-conceituais o
entendimento da filosofia e Poética do compositor (entendendo Poética como Pareyson propõe – o
qual a define como a conjuntura das normativas de uma arte, aqui as normativas da composição de
Almeida Prado principalmente nas últimas duas fases : “síntese” e “pós-modernas” (1984)).
       Das contemplações aqui abordadas, o essencial ao final é compreender o “entre” como uma
postura/espaço que busca ser o terreno pra a implantação do “novo sistema”. O transtonalismo que
é a gênese e a sistematização que ocupa o “entre” - constitui-se como um sistema coerente com
regras próprias e se conecta então com os demais sistemas. Ainda assim, somando-se a postura de
ordem poética do “ecletismo total” que compreende o arco geral que possibilita convivência plena
entre os sistemas - tonal, atonal e o próprio transtonalismo.
       O ‘novo sistema’ de Almeida Prado carrega paradoxos, descontinuidades, contrastes,
opostos, dubiedade e outras contradições que podem ser aparentemente desestabilizadoras, mas
quando essas forças colocadas no cenário criativo de sua composição estabelecem-se como energias
renovadoras, que dinamizam a obra quanto à poética pós-moderna. Tais forças paradoxalmente
estabelecem a energia para que haja unidade.


                                           Bibliografia
ALMEIDA PRADO, José Antônio R. “Cartas Celestes – Uma Uranografia Sonora Geradora de
     Novos Sons”.1985.6v. 576p. Doutorado. Universidade Estadual de Campinas.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Felix, Mil platôs - capitalismo c esquizofrenia, vol. 2 / (1980)
     tradução de Ana Lúcia de Oliveira e Lúcia Claúdia Leão - São Paulo: Editora 34, 1995 100
     p.
GUIGUE, Didier; PINHEIRO, Fabíola de Oliveira Fernandes. “Dos Momentos e do tempo –
     estratégias de articulação formal nos Momentos de Almeida Prado” Música de Câmera de
     Almeida Prado”. Universidade Federal da Paraíba. Paraíba, 18p.Disponível na World Wide
     Web:
     <http://www.cchla.ufpb.br/gmt/hp/pags_pessoais/didier/DGDownloads/DGAP1.PDF>.
     Acessado em: 03 Outubro 2008.
GAZIRI, N. N. Sistemas de Composição e Análise Musical. 1993. Dissertação de Mestrado,
     Universidade Estadual de Campinas.
MOREIRA, Adriana Lopes da Cunha. A Poética nos “16 Poesilúdios” para Piano de Almeida
     Prado: Análise Musical. 2002. 2v. 402p. Mestrado. Universidade Estadual de Campinas.
MOREIRA, Adriana Lopes da Cunha. “Flashes de Almeida Prado por ele mesmo”. OPUS: Revista
     da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música - ANPPOM - Ano 10, n.
     10 (dez, 2004) - Campinas -SP, p. 73-80.
NADAI, Robson Alexandre de. Sonata para Trombone e Piano de Almeida Prado: uma análise
     interpretativa. 2002. 2v. 214 p. Mestrado. Universidade Estadual de Campinas.
PERSICHETTI, Vincent. Armonia del siglo XX. (tradução de Alicia S. Santos). Madri: Real
     Musica, 1985.
ROCHA, Júnia Canton. “Entrevista com o compositor Almeida Prado sobre sua coleção de
     Poesilúdios para piano solo”. Per Musi - Revista Acadêmica de Música – n.11, Belo
     Horizonte (jan - jun, 2005), pp. 130-136.
YANSEN, Carlos Alberto Silva. Almeida Prado: Estudos para Piano, aspectos Técnico-
     Interpretativos. 2005. 1v. 401p. Mestrado. Universidade Estadual de Campinas

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Sistemas musicais de Almeida Prado entre o tonal e o atonal

  • 1. SISTEMAS MUSICAIS EM ALMEIDA PRADO: nas fases Síntese e Pós Moderna Edson Hansen Sant'Ana Universidade de Brasília edhansen_2000@hotmail.com Este trabalho surgiu de uma preocupação por uma abordagem analítica que leve a um entendimento possível da obra do ponto de vista estético ou poético, como distinguiria Pareyson (1984). Busca uma expansão do processo analítico por uma interpretação crítica conceitual dos dados materiais no contexto dos sistemas musicais, em direção ao sentido da poética composicional. Este trabalho surgiu, sobretudo, de uma inquietação pela busca de uma ferramenta analítica que reflita o pensamento da obra, uma abordagem analítica cujos parâmetros estejam intimamente relacionados com as questões da Poética da composição tal qual enunciadas por Almeida Prado. Nos trabalhos sobre a obra de Almeida Prado nota-se uma tendência predominante para abordagens que visam resolver questões da performance e interpretação musical, resultando, muitas vezes, numa análise descritiva que tange mais os dados materiais do que ao referencial teórico. O trabalho de MOREIRA (2002) se destaca pela postura predominantemente analítica. Entretanto, a ferramenta analítica da “teoria dos conjuntos” adotada pela especialista, ressente-se justamente de uma maior proximidade com questões da Poética. Para tanto, faz-se necessário um estudo preparatório relativo às inúmeras conceituações que Almeida Prado teceu a respeito de sua obra e técnica composicional. O presente trabalho busca sistematizar os enunciados do compositor que visam explicar os seus princípios composicionais. Busca extrair de tais declarações os conceitos-chaves que possam nortear a construção de uma ferramenta analítica que contemple sua poética. Almeja-se que essa ferramenta tenha parâmetros que possam ser traduzidos tecnicamente. Um “Novo Sistema”: entre o Tonal e o Atonal O compositor estabelece o terreno sistêmico localizado “entre” os sistemas herdados historicamente, o tonal e o atonal. Tal terreno sistêmico não apenas permite transitar entre os
  • 2. demais sistemas, mas depende desse fluxo. Sua re-visitação ao tonal se dá numa outra ordem de construção, sob grande liberdade de criação e autonomia. A música contemporânea, que neste século se dividiu em múltiplos caminhos estéticos, viu-se de repente com uma responsabilidade de coerência e explicação lógica. Era me oferecida então a chance de organizar um sistema capaz de abarcar várias situações sonoras, colocando-as juntas, criando um mínimo de unidade. Esse pluralismo, tão rico de possibilidades, teria que ser parte do Novo Sistema. (ALMEIDA PRADO, 1985, p. 541) O autor diz que as “Cartas Celestes” está entre o sistema tonal e entre o sistema atonal, esse estar ‘entre’ ocupa uma lacuna que é chamada de “novo sistema”. É nesse espaço ‘entre’ que o compositor diz atuar criando um ‘modus’ de composição. Um “novo sistema” que se apodera de uma indefinição, um espaço justamente ‘entre’ o tonal e o atonal, mas que salienta o ‘trânsito’ que pratica entre tais sistemas. Quanto aos sistemas tonal e atonal/serial, Almeida Prado diz que o “seu discurso como compositor não é tonal - Beethoven e nem serial - Schoenberg. Ele diz: “uma fusão desses dois sistemas” [...] Esse estar no “novo sistema” [...] “trabalha com mecanismos intervalares e não se subordina às regras de qualquer sistema” (NADAI, 2007, p. 25). Transtonalismo O compositor explica que esse “novo sistema” se articula pelo sistema de ressonância dos harmônicos superiores e inferiores. “O meu sistema seria então, uma tentativa de colocar juntos as experiências atonais com o uso racional dos Harmônicos Superiores e Inferiores, criando Zonas de Percepção da Ressonância.(ALMEIDA PRADO, 1985, p.559). O conceito de “zonas de ressonância”, oriundo da série harmônica, é um construto que está relacionado historicamente com o sistema tonal, foi re-apropriado por Almeida Prado a partir do conceito do “acorde de Messiaen” como uma janela de possibilidades de superação das dicotomias entre tonal e o atonal. Tal acorde conjuga a sobreposição de duas estruturas; ambas iniciam-se conceitualmente na nota centro (nota comum) de onde partem uma lógica intervalar superior (acorde maior: com 7a. menor, 9.ª maior, uma 11.ª aumentada e uma 14.ª bequadralizada e a 15.ª); e uma estrutura inferior que inicia-se nesta mesma nota comum, que baseia-se numa série harmônica invertida com notas que possuem uma relação intervalar de quatro saltos de terças ( a partir da nota comum em direção ao grave). A extremidade desses quatro jogos de intervalos de terças inversas a partir da nota central forma uma 9.ª maior abaixo (um acorde maior começando
  • 3. com esse 4.º intervalo a partir da nota central: acorde maior com 7.ª menor mais 9.ª maior – a qual é a nota central). A partir do 1.º intervalo da base (em direção a região grave) desenha-se o restante da estrutura inferior em uma escala no modo Lócrio (que parte de uma oitava abaixo da nota comum - nota central). ALMEIDA PRADO declara que o transtonalismo prevê a combinação dos materiais que vem da lógica do sistema das ressonâncias. As estruturas sonoras são expandidas pela utilização de procedimentos e técnicas que são oriundos dos outros sistemas. Assim todo proceder, como os materiais musicais são aglutinados ao transtonalismo. Essa associação de processos cumpre a exigência do novo sistema que é “entre” e que é esse espaço, um terreno hábil para o trânsito e combinação fluente dessas regras e normativas; a fusão ou gradação das normativas determinam novas cores, mas mútua coexistência desses sistemas. O resultado é um grande alcance composicional por ampla mutação, variabilidade e multiplicidade. ALMEIDA PRADO afirma que o seu transtonalismo vai de 1973 a 1983, e que a partir de 1983 começa seu pós-modernismo que dá abertura a uma poética de “ecletismo total” (GROSSO 1997, p.194; apud ASSIS, 1997, p.7; apud GUIGUE e PINHEIRO, 2001, p. 4). Mesmo que o compositor tenha declarado que a partir de então se abriu para uma fase eclética, ainda é marcante o transtonalismo nos Poesilúdios, obra que, segundo o próprio compositor, inaugura a sua quarta fase (entrevista de ALMEIDA PRADO, 2002, apud MOREIRA 2004, p. 74). “Em minha tese (PRADO, 1985), tentei racionalizar um pouco. O transtonal refere-se a uma mistura de serial, com atonal, e com tonal”. O conceito transtonal aplica-se à utilização de notas que pertençam às ressonâncias de uma nota de um acorde fundamental (PERSICHETTI, 1985). “O transtonalismo como sistema de organização das alturas encontra um dos seus fundamentos no acorde de ressonância de Messiaen, que se baseia no emprego da série harmônica”. [...] “Preferimos descrever o transtonalismo como um sistema predominantemente atonal de organização acrônica das alturas, que absorve e amplia o princípio do baixo fundamental herdado de Rameau [GUBERNIKOFF 1999], e as relações baseadas na série harmônica, incluindo, sem restrição, as construções forjadas a partir dos primeiros harmônicos — os que formam as tríades perfeitas” (GUIGUE & PINHEIRO, 2001, p. 4). Almeida Prado quando fala de seu transtonalismo diz que não criou “nenhum sistema para que outros possam imitar – como o ‘sistema serial’ de Schoenberg. Assim ele diz que não existe uma normativa ortodoxa, mas sim possibilidades livres. Trata-se de uma síntese, uma mistura de
  • 4. ordem livre do que é tonal, atonal e serial. “O transtonal é aquilo que parece ser tonal, que tens ares de tonal, mas que não tem as regras do tonal, é o uso livre das ressonâncias, com alguns harmônicos usados de maneira consciente e outros como notas invasoras” (ALMEIDA PRADO, 2002; apud MOREIRA, 2002, p.63). Ele diz como que tais estruturas lineares ou verticais fossem formadas dentro da idéia de “esculpir” dentro do conceito instrumental da ressonância. O “Ecletismo Total”: uma Síntese de Sistemas Se num primeiro plano de compreensão pode-se entender cada sistema como contendo suas regras e normativas, e assim “cada um dos sistemas (modal, tonal, atonal, pós-serial, etc.) opera em função de determinadas relações que se formam a partir de suas estruturas de referência” (GAZIRI, 1993, p. 8); a proposição do “ecletismo total” é uma postura de partilhar, de aproximar sistemas diferentes, e criar uma zona de troca, de convergência. Vai além do espaço e das normativas do próprio transtonalismo. A visão e ação abarcante sobre os três sistemas são resultantes reas dessa poética que expressa materialmente a síntese dos sistemas. “Esse pluralismo, tão rico em possibilidades teria que ser parte do novo sistema” (ALMEIDA PRADO, 1985, p.541) “[...] O transtonal refere-se a uma mistura [...]” (ALMEIDA PRADO, 2002; apud MOREIRA, 2002, p.63). As retóricas baseadas ou que tramitam entre esses sistemas, são aplicadas de maneira livre e que indicam trânsito fluente sem separações estanques; sendo o próprio espaço para tal trânsito uma característica importante do “novo sistema”. Os dois sistemas – o tonal e o atonal – convivem com a lógica de ressonâncias superiores e inferiores desse novo sistema. “Após a “6.ª Carta Celeste”, composta em 1982, (...) resolvi fazer colagens claramente visíveis nos “Poesilúdios”. Uma total ausência de querer ser coerente, um assumir o incoerente. É uma fase nova em relação às anteriores, embora tenha coisas das outras. O que nasceu com os “Poesilúdios” foi uma atitude de maior liberdade” (ALMEIDA PRADO, 2002; MOREIRA, 2002, p. 47) Almeida Prado continua a afirmar que com os “Poesilúdios” existe a abertura de uma nova fase. Uma atitude de maior liberdade. Poderá ser que a crítica possa atribuir a esta obra a classificação de uma composição de transição estilística, mas de fato nela verifica-se uma gama de multiplicidade e variabilidade dos materiais, sistemas e conceitos:
  • 5. “interligação de texturas não necessariamente coerentes: um material modal pode ser seguido por um ‘cluster’ (parecem que não deviam estar juntos, mas estão: citações, releituras, divagações e uma incoerência assumidamente onírica, surreal). Isso é o Pós- Moderno na pintura e no cinema também” (ALMEIDA PRADO, 2002; apud MOREIRA, 2002, 59). No percurso da pesquisa bibliográfica se ocorreu um deparar com parte de um texto de que consegue expressar a visão pós-moderna do compositor. Tal aplicação textual consegue traduzir uma ligação técnica-filosófica com o perfil de pensamento que é enunciado na composição de Almeida Prado, nas fases - “síntese” e “pós-moderna”. As palavras de DELEUZE e GUATARI tangenciam o espírito da poética do compositor e podem ajudar nessa busca de delinear uma teoria técnica-estética. “Colocando em variação contínua todos os componentes, a música se torna, ela mesma, um sistema sobrelinear, um rizoma ao invés de uma árvore, e fica a serviço de um continuum cósmico virtual, do qual até mesmo os buracos, os silêncios, as rupturas, os cortes fazem parte. De tal forma que o importante não seja certamente um pseudocorte entre o sistema tonal e uma música atonal; esta, ao contrário, rompendo com o sistema tonal, não faz senão levar o temperamento até suas conseqüências extremas (entretanto, nenhum vienense se dedicou a isso). O essencial é quase o movimento inverso: a efervescência que afeta o próprio sistema tonal, em um longo período dos séculos XIX e XX, e que dissolve o temperamento, amplia o cromatismo, conservando ainda um tonal relativo, reinventa novas modalidades, conduz o maior e o menor para uma nova mescla, e ganha a cada vez domínios de variação contínua para esta ou aquela variável. Essa efervescência passa para o primeiro plano, se faz ouvir por si mesma, e faz ouvir, por seu material molecular assim trabalhado, as forças não sonoras do cosmos que sempre agitavam a música — um pouco de Tempo em estado puro, um grão de Intensidade absoluta... Tonal, modal, atonal não significam mais quase nada. Não existe senão a música para ser a arte como cosmos, e traçar as linhas virtuais da variação infinita” (DELEUZE & GUATARI, 1980, Vol 2, 33). Conclusões A trajetória deste estudo pretendeu abranger e elucidar três grandes contemplações temáticas da teorização dos sistemas musicais que o compositor manipula e faz conviver em seu ‘modus de composição’. É interesse deste também trazer para perto destas discussões técnicas-conceituais o entendimento da filosofia e Poética do compositor (entendendo Poética como Pareyson propõe – o qual a define como a conjuntura das normativas de uma arte, aqui as normativas da composição de Almeida Prado principalmente nas últimas duas fases : “síntese” e “pós-modernas” (1984)). Das contemplações aqui abordadas, o essencial ao final é compreender o “entre” como uma postura/espaço que busca ser o terreno pra a implantação do “novo sistema”. O transtonalismo que é a gênese e a sistematização que ocupa o “entre” - constitui-se como um sistema coerente com
  • 6. regras próprias e se conecta então com os demais sistemas. Ainda assim, somando-se a postura de ordem poética do “ecletismo total” que compreende o arco geral que possibilita convivência plena entre os sistemas - tonal, atonal e o próprio transtonalismo. O ‘novo sistema’ de Almeida Prado carrega paradoxos, descontinuidades, contrastes, opostos, dubiedade e outras contradições que podem ser aparentemente desestabilizadoras, mas quando essas forças colocadas no cenário criativo de sua composição estabelecem-se como energias renovadoras, que dinamizam a obra quanto à poética pós-moderna. Tais forças paradoxalmente estabelecem a energia para que haja unidade. Bibliografia ALMEIDA PRADO, José Antônio R. “Cartas Celestes – Uma Uranografia Sonora Geradora de Novos Sons”.1985.6v. 576p. Doutorado. Universidade Estadual de Campinas. DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Felix, Mil platôs - capitalismo c esquizofrenia, vol. 2 / (1980) tradução de Ana Lúcia de Oliveira e Lúcia Claúdia Leão - São Paulo: Editora 34, 1995 100 p. GUIGUE, Didier; PINHEIRO, Fabíola de Oliveira Fernandes. “Dos Momentos e do tempo – estratégias de articulação formal nos Momentos de Almeida Prado” Música de Câmera de Almeida Prado”. Universidade Federal da Paraíba. Paraíba, 18p.Disponível na World Wide Web: <http://www.cchla.ufpb.br/gmt/hp/pags_pessoais/didier/DGDownloads/DGAP1.PDF>. Acessado em: 03 Outubro 2008. GAZIRI, N. N. Sistemas de Composição e Análise Musical. 1993. Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual de Campinas. MOREIRA, Adriana Lopes da Cunha. A Poética nos “16 Poesilúdios” para Piano de Almeida Prado: Análise Musical. 2002. 2v. 402p. Mestrado. Universidade Estadual de Campinas. MOREIRA, Adriana Lopes da Cunha. “Flashes de Almeida Prado por ele mesmo”. OPUS: Revista da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música - ANPPOM - Ano 10, n. 10 (dez, 2004) - Campinas -SP, p. 73-80. NADAI, Robson Alexandre de. Sonata para Trombone e Piano de Almeida Prado: uma análise interpretativa. 2002. 2v. 214 p. Mestrado. Universidade Estadual de Campinas. PERSICHETTI, Vincent. Armonia del siglo XX. (tradução de Alicia S. Santos). Madri: Real Musica, 1985. ROCHA, Júnia Canton. “Entrevista com o compositor Almeida Prado sobre sua coleção de Poesilúdios para piano solo”. Per Musi - Revista Acadêmica de Música – n.11, Belo Horizonte (jan - jun, 2005), pp. 130-136. YANSEN, Carlos Alberto Silva. Almeida Prado: Estudos para Piano, aspectos Técnico- Interpretativos. 2005. 1v. 401p. Mestrado. Universidade Estadual de Campinas