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RÁPIDO, BARATO E LIVRE DE
EXPERIMENTAÇÃO ANIMAL
Em apenas seis meses, Lacen-PR alterou
o método de diagnóstico da raiva e se
tornou referência para os laboratórios
de saúde pública da América Latina
É
viável um laboratório de saúde pública sem ex-
perimentação animal? A resposta é sim. O La-
boratório Central do Paraná (Lacen-PR) eliminou
o uso de camundongos para o diagnóstico da raiva e
se tornou o primeiro laboratório de saúde pública da
América Latina 100% livre de experimentação animal.
“Não é possível que não haja nada que a gente
possa fazer”. Esse era o pensamento dos integrantes
BEM-ESTAR ANIMAL
da equipe da Divisão dos Laboratórios de Epidemiolo-
gia e Controle de Doenças (DVLECD) quando entravam
no – agora extinto – biotério para fazer a inoculação
dos camundongos.
“Esta sala me dá gatilho”, descreve Thaila Corona,
uma das médicas-veterinárias responsáveis pelas aná-
lises das amostras, ao apresentar as dependências em
que chegava a fazer 500 eutanásias em um dia. “Era o
dia em que eu chorava ou brigava com alguém”, lembra.
Inconformada, em 2014, Thaila alterou no meio do
caminho o tema do seu mestrado para estudar a in-
vestigação do vírus da raiva por protocolo laboratorial
modificado. A ideia era utilizar cultura celular e, assim,
encerrar o método de isolamento viral em animais. O
processo, no entanto, não saiu como esperado. “É um
método laborioso, caro e não conseguimos nos estru-
T	O Lacen-PR eliminou o uso de camundongos para diagnóstico da raiva e realiza, em média, quatro mil exames de leishmaniose visceral canina ao ano
DiogoWosch
Thainá Laureano
Revista CFMV Brasília DF Ano XXVI nº 84 37
turar. Seria uma retomada para instituir um método
que o laboratório não está mais acostumado a fazer”,
explica Irina Riediger, diretora técnica do Lacen-PR.
Os anos foram passando e, mesmo com as dificulda-
des, a equipe seguiu buscando alternativas, solicitando
a aquisição de equipamentos e insumos necessários,
até que, em fevereiro de 2019, em publicação da Orga-
nização Mundial da Saúde (OMS), veio a solução: o reco-
nhecimento da reação em cadeia da polimerase (PCR)
quantitativa em tempo real ou, simplesmente, qPCR (do
inglês Polymerase Chain Reaction Quantitative Real Time)
como diagnóstico primário para a raiva.
Em resumo, a publicação reconheceu que a técnica
de qPCR, até então tida como método complementar,
poderia ser utilizada como definitiva para diagnosticar a
doença. Com uma equipe de especialistas em PCR den-
tro do laboratório, o caminho estava traçado e “foi tudo
muito rápido”, conta Irina. Entraram em contato com o
Centro de Controle e Prevenção de Doenças (Center for
Disease Control and Prevention – CDC), em Atlanta, nos
Estados Unidos, responsável pelo estudo, e iniciaram a
validação do processo nas dependências do Lacen-PR.
“Eles nos orientaram como proceder e remeteram
a primeira leva de reagentes para que pudéssemos
trabalhar. Traçamos um plano interno de como fazer a
substituição da metodologia com segurança, fizemos
todas as avaliações de desempenho analítico e com-
provamos que o método, de fato, funciona”, explica.
Com a validação completa, o método foi apresen-
tado ao Ministério da Saúde e ao Instituto Pasteur,
laboratório de referência nacional no diagnóstico da
raiva, e aprovado. Em agosto de 2019, foram encerra-
das as atividades do biotério e o Lacen-PR se tornou,
enfim, livre de experimentação animal. A satisfação é
visível nos olhos de toda a equipe. O sentimento, ex-
presso por Irina, é de alívio. “Aqui, o último bastião da
era paleolítica era a raiva. Acabou. Somos um labora-
tório livre de experimentação animal desde agosto do
ano passado, com muito orgulho”.
ECONOMIA DE TEMPO E DINHEIRO
Além de poupar a vida de 26 mil camundongos por
ano, o uso da qPCR é mais barato e rápido que o mé-
todo anterior. Comparando os insumos utilizados para
cada técnica, a qPCR reduz o valor à metade, gerando
uma economia de aproximadamente R$ 200 mil por
ano aos cofres públicos. São necessários apenas al-
guns ajustes.
“A qPCR já é utilizada para outros agravos, então
a estrutura já existe. É preciso cuidado com o fluxo de
processos dentro do laboratório, porque não se pode
trabalhar com amostra animal na mesma área em que
é utilizada amostra humana. Isso vai até uma etapa do
processo; dali em diante, pode misturar que não há
problema”, afirma Irina. A parte cara, ressalta, é ante-
rior a todo esse processo e já está pronta nos laborató-
rios que utilizam a técnica.
Há também a questão do tempo que cada método
exige para dar o resultado das amostras. A prova bio-
lógica com a utilização dos animais leva, em média, 30
dias para apresentar o diagnóstico. No caso da qPCR,
são necessárias menos de 24 horas. A técnica permite
ainda um aumento significativo no número de amos-
tras processadas. No que tange à eficácia, não há dúvi-
das da precisão de ambas, que se equivalem.
“Na verdade, a qPCR tem resultados até melhores,
porque é uma técnica mais sensível. Desde setembro,
tivemos duas amostras em que o vírus foi detectado
via qPCR e não foi identificado com prova biológica”,
destaca o médico-veterinário Guilherme Minozzo,
membro da equipe.
A saúde mental dos profissionais foi outro fator
levado em consideração. O exaustivo trabalho de ino-
culação e eutanásia dos animais colocava os médicos-
-veterinários em condições de estresse. “Tem muitas
vantagens; acho que a principal delas é não usar os
animais. Não tem estresse para os bichinhos, nem para
a gente”, complementa ele.
RECONHECIMENTO
Como reconhecimento máximo, a pesquisa con-
quistou o primeiro lugar na 16ª Mostra Nacional de
Experiências Bem-Sucedidas em Epidemiologia, Pre-
venção e Controle de Doenças (Expoepi), em 2019,
promovida pelo Ministério da Saúde. Para Irina, o tra-
T	Máquina que faz leitura do concentrado de material genético fornece
resultados das amostras em menos de 24 horas
DiogoWosch
Revista CFMV Brasília DF Ano XXVI nº 8438
balho realizado por sua equipe é realmente muito di-
ferente e especial. “Foi um reconhecimento não aqui
dentro, mas de todos os colegas do Sistema Único de
Saúde, em nível nacional”, diz.
APOIO AOS DEMAIS LABORATÓRIOS
O protocolo inicial, preconizado pela OMS, sofreu
algumas modificações que facilitam o trabalho e redu-
zem o custo da reação. Todo o processo implementado
no Lacen-PR está descrito na dissertação de mestrado
de Minozzo. O documento deve ser publicado até o fim
do ano e poderá ser usado por outros laboratórios para
a substituição da experimentação animal no diagnósti-
co da raiva. Muitos, inclusive, já entraram em contato, in-
teressados em dar início ao processo. “Teremos o maior
prazer em divulgar o protocolo e liberar a equipe para
auxiliar os colegas na implantação. Tudo que a gente
quer é tirar os animais do laboratório”, ressalta Irina.
Farmacêutica bioquímica e doutora em Biologia
Celular e Molecular, ela é ferrenha defensora da PCR.
Desde que ingressou no Lacen-PR, em 2005, trabalha
com outros colaboradores desenvolvendo, otimizando e
validando métodos baseados em tempo real para diag-
nosticar e monitorar os mais diferentes tipos de doença.
“Existe ainda um mito de que a PCR é muito difícil
e cara e não é mais assim; ela é o que se tem de melhor
disponível no mercado e de amplo acesso para substi-
tuir o diagnóstico de fase aguda de doenças infecciosas
de maneira geral”, explica. No laboratório, já se ansiava
pela utilização da técnica como método definitivo no
diagnóstico da raiva há alguns anos; com a aprovação
do protocolo pela OMS, o projeto foi concretizado.
Para o Ministério da Saúde, o modelo de prova bio-
lógica com inoculação em camundongos continua sen-
do o recomendado. O Brasil conta com 27 laboratórios
centrais, dos quais 26 aguardam uma orientação do
ministério para procurar alternativas à experimenta-
ção animal. A expectativa da equipe do Lacen-PR é de
que o trabalho realizado sirva de pontapé inicial para
alertar as autoridades nacionais a rever orientações
quanto ao diagnóstico da doença.
SAÚDE ÚNICA
O Lacen-PR integra o Sistema Nacional de Labora-
tórios de Saúde Pública do Ministério da Saúde, sendo
responsável pelo diagnóstico e monitoramento das
doenças de notificação obrigatória e demais doenças
de interesse de saúde pública. Embora seu foco seja
a saúde humana, a formação de equipes multiprofis-
sionais é fundamental para a abordagem das patolo-
gias no âmbito da saúde única. O médico-veterinário é
parte integrante dessa cadeia e ganha ainda mais im-
portância quando se observam os números divulgados
pela OMS: 60% das doenças infecciosas humanas e
75% das novas doenças que infectaram os seres hu-
manos nas últimas décadas têm origem animal.
“Hoje, as doenças que afligem a saúde pública são
majoritariamente zoonoses, que irão envolver minima-
mente um animal e potencialmente o ambiente em que
ele está; então, 90% do que fazemos no laboratório tem
relação com saúde única, de uma maneira ou de outra.
Sem uma equipe de veterinários aqui dentro, apesar de
o foco ser o humano, não conseguiríamos gerar os resul-
tados que estamos gerando”, defende Irina.
Na DVLECD, onde Thaila e Minozzo estão alocados,
são feitos também diagnósticos de leishmaniose vis-
ceral canina, esporotricose felina e febre amarela em
primatas não humanos, este em parceria com o labora-
tório da rede Fiocruz-PR/Instituto Carlos Chagas (ICC).
Os resultados dos exames servem como base para a
vigilância epidemiológica dos municípios no moni-
toramento da circulação dos agentes causadores das
doenças na região. Com dados em mãos, é possível de-
finir estratégias de prevenção e controle, reduzindo a
incidência de casos e, consequentemente, preservan-
do a vida humana.
T	Outros laboratórios demonstraram interesse no método
DiogoWosch
Revista CFMV Brasília DF Ano XXVI nº 84 39

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  • 1. RÁPIDO, BARATO E LIVRE DE EXPERIMENTAÇÃO ANIMAL Em apenas seis meses, Lacen-PR alterou o método de diagnóstico da raiva e se tornou referência para os laboratórios de saúde pública da América Latina É viável um laboratório de saúde pública sem ex- perimentação animal? A resposta é sim. O La- boratório Central do Paraná (Lacen-PR) eliminou o uso de camundongos para o diagnóstico da raiva e se tornou o primeiro laboratório de saúde pública da América Latina 100% livre de experimentação animal. “Não é possível que não haja nada que a gente possa fazer”. Esse era o pensamento dos integrantes BEM-ESTAR ANIMAL da equipe da Divisão dos Laboratórios de Epidemiolo- gia e Controle de Doenças (DVLECD) quando entravam no – agora extinto – biotério para fazer a inoculação dos camundongos. “Esta sala me dá gatilho”, descreve Thaila Corona, uma das médicas-veterinárias responsáveis pelas aná- lises das amostras, ao apresentar as dependências em que chegava a fazer 500 eutanásias em um dia. “Era o dia em que eu chorava ou brigava com alguém”, lembra. Inconformada, em 2014, Thaila alterou no meio do caminho o tema do seu mestrado para estudar a in- vestigação do vírus da raiva por protocolo laboratorial modificado. A ideia era utilizar cultura celular e, assim, encerrar o método de isolamento viral em animais. O processo, no entanto, não saiu como esperado. “É um método laborioso, caro e não conseguimos nos estru- T O Lacen-PR eliminou o uso de camundongos para diagnóstico da raiva e realiza, em média, quatro mil exames de leishmaniose visceral canina ao ano DiogoWosch Thainá Laureano Revista CFMV Brasília DF Ano XXVI nº 84 37
  • 2. turar. Seria uma retomada para instituir um método que o laboratório não está mais acostumado a fazer”, explica Irina Riediger, diretora técnica do Lacen-PR. Os anos foram passando e, mesmo com as dificulda- des, a equipe seguiu buscando alternativas, solicitando a aquisição de equipamentos e insumos necessários, até que, em fevereiro de 2019, em publicação da Orga- nização Mundial da Saúde (OMS), veio a solução: o reco- nhecimento da reação em cadeia da polimerase (PCR) quantitativa em tempo real ou, simplesmente, qPCR (do inglês Polymerase Chain Reaction Quantitative Real Time) como diagnóstico primário para a raiva. Em resumo, a publicação reconheceu que a técnica de qPCR, até então tida como método complementar, poderia ser utilizada como definitiva para diagnosticar a doença. Com uma equipe de especialistas em PCR den- tro do laboratório, o caminho estava traçado e “foi tudo muito rápido”, conta Irina. Entraram em contato com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (Center for Disease Control and Prevention – CDC), em Atlanta, nos Estados Unidos, responsável pelo estudo, e iniciaram a validação do processo nas dependências do Lacen-PR. “Eles nos orientaram como proceder e remeteram a primeira leva de reagentes para que pudéssemos trabalhar. Traçamos um plano interno de como fazer a substituição da metodologia com segurança, fizemos todas as avaliações de desempenho analítico e com- provamos que o método, de fato, funciona”, explica. Com a validação completa, o método foi apresen- tado ao Ministério da Saúde e ao Instituto Pasteur, laboratório de referência nacional no diagnóstico da raiva, e aprovado. Em agosto de 2019, foram encerra- das as atividades do biotério e o Lacen-PR se tornou, enfim, livre de experimentação animal. A satisfação é visível nos olhos de toda a equipe. O sentimento, ex- presso por Irina, é de alívio. “Aqui, o último bastião da era paleolítica era a raiva. Acabou. Somos um labora- tório livre de experimentação animal desde agosto do ano passado, com muito orgulho”. ECONOMIA DE TEMPO E DINHEIRO Além de poupar a vida de 26 mil camundongos por ano, o uso da qPCR é mais barato e rápido que o mé- todo anterior. Comparando os insumos utilizados para cada técnica, a qPCR reduz o valor à metade, gerando uma economia de aproximadamente R$ 200 mil por ano aos cofres públicos. São necessários apenas al- guns ajustes. “A qPCR já é utilizada para outros agravos, então a estrutura já existe. É preciso cuidado com o fluxo de processos dentro do laboratório, porque não se pode trabalhar com amostra animal na mesma área em que é utilizada amostra humana. Isso vai até uma etapa do processo; dali em diante, pode misturar que não há problema”, afirma Irina. A parte cara, ressalta, é ante- rior a todo esse processo e já está pronta nos laborató- rios que utilizam a técnica. Há também a questão do tempo que cada método exige para dar o resultado das amostras. A prova bio- lógica com a utilização dos animais leva, em média, 30 dias para apresentar o diagnóstico. No caso da qPCR, são necessárias menos de 24 horas. A técnica permite ainda um aumento significativo no número de amos- tras processadas. No que tange à eficácia, não há dúvi- das da precisão de ambas, que se equivalem. “Na verdade, a qPCR tem resultados até melhores, porque é uma técnica mais sensível. Desde setembro, tivemos duas amostras em que o vírus foi detectado via qPCR e não foi identificado com prova biológica”, destaca o médico-veterinário Guilherme Minozzo, membro da equipe. A saúde mental dos profissionais foi outro fator levado em consideração. O exaustivo trabalho de ino- culação e eutanásia dos animais colocava os médicos- -veterinários em condições de estresse. “Tem muitas vantagens; acho que a principal delas é não usar os animais. Não tem estresse para os bichinhos, nem para a gente”, complementa ele. RECONHECIMENTO Como reconhecimento máximo, a pesquisa con- quistou o primeiro lugar na 16ª Mostra Nacional de Experiências Bem-Sucedidas em Epidemiologia, Pre- venção e Controle de Doenças (Expoepi), em 2019, promovida pelo Ministério da Saúde. Para Irina, o tra- T Máquina que faz leitura do concentrado de material genético fornece resultados das amostras em menos de 24 horas DiogoWosch Revista CFMV Brasília DF Ano XXVI nº 8438
  • 3. balho realizado por sua equipe é realmente muito di- ferente e especial. “Foi um reconhecimento não aqui dentro, mas de todos os colegas do Sistema Único de Saúde, em nível nacional”, diz. APOIO AOS DEMAIS LABORATÓRIOS O protocolo inicial, preconizado pela OMS, sofreu algumas modificações que facilitam o trabalho e redu- zem o custo da reação. Todo o processo implementado no Lacen-PR está descrito na dissertação de mestrado de Minozzo. O documento deve ser publicado até o fim do ano e poderá ser usado por outros laboratórios para a substituição da experimentação animal no diagnósti- co da raiva. Muitos, inclusive, já entraram em contato, in- teressados em dar início ao processo. “Teremos o maior prazer em divulgar o protocolo e liberar a equipe para auxiliar os colegas na implantação. Tudo que a gente quer é tirar os animais do laboratório”, ressalta Irina. Farmacêutica bioquímica e doutora em Biologia Celular e Molecular, ela é ferrenha defensora da PCR. Desde que ingressou no Lacen-PR, em 2005, trabalha com outros colaboradores desenvolvendo, otimizando e validando métodos baseados em tempo real para diag- nosticar e monitorar os mais diferentes tipos de doença. “Existe ainda um mito de que a PCR é muito difícil e cara e não é mais assim; ela é o que se tem de melhor disponível no mercado e de amplo acesso para substi- tuir o diagnóstico de fase aguda de doenças infecciosas de maneira geral”, explica. No laboratório, já se ansiava pela utilização da técnica como método definitivo no diagnóstico da raiva há alguns anos; com a aprovação do protocolo pela OMS, o projeto foi concretizado. Para o Ministério da Saúde, o modelo de prova bio- lógica com inoculação em camundongos continua sen- do o recomendado. O Brasil conta com 27 laboratórios centrais, dos quais 26 aguardam uma orientação do ministério para procurar alternativas à experimenta- ção animal. A expectativa da equipe do Lacen-PR é de que o trabalho realizado sirva de pontapé inicial para alertar as autoridades nacionais a rever orientações quanto ao diagnóstico da doença. SAÚDE ÚNICA O Lacen-PR integra o Sistema Nacional de Labora- tórios de Saúde Pública do Ministério da Saúde, sendo responsável pelo diagnóstico e monitoramento das doenças de notificação obrigatória e demais doenças de interesse de saúde pública. Embora seu foco seja a saúde humana, a formação de equipes multiprofis- sionais é fundamental para a abordagem das patolo- gias no âmbito da saúde única. O médico-veterinário é parte integrante dessa cadeia e ganha ainda mais im- portância quando se observam os números divulgados pela OMS: 60% das doenças infecciosas humanas e 75% das novas doenças que infectaram os seres hu- manos nas últimas décadas têm origem animal. “Hoje, as doenças que afligem a saúde pública são majoritariamente zoonoses, que irão envolver minima- mente um animal e potencialmente o ambiente em que ele está; então, 90% do que fazemos no laboratório tem relação com saúde única, de uma maneira ou de outra. Sem uma equipe de veterinários aqui dentro, apesar de o foco ser o humano, não conseguiríamos gerar os resul- tados que estamos gerando”, defende Irina. Na DVLECD, onde Thaila e Minozzo estão alocados, são feitos também diagnósticos de leishmaniose vis- ceral canina, esporotricose felina e febre amarela em primatas não humanos, este em parceria com o labora- tório da rede Fiocruz-PR/Instituto Carlos Chagas (ICC). Os resultados dos exames servem como base para a vigilância epidemiológica dos municípios no moni- toramento da circulação dos agentes causadores das doenças na região. Com dados em mãos, é possível de- finir estratégias de prevenção e controle, reduzindo a incidência de casos e, consequentemente, preservan- do a vida humana. T Outros laboratórios demonstraram interesse no método DiogoWosch Revista CFMV Brasília DF Ano XXVI nº 84 39